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Mediação de Leitura

Prof. João Olinto Trindade Junior


Prof.ª Rosangela Silveira Garcia

Indaial – 2020
1a Edição
Copyright © UNIASSELVI 2020

Elaboração:
Prof. João Olinto Trindade Junior
Prof.ª Rosangela Silveira Garcia

Revisão, Diagramação e Produção:


Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri


UNIASSELVI – Indaial.

J95m

Junior, João Olinto Trindade

Mediação de leitura. / João Olinto Trindade Junior; Rosangela


Silveira Garcia. – Indaial: UNIASSELVI, 2020.

280 p.; il.

ISBN 978-65-5663-083-0

1. Leitura. - Brasil. 2. Mediação. – Brasil. I. Garcia, Rosangela Silveira.


II. Centro Universitário Leonardo Da Vinci.

CDD 370

Impresso por:
Apresentação
A leitura é um ato de abrir uma janela de si para o mundo e do
mundo para si. É espaço do qual o conhecimento emerge e onde a reflexão e
a imaginação encontram pouso. A leitura abre possibilidades múltiplas.

Para refletirmos sobre a correlação entre leitura e mediação, no


contexto de ensino, devemos compreender como tais concepções se
correlacionam, e as intersecções entre linguagem, práticas sociais, leitura e
práticas de mediação.

No desenvolvimento de práticas de mediação de leitura o educador


deve perceber-se no papel de mediador, não somente da leitura, mas da
aprendizagem do aluno. Visando refletir sobre a construção deste papel, ao
longo de seus estudos você desenvolverá as competências necessárias ao
estabelecimento do ensino de práticas mediadoras em sua prática pedagógica.

Neste percurso discutiremos os efeitos das políticas educacionais nas


práticas de ensino da leitura, refletiremos sobre a leitura e sua integração em
práticas interdisciplinares, sobre o desenvolvimento da mediação da leitura
em espaços escolares e não escolares; assim como a composição do texto e da
leitura em contextos digitais.

Prontos para o desafio?

Prof. João Olinto Trindade Junior


Prof.ª Rosangela Silveira Garcia
NOTA

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para
você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novi-
dades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é


o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um
formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagra-
mação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui
para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente,


apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilida-
de de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.
 
Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assun-
to em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa
continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de


Desempenho de Estudantes – ENADE.
 
Bons estudos!
LEMBRETE

Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma disciplina e com ela


um novo conhecimento.

Com o objetivo de enriquecer seu conhecimento, construímos, além do livro


que está em suas mãos, uma rica trilha de aprendizagem, por meio dela você
terá contato com o vídeo da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complemen-
tares, entre outros, todos pensados e construídos na intenção de auxiliar seu crescimento.

Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

Conte conosco, estaremos juntos nesta caminhada!


Sumário
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA ................................................. 1

TÓPICO 1 - A CONSTITUIÇÃO DA LEITURA................................................................................ 3


1 INTRODUÇÃO..................................................................................................................................... 3
2 A LEITURA CONSTITUÍDA HISTÓRICO-SOCIALMENTE .................................................. 3
2.1 A LEITURA COMO PRÁTICA SOCIAL ................................................................................... 11
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 11
RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 24
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 25

TÓPICO 2 - LEITURA E MEDIAÇÃO............................................................................................... 27


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 27
2 CONCEPÇÕES DE LEITURA E MEDIAÇÃO.............................................................................. 27
2.1 A LEITURA E A LINGUAGEM: PRÁTICAS DE MEDIAÇÃO ............................................. 36
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 45
RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 49
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 50

TÓPICO 3 - A LEITURA E O LEITOR............................................................................................... 53


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 53
2 LEITURA & LEITOR: O QUE LER? PARA QUE LER?............................................................... 54
2.1 A MEDIAÇÃO LITERÁRIA NA FORMAÇÃO DO LEITOR.................................................. 63
RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 72
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 73

TÓPICO 4 - RELAÇÃO DA LEITURA COM A ORALIDADE E COM A ESCRITA............... 75


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 75
2 CULTURA ORAL E LEITURA......................................................................................................... 76
2.1 CULTURA ORAL E ESCRITA..................................................................................................... 78
2.2 CULTURA ORAL E ESCRITA .................................................................................................... 84
RESUMO DO TÓPICO 4..................................................................................................................... 91
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 92

UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS..................................................................... 93

TÓPICO 1 - A LEITURA NO CONTEXTO BRASILEIRO: DIÁLOGO COM AS POLÍTICAS


PÚBLICAS............................................................................................................................................... 95
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 95
2 PRÁTICAS DE LEITURA.................................................................................................................. 95
3 POLÍTICAS PÚBLICAS E EDUCAÇÃO...................................................................................... 100
4 MOVIMENTOS DE INCENTIVO À LEITURA......................................................................... 105
RESUMO DO TÓPICO 1................................................................................................................... 113
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 114
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR................................ 115
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 115
2 A LEITURA E SUA INTEGRAÇÃO EM PRÁTICAS INTERDISCIPLINARES ................. 115
2.1 LEITOR INFORMACIONAL..................................................................................................... 124
2.2 LEITOR ESTUDIOSO.................................................................................................................. 124
2.3 LEITOR DILETANTE.................................................................................................................. 125
3 A MEDIAÇÃO DA LEITURA EM ESPAÇOS ESCOLARES.................................................... 126
3.1 A NATUREZA DA LEITURA EM AMBIENTES ESCOLARES............................................ 130
3.2 PLANEJAMENTO DIDÁTICO-LITERÁRIO........................................................................... 133
3.3 O GOSTO PELA LEITURA........................................................................................................ 135
4 A MEDIAÇÃO DA LEITURA EM ESPAÇOS NÃO ESCOLARES......................................... 140
4.1 LINGUAGEM E TRAPAÇA....................................................................................................... 144
4.2 A FUNÇÃO DO ESCRITOR....................................................................................................... 145
4.3 A PROEMINÊNCIA DO SIGNO LITERÁRIO........................................................................ 146
4.4 A LITERARIEDADE.................................................................................................................... 149
4.5 A PLURISSIGNIFICAÇÃO LITERÁRIA.................................................................................. 151
5 LEITURA: COMO AVALIAR? HABILIDADES E COMPETÊNCIAS LEITORAS.............. 153
5.1 APROPRIANDO-SE DO TEXTO............................................................................................... 154
5.2 LITERATURA E NICHO............................................................................................................ 155
5.3 CAMINHOS DA LEITURA COMPETENTE........................................................................... 156
5.4 A LEITURA REINVENTADA.................................................................................................... 162
5.4.1 Fichamento.......................................................................................................................... 164
5.4.2 Ficha de citações.................................................................................................................. 164
5.4.3 Resumo................................................................................................................................. 165
5.4.4 Comentário.......................................................................................................................... 166
LEITURA COMPLEMENTAR........................................................................................................... 168
RESUMO DO TÓPICO 2................................................................................................................... 171
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 172

UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA..... 173

TÓPICO 1 - LEITURA NO CONTEXTO DIGITAL: PROCESSOS E ESTRATÉGIAS.......... 175


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 175
2 PROCESSOS DE MEDIAÇÃO DE LEITURA NO CONTEXTO DIGITAL ........................ 175
3 O PAPEL DO PROFESSOR FORMADOR DO ALUNO LEITOR E O
DESENVOLVIMENTO DE ESTRATÉGIAS DE MEDIAÇÃO DA LEITURA ...................... 185
RESUMO DO TÓPICO 1................................................................................................................... 194
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 195

TÓPICO 2 - TECNOLOGIAS DIGITAIS E O LETRAMENTO LITERÁRIO.......................... 197


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 197
2 LETRAMENTO LITERÁRIO......................................................................................................... 197
3 A LEITURA E O TEXTO, LEITURA E NOVAS TECNOLOGIAS ........................................ 205
3.1 UM OLHAR AO TEXTO LITERÁRIO EM INTERFACES DIGITAIS.................................. 210
RESUMO DO TÓPICO 2................................................................................................................... 215
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 216

TÓPICO 3 - COMPOSIÇÕES DO TEXTO NO CIBERESPAÇO E OS PROCESSOS DE


LEITURA DESENVOLVIDOS.......................................................................................................... 217
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 217
2 LENDO O HIPERTEXTO................................................................................................................ 217
3 TEXTO SINCRÉTICO E MULTIMODALIDADE ..................................................................... 222
RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 228
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 230

TÓPICO 4 - RECURSOS EDUCACIONAIS DIGITAIS PARA ENSINO DA LEITURA...... 233


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 233
2 RECURSOS EDUCACIONAIS DIGITAIS: TIPOS, CLASSIFICAÇÕES, USOS................ 233
3 RECURSOS EDUCACIONAIS DIGITAIS EXEMPLOS DE PRÁTICAS DE LEITURA.... 240
RESUMO DO TÓPICO 4................................................................................................................... 251
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 252
REFERÊNCIAS..................................................................................................................................... 255
UNIDADE 1 -
PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA
LEITURA

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• apresentar um panorama amplo dos conceitos de mediação e leitura;


• desenvolver a capacidade de reconhecimento da leitura como prática so-
cial;
• possibilitar a compreensão da correlação entre leitura, oralidade e escrita;
• identificar os efeitos da mediação literária na formação do leitor.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em quatro tópicos. No decorrer da unidade,
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 – A CONSTITUIÇÃO DA LEITURA


TÓPICO 2 – LEITURA E MEDIAÇÃO
TÓPICO 3 – A LEITURA E O LEITOR
TÓPICO 4 – RELAÇÕES DA LEITURA COM A ORALIDADE E COM A
ESCRITA

CHAMADA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos


em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá
melhor as informações.

1
2
TÓPICO 1 -
UNIDADE 1

A CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

1 INTRODUÇÃO
Da leitura do conhecimento histórico no desenrolar dos papiros da
antiguidade à leitura do hipertexto que se manifesta nas telas digitais muita coisa
mudou. O livro assumiu os mais diferentes formatos e o processo de autoria se
ressignificou na criação de blogs e postagens em sites de redes sociais.

Desta forma, para refletirmos sobre as práticas de leitura devemos


compreendê-la nos diferentes contextos e momentos históricos em que ela se fez
presente; assim como seu entrelaçamento às práticas sociais. Nesse contexto, este
tópico tem como meta apresentar um panorama da evolução histórica da leitura,
sua inserção na prática social e como tal dinâmica se entrelaça com os atos de
leitura do sujeito.

2 A LEITURA CONSTITUÍDA HISTÓRICO-SOCIALMENTE


Você já pensou sobre a relação que estabelecemos com a leitura ao longo
de nossa vida?

Já refletiu de que forma a leitura faz parte do cotidiano? E como a leitura,


historicamente, se formou?

Todos esses questionamentos são válidos e comporão parte de nossos


estudos. De fato, é “ponto aceito sem contestação que a leitura do texto escrito
constitui uma das conquistas da humanidade. Pela leitura, o ser humano não
só absorve o conhecimento, como pode transformá-lo em um processo de
aperfeiçoamento contínuo” (CALDIN, 2003, p. 52).

Se formos analisar, de forma mais abrangente e profunda, o papel da


leitura em nossa vida ultrapassa práticas escolares de ensino. Devemos ter a
ciência de que nossa relação com a leitura não se estabelece no contexto escolar,
ela precede nossa história — a própria história da humanidade — a qual está
entrelaçada de forma intrínseca.

A leitura faz parte de nossas vivências, atravessa nossas relações com o


mundo por meio dos sentidos que produz; sendo nosso meio de comunicação
com o mundo, de apreendê-lo em todas as suas facetas.

3
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

Além disso, a leitura pode ser compreendida sob diferentes enfoques, entre
eles: como fator de desenvolvimento cognitivo; como acesso ao conhecimento
historicamente produzido pelo pensamento humano; como modo de socialização
da informação; como manifestação da história social; como manifestação
discursiva; como modo de interação entre o sujeito-autor e o sujeito-leitor; como
fator de expressão de cidadania; como acesso a memória social; como inserção
social do sujeito nas práticas do cotidiano. Portanto, pensar a leitura constituída
histórico-socialmente é pensá-la sobre todos esses ângulos.

Destarte pensar na leitura nas práticas escolares, a leitura do saber ou do


lazer, no âmbito do desenvolvimento cognitivo e do encontro com as letras – e
mesmo o texto imagético – há a leitura do mundo como aponta Freire (1988), ou
seja, a leitura como prática social, como forma de comunicação do sujeito com
seus pares e com o mundo.

Outro ponto de refl exão é sobre a relação binária leitura-livro.

Contra toda representação, elaborada pela própria literatura, do texto


ideal, abstrato, estável porque desligado de qualquer materialidade, é
necessário recordar vigorosamente que não existe nenhum texto fora
do suporte que o dá a ler, que não há compreensão de um escrito,
qualquer que ele seja, que não dependa das formas através das quais
ele chega ao seu leitor (CHARTIER, 2002, p. 126).

A modernidade atualizou os suportes que dão materialidade ao texto


de leitura; o que, se pensarmos considerando aspectos históricos, sejam eles,
atuais ou não, identifi camos que o livro físico não é o cerne da instituição da
leitura, de interação com o texto – literário ou não. Se na pré-história o contato da
leitura ocorria através de registros rupestres ou de pergaminhos, na atualidade
navegamos pelo hipertexto e pela linguagem multimodal.

FIGURA 1 – EVOLUÇÃO DOS SUPORTES DE LEITURA

FONTE: <https://www.ultrapassandolimites.com.br/blog/wp-content/uploads/2017/08/a-impor-
tancia-da-leitura-542x341.png>. Acesso em: 24 jan. 2020.

4
TÓPICO 1 - A CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

A leitura pode ser mediada por diferentes suportes que emergem do


contexto em que as práticas de leitura se produzem (Figura 1). Um bom exemplo
é o formato navegacional em um texto impresso em um livro e um texto digital
(ebook) em um smartphone, ou outro aparelho digital; no livro a leitura ocorrerá
de modo linear, do início ao fim de uma página, no folhear de página a página,
respeitando a materialidade do livro físico (impresso); em um suporte digital
a leitura pode ser alinear, ocorre por meio de links estabelecendo conexões
intertextuais com novos textos.

Para refletirmos sobre as práticas de leitura devemos compreendê-la nos


diferentes contextos e momentos históricos em que ela se fez presente, pois eles
são distintos e irão afetar a interação com o texto e os suportes se apresentam.

É por meio da interação com o texto, que a leitura dotada de intencionalidade


promove e sofre efeitos de fatores sociais e culturais, da produção de sentido que
se estabelece entre o leitor e o texto; dela emerge a negociação de valores, ideais e
aspectos subjetivos entre o leitor, a obra e o autor do texto.

A leitura se realiza a partir do diálogo do leitor com o objeto lido —


seja escrito, sonoro, seja um gesto, uma imagem, um acontecimento.
Esse diálogo é referenciado por um tempo um espaço, uma situação;
desenvolvido de acordo com os desafios e as respostas que o objeto
apresenta, em função de expectativas e necessidades, do prazer das
descobertas e do reconhecimento de vivências do leitor (MARTINS,
1994 apud OLIVEIRA, 2015, p. 14).

De fato, as interações com a leitura sofrem efeitos do contexto sócio-


histórico no qual ela se produz e se manifesta (Figura 2).

5
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

FIGURA 2 – EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA LEITURA

FONTE: Brodbeck (2012, p. 16-21)

Quando pensamos nossa relação com a leitura, identifi camos quanto ela
está integrada em nossa história, nosso cotidiano e emerge do nosso contato com
o mundo da informação e conhecimento.

Historicamente, a leitura sofreu efeito nos seus modos de produção; ou


seja, as formas de interação entre o leitor e o texto nem sempre foram do modo
como hoje se confi gura.

Na perspectiva histórica, desde a Antiguidade até nossos dias, início


do século XXI, aconteceu e acontece uma divisão entre letrados e
não letrados, contrastes entre leitores com maior grau de habilidade
e leitores com baixo grau de letramento. Cada grupo ou indivíduo
faz uso de um tipo de leitura e de formas variadas de ler, o que lhes
confere apropriações e representações diferenciadas (KNUPPEL, 2006,
p. 4).

Knuppel (2016), em seus estudos, traça uma linha do tempo dos modos
e formas de ler que destaca as distintas relações construídas ao longo do tempo
entre o leitor e o texto (Figura 3).

6
TÓPICO 1 - A CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

FIGURA 3 – LINHA DO TEMPO MODOS DE LEITURA

FONTE: Adaptado de Knuppel (2016)

7
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

Na visão da autora “pode se observar que estas diferenças, nos modos


e formas de ler, defi nia claramente um tipo de comunidade leitora, pois cada
segmento social atribuía um signifi cado diferente ao ato de ler” (KNUPPEL, 2016,
p. 5).

E
IMPORTANT

Observamos na cronologia da leitura e sua correlação com a cognição,


temáticas frequentes em estudos que se voltam ao contexto de ensino e contexto social –
de apropriação de conhecimento.

Jou (2001, p. 144) destaca que “no ato de ler, cria-se a cognição específi ca
da leitura, desenvolvendo-se, progressivamente, tanto os conhecimentos formais
quanto os procedimentos de realização”. Considerando a cognição como ação
sobre determinado conhecimento, a autora defende que “a própria atividade de
leitura permite a utilização de estratégias específi cas [...] facilitam a recuperação
e o desenvolvimento do conhecimento específi co da leitura, criando novas
associações e aumentando, consequentemente, a capacidade de leitura” (JOU,
2001, p. 53).

Berninger et al. (2002 apud FERNANDES; MURAROLLI, 2016, p. 156)


apresentam uma arquitetura representativa do sistema de leitura (Figura 4).

FIGURA 4 – ARQUITETURA DO SISTEMA DE LEITURA

FONTE: Berninger et al. (2002 apud FERNANDES; MURAROLLI, 2016, p. 156)

8
TÓPICO 1 - A CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

Observa-se, na perspectiva apresentada pelas autoras, a correlação direta


entre o sistema de escrita e a leitura sistematizado em níveis interdependentes;
entretanto, aliados ao contexto de produção – a situação em que o discurso é
produzido – ou seja, potencialmente entrelaçado ao contexto histórico e social
onde a leitura se produz.

Tomemos em primeiro lugar a leitura. Está ela sendo praticada como


passatempo ou como algo que passa além do seu tempo de realização?
É a segunda modalidade que mais me interessa. O leitor leva rastros do
vivido no momento da leitura para depois ou para fora do momento
imediato – isso torna a leitura uma experiência. Sendo mediata ou
mediadora, a leitura levada pelo sujeito para além do dado imediato
permite pensar, ser crítico da situação, relacionar o antes e o depois,
entender a história, ser parte dela, continuá-la, modificá-la (KRAMER
2000, p. 20).

A interação do leitor com a perspectiva histórica – temporal – trazida pela


leitura, como destaca Kramer (2000), vai ao encontro da assertiva de Santos (2015,
p. 31) quando ressalta que o leitor “confere ao texto os sentidos que a sua época e
o seu mundo lhe permitem”.

Para compreender melhor a necessidade de alinhamento do conhecimento


do contexto histórico entre o texto e o leitor observe o excerto de música de Chico
Buarque e Milton Nascimento:

Cálice (1973)

Pai, afasta de mim esse cálice


Pai, afasta de mim esse cálice
Pai, afasta de mim esse cálice
De vinho tinto de sangue

[...]

Como é difícil acordar calado


Se na calada da noite eu me dano
Quero lançar um grito desumano
Que é uma maneira de ser escutado
Esse silêncio todo me atordoa
Atordoado eu permaneço atento

FONTE: <https://www.letras.mus.br/chico-buarque/45121/>. Acesso em: 24 jan. 2020. (grifo


nosso)

Você considera que os sentidos produzidos pela leitura desse excerto na


atualidade seria o mesmo que os produzidos em 1973?

9
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

DICAS

Gilberto Gil, cantor e compositor brasileiro, explica a música Cálice e discute


a censura nas artes durante o período da ditadura. Assista ao vídeo disponível em: https://
youtu.be/8CnSiaP-jL4.

No contexto contemporâneo o termo cálice pode ser compreendido


simplesmente como um copo com formato diferenciado dos demais. Agora,
vamos pensar no contexto sócio-histórico da produção desse texto – período
compreendido entre 1964 e 1985 (Figura 5) – que no Brasil corresponde ao governo
militar, denominado também como ditadura, época de censura a determinadas
formas de produção artística (Figura 5) e intelectual.

FIGURA 5 – ARQUITETURA DO SISTEMA DE LEITURA

FONTE: <http://twixar.me/jw0m>. Acesso em: 24 jan. 2020.

10
TÓPICO 1 - A CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

NOTA

A censura nesse período se apoiou no Decreto-Lei nº 1.077, de 26 de janeiro


de 1970.

O sentido registrado pelos censores potencialmente se referia ao ato de


“calar-se”, o que levou a letra da música a ser censurada e proibida de divulgação
durante cinco anos. Tal ação, segundo Bicicgo (2013, p. 62), tem o objetivo de
“controlar o discurso do autor, mas, também, regular os sentidos produzidos
pelo leitor”.

Essa acepção vai ao encontro do que defende Santos (2015, p. 31) para
quem os sentidos emergentes de uma leitura “são resultado do confronto entre as
histórias de leitura do sujeito-leitor e as condições sócio-históricas de realização
da leitura de determinado texto. Esse confronto impede a existência de um único
sentido, como também o exagero da pluralidade infinita de leituras”.

AUTOATIVIDADE

Faça uma pesquisa de outros tipos de artes, além da música, que foram
censuradas no Brasil durante o regime militar.

2.1 A LEITURA COMO PRÁTICA SOCIAL


A leitura, enquanto prática social, remonta à antiguidade, segundo
Fernández e Kanashiro (2011, p. 134):

[...] a atividade física de ler também passou por transformações. A


leitura oral representada pelos pintores e iluminadores como um
esforço intenso que mobilizava o corpo inteiro, cedeu espaço para a
leitura dos livros folheados no qual o leitor manuseia suas páginas.
Atualmente também convivemos com a leitura digital, cuja mediação
se dá pela tela do computador.

Obras e suportes de leitura são, na atualidade, escolhas do leitor.

Entretanto, ler nem sempre esteve associado à liberdade, a escolhas


democráticas. Ao mergulharmos na obra de Umberto Eco, O nome da Rosa,
fazemos uma viagem ao contexto medieval. É possível perceber os perigos que
a leitura trazia para aqueles que queriam controlar as pessoas, mesmo num

11
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

período de poucos letrados. Por isso, alguns manuscritos confiscados pela Igreja,
a detentora do poder na época, ficaram escondidos até mesmo dos monges
copistas. As escrituras que escaparam da fogueira, se encontram nos recônditos
de uma secreta biblioteca de mosteiro, acorrentadas às prateleiras cheirando a
ranço e mofo, pois abrigavam em suas páginas as descobertas e os devaneios
daqueles que se permitiram ir além dos ensinamentos religiosos. Escritos que para
a época podiam corromper as mentes das pessoas, fazendo-as pensar, imaginar
e devanear. A censura angariou séculos e apesar dos avanços ocorridos com a
renascença, a modernidade e a pós-modernidade, ela é instrumento daqueles
que novamente querem controlar as pessoas. O medo de que a leitura corrompa,
transgrida, se rebele pode ser percebido no decorrer da história. Temos aqui no
Brasil um grande exemplo, se adentrarmos na história da Inconfidência Mineira,
seus líderes eram leitores assíduos, críticos, inconformados com sua situação.
Tais fatos levantam questões que empoderam a leitura e ressalta a importância
do ato de ler e suas influências sobre o sujeito leitor.

Desta forma podemos dizer que:

A leitura surge em nosso dia-a-dia como uma ação básica do homem


no universo. De tudo que vislumbramos, que olhamos naturalmente
e, às vezes, involuntariamente, fazemos uma leitura. Quando abrimos
um jornal, quando vimos uma briga de rua, quando olhamos um
desenho, uma obra de arte, ao ouvirmos uma música, de todos esses
exemplos, cada ser humano, além de uma leitura metódica e didática,
fazemos uma leitura — interpretação — crítica. Essa leitura é que nos
caracteriza como ser pensante. Modificante e crítico da sociedade
vigente (VITORIO, 2017, s.p.).

No tópico anterior vimos que os modos e formas de ler vão se compondo


a partir de distintos suportes, e que as formas de interação entre o leitor e o texto
nem sempre foram do modo como na atualidade se constrói; assim como, que a
leitura sofre, e promove efeitos, do contexto histórico e social em que se produz.

O que é prática social e como tal dinâmica se entrelaça com os atos de


leitura do sujeito?

Para responder a esse questionamento devemos pensar a relação do


homem – sujeito leitor – com o mundo social por meio da linguagem, compreender
como esse mundo se constitui e o papel da leitura nessa relação.

Indissociável pensar leitura como prática social – aqui considerada


enquanto situações de interação e comunicação na qual os sujeitos se inserem – e
não pensar na relação do sujeito com a linguagem.

Como a linguagem se insere nas práticas sociais?

A partir da ótica de Vygotsky (1998) e Bakhtin (1995), concebe-se linguagem


como forma de manifestação do pensamento e mediadora da relação do sujeito
com a realidade; compreendida como “o lugar da interação, da negociação de

12
TÓPICO 1 - A CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

sentidos, da representação de papeis, constituição de identidades” (SOUZA;


MOTA, 2007, p. 506), portanto, base de toda prática social ou práticas de uso da
língua.

As marcas individuais e as determinadas pelo lugar social de onde


provém o sujeito estarão presentes tanto na produção do texto quanto
na leitura. A interação sujeito/linguagem na leitura é caracterizada por
uma situação de intersubjetividade do leitor/texto que se relacionam
durante a enunciação, ambos com identidades sociais próprias
(DELL’ISOLA, 1993, p. 167).

A leitura como prática social se concretiza através do uso da língua


“diretamente vinculado com as relações estabelecidas entre os indivíduos que
vivem em sociedade e com a história da civilização humana” (SALDANHA,
2016, p. 31).

E
IMPORTANT

Se considerarmos o sujeito e sua relação com o mundo social, ou seja,


o sujeito como ser social constituído pela linguagem, como defende Bakhtin (2003), o
conceito de língua como unicamente sistema de signos é ultrapassado e não dá conta das
necessidades de estudo sobre a leitura como prática social.

Para Grotta (2000) a leitura é uma atividade de linguagem mediadora da


relação sujeito-cultura-mundo social; sendo por meio dela que o sujeito social
acessa o conhecimento e conquista elementos que lhe possibilitam “compreender,
participar e intervir em sua realidade” (GROTTA, 2000, p. 25).  Soares (2000, p.
18) complementa dizendo que a leitura é “interação verbal entre indivíduos, e
indivíduos socialmente determinados: o leitor, seu universo, seu lugar na estrutura
social, suas relações com o mundo e com os outros; o autor, seu universo, seu
lugar na estrutura social, suas relações com o mundo e os outros”.

13
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

FIGURA 6 – FUNÇÃO SOCIAL DA LEITURA

FONTE: Os autores

A leitura não tem uma função una (Figura 6), é modo de acesso ao
mundo social, se constitui socialmente enquanto “processo que além de mediar
a aquisição de conhecimentos, apresenta uma natureza política e ideológica,
que tem a possibilidade de moldar os sujeitos a agir conforme determinados
princípios” (VITORIO, 2017, s.p.). A ideologia se faz presente na leitura, seja na
visão de mundo de seu autor quanto no sentido que ao leitor produz e que esse
internaliza. A ideologia “está presente no sentido das palavras, na estrutura/
organização de um texto, nas metáforas, na própria coerência do discurso e nas
convenções discursivas de que faz uso [...] As ideologias são, portanto, ideias e
crenças veiculadas no discurso” (SILVA; GONÇALVES, 2017, p. 12).

Ler é uma prática social que se interliga a outros textos e outras


leituras, ou seja, a leitura de um texto pressupõe em ações conjuntas
de valores, crenças e atitudes que refl etem o grupo social em que as
pessoas estão inseridas. A leitura não é apenas o entendimento de um
leitor inserido na cultura letrada, mas uma relação de aspectos sociais
e culturais que perpassam pela atividade intelectual em que o leitor
utiliza diversas estratégias baseadas em seu conhecimento linguístico,
sociocultural e enciclopédico ( KLEIMAN, 2013 apud EVANGELISTA;
JERÔNIMO, 2014, p. 6-7).

14
TÓPICO 1 - A CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

DICAS

Assista ao filme O Nome da Rosa, ou leia o livro homônimo de Umberto Eco.


Esta obra reflete aspectos da autoria (muitos textos ao longo da história não tiveram seu
autor nomeado por risco de perseguição. Neste enredo que remete a era medieval, você vai
transitar numa época de poucos letrados, de domínio religioso. Estranhas mortes começam
a ocorrer num mosteiro beneditino localizado na Itália durante a baixa Idade Média, onde as
vítimas aparecem sempre com os dedos e a língua roxos. O mosteiro guarda uma imensa
biblioteca, onde poucos monges têm acesso às publicações sacras e profanas. A chegada
de um monge franciscano, incumbido de investigar os casos, irá mostrar o verdadeiro
motivo dos crimes, resultando na instalação do tribunal da santa inquisição.

Para Brandão (1994 apud PEREIRA; FREITAS; ARAÚJO, 2016 p. 5) “a


leitura como atividade de linguagem é uma “prática social de alcance político. Ao
promover a interação entre indivíduos, a leitura, não só como leitura da palavra,
mas também como leitura de mundo, deve ser atividade constitutiva de sujeitos
capazes de interligar o mundo e nele atuar como cidadãos” (Figura 7).

FIGURA 7 - IMAGEM REPRESENTATIVA DA RELAÇÃO LEITURA-AUTONOMIA DO SUJEITO

FONTE: <http://twixar.me/Bw0m>. Acesso em: 24 jan. 2020.

A leitura — enquanto prática social — possibilita ao sujeito a inserção


em todos os campos sociais, o diálogo com o mundo e acesso ao espaço do
conhecimento.

A leitura, como ato social, promove a autonomia do sujeito e sua inserção


em distintos âmbitos da sociedade; organiza-se como “um instrumento de poder,
porque dá ao sujeito a capacidade de ampliar seus conhecimentos e as suas
possibilidades comunicativas, [...] enriquecendo-o e permitindo transformar para
transformar a realidade em que está inserido” (VITORIO, 2007, s.p.).

15
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

Na perspectiva defendida por Pereira, Freitas e Araújo (2016, p. 4), a


leitura como prática social “exige um leitor reflexivo, atento e que seja capaz de
empregar seus conhecimentos prévios, sejam linguísticos, textuais e de mundo, a
fim de que possa construir novos enunciados”.

Sobre a leitura de mundo, para Freire (1989 apud SILVA, 2013, p. 3)


“precede sempre a leitura da palavra e a leitura desta implica a continuidade da
leitura daquele. A leitura é associada à forma de ver o mundo”.

Ler sempre representou uma das ligações mais significativas do ser


humano com o mundo. Lendo, reflete-se e presentifica-se na história.
O homem, permanentemente, realizou uma leitura de mundo. Em
paredes de cavernas ou em aparelhos de computação, lá está ele
reproduzindo seu “estar-no-mundo” e reconhecendo-se como capaz
de representação. Certamente, ler é engajamento existencial. Quando
dizemos ler, nos referimos a todas formas de leitura. Lendo, nos
tornamos mais humanos e sensíveis (CAVALCANTI, 2002, p. 13).

Leitura como prática social também é leitura do mundo e de si neste


mundo; leitura do mundo, que precede a leitura das letras, o mundo da linguagem,
constrói-se no mundo dos sentidos possíveis e infinitos; “precede a leitura da
palavra, daí que a posterior leitura desta não possa prescindir da continuidade
da leitura daquele. Linguagem e realidade se prendem dinamicamente. A
compreensão texto a ser alcançada por sua leitura crítica implica a percepção das
relações entre o texto e o contexto” (FREIRE, 1995 apud CARDOSO, 2011, p. 43).

DICAS

O educador Paulo Freire dizia que o homem lê o mundo antes de ler a


palavra. Esta é uma das ideias presentes no documentário Paulo Freire Contemporâneo,
que resgata o método de alfabetização criado pelo educador. Assista ao documentário
disponível no endereço: http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.
do?select_action=&co_obra=99980.

O contexto a que Freire se refere é o da interlocução do espaço temporal


no qual a escrita do texto se fez até o momento de seu encontro com o leitor. Esse
é o espaço da significância, da produção de sentidos.

16
TÓPICO 1 - A CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

Ler é, pois, um ato de primeira instância no esboço da consciência


de si mesmo e do outro e sua inscrição no mundo se dá como uma
escrita, devida. Do ato de ler decorre ao ato de escrever, de escrever a
própria história e dos outros, de marcar a própria existência social com
traços que podem, no entanto, guardar-se sob a forma das oralidades,
tanto quanto ganhar volumes, cores e sinais. [...] Ler é inscrever-
se no mundo como signo, entrar na cadeia significante, elaborar
continuamente interpretações que dão sentido ao mundo, registrá-
la com palavras, gestos, traços. Ler é significar e ao mesmo tempo
tornar-se significante. A leitura é uma escrita de si mesmo, na relação
interativa que dá sentido ao mundo (YUNES, 1995, p. 195).

De fato, a leitura não se prende ao texto escrito — apesar de com ele


estabelecer uma relação próxima e indissociável —, vai além dele e age na
oralidade — que tem como base a leitura da memória. A transmissão de contos
orais, que se fez presente em grande parte da nossa história, não seria uma leitura
da memória?

Como afirma Silva (1985 apud CALDIN, 2003, p. 52), “a leitura, se levada
a efeito crítica e reflexivamente, levanta-se como um trabalho de combate à
alienação (não-racionalidade). Dessa forma, a leitura se caracteriza como sendo
uma atividade de questionamento, conscientização e libertação”; é uma prática
social que conduz “o leitor, enquanto sujeito histórico, a inscrever-se em uma
disputa de interpretações” (CAZARIN, 2006, p. 307).

A prática social não se faz sem a prática discursiva, “essa articulação é


realizada pelos sujeitos sociais (reflexividade presente na prática discursiva), que,
a seu modo, internalizam as práticas sociais e constroem uma prática discursiva
própria” (SILVA; GONÇALVES, 2017, p. 7).

