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Janice Kaiser
Título original: The Texan
Jane Stewart — médica. Linda. Vencedora. Exceto no amor: seu coração era
presa fácil. Vulnerável
Obcecado por fazer justiça, Brady dava as costas para as outras paixões. Até
que o destino lhe fez conhecer Jane, a mais doce e sensual mulher que ele jamais
vira. Era a última chance de Brady ser feliz...
PRÓLOGO
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— Não é isso o que estou dizendo, meu filho. Não há nada errado em ser
solteiro. O problema é que não consegue sequer conceber a idéia de compartilhar
sua vida com alguém.
— Pois saiba de uma coisa, mamãe, há muito mais mulheres em minha vida do
que o tempo de que disponho para atendê-las. Jamais pretendi envolver-me
seriamente. Você conhece as razões. Quer que repita alguns detalhes?
— Não me refiro a essa espécie de mulher, Brady Coleman. Estou falando de
um verdadeiro amor, uma garota meiga e apaixonada. Quando isso ocorrer em sua
vida, certamente poderá esquecer sua irmã e os tristes acontecimentos que
envolveram sua morte. Com relação às mulheres atuais, não é da minha conta. Você
é um homem de trinta e cinco anos e não cabe a mim criticar sua vida amorosa. O
fato, querido, é que o ódio que traz dentro de si está corroendo-lhe as entranhas.
Não percebe?
Brady tentou controlar-se e diminuiu a velocidade. Todas as vezes que visitava
San Antônio tinha que finalizar a discussão com sua mãe com uma velha frase de
advertência:
— Está na hora de mudarmos de assunto antes que diga algo de que possa
arrepender-me, mamãe.
— Pois diga logo o que pensa, meu filho. No caso de arrependimento, o
mínimo que pode acontecer é que se verá obrigado a refletir sobre suas próprias
palavras.
Entraram em Alamo Heights, setor residencial da cidade. O Sunset Memorial
Park não estava longe, e Brady sentia o bater do coração mais forte do que nunca.
Esforçava-se para controlar a ira.
— Não vejo em que me ajudaria reafirmar minha opinião sobre Jeremy Trent.
— Não sei, meu filho, não sei. Nunca discutiu seus sentimentos com alguém?
— A única pessoa com quem gostaria realmente de conversar sobre esse
assunto é o próprio Jeremy — ameaçou.
— Pois esse é o ponto que queria ressaltar. Um homem precisa de alguém para
dividir suas angústias e mágoas. Uma mulher jovem e bonita o faria esquecer o lado
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escuro da vida. Eu o conheço. Você é como seu pai, impetuoso, capaz de amar e
odiar com a mesma intensidade.
— Não quero desapontá-la, mas casar-me com uma pobre garota e despejar
sobre ela meus próprios problemas não me parece nobre ou justo. E, além disso, por
mais que as respeite, não acho que a principal missão das mulheres seja salvar um
rapaz problemático de ímpetos violentos ou suicidas. E, para encerrar o assunto,
mesmo sabendo de sua contrariedade, quero advertir-lhe de que estou bem
satisfeito com meu modo de vida.
— Ora, Brady, não quero interferir em suas decisões. Tentava apenas indicar
um caminho para superar essa obsessão desencadeada pela tragédia de Leigh.
Ele permaneceu em silêncio por um instante.
— Posso aceitar que tenha morrido. Essa é uma triste realidade. Mas não posso
admitir que aquele assassino esteja livre. Não deixarei de alentar a esperança de
fazer alguma coisa para que a justiça se cumpra.
— Não lhe compete vingar a morte de sua irmã. Não esqueça de que temos
pleno conhecimento dos fatos.
— Sei perfeitamente o que aconteceu.
— Meu filho, você pensa que Jeremy é responsável pela morte de Leigh, mas o
fato é que a polícia não concorda com sua interpretação das circunstâncias.
— O que lhes falta são evidências materiais para incriminar esse bastardo. Isso
é outra coisa. Já conversamos a respeito. Você não aceita o fato de Leigh ter
cometido um erro ao casar-se com esse canalha.
— Mas você não percebe que já não faz mais nenhuma diferença? Sua irmã
está morta. Quero que a justiça seja feita, mas não posso permitir que a vingança
cega corroa nossas almas e nos destrua. Esqueça esses sentimentos. Nossa tragédia
familiar tem sido longa e dolorida. Nossas feridas precisam cicatrizar-se. Por favor,
Brady...
Ele estacionou o carro no Sunset Memorial Park.
—Vemos essa questão de forma diferente, minha mãe. Assim, deixemos a
discussão e pensemos em Leigh.
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Com certo alívio, Loretta não o contestou. Não seria correto conversar sobre o
tema diante da sepultura da irmã.
Avistaram as intermináveis ruas do cemitério. Entre os túmulos perfilados
olharam o grande mausoléu de onde o cortejo fúnebre partira em fevereiro passado.
O tempo estava bem diferente. Céu azul, claro e forte, brisa inquieta e morna.
Brady esperava que o esplendor do dia lhes iluminasse os espíritos. No entanto, sua
mãe lhe parecia atolada em passiva aceitação do destino.
Saiu do carro e ajudou a mãe segurando as flores. Caminharam lado a lado
entre túmulos e árvores frondosas.
Ao chegar, Loretta Channing parou por um instante, a fitar absorta a
sepultura.
— Fico contente ao ver que está limpa e em ordem — disse com suavidade. —
Fizeram um bom trabalho...
Brady não disse a ela que estivera havia dois dias no cemitério. Contratara dois
funcionários para polir o granito e aparar a grama do túmulo. Sabia que Loretta se
preocupava com aparências e pretendeu com isso trazer-lhe um pouco de paz e
tranqüilidade.
— Aqui estão as flores, filho. Disponha-as da melhor forma. Minhas costas
doem um pouco...
Carinhoso, Brady pousou as flores no túmulo e afastou-se para observar o
efeito. A brisa soprou, fazendo-as tremular. Loretta apoiou-se em seu braço e caiu
em pranto silente. Brady, com os olhos marejados pelas lágrimas, emprestou-lhe o
lenço.
Fixou o olhar na sepultura, tentando entender como a laje sobre o corpo da
irmã o separava de ternas lembranças. O nome gravado na pedra logo evocou-lhe a
ira: Leigh Channing Trent. Trent... O ódio era maior que a tristeza da perda. Muitas
vezes imaginava-se apertando o pescoço de Jeremy até esganá-lo.
Um ano antes, ao sair do cemitério, manifestara sua inconformidade de ver o
nome Trent junto ao de Leigh, como a profanar-lhe a sepultura.
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desejo do pai que lhe dissera um dia que a melhor maneira de recordá-lo seria
dançar em um baile com a mais linda garota do Texas.
Leigh sempre teve muito orgulho do irmão. Uma vez perguntou-lhe por que
perdia tanto tempo e atenções consigo quando a metade das mulheres da cidade
vivia louca para estar em seus braços.
— É a melhor forma de mantê-las sempre à minha volta... — Brady lhe
respondera, com uma piscada.
Três anos depois, Leigh casou-se com Jeremy Trent, um homem vaidoso e
detestável, recém-chegado de Nova York. Um sujeito tão desagradável e insípido
que Brady não conseguia entender como Leigh pudera se apaixonar.
Loretta soluçava forte. Brady ofereceu-lhe o ombro, segurando-a com o braço.
As lágrimas brotaram copiosas de seus olhos e o nome da irmã cintilou sobre o
mármore. Ele mordeu o lábio.
— Maldito. Maldito Jeremy Trent.
— Não diga isso, querido. Por favor, Brady...
Ele silenciou, e as lágrimas rolaram. Limpou-as com as costas da mão, irritado
com a própria impotência. Recordou as últimas palavras da irmã: "Brady... Não sei
o que fazer. Estou a ponto de perder o juízo. Jeremy está de deixando louca. Preciso
de sua ajuda".
Já haviam conversado muitas vezes sobre ele. Brady sempre lhe aconselhara o
divórcio. Não havia razão para suportar os caprichos daquele infeliz. Por sorte, não
tinham filhos, e a separação seria menos traumática.
Mas Leigh não fizera caso de seus conselhos. Recusava-se a ouvir. Pretendia
que Jeremy fosse com ela a um psiquiatra, um conselheiro para casais, mas ele se
recusava.
— Tentei tudo, Brady, mas ele não quer.
— Pois então, caia fora enquanto é tempo.
— Mas eu gosto dele. Ele é maravilhoso para mim. Mas às vezes...
— O quê?
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CAPÍTULO UM
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— E por que nervosa, doutora? O sr. Trent é amável e gosta muito de você.
Tempos atrás não conseguia sequer atender seus pretendentes. Todos os rapazes de
Monterey queriam levá-la a festas, e você, tão ocupada com estudos e com a clínica,
os ignorava. Certamente por não achar nenhum deles especial a ponto de interessar-
se. Mas agora a coisa é outra. Não há razão nenhuma para ficar nervosa.
Jane levantou a taça e observou Manuela através do cristal.
— Cada um enfrenta seus dissabores como pode. Talvez eu não seja tão forte e
disposta como os demais.
Manuela olhou-a fixamente:
— Isso não faz sentido, doutora. Já falamos muitas vezes. O problema é que
você é a doutora, e eu, a empregada doméstica. Talvez o sr. Trent a convença. Quer
um pouco mais de vinho?
— Não obrigada. Aqui tem a taça. Pode levá-la.
— Pois saiba, senhorita, que depois desses goles de vinho suas cores são as de
uma mulher apaixonada. Um sorriso, isso apenas é o que lhe falta.
Jane sorriu com embaraço.
— Obrigada pelo carinho, Manuela — respondeu, tomando-lhe a mão.
— Está apaixonada por ele? Verdadeiramente apaixonada?
— Não sei.
— É bem verdade que o sr. Trent freqüenta esta casa há apenas dois meses...
Pouco tempo, doutora.
— Jeremy é carinhoso e compreensivo. Gosto dele, mas, quando tento analisar
meus sentimentos, percebo que estou vulnerável e insegura. Questiono todos os
meus sentimentos.
— E ele? Disse ou insinuou alguma coisa? Algo romântico?
— Até agora, não diretamente. Mas sinto que há um certo envolvimento. Acho
que tem sido cauteloso devido à minha condição.
— Ou ele é um cavalheiro.
— Sim, Manuela. Gentil e generoso como poucos.
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— Bem, vou até a cozinha preparar o jantar para o romântico casal. Disse à
minha irmã que iria visitá-la esta noite. Assim que acabar de servir e arrumar a
cozinha, devo sair. Volto amanhã para servir o café — completou com um sorriso
de cúmplice.
Jane não havia dito a Manuela por que desejava estar a sós com o convidado
naquela noite. Mas não era difícil adivinhar. Apesar de nenhum convite ou
insinuação direta, era evidente o interesse de Jeremy em uma aproximação mais
íntima. Já haviam trocado beijos e carícias, e ele demonstrava envolvimento. Jane
tinha certeza. Ele entendia suas necessidades e acompanhava seus progressos na
fisioterapia. Não a pressionava e tratava-a com carinho e compreensão.
Jane Stewart fora uma profissional ativa, nunca dispondo de tempo para si.
Agora poderia aproveitar a convalescença para avaliar e viver outros aspectos que a
vida lhe oferecia. Sabia que esses conselhos eram sábios, mas era difícil levá-los à
prática. As horas se arrastavam quando Jeremy estava ausente. Pela primeira vez
Jane volta-se para a própria felicidade. Esses momentos a faziam valorizar a
cumplicidade e o afeto e perceber a antiga aridez de sua vida pessoal.
Ele era afetuoso e jamais forçou uma aproximação íntima. Algumas vezes sua
paixão tornava-se evidente. Isso excitava a fantasia de ser desejada e possuída como
mulher. Passadas algumas semanas, Jane tomou coragem e o convidou para um
jantar a dois. Ele tomou suas mãos e respondeu comovido:
— Jane, não imagina como estou feliz com o convite. Não poderia sugerir nada
melhor.
Não estava muito certa de que ele havia percebido que pretendia criar uma
atmosfera romântica e íntima que lhe permitisse tomá-la em seus braços e talvez até
levá-la para a cama. A incerteza a deixava muito nervosa.
O velho relógio de pêndulo anunciou as seis da tarde. Jane sentiu calafrios pelo
corpo. Talvez fosse uma tolice imaginar que Jeremy a desejasse. Fazer amor com
uma inválida não deveria ser excitante para um homem. Fechou os olhos, respirou
fundo e censurou-se por tão negativos pensamentos.
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Se um ano atrás alguém lhe dissesse que um dia ficaria nesse estado só por
causa de um jantar romântico, cairia em sonora gargalhada. Sua vida era demasiado
agitada para tais preocupações. Mas o acidente mudou tudo. Ficara entre a vida e a
morte devido a imprudência do motorista embriagado que provocou o desastre.
Depois de superar os críticos momentos, a preocupação dos médicos era saber se
algum dia voltaria a andar. Depois, era imaginar se poderia retomar a carreira de
médica e levar uma vida normal.
Os médicos estavam otimistas. Com o passar das semanas as melhoras
tornavam-se evidentes. E uma coisa ficou clara: a recuperação do movimento das
pernas seria um processo longo, envolvendo tratamento fisioterápico e exercícios. A
perspectiva era alentadora, mas Jane não conseguia ver o lado positivo. Sentia-se
deprimida e triste.
Foi quando surgiu Jeremy Trent. Sensível, ele percebeu seu estado de espírito e
com palavras alentadoras e sinceras conseguiu conduzi-la a uma posição mais
otimista com relação ao processo de cura. O homem certo, no momento certo. Uma
dádiva dos céus, pensava. E Jane sentia-se envolvida. No começo resistiu à idéia de
manter relações íntimas com Jeremy, mas, depois de consultar o dr. Mark Krinski, o
médico que a atendia, soube que relações sexuais não comprometeriam o
tratamento.
— Sexo? — perguntara o doutor, tentando disfarçar a surpresa.
— Minha sensualidade não desapareceu. Posso estar inválida, mas sinto
desejo.
Mark Krinski tentou brincar, provocante:
— E você iria a um motel? Talvez devesse treinar um pouco...
— Não se preocupe, Mark. Eu encontrarei com quem, como e onde. Quero
simplesmente que me diga se há riscos para a minha saúde e para o tratamento.
O médico corou.
— Desculpe, Jane, mas você me pegou de surpresa. Não quis ser irônico ou
magoá-la. Vou lhe dizer uma coisa muito séria: envolver-se com a vida é a melhor
coisa que poderia fazer mental e emocionalmente. E sexo é vida.
