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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS

R. Dom José Gaspar, 500 - Coração Eucarístico, Belo Horizonte - MG, 30535-901

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS

INSTITUTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS

Matheus Eduardo Moreira de Barcelos

Optativa: Sociologia do crime e da violência


Luís Flávio Sapori

Trabalho1

Os trabalhos sobre a sociologia do desvio realizados por Howard Becker


estabeleceram-se como referência para a consolidação da teoria da rotulação como uma
abordagem para melhor compreensão dos processos que configuram o crime e o
criminoso. O foco do autor foi esclarecer os processos de interação que conduzem a
construção e aplicação de rótulos aos indivíduos reputados como outsiders, visando a
compreensão do por que nem todos os indivíduos que violam a lei são reputados como
criminosos, visto que, para haver um criminoso não basta haver um crime, para tal; a
reação negativa do corpo social em relação ao indivíduo é imprescindível.

Para essa abordagem, o desvio é socialmente construído, bem como o desviante é


aquele individuo a quem o rótulo foi aplicado com êxito. Desse modo, regras, desvios e
rótulos são construídos em processos políticos, nos quais determinados grupos impõem
seus pontos de vista como mais legítimos que outros. O desvio, segundo o autor, não é
inato às ações ou aos indivíduos que as praticam; ele é definido por intermédio de
processos de julgamento que implicam disputas em torno de metas estabelecidas por
grupos específicos, portanto é preciso entender como as definições de crime são
construídas, a fim de conduzir a ação dos acusadores para com os acusados e o papel dos
empreendedores morais como agentes capazes de legitimar quais comportamentos serão
reputados como desviantes, destacando duas categorias: reformadores cruzados e
impositores de regras. Através da lei jurídica os reformadores cruzados constroem
normas sociais, assim, uma vez que essa lei jurídica seja instituída, caberá aos impositores
de regras de transformar essa lei em uma realidade social e, portanto, legítima, atribuindo
assim, às instituições responsáveis pelo controle social formal - isto é, policiais,
promotores, advogados e juízes - autonomia para agir diante de uma determinada

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situação, com a afirmativa de que a conduta prevista na regra, ocorreu e,


consequentemente, enquadra o seu ator no rótulo de criminoso. Diante disso, a rotulação
do indivíduo como outsider resulta do empreendedorismo moral e de sua interação com
um impositor de regras, que julgará determinados fatos como crime e o sujeito como
criminoso.

Assim, estudos orientados pela perspectiva da rotulação buscam entender os


processos de definição de uma regra penal, a transformação desta regra teórica em
realidade social, a estigmatização de algum indivíduo como criminoso, bem como, os
desdobramentos desse estigma que o menospreza, resultando em segregação (prisão) e,
quiçá, a institucionalização de uma carreira outsider por parte daquele que recebeu o
rótulo de criminoso. Desse modo, a teoria da rotulação, instiga duras críticas ao processo
de estigmatização, por parte dos grupos dominantes, em detrimento daqueles com menor
poder dentro da pirâmide social, logo, as mais suscetíveis a rotulação de criminoso.

No Brasil, estudos que utilizaram essa abordagem, demonstraram como raça,


sexo, idade e classe social são consideráveis atributos na definição de indivíduos como
criminosos, norteando a prática dos agentes policiais e do Poder Judiciário. A recente
pesquisa Elemento Suspeito coordenada pelo Centro de Estudos de Segurança e
Cidadania – CESeC, nos permite confirmar tais apontamentos, em especial o boletim:
Negro trauma: racismo e abordagem policial no Rio de Janeiro do qual elucida
interações entre a polícia e cidadãos na cidade do Rio de Janeiro, reafirmando que o perfil
predominante das pessoas consideradas suspeitas pelos policiais e priorizadas para as
abordagens são sobretudo os jovens negros, o que evidencia as características do elemento
suspeito do ponto de vista policial. É preciso ressaltar como a atuação do sistema de
justiça criminal é seletiva, visto que a população prisional brasileira é composta, em sua
maioria, por homens jovens, pretos ou pardos e de baixa escolaridade, desse modo,
criminoso é aquele indivíduo negro e de baixo status socioeconômico, sendo este o
preferivelmente assassinado nas abordagens policiais, provisoriamente preso ou
condenado à privação total da liberdade. Diante disso, o sistema que funciona de forma
altamente articulada, em uma espécie de linha de montagem (Sapori, 1995).

Dessa forma, evidencia-se que a teoria da rotulação proposta por H. Becker.


proporciona grandes contribuições para diversas análises empíricas sobre os padrões, de

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distinção que norteiam a atuação do sistema de justiça criminal brasileiro, reafirmando a


estigmatização de negros, pobres e moradores de favelas como outsiders.

Referências

BECKER, Howard Soul. Outsiders: estudos de sociologia do desvio. 1. ed. Rio de


Janeiro: Zahar, 2009{1963}.

SAPORI, Luís Flávio. A administração da justiça criminal numa área metropolitana.


Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 10, n. 29, 1995.

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