Para Fairclough (1995; 2001; 2005 apud SILVA; GONÇALVES, 2017,


p. 8), que conceitua discurso como “prática, não apenas de representação do
mundo, mas de significação do mundo, constituindo e construindo o mundo
em significado”, ocorrem implicações em pensar a própria linguagem, em uma
perspectiva discursiva, como prática social (Figura 8).

17
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

FIGURA 8 – PRÁTICA SOCIAL E PRÁTICA DISCURSIVA

FONTE: Adaptado de Fairclough (1995; 2001; 2005 apud SILVA; GONÇALVES, 2017, p. 6)

O linguista, em uma concepção tridimensional do discurso, situa a prática


social agregadora da prática discursiva e do texto (Figura 9).

FIGURA 9 – CONCEPÇÃO TRIDIMENSIONAL DO DISCURSO

FONTE: Fairclough (2001 apud SILVA; GONÇALVES, 2017, p. 9)

18
TÓPICO 1 - A CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

As práticas sociais nessa perspectiva são compostas de quatro momentos


de articulação que, impactados pela estrutura e ações (eventos), instituem o
momento discursivo das práticas através da mobilização de gêneros, discursos e
estilos (Figura 10).

FIGURA 10 - MEDIAÇÃO DE ESTRUTURA E AÇÃO PELA PRÁTICA SOCIAL

FONTE: Chouliaraki e Fairclough (1999 apud ACOSTA; RESENDE, 2014, p. 131)

A prática social em interlocução ao ato de ler, “na medida em que vem


apelar ao receptor por sua participação, acaba provocando suas memórias e nelas,
suas posturas, seus sonhos, suas opiniões antes tão encobertas ou desconhecidas
por ele próprio; crenças, valores materializados em discursos” (YUNES,1995, p.
191, grifo nosso); mobilizando a constituição do sujeito-cidadão.

Como vimos (Figura 6), uma das funções sociais da leitura é o


desenvolvimento da cidadania.

Mas ser letrado e ler na vida e na cidadania é muito mais que isso:
é escapar da literalidade dos textos e interpretá-los, colocando-os em
relação com outros textos e discursos, de maneira situada na realidade
social; é discutir com os textos, replicando e avaliando posições e
ideologias que constituem seus sentidos; é, enfim, trazer o texto para
a vida e colocá-lo em relação com ela. Mais que isso, as práticas de
leitura na vida são muito variadas e dependentes de contexto, cada um
deles exigindo certas capacidades leitoras e não outras (ROJO, 2002,
p. 2).

Antes de nos aprofundarmos na relação entre leitura e cidadania, vamos


nos deter no conceito do que significa(ou) o termo ao longo da história.

19
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

Rezende Filho e Câmara Neto (2001) discorrem sobre a evolução histórica


do conceito de cidadania (Figura 11); os autores destacam que mesmo ao longo da
evolução do termo a cidadania “de fato só pode se constituir por meio de acirrada
luta quotidiana por direitos e pela garantia daqueles que já existem” (REZENDE
FILHO; CÂMARA NETO, 2001, p. 5); dessa forma vemos o importante papel
da leitura como modo de inserção do sujeito na sociedade na busca de atuar de
forma crítica e defensora de seus direitos — e cumpridor de seus deveres — no
papel de cidadão.

FIGURA 11 – EVOLUÇÃO DO CONCEITO DE CIDADANIA

FONTE: Adaptado de Rezende Filho e Câmara Neto (2001)

20
TÓPICO 1 - A CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

De acordo com os autores “apesar da existência de profundas


desigualdades sociais, esse termo evoluiu com o passar dos anos. Ampliou a
abrangência abraçando todas as classes sociais. Deixou de restringir-se apenas à
participação política para relacionar uma série de deveres da sociedade para com
o cidadão” (REZENDE FILHO; CÂMARA NETO, 2001, p. 6). Martins e Sá (2008,
p. 239) defendem que a leitura é essencial na formação do cidadão “perfeitamente
integrado nas sociedades”; para as autoras:

a capacidade de usar a informação escrita (através da leitura) é uma
questão de sobrevivência na vida do cidadão, um fator de facilidade
no acesso à cultura comum e na sua partilha, na mobilidade social. A
incapacidade de o fazer constitui um fator de redução do nível e da
qualidade da participação social, logo, de exclusão social (MARTINS;
SÁ, 2008, p. 240, grifo nosso).

A partir dessa premissa “as práticas discursivas de leitura e de escrita


devem ser encaradas como fenômenos sociais que ultrapassam os limites da
escola” (MARTINS; SÁ, 2008, p. 245). Marinho (1983, p. 92) destaca que a leitura
é o “elo das coletividades e suas relações para a unidade social; é a nascente da
consciência e o desvelar do mundo”; para a autora “o exercício da cidadania e
a conquista das condições humanas de vida passa por três princípios básicos: o
direito civil, o direito social e o direito político” (MARINHO, 1983, p. 92).

A LEITURA PARA CRÍTICA SOCIAL

Gabriela Fagundes Padilha


Fernanda Souza

Ler é ferramenta primordial para que o Ser Humano saiba posicionar-
se, ter opiniões próprias e ser crítico. Uma vez que:

Ler significa ser questionado pelo mundo e por si mesmo, significa


que certas respostas podem ser encontradas na escrita, significa poder
ter acesso a essa escrita, significa construir uma resposta que integra
parte das novas informações ao que já se é (FOUCAMBERT, 1994, p.
5).

Segundo Kuenzer (2002, p. 101), “ler significa em primeiro lugar, ler


criticamente, o que quer dizer perder a ingenuidade diante do texto dos outros,
percebendo que atrás de cada texto há um sujeito, com uma prática histórica,
uma visão de mundo (um universo de valores), uma intenção”. A leitura crítica
é geradora de significados, em que ao ler, o leitor concorda ou discorda da
ideia principal. Isto faz com que seja diferenciada da decodificação de sinais,
reprodução mecânica de informações que por muito tempo foi considerada
como interpretação textual. “[…] como atividade constitutiva de sujeitos
capazes de interligar o mundo e nele atuar como cidadãos” (BRANDÃO;
MICHELITTI, 1998, p. 22).

21
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

Segundo Freire (1989, p. 13) “a leitura da palavra não é apenas


precedida pela leitura do mundo, mas por uma certa forma de ‘escrevê-lo’
ou de ‘reescrevê-lo’, quer dizer, de transformá-lo através da nossa prática
consciente”. Entendemos, então, que a leitura crítica desestabiliza o mundo
interior do indivíduo; gera-lhe dúvidas e anseios por mudanças. Em um
primeiro momento, ocorre a inquietação; depois, alguns ajustes são feitos
no mundo interior do leitor por meio da reflexão para, finalmente, ocorrer a
prática consciente, que consiste no resultado do novo sujeito transformado,
porém não concluído. Afinal, outras leituras de mundo serão lidas e relidas.

Para formar um leitor crítico, é importante que, desde o processo de


aquisição da linguagem escrita e no ato de ler, haja a compreensão por parte
daqueles que ensinam, que o processo de alfabetização se dará na medida
em que a leitura da palavra esteja inserida na leitura do mundo e estimule a
continuidade da leitura dele (FREIRE, 1989).

Silva (2002) define a criticidade na leitura dizendo que é pela leitura


crítica o sujeito abala o mundo das certezas (principalmente as da classe
dominante), elabora e dinamiza conflitos, organiza sínteses, enfim combate
assiduamente qualquer tipo de conformismo, qualquer tipo de escravização às
ideias referidas pelos textos.

No ato de ler prevalece, portanto, a liberdade por parte do leitor em fazer


as suas escolhas. Sua prática permite ainda articular os conteúdos culturais;
expandir a memória; estimular a produção de textos e determinar processos de
pensamento. Possibilita ainda a formação de pessoas abertas ao mundo, cuja
visão está voltada para o futuro (ALLIENDE; CONDEMARÍN, 2005).

Pode-se, então, concluir que a prática da leitura crítica caminha de


mãos dadas com a autonomia. Afinal, um sujeito autônomo e crítico não se
contentará com leituras que não lhe forneçam novas relações, associações ou
combinações de ideias. De acordo com Silva “todas essas ações subjacentes ao
trabalho de interlocução do leitor crítico podem ser amalgamadas num único
conceito, qual seja o de POSICIONAMENTO” (SILVA, 2002, p. 29).

Enfim, ler liberta, impulsiona as possibilidades de conhecimento a níveis


inimagináveis, transforma a consciência do Ser Humano perante o mundo em
que vive, dota o leitor a ser capaz de abrir inúmeras portas do desconhecido,
instiga ao infinito.

FONTE: <http://www.uniedu.sed.sc.gov.br/wp-content/uploads/2016/02/Gabriela-Fagundes-
-Padilha.pdf>. Acesso em: 24 jan. 2020.

22
TÓPICO 1 - A CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

DICAS

Agora que você já conhece a importante função da leitura como prática social,
pesquise uma experiência desta prática que comprove sua potência. Para aprofundar a
reflexão sobre esta atividade sugerimos a leitura do Capítulo 1 da obra de Michèle Petit, A
arte de ler ou como resistir a adversidade. Nesta obra a autora mostra, por meio de diversos
discursos de jovens, a potência da leitura como afetamento e prática social. Disponível em:
https://www.academia.edu/33104273/A_arte_de_ler_ou_como_resistir_a_adversidade_
Michele_Petit.

23
RESUMO DO TÓPICO 1

Neste tópico você aprendeu que:

• A leitura faz parte de nossas vivências, atravessa nossas relações com o mundo
por meio dos sentidos que produz; sendo nosso meio de comunicação com o
mundo.

• A modernidade atualizou os suportes que dão materialidade ao texto de


leitura; hoje navegamos pelo hipertexto e pela linguagem multimodal.

• Para refletirmos sobre as práticas de leitura devemos compreendê-la nos


diferentes contextos e momentos históricos em que ela se fez presente.

• É por meio da interação com o texto, que a leitura promove e sofre efeitos de
fatores sociais e culturais, da produção de sentido que se estabelece entre o
leitor e o texto.

• Os sentidos emergentes de uma leitura são resultado do confronto entre as


histórias de leitura do sujeito-leitor e as condições sócio-históricas de realização
da leitura de determinado texto.

• A leitura como prática social se concretiza através do uso da língua diretamente


vinculado com as relações estabelecidas entre os indivíduos que vivem em
sociedade e com a história da civilização humana.

• A leitura não tem uma função una, é modo de acesso ao mundo social, se
constitui socialmente enquanto processo que além de mediar a aquisição de
conhecimentos, apresenta uma natureza política e ideológica.

• A leitura – enquanto prática social – possibilita ao sujeito a inserção em todos


os campos sociais, o diálogo com o mundo e acesso ao espaço do conhecimento.

24
AUTOATIVIDADE

1 Sabe-se que o que está além do alcance dos olhos, o que se esconde por
trás das linhas, os conhecimentos prévios, enfim, são elementos necessários
para a compreensão do texto, o que ultrapassa em muito, os limites da
simples decodificação. O leitor não é mais um receptor passivo orientado
pela ordem do texto, mas é capaz de construir sentido a partir da direção
e elaboração de seu pensamento e a sua imagem de mundo. Levando-se
em consideração as quatro etapas do processo de leitura: decodificação,
compreensão, interpretação e retenção (MENEGASSI, 1995, p. 86-89), e
sabendo-se do valor de cada uma delas, verifica-se que, para que ocorra
uma leitura eficiente, de acordo com os moldes atuais, a segunda etapa —
compreensão — é indubitavelmente a de maior importância para que o
leitor ultrapasse os limites do campo visual; ou seja, compreender um texto
significa apreender sua temática e seus tópicos principais, utilizando-se,
para isso, de todos os conhecimentos prévios que lhe dizem respeito. Até há
algumas décadas, a leitura consistia no simples reconhecimento de letras,
sílabas e palavras. As pessoas se preocupavam com uma boa pronúncia
ao ler, bloqueando, muitas vezes, seu entendimento sobre o conteúdo
adquirido, ou seja, não saindo da primeira etapa do processo de leitura,
não iam muito além do domínio de pronúncia.

FONTE: GREGHI, R. N.; CAMACHO, S.; FECCHIO, M. Afinal, por que tanta dificuldade em
leitura? Akrópolis, Umuarama, v. 12, n. 3, jul./set., 2004.

Segundo Santos (2015), os sentidos emergentes de uma leitura são resultado:


a) ( ) Do processamento sintático/gramatical que promove a compreensão
do discurso baseado em texto.
b) ( ) Dos modos e formas de ler, definidos pela comunidade leitora, pois
cada segmento social atribuí um significado diferente ao ato de ler.
c) ( ) Do confronto entre as histórias de leitura do sujeito-leitor e as condições
sócio históricas de realização da leitura de determinado texto.
d) ( ) Do contraste entre leitores com maior grau de habilidade e leitores com
baixo grau de letramento.
e) ( ) Do ritmo acelerado das inovações tecnológicas que transformaram a
maneira de ver o mundo.

2 Sobre as práticas de constituição da leitura, avalie as afirmações a seguir:

I- Para refletirmos sobre as práticas de leitura devemos compreendê-la nos


diferentes contextos e momentos históricos em que ela se fez presente,
pois eles são distintos e irão afetar a interação com o texto e os suportes se
apresentam.

25
II- No século XIX começa a se consolidar o tipo de leitura como preocupação
presente em muitos autores, surgem novas ideias e a necessidade de
um lugar que seja destinado às crianças na sociedade, além de novos
procedimentos nas áreas pedagógica e literária.
III- O confronto entre as histórias de leitura do sujeito-leitor e as condições
sócio ideológicas de realização da leitura de determinado texto impede a
existência de um único sentido, como também o exagero da pluralidade
infinita de leituras (SANTOS, 2015).

Sobre as assertivas anteriores, é correto o que se afirma em:


a) ( ) I, apenas.
b) ( ) II, apenas.
c) ( ) I e II.
d) ( ) II e III.
e) ( ) I, II e III.

26
TÓPICO 2 -
UNIDADE 1

LEITURA E MEDIAÇÃO

1 INTRODUÇÃO
Para refletirmos sobre a correlação entre leitura e mediação devemos
compreender as diferentes concepções que esses termos podem assumir; assim
como as relações estabelecidas entre eles.

Nesse contexto, este tópico tem como meta apresentar as concepções de
leitura e mediação sob diferentes perspectivas teóricas e as intersecções entre
linguagem, leitura e práticas de mediação.

A leitura abre um espaço íntimo no ser de introspecção, de reflexão, da
imaginação. Ela nem sempre tem a capacidade de reparar as desigualdades, mas
serve como impulso para mudanças de pensamento e até de contexto pessoal,
como a história de Ben Carson, negro, filho de mãe solteira e simples empregada
doméstica, que investe nos filhos, os sonhos que não pode realizar. Este, por sua
vez, encontra nos livros os caminhos para a tão sonhada medicina, impulsionada
pela grande mediadora sua mãe. A leitura e o mediador incansável como agentes
contribuintes e encaminhadores do pensamento construtivo e não da violência.
A leitura abriu um campo de possibilidades, onde não parecia existirem muitas
margens de manobra.

2 CONCEPÇÕES DE LEITURA E MEDIAÇÃO


Segundo Frizon e Grazioli (2018, p. 1):

As memórias que um leitor tem em relação aos seus primeiros


contatos com as narrativas, orais ou escritas, muitas vezes se tornam
marcantes em sua trajetória. A mãe que entoava canções ou lia, ainda
quando a criança estava em seu ventre ou já no colo. A avó que
contava histórias ao pé da cama. A professora que criou o cantinho de
leitura. O pai e a mãe, ou outro familiar qualquer, que presenteou com
um primeiro livro. Há também o professor contador de histórias. O
mediador de leitura. A bibliotecária que dispunha as obras da melhor
forma possível, instigando os alunos a abrirem aqueles exemplares. O
amigo que falou sobre determinado personagem e o enredo de uma
narrativa, instigando para o ato de ler. A pessoa que fez com que, de
algum modo, o livro chegasse as mãos de um futuro leitor.

27
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

Neste contexto, a interação entre a leitura e o leitor através de um


mediador – um familiar, um professor, um bibliotecário – se apresenta como
uma interlocução do leitor não somente com o livro – enquanto objeto de leitura
– mas com outros leitores que vão possibilitar ou potencializar o ato de ler,
principalmente aos leitores iniciantes. Traçado o panorama histórico da leitura,
e identificada sua interlocução com práticas sociais de linguagem, vamos nos
debruçar sobre os dois principais conceitos que nortearão nossos estudos: leitura
e mediação.

No tópico anterior foi introduzido, brevemente, o conceito de leitura e já


apontada a ausência de uma concepção única, mas sim a presença de distintos
significados atrelados a campos de estudos e diferentes abordagens teóricas. O
que nos apresenta um grande desafio: o de compreender os trajetos dos diferentes
sentidos que o termo vai adquirindo.

Como aponta Aebersold e Field (1997 apud CAMPOS, 2008, p. 58), “definir
leitura não é uma tarefa fácil, mas poderíamos tentar explicá-la de uma forma
bem simplista: leitura é o que acontece quando uma pessoa olha para um texto
qualquer e atribui sentido aos símbolos gráficos nele inseridos”.

Com a meta de ampliar sua visão sobre tal conceito, e visando


compreender tal complexidade na definição do termo, elaboramos um quadro
que lhe possibilitará trajetar pelos distintos sentidos da expressão leitura com
base em autores de diferentes áreas de estudo (Quadro 1).

QUADRO 1 – LEITURA – DIFERENTES ACEPÇÕES SOBRE O TERMO


Bakhtin (1981 apud A leitura se constitui em um processo interativo entre autor,
SILVA 2012, p. 24) leitor e as várias vozes que eles representam propiciando, por
conseguinte, construção e reconstrução de significados e gerando
um processo ativo que constitui os sujeitos e confere vida à
linguagem.
Rangel (1990 apud Ler é uma prática básica essencial para aprender. Trata-se de
SILVA 2013, p. 9) uma situação de aprendizagem em que leve o educando a pensar,
fazer inferências, apropriar-se de sentidos a partir de contextos
linguísticos, históricos e situacionais e que remeta ao conhecimento
de mundo e por ser esta prática fundamental na formação de um
educando letrado, e atuante no mundo globalizado que estamos
inseridos.
Smith (1991, p. 201) A leitura não é uma questão de identificar letras, a fim de reconhecer
as palavras para que se obtenha o significado das sentenças. A
identificação do significado não requer a identificação de palavras
individuais, exatamente como a identificação de palavras não
requer a identificação de letras. Na verdade, qualquer esforço
por parte de um leitor, para identificar palavras uma de cada
vez, sem aproveitar a vantagem de sentido como um todo, indica
um fracasso para a compreensão e está provavelmente fadado ao
fracasso.

28
TÓPICO 2 - LEITURA E MEDIAÇÃO

Lajolo et al. (1991, Ler não é decifrar, como num jogo de adivinhações, o sentido
p. 59) de um texto. É, a partir de um texto, ser capaz de atribuir-lhe
significação, conseguir relacioná-lo a todos os outros textos
significativos para cada um, reconhecer nele o tipo de leitura que
seu autor pretendia e, dono da própria vontade, entregar-se a esta
leitura, ou rebelar-se contra ela, propondo outra não prevista.
Yunes (1995, p. 193- Ler é um ato de primeira instância no esboço da consciência
195) de si mesmo e do outro e sua inscrição no mundo se dá como
uma escrita, de vida. [...] A dimensão, pois, do ato que se crê
centralizado depois da alfabetização, está longe de ser reduzida às
letras combinadas em códigos fonéticos-fonológicos, morfológico
e sintáticos. [...] Ler é inscrever-se no mundo do signo, entrar na
cadeia significante, elaborar continuamente interpretações que
dão sentido ao mundo, registrá-la com palavras, gestos, traços.
Ler é significar e ao mesmo tempo tornar-se significante. A leitura
é uma escrita de si mesmo, na relação interativa que dá sentido ao
mundo.
O ato de ler, assim, carrega para um encontro entre
intersubjetividades e memórias várias que se interpenetram e
resultam na interpretação.
Goulemont (1996 Ler é dar um sentido de conjunto, uma globalização e uma
apud CHARTIER articulação aos sentidos produzidos pelas sequências. Não é
2000, p. 107). encontrar o sentido desejado pelo autor [...] ler é, portanto,
constituir e não reconstruir sentido.
Leffa (1996, p. 10) A leitura é basicamente um processo de representação. Como esse
processo envolve o sentido da visão, ler é, na sua essência, olhar
para uma coisa e ver outra. A leitura não se dá por acesso direto à
realidade. Nessa triangulação da leitura o elemento intermediário
funciona como um espelho; mostra um segmento do mundo
que normalmente nada tem a ver com sua própria consistência
física. [...] Como esses espelhos oferecem imagens fragmentadas
do mundo, a verdadeira leitura só é possível quando se tem um
conhecimento prévio desse mundo.
Solé (1998 apud Leitura é um processo mediante o qual se compreende a
Queirós, 2012, p.3-7) linguagem escrita [...] para ler necessitamos simultaneamente
manejar com destreza as habilidades de decodificação e aportar
ao texto nossos objetivos, ideias e experiências prévias. Para uma
pessoa se envolver em qualquer atividade de leitura, é necessário
que ela sinta que é capaz de ler, de compreender o texto, tanto
de forma autônoma, como apoiada em leitores mais experientes.
Enfatiza-se a leitura de verdade, aquela que realizamos os leitores
experientes e que nos motiva, é a leitura que na qual nós mesmos
mandamos: relendo, parando para saboreá-la ou para refletir.
Soares (2000, p. 18) Leitura não é esse ato solitário; é interação verbal entre indivíduos,
e indivíduos socialmente determinados: o leitor, seu universo, seu
lugar na estrutura social, suas relações com o mundo e com os
outros; o autor, seu universo, seu lugar na estrutura social, suas
relações com o mundo e os outros.

29
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

Indursky (2001) Ler é mergulhar em uma teia discursiva invisível construída de


já-ditos para desestruturar o texto e (re)construí-lo, segundo os
saberes da posição-sujeito em que se inscreve o sujeito-leitor.
Zapata e Vélez A leitura é uma atividade complexa que cumpre funções
(2003 apud SILVA, cognitivas, sociais, emocionais, afetivas, lúdicas e recreativas,
2012, p. 25) que, como prática social e cultural, permite ao homem adquirir
conhecimento, voltar no tempo, descansar e recriar. Também
Contribui para o enriquecimento da conversação e da escrita,
guia o leitor para a reflexão e molda algumas de suas habilidades.
Fatores socioeconômicos, culturais, físicos, psicológicos, cognitivos
e linguísticos interferem na leitura, o que mostra a necessidade de
um leitor ativo, que tenha clareza no conhecimento prévio que ele
possui e nos propósitos do que ele pretende alcançar.
Kleiman (2004, p. A leitura é um processo interativo, é mediante a interação de
13) diversos níveis de conhecimento que interagem entre si, como
o conhecimento linguístico, o textual, o de mundo, que o leitor
consegue construir o sentido do texto.
Martins (2007, p. 31) A concepção de leitura pode ser sintetizada com base em duas
características:
• Como decodificação mecânica de signos linguísticos, por meio
de aprendizado estabelecido a partir do condicionamento
estímulo-resposta (perspectiva behaviorista-skinneriana);
• Como processo de compreensão abrangente, cuja dinâmica
envolve componentes sensoriais, emocionais, intelectuais,
fisiológicas, neurológicas, tanto quanto culturais, econômicos e
políticos (perspectiva cognitivo-sociológica).
Campos (2008, p. A leitura é vista como uma atividade dialógica, um processo de
58) interação que se realiza entre o leitor e o autor, mediado pelo
texto, estando todos os elementos envolvidos situados em um
determinado momento histórico-social.
Koch e Elias (2008, Os autores apresentam o conceito de leitura sob três perspectivas.
p. 9-10) Foco no autor: A leitura é a captação das ideias do autor, sem
se levar em conta as experiências e os conhecimentos do leitor,
a interação autor-texto-leitor com propósitos constituídos sócio-
cognitivo-interacionalmente. Cabe ao leitor o reconhecimento das
intenções do autor.
Foco no texto: a leitura é uma atividade que exige do leitor o foco
no texto, em sua linearidade, uma vez que “tudo está dito”. Cabe
ao leitor o reconhecimento do sentido das palavras e estruturas
do texto.
Foco na interação autor-texto-leitor: a leitura é uma atividade
interativa altamente complexa de produção de sentidos que se
realiza com base nos elementos linguísticos presentes na superfície
textual e na sua forma de organização, requer a mobilização de
um vasto conjunto de saberes no interior do evento comunicativo.

30
TÓPICO 2 - LEITURA E MEDIAÇÃO

Freire (2009 apud Ler compreende uma visão crítica que não se esgota na
PINHEIRO et al. descodificação pura da escrita ou da linguagem escrita, mas que
2012, p. 2466) se antecipa e se alonga na inteligência do mundo. Ler implica
a percepção crítica, interpretação e “reescrita” do objeto lido,
procurando estabelecer relações entre texto e realidade vivida, em
outras palavras, a leitura deve ir além da decodificação de vogais
e consoantes, precisa fazer com que leitor transporte o conteúdo
lido para seu convívio social.
Fuza (2010, p. 12) A leitura centrada no texto pode ser denominada: leitura sob a
perspectiva do texto; leitura como extração (processo ascendente/
bottom up); leitura como decodificação. A leitura centrada no leitor
é denominada: leitura sob a perspectiva do leitor; leitura como
atribuição (processo descendente/top down). O diálogo entre
texto e leitor promove o surgimento do conceito de leitura como
interação.

FONTE: Os autores

Segundo Vitorio (2017, s.p.):

Diante de tantos conceitos, pareceres, propostas das mais diversas,


sucintas e exploratórias que existam sobre “o que é leitura?”, todos nós
chegaremos a uma resposta diferente e, nessa resposta, já estão nossas
interpretações, nossa pessoalidade de leitura e nossa subjetividade
sobre o tema. Isso porque estamos tratando de uma experiência
individual, cujos limites não estão demarcados por qualquer barreira
que seja, seja ela temporal, cultural, racial ou até mesmo intelectual.

De fato, os conceitos apresentados não visam assumir uma ou outra


abordagem teórica, mas explorar as múltiplas acepções sobre o termo, de forma
a serem complementares a visão do profissional letras. “A leitura, ainda mais
no universo dos cursos de Letras, é uma atividade tão intrínseca a tudo o que
fazemos, que questionamentos sobre essa atividade às vezes são subestimados
por se tratar, em princípio, de algo que acontece tão naturalmente que dispensaria
uma explicação mais formal” (FINATTO et al., 2015, p. 6).

NOTA

Assim como, para compreender o que é leitura, necessitamos percebê-la


como prática que vai além de um processo de decodificação de signos. Se pensarmos o
contexto escolar, a leitura pode ser vista como “instrumento para acessar os conhecimentos
de todos os componentes curriculares” (COSTA, 2012 apud BRODBECK; COSTA; CORREA,
2012, p. 30).

31
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

Se pensarmos no contexto escolar, outro aspecto se torna de importante


reflexão: o papel da medicação nas práticas de leitura; definição o que não se
configura tarefa fácil sendo que, para Williams (2007 apud RASTELI, 2013, p. 24),
“indica que este conceito é dotado de relativa complexidade e que se tornara
mais abrangente na medida em que fora utilizado como termo chave por vários
sistemas do pensamento moderno”.

Da mesma forma que encontramos diferentes acepções sobre o conceito
de leitura também encontraremos na busca por um conceito sobre mediação.
Preferimos, apresentá-lo em um quadro de conceito da mesma forma que o
quadro anterior elaborado, a partir da pesquisa em textos de diferentes teóricos
— da teoria cognitiva, da sociointeracionista e da sociológica-comunicacional — e
com eles dialogando.

QUADRO 2 – MEDIAÇÃO – DIFERENTES ACEPÇÕES SOBRE O TERMO

Hennion (1993 apud O termo mediação designa o lugar de interrogação, apontando


Almeida 2008, p. 13) como problemática a articulação entre essas duas maneiras
duais de interrogar o mundo social.
Lamizet (1999 apud Propõe um entendimento da mediação cultural situando-a na
DAVALLON, 2003) ordem de representação do espaço social. Assim, de acordo
com o autor, a mediação representa o imperativo social
essencial da dialética entre o singular e o coletivo, e da sua
representação em formas simbólicas.
Andaló (2006, p. 21-22) Mediação é o processo, não é o ato, não está entre dois termos
que estabelecem relação, ela é a relação. É um processo
facilitador que possibilita ao indivíduo apreende o mundo que
o cerca em seus significados. Tem um papel fundamental na
constituição do sujeito humano, pois possibilita a internalização
de categorias [...] permitem a apropriação de novos significados,
com os quais os sujeitos reorganizam suas ações e vida.
Barros (2006, p. 17), Mediar “[...] é fazer fluir a indicação ou o próprio material de
leitura até o destinatário-alvo, eficiente e eficazmente [...]”. A
mediação de leitura busca, primordialmente, mediar o leitor
a (re) descobrir o prazer pela leitura, promovendo um elo
de aproximação entre o texto e o leitor. Para essa realização
acreditamos ser necessária a presença de um mediador.
Almeida Júnior (2007, A leitura é realizada a partir do acervo de conhecimentos de
p. 44) cada pessoa. Cada leitura, dessa forma, é individual, diferente
de outra leitura, pois não pode prescindir dos referenciais de
quem a realiza. A exemplo da informação, a leitura não existe a
priori, se concretizando no processo de mediação. No entanto,
a mediação da leitura faz parte da mediação da informação
Dantas (2008, p. 4) O ato de mediar significa fixar entre duas partes um ponto
de referência comum, mas equidistante, que a uma e a outra
faculte o estabelecimento de algum tipo de inter-relação, ou seja,
as mediações seriam estratégias de comunicação em que, ao
participar, o ser humano se representa a si próprio e o seu entorno,
proporcionando uma significativa produção e troca de sentidos.

32
TÓPICO 2 - LEITURA E MEDIAÇÃO

Marteleto (2009, p. 19) Mediação é uma construção teórica destinada a refletir sobre
as práticas e os dispositivos que compõem os arranjos de
sentidos e formas comunicacionais e informacionais nas
sociedades atuais, sem perder de vista os elos que, tanto os
conteúdos quanto os suportes e os acervos, mantêm com a
tradição cultural.
Gomes (2010, p. 88) A mediação relaciona-se com a comunicação e se caracteriza
como um processo de intersubjetividades, resultante da
negociação e da disputa de sentidos, que permite aos sujeitos
ultrapassar e interpenetrar esses sentidos e gerar novas
significações. A mediação se opõe ao imediatismo, porque
demanda o jogo dialético, sem o qual inexiste.
Feuerstein (2012, p. 1) Mediação é a interação de um adulto, cuja intenção pode
ser a transmissão de um significado, de uma habilidade,
incentivando a criança a se superar com vistas a expansão da
capacidade cognitiva dela ou de outro mediado.
Barbosa e Barbosa A mediação se materializada como um acolhimento e permite
(2013, p. 11) que aqueles que buscam adentrar o mundo da leitura, façam
uso dessa hospitalidade para apoiar-se e dar materialidade
a suas buscas e desejos de compreensão da palavra, da vida.
Principalmente, para elaborar, construir seu próprio lugar de
leitor.
Rasteli (2013, p. 25) A partir de Hegel e posteriormente por Marx, a mediação será
relacionada à articulação entre as partes de uma totalidade
complexa, sendo a ela atribuída a responsabilidade pela
capacidade da passagem entre o imediato e o mediato. Está,
portanto, vinculada à ideia de processo e movimento que
fundam a dialética.
FONTE: Os autores

Podemos depreender dessas concepções que a mediação é o lugar onde


o processo comunicacional de interação entre os sujeitos, na construção de
múltiplos sentidos, se estabelece.

De acordo com Feuerstein (2012), a mediação se centra na interlocução


que se estabelece entre o mediador, o estímulo e o mediado (Figura 12).

33
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

FIGURA 12 – PARCEIROS DA MEDIAÇÃO (FEUERSTEIN (2012)

FONTE: Os autores

E
IMPORTANT

Em síntese, o mediado “é o foco, o centro da intervenção do mediador. A


mediação envolve a cognição e a motivação. A motivação é o aspecto afetivo da cognição.
E o estímulo colabora, juntamente com as intervenções do mediador, para desenvolver a
motivação no mediado” (CUNHA, 2017, p. 5).

34
TÓPICO 2 - LEITURA E MEDIAÇÃO

Tomemos novamente o exemplo de Ben Carson, este era o mediado em


questão. A motivação vem do desejo de sua mãe tirá-lo de seu contexto difícil e
miserável e a angústia para que não se debandasse para as gangues, comum em
seu bairro. Foi o estímulo afetivo desta matriarca mediadora que desenvolveu
a habilidade instigadora no mediado que se tornou um grande médico
neurocirurgião.

Em O perfil do professor mediador: pedagogia da mediação (TÉBAR, 2011),


“são descritos sete valores básicos [Figura 13], que ressaltam a importância da
mediação na etapa infantil e básica como prevenção de subdesenvolvimento e
disfunções nas crianças” (RASTELI, 2013, p. 30), de vital importância sendo que
nosso objetivo é investigar a mediação da leitura em espaços escolares.

FIGURA 13 – VALORES BÁSICOS DA MEDIAÇÃO

FONTE: Adaptado de Rasteli (2013)

35
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

Tais premissas são importantes à prática do professor — não somente do


profissional de letras ou da pedagogia, mas de todas as áreas do saber — sendo
que são vitais ao desenvolvimento cognitivo em práticas de leitura. Daí vem
outra questão, para incitar, iniciar ou motivar a leitura de forma mediadora, cabe
àquele que a propõe também ser um esmero leitor. Pois, como incentivar uma
prática que não se pratica? Como incitar algo que não se está impregnado por ela?

DICAS

Tradicionalmente associado à condição de "transmissor de conhecimentos",


o papel do professor merece ser revisto à luz dos apelos educativos de nosso mundo
e de novas configurações do projeto educativo. Assista à discussão apresentada
pela Prof.ª Rosa Lavelberg (USP). Disponível em: http://eaulas.usp.br/portal/video.
action;jsessionid=CA566AE57643A767D6ED2B5FED78915E?idPlaylist=6361.

2.1 A LEITURA E A LINGUAGEM: PRÁTICAS DE MEDIAÇÃO


Discutimos anteriormente conceitos importantes como de leitura e
mediação, agora vamos explorar o conceito de linguagem e refletir sobre a
correlação desses elementos nas práticas escolares.