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CAPÍTULO DOIS
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atitude positiva, sinto que há alguma coisa mais que o fere e magoa em toda essa
triste história.
— Você é mais intuitiva do que pensei.
— Como você mesmo disse, quando se gosta de alguém, é mais fácil perceber-
lhe os sentimentos.
— E não se sente desiludida por minha história?
— Pelo contrário. Penso em nós mais do que nunca.
— E espero que entenda meus cuidados. Não quis apressar-me. Queria estar
bem seguro antes de ir em frente e saber se você era emocionalmente forte e capaz
de enfrentar nosso relacionamento.
— E o que acha?
— Que você é muito corajosa. Tem muito a me ensinar.
— Isso não é verdade, mas agradeço por suas palavras.
Jeremy serviu-lhe mais uma taça de champanhe e, aproximando-se da
fogueira, atiçou o fogo. Jane observava o crepitar das chamas.
— Há alguma coisa que quero agora, e que antes não queria — comentou Jane,
acrescentando, sombria: — Não sei como dizer-lhe.
— O que é, Jane?
Ela suspirou, tomando coragem:
— Preciso ser tratada como uma mulher, e não como uma inválida carente de
cuidados e atenções médicas.
Jeremy franziu a testa:
— Não entendi bem o que quis dizer.
Ela mordeu o lábio, incapaz de encará-lo:
— Bem... Gostaria que fizesse amor comigo — murmurou.
O fogo na lareira estalava, soltando faíscas.
Jane levantou a cabeça, ansiosa pela reação dele. Os olhos brilhavam. Jeremy
inclinou-se e beijou-a apaixonadamente.
— Eu a amo, Jane.
Fitaram-se por um longo tempo. Jeremy acarinhou-lhe a face.
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Jane não queria dizer, mas essa não era a espécie de envolvimento que
desejava. Sempre encarara o casamento como um risco pouco recomendável. Mas
havia um ponto positivo. As intenções de Jeremy pareciam louváveis.
A brisa entrando pela janela refrescava-lhe a pele suada. Sentia-se bem ao ver
os dedos de Laureline moverem-se sobre seu corpo. Brady adorava quando ela
passava as mãos em suas costas, fitando-o com o olhar maroto.
— Não vai me dizer que ainda quer mais... — comentou ele com voz rouca.
Laureline pousou a cabeça sobre o braço musculoso e beijou-o, lasciva:
— Brady, querido, eu sempre quero mais. E, além disso, não dirigi cem milhas
esta noite apenas para namorar um pouquinho.
— Namorar um pouquinho?! E assim que você chama o que julgo ser uma de
minhas melhores atuações?
— Foi bom, querido, foi muito bom. Você é bárbaro, mas quero mais...
Brady olhou a janela aberta e brincou com seus cabelos. Laureline encaixou as
pernas entre as dele.
Ao longe avistava a Via Láctea e milhares de estrelas em volta da Lua. A névoa
ainda pairava sobre os campos de Edwards Plateau. Pedras calcárias preenchiam o
grande e inóspito vazio. Aqui e ali áridos desfiladeiros albergavam pinheiros e
carvalhos verdes a acompanhar agitados e tortuosos riachos.
Eram quase dois mil acres de terra entre ribanceiras, até os limites de Pullian
Creek. A fazenda de Brady tinha pouco valor comercial. Um vizinho criava gado
em parte das terras, e um poço de gás lhe rendia o suficiente para pagar os impostos
e o seguro da propriedade. A renda permitia algumas noites divertidas em Dallas,
Houston ou Nova Orleans. Pouco, na verdade. Não conservara a fazenda por razões
econômicas. Gostava da beleza da terra, dos cervos que desciam as encostas, dos
pássaros matutinos e dos ventos gelados do inverno e frescos do verão. A pequena
casa rústica era seu refúgio. Gostava de ler junto à lareira. Amava os livros. Tinha
mais de três mil volumes. A coleção abrangia todos os assuntos. Mas Brady tinha
preferência por biografias célebres, história da humanidade e da natureza.
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Consegui algum dinheiro e estive em Zavala County para contratar alguém que
acompanhasse os passos de Jeremy Trent.
— E para que fazer isso, Brady? Acha que vai adiantar alguma coisa? Sua irmã
infelizmente está morta.
— Se constatar que outra família corre o risco de passar o que passamos com
aquele canalha, vou agir. Tenho que conseguir processar o miserável.
— Brady, você está investindo dinheiro e empenhando a vida nessa busca. O
ódio o tem impulsionado, querido. Isso é loucura. Você se transforma em outro ser
quando se refere a Jeremy Trent e à sua irmã.
— Sinto aborrecê-la com isso, mas um homem faz o que tem de fazer.
Brady suspirou fundo e acariciou a fina penugem do vente de Laureline,
imaginando que talvez ela tivesse razão. Passava horas e horas pensando em matá-
lo, destruí-lo, uma obsessão que o desviava dos caminhos da vida.
— Uma lástima vê-lo assim. O ódio corrói-lhe as entranhas. Prefiro-o sensual e
brincalhão como sempre — instigou Laureline, fazendo-lhe cócegas.
Brady empurrou-lhe as mãos, dizendo em tom sério:
— Ora, Laureline, deixe-me em paz. Estou passando momentos difíceis.
Ela acomodou-se e afirmou:
— Quer saber? Não suporto mais os homens. Estou cansada. Exausta. São
cabeçudos e egoístas. E vou lhe dizer algo mais. Ia contar amanhã, mas é bom ir
sabendo que vou embora daqui. Decidi deixar San Antônio.
— E vai para onde?
— Não sei. Talvez Houston, Nova Orleans. Qualquer lugar. Quero começar de
novo.
Brady sentiu uma pontada no peito. Um pouco de tristeza, culpa talvez.
— Entendo o que quer, querida. Está certo.
— Você não entende é nada.
— Espero não tê-la desapontado.
— Evidente que estou decepcionada, seu tolo. Mas você não tem culpa. Nunca
me fez promessa alguma. Não como Jerry...
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— Ainda não tenho pormenores, mas ela não tem saído de casa nem para
trabalhar. Não consegui vê-la pessoalmente.
Brady esfregou o queixo.
— Continue investigando, Warren. Vá atrás de tudo que possa ser suspeito.
Talvez seja esse o momento de tomar um avião para ver as coisas de perto.
— Pois essa também é minha opinião. Jeremy Trent casou-se com a herdeira de
Connecticut três meses depois de conhecê-la. Verifico avanços com a médica. Saiba
que já lhe deu um belíssimo anel de presente.
— Como descobriu isso?
— Estive seguindo seus passos para descobrir onde morava. Na noite passada,
antes de visitar a médica, passou numa joalheria. E parece que dormiu em sua casa.
— Então nosso homem começou a agir. Safado! Sedutor!
— Nada tenho a dizer com relação a eventuais intimidades.
— Tudo bem, Warren.
— Alem disso, sr. Coleman, ele passou a tarde em San Francisco com uma
garota de programa.
— Talvez não tenha feito nada com a médica.
— Pode ser que goste de variar. Quem vai saber?
— Com relação à variedade, nada contra. Não posso criticá-lo por gostar de
garotas de programa — comentou Brady com um suspiro.
— Mas não esqueça, sr. Coleman: tudo indica que Jeremy Trent tem o hábito
de transformar esposas em defuntos.
— Hei de pegar esse desgraçado, Warren. Ele não perde por esperar. Gostaria
de fazê-lo em pedaços.
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CAPÍTULO TRÊS
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ainda o desejo. Jane percebeu que aquele amor se transformava num elixir mágico,
numa promessa de vida. No entanto, a idéia de casamento não a seduzia.
Jeremy fora capaz de entendê-la desde o começo. Um homem inteligente, bom,
preparado. Descobriu seus pontos vulneráveis e chegou ao âmago de seus desejos.
Jogava com a curiosidade feminina e se apresentava envolto em uma nuvem de
mistério. Jane gostava disso. Não era tola para cair em pequenas armadilhas de
sedutores, mas o fato é que gostava daquele jeito dele.
A história parecia perfeita, menos suas dúvidas com relação às verdadeiras
razões que motivavam o envolvimento de Jeremy Trent. Ele evitava expor seus
sonhos e desejos. Jane não sabia ainda o que fazia para viver, e ele mantinha-se
reticente com relação ao assunto. Parecia que seus interesses eram mais sociais do
que financeiros. Quando expressou desejo de contribuir com o atendimento
hospitalar de pessoas carentes ela o pôs em contato com Marian Montross, a
responsável pelos planos assistenciais da entidade. Algum tempo depois, Marian
disse que Jeremy passara a ser um elemento ativo da comunidade. Ele nunca
comentou o fato, dando-lhe a impressão de enigmática modéstia.
Peter nada lhe adiantara sobre a vida de Jeremy, mas tudo indicava tratar-se
de um homem preocupado com a vida em sociedade. E Jane Stewart era pessoa
expressiva em seu meio social. Seu nome abria portas e salões. Sua avó, Elsa
Stewart, fora uma grande dama da sociedade de Monterey nos anos vinte e trinta.
Tinha vínculos sociais e econômicos na região e freqüentava jantares e reuniões de
industriais e artistas de Hollywood. Os pais de Jane tiveram uma vida socialmente
mais recatada, centrada especialmente em Pebble Beach e no clube de campo da
cidade. Também destacavam-se nas atividades assistenciais. Assim, o nome Stewart
tinha certo encanto. Jane imaginava se esse fato representaria algum atrativo para
Jeremy.
Desde que recebera o anel, não deixou de imaginar como seria estar casada
com ele. Um marido amável e atraente seria um ponto altamente positivo para sua
carreira de médica. Por outro lado, seus dotes pessoais e familiares também
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poderiam representar muito para o futuro profissional de Jeremy Trent. Talvez ele
fosse o homem adequado para aquele momento de sua vida.
Quem sabe?
O sol continuava a lutar contra a neblina. A manhã, preguiçosa, levantava-se.
Manuela cantarolava na cozinha. Depois de arrumar a cozinha a velha empregada
tinha planos de ir para a casa da irmã em Gilroy. Antes, nessas ocasiões, Jane
providenciava uma enfermeira para estar a seu lado. Mas agora sentia-se forte, e
esses cuidados não eram mais necessários.
Jeremy não poderia vê-la nesses dias. Disse que teria que viajar para encontrar-
se com seu advogado. Ficaria uns três dias fora da cidade.
Jane sentiu-se um tanto aliviada com a notícia. Queria dispor de tempo para
pensar em sua proposta. Não se sentia pressionada, mas, como mulher madura que
era, preferia tomar decisões cautelosas, o mais possível independentes de emoções.
— Quero estar com você em igualdade de condições — advertira-lhe Jane sem
saber ao certo se algum dia se libertaria da cadeira de rodas.
— E então, doutora? Necessita de alguma coisa mais? — perguntou-lhe
Manuela.
— Não, tudo bem. Pode ir. Lembranças à sua irmã.
— E o telefone sem fio? Está a seu lado?
— Não. Acho que ficou no quarto.
— Um momento. Vou buscá-lo.
Ao voltar, Manuela despediu-se. Jane percebeu quando a empregada e amiga
saía pela porta dos fundos. A casa ficou em silêncio. Os últimos acordes da quinta
sinfonia perderam-se no ar. Dirigiu a cadeira de rodas até o grande móvel da sala,
pensando se iria escolher outro disco ou desfrutar do silêncio. Ao olhar a janela, viu
que não havia mais neblina. No entanto, o sol estava encoberto por negras nuvens
trazidas do Pacífico. Mais um daqueles imprevisíveis dias de San Francisco.
Observou o mar furioso contra as rochas ao longe. Sentiu-se cansada. Sua vida
introspectiva e solitária começava a mudar.
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— Alô?
— Brady Coleman, doutora. Desculpe se a incomodo.
Espantada, ela perguntou:
— O mesmo sr. Coleman que há pouco tocou em minha porta?
— Ele mesmo, dra. Stewart.
— Mas como?
— Telefone celular, doutora. Uma das maravilhas da tecnologia moderna.
Espero que me ouça melhor do que pelo interfone.
— Mas, sr. Coleman, afinal, o que deseja? Não tenho tempo para brincadeiras.
E saiba que não pretendo comprar nada, caso seja um vendedor.
— Nada disso. Na verdade, vim de San Antônio para falar-lhe.
— E sobre que assunto?
— Não quero assustá-la, mas devo adverti-la de que se trata de uma questão
de vida ou morte.
Jane olhou a porta e o telefone tentando perceber com que tipo de louco estava
lidando.
— Trata-se de uma brincadeira de mau gosto? Quem é o senhor?
—Sou o cunhado de Jeremy Trent — Brady respondeu, acrescentando. — Ou
era, até o momento em que minha irmã foi assassinada e ele fugiu para Connecticut.
E é sobre ele que quero conversar com a senhora, dra. Stewart.
O coração de Jane disparou enquanto conduzia apressadamente a cadeira de
rodas para a porta. Ao abri-la, deparou-se com Brady Coleman postado no portal
com o telefone celular no ouvido. Ele fitou-a longamente, guardando o aparelho no
bolso do fino paletó de lã inglesa. A calça de brim azul mal escondiam o cano das
botas texanas. Saudou-a com um gesto típico de vaqueiro.
— Bom dia, dra. Stewart. Sinto-me aliviado por perceber que o assunto lhe
interessa.
— Pois bem. Diga logo. O que houve entre sua irmã e Jeremy Trent?
— Não me diga que ele omitiu o fato de ser viúvo e de sua mulher ter sido
morta em sua cama em circunstâncias misteriosas.
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CAPÍTULO QUATRO
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Brady desabotoou o paletó, expondo a camisa xadrez e o largo cinto com fivela
de prata. Era agressivo e atraente. Cabelos ondulados, incríveis olhos azuis e traços
viris e angulosos. Um verdadeiro vaqueiro do velho Oeste.
— Bem, Brady, o que tem a dizer tomaria muito tempo?
— Tentarei ser breve e não tomar-lhe mais que quinze ou vinte minutos.
Jane ignorou a brincadeira e olhou o relógio, indicando que seu tempo era
limitado.
— Pois bem. Por que não tira o paletó e fica mais à vontade? Conversaremos
na sala.
Brady seguiu-a.
— Posso ajudá-la?
— Agradeço, mas tento ser auto-suficiente.
Ele não lhe deu ouvidos e a ajudou com a cadeira de rodas.
— Sinto, mas não é de minha natureza deixar que uma dama passe
dificuldades.