A relação entre o dueto concepção de linguagem e concepção de


leitura é fundamental na formação e no desenvolvimento do leitor
proficiente. Tal compreensão leva em observação a dependência do
texto-leitor, ou seja, uma depende do texto (leitura foco no texto),
outra do leitor (leitura foco no leitor) e uma terceira que compreende a
interação entre autor/texto/leitor (leitura como interação) (CORACINI,
2002 apud BATISTA-SANTOS; FERREIRA 2017, p. 332).

Geraldi (1997 apud BATISTA-SANTOS; FERREIRA 2017) destaca a


importância de compreender as concepções de língua, sujeito e interações (Figura
14) para, de forma mais abrangente, conceber o que é linguagem.

36
TÓPICO 2 - LEITURA E MEDIAÇÃO

FIGURA 14 – DISTINÇÕES ENTRE LÍNGUA, SUJEITO E INTERAÇÕES

FONTE: Geraldi (1997 apud BATISTA-SANTOS; FERREIRA, 2017, p. 332-333)

Batista-Santos e Ferreira (2017), com base em Travaglia (1996), Koch


(2005) e Fuza, Ohuschi, Menegassi (2011), sistematiza o conceito de linguagem a
partir de três enfoques (Figura 15): linguagem como expressão do pensamento,
linguagem como instrumento de comunicação e linguagem como interação; tais
concepções são de extrema importância quando pensamos a mediação da leitura,
pois serão base da construção da metodologia de ensino que será usada e das
competências leitoras serão mobilizadas.

37
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

FIGURA 15 – CONCEPÇÕES DE LINGUAGEM

FONTE: Batista-Santos e Ferreira (2017, p. 333)

Em síntese, na perspectiva das autoras, a linguagem como expressão


está relacionada a uma visão de linguagem como representação do pensamento,
alinhada aos pressupostos da gramática normativa. O sujeito, neste contexto,
é para Koch (2005), passivo; um sujeito psicológico, extraído das práticas
sociais no sentido de indivíduo livre de infl uência do meio para construção do
conhecimento, do agir e do pensar e de construir unilateralmente o sentido e
exteriorizá-lo (Figura 16). Nesse sentido, “o modo como o texto, que se usa em
cada situação de interação comunicativa, está constituído não depende em nada
de quem se fala, em que situação se fala, como, quando e para quem se fala”
(TRAVAGLIA, 1996, p. 22).

FIGURA 16 – DESTITUIÇÃO DO CONTEXTO NO PROCESSO DE PRODUÇÃO DO TEXTO

FONTE: <https://player.slideplayer.com.br/89/14358664/slides/slide_21.jpg>. Acesso em: 24 jan. 2020.

38
TÓPICO 2 - LEITURA E MEDIAÇÃO

Já a linguagem como instrumento de comunicação, a segunda perspectiva


adotada por Batista-Santos e Ferreira (2017), ainda situa o sujeito de linguagem
como sujeito passivo usado como instrumento de transferência de informações
entre os interlocutores; sendo o sistema linguístico tomado como fato objetivo
externo a consciência individual. “Nessa linha de pensamento, a linguagem é
concebida como uma ferramenta, empregada para transmitir uma mensagem,
uma informação, utilizando a variedade padrão e desprezando-se as demais
variedades linguísticas” (Figura 17) (BATISTA-SANTOS e FERREIRA, 2017, p.
334).

FIGURA 17 – VARIEDADES LINGUÍSTICAS – VARIAÇÕES GEOGRÁFICAS

FONTE: <https://static.todamateria.com.br/upload/va/ri/variacoeslinguisticas-0.gif>. Acesso em:


24 jan. 2020.

No terceiro enfoque, assumindo a linguagem como instrumento de


interação, ou seja, o interlocutor passa a ser ativo, interagindo, por meio da
linguagem, com seus pares e o meio social.

A linguagem é compreendida como processo de interação entre


os sujeitos e, por meio dela, esses sujeitos realizam atividades que
envolvem o uso social da linguagem, levando em consideração o
contexto no qual eles estão inseridos.
[…]
A sociedade se constitui por meio de práticas linguageiras, do uso social
da linguagem (usos dos gêneros textuais, orais e escritos). O sujeito,
por meio da interação, assume um papel de agente transformador.
Esse papel perpassa o simples ato comunicativo, pois aqui o sujeito
transforma e é transformado por sua ação. Dessa forma, na linguagem
como interação, o sujeito ao utilizar a língua não faz apenas transmitir
e exteriorizar um pensamento, ou repassar informações ao receptor,
mas sim realiza ações, age sobre o interlocutor (ouvinte/leitor)
(BATISTA-SANTOS; FERREIRA, 2017, p. 334-335).

39
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

E
IMPORTANT

A concepção de linguagem como ação obteve contribuições de diversas


áreas de estudos, as quais buscam estudar a linguagem em situação de uso. Tem-se, por
exemplo, a linguística da enunciação (a Teoria da Enunciação de Benveniste, a Pragmática,
a Semântica Argumentativa, a Análise da Conversação, a Análise do Discurso, a Linguística
Textual, a Sociolinguística e a Enunciação Dialógica de Bakhtin) (FUZA; OHUSCHI;
MENEGASSI, 2011, p. 489).

Nesse último enfoque da linguagem como interação, a leitura é concebida


como “resultado da interação entre leitor−texto−autor, que são responsáveis
pela construção dos signifi cados do texto e pela produção de sentidos. [...] não é
tida apenas como uma prática de extração, haja vista que implica compreensão
e conhecimentos prévios que são constituídos antes mesmo da leitura” (FUZA;
OHUSCHI; MENEGASSI, 2011 apud BATISTA-SANTOS; FERREIRA 2017, p.
338), em diálogos intercambiáveis (Figura 18).

FIGURA 18 – DIÁLOGO ENTRE AS CONCEPÇÕES DE LEITURA E DE LINGUAGEM

FONTE: Batista-Santos e Ferreira (2017, p. 339)

40
TÓPICO 2 - LEITURA E MEDIAÇÃO

De acordo com Kato (2002 apud BATISTA-SANTOS; FERREIRA, 2017, p.


342) “todas essas fases (decodificação, extração e levantamento dos conhecimentos
prévios) experimentadas pelo sujeito são somatórias que auxiliam na formação
do sujeito proficiente que passa a ser atuante sobre o outro e sobre o mundo”.

O texto — objeto da leitura — passa a ser compreendido “não mais como
uma unidade fechada, acabada em si, mas sim, como uma dimensão discursiva,
considerando-o em suas múltiplas situações de interlocução, como resultado
de trocas entre os sujeitos, situados em um contexto determinado” (FUZA;
OHUSCHI; MENEGASSI, 2011, p. 490).

A visão interacionista do ensino-aprendizagem da leitura expõe que


o significado do enunciado é construído mediante o processo de
interação entre leitor e texto, produzindo-se um momento de diálogo,
não mais um produto pronto, acabado, pois, a leitura acontece ao
desencadear-se o processo criativo em que sujeito e linguagem
interagem permanentemente, uma vez que o texto nunca está acabado,
não é produto, antes, dispositivo de produção. [...]. A leitura produto
é pessoal, individual, determinada pelas condições sociais, culturais,
históricas, afetivas e ideológicas do leitor, portanto, é variável, porque
o texto apresenta lacunas que convidam o leitor a preenchê-las
(DELL’ISOLA, 1996 apud FUZA; OHUSCHI; MENEGASSI, 2011, p.
494-495).

Fuza (2010) alerta que a prática de leitura, a partir de uma concepção


de linguagem como interação, não parece ocorrer no contexto escolar que,
aparentemente, ainda se sustenta em “concepções isoladas de leitura como
decodificação, privilegiando o texto ou o leitor, não havendo, assim, o diálogo
entre esses elementos. Tal realidade justifica a incessante necessidade de estudos
voltados à leitura, visando ao desenvolvimento e à formação de leitores críticos e
proficientes” (FUZA; OHUSCHI; MENEGASSI, 2011, p. 480, grifo nosso).

O ato de ter que ler algo imposto e dizer o que a criança precisa fazer em
seguida submete o livro ou o texto literário em algo muito didático, acaba com a
arte, e com o interesse de quem lê, por isso a importância de entender e fazer-se
perceber essa diferença. Tanto a criança, quanto jovens e adultos que carregam
o livro como um objeto próximo, companheiros, dizem que tudo começa com
a hospitalidade, encontros prazerosos, que acabaram ocorrendo fora da escola,
numa biblioteca, numa ONG, com um amigo, um vizinho, sujeitos que tocaram
o outro com intersubjetividade prazerosa, apresentando ao leitor a verdadeira
faceta da leitura. Sujeitos tocados no amago, redescobrindo a verdadeira faceta
da leitura literária. Esses provavelmente um dia serão iniciadores de leitura de
outros. Por que não ocorrer isso dentro da sala de aula?

A formação do leitor é “uma fase extremamente importante e necessária,


entretanto, não se pode permanecer nela por muito tempo, pois, caso contrário, o
desenvolvimento do leitor não se constitui, o que impede o indivíduo de formar-
se um cidadão crítico e consciente junto à sociedade” (MENEGASSI, 2010, p. 9).
Para Kleiman (2004, p. 51) o leitor proficiente:

41
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

Faz escolhas baseando-se em predições quanto ao conteúdo do


livro. Essas predições estão apoiadas no conhecimento prévio, tanto
sobre o assunto (conhecimento enciclopédico), como sobre o autor, a
época da obra (conhecimento social, cultural, pragmático) o gênero
(conhecimento textual). Daí ser necessário que todo programa de
leitura permita ao aluno entrar em contato com um universo textual
amplo e diversificado.

Um leitor proficiente ou competente é aquele que consegue “compreender


nos textos os elementos implícitos, para que ocorra o diálogo do texto presente
com outros textos lidos e para que se faça a ligação entre o conhecimento de
mundo e aquilo que está exposto no texto” (BATISTA-SANTOS; FERREIRA,
2017, p. 339).

DICAS

• Filme: que tal dar uma pausa e assistir Escritores da liberdade. Nesta
dramaturgia, você mergulhará num universo em que a leitura chega de forma conflituosa,
arbitrária e, com muito esforço, empatia e determinação, torna-se instrumento que auxilia
a conhecer os alunos rebeldes a conhecerem sua própria identidade. Uma história que nos
mostra como a leitura de algo considerado chato e complicado pode se tornar algo tocante
e transformador, que auxilia em ambos os aspectos, na do docente compreender melhor o
contexto dos alunos e dos alunos refletirem sobre seus contextos.
• Vídeo: ler é atividade fundamental na formação docente. Não só pela ampliação de
vocabulário e repertório. Assista à discussão apresentada pelo Prof. José Gabriel Perissé
Madureira (USP). Disponível em: http://eaulas.usp.br/portal/video.action?idItem=635.

Quando se tem “uma compreensão promovida pela discussão e pelo


diálogo, demonstrando o ponto de vista e a reflexão de cada sujeito sobre o
material lido, ocorreu uma leitura crítica e que os responsáveis pela compreensão
são leitores proficientes e não meros decodificadores do texto” (FUZA; OHUSCHI;
MENEGASSI, 2011, p. 494); ou seja, ele:

[...] produz sentidos e não apenas os extrai do texto. Ao perceber a


incompletude do que está exposto no papel, o sujeito age ativamente,
trazendo para o texto seus conhecimentos e utilizando a palavra do
outro para formular sua própria, produzindo um elo entre o que já foi
dito e o novo (FUZA; OHUSCHI; MENEGASSI, 2011, p. 495).

Os autores ainda destacam que “a construção do conhecimento é


realizada, então, por meio das relações sociais, pelo diálogo entre leitor, texto,
autor e os objetivos de leitura. Diante dos aspectos expostos a respeito da leitura
como interação” (FUZA; OHUSCHI; MENEGASSI, 2011, p. 495)

42
TÓPICO 2 - LEITURA E MEDIAÇÃO

Dessa forma, o leitor é um sujeito ativo que faz uso da leitura – e do texto
– em contextos sociais de uso, visando inserir-se no mundo em que vive como
cidadão crítico e leitor profi ciente interagindo com diferentes discursos de forma
que assimile diferentes olhares sobre a leitura (Figura 19).

FIGURA 19 – FORMAÇÃO DO LEITOR PROFICIENTE

s.

FONTE: Adaptado de Angelo e Menegassi (2008)

Dessa forma, a relação que se estabelece entre leitor e texto na composição


de um leitor profi ciente se sustenta na leitura como “uma atividade interativa
altamente complexa de produção de sentidos, com base nos elementos linguísticos
presentes na superfície textual e na sua forma de organização, mas requer a
mobilização de um vasto conjunto de saberes (Figura 20) no interior do evento
comunicativo (KOCH; ELIAS, 2006, p. 11).

FIGURA 20 - SABERES MOBILIZADOS PELO LEITOR PROFICIENTE

FONTE: Adaptado de Mata (2014)

43
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

Silva (2013, p. 6) destaca que para compreender o real sentido da leitura:

[...] é oportuno evidenciar que o sujeito precisa ser conduzido em


diversas situações a entrar nesse universo de leitores. E o educador
é o mediador fazendo-se necessário articular situações de prática de
leitura que garanta uma aprendizagem significativa, nessa perspectiva
é interessante ressaltar que o sujeito constrói o conhecimento, a partir
das relações estabelecidas através dessa mediação.

Mata (2014, s.p.) defende que é papel do educador “proporcionar ao aluno


oportunidades de experimentar o universo da leitura e descobrir o quanto ele é
amplo e diversificado. Propor atividades que mobilizem diferentes estratégias
individuais de leitura, além de situar essa prática em seu universo social de uso”.

44
TÓPICO 2 - LEITURA E MEDIAÇÃO

LEITURA COMPLEMENTAR

Leitura socio-cognitivo-interacional: foco na interação autor-texto-leitor

Fatima Aparecida de Oliveira Sozza

Podemos ensinar a compreensão? Evidentemente que não. O papel do


professor nesse contexto é criar oportunidades que permitam o desenvolvimento
dos processos cognitivos, sendo que essas oportunidades poderão ser bem mais
exploradas na medida em que esses processos sejam melhores conhecidos. Koch
(2006, p. 11) afirma que “há lugar, no texto, para toda uma gama de implícitos,
dos mais variados tipos, somente detectáveis quando se tem, como pano de
fundo, o contexto sociocognitivo dos participantes da interação.” Essa concepção
de método de leitura pressupõe uma concepção interacional (dialógica) da língua
cujos sujeitos são vistos como construtores sociais, sujeitos ativos que através do
diálogo constroem e são construídos no texto, considerando que esse é o lugar
próprio da interação. Assim complementa a autora:

Nessa perspectiva, o sentido de um texto é construído na interação


texto-sujeitos e não algo que preexista a essa interação. A leitura é, pois, uma
atividade interativa altamente complexa de produção de sentidos, que se realiza
evidentemente com base nos elementos linguísticos presentes na superfície
textual e na sua forma de organização, mas requer a mobilização de um vasto
conjunto de saberes no interior do evento comunicativo (KOCH, 2006, p. 11,
negritos acrescentados da autora).

Fica evidente, também, nessa abordagem de leitura, uma concepção de


língua/linguagem diferente do paradigma tratado anteriormente. O modelo
referendado pelo conceito socio-cognitivo-interacional de língua privilegia os
sujeitos e seus conhecimentos em processos de interação. Tomando o texto como
lugar de interação cujos sentidos não estão lá, mas são construídos, considerando-
se, para tanto, as “sinalizações” textuais dadas pelo autor e os conhecimentos do
leitor, que, durante a leitura assume o lugar de sujeito, numa atitude ativa. Ou seja,
espera-se que o leitor concorde com a ideia do autor ou a rechace, complete-as ou
adapte-as, comungando da ideia que toda “compreensão é prenhe de respostas
e, de uma forma, ou de outra, forçosamente, a produz” (BAKHTIN, 1992, p. 290).

Esta linha teórica calcada nos processos cognitivos se desenvolveu através


de pesquisadores ingleses sob o ponto de vista das teorias da cognição, ou seja,
de abordagens teóricas que procuram explicar o processo de compreensão
desencadeado no momento da leitura. São, portanto, abordagens que se
desenvolveram a partir da psicolinguística e da sociolinguística. No Brasil,
inicialmente, essas ideias parecem desenvolver-se junto às pesquisas de leitura
instrumental em língua estrangeira, Kato (1985) destaca que nesta época
professores de língua estrangeira preocupados com a questão da leitura de seus

45
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

alunos, constataram que muitas das dificuldades com a leitura não se deviam ao
desconhecimento da língua estrangeira, mas ao fato dificultoso de interagir com
o texto.

Levando em consideração esse diagnóstico, os pesquisadores centraram
seus estudos nos desvelamentos dos processos subjacentes ao ato de ler,
objetivando como aplicação pedagógica desse conhecimento uma proficiência
do leitor. Os interesses básicos destas investigações estão na ação ou reação
psicolinguística vivenciadas pelo leitor no momento da leitura e nos mecanismos
linguísticos e psicológicos envolvidos. Logo, uma atitude centrada nesse processo
que permeia o ato de ler denomina-se de leitura interativa, primeiramente,
interação entre os processos cognitivos e, segundo o processo de interação entre
leitor e autor via texto, “pois a leitura é um ato social, entre dois sujeitos –leitor e
autor – que interagem entre si obedecendo a objetivos e necessidades socialmente
determinados” (KLEIMAN, 1997, p.10).

No âmago dessa concepção interacionista de leitura, estão as pesquisas


de Kleiman (leitura: ensino e pesquisa, 1989; Texto e leitor: aspectos cognitivos da
leitura, 1997; Oficina de leitura e prática, 1997). As formulações teóricas básicas
dessa autora foram desenvolvidas no centro de Estudos de leitura da Universidade
de Illinois, onde a pesquisadora teve oportunidade de estagiar. Agrega ainda a
esta mesma teoria as proposições de Koch (2006) Ler e compreender: os sentidos
do texto, cuja sistematização dos processos cognitivos é tratada de forma clara e
exemplificadora, auxiliando da melhor forma, a compreensão desse método.

No intuito de elucidar os processos cognitivos da leitura, citamos o livro


Texto e leitor (1997), no qual Kleiman aborda conceitos necessários ao estudo da
leitura e compreensão descrevendo como ocorrem tais processos. Segundo a
estudiosa: “A compreensão de textos envolve tais processos cognitivos múltiplos,
justificando assim o nome de faculdade "que era dado ao conjunto de processos,
atividades, recursos e estratégias mentais próprios do ato de compreender”
(KLEIMAN, 1997, p. 9).

A compreensão de um texto é um processo que se caracteriza pela utilização


de alguns conhecimentos, a saber: o conhecimento prévio, o conhecimento
estruturado, o estabelecimento de objetivos para a leitura, a materialização
linguística, a coesão e a coerência. É frente à interação de diversos níveis de
conhecimentos como: o linguístico, o textual, o conhecimento de mundo, que o
leitor consegue construir o sentido do texto. Todos ativados durante a leitura
podem se chegar ao momento da compreensão. A leitura implica uma atividade
de procura por parte do leitor, no seu passado de lembranças e conhecimentos. O
texto sugere pistas e caminhos, mas que certamente não explicita tudo o que seria
possível explicitar.

O conhecimento linguístico desempenha um papel central no


processamento do texto. O que se pode entender por processamento é aquela
atividade pela qual as palavras, unidades discretas, distintas, são agrupadas em

46
TÓPICO 2 - LEITURA E MEDIAÇÃO

unidades menores. Com base nesse conhecimento está o conhecimento gramatical


que permitirá a identificação de categorias gramaticais dentro das frases
(categorias nominais, verbais e sintáticas) permitindo que esse processamento
evolua até chegar a compreensão. O conhecimento linguístico, dessa forma, é
um componente do chamado conhecimento prévio sem o qual a compreensão é
impossível.

Por outro lado, chamaremos o conjunto de noções e conceitos sobre o


texto de conhecimento textual. Esse conhecimento é que dá conta da estrutura do
texto e do seu gênero. Segundo Kleiman (1997, p. 20) “Quanto mais conhecimento
textual o leitor tiver, quanto maior a sua exposição a todo tipo de texto mais
fácil será sua compreensão”. Portanto, tanto o conhecimento linguístico como o
conhecimento textual formam parte do conhecimento prévio, e ambos devem ser
utilizados na leitura.

O conhecimento de mundo ou enciclopédico pode ser adquirido tanto


formalmente como informalmente. Para haver compreensão durante a leitura a
parte do nosso conhecimento de mundo que é relevante para a leitura deve ser
ativada, ou seja, deve estar num nível ciente, e não perdida no fundo de nossa
memória. O conhecimento de mundo envolve conhecimento extralinguístico e
a sua recuperação se deve ao conhecimento de caráter enciclopédico que o leitor
tem. Nesse sentido, a ativação do conhecimento prévio procura no fundo da
memória nosso repertório de conhecimentos, de informações relevantes para o
assunto a partir de elementos formais fornecidos no texto.

Ademais, segundo Kleiman (1997), a ativação do conhecimento prévio é,


então, essencial à compreensão, pois é o conhecimento que o leitor tem sobre o
assunto que lhe permite fazer as inferências necessárias para relacioná-la com
diferentes partes do texto num todo coerente. Esse é um processo inconsciente
do leitor proficiente, além do mais, são as inferências que fazemos ao texto que
guardamos como conhecimento e não as palavras do texto literalmente.

Por outro lado, a pesquisadora traz à tona a abordagem dos princípios


que regem a atividade de leitura. A estudiosa destaca dois princípios sendo: a
procura de coerência e o estabelecimento de objetivos e propósitos claros para a
leitura. A explicitação de objetivos possibilita a compreensão do texto, isto é, ter
claramente uma intenção demarcada para realizar a leitura facilita a interação
como o texto. Há também evidência experimental que mostra que somos capazes
de lembrar muito melhor aqueles detalhes de um texto que tem a ver com um
objetivo específico. Outra atividade que depende dos objetivos estipulados e que
contribui para a compreensão é a formulação de hipóteses. Kleiman (1997, p.
35-36) cita que “Vários autores consideram que a leitura é, em grande medida,
uma espécie de jogo de adivinhação, pois o leitor ativo, realmente engajado no
processo, elabora hipóteses e as testa, à medida que vai lendo o texto.” Na visão
interacional o texto não é um produto acabado, que traz tudo pronto para o leitor
receber passivamente, o leitor também sobrepõe ao texto seus objetivos e sua
formulação de hipótese.

47
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

Além desses modos de executar o texto, outros integram o rol de


processos em torno da compreensão e não podem deixar de serem refletidos, é
o caso das estratégias de processamento. A materialização de uma intenção do
autor se dá através de elementos tanto linguísticos como gráficos cabendo ao
leitor a recuperação dessa intenção através do formal. Nesse caso, o leitor se apoia
tanto em elementos extralinguísticos, bem como em elementos linguísticos como
o componente contextual. Esse componente define as relações e propriedades
internas do texto. Nesse aspecto ressalta Kleiman (1997, p. 45) que “O texto é
considerado por alguns especialistas como uma unidade semântica onde vários
elementos de significação são materializados através de categorias lexicais,
sintáticas, semânticas e estruturais”.

Outros aspectos importantes nessa materialização do texto são a coesão e a


estrutura do texto. Quanto a coesão Kleiman (1997), afirma que são as estratégias
cognitivas que estimulam o comportamento automático e inconsciente do leitor e
seu conjunto serve para construir a coerência local do texto, isto é, elementos que
tem a ver com a sequenciação textual.

Ao passo que a estrutura no processamento do texto e no papel das


estratégias cognitivas funciona em dois níveis: o local e o temático. O local é
também chamado de microestrutura, isto é, aqueles princípios e regras que
orientam processos inconscientes do leitor na reconstrução de laços coesivos
entre elementos próximos, sequenciando o texto. Já o nível temático ou da
macroestrutura asseguram sequências maiores, como períodos, parágrafos que
avançam no desenvolvimento do tema global.

FONTE: <http://www.gestaoescolar.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/producoes_pde/artigo_fati-
ma_aparecida_oliveira_sozza.pdf>. Acesso em: 24 jan. 2020.

48
RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

• Para refletirmos sobre a correlação entre leitura e mediação devemos


compreender as diferentes concepções que esses termos podem assumir.

• A leitura, ainda mais no universo dos cursos de Letras, é uma atividade tão
intrínseca a tudo o que fazemos.

• Para compreender o que é leitura necessitamos percebê-la como prática que vai
além de um processo de decodificação de signos.

• Se pensarmos no contexto escolar, a leitura pode vista como instrumento para


acessar os conhecimentos de todos os componentes curriculares.

• A mediação é o processo comunicacional de interação entre os sujeitos, na


construção de múltiplos sentidos, se estabelece na interlocução que se estabelece
entre o mediador, o estímulo e o mediado.

• A relação entre o dueto concepção de linguagem e concepção de leitura é


fundamental na formação e no desenvolvimento do leitor proficiente.

• Um leitor proficiente ou competente é aquele que consegue compreender nos


textos os elementos implícitos, para que ocorra o diálogo do texto presente com
outros textos lidos e para que se faça a ligação entre o conhecimento de mundo
e aquilo que está exposto no texto.

• A relação que se estabelece entre leitor e texto na composição de um leitor


proficiente se sustenta na leitura como uma atividade interativa altamente
complexa de produção de sentidos, com base nos elementos linguísticos
presentes na superfície textual e na sua forma de organização, mas requer
a mobilização de um vasto conjunto de saberes no interior do evento
comunicativo.

• Cabe ao educador propor atividades que mobilizem diferentes estratégias


individuais de leitura, além de situar essa prática em seu universo social de
uso.

49
AUTOATIVIDADE

1 Agora que você já tem ciência que a compreensão de um texto é um processo


que se caracteriza pela utilização de alguns conhecimentos, a saber: o
conhecimento prévio, o conhecimento estruturado, o estabelecimento de
objetivos para a leitura, a materialização linguística, a coesão e a coerência;
elabore um quadro sobre os conhecimentos prévios que o leitor deve
mobilizar para compreender o sentido no conto A cartomante de Machado
de Assis, disponível em:

FONTE: http://www.biblio.com.br/defaultz.asp?link=http://www.biblio.com.br/conteudo/
MachadodeAssis/acartomante.htm. Acesso em: 5 fev. 2020.

2 Os mediadores de leitura são aquelas pessoas que estendem pontes entre


os livros e os leitores, ou seja, que criam as condições para fazer com que seja
possível que um livro e um leitor se encontrem. A experiência de encontrar os
livros certos nos momentos certos da vida, esses livros que nos fascinam e que
nos vão transformando em leitores paulatinamente, não tem uma rota única
nem uma metodologia específica; por isto os mediadores de leitura não são
fáceis de definir. No entanto, basta lembrar como descobrimos, nos primeiros
anos da vida, esses livros que deixaram rastros em nossa infância e, talvez,
aparecerão nítidas algumas figuras que foram nossos mediadores de leitura:
esses adultos íntimos que deram vida às páginas de um livro, essas vozes que
liam para nós, essas mãos e estes rostos que nos apresentavam os mundos
possíveis e as emoções dos livros. 
Os mediadores de leitura, consequentemente, não estão somente na escola,
mas no lar, nas bibliotecas e nos espaços não convencionais como os parques,
os hospitais e as ludotecas, entre outros. Durante a primeira infância, quando
a criança não lê sozinha, a leitura é um trabalho em parceria e o adulto é quem
vai dando sentido a essas páginas que para o bebê não seriam nada, sem sua
presença e sua voz. Por isso, os primeiros mediadores de leitura são os pais,
as mães, os avós e os educadores da primeira infância e, paulatinamente, à
medida que as crianças se aproximam da língua escrita, vão se somando outros
professores, bibliotecários, livreiros e diversos adultos que acompanham a
leitura das crianças.
O trabalho do mediador de leitura não é fácil de reduzir a um manual de
funções. Seu ofício essencial é ler de muitas formas possíveis: em primeiro
lugar para si mesmo, porque um mediador de leitura é um leitor sensível
e perspicaz, que se deixa tocar pelos livros, que desfruta e que sonha em
compartilhá-los com outras pessoas. Em segundo lugar, um mediador cria
rituais, momentos e atmosferas propícias para facilitar os encontros entre
livros e leitores. Às vezes, pode fazer a Hora do Conto e ler em voz alta uma
ou várias histórias a um grupo, mas, outras vezes, propicia leituras íntimas

50
e solitárias ou encontros em pequenos grupos. Assim, em certas ocasiões,
conversa ou recomenda algum livro; em outras permanece em silêncio ou se
oculta para deixar que livro e leitor conversem.

FONTE: REYES, Y. Mediadores da leitura. Belo Horizonte: Glossário Ceale; Faculdade de


Educação da UFMG. 2014. Disponível em: http://ceale.fae.ufmg.br/app/webroot/glossario-
ceale/verbetes/mediadores-de-leitura. Acesso em: 4 jan. 2020.

Mediação é a interação de um adulto, cuja intenção pode ser a transmissão de


um significado, de uma habilidade, incentivando a criança a se superar com
vistas a expansão da capacidade cognitiva dela ou de outro mediado. Essa
concepção de mediação é proposta por:
a) ( ) Gomes (2010).
b) ( ) Feuerstein (2012).
c) ( ) Dantas (2008).
d) ( ) Barros (2006).
e) ( ) Andaló (2006).

3 Sobre leitura e mediação, avalie as afirmações a seguir:

I- Batista-Santos e Ferreira (2017) sistematizam o conceito de linguagem


a partir de três enfoques: linguagem como expressão do pensamento,
linguagem como instrumento de comunicação e linguagem como interação;
tais concepções são de extrema importância quando pensamos a mediação
da leitura.
II- A relação entre o dueto concepção de linguagem e concepção de leitura é
fundamental na formação e no desenvolvimento do leitor proficiente.
III- De acordo com Feuerstein (2012), a mediação se centra na interação que se
estabelece entre o mediador, a obra e o mediado.

Sobre as assertivas acima, é correto o que se afirma em:


a) ( ) I, apenas.
b) ( ) II, apenas.
c) ( ) I e II.
d) ( ) II e III.
e) ( ) I, II e III.

51
52
TÓPICO 3 -
UNIDADE 1

A LEITURA E O LEITOR

1 INTRODUÇÃO
Ao nos referirmos à palavra “leitura”, a primeira coisa que vem à mente é
ler um livro. O termo é polissêmico, mas podemos caracterizá-lo de maneira mais
específica. Como aponta Zilberman (1984, p. 18), “no espaço entre a fala e a escrita
surge um código escrito que tem como uma de suas marcas a capacidade de se
extrair deste vários sentidos, de acordo com sua organização”. Em suma, o texto
por excelência tem a particularidade de promover saberes quase que infinitos, e
alguns, infinitos.

Ler não envolve apenas... ler. Abrange uma compreensão mais ampla, já
que está associada à interação entre o ser e a sociedade. É através da leitura que
damos sentido ao mundo, organizando toda a complexidade que nos cerca. Até
as inconstâncias da vida se transformam numa forma de texto.

Você já ouviu falar em semiologia? É uma ciência associada a cursos da


área de letras e das ciências do corpo. Se em letras aborda a questão dos signos,
na área de ciências do corpo fala sobre a leitura do corpo, daí a expressão “o corpo
fala”. Esse é um exemplo de como temos a capacidade de ler o mundo.

Em primeiro lugar, tudo o que fazemos é realizada por meio de uma


forma de comunicação, uma linguagem. Toda linguagem envolve o uso de uma
língua. Se pensarmos por esse lado, alguns cursos universitários como medicina
e enfermagem, mas também marketing e Letras, possuem uma disciplina para
aprender a interpretar tanto os sinais do corpo. Já ouviu a expressão “o corpo
fala”? Bem, acontece que, em geral, informamos mais do que realmente dizemos.

A leitura pode ser compreendida como um ato de criação de sentidos,


e por isso sua importância vai além da noção de alfabetização, ato de leitura
mecânica, mas de interação social.

Desde sempre há o fetiche da leitura como mecanismo de ascensão


cultural, a ideia de que se lermos determinados livros “difíceis”, ficaremos mais
inteligentes. O problema nesse sofisma é que substituímos uma possibilidade por
certa, e desconsideramos o tipo de leitura e como o leitor se insere socialmente
no cotidiano de quem adquire essas leituras. É por isso que há a necessidade
da apreensão, por parte dos alunos e dos professores, das práticas cotidianas de
leitura. Ler não é ler. Entretenimento, obrigação, descoberta, pesquisa, revisão...
há várias práticas de leitura.

53
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

A prática de leitura na contemporaneidade é voltada para uma noção


tecnicista: o indivíduo aprende a ler para desenvolver proficiências. Todavia, em
muito se distancia a noção de leitura como fator de emancipação social. Observe a
prática cotidiana dos seus alunos: eles aprendem a ler mais para traduzir códigos
do dia a dia, ler receitas de bolo, legendas em filmes e gravar letras de música.
Dessa maneira, o ato de ler mecanizado não promove uma ruptura com sua
própria situação social, tampouco promove acesso a outras formas de cultura e
conhecimento. “A simples ideia de que o ato de ler em si se basta — como visto em
chavões do tipo ‘leia um livro’ —, desapegado das suas funções sociais fomenta
atitudes que em muito de desassociam da sua função social” (BRITTO, 2003, p.
114). Esse é um dos motivos que biografias de youtubers vendem tanto nos dias
de hoje! Porém, não podemos deixar de lado a função social do ato de leitura.

DICAS

Regina Zilberman, em seu artigo A leitura no Brasil – sua história e suas


instituições, faz um aporte dos mecanismos nacionais criados para o crescimento do
público leitor — bem como suas inconsistências. É um texto essencial para entender as
propostas do ensino de literatura em sala de aula. Disponível em: http://www.unicamp.br/
iel/memoria/projetos/ensaios/ensaio32.html.

2 LEITURA & LEITOR: O QUE LER? PARA QUE LER?


Ler? Para que, por que, como e o que? São pontos que direcionam a
complementação da atividade de leitura. A literatura é uma das possibilidades
textuais existentes dentre várias. A competência (habilidade de leitura) nestas
outras modalidades pode ser anterior e requisito para o desenvolvimento das
demais habilidades ao longo dos tempos.