— Vejo que realmente estou diante de um cavalheiro.
— Talvez seja uma forma de reafirmar minha masculinidade.
Ele parou a cadeira de rodas e posicionou-se onde Jane pudesse vê-lo.
— Que linda vista. Esse campo deve ter recebido muitos campeões. Você
jogava golfe, Jane?
— Sempre gostei do esporte. Mas algumas partidas de fins de semana não
formam um golfista. Isso é o que dizem.
— Eu também gosto, mas não costumo jogar — comentou Brady, firmando o
olhar entre a grama e as árvores do campo. Os ombros largos e a cintura fina
delineavam um perfil rude e atraente. — Sabe, eu moro nas montanhas, em Hill
County, de modo que prefiro caçar veados ou coelhos a golpear bolinhas brancas
em campos bem comportados. Você não gosta de caçar? Não me diga que é dessas
que pretendem salvar crocodilos, macacos e baleias.
— Na verdade, não, mas não suporto matar animais ou agredir a natureza.
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— Desculpe, Jane. Acho que passei dos limites. Sempre que penso em minha
irmã, saio de mim ao imaginar que o mesmo pode acontecer com outra pessoa. Não
deveria ter sido tão deselegante.
— Quanto a isso, Brady, evidentemente, estamos de acordo.
— Talvez devesse começar tudo outra vez. Tentarei ser menos agressivo.
— Na verdade, gostaria que abreviasse o mais possível a nossa entrevista.
Ele moveu a cabeça, assentindo. Fitou-a longamente.
— Que tanto me olha, sr. Coleman? — perguntou Jane, incomodada.
— Por nada. Apenas percebi que estou diante de uma bela mulher. Minha
irmã Leigh também era linda. Jeremy Trent sempre teve bom gosto.
Jane, entre lisonjeada e ofendida, surpreendeu-se com o comentário. Não
encontrou resposta.
Depois de breve silêncio, Brady retomou o assunto:
— Mas, como lhe havia perguntado, você tem chances de se libertar da cadeira
de rodas?
— Meu médico é otimista. Tenho registrado avanços. Só o tempo dirá.
— E conheceu Jeremy depois de ficar inválida?
— Sim. Algo de mal nisso?
— Céus! Essa circunstância se ajusta perfeitamente ao seu modo de agir.
— Afinal, de que está falando?
— Ele tem um faro especial para mulheres vulneráveis. Leigh apaixonou-se à
primeira vista. Jeremy tinha elementos para atingir seu ponto fraco. A segunda
mulher era reconhecidamente neurótica.
Jane revoltou-se com o comentário.
— Pois saiba, sr. Coleman, que ele é delicado e compreensivo.
— Por favor, prefiro que continue chamando-me por Brady.
— Pois bem. Já lhe passou pela cabeça que quem tem problemas é você
mesmo? Vê o mal e o demônio em todas as partes.
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— E verdade, sra. Stewart. Tenho rancor e nojo de Jeremy Trent. Nunca gostei
dele, mas depois da morte de minha irmã passei a odiá-lo. Admito. Isso tem sido
um problema para mim.
— E jamais imaginou que poderia estar fazendo um julgamento errado sobre
ele?
— Tenho certeza do que sinto e do que estou lhe dizendo, Jane. Acredite.
Ela suspirou, impressionada com as certezas inflexíveis de Brady. Talvez
estivesse diante de um psicótico.
— Mas, então, vamos aos fatos. Estou disposta a ouvi-lo.
— Minha pasta está no carro. Um momento, e irei buscá-la. Tenho relatórios de
três anos sobre a vida de Jeremy Trent. Quero ser preciso.
Jane o observou dirigindo-se à porta. Parecia convencido de suas verdades. Por
que não ouvi-lo? Por um momento o anel de brilhante passou-lhe uma terrível
sensação de perigo e incerteza. Jeremy, poucas noites atrás, havia dormido em sua
cama. Agora aquele homem, ali à sua frente, exalando ódio e agressividade,
afirmava que ela compartilhara o leito com um dissimulado e perigoso assassino.
Brady regressou a passos largos, com a pasta de couro nas mãos.
— O lugar é realmente lindo, Jane. Pertence à sua família?
— Meu avô teve algumas terras na península, mas a maior parte foi vendida
anos atrás. A família ainda conserva algumas propriedades, mas a casa e os
arredores são meus.
— Não sei se me acostumaria a viver tão perto do mar. Sentiria falta de minhas
montanhas do Texas — comentou Brady ao sentar-se e abrir uma das pastas.
— E você cria gado? Parece um caubói dos velhos tempos. Posso até imaginá-
lo tocando boiadas por vales e desfiladeiros. Ou talvez até em um rodeio...
— Na verdade gosto da lida com animais, mas não tenho criação. Minha
atividade econômica é outra.
— E o que você faz?
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Ela não confirmou. Pediu que eu o convencesse a procurar um psiquiatra. Disse que
o marido necessitava desse tipo de ajuda.
— Bem, até agora, nada tão sério. Casais costumam ter problemas.
— Continuemos com os fatos. Minha irmã foi assassinada na própria cama.
Estrangulada perto das dez horas da noite. Ficaram sinais de violenta luta. Técnicos
da polícia encontraram pedaços da pele de Jeremy nas unhas de Leigh.
Constataram-se arranhões nas costas do marido. Há fotos que mostram isso.
Impressionada, Jane perguntou:
— Isso é verdade?
— Veja, leia você mesma.
— E por que não formalizaram a denúncia e o prenderam por assassinato?
— Porque o desgraçado preparou um álibi. Uma história de tal forma
convincente que o promotor público decidiu não indiciá-lo como suspeito. Seu
envolvimento no crime ficou apenas como uma dúvida razoável.
— E o que Jeremy declarou?
— Disse que naquela noite fizeram sexo intenso e dormiram cedo. Foram
despertados por um assaltante que invadiu o quarto. Lutou com ele alguns
instantes. Recebeu um golpe e desmaiou. Quando voltou a si, viu o bandido
tentando estrangular Leigh. Pegou a pistola da gaveta e matou-o com dois tiros.
Verificou que era tarde demais. Leigh estava morta. Chamou imediatamente a
polícia. Essa é a história que Jeremy contou.
Espantada com o relato, Jane perguntou:
— E por que essa versão poderia ser mentirosa?
— Nesse caso, o assassino seria Spike Adamson, um delinqüente comum. Teria
matado Leigh enquanto Jeremy estava inconsciente.
— E daí? A história parece coerente.
— A polícia confirmou que o meliante entrou pela janela. Suas pegadas foram
detectadas em seu percurso no quarto até a cama. E morreu com dois tiros de
pistola. Não foram encontrados traços de sua pele ou de carne nas unhas de minha
irmã; mas ela trazia nas unhas vestígios de tecidos de Jeremy.
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— Mas, Brady, ele contou que fizeram sexo intenso. Isso é normal, não é?
— Sabe, Jane, com todo o respeito, não perguntaria como se porta na cama.
Mas eu conhecia muito bem minha irmã. Não aceito essa história de sexo intenso. A
menos que isso signifique estupro.
Jane sacudiu a cabeça.
— Aí parece que há um engano. Jeremy é uma pessoa amável e afetuosa.
Estupro não se encaixa ao seu perfil. Nada vejo de patológico em seu ex-cunhado.
— Quem falou em sexo intenso foi o próprio Jeremy. Pode ler nos autos.
Jane tremeu, intuindo que algo andava errado. Para aceitar as considerações de
Brady teria que concluir que Jeremy era esquizofrênico.
— Há outro fator que o incrimina — continuou Brady. — A perícia indicou que
a morte de Leigh ocorreu bem depois de Spike Adamson ter sido atingido pelos
tiros. Ela morreu quase meia hora depois do assaltante.
— E o que disse o promotor sobre isso?
— Alegou que esse era o único indício que poderia fazê-lo duvidar da versão
apresentada por Jeremy. Acrescentou que intrusos misteriosos sempre foram
explicações habituais de réus no caso de morte entre casais. Nesse caso, disse o
promotor, o corpo do assassino transformou-se em forte evidência em apoio à
história de Jeremy.
Jane sentiu um certo alívio.
— Parece que a história dele é bem razoável. Ele matou o assassino de sua
irmã. Seu problema, Brady, é que insiste na culpabilidade de seu cunhado. Isso é
doentio.
— E como você explica o relatório da perícia sobre os horários das mortes?
— Se os promotores não pautaram a decisão a partir do relatório da perícia,
certamente é porque o consideraram pouco consistente. Há uma boa margem de
erro nessas avaliações. Lembre-se, Brady... meia hora.
— Vou lhe dizer uma coisa. O problema é que as autoridades sempre tiveram
muitas dúvidas. A promotoria necessitava de uma evidência mais forte do que o
relatório da perícia.
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— Mas Jeremy abateu o assassino com dois tiros. E ele ficou morto no chão.
— Minha irmã lutou por sua vida contra um homem que pretendia estrangulá-
la. Não lhe soa estranho que não lhe tivesse deixado uma marca sequer? Nenhum
vestígio da pele do assassino em suas unhas. Você acredita nisso?
— Olhe, pelo que relatou, Jeremy não foi responsabilizado pela morte de sua
irmã. Ficou livre de qualquer acusação.
— E você se casaria com esse sujeito, mesmo sabendo tudo o que ouviu?
— Você está obcecado, Brady. Quer de todas as formas acreditar que Jeremy é
um assassino. Basta. O assunto está encerrado.
Ele fitou-a com rancor. Respirava forte, mal contendo a ira.
— Tenho certeza de que o desgraçado matou minha irmã. Acho que contratou
Adamson para aparecer na casa sob um pretexto qualquer: fraude de seguro,
perversão sexual, sei lá o que.
— Acalme-se. São apenas suposições.
— Sei perfeitamente disso. Se eu pudesse comprovar o que sei que aconteceu,
ele já estaria morto.
Jane empalideceu.
— Tenho consciência de que não lhe apresento um quadro muito agradável —
Brady continuou, num tom mais ameno. — Que mulher gostaria de ouvir que as
duas esposas de seu noivo tiveram fins trágicos? Estrangulamento... overdose de
álcool e drogas...
Jane respirou fundo para acalmar-se.
— Respeito seus sentimentos com relação à sua irmã, Brady. Mas percebe que
pretende que eu o julgue culpado quando as próprias autoridades judiciárias não o
responsabilizaram pelo crime? Não faz sentido.
— E o que faz sentido?
— Qual seria o motivo que teria levado Jeremy a assassinar sua irmã? Diga-me.
Loucura simplesmente?
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— Nada disso. Talvez lhe faltem alguns parafusos, mas esse Jeremy Trent tem
uma ambição sem limites. Minha irmã era uma mulher rica. Herdou uma bela
fortuna do pai, e o desgraçado caiu fora com boa parte do dinheiro.
— Jeremy é de boa família. Sempre teve dinheiro. Freqüentou boas escolas.
Deve ter ficado com o que lhe tocava legalmente — Jane o contrariou.
— E o que a faz supor que tudo isso seja verdade? Foi ele quem lhe contou?
— Jeremy é discreto, mas seus modos indicam que tem berço.
— Um ator de categoria, apenas isso.
— Suponho que agora você vai dizer-me que ele é um impostor, uma fraude
total, alguém sem família, sem dinheiro, sem cultura, sem traquejo social. É isso?
— Sabe, acho que há uma diferença fundamental entre ser o que se é e
pretender ser o que não é. Devo assegurar-lhe que boa parte de seus bens foram
obtidos através de casamentos convenientes.
— E seu ódio que fala por você, Brady. Devo admitir que talvez eu tenha
superestimado as possibilidades econômicas de Jeremy. Mas isso não tem muita
importância.
— Não consigo entender como deixou-se envolver pela conversa desse sujeito.
Jane olhou para o relógio.
— Bem, parece que nosso tempo se esgotou. E o assunto também.
— Um texano percebe quando é hora de dizer adeus.
Ela concluíra que Brady era boa pessoa e que estava muito perturbado com a
perda da irmã. Olhou-o com certa simpatia, apesar de tê-la aborrecido bastante. A
irritação e a energia negativa dissiparam-se.
Ele levantou-se e se dirigiu à porta, acrescentando:
— Suponho que não entrará em pormenores de nossa conversa quando estiver
com Jeremy. De todo modo, faça-lhe algumas perguntas. Ele conhece perfeitamente
minha opinião. Eu realmente temo que você tenha o mesmo destino de suas outras
mulheres. Espero que não.
— Não se preocupe. Entendi a boa intenção de sua visita, mas me reservo o
direito de tirar minhas próprias conclusões.
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CAPÍTULO CINCO
— Sinto muito, mas o sr. Dalton não pode atendê-la no momento. Está no
tribunal. Só deve voltar amanhã — respondeu a funcionária, acrescentando: —
Quer deixar algum recado?
— Talvez ele possa retornar a chamada. Estou falando da Califórnia — Jane
pediu, frustrada, passando-lhe o número de seu telefone. — O sr. Dalton poderia
fazer a chamada a cobrar. Eu aguardo.
Acalentava a esperança de que a conversa com o procurador a ajudasse a
avaliar melhor seu relacionamento com Jeremy Trent. A visita de Brady Coleman
despertara ansiedade e incertezas. O principal agora era saber se as afirmações do
visitante tinham base na realidade. Tudo indicava que as palavras de Brady faziam
sentido e que ele não se tratava de um personagem psicótico. Apenas um homem
determinado. Nada tinha de louco. O desejo de vingança lhe entorpecia o
julgamento, mas parecia bem intencionado e sincero. As acusações careciam de
provas concretas, mas havia indícios preocupantes. A opinião do promotor Danton
era, sem dúvida, fundamental. Teria que esperar até o dia seguinte para falar-lhe.
Jeremy telefonaria pela tarde, e Jane estava ansiosa para conversar sobre a
visita de seu ex-cunhado. Talvez o próprio acusado pudesse esclarecer suas
dúvidas. As histórias e acusações de Brady eram terríveis.
Imersa em pensamentos, Jane dirigiu a cadeira de rodas até o aparelho de som.
Selecionou uma música suave e dispôs-se a continuar a leitura do romance policial
cuja trama a envolvera nos últimos dias. Mas não conseguiu fixar a atenção nos
personagens ou na história. Os pensamentos voltavam-se ao drama da irmã de
Brady. Tomada pela fantasia e angústia, Jane imaginava cenas da intimidade do
casamento de Jeremy. Sexo intenso, como diziam, não era crime se houvesse
anuência dos parceiros. No entanto a idéia a assustava. Considerava-se uma pessoa
sexualmente normal e tais extravagâncias não a seduziam. Teria Jeremy um lado
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obscuro e lascivo não detectado por ela? Ou seria um perigoso farsante, como
indicavam as palavras de Brady Coleman?