Há textos e textos: alguns podem ser lidos em trechos para sua


compreensão, outros, com muito aprofundamento. Alguns podem ser lidos de
um fôlego, outros, durante horas. Alguns textos são simplórios, enquanto outros
promovem um verdadeiro jogo linguístico com o leitor. Alguns são como histórias
de aventuras, enquanto outros, verdadeiros romances policiais. E há aqueles
que possibilitam múltiplas interpretações, e todas fazem sentido, ao longo dos
tempos: são os textos literários, diferentes de outros que cumprem uma função
bem específica, como roteiros, livros didáticos e manuais.

Nesse processo de produção de saberes a partir do texto, deve-se


considerar que a leitura informativa exige estratégias próprias, que são muito
importantes para realimentar nosso processo de aprendizagem. Selecionar as
informações que realmente interessam relacioná-las com outras, usá-las de modo

54
TÓPICO 3 - A LEITURA E O LEITOR

adequado, percebê-las e ironizá-las em sua parcialidade, contextualizá-las social


e historicamente são algumas estratégias de produção de conhecimento por meio
da leitura.

Porém, a atividade ledora nunca é igual, visto que os textos dos quais se
apropria abordam diferentes faculdades psíquicas do indivíduo. Muitas dessas
faculdades são movimentadas por influência do texto literário, fugindo do padrão
de outros textos que circulam cotidianamente. Mas estar fora do padrão não
significa questionar todos os padrões, de modo que os perfis literários também
são fonte profícua de aprendizagem a ser conhecidas pelos leitores.

FIGURA 21 – ANTES DA ARQUEOLOGIA

FONTE: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/3/3a/Antes_da_arqueologia._Car-
toon_de_Paulo_Cesar.JPG>. Acesso em: 24 jan. 2020.

A relação do texto literário com o universo verbal como um todo, com os


outros textos escritos, já é, pois, objeto da necessária recriação por parte do leitor.
Mas a relação do texto literário com o universo extraverbal também passa por
todas as transformações, seleções, repetições, rupturas, apropriações que sejam
possíveis.

Porém, determinadas leituras exigem uma gama de conhecimentos para


serem aproveitadas, onde o próprio leitor vai se apropriando e transformando
o texto com sua subjetividade e ampliando seu arcabouço a cada novo texto
lido. É o que Roland Barthes, escritor, sociólogo, crítico literário, semiólogo
e filósofo francês, chama de a “morte do autor”, pois, ao ler e se apropriar do
texto do autor, o leitor coloca no texto sua gama sociocultural e o ressignifica.
Ler é, essencialmente, produzir conhecimento, como se cada um ampliasse uma
biblioteca particular a cada livro que lê. É o que aponta Darnton (1992) ao abordar
que o indivíduo não desenvolve a habilidade da leitura, mas sim a capacidade de
estabelecer relações de significado, social e culturalmente. Ele o faz identificando,
reconhecendo, comparando, analisando e interpretando os códigos que lhe
chegam, ou seja, o processo de intertextualidade.

55
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

ATENCAO

Não há texto isolado do seu universo formativo. Todo texto referencia seu
espaço, mesmo que por analogia. Narrativas, como Os Lusíadas, foram produzidas durante
a época das grandes navegações, bem como Dom Quixote, que reflete um período da
modernidade e da ascensão da burguesia.

Essa noção de intertextualidade é cunhada por Julia Kristeva (1974 apud


FIORIN, 2006b, p. 165), a qual considera que todo texto é construído em referência
a outro por meio de referências, tomadas como posição discursiva: “paródias,
alusões, estilizações, citações, ressonâncias, repetições, reproduções de modelos,
de situações narrativas, de personagens, variantes linguísticas, lugares comuns
etc.” Kristeva (1974 apud FIORIN, 2006a, p. 71) compreende o termo como
“escritura, simultaneamente como subjetividade e como comunicabilidade”.

Livros falam de livros, escritores falam de leitores. Compreender um texto


trata-se de um processo dialógico, de maneira que todo ato de compreensão está
indissociável de uma resposta, pois “introduz um objeto de compreensão num
novo contexto, ‘o contexto potencial da resposta’” (BAKHTIN, 2006, p. 95a).

É a partir disso que se constata como o texto literário exige um leitor que
perceba essa relação textual de um texto com seus anteriores ou contemporâneos.
O texto não é apenas uma série de enunciados, mas, sim, a percepção dos
diferentes significados no interior da língua. (FIORIN, 2006a)

DICAS

Nos dias de hoje é cada vez maior a presença de filmes — textos mistos —
abarrotados daquilo que se chama easter egg, surpresas e referências dentro da obra que
se conectam a outras, ou seja, uma forma de intertextualidade. Da mesma maneira que os
acontecimentos da obra Ilíada fazem referência a eventos e personagens de Jasão e os
Argonautas, nos dias de hoje, os filmes — como os do universo cinematográfico Marvel —
se conectam e se completam. Sugerimos a leitura do texto O prazer do texto, de Roland
Bathes. Na obra, aborda-se como o prazer sensual do texto para quem lê ou escreve é
construído por meio de relações interdiscursivas. Disponível em: https://social.stoa.usp.br/
articles/0037/3107/BARTHES-Roland-O-Prazer-Do-Texto.pdf.

56
TÓPICO 3 - A LEITURA E O LEITOR

Cria-se um espaço discursivo onde se conflitam quem escreve, a quem se


destina e os textos com quem trava diálogo, uma vez que esse próprio destinatário
atua como um discurso presumido e, por vezes, silenciado, de maneira que todo
texto permite a criação de um espaço onde se lê, pelo menos, dois textos. “Temos,
dessa maneira, a palavra, signo linguístico por excelência, atuando/interagindo
translinguística e ininterruptamente entre sistemas semiológicos. Entre os vários
tipos de textos, é o literário o espaço por excelência para ativar a propriedade
intertextual da linguagem verbal” (REIS, 2008, p. 183).

É o literário — espaço por excelência para ativar a propriedade intertextual


da linguagem verbal — que capacita o leitor a ir além do texto, a abrir janelas
inquiridas por sua consciência. É isso que o leitor contemporâneo, com muita
dificuldade, compreende quando faz esses entrecruzamentos discursivos, entre
o texto e seus elementos históricos. Cinco pessoas podem ler ao mesmo tempo,
mas cada uma terá uma visão de acordo com sua subjetividade, seu contexto.
Podem até chegar às mesmas conclusões, mas com elementos distintos a serem
referenciados. Essa é a potência dinâmica do texto.

Como desenvolver no aluno essas competências de percepção? Por meio


do texto literário, que possui uma dinâmica de atuação e um vasto universo textual
— o qual envolve, inclusive, textos literários e não literários — que possibilitam
essa interpretação constante de textos em e através de outros textos. E à medida
que esse leitor se torna mais competente, vai construindo sua competência ledora
por meio de recortes das suas próprias leituras, adaptando-se continuamente a
novos contextos semióticos.

Numa sociedade do consumo onde ler passa a ser um viés mercadológico


— com best-sellers voltados para várias faixas etárias —, é por meio da leitura
literária que se desenvolvem capacidades imaginativas, imaginação, sentimentos,
valores e as diferentes negociações por meio da qual o meio social coloca em
discussão suas questões. Aqui entra uma questão importante sobre as escolhas
literárias. Se o aluno desenvolve capacidade crítica por meio da literatura e
demais aportes de leitura, isso recairá sobre as inerentes escolhas do que irá ler.

E você? Neste momento deve estar pensando em sua trajetória escolar, nas
aulas de português. Nem todos tem a sorte de encontrar docentes engajados em
fazer essa diferença. Pois, para fazer diferente, apresentar a literatura é preciso
estar impregnado por ela.

Muitos se perguntam sobre a importância da literatura no currículo escolar.


Deveríamos perguntar outra coisa: o que foi feito da literatura nesses currículos
educacionais? Reduzida à historiografia literária, gravação de períodos, estilos e
marcas, sem um aprofundamento. O aluno vulgar, ao concluir a educação básica,
pouca chance e incentivo teve para ler, por completo, os clássicos brasileiros
que estudou. Entretanto, a importância da literatura no currículo escolar dá-se
justamente da capacidade imaginativa transmitida e desenvolvida pela literatura
para ter em mão os instrumentos que lhe propiciem atingir a plenitude de sua

57
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

cidadania. “É no texto literário que o indivíduo atinge as várias possibilidades


da língua que transcendem os signos cotidianos, ato possível pela acumulação de
significados possibilitada por esse tipo de texto” (LAJOLO, 1993, p. 106).

Essa acumulação transcende o imediatismo da cultura de massa, de maneia


que a relação entre leitor e texto deve instigar uma pluralidade de representações,
motivo pelo qual aqueles textos que promovem a indeterminação são os mais
adequados por apresentarem um mundo ficcional a ser decifrado.

Pode-se ir além, pois o texto tem a capacidade de instigar no leitor, por


exemplo, o princípio da comunidade: nos dias de hoje, há redes sociais voltadas
para esse intuito, nas quais as pessoas compartilham suas ideias, sugestões,
conhecimentos e teorias sobre o que vivenciaram. São levados a construírem
sentidos individuais e coletivos, de modo que as conversas entre leitores ampliam,
cada vez mais, essa percepção, de modo que o ato de trabalhar com o texto passa
a ser algo lúdico e prazeroso.

Trata-se de algo além de um prazer estético, mas intelectual. Umberto


Eco aborda essa questão em Seis passeios pelos bosques da ficção (2004), ao abordar o
jogo ficcional construído pelo escritor, o qual convida o leitor a adentrar e aceitar
as regras desse jogo, gerando um verdadeiro prazer intelectual. “A obra ficcional,
por sinal, é a experiência de leitura por excelência, uma vez que é simbolicamente
uma imagem do mundo, ou seja, nunca está totalmente encerada” (ZILBERMAN,
1984, p. 19). É o texto que fala mais pelas suas ausências, pelos “talvez” e “se”,
e cabe ao leitor completar esses espaços, decifrar seus enigmas por meio de sua
capacidade imaginativa e vivência.

Desse modo não se pode considerar o livro como mero instrumento


de preparação das séries iniciais, degrau para leituras nas séries posteriores. É
por meio de uma interação duradoura entre leitor e texto que se ampliam as
possibilidades de um conhecimento real do mundo, transcendendo as limitações
que o próprio ensino escolar estabelece para poder generalizar o processo de
ensino-aprendizagem.

A escola, ao instruir os alunos, padroniza os saberes, independente do grau


ou capacidade de cada um. É por isso que esses limites são transcendidos pelo
texto literário, o qual não “respeita” essas barreiras – necessárias –, possibilitando
a descoberta de uma vivência singularizada em cada obra. Se quem lê sabe
mais, então é por meio da obra de ficção que o indivíduo melhor desenvolve
sua capacidade de problematizarão para enfrentar os grandes problemas da
sociedade.

Seria esse o princípio da formação daquele que chamamos de “leitor”.

Um bom leitor é aquele que tem uma boa prática de leitura e,


consequentemente, amplo conhecimento de mundo para interpretar corretamente
vários tipos de enunciados. Ele realiza uma constante negociação linguística via

58
TÓPICO 3 - A LEITURA E O LEITOR

leitura: interpreta tanto os signos quanto os significados que produz. O ato de


leitura nunca é um ato solitário, pois, ao fazê-lo, entramos em contato com as
vozes que nos precedem.

Dúvida? Leia o poema a seguir e reflita acerca da afirmação anterior:

"Minha terra é a Penha.


O medo mora aqui
Todo dia chega a notícia,
que morreu mais um ali.

Nossas casas perfuradas


pelas balas que atingiu,
Corações cheios de medo
do polícia que surgiu.
Se cismar em sair à noite
já não posso mais
Pelo risco de morrer
e não voltar para os meus pais.

Minha terra tem horrores


que não encontro em outro lugar.
A falta de segurança é tão grande
que mal posso relaxar.

"Não permita Deus que eu morra",


antes de sair deste lugar
Me leve para um lugar tranquilo
"Onde canta o sabiá."

(Alunos anônimos de Escola na Penha – RJ)

Numa primeira leitura, o leitor pode ser levado a abordar o tema como
um mero poema produzido por alunos de maneira semianônima; um olhar um
pouco mais atento aponta a relação entre este, e aquele outro, importantíssimo
para a literatura Brasileira: A Canção do Exílio, de Gonçalves Dias.

Inconscientemente, esse leitor toma decisões/faz escolhas que guiam sua


interpretação, a saber:

a. Percebe a relação implícita e explícita entre o poema Minha terra é a Penha e a


versão que parodia, de Gonçalves Dias.
b. Pode observar o poema numa relação métrica, constatando que um dos
elementos que permitem essa correlação é como essa paródia procura manter
os elementos musicais do texto original.

59
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

c. Sendo um leitor mais competente, observa que há uma tradição que parodia a
Canção do Exílio, com textos que vão de Castro Alves a Chico Buarque, e que o
texto aqui apresentado se insere nessa situação.
d. Analisa sutilmente como o poema, embora parodie um texto da 1ª geração
romântica — nacionalista, ufanista, indianista —, aproxima-se muito mais da
estética da 3ª geração romântica — condoeira, hugoana, voltada para as causas
sociais, como a abolição da escravatura e outras mazelas da sociedade, à época.

É uma constante negociação já que o texto realiza uma ininterrupta trapaça


interpretativa, obrigando o leitor a “correr atrás” do seu sentido. Pode-se dizer
que, se o texto visa a um determinado tipo de leitor, este vai sendo construído
à medida que lhe toma contato, aceita suas regras, lança-se num eterno jogo
linguístico em prol de realizar a plena interpretação dos signos ali presentes.

Tanto os textos verbais quanto os não verbais e mistos carecem de lógica


para fazerem sentido. Essa lógica, a qual chamamos coerência textual, não está
presente só no texto e, em muitos casos, depende do próprio leitor, mas não só
dele, claro. Melhor dizendo, os sentidos dos textos são construídos na interação
entre produtor do texto – texto – leitor. Trata-se da conjugação dos três elementos,
cada um cumprindo a sua parte. E já que é assim, observe como o leitor pode
contribuir para construir os sentidos de um texto ao acionar seus conhecimentos
prévios (textuais, enciclopédicos, linguísticos). Observe com bastante atenção a
imagem que se segue.

FIGURA 22 – QUADRO

FONTE: <https://cdn.pixabay.com/photo/2014/08/25/16/17/picture-frame-427233_960_720.
jpg>. Acesso em: 24 jan. 2020.

60
TÓPICO 3 - A LEITURA E O LEITOR

Como? Você não entendeu nada? Não deve estar bem da vista! Olhe de
novo e perceberá que o pintor procurou reproduzir, de maneira impressionante,
o cenário do Alasca, no qual se vê nitidamente um coelho da neve fugindo de um
lobo branco e, ao fundo, um urso branco olha para ambos enquanto decide qual
irá atacar. A imagem detalha uma forte nevasca em meio ao deserto de neve e
gelo, de maneira que a branquidão só permite perceber que ainda é dia.

A partir dessa interessante experiência, podemos dizer que um dos fatores


que conferem interpretabilidade a um texto é a capacidade do leitor de fazer essas
correlações – e, claro, um pouco de boa vontade e bom humor. Conhecer um
pouco do estilo de quem produz algo, dos temas que são recorrentes em sua
produção nos ajuda a antecipar algo do que se pode esperar encontrar.

O mesmo pode fazer pelo leitor um título. Esse é o caso do texto de Luís
Vilela (2001, p. 38) a seguir.

(por onde começo?)


“Luiz XV” (vazio, nem um de resto)
“VÁLIDA EM TODO O TERRITÓRIO NACIONAL”
“Prezado cliente:

Faz 15 dias enviamos-lhe um lembrete. Não deve ter chegado às suas


mãos. Ele falava sobre um pagamento” (à merda).

“CURSO DE INGLÊS – PROFESSOR ELETRÔNICO”

Comprar: creme de barba – sabonete – cuecas – dicionário de español


(creme; sabonete; cuecas; comprar dicionário de espanhol? Pego na biblioteca a
hora que precisar... um brasileiro que precisa de tradução para ler Neruda não
é, como ele disse, um brasileiro Franz Kafka Obras Completas, setenta mil te
logo e bença, se ainda fosse no original mas no original não sei ler, não posso
ler espanhol que lembro do Cantinflas, compadre hombre minha colega é que
gostava de dizer que espanhol avacalha tudo).

Padeiro! Zé? 5 ou 10 mil?


“Camponesa 5-VII-65” (65?)

Telefonar para J. 4-0060 (que dia você vai me pagar? Tou duro).

“Estamos convidando V.Sa. e Exma. Família para o lançamento do


livro” (Martini esnobismo bichos penetras medalhões fofocas).

“LIGA DE DEFESA DA TRADIÇÃO DA FAMÍLIA E DA


PROPRIEDADE” (credo!)

“Prezado sócio” (prezado é o seu rabo) “Verificando em sua ficha”


(parece até que estou devendo ao mundo inteiro).

61
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

“Caro amigo” (30 de julho; hoje já é setembro) “Aguardo para breve


sua resposta” (amanhã escrevo, amanhã pago, amanhã telefono, amanhã faço
tudo).

“DESÂNIMO: O GRANDE PROBLEMA DE MILHARES HOJE Vivemos


num mundo em que a extrema complexidade das coisas” (depois eu leio).

“Você sabia? Madame Cecília, ocultista, de renome, recém-chegada a


esta cidade, resolve todos os seus problemas” (já vou lá).

Minha frase mais bela está escrita no fundo dos meus olhos e só o meu
amor a poderá ler (aquela tarde ela e eu o escuro a rua as luzes os carros por
que a gente fica tão idiota quando está feliz? aquela tarde ela e eu nós dois)
Tristeza e cansaço. Esperar, esperar, esperar. Se ela não for hoje (ela não foi)
(chega, amanhã arranjo essa droga).

FONTE: VILELA, Luiz. Os melhores contos de Luiz Vilela. Globo Editora: Porto Alegre, 2001, p. 38.

Que sentido você atribuiria a esse texto? Nenhum? Se você tivesse sabido
de antemão que tem como título Gaveta, a compreensão seria outra? Um homem
limpa e arruma uma gaveta e, enquanto vai achando papéis antigos, conversa com
seus “próprios botões” sobre esses achados. Cada um remete a uma lembrança.

Outro exemplo é como os conhecimentos prévios contribuem para o


sentido de um texto:

FIGURA 23 – NARCISISMO PÓS-MODERNO

FONTE: <https://cdn.pixabay.com/photo/2018/04/23/21/54/arm-3345706_960_720.jpg>.
Acesso em: 24 jan. 2020.

62
TÓPICO 3 - A LEITURA E O LEITOR

Com certeza, você atribuiria alguns sentidos interessantes, principalmente


se pudesse associar a figura em primeiro plano, a pessoa que faz uma selfie em meio
a um ambiente — embora distorcido — campesino. Porém, o título da imagem,
“Narcisismo pós-moderno” relaciona-a ao mito de Narciso, filho do deus do rio
Céfiso e da ninfa Liríope, sua compreensão do texto se daria de uma maneira bem
mais aprofundada. Narciso era belíssimo, moças e ninfas apaixonavam-se por ele.
Mas o rapaz não se interessava por nenhuma delas. Num dia muito quente, ele,
que nunca vira a própria imagem, debruçou-se sobre um rio de águas límpidas
para matar a sede. Viu seu rosto refletido e, pensando ser o de uma pessoa que
estivesse embaixo da água, imediatamente apaixonou-se. Ali permaneceu até a
morte, embevecido consigo.

O conhecimento do mito mudaria sua interpretação inicial?

De fato, a leitura é uma prática constante, um hábito que precisa ser


cultivado cotidianamente. Trabalhamos aqui com modalidades verbais escritas
e não verbais, além de mistas, muito utilizadas cotidianamente nas escolas para
ensinar e transmitir saberes aos alunos. Existem, é claro, outras modalidades que
permitem diferentes leituras, como a música, o cinema e o teatro. De todas as
formas, essas variedades de textos permitem exatamente o que se propõe: uma
profícua produção de sentidos através dos códigos que as veiculam.

2.1 A MEDIAÇÃO LITERÁRIA NA FORMAÇÃO DO LEITOR


O que de fato ensinamos quando ensinamos literatura? Talvez essa não
seja sua experiência pessoal, mas há um sem número de professores que, na
divisão de turmas e classes, optam por não lecionar essa disciplina. Os motivos
podem ser vastos, da falta de didática, desinteresse dos alunos e, até mesmo,
menor carga horária direcionada para a disciplina.

Devemos, pelo menos, buscar respostas para estas questões, tendo como
referência o ensino de literatura no Ensino Médio.

Em primeiro lugar, “ensina-se” literatura? Ensinamos sobre períodos


literários, estéticas, épocas culturais, estilos de época... pode-se discutir se essa
proposição se aplica a todas as faixas de ensino, mas devemos nos ater a esse
ponto. Em segundo, qual é o arcabouço utilizado? O texto literário, ou resumos,
histórias dos períodos, biografias dos autores, grandes eventos etc.?

Por influência de uma gama de linhas teóricas, o próprio estudo e


abordagem em sala de aula acaba por ser um reflexo do ensino superior:
abordamos o texto literário por um viés linguístico, antropológico, sociológico,
filosófico... mas na maioria das vezes não analisamos o texto pelo texto, ou
seja, sua estrutura linguística, seu sentido implícito. Pior: com o advento dos
saberes transdisciplinares, o texto literário é sempre o complemento de outra

63
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

coisa. Passamos a ensinar José de Alencar como complemento da chegada da


família Real ao Brasil, e Tomás António Gonzaga como fruto da Inconfidência
Mineira. Qualquer livro de literatura possui minimamente mais referências aos
movimentos culturais, do que à análise do texto.

NOTA

Há relação muito íntima entre ensino de literatura e literatura infantil. Esta


nasce, ou melhor, passa a ser classificada, catalogada e produzida a partir do momento em
que a literatura passa a possuir um viés doutrinário direcionado para a formação da criança,
algo que, até hoje, é motivo de discussão. Nem sempre o que chamamos de “literatura
infantil” ou contos de fadas, em sua vertente escrita, era direcionado para crianças, mas
lida por e para adultos. Saber um pouco desse processo pode auxiliá-lo a compreender um
pouco da evolução dessa ideia de um texto feito com fins exclusivamente pedagógicos.
Veja mais sobre o assunto no artigo O contexto histórico da literatura infantil, de Lhais Leite.
Disponível em: https://www.webartigos.com/artigos/o-contexto-historico-da-literatura-
infantil/154769.

Um dos principais reflexos é a historiografia literária que se reflete na


educação básica: filha do nacionalismo literário, sua presença é marcante, uma
vez que se centra numa progressão cronológica de obras do cânone brasileiro e
português. O livro didático pouco faz para superar essa perspectiva, com marcas
do positivismo do século XIX, o qual agregava uma visão das ciências exatas — no
sentido de “evolução” — aos livros em geral, acrescido de uma visão materialista
(CANDIDO, 1974).

Fica uma dúvida: no que difere esse material do livro de história, uma
vez que em muito se aproximam suas particularidades? A aula resume-se, salvo
exceções à leitura oral de fragmentos, por parte de professores e/ou alunos,
acrescido de perguntas ao fim de cada sequência de textos. O próprio livro do
professor já carrega um padrão de respostas, cabendo-lhe apenas “ajustar” às
dos alunos. Não há uma tentativa de depreciação, mas considerando o rumo de
muitos cursos de letras que se focam em produzir professores de português e
revisores, há relativa probabilidade de o professor não ter certeza de suas próprias
respostas, guiando-se sempre pelo gabarito. O professor transcreve no quadro
trechos do livro, responde às questões e, para muitos alunos, isso é considerado
um exemplo de excelência de aula. Em alguns casos é passada uma pesquisa a
qual os alunos copiam os textos da internet, sem um aprofundamento e reflexão
do saber atingido, isso quando ocorre.

Com base nessa breve exposição, faça-se a pergunta: o que se ensina


na aula de literatura, além de história da literatura? É possível apontar uma
contextualização grosseira, que se limita a aglutinar pontos heterogêneos —

64
TÓPICO 3 - A LEITURA E O LEITOR

como as diferentes gerações românticas e os pré-românticos —, usando um texto


ficcional como arcabouço para outros acompanhamentos? A aula de literatura
torna-se um verdadeiro mimetismo no qual se repete o que já está dado. Não
de analisar os textos para atingir conclusões, mas de explicar a história dos
movimentos literários, apresentar dados, momentos, influências e, com base
em proposições já realizadas, realizar atividades para atingir o conhecimento
previamente determinado.

Há uma frase de Umberto Eco que aponta: “O texto é aberto, mas não é
escancarado”. O problema dos estudos literários na educação básica atinge um
caminho inverto: as interpretações não são abertas, mas reduzidas. Passamos a
ser limitados — e limitar os demais — pelas interpretações e leituras de grandes
críticos, produtores de material didático e teóricos da literatura.

O ideal, não seria o professor, ao final de toda explanação necessária do


currículo literário, eleger junto dos alunos uma obra para lerem no todo e ao
iniciar cada aula abrir espaço para discutirem suas descobertas. O texto é aberto,
neste caso, às subjetividades dos leitores e o professor/mediador que o instigará
a novas descobertas. Esse tipo de atividade aumenta o vínculo professor e aluno
e amplia as dimensões da aula.

ATENCAO

Não há leitura sem viés ideológico, uma vez que a ideologia presume uma
visão de mundo. Quando se afirmar que uma resposta de exercício apresenta interpretações
possíveis, faz-se, também, uma leitura de viés ideológico. E uma resposta reduzida presente
em um manual não está isenta disso.

Observe como, nos últimos anos, as secretarias de educação por todo o


país, ao fornecerem o material didático — ou darem as devidas indicações —
fornecem/indicam uma série de materiais complementares. O texto não se basta:
deve-se complementar sua leitura com fotos, filmes, atividades paradidáticas.
As propostas curriculares apontam um excedente de mídias que trazem prontas
suas próprias interpretações dos acontecimentos. Isso gera um ciclo vicioso que
incentiva os alunos a procurarem as interpretações de terceiros: pergunte aos
seus alunos quem já leu o livro Senhora, de José de Alencar, ou quem procurou
uma versão em vídeo, resenha na internet, versão em quadrinhos, podcast que
comentava a obra... situação clássica é da professora que cobrou a leitura de
Ensaio sobre a cegueira, de Saramago, e ficou claro que, pelo teor de suas respostas,
não leram o livro, apenas assistiram à versão fílmica.

65
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

Mesmo nesse tipo de situação, há as velhas inconstâncias, como o não uso


de material, fazendo com que a aula se torne meramente expositiva, precedendo
o modelo “tradicional”. Mesmo o professor mais empolgado já se viu preso a
uma cultura escolar que apenas adapta a novidade aos contextos existentes,
transformando a aula de literatura numa versão da gramática normativa, a
“literatura normativa”. E de fato a fuga dessa historicidade literária é, por vezes,
considerada uma fuga do comum.

O problema dessa prática, existente desde o século XIX, é que temos uma
gama de alunos que, como em ciclo, aprendem a teorizar normativamente sobre
livros que nunca leram, criticar autores que desconhecem e decorar características
de escolas literárias (VERRIER, 2007, p. 8). Futuramente, estudos como teoria
literária e literatura comparada enfrentam a existência de uma geração de alunos
que se pautam em Homero sem nunca terem lido a Ilíada.

Não há, nessa situação, aula. Comum a expressão “odeio literatura”. O


aluno não odeia literatura, ele odeia o seu estudo, tomado por aula monofonia
progressivamente entediante. Como mudar esse quadro? Não se trata de um
problema das práticas ensino da disciplina em si, mas das práticas escolares, na
qual a literatura não estivesse relegada à complementação de aulas de Português
e Redação. Deve-se, assim, reconfigurar a noção de leitura literária, de maneira
ser uma atividade livre e constante, possibilitando uma autonomia por parte do
aluno, de modo que o mesmo se aproprie da obra, formando, assim, leitores reais.

Nas práticas educacionais contemporâneas, mesmo que as ações resistam


às novas perspectivas, uma reconfiguração tem atingido os manuais acadêmicos
e determinações do Ministério da Educação, paulatinamente, a ponto de já se
encontrar, em não poucos documentos, o termo “leitura literária” para abordar a
leitura de textos literários tendo em vista sua potencialização.

Essa potencialização possibilita a inserção de mudanças em prol do ensino


dessa disciplina, mas quais seriam suas implicações? Nos dias de hoje, seria um
deslocamento significativo na sua didática, visto que move o foco para o texto
literário e a capacidade de promover uma interação significativa com o aluno.
É uma visão que possibilita ao aluno não se limitar aos sentidos indicados pelo
professor — e pelo próprio livro didático —, mas limitar-se aos sentidos que vão
construindo por meio das leituras.

Dessa maneira, a prática da leitura literária necessita de transcender


a visão muito comum de ser mero arcabouço complementar para a aplicação
de teorias pedagógicas — como, por exemplo, a leitura dos romances de Jorge
Amado em prol da Pedagogia do Oprimido, de Paulo Freire —, tendo o texto e a
formação do indivíduo como fim, não como espaço de transição. Pode-se apontar
um ponto ainda mais grave: a imposição dos discursos dominantes — discursos
monofônicos — que abafam as possibilidades existentes fruto de representações
comunicativas dominantes que abafam as novas que surgem.

66
TÓPICO 3 - A LEITURA E O LEITOR

Voltemos ao que fora apontado sobre o gosto de ler. Alguém não gosta de
ler? A frase é ilógica. Mas não o é. Há pessoas que não leem um livro por ano, pelo
menos, e ainda não entendem a insanidade de um ser leitor. Qual é a graça? Não
tem sentido? Só haverá sentido para quem um dia aprendeu a tê-lo.

O ato de leitura presume uma aproximação: da mesma maneira como


nos lançamos ao deleite estético de outras obras, ou que vamos ao cinema de
acordo com nossos gostos, somos lançados à leitura de livros que nos atraem. Isso
ocorre pela propaganda, pela indicação de alguém, pela busca por informação —
e, mesmo assim, podemos pesquisar determinado assunto a partir de um livro
específico, mais condizente como nossos hábitos de leitura — e por capacitação:
profissionais das mais variadas áreas leem por que precisam se capacitar,
principalmente os profissionais de letras. A questão é que lançarmo-nos à leitura
sem uma obrigatoriedade gera uma identificação maior entre leitor e texto. Da
próxima vez que seu aluno alegar que não leu o livro que teria que apresentar
em sala, pergunte qual ele estava lendo naquele momento, ou que acabara de ler.

Vamos nos deter um pouco na experiência que ocorre no filme Sociedade


dos poetas mortos? Você já viu? É praticamente um clássico. Se não viu vale a pena
assistir a ele. Mas vamos inseri-lo no contexto. Essa dramaturgia se passa em
1959, em uma tradicional escola norte-americana apenas para garotos. Guiada por
quatro grandes princípios (tradição, honra, disciplina e excelência), a Academia
Welton se orgulha de formar grandes líderes numa sociedade em que os pais
tinham enorme influência na escolha profissional dos filhos. Um novo professor,
John Keating, confronta os ideais conservadores da instituição, que pouco valoriza
expressões artísticas e limita a liberdade dos estudantes. Suas aulas estimulam o
pensamento crítico e autônomo dos jovens e os ajuda a enxergar o mundo de um
ponto de vista diferente, perseguindo suas paixões e assumindo as rédeas das
próprias vidas. Com isso, tenta acabar com a passividade frente a um sistema
autoritário que não permite que reflitam sobre suas trajetórias e desejos. O professor
desperta nos alunos a vontade de se descobrirem e aproveitarem a vida. A sala
de aula ficou pequena para eles e criam um clube de leituras noturna. Entre as
leituras, cada um se depara com novos sentimentos, sonhos e características que
até então não conheciam sobre si mesmos. Em meio a aulas intrigantes, leituras
inspiradoras e descobertas conflituosas, uma série de consequências acomete
os personagens. Entretanto, ao final, fica claro o reconhecimento dos alunos ao
professor e a perpetuação do seu legado, que ensinou aos jovens a possibilidade
de encarar o mundo de uma maneira nova. Vemos aqui os jovens se lançando a
leitura sem obrigatoriedade, pela fruição, pela descoberta do inusitado. Como
incitar isso atualmente? Creio que não, pois trata-se de criaturas heterogêneas.
Aqui entra o viés do docente, sua formação, sua empatia e sua subjetividade em
enxergar o todo e perceber como agir sobre ele.

67
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

DICAS

Fazemos o recurso a uma metáfora para chamar o leitor de “categoria narrativa”.


Na verdade, as categorias são “tempo”, “espaço”, “narrador”, “personagens” e “foco narrativo”.
Interessou-se? Conhecê-las pode auxiliar você a selecionar textos que tenham maior
produtividade com os alunos. Leia o texto Categorias da narrativa, disponível em: https://
paginaapagina.files.wordpress.com/2010/02/categorias-da-narrativa.pdf.

“Todo texto possui, então, uma espécie de leitor empírico” (ECO, 1994,
p. 17), presumível para todo e qualquer texto literário. Leitor porque é para ele
que é direcionado, presumível na medida em que o autor trava um diálogo com o
indivíduo que será seu “alvo”, uma imagem não física, mas prevista.

Você já ficou surpreso como aquele seu aluno que não lê Senhora, de José
de Alencar, lê em menos de duas semanas um livro com mais de 900 páginas,
provavelmente sobre dragões? Isso está intimamente associado ao gosto, formas
de pensar, campo de atuação, experiência e interesse do leitor. A ideia de um
indivíduo que “foge da realidade”, que prefere passar seu tempo com a leitura
envolve, inicialmente, a proximidade com esse hábito e o texto em si. O leitor,
habituado à sua prática, desenvolve suas próprias estratégias de leitura, de
acordo com sua individualidade.

A ironia é que a escola, espaço de descoberta e saberes por excelência —


em teoria — torna-se o lugar de padronização das descobertas: todo ato realizado
está inserido em um conteúdo programático, ou num currículo oculto. O texto
literário ali estudado dá conta das premissas da escola, não do amadurecimento
do aluno. Isso não impede, por exemplo, que modificações e transformações
possam ocorrer, uma vez que, tradicionalmente, a escola é também um espaço
de mudança. É por isso que devemos observar os caminhos atuais — e a serem
seguidos — para a proposição da mudança do ensino da literatura na escola dos
dias de hoje.