Jane desejou que Manuela estivesse a seu lado. Como em várias ocasiões,
desabafaria nos ombros dela, que sempre fora muito mais que uma empregada,
tendo se tornado amiga da família. As acusações de Brady tornaram-na insegura
quanto a seus sentimentos e suas esperanças. Teria ele razão?
O telefone soou. Atendeu-o, sobressaltada. Era Juddy, a fisioterapeuta, que
pretendia transferir a sessão do dia seguinte para aquela mesma tarde. Aliviada,
Jane concordou. A presença de Juddy seria bem-vinda e a ajudaria a tirar do
pensamento as desagradáveis sensações alentadas por suas suspeitas. Voltou à
leitura.
Perto do meio-dia colocou no microondas a refeição feita por Manuela.
Enquanto preparava-se para almoçar, percebeu que tanto a imagem de Brady
Coleman quanto suas palavras contra Jeremy Trent não lhe haviam deixado em paz
um só minuto.
Foi com certo alívio que ouviu a campainha.
Juddy saudou-a com um sorriso:
— Grandes progressos, Jane. Fico contente ao vê-la capaz de permanecer em
casa sozinha — saudou a fisioterapeuta, tirando o agasalho esportivo e
pendurando-o no cabide da ante-sala.
— Wayne me contou que você vai indo muito bem. Ele deve voltar na próxima
semana.
— Espero que esteja aproveitando as férias — comentou Jane.
— Os aparelhos ainda estão em seu quarto? — indagou Juddy, conduzindo a
cadeira de rodas. — Os registros indicam melhoras, Jane. O relatório de Wayne diz
que o próximo passo é fortalecer os músculos das pernas. A flexibilidade tem se
demonstrado satisfatória.
— É verdade. Quase não tenho sentido dores.
— Parece que poderemos aumentar a carga de exercícios para as pernas.
— Wayne já começou a fazê-lo.
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— Arrependimento?
Ele riu.
— Pelo contrário. Eu a amo, mas não falei de meus sinceros e profundos
sentimentos ao oferecer-lhe o anel. Espero apenas que tenha compreendido o gesto
e minhas intenções.
Jane respirou fundo antes de responder:
— Bem, Jeremy, devo adiantar que pensei bastante em sua proposta.
— E posso alimentar esperanças?
— A verdade é que pouco falamos sobre planos futuros. Talvez seja o
momento de avaliar nossas possibilidades.
— Estou de acordo.
— Sabe, Jeremy, somos pessoas de posição e economicamente independentes.
Que acha de fazermos um acordo pré-nupcial, de tal forma a garantir uma clara
separação de bens?
Houve um estranho silêncio. Ela teve o pressentimento de que o pior
prognóstico se confirmava.
— Bem, Jane... se essa é sua posição, não vejo razão para não falarmos sobre
esse acordo.
— Meu pai ficaria feliz ao saber que, apesar de não ter tido netos, minha parte
da herança foi destinada às obras assistenciais.
Outro longo silêncio. Ela retomou o assunto:
— Estou certa de que você também tem planos com relação à pessoa a quem
deixar seus bens, Jeremy.
— Sabe, nunca pensei nesse assunto. Em meus dois casamentos anteriores a
questão nem sequer foi levantada.
— Quer dizer que não houve acordos pré-nupciais?
— Não. Como disse, não pensamos no assunto. Romantismo de minha parte,
suponho.
— Ora, tenho a impressão de que romances podem florescer mais facilmente
sem a intermediação de bens ou dinheiro.
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— Ela foi morta por um assaltante. Uma história terrível. Não gosto de falar
sobre isso.
— Sinto muito, não queria revolver tristes recordações.
— Você é carinhosa e atenciosa, Jane. Gostaria de tê-la em meus braços neste
momento.
— Eu também — Jane respondeu com pouca convicção.
— Dentro de alguns dias estarei de volta.
— Estarei esperando.
Jane despediu-se e desligou o telefone sem saber em que pensar. Jeremy
reagira muito mal ao tema do acordo pré-nupcial. Logo depois, mostrou-se mais
maleável. Estaria fingindo?
Brady portara-se como um alguém sem muitos recursos e, no entanto, era
herdeiro de grande fortuna. Talvez o ressentimento entre ambos se devesse ao fato
de Leigh ter deixado algum dinheiro a Jeremy, e Brady ter ficado com o
arrendamento do rancho. Melissa tinha razão. Estava no meio de uma briga entre
inimigos poderosos.
Manuela interrompeu seus pensamentos:
— Gostaria que acendesse a lareira, senhorita? E que tal um bom café?
— Ótima idéia, Manuela.
— E o sr. Trent? Como vai ele? Boas notícias?
— Jeremy vai bem. Eu é que ando um pouco confusa.
— Afinal, o que houve?
— Bem que estou precisando desse café e do calor da lareira.
— Se é só isso, estará feliz num minuto... — comentou Manuela
encaminhando-se para a cozinha.
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CAPÍTULO SEIS
A brisa marítima fazia seus cabelos esvoaçarem. Sentada à beira do barco, Jane
sentia o sol através do fino tecido do biquíni rosado. Jeremy a envolveu e sussurrou
em seu ouvido:
— Jane, eu a amo. — E a empurrou bruscamente para o mar azul.
Ao sentir o cálido contato das ondas, não teve medo. Fechou os olhos e tentou
relaxar. Foi surpreendida pelo forte abraço de Brady, que emergia das profundezas.
— Ei, Jane. Parece que precisa de ajuda...
Ele apertou-a contra si, e ela percebeu que estavam nus. Jeremy e o barco
sumiram no horizonte.
Jane sabia que Brady sempre estivera à espreita. Sentia-se segura. A água
brincava entre os seios expostos. O ar era frio, mas agradável. Quando pernas
tocaram-lhe a cintura, Jane sentiu-o insinuar-se entre suas coxas, num clima erótico
e sedutor. Afastou-se um pouco e passou a massageá-la ritmicamente entre as
pernas, mantendo-a enlaçada em seu braço. Os olhos eram de azul profundo, e
gotas de água salgada reluziam-lhe sobre o rosto. Beijou-a apaixonadamente. Jane
gemeu de prazer. Delicadamente, Brady penetrou-a em movimentos ritmados, Jane
sentiu que queria mais. Ele compreendeu seu desejo e passou a movimentar-se cada
vez mais depressa até se confundirem numa descarga de cores e sensações
indescritíveis. Jane acordou sobressaltada, o coração batendo descompassado,
impressionada com a intensidade das sensações que em sonho a arrebataram.
Aos poucos, retornou à penumbra do quarto, intrigada pelo fato de ter
sonhado com Brady Coleman, o desconhecido que, ao surgir diante de sua porta,
trouxera-lhe apenas angústia e preocupações.
Não era comum ter sonhos eróticos. Refletiu algum tempo. Como era possível
Brady Coleman lhe surgir em sonhos e fantasias sexuais? Um homem bonito e
atraente, nada mais que isso.
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Suspirou fundo e fez soar a campainha para que Manuela lhe trouxesse o café
da manhã. Não demorou muito e a senhora idosa irrompeu no quarto com suco de
laranja, presunto, pão fresco, manteiga e geléia.
— Bom dia! Quer levantar-se agora? Veja que linda manhã! — exclamou
Manuela alegremente, abrindo as janelas.
O aroma de café espalhou-se por todo o aposento.
— Quer que a sirva agora ou prefere tomar banho primeiro? — indagou a
empregada, abrindo as torneiras do banheiro e escolhendo entre os vários frascos
de sais de banho cuidadosamente organizados na prateleira.
— Sim, Manuela, vamos ao banho primeiro... Essa era uma situação que
sempre a incomodava.
Sentia-se frágil e dependente. Naquela manhã, Jane sentiu-se mais
constrangida.
Por quanto tempo necessitaria de ajuda para as mais simples tarefas do
cotidiano? Que situação amarga, pensava. Por que o destino a lançara em tão triste
situação?
Tudo por causa de um adolescente estúpido que, bêbado, tomou a direção de
uma caminhonete e saíra pelas ruas como um louco. Jamais esqueceria daqueles
faróis terríveis voando em sua direção naquela curva da estrada. Voltava de um
jantar com um dos diretores do hospital em Coast Highway. Dirigia pela via
tortuosa entre precipícios e penhascos. Não houve como escapar do impacto. O
rapaz morreu na hora. Uma destruição total. Meses de vida perdidos.
Não fora aquele terrível acidente, Jeremy não haveria se impressionado com
sua frustração e vulnerabilidade. E Brady não a teria sensibilizado a ponto de
evocar-lhe eróticas fantasias. Estaria ocupada com as crianças do hospital e levando
uma vida comum.
Imersa na tépida banheira, Jane ensaboava os braços e o peito, tentando decidir
o que fazer com Jeremy Trent. Não estava mais segura sobre os próprios
sentimentos. O encanto e a magia despertados por ele esvaíam-se como espuma.
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— Está bem. Já que não podemos falar sobre ele, poderíamos falar sobre Brady
Coleman? Ele nem sequer foi indiciado... Ou foi?
— Não.. Brady não foi indiciado.
— E o conhece, não?
— Sim. Há quase vinte anos. Jogamos bola juntos nos tempos da universidade.
— E então, diga-me: é um homem confiável?
Bob Dalton hesitou.
— A senhorita sabe que a falecida sra. Trent era irmã de Brady, não é?
— Sim, claro.
— Então pode imaginar como têm sido as relações entra ambos, ele e Jeremy.
— Sei que há desconfiança, inimizade e ódio entre. Mas diga-me uma coisa:
Brady Coleman é um louco a ponto de não raciocinar quando se refere à morte de
sua irmã?
O promotor manteve-se em silêncio. Jane aguardou.
— Olhe, senhorita, Brady é um espírito rebelde e independente. Algumas
vezes é tomado por impulsos... mas eu não diria que é louco.
— Devo entender então que suas acusações têm alguma base?
— Eu não disse isso. Apenas comentei sobre o caráter de Brady. Na verdade,
eu o admiro. No Texas, o homem que persegue o assassino da irmã é visto com
bons olhos. Cumpre seu papel.
— Mas pode estar mal informado, pode basear-se em premissas erradas.
— Esse é um assunto a ser avaliado.
— Sr. Dalton, o senhor não está facilitando as coisas...
— Não cabe a mim opinar sobre a culpabilidade ou inocência de pessoas. Isso
só o faço no exercício de minhas obrigações profissionais. Lamento não poder
ajudá-la. Sugiro que discuta esse assunto com Jeremy Trent.
— Eu pretendo fazê-lo.
— Algo mais?
— Não, sr. Dalton. Já tomei bastante seu tempo. Agradeço-lhe a atenção.
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Jane despediu-se e desligou. Nada havia descoberto, a não ser o fato de Brady
não ser um homem ensandecido pelo sofrimento. Percebeu que o promotor
demonstrou respeito por ele. Certamente sentia-se responsável pela tragédia da
irmã, e o ódio que destilava contra Jeremy era uma forma de redimir-se. Jane sentia-
se frustrada. O promotor omitira qualquer palpite sobre suas conjecturas.
Manuela serviu-lhe o café e trouxe um alegre xale bordado para que passeasse
pelos jardins. Passou longos momentos podando galhos e colhendo flores. Admirou
a linda coleção de plantas exóticas japonesas deixadas por seu pai dispostas em um
canto especial do jardim. A brisa e o canto dos pássaros mergulharam-na num
mundo de sonhos. O telefone sem fio a fez voltar à realidade. Quem seria agora?
— Bom dia. Aqui é Brady. Tudo bem?
Jane ficou feliz ao ouvi-lo.
— Alô, Brady. Não esperava sua chamada.
— Espero que tenha dormido bem.
Jane sobressaltou-se imaginando que ele já soubesse de seu sonho erótico.
Respondeu envergonhada:
— Sim, Brady. Eu dormi muito bem.
— Estava preocupado. Temi ter-lhe estragado o dia de ontem.
— Pois saiba que sobrevivi.
— Fico contente — ele respondeu, acrescentando: — Gostaria que fosse vê-la
hoje?
— Muita amabilidade sua, Brady. Mas não vejo por que ver-nos. Ouvi sua
opinião sobre Jeremy. Mesmo que não a aceite, estou grata. Você conseguiu abrir-
me os olhos para certas possibilidades.
— Isso quer dizer que vai investigar a vida dele?
— É isso mesmo. Tenho que fazê-lo.
— Bem, sinto-me melhor. Sei que chegará ao centro da questão.
— Consideremos então que cumpriu seu dever e pode voltar para casa. Viaja
hoje para o Texas?
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— Mas, Jane, temos que nos despedir. Sei que não quer falar mais sobre esse
triste assunto, mas isso não impede que eu vá até aí para apresentar meus
cumprimentos.
— É gentil de sua parte, Brady, mas não vejo por que se incomodar de vir até
minha casa.
— Ora, não me custará nada passar por aí.
Jane riu.
— Fala sério?
— Claro. Sei que não fica bem aparecer sem ser convidado, mas a verdade é
que já estou a caminho.
— Estou aprendendo a conhecê-lo, sr. Coleman — respondeu Jane, assentindo.
— Ótimo.
— Estou no jardim, ocupando-me de flores e plantas. Manuela o fará entrar.
Desligou o telefone e instruiu a governanta, imaginando se Brady apareceria
com uma nova surpresa ou se se tratava apenas de uma visita social. Observou-se
no pequeno espelho e retocou a maquiagem. Desejou estar usando outras roupas e
sonhou poder esperá-lo de pé, à entrada do jardim.
Passados alguns minutos viu-o pela janela da cozinha. Brady conversava
animadamente com Manuela. Logo se aproximaram. Ele falava em espanhol com a
governanta sorridente.
— Aqui está o sr. Coleman, senhorita. Já lhe servi uma xícara de café. Deseja
alguma coisa? Um suco, talvez?
— Não, obrigada, Manuela.
— Então, com licença — despediu-se, sorrindo amável para Brady.
— Você parece saber lidar muito bem com senhoras — Jane comentou ao sentir
as mãos retidas entre as dele, em carinhosa saudação.
— Manuela surpreendeu-se porque disse-lhe algumas palavras em espanhol.
Conversamos um pouco. Conheço bem a região onde nasceu.
— Quer dizer que fala bem sua língua? — indagou, retirando as mãos.