Cabe aqui ressaltar o porquê dessa escolha. Em leituras de best-sellers,


por exemplo, o texto ocorre de forma linear, está escancarado e explicito ao
leitor. Já na literatura, a maioria costuma dizer que é difícil, que não se entende
o que o autor quer dizer, não compreendem os fatos entre outros fatores. Isso
ocorre porque a literatura está aberta ao leitor, como assume Umberto Eco (1994),
mas não escancarada. Ela permite ao leitor alçar seu próprio voo sobre o texto,
parar sobre uma página e imaginar mais possibilidades, refletir sobre o porquê
da falta de linearidade. É essa premissa que tira o leitor da zona de conforto de
uma leitura comum. É isso que torna o texto um clássico, uma literatura, a sua
estrutura que foge do convencional, por sua implicidade. Se a escola é o espaço
de formação de leitores, de capacitação da elite intelectual, que espécie de leitores

68
TÓPICO 3 - A LEITURA E O LEITOR

estamos formando? Considerando os 12 anos de educação básica, qual a base que


um aluno tem dos textos mais fundamentais da nossa literatura? Por vezes, ele
se forma sem ter contato até com autores mais populares, quando muito tendo
acesso a contos e trechos de poemas em suas provas.

Se tradicionalmente o ensino fundamental tem a responsabilidade de


despertar esse gosto, então ele já deveria ser um leitor competente ao adentrar
no ensino médio. Nada mais longe da verdade: na atual conjuntura educacional
do país, na qual o ENEM delimita os caminhos a serem perseguidos e os rumos
perseguidos por quem deseja aprovação nos melhores vestibulares, o ensino de
literatura adentra na sua fase mais tecnicista: o aluno é um executor de tarefas,
limitado aos chavões e decorebas.

Essa é uma questão antiga no Brasil: os inconfidentes mineiros, além de


questionarem o aumento de impostos, também questionavam a necessidade de
uma educação de base: desde sempre a formação intelectual do país era direcionada
para atingir as mais proeminentes universidades. Significativo é o livro O
Ateneu, de Raul Pompeia, o qual apresenta um colégio que recebia matrículas
com muita antecedência, e colocava os alunos em situação de internato e tantas
outras provações visando ser o primeiro degrau para ensinar nas universidades,
à época. O colégio — que dá nome para a obra — seguia uma premissa intensa de
gravação de normas, regras e padrões, em todas as disciplinas.

E
IMPORTANT

O texto literário tem a capacidade de mimetizar o meio que o cerca. Obras


como O Ateneu, de Raul Pompeia, refletem uma sociedade voltada para o funcionalismo
público, no qual se procura os melhores colégios não para o desenvolvimento cidadão do
indivíduo, mas uma capacitação para os melhores cargos.

Parece-lhe familiar essa situação? Não é muito diferente — similar até


demais — da mentalidade dos preparatórios dos dias de hoje, que levam o
aluno a um acúmulo violento de conhecimentos, por vezes instruindo-os em um
regime intensivo e extensivo durante três anos, não para atingirem os pilares da
cidadania, mas para serem aprovados em dada avaliação. Tendo em mente essa
mentalidade que domina nosso país, o que de fato poderia ser ensinado em uma
situação de reavaliação do ensino de literatura, partindo do princípio de que a
base dessa revitalização, o objeto de estudo, seria próprio do texto literário?

Vincent Jouve (2002) delimita alguns passos a serem seguidos para que se
estruture minimamente um processo de reação ao status atual. Para ele, “reverter
o atual quadro envolveria antecipar o problema, reestruturá-lo e interpretar os

69
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

resultados obtidos” (JOUVE, 2002, p. 18). A leitura deve ser interpretada como
ação cognitiva por necessidade de dada competência, ou seja, capacidades
mínimas que o leitor deve ter em mãos para seguir com a leitura. Uma vez
que temos o fenômeno dos analfabetos funcionais, é preciso, pelo menos, uma
progressão dos textos a serem lidos bem como os códigos para os quais o aluno
será apresentado, visando ao desenvolvimento dessas capacidades.

Jouve (2002) prossegue apontando as particularidades e características


que devem ser desenvolvidas em prol desse processo de revitalização da leitura
literária em sala de aula: a noção de afetividade, argumentação e simbolismo. O
texto deve ser abordado como parte de um processo afetivo, ou seja, a relação do
eu-pessoal para o auxílio da aproximação. Na medida em que foi apontado que deve
haver uma aproximação entre leitor e texto, é importante a relação entre o objeto
e o que este lhe diz. Obviamente um livro sobre superação ou autoajuda sempre
pode dizer algo ao leitor, mas coloca-se em questão o princípio da universalidade
de um texto, de uma obra que séculos depois ainda tem a capacidade de dizer
algo e despertas a empatia do ledor. Há, também, o processo da argumentação,
no qual todo texto levanta questões a serem respondidas e, com isso, suscita o
indivíduo a buscá-la.

Tantas leituras façamos de Gabriela, cravo e canela, de Jorge Amado, em


tantas questões nós seremos suscitados a buscar, como abuso, patriarcalismo,
emancipação feminina etc. E por fim, a noção do simbolismo processual: cada
texto propõe diversas leituras e confrontos de pontos de vista na medida em que
atinge leitores diferentes, com os mais variados processos formativos. E cada
leitor, dotado de seu devido capital simbólico, confronta-o com o texto que lhe
chega. Há uma negociação a todo instante entre seus símbolos e aqueles que o
atinge, de modo que, ao se mesclarem e se transformarem, também influenciam
os outros símbolos de suas futuras leituras.

Essas práticas são estruturáveis, ou seja, não contradizem a leitura de


outros tipos de texto. Voltamos à expressão: “quem lê, sabe mais”. O aluno só
pode desenvolver essas habilidades na medida em que tem contato com toda
a obra, e não apenas trechos. Ao se limitar ao livro paradidático e às respostas
do quadro, não desenvolve plenamente suas competências que poderiam ser
colocadas em práticas durante todo o processo de leitura. Seria como ensinar
alguém a nadar utilizando apenas um manual didático, sem uma aula prática na
piscina. Sempre faltará algo para completar seus objetivos.

Apontamos, então, para o grande problema para o desenvolvimento


dessa prática de leitura particularizada na escola, a qual não se centra no
interesse do corpo discente, mas a falta de tempo e espaço nas escolas para o
desenvolvimento de dadas atividades, muitas vezes impedidos devido a um
currículo escolar enrijecido, um currículo oculto desestruturado que se foca em
objetivos extremamente engessados, sem se atualizar, e a cultura escolar que não

70
TÓPICO 3 - A LEITURA E O LEITOR

oferece possibilidades para a inserção de saberes que propiciariam novas práticas


por parte do aluno, de maneira que o mesmo possa fruir refletir e elaborar novos
conhecimentos, estes, desatrelados da estrutura didática tradicional.

Aprofundaremos esta acepção nos tópicos futuros, mas é extremamente


fundamental essa noção de que há um confronto — e conflito — constante entre o
projeto político pedagógico de vários sistemas educacionais, e a aplicação dessas
políticas, de maneira que o aluno se encontra limitado não pelos seus gostos, mas
pelas oportunidades que lhe oferecem.

71
RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico, você aprendeu que:

• A leitura é uma prática construtiva e dialógica, de maneira que lemos o que


fora produzido por outros leitores.

• O leitor é um indivíduo que precisa se lançar a uma atividade prática constante,


de modo que desenvolva mais plenamente sua prática de leitura.

• O ensino da leitura é uma prática constante que deve ser feita em todas as
etapas da formação escolar, uma vez que a leitura não se esgota no texto
literário, abrange a percepção do mundo.

• A leitura, assim como a produção textual, é uma prática de inclusão social.

• Por meio da leitura o indivíduo desenvolve a capacidade de “estar na


sociedade”, interagir com os elementos que o circundam.

• A leitura se realiza no espaço que a circunda, é uma forma de interpretação do


espaço social.

• O ensino da leitura não pode se limitar a uma prática fossilizada, justamente


porque o ato da leitura se renova de acordo com as situações que surgem no
decorrer dos tempos.

72
AUTOATIVIDADE

1 Agora que tivemos a oportunidade de abordar a relação entre leitor e


leitura, bem como o desenvolvimento de projetos educacionais voltados
para o desenvolvimento da habilidade de leitura, faça uma pesquisa por
projetos voltados para a leitura e produza uma breve apresentação sobre
o projeto selecionado. Não esqueça de deixar um link de consulta para o
projeto!

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74
TÓPICO 4 -
UNIDADE 1

RELAÇÃO DA LEITURA COM A ORALIDADE E COM


A ESCRITA

1 INTRODUÇÃO
É comum ouvirmos que a escrita é a transcrição da fala e que, por isso, se
escrevêssemos como falamos, não teríamos dificuldades com a ortografia. Será
mesmo?

A escrita é uma convenção, por meio da qual se busca a padronização


da língua de modo que se possa facilitar a comunicação entre os seus usuários.
Entre ela e a fala há diferenças. Conhecê-las evita que traços da fala interfiram na
escrita.

Vejamos algumas características exclusivas da modalidade falada, mesmo


a produzida por sujeitos escolarizados. O trecho que segue é um fragmento,
transcrito, de uma entrevista informal realizada para o Projeto Norma Linguística
Urbana Culta do Rio de Janeiro – NURC – RJ – (Para uma História do Português
do Brasil):

— E quan... quantas refeições normalmente o senhor faz?


— Bom, eu faço três alim... três refeições. Bom, se contar o café da manhã
seriam quatro.
— E essas duas refeições assim, o café e o almoço, do que que consta?
— Ah, bom, legumes, né, normalmente eu, nós, eu no caso meu e da
minha senhora, nós comemos mais legumes.
— Que tipo de legumes?
— Ah, vou te dizer: couve, tipo mineira, eh, aquela verdura que o Pope...
o Popeye faz propaganda, espinafre, e às vezes jiló, ervilha. Hoje por exemplo
foi arroz e essa vagem, sem sal. A turma lá em casa reclama que quando eles,
eh, sentem assim, hum, apetite de participar da nossa alimentação, que é feita
separada, reclama, eu digo: bom, então coloquem sal se vocês querem. Agora,
eu digo a minha senhora o seguinte: eu aceito esse regime em parte, até aos
sábados, entende, domingo eu quero a minha carta de alforria. É, o domingo.
— Por que que não deixaram comer a farofa? De que era a farofa?
— É porque a minha senhora diz que a farofa, não é, leva um pouco de
sal e para evitar o excesso de sal, e a farofa exige também depois ingerir água
em excesso, e quem tem pressão alta não pode estar ingerindo muito líquido,
né? Tem que evitar o líquido, evitar o líquido.
FONTE: <http://nurcrj.letras.ufrj.br/corpora/did/did_103.htm>. Acesso em: 28 jan. 2020.

75
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

Podemos observar que o texto vai sendo organizado ao mesmo tempo em


que é produzido. O seu planejamento é concomitante ao momento da fala. Desse
modo, pausas, correções, reparos, mudanças de tópico ocorrem localmente, isto
é, à medida que se vai pensando sobre o que se está pretendendo dizer.

Essas marcas de oralidade não raro invadem a escrita, uma vez que nos
habituamos com elas. Os motivos por que isso ocorre vão desde o pouco que se lê
até o tempo que é gasto mais com atividades de fala do que de escrita.

Na verdade, assim como não há uma única modalidade de língua, uma


e outra também variam. A motivação para tal variação não é única. Há variações
de acordo com a região de origem do indivíduo, a idade, o sexo, a profissão, o
grau de escolaridade e a condição social. A língua varia desde um registro muito
informal ao mais formal. “Nossa tarefa é tornarmo-nos poliglotas da própria
língua”, como sustenta o professor Bechara (2015, p. 25), e adequá-la ao nosso
interlocutor e às situações comunicativas com que nos defrontamos.

Isso significa dizer que devemos saber adequar o nosso modo de falar ou
de escrever às circunstâncias sociais e ao gênero de texto que nos propomos a
produzir. A língua pode, nessa perspectiva, variar tanto na fala quanto na escrita.

É através da escrita — todas as formas de “se escrever” — que o indivíduo


dá sentido ao que quer dizer, cria formas, imagens. Aprender a escrever não é
apenas “decorar” um conjunto de signos, mas, por fim, entender os fundamentos
do sistema de escrita, e como a linguagem — em seus aspectos discursivos —
funcional.

2 CULTURA ORAL E LEITURA


Ao longo da vida escolar, no estudo de Português, você provavelmente
teve contato com diferentes conteúdos, visando à aprendizagem da língua e da
literatura. Ainda que a continuidade dessa aprendizagem seja sempre desejável
(e esse é certamente um dos nossos objetivos), nós o convidamos a dar um
passo adiante, podendo também refletir sobre a própria língua e sua relação
cultural de coautor na formação do indivíduo, de modo a conhecer alguns
conceitos relacionados ao mundo da escrita, o que facilitará a sua compreensão
dos mecanismos de produção textual. Poderá, desse modo, discutir modos de
funcionamento das práticas comunicativas e tomar ciência de suas implicações
sociais — caminhos produtivos para a ampliação de horizontes e a formação
profissional.

Como as concepções de linguagem e de língua, processos discursivos, se


vinculam à noção de cultura oral e cultura letrada? E qual a importância desse
termo para a compreensão/surgimento/instauração de uma sociedade leitora e
escritora — por exemplo, no Brasil?

76
TÓPICO 4 - RELAÇÃO DA LEITURA COM A ORALIDADE E COM A ESCRITA

Ter acesso à leitura e escrita é, em um sentido mais profundo, ser um leitor


e produtor de textos competente e, em último caso, a conquista da cidadania
por parte dos indivíduos (SOARES, 1989, p. 118). É consenso que, em um
sistema de ciclos educacionais, o aproveitamento e aumento de resultados no
desenvolvimento das habilidades de leitura e escrita seriam mais profícuos e
diversificados. É por esse motivo que a apropriação dos processos de alfabetização
e letramento devem seguir um conjunto de processos com metas específicas.

O chamado “1º ciclo da educação”, vulgo “ciclo de alfabetização”, abrange


as três primeiras séries do Ensino Fundamental I. Porém, apesar de investimentos
governamentais que remetem ao século passado, é grande a presença de
analfabetos funcionais — que desenvolveram a capacidade de ler enunciados,
mas não de interpretá-los corretamente — ao fim dessa etapa. Isso se dá, segundo
Magda Soares (2003), professora da UFMG, devido à perda de especificidades
por parte dos ciclos, os mesmos deixando de ser direcionados para a plena
alfabetização do aluno em detrimento da perda de metas e objetivos específicos
em prol do desenvolvimento infantil. O aluno atravessa a etapa inicial vítima de
uma visão bancária da apropriação da educação, contribuindo para o aumento
dos índices de analfabetismo nas séries seguintes e, consequentemente, evasão
escolar. As competências linguísticas não desenvolvidas previamente acarretam
num efeito ainda maior em toda o sistema de ensino ao longo dos anos, afetando,
inclusive metas, objetivos e competências posteriores.

A maior barreira a ser superada nessa etapa é a dificuldade em promover


aos alunos a possibilidade de refletir como a apropriação da palavra está associada
ao seu desenvolvimento. Isso, claro, paralelo a um trabalho na perspectiva do
letramento. Sob um ponto de vista que segue a linha de Piaget, cada etapa deve
seguir seu devido tempo, de modo que essa alfabetização deveria ocorrer em
tempo oportuno a cada criança e, para o pleno desenvolvimento da escrita, deve-
se levar ao aluno/discente/criança à compreensão do uso social da escrita como
forma de domínio da autonomia intelectual: a criança não aprende “apenas” a
ler e escrever, mas compreende como isso é fundamental para sua autonomia em
sociedade.

Parece complexo absorver os passos do processo de letramento e


alfabetização; entretanto, como enfatiza a professora Magda Soares (2003), no
Brasil o letramento — resultado do ato de leitura e escrita, mas numa visão
associada à pratica social do indivíduo — surgiu enraizado no conceito de
alfabetização, originando dessa forma uma confusão entre a especificidade
de cada termo, provocando uma inadequada e inconveniente fusão dos dois
processos, com prevalência do conceito de letramento, o que tem conduzido certo
apagamento da alfabetização. É, de fato, uma luta diária e quase individual do
docente para atingir suas metas sem prejudicar o aluno com um saber que pode
prejudicar o seu desenvolvimento.

77
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

A escrita é uma convenção, por meio da qual se busca a padronização


da língua de modo que se possa facilitar a comunicação entre os seus usuários.
Abaixo, um modelo teórico das etapas necessárias à apropriação da escrita, de
um indivíduo que apenas conhece a variedade falada da língua, até aquele que
domina perfeitamente a modalidade escrita padrão formal:

QUADRO 3 – ETAPAS DA APROPRIAÇÃO DA ESCRITA

1 Língua falada, adquirida no meio social em que se nasce e vive e com


que se comunica com os demais.
1 A escrita adquirida mediante processo inicial de Alfabetização escolar. Nesta
fase, os traços da língua falada pelo aprendiz interferem nessa escrita.
2 Nesta etapa da escolarização, a escrita já é, em seus aspectos convencionais,
dominada pelo aprendiz. Já não há mais interferência da fala.
2 Em um processo inverso, aqui a fala é que passa a sofrer influência da
escrita convencional. Trata-se da transferência dos traços dessa escrita
padronizada para a fala.
FONTE: Adaptado de Moreira (2003)

O indivíduo com pouca escolaridade — ou acesso a uma prática de leitura


considerada didaticamente “fraca” — situa-se entre as fases E1 e E2, seu texto
possui muitas marcas da oralidade, distanciando-se da norma padrão. Conforme
apontam estudos (BONAMINO; COSCARELLI; FRANCO, 2002), boa parte
dos candidatos ao ENEM inserem-se nesse perfil, a julgar pelos traços de suas
redações.

2.1 CULTURA ORAL E ESCRITA


Salientamos a problematização do termo “letramento”, o qual não pode
ser visto apenas como a escolha de um termo do modismo pedagógico do
docente de língua portuguesa. Para fins de comparação, a palavra “alfabetização”
tem a acepção de “domínio da técnica de leitura e escrita”, na medida em que o
termo “analfabeto” seria aquele que não sabe ler — tecnicamente e socialmente.
O termo pedagógico “letramento”, este muito mais recente, busca ir além dessa
delimitação, tenta atingir a plurissignificação social da apreensão da leitura e
escrita enquanto prática do cotidiano.

Diz-se além: o letramento é uma busca pela superação da alfabetização


enquanto técnica enviesada e cristalizada da aquisição de saberes, uma vez que
esta padroniza toda uma técnica, já a outra, busca trabalhar o texto para além
dos livros didáticos. Enquanto a alfabetização estaria limitada ao código escrito
— uma vez que uma criança de cinco anos já tem domínio da língua na sua
variedade cotidiana — e suas correlações, como alfabeto, relações sintáticas e
sonoras; o letramento, ao aprofundar o texto e suas relações sociais, as funções

78
TÓPICO 4 - RELAÇÃO DA LEITURA COM A ORALIDADE E COM A ESCRITA

da escrita — e suas múltiplas formas, bem como os métodos através dos quais
os indivíduos apreendem os mais diferentes tipos de textos, como uma música,
uma pintura, um texto oral — a exemplo dos contos de fadas — e suas correlações
cotidianas. A necessidade de textos mistos, como o cinema, de apresentar um
herói e alguém a ser salvo, remetem a relações intertextuais às quais o indivíduo
tem contato na infância através de contos de fadas, “mecanismos esses que dão
dinamismo às diversas narrativas e propiciam que melhor compreendam as
histórias a serem contada ao possuírem elementos em comum com histórias de
fantasia” (KLEIMAN, 2001, p. 18).

Ora, ao compreendermos a aquisição de leitura não como processo de


alfabetização, mas de letramento, o mesmo assume uma dimensão mais ampla,
de maneira que todo o ambiente sociocultural do indivíduo passa a ser seu
professor/letrador.

Se fazer parte de uma família com maior grau de instrução demonstra


um maior grau formativo do/no aluno, esse princípio não muda,
mas assume outros contornos ao considerar os vários códigos sociais
através do qual interagimos e que podem ser resgatados em prol do
aproveitamento escolar (BOURDIEU; PASSERON, 1975, p. 35).

Um indivíduo que possuísse uma inteligência cinestésico-espacial, ou


seja, voltada para práticas motoras, passa a desenvolver, antes das primeiras
séries, suas primeiras concepções de escritas.

Bakhtin (2005) aborda esse princípio ao falar do carnaval, e de como,


para muitos, é uma “segunda vida”. Analogamente, o aluno pode ainda não
ser proficiente no código verbal-escrito, mas possui uma cultura carnavalesca
sofisticada que lhe traz uma interpretação de mundo por vezes mais ampla do
que sua pouca idade adquiriria em livros escolares.

O ambiente escolar, em contraponto, desenvolve o conhecimento das


formas do discurso — pesquisa, desenvolvimento, testagem de variáveis e
exclusão do que não é socialmente aceito como verdadeiro —, mas a partir
das premissas de letramento, passa a desenvolver questões que dialogam
diretamente com as premissas já adquiridas pelo discente, em seu ambiente
cotidiano. O ambiente escolar, longe de anular o não aceito, partilha com este um
conhecimento prévio e o apresenta sobre novas matizes, de maneira que tão ou
mais importante é a participação do estudante via práticas discursivas orais no
seu trajeto de proficiência das práticas discursivas escritas, do que o mero saber
docente, este, autorizado, determinado e visto como sendo, por muitos, como
o único relevante. Eis a grande vantagem do letramento sobre a alfabetização,
enquanto jogo discursivo de múltiplos saberes, no qual o que fora silenciado é
resgatado em prol da criação de saberes transdisciplinares. Logo, haveria uma
relação tênue entre letramento e construção do discurso do eu, ou seja, como o
sujeito se define, e os mecanismos que adquire para tal ato definitivo.

79
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

Via letramento ocorre uma transição de competências que favorecem o


desenvolvimento das linguagens orais e escritas (SCARPA, 1987), o que por vezes
é prejudicado por práticas educativas não transtextuais, as quais fragmentam
e descontextualizam a apreensão da linguagem, suas práticas discursivas e os
demais saberes. Dessa forma, não haveria um desenvolvimento da linguagem
oral e da escrita como uma sequência: embora a aprendizagem seja gradual, o
indivíduo passaria por diferentes etapas, entre idas e vindas, desenvolvendo tanto
sua fala quanto sua escrita. À medida em que vai interagindo com os diversos
códigos sociais, as manifestações discursivas, desenvolvendo e descobrindo
processos cognitivos, este mesmo indivíduo por vezes retorna a espaços
anteriormente frequentados para reformular domínios pouco abordados. Há um
determinado uso dessa prática no cotidiano escolar quando, via progressão, o
indivíduo retoma no Ensino Médio saberes previamente abordados no Ensino
Fundamental; entretanto, a fragmentação de saberes por vezes o inibe de
correlacionar adequadamente o que já aprendera, com novas visões do mesmo
saber. Uma perspectiva social do letramento seria a este mais profícua e vantajosa.
Permitir-lhe-ia, por exemplo, ir além da função pragmática da leitura — as práticas
do cotidiano, como ler breves enunciados, entender superficialmente a letra de
músicas, assistir filmes legendados etc. — para funções menos pragmáticas e mais
conceituais, possibilitando que o indivíduo vá além das apreensões do cotidiano.

NOTA

A prática de letramento, como explicado, envolve mais do que a apropriação


da escrita, mas, também, seu uso social. Ela vai de encontro a uma série de estudos
desenvolvidos ao longo do século XX, de teor socioconstrutivista, que aborda a apropriação
do saber com base não no conteúdo em si, mas no sujeito que dele se apropria.

Da mesma maneira que cada indivíduo se comunica utilizando as mais


diversas variedades linguísticas, os processos de aprendizagem da língua seguem
o mesmo trajeto. Logo, pode ser considerado um erro conceber que a língua só é
aprendida por meio de um espaço de saber, ou seja, a escola. Se compreendermos
a criança como detentora de algum saber, podemos auxiliá-lo a desenvolver
mais sua capacidade de interpretação textual. Se são atores sociais, é relevante
compreendermos a visão que tem acerca do código escrito, como o concebem e no
que desejam se aprofundar. O professor que ainda não fez uma pergunta dessas
para sua turma, ficará surpreso quando o fizer. Embora muitas respostas possam
ser desanimadoras, o resultado obtido e as possibilidades de uso em sala de aula
valerão à pena.

80
TÓPICO 4 - RELAÇÃO DA LEITURA COM A ORALIDADE E COM A ESCRITA

Praticar a escrita sempre foi um ato simbólico. Mas nem de teorias vive
apenas o homem. Principalmente o professor, o qual precisa, muito mais do que
dominar a teoria, colocá-la em prática. Alguns educadores se empenharam em
teorizar a prática pedagógica dentro e fora da sala de aula, estudando o processo
de apropriação da escrita como ato de emancipação do indivíduo.

Essa percepção foi sendo gradualmente construída por diversos


pesquisadores ao longo do tempo, através de vários caminhos, idas e vindas,
avanços e retrocessos. Como apontam Priscila Larocca e Esmérica Sabeli (2001,
p. 192):

A vertente da sociologia conhecida como “Nova Sociologia da


Educação”, encabeçada por nomes como Baudelot, Althusser,
Bourdieu e Passeron, dentre outros, promovera uma série de críticas
ao modelo vigente na educação, trazendo denúncia aos mecanismos
institucionais presentes no âmbito escolar, de maneira que, para eles,
a escola corroborava para a manutenção do status quo, ou seja, a
perpetuação de uma sociedade essencialmente desigual.

Em resposta a esse movimento, Piaget é resgatado via estudos da


psicogenética por meio de Ana Teberosky e Emília Ferreiro. Estas — na mesma
linha dos estudos originais que consideravam as necessidades específicas do
indivíduo em detrimento do sistema educacional – agora deixavam de lado as
técnicas pedagógicas em prol de uma nova linha de pesquisa, associada com as
teorias da recepção que abordam o processo educativo sob o ponto de vista do
sujeito que aprende — ou seja, um sujeito que é consciente, o qual constrói o
conhecimento através das hipóteses que formula.

A opção por Piaget envolve o fato deste ter desenvolvido os alicerces


do que veríamos a chamar de lógica infantil, de como a criança aprende de
maneira diferente da dos adultos: disso, surgiram os estágios educacionais
de desenvolvimento. Ferreira e Teberosky, ao observarem como crianças de
bairros pobres de Buenos Aires adquirem a competência linguística, deram
prosseguimento às teorias de Piaget ao formular suas hipóteses, em diálogo com
toda uma tradição socioconstrutivista do século 20.

Os pontos por elas elencados lançaram novas perspectivas que foram


seguidas e implementadas por muitos sistemas educacionais, não sem críticas.
Instaurou-se a segregação em ciclos de apreensão da escrita, que vão do pré-
silábico, silábico ao alfabético; entretanto, em muitos casos, privilegiou-se o
indivíduo que aprende em prol de um tipo particular de professor, o qual busca
desenvolver as condições para a interação socioeducativa frente ao fenômeno
não-natural da apropriação da escrita. Diferente da fala, a escrita não é uma
manifestação puramente social, mas envolvida em uma série de caminhos
e procedimentos ao sincrônicos e diacrônicos, e por vezes um profissional em
particular faz a diferença ao longo da sua transmissão e aprendizagem.

81
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

Foi em meados dos anos 1980 que as teorias de Lev Vygotsky e Alexander
Luria — época da chegada da Psicologia Histórico-Cultural no Brasil — deram
nova perspectiva aos estudos da aprendizagem, opondo-se ao até então abordado
por Piaget e enfatizando outros olhares, como a relevância da apropriação da
linguagem escrita pelas culturas. Os estudos culturais, que remetiam aos anos
1960, bem como o fim dos grandes impérios coloniais, há tempos influenciavam
gradativamente os diferentes campos de saber. Para Larocca e Saveli (2001,
p. 209), “a linguagem, em suas diferentes formas de manifestação — gesto,
brincadeira, desenho, fala e escrita — que sabemos ser formas de viver cultural, é
reconhecida pela psicologia Histórico-Cultural como ferramenta de constituição
e transformação intramental”.

NOTA

Lev Vygotsky foi um psicólogo de influência marxista que desenvolveu ampla


pesquisa sobre os aspectos psicológicos da linguagem. Seus estudos são uma das bases
dos estudos da Semiologia contemporânea, além de Bakhtin, Chomsky e Saussure.

Vygotsky e Luria resgatam muito das premissas de Bakhtin ao apontar o


caráter dialógico da língua, ou seja, sua dimensão discursiva. A criança, durante
o processo de aprendizagem, não apenas decora: cada palavra que compreende
e, num sentido mais amplo, a criação do seu discurso é, por definição, criado em
sentido dialógico. Se ele se apresenta como “eu”, é por que não é “tu”; se durante
sua afirmação de identidade ele se apresenta como “Paulo” — palavra do gênero
masculino —, é por que se opõe à “Paula” — palavra do gênero feminino —
e “Paulas” — a qual acrescenta uma oposição indicativa de número. Sua visão
bakhtiniana remete a um princípio da formação de sentidos que é a raiz da
premissa dialógica do crítico russo:

O falante não é um Adão, e por isso o próprio objeto do seu discurso


se torna inevitavelmente um palco de encontro com opiniões de
interlocutores imediatos (na conversa ou na discussão sobre algum
acontecimento do dia-a-dia) ou com pontos de vista, visões de mundo,
correntes, teorias etc., (no campo da comunicação cultural). Uma visão
de mundo, uma corrente, um ponto de vista, uma opinião sempre
tem uma expressão verbalizada. Tudo isso é discurso do outro (em
forma pessoal ou impessoal), e este não pode deixar de refletir-se no
enunciado (BAKHTIN, 2003, p. 315).

Na absorção e reinterpretação que faz das premissas de Bakhtin, Vygotsky


ajuda-nos a entender como o ato de aprendizagem é, também, um processo
dialógico, envolvendo processos que são simultâneos e concomitantes: por que
dizemos o que dizermos, e qual a relação entre o que é escrito, e o que é dito;
palavra escrita, e proferida.

82
TÓPICO 4 - RELAÇÃO DA LEITURA COM A ORALIDADE E COM A ESCRITA

É por isso que as escolhas feitas cronologicamente dentro e fora da língua


envolvem uma acepção cultural, de modo que, para que sejam desenvolvidos
métodos eficazes de domínio da escrita, é preciso trabalhar com textos que circulam
em determinado meio social. Em suma, a única forma de superação dos sentidos
aceitos/instituídos — de toda uma dialética presente na alfabetização que apenas
mantém as estruturas dominantes via discursos autorizados (FOUCAULT, 1999)
— “dá-se por meio da recorrência a dimensão pluridiscursiva da escrita e leitura,
possibilitando ao indivíduo uma plena criação de sentidos através dos textos
que circulam — por vezes, de maneira subjetiva – no meio em que habitam”
(LAROCCA; SAVELI, 2001, p. 215).

É lúdico propormos uma aplicação prática do que foi apresentado sobre


o aspecto pedagógico da produção textual. Se o indivíduo, ao produzir um texto,
expõe seu discurso, é relevante afirmarmos que realiza uma interação texto-
sujeito: o sentido produzido é inerente a esse contato, essa troca social.

Em muitas escolas, redação era/é sinônimo de Língua Portuguesa e, às


vezes, complemento da disciplina de literatura. Progressivamente tornou-se
disciplina autônoma, mas, posteriormente, atingiu papel preponderante ao
assumir alcunha de “produção textual”, “produção de textos” e variáveis. Deixou
de ser mera realização de proposta de redação apresentada pelo professor, passou
a abordar a ampla discursividade textual, uma vez que considera o indivíduo
como mais do que criador de textos, mas o empodera numa relação escritor-
leitor, em consonância com as possibilidades linguísticas desenvolvidas em sala
de aula.

A opção por produzir textos em detrimento da mera redação escolar


fornece ao aluno uma percepção do dialogismo textual, desierarquiza textos,
aumenta suas chances e percepções do autor daquilo que produz. O aluno ganha
a chance de conceber a própria leitura como um ato de criação, e que quanto mais
lê, mas amplia os espaços cognitivos em que adentra.

Assim é notória a capacidade do aluno de produzir textos quando


o professor faz intermediação com a linguagem (escrita e oral) por meio de
discussões em sala de aula, de leitura silenciosa de outros textos, sobretudo é
diante desse confronto textual que esse aluno pode tomar uma decisão à frente
do que foi lido.

O aluno, diante da percepção da intertextualidade inerente a todo texto,


passa por si a problematizar os sentidos do cotidiano. Começa a compreender,
por exemplo, que as músicas de Martinho da Vila são tanto MPB quanto as de
Caetano Veloso, uma vez que suas capacidades de interpretação gradativamente
transcendem as próprias presentes no livro didático, permitindo-lhe contextualizar
os sentidos.

83
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

Em todo esse processo, aluno e professor seguem redescobrindo o ato da


leitura/escrita, o qual concebe que todo texto é absorção de outro texto, não é
signo órfão, que todo escritor o é na medida em que realizou leituras prévias,
e o mesmo será a base de leituras futuras. Cabe a escola — e os profissionais
envolvidos — a vanguarda dessa função, do desenvolvimento de novos leitores,
não limitados apenas pela palavra escrita, mas por diferentes tipos de textos, em
constante negociação. Esse fenômeno é conhecido como intertextualidade:

Ora, nesse conjunto de níveis e de objeto, o que é exatamente a


intertextualidade? Qualquer referência ao Outro, tomado como posição
discursiva: paródias, alusões, estilizações, citações, ressonâncias,
repetições, reproduções de modelos, de situações narrativas, de
personagens, variantes linguísticas, lugares comuns etc. (FIORIN,
2006b, p. 165).

Cria-se um espaço discursivo onde conflitam-se quem escreve, a quem se


destina e os textos com quem trava diálogo, uma vez que esse próprio destinatário
atua como um discurso presumido e, por vezes, silenciado, de maneira que todo
texto permite a criação de um espaço onde se lê, pelo menos, dois textos. “Temos,
dessa maneira, a palavra, signo linguístico por excelência, atuando/interagindo
translinguística e ininterruptamente entre sistemas semiológicos. Dentre os vários
tipos de textos, é o literário o espaço por excelência para ativar a propriedade
intertextual da linguagem verbal” (REIS, 2008, p. 183).