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prematuro pensar nessa herança. Além disso, Leigh era muito mais jovem e sempre
esperei que vivesse bem mais do que eu. Por outro lado, nada impede que minha
mãe faça um testamento... — tentou argumentar Brady, disparando: — Escute, Jane,
você está sugerindo que fui beneficiado com a morte de minha irmã?
— Não disse nada disso. Acho apenas que é essa a questão existente entre você
e Jeremy. Eu nada tenho a ver com seus problemas.
— Acho que está fazendo um julgamento precipitado e sendo superficial.
— Então por que veio até aqui?
— Você não conhece Jeremy Trent...
— E pensa mesmo que se me casasse com ele, correria riscos?
Brady fitou-a em silêncio.
— Acha mesmo que ele me faria algum mal? — ela insistiu.
— Você falou com Bob Dalton?
— Sim. Disse-me polidamente que não poderia conversar sobre o assunto.
— Ele lhe disse isso?! — esbravejou, colocando a xícara sobre a mesa.
— Foi o que disse. Ao que me pareceu, não aprovou sua sugestão de consultá-
lo.
— Covarde! Ele sabe muito bem que não o incomodaria por algo sem
importância.
— A questão não é essa, Brady. Trata-se apenas de um problema ético.
— Malditos advogados e promotores! Falta-lhes cabeça, sentimento, senso
comum — resmungou, pegando seu telefone celular. — Alô? Queria o número do
escritório do promotor de Bexar County. Sim? Obrigado.
Instantes depois, a ligação foi completada.
— Alô! Oi, querida. Aqui é Brady Coleman. Por favor, preciso falar com Bob
Dalton. Tudo bem. Sei que está numa reunião. Para dizer a verdade, eu também
estou, aqui na Califórnia, e fazendo papel de tolo por culpa dele. Diga que é urgente
e que quero falar-lhe agora mesmo. Brady Coleman. Isso mesmo. Eu aguardo.
Jane sorria. Ele tamborilava os dedos sobre a mesa. Passados alguns instantes,
falou em tom enérgico:
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— Bob? Por que disse à srta. Stewart que não pode discutir o caso de Leigh?
Nem quero saber de sua postura ética. Trata-se simplesmente de impedir mais um
crime, e suponho que você é pago para isso, não é verdade? Lei? O que me importa?
Sua omissão é que é ilegal. Eu me refiro a uma jovem senhora que necessita de sua
opinião. Sua vida pode depender disso. Portanto, fale com o coração. Vou passar-
lhe o telefone agora mesmo. Diga-lhe o que pensa sobre a morte de Leigh.
Brady inclinou-se e passou o fone para Jane.
— Alô, sr. Dalton? Sinto muito, mas Brady insiste em que tenha essa conversa
consigo.
Bob Dalton riu.
— Srta. Stewart, espero que entenda que nada posso dizer oficialmente. Caso
um dia se refira à nossa conversa a alguém, serei obrigado a desmenti-la. Trata-se,
afinal, de uma conversa particular e entre amigos.
Jane sentiu o sangue gelar-lhe nas veias. Os olhos azuis de Brady a fitavam,
impassíveis.
— Entendo perfeitamente, sr. Dalton.
— Então vamos à minha opinião. Não posso afirmar que Jeremy Trent tenha
assassinado a mulher, mas existe uma série de evidências que me impedem de
assegurar sua inocência. Há questões sem resposta.
Jane ouviu a análise do promotor e concluiu que em nada diferia da opinião de
Brady Coleman.
— Tínhamos um corpo na cama e um delinqüente morto a tiros no quarto do
casal. Havia sinal de luta e de relações sexuais entre marido e mulher. Os exames da
perícia não foram conclusivos. Um verdadeiro pesadelo para a promotoria. Não
havia base sólida para acusar Jeremy, mas alguns indícios que o incriminavam.
O coração de Jane acelerava. Com voz sumida, arriscou a pergunta:
— E por que ele teria assassinado a mulher?
— Não sei. Realmente seria muito difícil levar o caso a um julgamento. Os
argumentos seriam apenas conjecturas. A senhora conversou com ele sobre o
assunto?
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CAPÍTULO SETE
Brady olhou através da ampla janela do restaurante. A vista da baía de
Monterey era esplêndida em seus tons azuis e acinzentados. O garçom indicara a
Jane o rumo do lavatório feminino. Na mesa ao lado, um senhor lidava para abrir
uma enorme ostra.
Ela tomara a sério seu papel de guia. Passaram horas bastante agradáveis
juntos. Jane mostrou Carmel a Brady e a missão jesuíta, e percorreram de automóvel
toda a região. Havia muitas lojas turísticas, e ela sugeriu-lhe que comprasse
algumas garrafas do famoso vinho da Califórnia. Manteve-se polida e distante,
recusando-se a descer do carro. Brady ficou intrigado com esse comportamento.
Imaginou que estivesse ainda aborrecida com as advertências que fizera sobre
Jeremy Trent. Portanto, não a pressionou.
Ao deixar Carmel, percorreram a Seventeen Mile Drive ao longo da costa.
Passaram por Cypress Point, Bird Rock, Point Joe e Moss Beach. O cenário era
belíssimo. Ciprestes acompanhavam a rodovia e perdiam-se entre colinas e
penhascos. As ondas lançavam nuvens de branca espuma sobre as rochas. Seguiram
a autovia rumo a Pacific Grove. Monterey era agradável, limpa e saudável.
Recordava-lhe alguns lugares de San Antônio. Durante o passeio, Jane indicou o
edifício de sua clínica.
— Que tal parar um pouco e cumprimentar o pessoal? Poderemos fazer-lhes
uma surpresa — ele sugeriu.
— Não, Brady. Mesmo porque é hora de almoço... Devem ter saído.
Ele insistiu ao saber que desde o acidente Jane não visitara mais seu local de
trabalho. Temia ficar deprimida.
— Ora, vamos visitá-los. Talvez isso a motive. Garanto que será um sucesso.
— Brady, por que não deixa de portar-se como um irmão mais velho?
Ele sorriu ao sentir-lhe a reação.
— Tudo bem, Voltaremos a esse assunto depois do almoço. Promete?
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Não conseguia compreender o fascínio que essa doutora da Califórnia exercia sobre
si.
— E então, Brady? O homem das montanhas encantou-se pelas ondas do mar?
Em que está pensando? — perguntou Jane, interrompendo suas divagações.
— Nada em especial. O mar realmente é bonito.
Ela intuía a forma de ser de Brady com as mulheres.
Imaginava-o inflexível e dominador.
Jane falou sobre vários aspectos das relações humanas e destacou a
importância da independência no plano afetivo. Provocou-o com perguntas e riu
bastante com respostas espirituosas e picantes.
Quando veio o garçom, pediram cerveja e vinho californiano. O ambiente era
agradável e acolhedor. Jane comentou, sorrindo:
— Sabe, Brady, você não é o caubói simplório que pretende parecer. Percebi
isso cinco minutos depois que entrou em minha casa.
— Está dizendo que sou um fingido, dra. Stewart?
— Não exatamente, mas sei que estou diante de um texano manhoso.
— É. Talvez eu seja um tanto precavido — concordou.
— E de que tenta defender-se? Ele franziu a testa como se não entendesse a
pergunta.
— Não tem que responder-me — apressou-se Jane.
— Pois tento descobrir por que me sinto motivado a aconchegá-la em meus
braços como uma gatinha.
— Talvez por ser mais generoso e sensível do que realmente se permite.
— Ora, Jane, isso não corresponde à minha forma de ser — respondeu Brady,
intrigado.
Fitaram-se longamente até dirigirem os olhares à paisagem que se
descortinava. Jane tinha traços delicados e lindos olhos azuis. Ele sentia-se
inexplicavelmente envolvido. Seria um célebre caso de opostos que se atraíam? Não
sabia, mas era um forte apelo, um desejo de acarinhá-la e ampará-la. Isso não era
comum em sua vida. As mulheres o motivavam apenas para o jogo sexual. E Brady
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era direto e objetivo: o romance era apenas uma moldura para as suas intenções
eróticas.
— Como era Leigh? — perguntou Jane, interrompendo-lhe os pensamentos.
— Uma linda garota, doce e frágil. Como todas, procurava o amor de sua vida.
— Você a queria muito, não é?
— Minha mãe e eu sempre tivemos fortes vínculos, mas jamais permiti que ela
se intrometesse em minha vida. Quando se casou novamente, surgiu uma barreira
entre nós. Depois, Leigh nasceu. Liguei-me muito a ela. Tornei-me até um pouco
possessivo. Quando se casou com Jeremy Trent, fiquei sentido. E não por ciúme. Na
verdade eu queria sua felicidade e sabia que ela estava cometendo um grande erro,
mas não quis ouvir-me. Fiquei aborrecido e decepcionado. Quando necessitou de
minha ajuda, falhei miseravelmente. Essa é a culpa que tem me atormentado.
— Mas, Brady — disse Jane suavemente —, você não tem por que recriminar-
se. Estou certa de que fez o possível.
— Talvez, mas a dura realidade é que Leigh foi minha única irmã.
Depois do almoço, decidiram passar pelo Aquário. Depois, Brady a levaria
para casa. Subiam a Franklin Street quando ela disse que virasse à direita.
— Por aí não chegaremos à autovia — comentou ele.
— Não. Esse é o caminho para a minha clínica.
Brady dirigiu em silêncio, com um sorriso brincando em seus lábios. Jane
percebeu.
— Uma boa idéia, querida. Vão gostar de sua visita.
— Talvez devêssemos telefonar avisando.
Ele entregou-lhe o telefone celular.
— Você encontra solução para tudo, não? — Ela sorriu.
— Apenas tento ajudar.
Jane tomou o aparelho, pensativa. Esse tipo de atitude nada tinha a ver com
Jeremy Trent. Brady era diferente. Seria essa uma forma de mostrar compaixão por
uma pobre inválida?
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CAPÍTULO OITO
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— Brady?
— Sim?
— Gostaria de conhecer Big Sur amanhã?
— Parece um belo convite.
— É um convite. Temos um chalé. Quando garota passei muitos verões em Big
Sur. Poderia conhecê-lo, caso esteja disposto a ficar mais um dia comigo e meu urso.
Um grande sorriso iluminou-lhe o rosto.
— Que cavalheiro poderia recusar tal oferta?
— Você quer mesmo ir?
— Claro!
— Então, partiremos bem cedo.
— A que horas?
— Nove da manhã.
— Os galos da Califórnia acordam tão tarde?
— Ora, Brady, eu me levanto bem mais cedo.
— Que tal dez?
— Não sou tão preguiçosa.
— Estarei aqui às nove.
— Pedirei a Manuela que nos prepare algo para levar. Quero ver se estou em
forma para um piquenique.
— Você está em forma para isso e muito mais. Verá! — E se despediu com uma
piscada de olhos.
O quarto estava escuro quando Jane acordou. Olhou para o relógio. Eram oito
e meia, mas parecia mais. Dormira profundamente e sentia uma real satisfação.
Sonhos agradáveis e confusos. Brady manteve-se em seus pensamentos.
Era espantoso como se relacionavam bem, fato raro com suas novas amizades.
Talvez a situação se devesse à sua vulnerabilidade emocional. Tinha sido muito
receptiva com Jeremy e com Brady. Isso talvez explicasse seu comportamento. Mas
por que Brady se portara de forma tão afetiva? Atração sexual? De sua parte, sim.
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Havia também certo magnetismo emocional, e Jane fantasiava com relação a certas
palavras e comportamentos do texano. Era uma vibração inegável e inexplicável.
Tentava ser realista considerando que o objetivo da viagem de Brady à
Califórnia era poupar uma pobre inválida de um destino trágico. Talvez a ternura
evidente nada mais fosse que uma projeção de sentimentos com relação à sua
própria irmã Leigh.
Jane suspirou. Era uma ironia, mas cometera o mesmo erro, com Brady e com
Jeremy. Sucumbira às emoções e o convidara a um novo passeio. E estava claro que
era uma tolice envolver-se com um homem que apenas tentava esclarecer confusões
de caráter pessoal e familiar. Jeremy era o problema real. Sua ausência a afetou e ela
permitiu que Brady se aproveitasse disso. A não ser pela segunda conversa com o
procurador Bob Dalton, nada poderia mudar seus conceitos sobre Jeremy. Além
disso, Brady e Bob Dalton eram amigos havia muitos anos. Muitos aspectos ainda
tinham de ser esclarecidos.
A porta abriu-se, trazendo uma réstia de luz. Manuela se aproximou,
cautelosa:
— Senhorita... Está acordada?
— Sim, Manuela, entre.
— Srta. Jane, o sr. Trent acaba de chegar. Está na sala.
— Jeremy está em casa? Como assim?
— Ele mesmo. Disse que estava tão preocupado com a senhora que tomou o
primeiro avião. Parece nervoso e pediu que verificasse se estava acordada.
Surpreendida e amedrontada, Jane ouviu a voz de Jeremy:
— Jane?
— Sim. Estava cochilando e acabo de despertar — respondeu ela, vendo-o ao
lado da porta entreaberta.
— Sinto incomodá-la, querida, mas tinha que vê-la.
— Manuela, por favor, acenda a luz — pediu ela, cobrindo-se.
Jeremy entrou e olhou-a, preocupado:
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— Perdoe-me por aparecer assim, a essa hora e sem avisar. Fiquei ansioso
depois que falamos ao telefone e decidi vir imediatamente.
— Não vejo motivo para tanto nervosismo e preocupação — respondeu,
indicando a Manuela que desejava conversar com ele a sós.
— Obrigada, Manuela.
— Deseja alguma coisa, senhorita?
— Não, querida, pode ir-se. Ah! Talvez Jeremy aceite tomar um pouco de chá
comigo.
— Claro, Jane.
Manuela saiu, deixando a porta entreaberta. Jeremy a fechou, aumentando-lhe
a insegurança e a incerteza. Aquele era outro homem.
— Como é bom vê-la de novo, querida.
— Eu também estava saudosa — afirmou, mecanicamente, ao vê-lo aproximar-
se da cama.
Jane percebeu-lhe o ar sério e preocupado.
— Você arranjou um amigo em minha ausência — disse Jeremy com ar solene
apontando o urso de pelúcia em sua cama.
— Sim, este é o meu novo amigo.
— Engraçado. As pessoas sempre nos surpreendem — ironizou ele, sentando-
se à beira da cama e tomando-lhe as mãos.
— Ontem fui ver as crianças de meu consultório. Havia alguns bichinhos de
pelúcia e trouxe este para casa.
— Eu deveria sentir-me enciumado...
— Não. Não é para tanto.
Jeremy abaixou-se para beijá-la. Ela virou a cabeça levemente, oferecendo a
face. Os lábios estavam frios.
— Estou surpreso com a sua decisão de ir ao consultório. Pensei que esperaria
até poder andar de novo.
— Eu precisava sair. Queria fazer apenas uma visita, mas John Bosché estava
só, e a sala, cheia de bebês. Ajudei-o com meus pequenos clientes.
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— Espero que não tenha exagerado. Sua saúde vem em primeiro lugar. Há
outros médicos na clínica.
Jane aborreceu-se com o comentário pessimista. Intuiu que ele preferia vê-la
dependente e sem iniciativa:
— Não gostou de minhas palavras, não é, Jane?
Não respondeu, recordando momentos em que Jeremy lia em voz alta para ela.
Antes, isso lhe parecia sinal de afetuoso relacionamento. Agora, tinha dúvidas.
Ele acariciava suas mãos, e Jane perguntava-se qual o significado daquele
homem em sua vida. Compaixão? Compreensão? Ou um aventureiro diabólico tal
como advertira Brady Coleman?
— Não gostou de minhas palavras? — repetiu a pergunta.
— Sabe, Jeremy... você sempre se preocupou comigo. Respeito-o por isso.
— É, mas alguma coisa está errada. Eu sinto.
O tom era gentil e superficial. Jeremy estava desconfiado. Se as histórias sobre
ele fossem reais, o perigo de um confronto seria grande. Jane sentia-se frágil e
insegura, e convenceu-se de que ele sabia atuar sobre sua debilidade. Sempre
atingia seu ponto mais vulnerável, desde o começo.
Ela afastou-se, ajeitando um travesseiro na cabeceira da cama, estabelecendo
uma distância entre eles.
— Sim, você está certo. Há algo errado.
— O quê?
Ela respirou fundo, buscando acalmar-se.
— Decidi não usar seu anel. É muito cedo.
— Imaginei... Por isso apressei-me em vir. Você significa muito para mim.
— Tudo bem. É apenas uma questão de tempo — comentou ela, sentindo-se
melhor ao ver que mantinha o controle. — Trata-se apenas de um pequeno passo
para trás.
— Claro — respondeu Jeremy —, mas prometa-me que manterá coração e
mente abertos para o futuro.
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— Fala como se pedir-me em casamento fosse pecado. Não é bem assim. Fiquei
lisonjeada, mas não tenho sido a mesma desde o acidente. Você não me conhece.
Sou mais forte e decidida do que imagina. Fui ao consultório, retomei o contato com
minha realidade e acho que esse é o caminho.
Jeremy ouviu-a em silêncio. Era difícil imaginar o que ele pensava, mas Jane
percebeu que suas palavras não o entusiasmavam.
— Sabe, Jeremy, você conheceu-me como uma inválida e, a meu ver, se
perturba por eu revelar-me independente e auto-suficiente ao visitar a clínica.
— Ora, isso não é verdade. Quero apenas que seja feliz.
As palavras dele soaram-lhe falsas. Não compreendia por que preferia
acreditar em Brady, um homem que mal conhecia. Como poderia ter sido tão cega
com relação a isso?
Jeremy parecia magoado.
— Mas tem algumas coisas mais, Jane.
— Há um assunto que não mencionou.
— O que é?
Ela apoiou-se no travesseiro e afirmou:
— As trágicas circunstâncias que envolveram seus dois casamentos me
preocupam.
— Talvez eu tenha sido brusco quando perguntou sobre Leigh ao telefone —
replicou Jeremy, acrescentando: — Não achei que fosse o momento para falar sobre
o assunto. Se fui grosseiro, desculpe-me.
— Não se trata de grosseria, Jeremy.
— Então o quê? Ela engoliu em seco e exigiu:
— Diga-me o que aconteceu com Leigh. Quero saber a verdade, nua e crua. Se
há um tempo para a sinceridade, este é o momento.
Quando ele levantou-se e dirigiu-se à janela, Jane percebeu-lhe os traços duros
e retraídos. Nesse momento a governanta bateu à porta trazendo o chá.
— Por favor, Manuela, coloque-o na mesa.
— Alguma coisa mais, senhorita?
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disse que Leigh era uma neurótica e que estava sob cuidados de um psiquiatra?
Mencionou as queixas dela sobre mim?
— Não.
— Pois ela não me aceitava como eu era. Estava acostumada à maneira rude
dos texanos e ditava os procedimentos de nossa vida sexual, jogo violento com o
qual nunca estive de acordo. Na noite em que morreu, agrediu-me e unhou-me
durante nossa relação com o objetivo de provocar-me. Quanto a Vitória, creio que já
contei tudo. Era público.
— Jeremy, eu não o acuso de nada...
Ele ignorou-a e continuou:
— Posso não ter sido capaz de administrar essas situações, mas jamais pretendi
ferir ninguém. Se há algum pecado, é o da omissão. Isso eu juro.
Jane notou que ele estava muito perturbado. Decidiu não interrompê-lo.
— Algumas pessoas tentaram incriminar-me. Um deles, o irmão de Leigh. Ele
me odeia e eu também não gosto dele. E possível que o promotor tenha considerado
algumas de suas improváveis acusações. Na verdade, são amigos de infância, e
nesse caso, você sabe... E o que importa para mim é a sua opinião, a sua
sensibilidade. Acha que sou violento?
— Não. Você nunca me pareceu uma pessoa violenta.
— Então confie no homem que conhece. Não posso culpá-la por ser cautelosa,
mas a verdade está comigo. E a lei também. Ela pronunciou-se. Não pretenda agora
condenar-me baseada em boatos e insinuações.
Jane suspirou, constatando a intensidade dos sentimentos dele.
— Você tem razão.
— Então acha que temos chances?
— Sim, mas vamos dar tempo ao tempo. Fique com o anel. E lindo e deve
esperar o momento certo.
— Prefiro que fique com você, mesmo que não o use.
— Não. Tudo a seu tempo. Tome-o.
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Jeremy pegou o anel e guardou-o no bolso. Parecia triste. Jane tinha que
admitir que parecia inocente. No entanto, também acreditava na sinceridade de
Brady. Talvez ele estivesse iludido por sua própria aversão contra o ex-cunhado.
Cada um deles poderia trazer a própria a verdade.
— Manuela disse que estava cansada. Receio que minha visita veio aumentar
seu cansaço. Vou-me embora. Eu amo você. Muito.
Inclinou-se e beijou-a de leve nos lábios. Olhou-a nos olhos, súplice. Mais uma
vez, Jeremy era o homem que viera para salvá-la. Agora, entretanto, olhava-o com
precaução.
Ele tocou sua face e dirigiu-se para a porta.
— Jeremy ?
Ele voltou-se.
— Sim, querida?
— Vitória também gostava de sexo intenso?
Jeremy pareceu chocado com a pergunta. Hesitou:
— Não. Por que pergunta?
— Houve sexo intenso na noite em que ela entrou em coma?
Jeremy ficou muito embaraçado ao responder:
— Quando ela estava drogada e alcoolizada tornava-se irracional e violenta.
Mas não é sobre isso que está falando, é?
Ela sacudiu a cabeça.
— Não. Penso que não seja isso.
— Aonde quer chegar?
— A lugar algum. Apenas curiosidade...
Ele deixou-a, dirigindo-se à porta. Depois de alguns momentos, lágrimas
afloraram e cobriram o rosto de Jane.
Tudo fora muito doloroso. No fundo de sua alma, ela estava assustada como
nunca.
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CAPÍTULO NOVE
Jane foi despertada durante a madrugada pelo som de árvores e folhas batidas
por fortes ventos que assobiavam no telhado. Entre o sonho e a realidade, pensou
em Jeremy e Brady antes de compreender que estava em busca de seu próprio
destino. Acordou assustada. Uma tempestade de inverno se aproximava. A manhã
não seria própria para o passeio a Big Sur, apesar de a costa e o mar ficarem
majestosos quando acossados pela chuva e os ventos. Brady resolveria se fariam o
passeio em tais condições. Resolveu arrumar-se e esperá-lo. Chamou Manuela e
pediu uma calça de brim e uma camisa de flanela estampada. Havia tempos não
usava calças e sorriu ao pensar que roupas esportivas agradariam a Brady.
Enquanto a governanta a vestia, tentou manter-se de pé, esforçando-se para
recobrar o movimento das pernas.
— E se eu nunca mais conseguir andar, Manuela?
— Conseguirá — respondeu a governanta, incentivando-a. — Talvez demore
um pouco, mas tudo vai dar certo.
Jane sabia que poderia melhorar, mas precisava de apoio. Tinha dúvidas, e
imaginava que talvez elas não dissessem respeito apenas à capacidade de andar.
Talvez representassem algo de mais profundo dentro de seu ser.
Depois do café da manhã, pediu a Manuela que acendesse a lareira para
aquecer o ambiente. Brady estava prestes a chegar. Ficou longos minutos
observando a lenha na fogueira, aguardando ansiosa a chegada do amigo. O
telefone tocou, sobressaltando-a. Era Melissa Krun.
— Jane? Já recebi o primeiro relatório das investigações e decidi mantê-la
informada.
— Ótimo.
— Vamos começar com Jeremy Trent. Meu informante em Connecticut
conversou com a família de Vitória. As referências não foram boas. Disseram que
ele estava interessado no dinheiro dela e revelaram sérias suspeitas com relação ao
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— E então?
— Pareceu-me que ele tinha resposta para tudo.
— Isso não me surpreende. Ele é matreiro.
— Devolvi-lhe, o anel, mas não rompi nosso relacionamento. Decidi esperar o
resultado das investigações que mandei fazer.
Brady moveu a cabeça, aprovando-a.
— Fico feliz por saber que tomou medidas sensatas.
— Sou grata por sua sugestão, e é bom que saiba que também estou
investigando sua vida. Espero não deparar-me com desagradáveis surpresas.
— Meu velho pai dizia que quem trapaceia com cartas também o faz com os
negócios e com as mulheres. Mas uma coisa é certa: ninguém consegue burlar a
verdade.
— Sábias palavras.
— Meu pai era pobre, mas não era tolo.
— Parece ter sido um homem feliz.
— Na verdade, sim. Antes de morrer confessou-me que gostaria de ter se
comportado melhor com minha mãe. As mulheres são prazenteiras quando se é
jovem —..dizia ele —, mas, na velhice, se não se tem uma boa companheira, a
liberdade perde totalmente o sentido.
— E o que você pensa sobre essas palavras de seu pai?
— Que ele tem razão, mas a velhice, no momento, ainda está longe. Cada um
tem sua forma de ser, Jane. Não sou rígido, mas sou sincero e direto. Acho que é
assim que as coisas funcionam.
Ela sorriu.
— Espero que realmente seja como diz. Brady levantou-se:
— E então, senhora? Enfrentaremos a mãe natureza?
— Claro. Por que não?
Manuela trouxe uma capa de chuva amarela, e Brady levou Jane nos braços até
o carro. Voltou para buscar a cesta de piquenique e a cadeira de rodas. Os ventos
haviam amainado, mas nuvens escuras toldavam o céu.
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CAPÍTULO DEZ
Jane estava deitada na cama do pequeno quarto que se abria para a sala de
estar. A porta permitia-lhe ver Brady acender o fogo. Ele conseguira travesseiros e
uma bela manta estampada para agasalhá-la. Por sorte havia lenha e gravetos ao pé
da lareira de pedra. Brady estava descalço. As botas sujas de lama foram deixadas
na varanda.
Quando a madeira começou a crepitar entre as chamas, Brady dirigiu-se ao
quarto e sentou-se ao lado dela. Ao perceber que a calça estava molhada, comentou:
— Eu deveria ser mais cuidadoso.
— É desagradável ficar com roupas molhadas. Por que não as tira? Prometo
que não olharei.
— Ora, secará mais rápido no corpo. Além disso, um homem só deve andar
sem calça pela casa quando tem alguma intenção... digamos... inconfessável.
Jane riu do comentário e perguntou:
— Algumas vezes todos podemos ficar vulneráveis. Será que não consegue
sequer admitir essa possibilidade? É normal sentir-se fraco, inseguro e carente
algumas vezes. Ou será que seu amor-próprio exige que seja durão o tempo todo?
— O temor do fracasso acompanha todo homem. Desde criança aprendemos
que o importante é vencer. Por isso estamos sempre competindo e lutando uns
contra os outros. Nos negócios é a mesma coisa.
— Sua sensibilidade surpreendeu-me mais uma vez, Brady.
— Logo chegará à conclusão de que, apesar das aparências, não sou uma
pessoa cheia de preconceitos.
Ele tomou a toalha com que secara o cabelo de Jane e, antes de usá-la,
acariciou-lhe gentilmente o rosto. Ela adorava gestos espontâneos. Olhando em seus
olhos, afirmou:
— Nunca pensei em você como um alguém cheio de preconceitos.
— Ah, é?
de balanço de seu pai. Além da confortável sala de estar havia o quarto e o sótão.
Da cama ampla e confortável se podia ver o mar. Sua irmã Margareth preferia o
sótão, onde havia duas camas. Costumava ir a Big Sur com os pais todos os fins de
semana durante o verão. Depois que morreram, poucas vezes voltara ao chalé.
Aparecia apenas quando estava triste ou nostálgica.
Brady a observava, absorta em suas lembranças.
— Feliz de estar aqui, Jane?
— Muitas recordações,
— Posso imaginar.
— Gosto de estar aqui com você — admitiu ela, surpreendendo-se com a
declaração.
Olharam-se por um longo tempo.
— Em que pensa, Brady?
— Em como você é agradável e doce.
— E por que diz isso?
— Porque é verdade.
"Será mesmo?", perguntou-se Jane ao ser surpreendida por um beijo. Um
tremor apoderou-se de seu corpo, subitamente excitado. Ela sabia que havia
atração, mas não a imaginou tão forte e arrebatadora. Sentiu o perfume dele, o roçar
da barba bem-feita, o forte aperto de seus braços.
— Isso eu não esperava — suspirou, afastando-se um pouco.
— Não consigo resistir, Jane.
— Você é um homem muito atraente, mas...
— Mas o quê?
— Acho que não devemos. Na realidade...
Ele beijou-a novamente.
— Não estou entendendo o que quer dizer, querida. Explique-se melhor.
— Acho que não estamos fazendo a coisa certa.
— Por quê? Você é uma mulher e eu sou um homem. Homens e mulheres
gostam de fazer esse tipo de coisa.