E
IMPORTANT

Gerard Genette é um crítico francês que aborda as relações textuais inerentes a


toda forma discursiva. É dele, por exemplo, a noção de arquitextualidade e paratextualidade,
sobre as quais todos os elementos do texto — por exemplo, a própria capa utilizada em
determinada publicação — contribuem para uma relação de produção de sentidos; ele
também aponta como os textos são essencialmente transtextuais, uma vez que há sempre
um diálogo constante entre o texto lido, e o produzido, tema amplamente abordado nos
seus livros Introdução ao Arquitexto (1986) e Palimpsestos: a literatura de segunda mão
(2010).

2.2 CULTURA ORAL E ESCRITA


A transição de uma cultura oral para uma cultura escrita não é tão simples,
pois na maioria das vezes envolve dificuldades. Considere o aluno, em seu mais
variado grau de aprendizado e prática de leitura, que exerce como prática social
a interação com a cultura oral, de modo que ele entra temporariamente na escrita,
quase como um visitante.

84
TÓPICO 4 - RELAÇÃO DA LEITURA COM A ORALIDADE E COM A ESCRITA

A primeira dificuldade envolvendo o letramento em sala de aula já fora


abordada ao longo do tópico: a incapacidade de se detectar um texto como
sendo um texto. Somos alfabetizados aprendendo que a escrita é a única forma
de se comunicar, e que o sujeito alfabetizado é apenas aquele que aprendeu as
letras iniciais e, antes disso, é um analfabeto. Todavia, nosso estudo procurou
desconstruir tal noção em prol da percepção de “letrado”.

No início do século XXI, o Ministério da Educação, por meio da


instituição dos novos Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 2001) — um
dos documentos oficiais do MEC com o propósito de delimitar rumos a serem
seguidos em prol da plena implementação do sistema educacional brasileiro —,
defende a promoção de novas políticas a serem utilizadas no ensino de Língua
Portuguesa, as quais vêm ao encontro de estudos contemporâneos que abordam
novas matizes — e matrizes — em prol do binômio letramento/alfabetização. Em
suas acepções iniciais, o documento aponta que:

[...] o domínio da língua, oral ou escrita, é fundamental para a


participação social efetiva, pois é por meio dela que o homem se
comunica, tem acesso à informação, expressa e defende pontos de
vista, partilha ou constrói visões de mundo, produz conhecimento.
Por isso ao ensiná-la, a escola tem a responsabilidade de garantir a
todos os seus alunos o acesso aos saberes linguísticos, necessários para
o exercício de cidadania, direito inalienável de todos (BRASIL, 2001,
p. 15).

E você? Concorda? Pois essa observação do MEC é voltada justamente


para a função social da escrita, bem como sua relação com o exercício de uma
cidadania plena. Em prol de todos os caminhos realizados nos anos 1980 e 1990
do século XX, houve uma sincera tentativa do Ministério da Educação em rever
os princípios norteadores visando a uma “pátria educadora” logo no início do
novo século. Os mesmos PCN também abordam o conceito — aqui apresentado
— de letramento, compreendendo-o como;

[...] produto da participação em práticas sociais que usam a escrita


como sistema simbólico e tecnologia. São práticas discursivas que
precisam da escrita para torná-las significativas, ainda que às vezes
não envolvam as atividades específicas de ler ou escrever. Dessa
concepção decorre o entendimento de que, nas sociedades urbanas
modernas, não existe grau zero de letramento, pois nelas é impossível
não participar, de alguma forma, de algumas dessas práticas (BRASIL,
2001, p. 23).

Isso significa que, na mesma medida em que o aluno deve aprender


a ser um intérprete dos diferentes tipos de linguagem — verbal, não verbal e
mista —, também o deve ser dos usos sociais da leitura e da escrita. Os PCN
vêm confirmar essas discussões e, justamente por isso, são “parâmetros”: não são
apenas medidas e critérios, mas, principalmente, preceitos e princípios a serem
atingidos. Se os PCN que atuam como indicadores das metas almejadas no ensino

85
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

da Língua Portuguesa envolvem o pleno uso das possibilidades das diferentes


linguagens, então suas orientações abrangem o desenvolvimento das quatro
habilidades básicas: “falar, escutar, ler e escrever” (BRASIL, 2001, p. 43).

“Domar” essa heterogeneidade discursiva possibilita conhecer de maneira


mais aprofundada o aluno, de maneira que você, discente, possa levar o estudo
da língua a eles de maneira a superar a velha pergunta “para que isso vai servir
na minha vida”? Como apontam os pesquisadores José Sacristán e Angel Gómez
(1998, p. 10):

Os professores/as serão profissionais mais respeitados quando


puderem explicar as razões de seus atos, os motivos pelos quais
tomam umas decisões e não outras, [...] quando souberem argumentar
[sobre sua própria prática] numa linguagem além do senso comum,
incorporando as tradições do pensamento institucionalizado [e eu
diria: do conhecimento científico]. Para transformar, é preciso ter
consciência e compreensão das dimensões que se entrecruzam na
prática dentro da qual nos movemos.

Isso deve chamar a atenção de todos os docentes para os seguintes


questionamentos essenciais de uma aula: Para que ensinar tal conhecimento, e
qual é a sua relevância? Para a Pedagogia histórico-crítica, as respostas a essas
perguntas apontam para os objetivos da educação, na qual:

Selecionam-se, do conjunto dos saberes sistematizados os elementos


relevantes para o crescimento intelectual dos alunos e organizam-se
esses elementos numa forma, numa sequência tal que possibilite a sua
assimilação” – e eu diria, sua compreensão (SAVIANI, 2003, p. 88).

Essa escolha e organização dizem respeito ao método a ser utilizado no


processo pedagógico, com o intuito de favorecer a compreensão e domínio dos
conteúdos trabalhados. Para o professor, é a apropriação dos conhecimentos
acerca da realidade que proporcionam aos alunos uma ação coerente frente aos
acontecimentos cotidianos e, até mesmo, a busca de uma transformação.

Isso pode ser melhor compreendido se usarmos alguns exemplos práticos


de leitura e escrita em sala de aula. Todo enunciado produzido deve considerar,
dentre as possibilidades, duas questões fundamentais: “Para que?” e “Qual a
sua relevância?” São questões que devem ser respondidas e, para tal, precisamos
considerar dois fatores:

• o grau de leitura do aluno; e


• sua capacidade de trazer uma experiência prévia para dentro da sala de aula,
contribuindo assim com seu processo individual de letramento.

Avaliar o grau de letramento do aluno é uma tarefa complexa, uma vez


que analisa os diferentes graus de interpretação deste, bem como sua capacidade
discursiva em diferentes tipos de texto. O texto a seguir é um exemplo do que
fora dito ao longo do tópico:

86
TÓPICO 4 - RELAÇÃO DA LEITURA COM A ORALIDADE E COM A ESCRITA

FIGURA 24 – PROBLEMAS CAUSADOS PELA FALTA DE CONTEXTUALIZAÇÃO

FONTE: <https://abrilveja.files.wordpress.com/2016/05/valesca-prova-original1.jpeg>. Acesso


em: 28 jan. 2020.

Uma polêmica envolvendo a cantora Valesca Popozuda ocupou várias


mídias durante um bom tempo, após um professor utilizá-la como exemplo em
uma questão de prova de um colégio no Distrito Federal — motivo pelo qual a
imagem em si não tem uma autoria, por ser “obra” de um menor de idade, o qual
não pode ser identificado por questões legais. Sites, jornais e revistas dedicaram
vasto espaço para reclamar do descabimento cometido pelo professor de filosofia.
Pode-se considerar, de fato, que todo o alarde feito pela mídia tem origem em um
problema fundamental: a incapacidade do aluno em compreender a questão, na
sua essência.

Você deve ser capaz de compreender que o aluno não associou ao texto
a ironia atribuída pelo professor. Não discutamos suas escolhas — nem nos
cabe, uma vez que não temos acesso à toda a sua avaliação —, mas como uma
interpretação parcial tem origem na baixa prática de leitura. Dizemos “baixa”,
pois os elementos constituintes do texto são compreensíveis: há uma cantora,
chamada Valesca Popozuda; “É só tiro, porrada e bomba” é um jargão utilizada
pela mesma em um funk; “grande” e “pensadora” são termos compreendidos
pela população. Mas a correlação entre as palavras é que não fez sentido para os
leitores: tivemos leitores alfabetizados, mas pouco letrados.

Retomando as considerações do MEC, não existe grau zero de letramento.


Logo, um aluno, pelo ato de reflexão, seria capaz de responder a essa pergunta? É
provável que sim, mas sem a devida orientação, ele pode cair no mesmo erro dos
meios de comunicação e não compreender que o professor estava sendo irônico.
O letramento envolve a leitura de mundo, de um senso crítico sobre as questões
que envolvem socioculturalmente este sujeito.

Em 10 de abril de 2014, Clayton Rabelo, no jornal “O povo”, publicou


a charge “Grandes Pensadores do Mundo”, no qual faz uma ironia da ironia
anterior, colocando a funkeira Valesca ao lado de outros nomes, como os filósofos
Sócrates e Descartes, o polímata Leonardo da Vinci, além do matemático Bertrand
Russell e do escritor Tolstói. A figura a seguir, quando contextualizada, ajuda-nos
a compreender uma crítica inerente a vários textos:

87
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

FIGURA 25 – CULTURA

FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Cultura_de_Pernambuco#/media/File:Bonecos_de_Olin-
da_-_Pernambuco,_Brasil.jpg>. Acesso em: 28 jan. 2020.

Você pode até não perceber, em um primeiro momento, uma relação


mais íntima entre a Figura 24, o alarde da mídia, a charge de Clayton Rabelo e a
Figura 25. Entretanto, todas carregam uma crítica “venenosa”, pois, via relação
intertextual, trazem à tona a discussão – mesmo que, em alguns casos, não tenha
sido esse o objetivo inicial, como na prova feita pelo professor – sobre o que é
cultura, e os espaços que ocupa.

Na Figura 25, há a representação do Carnaval de Olinda, manifestação


cultural de uma cidade, com seus bonecos gigantes mundialmente conhecidos. Se
chamamos “cultura” a manifestação artística da alta sociedade, de fato o carnaval
de rua não estaria enquadrado nesse quesito. Mas ao entendermos cultura como
manifestação dos elementos significativos de uma sociedade, de fato, o carnaval
o é. E o funk também. E a falta de compreensão desses pontos demonstra a
incapacidade do indivíduo, ao longo do seu processo formativo, de ligar signos
presentes no cotidiano. Pior: ele aprende desde cedo que alguns signos são mais
importantes do que outros, hierarquizados. Como Foucault aponta em A Ordem
do Discurso (1999), há discursos oficiais, autorizados; e aqueles permitidos em
determinados contextos, mas relegados a um patamar de segunda categoria, na
maioria das situações. É por esse motivo que, para um aluno de educação básica
e grande parte da população, Valesca é divertida para ser utilizada em um baile
— autorizada —, mas não na escola, espaço de saber por excelência.

Outro exemplo de problema recorrente para as técnicas de letramento é a


capacidade de o aluno formular seu devido discurso. Suponha que um aluno seu
escrevesse a notícia a seguir. Qual problema ela apresenta?

88
TÓPICO 4 - RELAÇÃO DA LEITURA COM A ORALIDADE E COM A ESCRITA

FIGURA 26 – (DES)REPORTAGEM

FONTE: <https://brasil.estadao.com.br/noticias/geral,pm-cerca-predio-historico-ocupado-por-
-indios-no-rio,983523>. Acesso em: 28 jan. 2020.

Já detectou? Como explicaria isso para ele?

O texto apresenta um problema grave de ambiguidade. Os índios auxiliam


a polícia no cerco, ou são os índios que foram cercados pela polícia? Confuso!
E o pior, essas são as marcas subjetivas da oralidade: problemas de escrita são,
primordialmente, problemas da fala. São vícios de linguagem que perpassam
para o texto escrito e, muitas vezes, fazem sentido para os falantes.

Claro que nós, como falantes, temos a capacidade de formular mentalmente


o enunciado e chegarmos a uma conclusão, a de que os indígenas estão cercados.
Entretanto, parte do problema encontrado ao auxiliar o indivíduo a se apropriar
da escrita, envolve a sua falta de prática. Ao organizar seus pensamentos, o aluno
apresenta-os de maneira desordenada, utilizando uma modalidade da língua
com opções, ao seu ver, muito restritas: a norma padrão formal, vulgo “norma
culta”. É preciso quase que um processo cirúrgico para que o aluno compreenda
as necessidades de se escrever de uma maneira padronizada – mas, também,
letrada – mas, para tanto, vale relembrarmos das já proferidas palavras sábias de
Graciliano Ramos: “a palavra não foi feita para enfeitar”, possui um uso social.

89
UNIDADE 1 - PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA LEITURA

DICAS

Sugestão de leitura: PETIT, Michele. Os jovens e a leitura: uma nova perspectiva.


Trad. Celina Olga de Souza. São Paulo: Editora 34, 2008. Nesta obra a antropóloga e
pesquisadora narra suas experiências e de seus colegas em projetos de mediação de leitura
em contextos marginalizados. Vemos o leitor sendo forjado pela literatura. Lemos relatos
tocantes e inspiradores que demarcam não somente a potência da leitura por fruição, mas
como ela amplia a leitura de mundo do sujeito leitor independente de sua classe social e
etnia. Outro fator interessante é que esses iniciadores nem sempre são os professores de
sala de aula, mas um bibliotecário, um amigo, um projeto social que acorda o imaginário
repelido por aqueles que tiveram que cair na realidade precocemente.

90
RESUMO DO TÓPICO 4

Neste tópico, você aprendeu que:

• O texto se apresenta através de várias modalidades, como a oral e a escrita.

• O texto escrito não é a única manifestação cultural de um grupo, uma vez que
há toda uma produção que circula pelo campo da oralidade.

• A apropriação da escrita transita pelo domínio da oralidade, mas não o


contrário: um indivíduo pode ter uma capacidade de leitura que não se limita
ao texto escrito, o que influencia na sua capacidade interpretativa.

CHAMADA

Ficou alguma dúvida? Construímos uma trilha de aprendizagem


pensando em facilitar sua compreensão. Acesse o QR Code, que levará ao
AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

91
AUTOATIVIDADE

1 Faça uma pesquisa sobre os conceitos de Alfabetização e Letramento,


e discorra como podem ser utilizados em prol do desenvolvimento de
práticas de leitura.

92
UNIDADE 2 -

LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• disponibilizar conhecimento sobre políticas educacionais e a instauração


da leitura no contexto escolar;
• desenvolver a capacidade de pensar a leitura em práticas interdisciplina-
res;
• possibilitar a identificação entre leitura e políticas educacionais;
• agregar práticas de leitura interdisciplinares.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em dois tópicos. No decorrer da unidade,
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 – A LEITURA NO CONTEXTO BRASILEIRO: DIÁLOGO COM


A POLÍTICAS PÚBLICAS
TÓPICO 2 – A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

CHAMADA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos


em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá
melhor as informações.

93
94
TÓPICO 1 -
UNIDADE 2

A LEITURA NO CONTEXTO BRASILEIRO: DIÁLOGO COM


AS POLÍTICAS PÚBLICAS

1 INTRODUÇÃO
Quando D. Pedro I declarou a independência do Brasil em 7 de setembro
de 1822, deparou-se com um problema grave: a maior parte da população não
era alfabetizada. Além de todas as questões envolvendo a necessidade de corpos
públicos para a manutenção do estado brasileiro recém-nascido, deparávamo-
nos com a falta de instituições para darem prosseguimento à implementação de
políticas educacionais de desenvolvimento da alfabetização no Brasil.

Relata-se que a primeira escola que representava uma mudança na


política pública de alfabetização fora fundada em 1835, em Niterói (FREIRE,
2012, p.48), marcando o passo inicial da transformação da sociedade brasileira de
majoritariamente agrícola-comercial para urbana.

O desenvolvimento de políticas públicas visando a maturação da


capacidade de leitura, no Brasil, tem origem nessas primeiras práticas do governo,
ainda na época do Brasil império. Dessa maneira, pensar em práticas de leitura
significa dialogar, inicialmente, com atitudes governamentais voltadas para a
implementação de políticas de alfabetização no território brasileiro.

2 PRÁTICAS DE LEITURA
Ao abordarmos os princípios envolvendo as práticas de leitura, precisamos,
inicialmente, delimitar o que compreendemos como leitura produtiva. A leitura
envolve um ato cognitivo. Porém, o que é, de fato, a leitura?

Podemos dar uma definição razoável do que seria tal prática? Gostaríamos
de propor uma definição, a qual será nosso guia ao longo do capítulo.

o texto pode ser considerado o próprio lugar da interação e da


constituição dos interlocutores. [...] Nessa perspectiva, o sentido
de um texto é construído na interação texto-sujeitos e não algo que
preexista a essa interação. A leitura é, pois, uma atividade interativa
altamente complexa de produção de sentidos (KOCH; ELIAS, 2006,
p.10-11, grifo nosso).

95
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

O conceito de leitura está atrelado ao de texto. Mas o que é texto? Ora, se


todo ato de comunicação envolve a produção de enunciados, então significa dizer
que, cotidianamente, circulamos entre textos. Já parou para pensar nisso?

Ao conversar, estamos produzindo um texto. Um show de música também


é uma expressão textual. Propagandas, produções culturais — televisivas ou não
— também o são; debates, receitas — de pratos de comida ou ministradas por
médicos —, também. Como diria Barthes (1987a), vivemos em um mundo feito
de palavras, de tal maneira que temos dificuldade de compreender plenamente
que os textos são feitos por mais do que palavras, sua total utilidade e diferenças
entre um e outro.

Se um texto não é limitado apenas pela modalidade verbal escrita, o


mesmo pode ser dito da leitura. Não lemos apenas palavras. Lemos gestos, sons,
imagens. Tampouco o fazemos apenas com nossos olhos, mas com múltiplos
sentidos. Ler o mundo não é apenas um ato de ler as palavras, ideias e grandes
romances. É estar em sintonia com tudo o que ocorre ao redor.

Lemos o mundo quando observamos, por exemplo, o temperamento de


um individuo através das suas escolhas de roupas; quando percebemos a mudança
de estação via tato pela temperatura. Quando damos uma resposta específica para
uma situação em particular, adaptamos nosso discurso a uma leitura prévia de
mundo. O leitor não é aquele que simplesmente domina a alta cultura, mas que
interage com todas as formas de produção de discurso ao seu redor, e acrescenta-
os ao seu próprio cotidiano. Como aponta a professora Zilberman (2009, p. 30):

Com a incumbência de ensinar a ler, a escola tem interpretado essa


tarefa de um modo mecânico. Quando atua de modo eficiente, dota
as crianças do instrumental necessário e automatiza seu uso, por meio
de exercícios que ocupam o primeiro — mas dificilmente o segundo
— ano do ensino fundamental. Ler coincide então com a aquisição de
um hábito e tem como consequência o acesso a um patamar do qual
dificilmente se regride, a não ser quando falta competência à introdução
do aluno à escrita. Porém, a ação implícita no verbo em causa não torna
nítido seu objeto direto: ler, mas ler o que? Desta maneira, o sentido
da leitura nem sempre se esclarece para o aluno que é beneficiário
dela. Por conseguinte, mesmo aprendendo a ler e conservando essa
habilidade, a criança não se converte necessariamente em um leitor.

Zilberman aponta que não devemos apenas “indicar livros” mas, antes,
desenvolver a capacidade de leitura dos nossos alunos, sua capacidade de
interpretação tanto da palavra-signo, quando do texto-signo.

Você sabe por que a leitura é o espaço por excelência de produção de


múltiplos sentidos? Simples, um texto é, por definição, polissêmico. Ou seja,
quando bem construído, por suscitar, intencionalmente, múltiplos sentidos. Esse
conceito deriva da ideia de Polissemia, que é a multiplicidade de sentidos que
uma mesma palavra da língua pode apresentar, em diferentes contextos de uso.
As ideias de Bakhtin permitem que a relação entre o texto e seu leitor evoluam:

96
TÓPICO 1 - A LEITURA NO CONTEXTO BRASILEIRO: DIÁLOGO COM AS POLÍTICAS PÚBLICAS

deixa de ser monológico para ser dialógico (BAKHTIN, 2003), ou seja, processo
interativo realizado pelas vozes que se encontram/confrontam: leitor, autor
etc. Isso também significa dizer que o ato de leitura é inacabado: eis o motivo
de determinados textos literários serem considerados universais, por sempre
permitirem leituras diferentes nas mais diferentes épocas — Tão atual nos é a fala
do velho do Restelo para a compreensão do ser humano:

—"Ó glória de mandar! Ó vã cobiça 


Desta vaidade, a quem chamamos Fama! 
(Os Lusíadas – Canto IV – Estrofe 95)

A fala do velho do Restelo é um exemplo de diálogo entre a literatura e


o mundo do qual se alimenta. O velho do Restelo reclama dos anseios da coroa
portuguesa, de procurar atingir a grandiosidade mundial, enquanto localmente
não falta pobreza à pátria. É a mesma influência para o diretor Manoel de Oliveira
produzir seu documentário, Non ou a vã Glória de Mandar (1990), referenciando
o resultado, cinco séculos depois, de uma política expansionista do Estado
português. É um exemplo de que o texto é, também, intertextual, pois é feito a
partir de outro. Hora, todo texto é produzido via relação íntima com outro texto
(GENETTE, 2010), seja por complementariedade, seja por oposição.

Outro exemplo está no uso denotativo e conotativo de um texto. Atribuímos


o rótulo de efeito denotativo quando um texto, em parte ou na totalidade, assume
um caráter literal, a exemplo de notícias de jornal e/ou textos científicos. A
conotação, por sua vez, está relacionada ao sentido indireto, subjetivo, figurado
de um texto, o qual pode sofrer modificações de acordo com o contexto. A palavra
“cara” pode significar tanto “face”, “afinidade” ou “valor”.

Outros exemplos:

• Deixei-os de boca aberta.


• A boca da garrafa está quebrada.

No primeiro caso, o texto permite um sentido figurado do seu enunciado;


no segundo, literal. É importante ter em mente que esse sentido leva em
consideração dois elementos: Contexto e Interlocutores.

Contexto é o conjunto das circunstâncias (sociais, políticas, históricas,


culturais etc.) associadas a um texto.  É o conjunto de circunstância no qual o texto
assume sentido, permitindo sua coerência interna. Para tanto, vários elementos/
atores tomam parte, como a mensagem em si, os meios de comunicação,
emissores e receptores, recepção e acepção, bem como diversos outros elementos
que favorecem — ou desfavorecem — sua compreensão. Até o texto no qual
temos dificuldade para identificar autoria, ainda é possível detectar um leitor
presumível (ECO, 1994), modelo, uma vez que todo texto possui, em sua essência,
um leitor-alvo, para o qual é destinado.

97
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

Se um texto é um espaço de produção de sentidos, tornam-se necessárias


as devidas capacidades para lê-lo adequadamente. Não basta, obviamente, que o
escritor tenha as habilidades para produzir o devido sentido planejado: seu leitor
precisa possuir as capacidades mínimas de leitura, e isso só vem com o devido
tempo, prática e persistência. Todo texto tem o seu leitor, aquele que será capaz
de decifrar seu código. Não é um leitor cuja existência seja física, mas presumida:
todo texto, ao ser produzido, tem em mente aquele indivíduo capaz de interpretá-
lo, o qual detém um número específico de conhecimentos para atingir sua meta.

As figuras a seguir são exemplos do que vem sido apresentado até então:

FIGURA 1 – A CRIAÇÃO DE ADÃO - MICHELANGELO, 1512

FONTE: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/7/73/God2-Sistine_Chapel.
png/800px-God2-Sistine_Chapel.png>. Acesso em: 3 fev. 2020.

FIGURA 2 – A CRIAÇÃO DE ADAM

FONTE: <https://m.blog.naver.com/myoto1214/220842337033?view=img_1>. Acesso em: 3 fev. 2020.

98
TÓPICO 1 - A LEITURA NO CONTEXTO BRASILEIRO: DIÁLOGO COM AS POLÍTICAS PÚBLICAS

A criação de Adão é uma famosa obra de Michelangelo, e constitui parte


da pintura da Capela Sistina, situada no Palácio Apostólico, residência oficial do
Papa na Cidade-Estado do Vaticano. Incontáveis artistas o referenciam em tantos
contextos que, por vezes, o único elemento em comum são as mãos de ambas
personagens se tocando.

Os textos dialogam entre si. A isso se dá o nome de intertextualidade. Por


isso, quanto mais lemos, quanto mais participamos de atividades culturais, mais
vamos aumentando nossa bagagem de conhecimento que, por sua vez, acaba por
nos ajudar a compreender novos textos. Uma espécie de círculo vicioso.

Podemos, então, simplificar o conceito de intertextualidade: influência e


relação que um texto estabelece sobre o outro. Diálogo entre os vários tipos de
textos (formais, publicitários, literários etc.). A intertextualidade pode ser dividida
em várias classificações, mas, dando continuidade à busca por simplificação,
podemos apresentá-la a partir dos dois exemplos a seguir:

• Intertextualidade explícita

Trecho do poema de “Sete faces”, de Carlos Drummond de Andrade:

“Quando nasci, um anjo torto


desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.”

Trecho do poema “Até o fim”, de Chico Buarque:

“Quando nasci veio um anjo safado


O chato do querubim
E decretou que eu estava predestinado
A ser errado assim.”

• Intertextualidade implícita

Trecho da canção “Ai que saudade da Amélia” (Ataulfo Alves e Mário Lago):

“Ai meu Deus que saudade da Amélia


Aquilo sim que era mulher
Às vezes passava fome ao meu lado
E achava bonito não ter o que comer
E quando me via contrariado dizia
Meu filho o que se há de fazer
Amélia não tinha a menor vaidade
Amélia que era a mulher de verdade.”

99
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

Trecho da canção “Desconstruindo Amélia” (Pitty):

“E eis que de repente ela resolve então mudar


Vira a mesa
Assume o jogo
Faz questão de se cuidar
Nem serva nem objeto
Já não quer ser o outro
Hoje ela é o também.”

Bakhtin (2003) aponta que essa percepção de intertextualidade está


diretamente associada à capacidade cultural do leitor, de maneira que muitos
textos até hoje não o são percebidos em sua relação intertextual. Em suma,
determinadas relações só o são percebidas à medida em que os leitores são mais
ou menos competentes.

Todo texto trava um diálogo com o seu leitor. Como já dissemos, o texto
cria, presume, convoca. E isso vale para romances, contos, filmes... todo tipo de
produção de sentidos é um verdadeiro convite para a sua devida interpretação.
Imagine os homens das cavernas, desenhando símbolos, contando a história
de suas caçadas. Eram registros para a posteridade e, principalmente, relatos
que presumiam a capacidade interpretativa póstuma. Pense nisso da próxima
vez que você se lançar ao primoroso ato da leitura, que todo ato de escrita, seja
verbal ou não verbal, presumo um ato de comunicação, um convite à leitura e
interpretação. Aliás, chega a ser redundante a afirmação anterior, já que, se você
lê, então você interpreta.

3 POLÍTICAS PÚBLICAS E EDUCAÇÃO


Trouxemos essa explanação inicial sobre o ato da leitura como forma de
resgate da temática da abordagem 1, de maneira que você possa entender, de
forma introdutória, o desafio que as instituições enfrentam ao tentar conceber a
leitura como proposta de política pública em prol da educação.

Não basta promover ao indivíduo apenas o acesso à leitura; é


imprescindível que esse torne-se leitor competente. Se num primeiro momento
a escrita era a arma de uma elite intelectual, não tardou a ser compreendida
como forma de conquista e exercício de uma cidadania plena. Embora não
seja uma sumidade, é ponto quase pacífico entre docentes que a instauração
de ciclos educacionais foi uma estratégia de educação que buscava respeitar
o desenvolvimento de cada indivíduo, mediante suas necessidades e
potencialidades.

100
TÓPICO 1 - A LEITURA NO CONTEXTO BRASILEIRO: DIÁLOGO COM AS POLÍTICAS PÚBLICAS

É por esse viés que podemos considerar a apropriação da língua como uma
das mais primordiais formas de inclusão social, bem como seu uso em instituições
públicas e privadas de forma autônoma. Logo, tão importante quanto as técnicas
de sociabilidade inerentes às primeiras séries, é a apropriação da alfabetização e
do letramento como metas pré-definidas para todo processo formativo.

Compreender a escola como espaço para o desenvolvimento de práticas


educativas é assumir a responsabilidade na formação de indivíduos plenos,
cientes de todos os seus direitos, dominantes de uma cultura antes a eles
negada, a escrita. Se foi Piaget quem abriu nossos olhos para a necessidade de
compreendermos que a criança também passa por etapas para adquirir novos
saberes, bem como possui um determinado tempo para desenvolver novas
competências, contemporaneamente muitos ainda ignoram que ler não é apenas
interpretar palavras: a leitura não está relegada a propiciar o que chamamos de
pedagogia bancária, um conhecimento acumulativo e gradual. Essa didática,
limitada a dar textos para o aluno ler para realizar tarefas, muitas das quais eles
tanto não compreendem quanto não tem interesse, criam um público-leitor, mas
impossibilita o surgimento de leitores competentes.

Na sala de aula, o ato de leitura é tratado mais como instrumento de


ensino, do que aprendizagem. É mais instrumento de legitimação do saber do
professor, do que mecanismo de aprendizagem do aluno. Forma de representação
do discurso dominante docente e, por vezes, silenciamento do discente. É texto
“morto”, totalmente desassociado do cotidiano de quem aprende, por isso mesmo
texto afastado, que nada lhe diz. É um mecanismo que interfere na própria
intertextualidade inerente a todos os enunciados, por influenciada na criação
de novos leitores, os quais tornam-se incapazes de compreender as relações
dialógicas dentro da linguagem.

O professor, em sala de aula, tem que compreender que não realiza uma
função una: por isso tende a apresentar não apenas textos que dialoguem com o
aluno, mas, também, os vários propósitos a ele inerentes, bem como os mecanismos
que permitem que os mesmos penetrem com seu arcabouço social nas obras, que
provoquem deslocamentos mentais, conjecturas. São as provocações do professor
mediador que iniciarão o interesse, o aprofundamento da leitura e a inserção na
ideia do autor. É só através disso que é possível começar a pensar em maneiras
que levem ao aluno a plena utilidade de prática social inerente ao texto escrito.
Sem isso, a expressão “não gosto de ler” assume sua função mais primária: texto
literário, e não os mais diversos enunciados comunicativos do cotidiano que
contribuem para o desenvolvimento humano.

Partimos do princípio de que o ensino deve ser baseado nas variedades


existentes, vinculadas à vida cultural e social da pessoa. Cabe ao docente saber
articular o conhecimento gramatical aos novos métodos que contemplam o texto
como objeto de ensino.

101
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

Marcia Terra (2016), em pesquisa sobre as práticas de incentivo à leitura no


Brasil, aborda o caráter tardio de políticas públicas em solo brasileiro, e de modo
eficaz. Essas primeiras iniciativas remetem aos anos 30 do século XX, em detrimento
da preocupação do Governo de desenvolver projetos desenvolvimentistas na
sociedade brasileira. O resultado mais imediato de tal ação foi a ampliação das
redes escolares, além de uma necessidade de qualificação de mão de obra. Em
suma, as primeiras iniciativas de políticas públicas voltadas para o incentivo à
leitura, no Brasil, surgem associadas a um contexto tecnicista:

As iniciativas governamentais acerca da leitura são inauguradas,


ainda em 1930, devido ao interesse do Estado em construir uma
imagem do Brasil como um país em pleno desenvolvimento, o que
motivou também a ampliação da rede escolar. Também a necessidade
de ofertar mão de obra com qualificação mínima para trabalhar nas
indústrias foi mola motora para o incentivo tanto na propagação da
leitura quanto da escola. O objetivo não era, portanto, privilegiar a
formação de leitores, mas possibilitar a aquisição de alguns signos
linguísticos, o essencial para sobreviver em situação específica de
certos locais de trabalho (CALDAS, 2005, p. 95).

Deve-se salientar que esse período é marcado por dois momentos


significativos: a criação do Ministério da Educação e Saúde Pública, em 14 de
novembro de 1930; e o reconhecimento, já na constituição varguista de 1934, da
educação como um direito de todos os brasileiros. Diversas outras realizações,
como a criação do Instituto Nacional do Livro, em 1937, dariam fomento para
políticas públicas que seriam desenvolvidas nos anos seguintes. Uma de suas
políticas era aumentar o acervo das bibliotecas públicas que existiam e a criação
de novas nos municípios que ainda não a possuíam. Pode-se apontar que a
criação de um instituto voltado para o desenvolvimento da prática de leitura já
indicava, inicialmente, o reconhecimento da importância do desenvolvimento
dessa prática.

Enquanto política pública, novas instituições foram criadas posteriormente


com o intuito não apenas de promover a leitura, mas controlá-la, como apontam
Lajolo e Zilberman (1984), havia uma preocupação com a seleção do escopo que
seria disponibilizado para a população.

Essas primeiras experimentações não tardariam a apresentar problemas.


Só quando o texto é significativo — no sentido de que o aluno/discente compreende
as relações intertextuais entre texto e seu cotidiano — é que ele favorece um pleno
aprendizado ao contribuir no desenvolvimento de leitores profícuos.

Tomemos como exemplo da prática de leitura um texto de Graciliano


Ramos:

102
TÓPICO 1 - A LEITURA NO CONTEXTO BRASILEIRO: DIÁLOGO COM AS POLÍTICAS PÚBLICAS

“Deve-se escrever da mesma maneira como as lavadeiras lá de Alagoas


fazem seu ofício. Elas começam com uma primeira lavada, molham a roupa
suja na beira da lagoa ou do riacho, torcem o pano, molham-no novamente,
voltam a torcer. Colocam o anil, ensaboam e torcem uma, duas vezes. Depois
enxáguam, dão mais uma molhada, agora jogando a água com a mão. Batem
o pano na laje ou na pedra limpa, e dão mais uma torcida e mais outra, torcem
até não pingar do pano uma só gota. Somente depois de feito tudo isso é que
elas dependuram a roupa lavada na corda ou no varal, para secar. Pois quem se
mete a escrever devia fazer a mesma coisa. A palavra não foi feita para enfeitar,
brilhar como ouro falso; a palavra foi feita para dizer”.
FONTE: RAMOS, Graciliano. Linhas tortas. São Paulo: Record, 2009. p. 32.