— Mas...
— Mas o quê, querida?
— Oh, Brady por que você insiste?
— Porque ouvi apenas murmúrios e hesitações.
— Pois saiba que não quero ser seduzida. Entendeu? — afirmou Jane, tentando
demonstrar firmeza.
— Claro que entendo, mas não acredito.
— Como pode dizer isso?
— Não viemos para cá só por causa da vista e do mar. Você também tinha
outras intenções. Nada mais natural. Admita.
— Como pode dizer uma coisa dessas?
— Tudo bem. Por que pensa que viemos até Big Sur?
— Para um piquenique.
— Bem. Isso é parte da verdade. Talvez a menos importante.
— Você está querendo dizer que vim até aqui para ser seduzida? Não posso
acreditar.
— Se espera piedade ou clemência, esqueça. Todos nós temos nossas
dificuldades.
— Que quer dizer com isso?
— Você é uma mulher normal, como qualquer outra, Não posso tratá-la de
outra forma.
— Além disso — ela ironizou —, sou a mulher que tocou seu coração, como
disse há pouco.
— Espero que não esteja brincando comigo. Fui sincero ao confessar-lhe meus
sentimentos.
Jane ficou exasperada.
— Você é o homem mais desconcertante que conheci.
— E serei capaz de sensibilizá-la? — perguntou Brady, beliscando-lhe a perna
sob o cobertor.
Ela empertigou-se, pronta para dizer-lhe que sexo era a última coisa que lhe
interessava. Mas ele ria, um riso divertido, sem zombaria. Faltava-lhe a palavra
perfeita. Não conseguia repreendê-lo.
Diante do silêncio, Brady beijou-a outra vez. Jane não resistiu e não estava
certa se desejava continuar. Seguindo o impulso, virou-se, agarrando-se àqueles
ombros largos, pressionando seu corpo o mais que pôde. Saboreou a sensualidade
dos lábios dele.
Depois do beijo, apoiou a testa contra a de Brady.
— Você é um bandido.
— Por que diz isso, querida?
— Porque o que quer é apenas uma nova conquista. Seu primeiro caso com
uma inválida. E aqui estou, diante de sua complacência.
— Não gosto de ouvi-la falar desse modo. Está sendo cruel. Será que não
percebe que estou sinceramente envolvido?
Jane não respondeu. Temia acreditar em suas palavras. E estava
envergonhada. Não fora honesta o suficiente para admitir que queria ser seduzida.
— A quem você teme? A Brady Coleman ou a seus próprios sentimentos?
Ela fitou-o, inquieta.
— Você é um homem sensível, mas não fique tão convencido. Jeremy Trent
também sabe ser assim.
Ele não escondeu a irritação provocada pela referência.
— A sensibilidade de Jeremy é voltada para debilidades e fraquezas. Ele as
identifica e ataca. Não tinha entendido esse lado dele até você aparecer, Brady.
— E que acha que comigo é a mesma coisa?
Ela pensou um instante, olhando a chuva através da janela.
— Sei que existe desejo, mas não só isso. Há outras coisas mais.
Brady acariciou-lhe as mãos.
—Talvez este seja o momento de sentir, não o de pensar.
Jane sorriu.
— E fácil entender por que costuma sair-se tão bem com as mulheres. Aposto
que a maioria quer agradá-lo o tempo todo. Você tem o dom de despertar esses
sentimentos.
— Não entendo...
Ela tocou de leve o. rosto dele, olhando seus olhos ingênuos, sabendo estar
diante de um conquistador capaz de fazer qualquer mulher desmaiar de prazer.
— Você deseja mesmo fazer amor com uma aleijada?
— Não há razão para ter pena de si mesma. Saberemos encontrar o caminho
prazeroso da sensualidade.
— Talvez duvide de minhas possibilidades. Tenho medo, Brady.
— Medo de quê?
— De tudo.
— Não é Jane Stewart quem fala. Posso não tê-la conhecido antes do acidente,
mas sei que estou diante de uma mulher de valor.
— Mas, Brady, mal posso levantar-me e você insiste em fazer amor comigo! É
assustador.
— Querida, Jeremy Trent talvez goste de vê-la enrolada em cobertores e
dependente da cadeira de rodas. Eu quero é vê-la sadia, alegre, disposta, vivendo a
vida como se pode vivê-la, mesmo diante de uma situação passageira que lhe
dificulta os movimentos.
Jane não conteve o pranto.
— Você tem razão. Meu problema tem sido minha atitude diante da vida. O
acidente tolheu-me a iniciativa, deixou-me insegura e frágil. Nunca fui assim.
— E o que vamos fazer sobre isso?
— Quero voltar a andar — ela respondeu. — Quero mesmo.
— A ponto de levantar-se e tentar andar até a mesa da sala?
Jane sorriu com tristeza.
— Vamos. Posso ajudá-la.
— Será um milagre se conseguir manter-me sobre as pernas.
— Esse é o começo. Não há outra forma.
— Há muitas coisas a fazer numa fazenda, mesmo que não haja criação. A mãe
natureza é pródiga em Hill County. E necessário cuidar dos cedros, cortá-los e
empilhá-los. Fazer reparos periódicos na estrada, nas cercas. Algumas vezes
contrato alguns homens para o serviço. Tenho um capataz indiano. Chama-se
Heppo. Um bom trabalhador. Cortar cedros ocupa muitos homens e, além disso,
posso arrendar a terra para pasto.
— Então você não é um caubói de verdade.
— Tenho vários búfalos em meu rancho.
— Espero que não se dedique à caça desses belos animais.
Brady tomou um gole de vinho.
— Não, querida. Gosto de admirá-los. Mas às vezes caço veados ou javalis. E
uma região agreste e linda. Um dia irá conhecê-la — finalizou Brady, fitando-a
seriamente.
— Você gostaria mesmo que eu fosse, não é?
— Sim. Ficaria muito feliz em tê-la em meu rancho.
— Talvez algum dia. Gostaria de ver o pôr-do-sol em Hill County.
— Você gosta de antropologia e história?
— Nunca fui uma leitora dedicada, mas gosto de museus.
— Meu rancho é um verdadeiro museu antropológico. Há muitos anos,
viveram lá tribos indígenas, e é fácil encontrar artefatos de cerâmica e outros
tesouros. Ele fica na rota de imigração de vários povos pré-colombianos. Viajavam
entre o norte do Texas e de Oklahoma, e o norte do México. Adoro escavar a
montanha. E como viajar pelo tempo.
Jane o ouvia, fascinada. Jamais conhecera alguém como ele.
— Estamos tão envolvidos com nossas vidas que esquecemos de nossas
ligações com o passado e com a terra de nossos ancestrais. Fico pensando que justo
em meu rancho amores foram perdidos, lutas foram travadas, lindos bebês vieram à
luz. E tudo isso sob o mesmo sol que nos ilumina.
Ela observou seus olhos brilhantes moverem-se, sonhadores.
— Você é um romântico, Brady.
Ele sorriu.
— Tento viver com sentimento... e paixão.
— Estou contente por tê-lo conhecido.
— Eu também, querida.
Ela tomou mais um gole do vinho. Brady dividiu o restante da garrafa,
olhando a lareira. Uma tora rolou, soltando faíscas. Levantou-se para ajeitar o fogo,
adicionando mais lenha.
Jane observava, admirando sua estrutura musculosa. Durante todo o almoço
ele esteve seduzindo-a com os olhos.
Brady esteve em completo controle, emitindo vibrações, como um regente de
orquestra a dirigir o ritmo da sedução. O olhar não deixava dúvidas sobre suas
intenções. A atração era forte e inegável. Ambos sabiam o que estava para
acontecer.
Quando retornou para a mesa, ela perguntou docemente:
— Você me leva para a cama, Brady?
— Claro, se é isso o que quer
— E se deitará comigo? Gostaria que me abraçasse enquanto observo a chuva.
— Claro, mas tenho que tirar esta calça molhada.
Jane assentiu.
— Eu sei. Quero você também.
— Sabe de uma coisa, Jane? Desejo-a desde o momento em que me atendeu à
porta.
— Para falar a verdade, acho que eu também. Amor à primeira vista, como
dizem os romances. Não pensei que pudesse existir. Vamos, não me torture mais.
— Querida.... Tenho o pressentimento de que serei feliz por um longo tempo.
Jane ardia em desejo. A paixão era tão forte que chegava a doer.
Brady levantou-se e beijou-lhe as mãos, suavemente. Ela o trouxe para si e
beijaram-se longamente.
— Vamos, Brady. Vamos para a cama...
CAPÍTULO ONZE
como nunca. Um leve torpor tomou-lhe o corpo quando ele começou a beijar-lhe o
queixo, a nuca, descendo vagarosamente em direção às suaves linhas de seus seios.
Jane sentiu o rosto amado pousar sôfrego sobre seu colo. Agarrou-lhe os cabelos em
apaixonada carícia.
Brady deslizou a mão até o fecho da calça de brim de Jane. Ao sentir a pressão
ansiosa sobre o ventre, ela estremeceu, excitada.
— Oh, Brady — murmurou, levantando-lhe o rosto e beijando-o.
Foi um beijo prolongado e apaixonado que a deixou sem ar e totalmente fora
de si. Quando afastou-se um pouco para respirar, surpreendeu-se ao ver que Brady,
em movimentos ágeis, a desnudava completamente.
Sem dizer palavra e fitando-lhe o corpo nu sobre a cama, ele levantou-se e
tirou suas roupas, ajeitando-as ao lado do criado-mundo. Em questão de segundos
a abraçava terna e apaixonadamente. Jane gostou de vê-lo despir-se e de sentir
como ele a desnudou. Era algo que evocava rituais atávicos. Ao vê-lo sobre si,
tentou mover as pernas, ajeitando-se para sentir melhor sua pele e seu calor.
Ele acomodou-se a seu lado, moderando os carinhos, prolongando o mais
possível o tempo de delícias. Em um segundo Jane compreendeu que ele se
continha, renunciando à possibilidade do prazer imediato, dispondo-se a procurar o
ritmo de -seu coração feminino. Era uma demonstração de carinho e nobreza que
ela só vira nos romances que lera.
Embalado pelo tamborilar da chuva e o crepitar das chamas, o enlevo durou
longos minutos. Desejo e paixão pairavam no ar quente e úmido do chalé. Lá fora, a
fúria dos elementos acompanhava o ritmo dos amantes.
— Brady... eu o quero tanto... Faça amor comigo. Agora.
— Calma, querida. Beije-me — respondeu ele, acariciando-lhe o ventre.
— Sabe, querido, sempre me disseram que eu tinha lindas pernas.
— E ainda as têm — respondeu ele, afastando-as e insinuando-se entre elas.
— Tenho medo. Não sei se vou conseguir... Vamos, faça amor comigo agora.
— Temos todo o tempo do mundo, Jane. Você conseguirá. Eu prometo.
— Sabe, se posso ter essas sensações a seu lado... quero dizer... mesmo inválida
como estou, imagine quando me curar. Já pensou? Na verdade, se é assim, para que
andar? Fizemos tudo deitados, não foi?
— Não brinque com isso. Logo estaremos dançando e correndo juntos pelas
montanhas do Texas.
Ela sorriu. Jamais imaginara encontrar alguém como Brady. Um. amante
compreensivo e atento, um companheiro, um amigo, um homem cheio de mistérios
e de vida. Ele era tudo isso.
— Quem sabe, Brady? Mas que tal se, antes de viajarmos às montanhas do
Texas, tentássemos outra vez?
Ele olhou-a com malícia.
— Sei que fui um pouco rápido. Talvez pudesse ter prolongado mais um
pouco esses momentos...
— Nem diga isso, Brady. Você foi perfeito. Apenas, quero mais. Nunca me
senti assim.
— Eu também — respondeu ele, sorrindo e tomando-a novamente em seus
braços.
Amaram-se até tempestade amainar e toda a lenha ser consumida pela
fogueira.
Aninhada nos braços de Brady, Jane comentou, sorridente:
— Esses momentos foram absolutamente especiais para mim, Brady.
— Para mim foi uma experiência totalmente nova. Foi a primeira vez que senti
algo mais que sexo. É estranho e fascinante, querida.
Jane não entendeu o que o companheiro queria dizer. Na verdade, Brady não
sabia definir com exatidão seus sentimentos.
— Sabe, Jane, amor e sexo até o dia de hoje eram realidades incompatíveis em
minha vida. Tudo isso é muito novo, e não me envergonho de dizer que estou
extasiado.
— Não confunda compaixão com amor, querido.
Um momento de louco prazer? Não. Jane sabia que era mais, muito mais do que
isso.
Exausto, Brady adormeceu em seus braços. Ela ficou desperta, observando as
brasas na lareira e os sons distantes do mar e de esporádicos trovões.
Sentia-se feliz, saciada e completa. Era muito para uma mulher que dias atrás
se considerava infeliz e inválida.
CAPÍTULO DOZE
A tempestade deu trégua pela manhã. Jane acordou quando Brady acendia o
fogo da lareira. Da janela viu o céu cinzento a prenunciar mais chuva pela costa.
— Bom dia, Brady.
— Como está a minha rosa da manhã? — gracejou, aproximando-se e
ajeitando-lhe o travesseiro.
Jane encolheu-se, puxando as cobertas, envergonhada de sua aparência ao
despertar. Ele não se barbeara, parecendo-lhe mais rude e másculo com os cabelos
desalinhados. Ela olhou-o de soslaio:
— Não sou uma rosa. Sou apenas uma mulher apaixonada. Veja o que restou
de mim: devo ter olheiras... Credo! Estou completamente nua debaixo dessas
cobertas. Foi uma noite de loucura, Brady. — disse, corando.
"Uma tarde e uma noite de amor. Como isso pode mudar a vida de uma
mulher...", pensava Jane. Não sabia de seu apetite sexual. Era como se tivesse
encontrado dentro de si outra pessoa, lasciva, erótica, surpreendente em suas
fantasias. E essa nova mulher surgira nos braços de Brady Coleman. Um mestre, um
feiticeiro do amor. Sentia-se amada e desejada como nunca.
— Ora, querida, você estava apenas carente de afeição. Encontrou o homem
certo, no momento certo — comentou ele, rindo.
— Nunca me senti assim em toda a minha vida. Foram momentos muito
especiais — afirmou, acarinhando-lhe as costas.
— Também acho que foi tudo extraordinário, Jane. Estou com uma fome do
tamanho do Estado do Texas. Poderíamos fazer uma refeição ligeira, mas um
homem que se preza merece um bom café da manhã. E acho que não temos nada
em casa.