O escritor propõe um método para se escrever um texto. Poderíamos


aplicar tal método à prática de leitura? Poderíamos transitar isso para o ato de
leitura, de modo que o texto deve ser lido aos poucos, compreendido na medida
das limitações de cada um?

É possível, então, trazermos o aspecto lúdico do texto em prol da sua


compreensão. Leia a frase a seguir, retirada de uma entrevista do ex-presidente
José Sarney:

“Passei a vida atrás de eleitores e agora busco os leitores.” (José Sarney, Veja,
dez. 1997).

O que se deduz desse texto? Infere-se uma mudança na vida do político,


mas... qual?

O ex-presidente aponta como passou por uma mudança profissional —


afinal, era político de carreira e, agora, seria escritor. Seria muito possivelmente
errado apontar que ele irá se tornar jornalista, contista ou romancista: não pelo
fato de que são profissões que envolvem o ato da escrita, mas porque o texto
original não induz à percepção do tipo de escritor que ele viria a ser.

O exemplo anterior se apropria de uma das modalidades de texto — a


escrita — para desenvolver a capacidade de leitura — e, consequentemente, de
interpretação — do indivíduo.

Essas abordagens sobre o direcionamento da leitura fizeram parte dos


problemas enfrentados pelo Governo Federal, bem como os projetos de políticas
públicas que atuavam, também, como censores. Como também apontam Lajolo
e Zilberman (2007), é em meados dos anos 40 do século XX que as bibliotecas
passam a receber um “reforço positivo” com obras que apresentem uma visão
positiva do contexto brasileiro, correlacionando as obras literárias com o sucesso
da estrutura governamental.

103
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

E, de fato, somente na última década do século XX que houve a iniciativa


da criação do Serviço Nacional de Bibliotecas, o SNB, com o intuito de interligar
as instituições por todo o país:

Uma iniciativa interessante que visava ao intercâmbio entre as


bibliotecas propondo um crescimento estruturado na organização e
funcionamento das BPs, que seria uma espécie de ‘guardiã’ do saber,
um depósito da cultura erudita, que deveria ser organizado nas
bibliotecas, porém, o incentivo à leitura do mesmo ainda é bem tímido
(CALDAS, 2005, p. 86).

Essas políticas públicas promoviam o controle das bibliotecas, mas não


houve como contraponto ações que fomentava o uso desses espaços, de maneira
que houve repressão intensiva por parte do governo.

O grande problema para a interpretação das imagens (charge x imagem


real) correlaciona-se com o problema enfrentado pelos leitores naquele período.
Você consegue imaginar a quantidade de conhecimentos necessários ao leitor para
compreender de maneira mais profunda essas associações? Provavelmente um
leitor comum apenas apontaria um texto como cópia do outro, sem aprofundar
essas questões essenciais. Você sabe por quê? Porque, durante muito tempo, as
escolas públicas ofereciam fragmentos de leitura e as pesquisas nas escolas se
reduziam apenas a copias exatas de livros e enciclopédias. Com isso, as bibliotecas
públicas acabaram incorporando essa característica de biblioteca escolar, para
suprir a necessidade deste espaço que as escolas não possuíam. A fragilidade do
currículo e das ações didático pedagógicas refletiam nas ações dos alunos e usos
das bibliotecas.

Possivelmente nisso residiria a crítica e o humor da charge sobre a obra de


Michelangelo. Estaria o chargista querendo dizer que a pintura não “consertaria”
aspectos não harmoniosos do mundo que ela viria a representar?

O fato é que a leitura de um texto demanda conhecimentos extras para


que possamos compreender o que ele não diz ou mostra explicitamente, mas com
certeza está significando. Como já abordamos, toda a leitura é um ato intertextual
que depende do grau de domínio linguístico — ou seja, dos signos linguísticos
— por parte do falante. Faz-se necessário uma constante negociação entre leitor,
os signos presentes e o seu domínio destes em determinado contexto. É por esse
motivo que as imagens anteriores possuem um caráter crítico e, para tal, traz
também uso de um recurso bastante expressivo e interessante, denominado
intertextualidade, que consiste na citação de um texto por outro. Então, todo
texto para além de uma relação intertextual entre escritor e escritor também o é
em relação a escritor e leitor. De fato, durante muito tempo concebeu-se o escritor
como um intelectual em sua torre de marfim produzindo cultura para alguns
escolhidos, mas a ideia de um leitor sempre esteve presente, ora como membro
de uma elite intelectual, ora como uma categoria narrativa.

104
TÓPICO 1 - A LEITURA NO CONTEXTO BRASILEIRO: DIÁLOGO COM AS POLÍTICAS PÚBLICAS

Essas relações intertextuais, as quais abordamos ao longo desse capítulo,


seriam um grande obstáculo a ser enfrentado no decorrer das próximas décadas.
Na tentativa de superar uma grande faixa de população analfabeta desde a
sua independência, no século XIX, o governo varguista — e seus sucessores
— implementaram políticas de desenvolvimento que, em grande parte, não
possibilitaram o desenvolvimento das práticas de leitura, mas de apenas
alfabetização.

4 MOVIMENTOS DE INCENTIVO À LEITURA


Discutir sobre movimentos que envolvem a leitura certamente recaem
sobre a história da educação no Brasil. A leitura durante muito tempo ficou
restrita a uma pequena parcela da sociedade que tinha acesso à escolarização e
aos livros. Após a criação do Ministério da Educação, na década de 1930, é que
iniciaram as políticas para a educação pública destinada as classes desfavorecidas.
Alguns historiadores comentam que a alfabetização iniciou com cunho político,
pois analfabetos não votavam. Posteriormente, aliado à alfabetização surgiram os
cursos profissionalizantes para preparar o povo com pouca instrução a ser o que
lhe destinava, operário, ou seja, as primeiras instruções destinavam aos anseios
políticos da elite da época. Os cursos superiores eram destinados aos jovens
burgueses de família abastada.

Nesse contexto de tramas políticas e novos direcionamentos de início


da democracia, garantidos agora pela Constituição, que a educação pública
realmente inicia seus passos de asseguramento constitucional, destinando
verbas, a princípio insuficientes e até os dias atuais, mas que representavam um
avanço. Por conta deste direito surgiram políticas públicas, ora pressionadas por
intelectuais, ora por interesse políticos, que reivindicavam a ampliação e melhoria
do atendimento escolar, para que o direito do povo fosse de fato consolidado.

Em contrapartida, um efeito colateral foi a ampliação da rede escolar.


Seu crescimento favoreceu a expansão do público leitor e, consequentemente,
da circulação de livros (LAJOLO; ZILBERMAN, 2007). Dado que também houve
o crescimento de editoras e livrarias que iniciavam a disseminação da leitura,
seja por jornais, folhetins e os primeiras obras brasileiros literárias da época, com
Machado de Assis, Monteiro Lobato, entre outros.

Na medida em que se passava a ter uma instituição que favorecia o


crescimento do público-leitor, várias editoras direcionaram seus esforços para
atingir esse público. Porém, a literatura só retoma como pauta das políticas
públicas nacionais a partir dos anos 1980, com o fim da Ditadura Militar.

Porém, parece-nos produtivo uma breve abordagem sobre como, no Brasil,


surge a necessidade de uma literatura voltada para o público infantojuvenil.

105
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

De acordo com Zilberman:

Os primeiros livros para crianças foram produzidos ao final do século


17 e durante o século 18. Antes disto, não se escrevia para elas, porque
não existia a infância. Ainda para a autora, a ausência da concepção de
infância ocorreu em virtude de outro fato: a emergência de uma nova
noção da família, centrada [...] num núcleo unicelular preocupada
em manter sua privacidade [...] e manter o afeto entre seus membros
(2015, p. 15).

Nesse sentido, Zilberman (2015) afirma que a valorização da família


trouxe uma nova concepção de infância, o que proporcionou a educação para
os pequenos: “A nova valorização da infância gerou maior união familiar, mas
igualmente os meios de controle do desenvolvimento intelectual da criança e a
manipulação de suas emoções. Literatura infantil e escola, inventada a primeira e
reformada a segunda, são convocadas para cumprir essa missão” (ZILBERMAN,
2015, p. 15).

O surgimento do movimento Romancista no século XVIII e XIX


proporcionou uma nova concepção de mundo, com um novo sentimento, voltado
para o sonho, a imaginação, a religiosidade, a fé, a esperança, a liberdade criadora
e a valorização da natureza, recuperando, assim, o folclore e as tradições da
sociedade daquela época no campo literário.

Segundo Coelho (2010, p. 147) foi:

A partir do Romantismo (1ª fase da Era Romântica), vemos que em


todas as nações europeias e americanas, com maior ou menor ênfase,
cresce rapidamente o número de autores e de grandes obras que
marcam a gênese e evolução da Literatura, das ideias e dos valores
que, hoje, conhecemos como tradição.

A Revolução Industrial exigia novas perspectivas das pessoas, com isso


foi necessário criar mão de obra especializada e qualificada para desenvolver
diversos tipos de serviços no meio industrial, e com isso a escola se adequou a esse
papel de qualificar o sujeito, proporcionando ensinamentos voltados ao ato de
ler, escrever e de contar. Portanto, o ensino germanizado das escolas, em virtude
da Revolução Francesa, que foi um movimento político-social, proporcionou um
caminho para Modernidade, bem como o acesso aos meios de produção. Esse
foi um dos contextos que mais influenciaram o desenvolvimento da literatura
infantil:

A Revolução Industrial influenciou na literatura para crianças. Com


ela, ocorreram mudanças significativas na estrutura da sociedade, em
todos os segmentos. Com a industrialização, a sociedade começou a
passar por um processo de modernização, refletindo, no campo da
educação, a necessidade de se adequar aos moldes da modernidade.
Sendo assim, o mercado livreiro ganhou destaque, aperfeiçoando a
tipografia e crescimento do livro (LAJOLO; ZILBERMAN, 2007, p. 15-
17 apud BARBOSA, 2016, p. 23).

106
TÓPICO 1 - A LEITURA NO CONTEXTO BRASILEIRO: DIÁLOGO COM AS POLÍTICAS PÚBLICAS

Foi no século XIX, na Europa, que os contos de fadas e as narrativas


folclóricas retornaram a ser presença marcante no campo da literatura infantil,
período em que o Romantismo e Realismo disputavam o mesmo espaço,
trazendo a valorização da reconstrução do mundo imaginário e maravilhoso.
Desse modo, a literatura se alicerça com um novo estilo e técnica, e este período
foi denominado o século do ouro da literatura infantil e do romance, em virtude
de tornar para todos os tipos de classe social, o contato com os mais importantes
entretenimentos literários.

No começo do século XIX, a literatura infantil ganhou novos rumos e


alcançou uma expansão significativa com textos literários de sucesso:

Os irmãos Grimm, em 1812, editaram a coleção de contos de fadas,


que, dado o êxito obtido, se converteu, certo modo, em sinônimo de
literatura para crianças. A partir de então, esta definiu com maior
segurança os tipos de livros que agradam mais os pequenos leitores e
determinou melhor suas principais linhas de ação: em primeiro lugar,
a predileção por histórias fantásticas, modelo adotado sucessivamente
por Hans Christian Andersen, nos seus Contos (1833), Lewis Carroll,
em Alice no país das maravilhas (1863), Collodi, em Pinóquio (1883),
e James Barrie, em Peter Pan (1911), entre os mais célebres (LAJOLO;
ZILBERMAN, 2007, p. 20 apud BARBOSA, 2016, p. 24, grifo nosso).

Esse contexto de transformação, de se abordar aquilo que viria a ser


chamado de “literatura infantojuvenil”, teria reflexos na sociedade brasileira,
principalmente no século XX.

Nesse contexto, a literatura infantil brasileira surgiu no século XIX, com


obras baseadas na literatura europeia, trazendo os aspectos da literatura greco-
latina como fonte principal, por exemplo, a literatura francesa de La Fontaine e
Perrault, que foram apresentados ao Brasil por intermédio de Portugal. Assim,
a literatura infantil no Brasil começou a se consolidar, a partir do século XIX,
conscientizando os leitores sobre uma literatura específica para a criança.

De acordo com Simões (2013, p. 234), “a literatura infantil no Brasil é um


fenômeno recente, destacando que, para alguns autores, teria começado em 1895,
com a publicação de Contos da Carochinha, de Alberto Figueiredo Pimentel”.
Carvalho (1989) corrobora com essa informação, mas ressaltando a relação da
escola com a literatura infantil, ao afirmar em seus estudos sobre literatura infantil
no Brasil, por meio de um traçado histórico que foi a partir de 1820, mesmo ano
de formação do Colégio Caraça, que a literatura e a escola se tornaram restritas,
ou seja, só as classes socialmente e economicamente dominantes tinham acesso à
educação e às obras infantis consideradas clássicas.

107
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

[Segundo] Cunha (1999, p. 20), “no Brasil, como não poderia deixar
de ser, a literatura infantil tem início com obras pedagógicas e,
sobretudo, adaptadas de produções portuguesas, demonstrando a
dependência típica das colônias”. Vale destacar que, para a autora, a
legítima literatura infantil brasileira foi iniciada efetivamente com o
surgimento das obras de Monteiro Lobato, por ser um escritor que
proporcionou a diversidade de temas, contextos e gênero literário,
trazendo personagens que ultrapassam os estilos convencionais
literários, e com isso tendo seu próprio estilo e universo ficcional
(BARBOSA, 2016, p. 25).

Nesse sentido, surgiu José Bento Monteiro Lobato na literatura


infantil brasileira, com suas obras Narizinho Arrebitado,  Sítio do Pica-pau
Amarelo,  Reinações de Narizinho  e outras, que revolucionaram o campo da
literatura infantil no país, com textos que retratavam a realidade social e cultural,
com personagens contemporâneos, como a boneca de pano, Emília.

Em O Sítio do Pica-pau Amarelo, por exemplo, Lobato, por meio de uma
série de histórias, trouxe aspectos da vida rural, como fazendas de cafés, com
intuito de revelar as questões nacionais do país, bem como revelar histórias com
aspectos folclóricos, narradas por uma cozinheira negra, que representavam os
valores morais e culturais de um povo. E, logo em seguida, “adotando postura
iconoclasta perante os valores culturais populares, Monteiro Lobato promove a
cozinheira do sítio a narradora titular em Histórias da Tia Nastácia” (LAJOLO;
ZILBERMAN, 1986, p. 65 apud BARBOSA, 2016, p. 26).

Para Nely Novaes Coelho (2010, p. 247):

A Monteiro Lobato coube a fortuna de ser, na área da Literatu­ra


Infantil e Juvenil, o divisor de águas que separa o Brasil de ontem e
o Brasil de hoje. Fazendo a herança do passado imergir no presen­te,
Lobato encontrou o caminho criador de que a Literatura Infan­til estava
necessitando. Rompe, pela raiz, com as convenções este­reotipadas e
abre as portas para as novas ideias e formas que o novo século exigia.

Monteiro Lobato ao realizar adaptações de obras clássicas apresentava


a intenção de: “Levar às crianças o conhecimento da tradição (com seus heróis
reais ou fictícios, conquistas da ciência etc.) e, também, questionar com elas as
verdades feitas” (RIBEIRO, 1984 apud BARBOSA, 2016, p. 26). No entanto, Lobato
inicia no campo literário infantil a ficção e a magia para as crianças, a partir do
contexto da realidade nacional, sendo a representação da relação familiar, da
vida no campo e do folclore afro-brasileiro. Vale destacar que vários estudiosos,
como Coelho (2010), Carvalho (1989) e outros, acreditam que a literatura infantil
brasileira é demarcada em dois tempos, antes e depois de Monteiro, e que, após
a sua influência no contexto literário infantil, com personagens que revelam as
questões sociais, políticas e culturais do povo brasileiro, renasceu uma nova
literatura infantil.

108
TÓPICO 1 - A LEITURA NO CONTEXTO BRASILEIRO: DIÁLOGO COM AS POLÍTICAS PÚBLICAS

FIGURA 3 – A MENINA DO NARIZINHO ARREBITADO

FONTE: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/7/7a/A_Menina_do_Narizinho_Arre-
bitado_%28pag_22._crop%29.png>. Acesso em: 3 fev. 2020.

Assim, a partir de Lobato, sugiram novos escritores com perfi l inovador


de narrativas infantis, como as revistas em quadrinhos, que trouxeram outra
forma de leitura, a intersemiótica, bem como a televisão, que transformou as
leituras dos livros infantis em seriados de entretenimento para crianças e jovens,
como, por exemplo, a inesquecível série infantojuvenil O Sitio do Pica-pau
Amarelo, adaptada da obra de Monteiro Lobato, e produzida pela Rede Globo.

Observa-se, portanto, como o processo de incentivo à leitura no Brasil,


enquanto política pública de direito do povo avança a passos lentos e, em
contrapartida, as políticas guiadas por uma intelectualidade demonstram
uma preocupação em disseminar esse acesso a todos buscando mecanismos
que viabilizem esse acesso. Um belo exemplo disso, foi a criação da Biblioteca
Municipal de São Paulo, em 1926. Mário de Andrade, intelectual da época, um
homem fascinado pelos livros, e sua equipe realizaram um visionário projeto
na capital, pois via a necessidade de trazer as artes, música e literatura como
elementos vitais para a área dos serviços públicos. Para isso revitalizaram a
biblioteca, priorizaram a formação do acervo/memória, que permitiu reunir
em um único espaço o registro da expressão humana em suas variadas formas.
No entanto tanto gasto fora visto pelos governantes como inútil. A biblioteca se
tornou um espaço polivalente de ações culturais e de convivência, pela utilidade
dos serviços oferecidos a uma população normalmente distanciada dos livros —
antes mesmo da existência do tão admirado Pompidou, na França. Naquela época
Rio de Janeiro, a capital, e São Paulo respiravam ares europeus e seus intelectuais
queriam projetar aqui o que estava dando certo na Europa.

109
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

Logo após esse movimento intelectual, em São Paulo foi criado o


Instituto Nacional do Livro (INL), principal instituição pública responsável pelo
desenvolvimento do livro e da leitura no Brasil. Este sobreviveu por mais de 50
anos, iniciou no Estado Novo e sobreviveu até o início da redemocratização em
1990 quando foi extinto. De acordo com Oliveira (2011, p. 29), o INL “respondeu
ao Ministério da Educação e Saúde de 1937 a 1953; ao MEC de 1953 a 1981; à
Fundação PróMemória (MinC) de 1981 a 1988; e à Fundação PróLeitura (MinC)
de 1988 a 1990”. E era o responsável também por editar, publicar e distribuir
livros; implantar bibliotecas; formar recursos humanos qualificados para atuar
nas bibliotecas e coordenar o Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas.

A criação de iniciativas, como o PNL — Programa Nacional Salas de


Leitura —, em 1984, baseava-se em todo um corpus ficcional direcionado para
um público específico. Embora tardio, esse projeto teve a preocupação de fornecer
para as instituições de ensino o material para a formação de bibliotecas escolares
(CALDAS, 2005).

Outras atividades viriam a ser desenvolvidas nas décadas anteriores,


como o Pró-Leitura (1992), voltado para o treinamento de professores que
viriam a desenvolver estratégias de leitura em sala de aula; o PROLER, em 1992,
instituído a partir do Decreto nº 519/1992, com o intuito de promover uma maior
mobilização política em prol do desenvolvimento de práticas de leitura. Dentre
suas práticas estão a:

Formação de uma rede nacional de incentivo à leitura; cursos de


formação de promotores de leitura; assessoria para implementação
de projetos de promoção da leitura; implementação da política de
incentivo à leitura na Casa da Leitura, com cursos, palestras e outras
atividades; criação da rede de referência e documentação em leitura;
assessoria para a implantação de bibliotecas para crianças, jovens e
adultos; sistema de acompanhamento e avaliação (PROLER, 1998, p.
18).

O programa atua incentivando práticas de leituras junto à rede escolar,


com a atuação de múltiplos parceiros.

Outra iniciativa em prol da leitura no Brasil, mais recente, são concursos


literários que visam desenvolver a iniciativa por parte das escolas, como os
concursos da PGU; ou o “Concurso Literatura Para Todos”, promovido desde
meados de 2005 pela Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização,
Diversidade e Inclusão (SECAD), em parceria com o Ministério da Educação.
Suas premissas iniciais envolvem o lançamento de concursos que incentivam
a produção de textos literários para novos leitores, de modo que os que forem
contemplados com o prêmio — tiverem seus livros escolhidos — terão ampla
divulgação nacional. Esse projeto visa incentivar novos autores, além de buscar
um diálogo com as novas gerações.

110
TÓPICO 1 - A LEITURA NO CONTEXTO BRASILEIRO: DIÁLOGO COM AS POLÍTICAS PÚBLICAS

Outra iniciativa de políticas públicas em prol do desenvolvimento


da leitura no Brasil de maior porte, até o momento, é o PNBE, o Programa
Nacional Biblioteca da Escola. O programa atua por meio de fornecimento de
obras para bibliotecas públicas em todo o Brasil. Gradativamente o programa
passou a atender diversos níveis de Educação, como a Educação Básica e EJA,
com o propósito de “democratizar o acesso de alunos e professores à cultura, à
informação e aos conhecimentos socialmente produzidos ao longo da história da
humanidade” (BRASIL, 2007, s.p.).

DICAS

Peter Sloterdijk, filósofo e filólogo alemão, é um dos grandes pensadores


contemporâneos que, à linha de Derrida, mescla filosofia com linguística, para os quais o
aumento de leitores — competentes ou não — está intimamente relacionada à capacidade
de propagação dos meios de comunicação. A alfabetização em massa e outras premissas
educacionais são indissociáveis da capacidade de “distribuir” o que fora produzido. Quando
a isso, Cezar Barros desenvolve profícuo artigo sobre o tema: http://www.hallnohall.com.br/
blog/2010/06/21/os-meios-de-comunicacao-e-a-propagacao-de-ideias/

DICAS

Alessandra El Far, doutora em antropologia pela USP, discute numa obra


de linguagem acessível e resumida, A leitura e o livro no Brasil. Seu texto tem o poder
transportar o leitor ao palco dos acontecimentos, onde recupera e esclarece alguns pontos
da história do livro e da leitura em nosso país. Um percurso que envolve a censura desde o
período Colonial, o surgimento das editoras, escritores e leitores.

Com o passar dos anos, mais e mais programas de políticas públicas


passaram a utilizar as escolas como carro-chefe de desenvolvimento de práticas
de leitura. Dessa maneira, muito da legislação vigente relacionada às escolas
desenvolveu-se paralelamente a projetos voltados para o desenvolvimento da
leitura.

Grande parte desses programas vem sendo garantido pela Lei de


Diretrizes e Bases da Educação. Você sabia que esta lei iniciou seu movimento
na era Vargas quando fora criado o Ministério da Educação e veio se arrastando
até o governo Fernando Henrique Cardoso na década de 90 (1994-2002)?

111
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

DICAS

Cabe aqui a sugestão de leitura da entrevista dada por Demerval Saviani sobre
o histórico de lutas que perpassa o Plano Nacional de Educação (PNE), bem como da
construção do texto da LDB. Disponível em: http://www.anped.org.br/news/entrevista-
com-dermeval-saviani-pne.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96) trabalha


com diretrizes e princípios da educação nacional. Expressas em seu artigo 27,
as diretrizes estabelecem que os conteúdos curriculares da educação básica
considerem:

I- a difusão de valores fundamentais ao interesse social, aos direitos


e deveres dos cidadãos, de respeito ao bem comum e à ordem
democrática;
II- consideração das condições de escolaridade dos alunos em cada
estabelecimento;
III- orientação para o trabalho;
IV- promoção do desporto educacional e apoio às práticas desportivas
não-formais (BRASIL, 1996, s.p.).

Tais princípios levam em conta a ética, a política e a estética da educação em


um nível mais concreto de valores. Assim, por meio do princípio de consideração
da diversidade étnico-racial — englobado pela Lei nº 12.796/2013 —, consideram-
se as condições específicas da sociedade brasileira.

Antes de encerrarmos este breve apanhado sobre os movimentos de


incentivo à leitura no Brasil, cabe lembrarmos que após a redemocratização, com
a Constituição de 1988, é que iniciativas de grande porte começam a ganhar mais
proporção no território nacional. Até porque instituições não governamentais
pressionavam o governo, atrasado nessas políticas, para um melhor
direcionamento. Vimos nascer o Programa Nacional de Incentivo à Leitura —
PROLER (1992), pertencente à Fundação Biblioteca Nacional (MinC). Em seguida
o Projeto uma Biblioteca em cada Município (1995 a 2002); o Programa Nacional
Biblioteca na Escola — PNBE (1997) e o Plano Nacional do Livro e Leitura —
PNLL.

112
RESUMO DO TÓPICO 1

Neste tópico, você aprendeu que:

• Os projetos de leitura no Brasil foram implementados por meio de políticas


públicas.

• Os movimentos de incentivos à leitura historicamente estão associados a


práticas estatais, de acordo com o projeto de governo de seus respectivos
períodos.

• Há uma relação histórica entre projetos de leitura, alfabetização e o


desenvolvimento da literatura infantojuvenil no Brasil.

113
AUTOATIVIDADE

1 Agora que você tem um conhecimento prévio de que os movimentos de


incentivo à leitura no Brasil estão associados à projetos governamentais,
faça uma pesquisa sobre um movimento/programa voltado para a leitura
e implementado no seu município ou estado. Compartilhe o máximo de
informações possíveis, como origem, idealizadores, desenvolvimento,
resultados e situação atual.

114
TÓPICO 2 -
UNIDADE 2

A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

1 INTRODUÇÃO
A leitura transcende o espaço da diversão. É muito comum professores de
literatura enfrentarem o seguinte problema: seus alunos alegam que não gostam
de ler. Na verdade, não gostam daquilo que se tornou a literatura nos bancos
escolares.

Na escola, a literatura vira matéria de livros paradidáticos, no fundamental;


disciplina autônoma no ensino médio e preparatório no terceiro ano, visto
que muitos colégios estão mais preocupados com a leitura de livros que serão
utilizados nos vestibulares. Dessa maneira, o texto literário torna-se um meio,
não um fim.

Ocorre um verdadeiro paradoxo: o professor de literatura promove


uma leitura interpretativa valendo-se de elementos da história, da filosofia e da
sociologia; porém, a transdisciplinaridades, nesse caso, torna-se uma moeda de
mão única: pouco comum é a presença de um professor de sociologia que usa as
obras de Machado em sala de aula.

Neste contexto, este tópico tem como meta abordar as possibilidades da


mediação da leitura em sala de aula, visando as relações transdisciplinares.

2 A LEITURA E SUA INTEGRAÇÃO EM PRÁTICAS


INTERDISCIPLINARES
No tópico anterior, com o propósito de estabelecer as bases que nos
guiariam ao longo desta disciplina, apresentamos as questões e problematizações
do ensino da leitura e da prática de leitura literária em sala de aula, bem como
políticas públicas que foram implementadas com o passar dos anos no território
brasileiro. Pudemos, dessa maneira, abordar o princípio da leitura significativa, a
qual se atrela à formação sociocultural do leitor. Apontamos também como pode
ser desenvolvida uma estrutura que possibilite o desenvolvimento de práticas em
prol do desenvolvimento das competências necessárias à leitura.

Vestimo-nos desses alicerces para tratar de uma questão fundamental: o


leitor se forma, ou ele é formado por alguém?

115
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

Essa pergunta extremamente capciosa nos é cara na mesma medida que


conveniente. Use-se como exemplo para o seguinte exercício: quando adquiriu o
hábito da leitura no sentido popular a ela atribuído, ou seja, “gostar de ler livros”?
Foi por curiosidade? Na biblioteca escolar? Ou foi um presente que recebeu?

Como aponta Umberto Eco, “os livros sempre falam sobre outros livros, e
toda estória conta uma estória que já foi contada” (ECO, 1983 apud HUTCHEON,
1991, p. 167). Em outras palavras, os escritores são, acima de tudo, leitores.

Porém, essa imagem do escritor-leitor muitas vezes não é abordada em


sala de aula. Muito do que se lê está associado a material paradidático e enxertos
de apostilas, distanciando o aluno do material literário.

DICAS

Não é de hoje a correção entre aluno e sala de aula. Rosa Maria Aparecida
Nechi Verceze e Eliziane França Moreira Silvino, professoras da UNIR desenvolveram um
longo estudo sobre como, paradoxalmente, a leitura em sala de aula tem potencial para
castrar o aluno de seu processo de formação como leitor. A leitura é incômoda, mas
denuncia muitas das práticas do cotidiano escolar. Disponível em: http://periodicos.uesb.br/
index.php/praxis/article/viewFile/328/361.

Só depois de acessarmos esse resquício residual que assola a maioria dos


alunos do país — muitos, inclusive, de alta renda, mas com carência de prática de
leitura — que podemos começar a conceber ações que abordem as relações entre
literatura e formação de leitores, principalmente na concepção de que o texto
ficcional é uma forma de se compreender o mundo, ao passo em que aborda as
possibilidades e potencialidades do da língua em prol da formação de leitores.
Ainda não respondemos à pergunta: qual é o processo formativo de um leitor?
Podemos recorrer às considerações de alguns escritores e educadores que são,
também, leitores, para responder a essas dúvidas, como Fanny Abramovich, para
a qual a leitura era uma espécie de volúpia, uma prática deliciosa realizada com as
obras dos clássicos brasileiros. Para a autora, “gerava-se uma sensação totalizante
que preenche o ser e permite a fruição de muitos saberes” (ABRAMOVICH,
1995, p. 11). Por sua vez, Ana Maria Machado revela sua predileção por contos
de fadas desde pequena, por influência da mãe (LAJOLO, 1995). Apontamento
parecido faz Joel dos Santos, que desenvolveu cedo o gosto por influência da avó
(SANTOS, 2013).

Os relatos denunciam um ponto crucial que nos servirá de primeiro passo:


em muitos casos não foi à escola a responsável pelo desenvolvimento do hábito de
leitura nos indivíduos. Podemos, inclusive, apontar como muitos desses escritores
eram oriundos de espaços mais alfabetizados. Porém, qual fora a influência de
116
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

Machado de Assis, nosso maior escritor? Que escolhas frequentou? Quais liceus
visitou? Para além das histórias/lendas de que fora trabalhar numa padaria de
um francês para aprender o idioma, é fato que o escritor não era detentor do
“perfil” usufruído pela elite carioca, à época.

É importantíssimo compreender o processo formativo do leitor como


um ritual iniciativo, através do qual ele passa a ter contato com um novo
mundo. Dividido em etapas, possui a capacidade de possibilitar o crescimento
e amadurecimento deste indivíduo em formação. É possível, com base nas
primeiras experiências, observar o desenvolvimento de um gosto pela prática, não
sem empecilhos, o apoio de facilitadores, indivíduos que o auxiliam e incentivam
à prática, bem como o meio, ou seja, um contexto sociocultural que agregue as
possibilidades e oportunidades de enriquecimento, de modo a aproximá-lo cada
vez mais para essas atitudes. É nessa constatação que se observa o acesso ao
texto literário e a presença de outros leitores, os quais auxiliam na capacitação,
influência e reforço positivo dos futuros leitores. Esses elementos possibilitam
um despertar precoce e estimulam uma série de atividades que tão cedo agregam
resultados prazerosos, afetivos e que influenciam em todo o processo formativo
do estudante.

Se fossemos investigar muitos outros escritores e leitores vorazes


verificaríamos que há um ponto em comum entre eles. Em algum momento de
suas vidas encontraram com um iniciador de leitura. Sim, um iniciador de leitura,
é o que Michele Petit chama para aquelas pessoas cuja sensibilidade toca o outro
com afetamento, despertou seu desejo, sua curiosidade pela literatura. E você? Já
parou para pensar quem foi o seu iniciador? Raros são aqueles que respondem
“foi meu professor”. Tomando como base tais experiencias podemos apontar
como o meio em que cada escritor conviveu facilitou o desenvolvimento de sua
atividade como leitor, bem como o desenvolvimento de um perfil de leitura.

DICAS

Michele Petit escreveu várias obras a respeito da mediação de leitura em jovens


e adultos. Entre elas, Os jovens e a leitura; O ato de ler; Leituras: do espaço intimo ao
espaço público, entre outras. Vale a pena ler a resenha do seu livro A arte de ler ou como
resistir à adversidade. Disponível em: http://www.ufjf.br/praticasdelinguagem/files/2012/02/
Resenha-2-A-arte-de-ler-ou-como-resistir-%C3%A0-adversidade1.pdf.

117
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

Ao focarmos no ponto do vínculo entre leitor e texto, não de obrigação, mas


de afinidade chegamos na questão do afetamento, desse envolvimento sensível
do leitor e o texto. Essas ações motivadas por vários fatores, como vínculos —
sociais e culturais — que vão sendo estabelecidos ao longo da vida, promovem
uma mescla, ou melhor, aglutinação e associação entre esses pontos, de modo
que o ato da leitura se torna desassociado de outras práticas cotidianas. Não é
por acaso que um contexto familiar é sempre um dos melhores espaços para esse
desenvolvimento, e porque muitos dos leitores deram início à sua prática por
meio de histórias que lhes eram contadas.

A leitura separa o ambiente para o leitor conceber sua identidade e


constatar sua fragilidade, atos possibilitados pelo “fazer ficcional” inerente ao
texto, seu jogo de devaneio de experimentação. Essa experiência tanto abre novos
horizontes quando amplia as percepções de cada um. Porém, contemporaneamente
o desenvolvimento desse gostou passou a ser um verdadeiro desafio, e um de
seus principais motivos e a inconstância dos facilitadores educacionais, ou seja,
o acesso ao texto. O acesso ao universo literário é limitado por vários fatores, a
saber, o acesso ao material, a infraestrutura, os meios democráticos de acesso
aos livros e os projetos de promoção de leitura por parte do governo, os meios
de comunicação, a internet, o celular, estes últimos tem sido mais sedutores aos
jovens e crianças e até muitos adultos do que um livro. Que propostas estão sendo
implementadas para acompanhar a modernidade, e qual sua aplicabilidade?

NOTA

A entrada de outros gêneros em sala de aula é recente. Durante décadas foi


utilizado apenas o livro didático, com posterior uso dos paradidáticos e, mais recentemente,
revistas, jornais e outros formatos (SOARES, 2010).