— Pois posso me vestir e procuraremos um restaurante — sugeriu Jane.
— Também pensei nisso. Mas eu poderia ir à mercearia na estrada e trazer
alguma coisa. Gosto de preparar o café da manhã.
O esforço para manter-se sobre os pés foi enorme. Ele a ajudava. As pernas
estavam frouxas e tremiam um pouco. No entanto, respondiam à sua vontade. Ao
percebê-lo, sentiu-se feliz. Ria como uma menina.
Inclinou-se e esforçou-se o mais que pôde para ficar em pé. No início sentiu-se
fraca e tudo parecia difícil. Quando Brady a ajudou, animada, Jane levantou-se. As
pernas continuavam tremendo, mas ela não se sentia insegura como em vezes
anteriores. Isso a fez muito feliz. Gratidão, amor e um fortes emoções inundavam-
lhe o coração. Espontânea, atirou os braços em volta do pescoço dele. Mais uma
pequena vitória.
— Obrigada, Brady, muito obrigada.
— Não há por quê. Foi você quem se levantou.
A muito custo, chegou ao quarto de banhos. Brady acomodou-a na banheira e
voltou ao quarto para buscar a cadeira de rodas. Deixou-as a seu alcance.
— Venha, querida, vamos. Acomode-se na banheira. Vou abrir a torneira.
A ducha quente molhou-lhe os cabelos. Brady acenou e saiu rápido para a
mercearia. Jane ficou à vontade. Momentos depois, ouviu o barulho do carro de
Brady ao partir.
Jane sentia-se bem. Tudo era loucura, mas ele a fazia muito feliz. Poderia ser
fantasia, mas tivera momentos extraordinários. Gostava de Brady. Era um
sentimento impetuoso, sufocante. Seria amor?
Passou mais de quinze minutos sob a ducha, meditando. A água na banheira
esfriava rapidamente. A mercearia não era longe, e logo Brady estaria de volta.
Decidiu esperá-lo e não arriscar-se a passar para a cadeira de rodas sozinha. Temia
escorregar e ferir-se.
Chuva e vento assobiavam lá fora. Ele iria se molhar muito. Talvez se despisse
para secar as roupas ao fogo, Jane fantasiou.
Ouviu uma batida na porta e estranhou. Brady sabia que não poderia ajudá-lo
com as compras. O barulho continuou. Imaginou que tentava abrir a porta com os
pés. Apurou o ouvido e chamou:
— Brady? É você, querido?
Não houve resposta, mas tinha certeza de que alguém tinha entrado. Ouviu
passos. Sinistros pensamentos ocorreram-lhe à mente.
— Brady? É você? — gritou mais alto.
Jeremy Trent surgiu na porta.
Assustada, Jane gritou, cruzando os braços sobre o peito.
— Amante errado! Surpresa, querida? — vociferou ele com ironia.
— Jeremy! O que faz aqui? — indagou, tentando recuperar-se do susto.
— Eu é que devo fazer as perguntas, não acha? — respondeu Jeremy com
sarcasmo. — E onde está ele? Por onde anda seu amante para dias chuvosos?
Muda, Jane fitou-o, desafiante.
— Onde está ele?! — gritou Jeremy, sacudindo a água que lhe escorria pelo
rosto e a jaqueta.
— Foi à mercearia e logo estará de volta, se é que isso possa lhe interessar,
Jeremy Trent. Saiba que não há nenhuma justificativa para essa invasão de minha
privacidade.
Ele observou a cadeira de rodas e o roupão perto da banheira.
— Suponho que esse sujeito tenha preparado seu banho antes de sair. E deve
ter lhe prestado também outros serviços — disse ele, agressivo, acrescentando: —
Ou teria sido você quem o atendeu? Brady Coleman deitou com todas as prostitutas
do Texas. Deve estar tentando a sorte na Califórnia. E parece que desta vez
conseguiu algo de certo nível.
— Saia daqui, seu cafajeste! Saia imediatamente! — ela gritou.
Jeremy Trent gargalhou sinistramente.
— Sua indignação não me comove, Jane. Você é mesmo uma prostituta de
luxo.
— Saia desta casa, Jeremy. Saia agora mesmo. Garanto que vai se arrepender.
Ele moveu a cabeça para trás e gargalhou novamente.
— Que há com você? — Jane gritou, — Que deseja? Que espera ganhar com
isso?
A expressão de Jeremy endureceu.
— Não, Jeremy! — gritou ela enquanto seu corpo emergia das águas que se
escoavam para o ralo.
Jeremy ria ao vê-la tentar esconder o corpo com as mãos, gritando frenética:
— Saia já daqui! Seu cafajeste!
A fisionomia de Jeremy endureceu. Um carro chegava. Era Brady Coleman.
— Agora talvez você se retire — ela soluçou.
— Por um momento, minha querida. Não se preocupe que eu volto para
acabar com essa brincadeira.
Jane assustou-se ao ver que Jeremy Trent tinha um revólver na mão.
Brady ficou pálido quando viu o Dodge branco estacionado diante do acesso
do chalé. Parou o carro logo atrás e correu ansioso caminho acima. "Se o desgraçado
ousou tocá-la, vou matá-lo com minhas próprias mãos", pensou.
O chão estava escorregadio. Aos tropeços, chegou ofegante à porta. Não se
surpreendeu ao ver o riso cínico de Jeremy Trent. Ele o esperava ao lado da lareira.
Tinha uma das mãos no bolso da jaqueta.
— Onde está ela?! — gritou Brady.
— Ela quem? — provocou o intruso.
— Jane. Onde está Jane, seu miserável?
— A última vez que a vi, estava tomando banho. Um espetáculo muito
excitante...
Brady, mal contendo a ira e a preocupação, correu em direção ao banheiro.
Jeremy o deteve, apontando-lhe a pistola automática.
— Pare agora mesmo. Acho que a srta. Stewart prefere resguardar a
privacidade. Além disso, temos que acertar nossas contas, Brady Coleman.
Brady parou, fitando a arma.
— Jane! Você está bem? — ele gritou.
— Sim. Estou bem. Cuidado, Brady. Jeremy está armado!
— O vaqueiro já sabe, querida. Tenho-o sob a mira de minha pistola. Que lhe
parece?
— O que há, Trent? O que você quer? Atemorizar-me? É muito valente com
uma arma na mão — Brady provocou.
Jeremy montou a pistola em brusco movimento.
— O que eu quero, seu canalha? Quero ver-me livre de você. Não lhe bastou
ficar com o rancho de Leigh? Por que você não desiste do que é meu? O que está
fazendo atrás de Jane? Estou cheio de você, texano do inferno! — rosnou,
encostando a arma na garganta de Brady.
— Assassino!
— Você não sabe de nada.
— Sei que você matou minha irmã e tentou fazer o mesmo com a outra mulher
em Connecticut. Seus dias estão contados, Jeremy. A justiça pode tardar, mas chega.
Ele soltou uma gargalhada.
— Matá-las? Por que deveria? Eram apaixonadas por mim. Ambas me
amavam e eu as amava também — respondeu ele com desequilibrada entonação.
— E por que tirou a vida de Leigh?
A expressão de Jeremy ficou rígida.
— Ela não entendeu... Ela não entendeu... Ela não entendeu.
— Então foi isso. Ela não entendeu o lixo que você é. Assassino!
Jeremy vociferou entre os dentes:
— Ela mereceu. Não pude fazer nada. Ela não entendia. Alegro-me que tenha
morrido. Alegro-me... Alegro-me — respondeu ele, movendo a pistola de um lado
para outro.
— Você estrangulou Leigh antes ou depois de balear Spike? Usou essa mesma
arma contra ele?
— Tive que atirar, vaqueiro. Tive que atirar... Não havia jeito.
— Então matou Leigh, estrangulando-a, e depois saiu às ruas para buscar um
marginal para matá-lo a tiros em seu quarto. O que prometeu a Spike? Dinheiro ou
sua própria mulher? Como você é baixo e perverso!
— Como você é burro. Nem percebeu que lhe fiz um grande favor. Dentro de
poucos anos terá a fazenda de sua mãe e muitos dólares. Transformou-se em
herdeiro único de uma bela fortuna. Por que não me deixou em paz? Por que não
ficou no Texas? De que lhe serve uma mulher inválida numa cadeira de rodas? Sexo
por caridade? Esse não é o seu estilo, Brady.
— Você me dá asco, Jeremy.
— Quer mesmo é me destruir, tirar o que é meu. Mas não conseguirá me deter.
Vou eliminá-lo, vaqueiro estúpido — finalizou, apontando-lhe mais uma vez a
pistola.
— Você não teria coragem. Gente da sua laia prefere estrangular uma mulher
na cama a enfrentar qualquer situação realmente perigosa. Nem sei como veio até
aqui.
— Que pena, vaqueiro... você também não entende. Vocês são todos uns
loucos.
— Eu entendo muito bem, Jeremy. Chegou a hora de você pagar por todos os
seus crimes — respondeu Brady, aproximando-se.
— Você está facilitando as coisas — disse Jeremy, com a pistola em riste.
Brady sabia que Jeremy era louco o suficiente par apertar o gatilho. Observava-
lhe todos os movimentos à espera de uma oportunidade de arrebatar-lhe a arma.
— Na verdade, vaqueiro, não vim até aqui para conversar. Adeus. Foi ótimo
conhecê-lo.
— Não, Jeremy, não atire! — gritou Jane, da porta, em sua cadeira de rodas.
Trent desviou o olhar por um segundo, tempo suficiente para que Brady se
lançasse contra ele golpeando-lhe no rosto com um soco poderoso. Jeremy
rodopiou, mas a arma disparou antes de ir ao solo, rolando em direção à lareira.
Jane gritou apavorada ao ver Brady cambalear com o ombro sangrando. Lívido,
apoiou-se no sofá.
Jeremy correu à lareira tentando recuperar a pistola. Foi impossível resgatá-la
das chamas. Brady levantou-se e tentou agarrá-lo. Jeremy o empurrou com força e
saiu correndo rumo à porta.
— Você está ferido!
Brady sentiu uma pontada de dor no ombro esquerdo. Uma poça de sangue
formava-se a seus pés.
— Brady! Você está baleado! — Jane exclamou, aterrorizada.
— A bala atingiu-me de raspão. Não me parece muito grave — respondeu,
apertando o ferimento com a mão.
— Deixe-me ver... Espere!
— Tenho que pegar esse cara, Jane — respondeu ele, dirigindo-se para a porta.
— Não, Brady! Está sangrando muito!
Ele não ouviu o conselho. Jeremy estava quase chegando ao estacionamento.
Brady entendeu que ele não iria muito longe, pois seu carro impedia que arrancasse
com o Dodge. Olhou para trás e viu Jane. Ela tremia.
— Use o telefone celular para chamar a polícia.
Apertando o ferimento com a mão, correu em direção a Jeremy com um único
pensamento: agarrar de vez o assassino de sua irmã.
CAPÍTULO TREZE
Nada mais havia a fazer senão esperar o socorro. E como demorava. Jane
tremia de frio e sentia-se exausta.
— Querido... os médicos devem estar chegando — murmurou no ouvido de
Brady. — Agüente mais um pouco... Não quero perdê-lo.
Beijou-lhe ternamente o rosto pálido. Passados alguns minutos, ouviu sirenes
ao longe.
— Graças a Deus — suspirou aliviada.
Brady gemeu.
— Ai... minha cabeça!
Jane ouviu um ruído estranho na direção do precipício.
— Tudo bem, querido. Estou a seu lado. O socorro está a caminho. Já ouço as
sirenes da ambulância. Descanse. Não tente mover-se.
Brady olhava sobre os ombros dela. Sua expressão era de horror. Jane
assustou-se e virou-se.
Diante deles estava Jeremy Trent, como um louco desvairado, sujo de barro e
sangue, os olhos injetados, a berrar:
— Vou matá-los, malditos. Os dois vão morrer!
— Não se aproxime, Jeremy. A polícia está chegando. Não se mova. Você
também está ferido, precisa de um médico.
Jeremy avançava, ignorando as advertências.
— Não adianta, Jane, esse sujeito está completamente louco.
— Vou matá-los — dizia ele, agarrando uma enorme pedra.
O assassino aproximava-se.
— Por favor, Jeremy! — gritou Jane.
Ele levantou a pedra acima dos ombros e preparava-se para desferir o golpe
fatal. As vítimas pareciam indefesas.
Jane sentiu que havia uma única possibilidade. O esforço foi enorme. Lutava
pela própria vida e a de seu querido Brady. Milagrosamente conseguiu levantar a
perna esquerda e apoiá-la contra a barriga de Jeremy quando ele, aos berros,
pretendia soltar a enorme pedra. Foi o suficiente para desequilibrá-lo. Os braços do
assassino foram para trás e o tombo foi inevitável. Jeremy tentou agarrar-se, mas
escorregou direto em direção ao precipício. Sua fisionomia era de horror. Não
houve gritos. Despencou contra as ondas e as rochas.
A ambulância e a radiopatrulha acabavam de chegar. Em segundos os
enfermeiros ocupavam-se de Brady Coleman. Jane também foi atendida pelos
médicos. Ambos foram levados para o hospital de Monterey. Os médicos elogiaram
a atitude e o esforço dela. Sua dedicação salvara a vida de Brady. Ele havia perdido
muito sangue e se ela não o tivesse atendido a tempo, tudo teria sido inútil.
Brady ficou em estado de choque, mas logo recuperou-se. Jane estava a seu
lado.
— Essa eu fico lhe devendo...
— Brady, eu o amo. Nem sei o que seria de mim se algo pior tivesse
acontecido.
— Mas você salvou-me ao cuidar de meus ferimentos e da fúria daquele
assassino maníaco... E nem pude agradecer-lhe...
— Uma mão lava a outra. Não sei como consegui chegar até lã.
— Mas conseguiu. Pelo visto já deve estar pronta para montar a cavalo em
meu rancho no Texas. Que lhe parece a idéia?
Ela sorriu, satisfeita.
— Eu nunca vi um pôr-do-sol em Hill County, Brady. Deve ser o lugar perfeito
para curar inválidos e feridos.
— Pois pode ir preparando as malas. Os ares do Texas operam milagres.
Garanto que em pouco tempo estará dançando quadrilha.
Jane curvou-se e beijou-o ternamente. Brady correspondeu à carícia com
sensualidade.
— Devagar, vaqueiro. Teremos tempo para isso... Brady sorriu com malícia.
— Sempre é tempo para os que se amam, querida.
EPÍLOGO
FIM