São perguntas simples que exigem respostas complexas, iniciando a


problemática da criação de novos leitores, principalmente num ambiente em
que o próprio acesso à cultura é deficiente. Como aponta Ezequiel Silva (2012),
a formação de leitores demanda o contexto nacional e a percepção da falta de
condições sociais e econômicas para promover a capacitação dos cidadãos
brasileiros. Dessa forma, considerando a carência de bibliotecas em todo o
Brasil, próximas das grandes concentrações urbanas, mas longe das regiões
mais carentes, resta à escola, para além do seu papel de espaço de promoção da
educação, a responsabilidade do processo formativo desses leitores. Instituição
educadora por excelência, responsável por inter-relacionar os mais diferentes
campos do saber, cabe a ela essa função.

118
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

Outro fator interessante, que cabe aqui ressaltar, é a carência das bibliotecas
existentes por visitantes entusiasmados por seus tesouros nas prateleiras. O
mundo evoluiu e muitas bibliotecas continuam paradas no tempo. É hora desses
espaços se reinventarem. Luiz Milanesi, bibliotecário e escritor, discute sobre esse
assunto em sua obra A casa da invenção (1991). A biblioteca precisa se reinventar.
Ela não é mais espaço só de silencio e pesquisa. Algumas bibliotecas têm iniciado
esse novo paradigma aqui no país. Algo sonhado por Mário de Andrade há quase
um século atrás. A biblioteca vem se reinventando para não se tornar um espaço de
palavras mortas. Por disporem de base essencial — acervo diversificado — tende
a conjugar três verbos: informar, discutir e criar, independentemente da ordem.
Tornando-se um lugar de encontros que atraiam o público por meio da ação
cultural, como um lançamento de livro, uma apresentação musical, exposições
escolares e de artistas locais, tornando um espaço que a comunidade interaja com
sua cultura e com a cultura do mundo contida nas prateleiras. Essa tarefa cabe
aos iniciadores, professores, autoridades públicas que queiram colocar a cultura
em primeiro plano.

Devemos, porém, resgatar os problemas da mercadorização do saber:


diferente do desenvolvimento da leitura literária, o protagonismo escolar
pode ser suplantado pelo uso da velha didática que absorve livros didáticos
e paradidáticos, afastando o aluno do uso do texto literário integral. Ocorre o
erro da cristalização da leitura, prendendo o aluno a receitas e fórmulas prontas,
muitas vezes disfarçadas de prazer estético, o qual é também conhecido como
“prazer superficial”. Em suma, um texto estruturado e organizado que evoca o
lado lúdico da leitura, mas não atinge a função social da escola de promover o
prazer essencial que flui do ato da leitura.

E o que difere o prazer essencial, do superficial? O prazer superficial


está relacionado à leitura superficial do texto, no qual a atividade estrutura-se
em torno da dinamização do texto literário, limitando-se a abordar as questões
óbvias nele presente. Essas características estão muito presentes em textos que
apresentam as características mais óbvias de dada obra, dividindo as avaliações
em formato objetivo. Não é uma prática incomum, uma vez que busca direcionar
o aluno mais para uma formação específica. Já o prazer essencial envolve as
experiências de leitura focadas no aperfeiçoamento e emancipação do indivíduo,
possibilitando a problematização dos temas apresentados. Deixa de haver uma
resposta essencialmente correta, mas possivelmente contextualizada.

É muito comum o uso desse prazer superficial para a realização de


atividades que visam mais ao uso da língua, do que o sentido do texto, de modo que
o texto literário é meramente fenômeno linguístico. Já atividades que valorizam
o prazer essencial são voltadas para a contextualização e desenvolvimento das
habilidades lúdicas durante o processo de aprendizagem. Um exemplo dessa
atividade seria uma atividade de contextualização entre Alto da Barca do Inferno,
de Gil Vicente, e Auto da Compadecida, de Ariano Suassuna.

119
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

FIGURA 4 – A OBRA DE GIL VICENTE E SEUS REFLEXOS NO TEATRO EM LÍNGUA PORTUGUESA

FONTE: <https://encrypted-tbn0.gstatic.com/images?q=tbn:ANd9GcTj77IMb0i_rSM1bBe0ytu-
ZNZ1hb21-_tR-Ze9FD4SEx8UIUTpy&s>. Acesso em: 3 fev. 2020.

Eis a questão apresentada e não percebida pelos educadores, a


incompreensão da diferença entre gosto e prática de leitura. Há toda uma
sequência de produções, bem como um mercado, voltados para uma prática
constante, quase robotizada. Mas pode-se falar, de fato, em leitor? Se o hábito
da leitura envolve, se o hábito da leitura envolve, antes de qualquer coisa, uma
afi nidade, um gosto com a prática, em que medida a obrigatoriedade do exercício
contribui com o seu desenvolvimento?

TUROS
ESTUDOS FU

Quantas vezes você já viu grupos de alunos que, em sua maioria, liam pela
obrigação, mas não demonstravam o interesse pela leitura? É possível que ler se desassocie
do gostar? Deixamos essa pergunta que será abordada mais adiante, mas pergunte-se se o
seu desempenho não está sendo afetado por esse fator.

120
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

É nesse princípio que o educador/professor deve ter em mente sua função


de agente formador de leitores, contribuindo para sanar essas carências mais
essenciais que surgem ao longo do seu processo formativo. Tornar-se ciente
desses questionamentos aponta a função de cada um — na função de professor
— como participante desse processo iniciativo voltado para o desenvolvimento
do gosto pela leitura, bem como das instituições envolvidas nas respectivas
atividades educativas.

De maneira que possamos apontar para os vários caminhos,


problematizações e possibilidades dessa prática educativa em particular, trazemos
novamente as observações de Fanny Abramovich, escritora e pedagoga, sobre
este processo de formação de leitores e como o mesmo pode ser implementado
em instituições que visam fomentar suas práticas:

Consta-me que a prioridade inicial deveria ser capacitar leitores


inconsistentes, determinados, cheios de dúvidas, atentos para o
potencial que uma história pode abordar, competentes para entender
o motivo de não terem aproveitado ao máximo determinada história.
Texto literário é arte, é prazer, e cabe a escola abraçar essa marca
educativa, o que envolve, também, ensinar a gostar e a criticar
(ABRAMOVICH, 1995, p. 148).

Essas práticas, quando relegadas, atrapalham todo o processo de formação


do leitor, em vários níveis. Desta ênfase que Abramovich (1995) defende que
ambos, literatura e escola, comungam de um espaço, o de formação, de maneira
que se a escola busca educar com os fatos e registros, o texto ficcional o faz com
as possibilidades, instigando o aluno/leitor por meio dos questionamentos que
nele desperta. São atividades que, por sua atuação contestadora, nunca deixam o
indivíduo indiferente ao que o atinge.

Você já ouviu falar em formação estética em educação? Alguns escritores


já discutem sobre a formação estética em educação, que vem da premissa de unir
a razão e o sensível, pois o mundo chega a nós através dos sentidos. Maffesoli,
Schiller, Duarte Junior, Meira, entre outros estudiosos trazem à baila a questão
da formação estética do ser humano algo importante diante do enrijecimento da
sensibilidade humana. A formação estética em educação abarca a bagagem socio
cultural do indivíduo que tende a ser refinada pelo contato dos sujeitos com a
arte em suas diversas facetas, como a música, a arte em si, a literatura entre outros
dispositivos culturais. Vivências culturais diversas que vão ora impactando,
afetando e aumentando o arcabouço dos sujeitos, ampliando sua formação, seu
afetamento, seu prazer de sentir o mundo através de exercícios cognitivos.

E como trazer essas possibilidades para a sala de aula? Somente com a


formação do professor, certo? Foi com essa preocupação que Uriarte, Neitzel e
Carvalho (2016) trazem essa discussão no artigo intitulado Formação Estética em
Educação: produções acadêmicas no Brasil. O artigo é um compêndio Nacional
da produção acadêmica da formação de professores de 2003 a 2013. Essa pesquisa
visava detectar a preocupação docente sobre sua formação estética. Partindo

121
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

desse pressuposto, as pesquisadoras recorrem aos bancos de dados de teses e


dissertações para levantar material significativo sobre a educação estética nos
últimos 10 anos. As pesquisadoras descobriram que mesmo a passos lentos vem
crescendo a necessidade de capacitação dos professores, pois a educação precisa
de um espaço mais dinâmico e lúdico de aprendizagem. Faz-se necessário antes
de querer mudar a dinâmica em sala de aula, que o professor busque pesquisas,
formação, embasamento para adquirir as competências necessárias para transmitir
a seus alunos o conhecimento com menos rigor e mais sensibilidade.

Percebe-se neste breve resumo das pesquisas brasileiras que alguns


docentes trazem essa necessidade de criar no ambiente escolar novas possibilidade
de trazer a literatura como instrumento essencial e repaginado, pois a literatura
é arte.

Assim como a escola cria um ambiente que transmite o saber acumulado,


a literatura parasita o meio social, relação que o aluno tem com o meio. E por mais
diferenciada uma que uma obra possa estar do meio que transita, ainda assim
tende a possuir a capacidade de se integrar com seu leitor, uma vez que ainda
busca salientar às grandes questões a serem resolvidas, como a relação entre a
Terra Média de Tolkien e a Segunda Guerra Mundial, de maneira que ao atingir
essa reflexão, o leitor também realiza uma atividade de autorreflexibilidade
pessoal.

Essa mesma função não escapa à escola, que auxilia o aluno a ler o mundo
por meio dos conteúdos programáticos. A inconstância é como o mesmo percebe
que a aprendizagem em sala lhe permite uma nova percepção do seu dia a dia, e
especial a descoberta da existência de leis com as quais não exerce nenhum poder.
É nessa medida que escola e literatura se distanciam, devido às possibilidades
de interagir com um mundo, ainda que ficcional, de maneira mais ativa. É por
meio da obra ficcional que muito se conjecturou sobre os limites do nosso mundo,
como vários livros de Júlio Verne, ou os limites da percepção nas obras de Arthur
Conan Doyle. É o texto literário, germinador da imaginação, que possibilita ao
indivíduo desenvolver a capacidade de subverter as amarras da realidade e
repensá-la em prol de seus objetivos.

Se analisarmos o valor da obra literária para a formação do leitor, o que


a classificaria como boa ou ruim não divergem tanto dos critérios que analisam
qualquer obra de arte. Em suma, sua valoração está no princípio de favorecer um
porto de saída para uma percepção inovadora da realidade, permitindo que o
leitor possa compreender melhor o mundo em que convive, mas por outro viés.

E como potencializar a literatura a ponto de o texto produzir sentido? Está


aí uma questão muito importante, ou seja, o processo de interação que ocorre
entre a obra e leitor. Adair de Aguiar Neitzel e Carla Carvalho, pesquisadoras
e professoras catarinenses, discutem sobre essa questão ao discutirem sobre o
desenvolvimento de um projeto de formação de leitores denominado CONTART.
O artigo intitulado A movência do leitor na leitura do literário traz à tona como

122
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

se constrói a subjetividade do contador por meio do ofício de contar, de afetar,


de transmitir a literatura fruitiva, entendendo está como objeto artístico e estético
que necessita ser apreciado como arte.

Dois pontos importantes são levantados pelas pesquisadoras na relação


que acontece da recepção do texto literário: a importância da performance e a
leitura silenciosa. Na performance entra questões de como magnetizar aquele
que vai receber, sem infantilizá-lo e desmistificá-lo, salvaguardando seu status
literário. Ao embevecer-se do texto, o leitor abre sua bagagem cultural para
compreendê-lo, um processo que se dá em silêncio entre leitor e obra, que mediada
ora pelo contador onde se pode atingir a fruição estética, ou seja, o afetamento
dos sentidos, das memórias.

Emerge dessa interação a relação entre o leitor e a obra que lê. Na medida
em que a obra exige uma participação mais ativa e do domínio do leitor de
um código cultural, mas o livro tem a lhe agregar, devido a sua capacidade de
abranger o meio social, possibilitando o alargamento do horizonte sociocultural
de quem lê a obra. Sendo este um processo cognitivo de intercâmbio, instaura-se o
fenômeno da leitura. É comum a acepção “o que você absorveu de bom do texto”,
quando, na verdade, se trata de uma compreensão do mundo real via imaginário.
Assim, a obra literária não se limita ao conteúdo escrito, mas à capacidade do
leitor em assimilar a realidade criada. Dessa maneira, a leitura só se dá quando
esse processo, a interpretação entre mundo ficcional x mundo real, se realiza em
sua totalidade.

DICAS

No início desta unidade trouxemos o questionamento acerca do processo


de instrumentalização pedagógica da leitura. Agora, entre no fórum da Unidade 2 —
considerando que você já pode ter uma apreensão inicial dos pressupostos desse processo
— e responda à seguinte pergunta: em que medida um projeto de leitura realizado de
maneira independente dos parâmetros curriculares nacionais pode atingir resultados mais
propícios e proveitosos?

Ao longo desta disciplina, tem-se discutido o problema da prática de leitura,


sua contextualização, caminhos e estratégias. Abordamos vieses pedagógicos,
estratégias metodológicas, pesquisas e arcabouços que fomentassem o devido
embasamento para os respectivos pontos de vista aqui elencados.

Neste último tópico, observamos a necessidade de trazer uma reflexão da


pergunta mais essencial dessa unidade: por que devemos ler? Qualquer resposta
é subjacente à prática da leitura, externa à mesma e, muitas vezes, de cunho
subjetivo. Muitos pesquisadores elencaram — e continuarão apresentando uma
123
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

série de justificativas que levam o indivíduo à prática. Optamos aqui por abordar
o ato da leitura do ponto de vista de determinados leitores-modelo — não num
sentido stricto da teoria de Umberto Eco, mas lato, ou seja, com certo grau de
generalismo, o que podem ser tipos de leitores que estão associados a alguns
tipos de leituras, mas também o mesmo leitor que assume posicionamentos
diferentes de acordo com o tipo de texto com que trava contato —, que como
tantos outros exerce a prática em situações específicas. Assim, nesta última etapa,
evitamos parcialmente uma discussão meramente acadêmica e a trazemos para
nosso próprio cotidiano, propiciando justamente um processo dialógico com
nossas práticas diárias em relação à leitura.

Em resumo, as leituras realizadas cotidianamente seguem os seguintes


intuitos: feitas para se informar, para conhecer acerca de algo ou alguma coisa
ou para atingir determinada sensação prazerosa. Não pense nisso como uma
categoria cristalizada, tampouco como uma categoria. Podemos dizer que são
motivações associadas a propósitos que situacionalmente podem se modificar. Se
cada leitor pode e deve descobrir uma leitura pessoal para cada texto que trava
contado, não é incomum ele desenvolver uma relação diferente da planejada com
cada texto que encontra. Abordaremos, então, os tipos de leitores:

2.1 LEITOR INFORMACIONAL


Um leitor que busca se informar tem como princípio a leitura que favoreça
um maior conhecimento dos fatos que circulam ao seu redor, quer se atualizar.
Tendo esse objetivo em mente, privilegia meios de propagação que difundem
rapidamente esses dados, como jornais, revistas, periódicos e outros tipos, como
jornais virtuais, blogs e podcasts de notícias. Quase que religiosamente todos os
dias ele recebe seu jornal ou revista, ou acessa seus sites favoritos para tomar
ciência dos últimos acontecimentos. É um leitor preocupado com o cotidiano,
os principais assuntos, sua evolução e repercussão, e deseja fazer uma recolha
dessas informações para se posicionar criticamente diante destes. Vale observar
que é um dos tipos de leitores mais valorizados por estar “antenado”, mesmo
que, muitas vezes, possua apenas um recorte de informações superficiais. De um
ponto de vista social, o indivíduo que não aproxima minimamente dessa categoria
de leitor é tratado como se tomado por uma espécie de alienação.

2.2 LEITOR ESTUDIOSO


Um leitor que busca conhecer determinado assunto possui muita
aproximação com vários outros tipos de profissionais que pesquisam e estudam
constantemente, além de outros que precisam de algo mais do que uma
informação resumida para seu campo de atuação. Porém, devido à variabilidade
das profissões e suas características, algumas exigem uma maior reflexão sobre
determinados processos do cotidiano, de modo a estarem em um estado de

124
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

pesquisa permanente. Assim, uma parcela significativa do tempo desse leitor é


dedicada à busca e reflexão de questões fundamentais do mundo ou, ao menos,
da sociedade em que habita, problemas culturais, divergências epistemológicas e
nas situações em que lhe falta o devido tempo para esse exercício, um incômodo
instaura-se dentro de seu ser. “Incômodo” parece-nos uma ótima analogia para
um sentimento que faz o indivíduo sair do seu lugar de tranquilidade. O que
faz com que, por exemplo, dentistas separem um pouco do seu tempo para
tomarem parte de seminário, assistirem a palestras e tomarem contato com novas
pesquisas na sua área? Analogamente ao mito de Prometeu, eles não o fazem pela
curiosidade, mas pelo fogo!

2.3 LEITOR DILETANTE


Por último, um leitor que busca atingir uma sensação prazerosa oriunda
do ato da leitura satisfaz-se recorrendo aos gêneros textuais literários. Ele pode
assim atingir horizontes propiciados pela literatura ilimitados, capazes de
proporcionar também infinitas interpretações em detrimento da plurissignificação
do signo literários, o que o motiva a buscar escritores diferenciados, permitindo-
lhe atingir novos saberes e expandir sua percepção de mundo. Como abordamos
ao longo desta disciplina, é o tipo de leitura mais desfavorecida pelas práticas
escolares contemporâneas, de maneira que o efeito prazeroso é substituído pela
obrigação da leitura, da determinação prévia de um tempo para o exercício ledor,
da mecanização do texto, dos discursos autoritários que limitam as interpretações
e delimitam o que é válido ou não e toda uma série — melhor dizer, tradição —
de mecanismos que ocasionam num sentimento de repúdio — embora o aluno
não utilize essa palavra — e, consequentemente, morte precoce do leitor.

Curiosamente há mecanismos que têm resgatado esse tipo de leitor no


cotidiano, como as várias adaptações de livros para filmes e séries, o que instiga
o expectador a procurar suas obras. Mesmo com caráter mercadológico, obras
clássicas são relançadas com capas especiais, com efeitos muito curiosos e, até,
influenciando outras obras. É significativo observar que o filme O espaço entre
nós, o qual conta a história de um garoto que nasceu durante uma missão em
Marte e lá ficou por 16 anos antes da tripulação retornar à terra, é baseado em
um livro de ficção científica clássico, Um estranho numa terra estranha, de Robert
H. Heinlein, sobre um garoto que nasce durante a viagem ao planeta vermelho
mas, como todos morrem pouco depois do pouso, o jovem é criado por 20 anos
por marcianos antes de retornar à Terra graças à chegada de outra nave terrestre.

125
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

ATENCAO

Sobre os diferentes tipos de leitores, é muito útil o artigo Crianças, leitura


e cibercultura: os tipos de leitores e navegadores no ensino fundamental I, de Martha
Kaschny Borges, Silviane de Luca Avila, Cristiana Guntzel da Silva, sobre os tipos de leitores
contemporâneos, onde abordam os novos leitores da era digital, os nativos digitais.
Disponível em: https://online.unisc.br/seer/index.php/reflex/article/view/3820/3017.

Podemos observar que as práticas de leitura exercitadas pelos três tipos


de leitores associam-se à essência do ato de ler, de modo que um não exclui o
outro, sendo um leitor pleno aquele que executa as três. Porém, como já apontara
Paulo Freire em A importância do ato de ler (2005), todo texto abordado por um
leitor é o primeiro degrau para uma observação mais aprofundada e crítica do
nosso contexto social. É por isso que é absurda a ideia de que os alunos — e,
também as pessoas, em geral — não leem, pois qualquer meio linguístico atua em
referência ao mundo que parasita, de maneira que atuar como leitor competente
e adquirir a capacidade de traduzir os signos textuais, seus referenciais, adentrar
numa dinâmica interna e compreender como ela se inter-relaciona com toda
outra, externa é imprescindível para uma percepção de indivíduo no mundo.

Todo indivíduo possui uma capacidade (biológica e psíquica) inerente


para a comunicação. Porém, na sociedade da qual fazemos parte, as mazelas
sociais são reproduzidas em todas as estruturas possíveis, até mesmo no espaço
educacional, de modo que as capacidades dos indivíduos não são correta e
plenamente desenvolvidas, primeiramente pelo pouco conhecimento do professor
sobre como dinamizar seu trabalho e segundo pelo currículo educacional a ser
seguido.

Encerramos aqui este subtópico com uma frase de Monteiro Lobato que
nos é contemporânea desde sempre: “um país se faz de homens e livros”. Livros
fechados tornam-se palavras mortas. Livros abertos, lidos, absorvidos ampliam
as possibilidades fruitivas do ser humano em se conhecer, perceber o mundo,
transformar-se e mudar seu contexto.

3 A MEDIAÇÃO DA LEITURA EM ESPAÇOS ESCOLARES


Para se conhecer o perfil dos textos utilizados no âmbito escolar, basta
olharmos seus livros didáticos para observarmos suas características mais
comuns:

• Recortes de livros, muitos dos quais de obras infantojuvenis.


• Em geral, nacionais, com exceção de contos de fadas.

126
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

• Havia um número maior de textos no livro de Língua Portuguesa e Redação,


voltados para exercícios textuais, do que no próprio livro de literatura.
• Não se atrapalhava a capacidade escrita, duplicadora.

Os livros sempre estiveram/estão divididos em capítulos, voltados para


temas que abordassem, por exemplo, questões gramaticais. Cada capítulo era
iniciado por um trecho de uma grande obra, ou de um texto adaptado para se
adequar ao direcionamento do capítulo.

O escritor Bartolomeu Queiroz, em entrevista, salienta como trechos


de seus textos estão dispersos em livros didáticos (SESC, 2012). Nesses trechos
utiilizados para fins didáticos não há explanação sobre o autor — vivência,
carreira, origens, estilo — ou um breve resumo do livro citado, de maneira que
os leitores, jovens, pudessem se contextualizar. Desse modo, o texto literário teve
uma função utilitarista, contribuindo como base de exercícios linguísticos, mas
pouco auxiliando na sua formação de leitor. Mas o professor poderia aprofundar
esse assunto trazendo essas fontes, sugerindo atividades que complementassem
o livro didático que desafiassem o aluno a interagir mais no assunto, conhecer
o contexto e quem sabe obras completas do escritor. Aí vem aquela questão da
movência do leitor, da performance do mediador em incitar o receptor.

E
IMPORTANT

Não são poucos os artistas, escritores e pesquisadores que definem sua


existência pelo contato com livros. Para muitos, se o mundo acabasse, bastava que
salvássemos as grandes literaturas para que reconstruíssemos nossa civilização. A afirmação
não é tão absurda quanto muitos pensam: os clássicos da literatura recebem esse nome
por, dentre outros motivos, atingirem a essência cultural de suas respectivas sociedades e,
com isso, transcenderem seus espaços formativos.

Essa apropriação do texto literário sem sua contextualização é uma


constante nos livros didáticos, a exemplo do poema de Cecília Meireles, Ou
isto ou aquilo, o qual consta no livro do 2º ano do fundamental da coleção Quero
aprender (MORAES, 1996). O poema é replicado na sua integridade, e chega a
abordar questões de compreensão textual, sem nenhuma contextualização. Os
exercícios pouco estão relacionados ao texto, de maneira que este é utilizado para
analisar figuras de linguagem e como elas constroem o sentido do texto. Porém,
esse exercício de caráter linguístico reserva-se a ser uma aplicação de outra
ordem, deixando a apreensão de saberes de fora. Ainda um terceiro caso, o livro
Trabalhando com poesia (BERALDO, 2001), em um exercício que contém o poema
Três Tias, de Elias José, apresenta a seguinte proposta de atividade: “que letras
aparecem mais de uma vez no poema? Veja a letra que mais aparece e duplique-a
todas as vezes que ela aparecer na primeira estrofe” (BERALDO, 2001, p.15).
127
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

Os três exemplos, embora em alguns casos dupliquem completamente o


texto original, servem como mero pretexto para abordar o ensino da gramática.
Não são questões que promovam a reflexão da temática a ser abordada — a
estilística — tampouco trazer à tona a reflexibilidade inerente ao texto literário,
não podendo ser categorizada como produção textual significativa, ou seja, sem
uma relação interacional com o leitor. Não é por acaso que, em muitos casos, os
textos literários são substituídos por textos dispersos encontrados na internet,
visto que seu esvaziamento simbólico cria uma situação na qual sua substituição
não causa prejuízo ao exercício apresentado.

Em suma, não é um problema de falta de literatura, mas sua acessibilidade


lúdica, fruitiva. Trata-se de uma literatura prejudicada nos manuais didáticos por
causa do nosso sistema educacional (SILVA, 1986), substituindo o deleite do texto
pela sua castração, da delimitação do texto a ser lido, dos sentidos pré-definidos e
do impedimento do aluno de desenvolver sua capacidade interpretativa. Kleiman
(1998, p. 12), por outro lado, amplia a crítica:

É comumente sabido que há um pré-impedimento diante do que


ou é muito difícil, ou muito complexo. A simplificação dos textos e
seu descaso durante esse período letivo contribuirão, futuramente,
para a não formação do futuro leitor, acostumado a ler enxertos e
desacostumado a se lançar na leitura.

Fazendo uma leitura pedagógica dos exercícios, eles produzem um


bloqueio em todo um processo socioconstrutivista, na medida em que a falta de
relação entre texto e contexto causa um bloqueio no discente. Não há o prazer do
texto, da mesma maneira que se impede o desenvolvimento das potencialidades
que lhe são caras, sua capacidade de interpretação literária.

Todo exercício que se apropria de textos, independente do seu caráter


avaliativo ou campo de saber, deve propor uma visão ampliada deles, de maneira
que possibilite ao aluno a noção de que a produção escrita está relacionada a
diferentes elementos, o que inclui sua receptividade. Analisa-se muito textos de
acordo com sua classificação sintática, morfológica, histórica etc., mas ignora-
se, por vezes, seu caráter semântico. Cabe à escola esse papel de auxiliar nessa
prática de interpretação da plurissignificação textual, literária ou não.

128
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

FIGURA 5 – A LITERATURA É COMO A ESFINGE: DECIFRA-ME OU TE DEVORO

FONTE: <https://farm6.staticflickr.com/5042/5253456780_9af8c1e1e5_b.jpg>. Acesso em: 3 fev.


2020.

Se para toda regra há exceção, iniciativas são realizadas em prol do


melhor uso do texto literário. Como apontado, literatura e escola são espaços que
comungam de interesses e, por vezes, entram em conflito. Como aponta Lia Luft
(2004, s.p.):

a escola era terrível, seria melhor se ficássemos em casa, no quintal,


lendo. Mas era divertido quando brincávamos com os vocábulos:
na biblioteca havia livros, e as palavras eram como doces infinitos
que a gente guardava por um instante antes de se deliciar... mas às
vezes jogávamos na cara dos outros essas descobertas, de propósito,
cuspindo.

Observe como a crônica, que nas mãos de Luft assume contornos de


crônica literária, promove um jogo lúdico de verdade/falsidade: ela tanto gostava
quanto odiava a prática de leitura na escola. Quais seriam esses livros? Didáticos?
Ou livros que ela não gostava?

DICAS

Isabel Solé é uma pesquisadora que aborda a leitura pelo viés da psicologia
e, em termos mais ou menos gerais, aponta que os mesmos mecanismos de punição e
recompensa se fazem presente no desenvolvimento na formação do leitor. Em entrevista,
a pesquisadora detalha suas colocações, e como suas práticas ao longo dos anos sempre
apresentaram esses elementos em comum. Disponível em: https://novaescola.org.br/
conteudo/304/para-isabel-sole-a-leitura-exige-motivacao-objetivos-claros-e-estrategias.

129
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

Para não limitarmos o grau de interpretação, apontamos que, a nosso


ver, parece-nos que ela reclama dos livros que lhe são obrigatórios, ou seja, que
não favorecem o desenvolvimento da capacidade ledora, em oposição a outros
que ela mais gostava, que contribuíram para a ampliação de suas faculdades
cognitivas. Assim, a escritora traz a discussão sobre o próprio texto literário a
ser trabalhado em sala de aula. Observemos como, enraizada em uma série de
estudos de ordem cronológica e num curto espaço de tempo para realização de
um conteúdo programático, a disciplina de Literatura limita seu ensino a textos
que, como primeiro contato para os leitores, não contribui com sua função:

Compete hoje ao ensino da literatura não mais a transmissão de um


patrimônio já constituído e consagrado, mas a responsabilidade pela
formação do leitor. A execução dessa tarefa depende de se conceber a
leitura não como o resultado satisfatório do processo de alfabetização
e decodificação da matéria escrita, mas como atividade propiciadora
de uma experiência única com o texto literário. A literatura se associa
então à leitura, do que advém a validade dessa. [...] A experiência
da leitura decorre das propriedades da literatura, [...] esse universo,
contudo, se alimenta da fantasia do autor, que elabora suas imagens
interiores para se comunicar com o leitor. [...] Dúbia, a literatura [...]
aciona sua fantasia [...] mas suscita um posicionamento intelectual. [...]
Nesse sentido, o texto literário introduz um universo que, por mais
distanciado do cotidiano, leva o leitor a refletir sobre sua rotina e a
incorporar novas experiências (ZILBERMAN; SILVA, 1990, p. 19).

Há, nesse estudo, uma abordagem da responsabilidade inerente ao texto


literário, do fazer literário, e sua transmissão. Aponta-se que não cabe à escola
estruturar didaticamente o texto durante o processo de acessibilidade do texto
literário, tampouco pedagogizá-lo ou limitar suas possibilitadas semânticas aos
limites do manual didática. Em suma, o que precisa ser abordado é o livro, puro
e simples, de maneira que o leitor possa desenvolver e ampliar sua capacidade
criativa, por meio de suas escolhas intertextuais e paratextuais.

Para tanto, abordaremos alguns pontos essenciais para entender o


processo da leitura nos ambientes educativos.

3.1 A NATUREZA DA LEITURA EM AMBIENTES ESCOLARES


Após essa abordagem sobre o uso dos textos e seu problema de
contextualização, fruto de uma estrutura engessada presente nas estruturas
escolares, vamos abordar um campo ao qual nos referimos anteriormente, a
natureza da leitura em sala: qual é a prioridade?

Não é incomum a concepção cotidiana da leitura sobre a qual o texto


deve emancipar o indivíduo, ignorando todas as suas potencialidades. Isso é
tão frequente, que nós dividimos nossa literatura em “literatura” e “literatura
infantojuvenil”, por exemplo, categorizando-as de acordo com a faixa etária e, ao
mesmo tempo, sutilmente criando hierarquias de valor.

130
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

Mas o que é mais importante? Hábito ou ludicidade? Meta ou prazer? É


muito comum o pensamento de que o que importa é que os alunos leiam o texto,
mesmo porque, como já apresentamos, uma parte significativa só terá acesso aos
livros no ambiente escolar. Mas não podemos esquecer que a criança/adolescente
tem acesso à leitura em vários lugares e, só para citar um exemplo, hoje em dia
temos a internet. De fato, nós adultos, somos mais propensos ao fetiche do livro
impresso, de não admitir qualquer outro formato, mas há toda uma produção
de livros digitais que facilitam esse tipo de leitura, com a leitura sendo realizada
desde e-readers, celulares e computadores. É claro que devemos considerar os
aspectos socioeconômicos de cada um, pois muitos vivem em situação em que
sequer tem acesso a esses recursos, mas é um exemplo de como a acessibilidade à
obra literária é mais ampla do que podemos apontar. Além do que, a ampliação da
leitura, na medida em que abordamos até então, encontra-se presente em vários
lugares, de modo que o aluno sempre lê, mesmo que não tenha essa percepção.

Para completar, não é porque o espaço escolar é, para grande parcela, o


único acesso à leitura, que podemos apresentar textos aleatórios, sempre com
a mesma metodologia. Cada tipo de gênero textual é mais adequado à dada
situação comunicativa, bem como diferentes tipos de atividades. O raciocínio é
simples: se você precisasse desenvolver hábitos de leitura em uma turma, qual
livro utilizaria? A pergunta pode ser extremamente ambígua, uma vez que você
precisa considerar meta, disponibilidade, praticidade, objetividade e saberes a
serem trabalhados. Mas coloque-se no meio do caminho entre aluno e professor,
e faça essa reflexão.

Enquanto se questiona, podemos delimitar não a obra, mas os métodos a


serem utilizados: nosso caminho deve favorecer o ato de pensar e de construir,
ou seja, divagar em meio à leitura, ser protagonista da sua fala e escrita. Esses
exercícios passam a ser a base dos métodos a serem aplicados, já que o aluno é
levado, via escrita, a compartilhar o que escreve, ou seja, dar forma, corporificar.

Podemos exemplificar os apontamentos com alguns textos que nos levem


a pensar sobre isso, como o que fora selecionado a seguir, vamos ler?

O menino maluquinho

Era uma vez um menino bagunceiro.

Ele tinha o olho maior que a barriga, tinha fogo no rabo, tinha vento nos
pés, umas pernas enormes (que davam para abraçar o mundo) e macaquinhos
no sótão (embora nem soubesse o que significava macaquinho no sótão).

Ele era um menino impossível! Ele era muito sabido, ele sabia de tudo,
a única coisa que ele não sabia era como ficar quieto. Seu canto, seu riso, seu
som nunca estavam onde ele estava. Se quebrava um vaso aqui logo já estava
lá. Às vezes cantava lá e logo já estava aqui. Pra uns, era uirapuru, pra outros,
era um saci.

131
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

Na turma em que ele andava, ele era o menorzinho, o mais espertinho,


o mais bonitinho, o mais alegrinho, o mais maluquinho. Era tantas coisas
terminadas em -inho que os colegas não entendiam como é que ele podia ser
um companheirão.
FONTE: ZIRALDO. O menino maluquinho. São Paulo: Melhoramentos, 2012.

Uma leitura superficial do texto o abordaria com base nas classes


gramaticais presentes, como substantivos, artigos, adjetivos, verbos, advérbios
etc. Mas as relações no texto não são apenas sintáticas, mas também semânticas,
presentes em qualquer texto, principalmente o literário que propicia uma rede
de interrelações via signo literário. É por isso que se deve aproveitar o aporte
para abordar questões sobre quem narra, quem são as personagens, o enredo da
história, o local e o tempo.

Observa-se que se trata de um menino, e muitos dizem que ele é


maluquinho devido às suas peraltices. Com base nisso, podemos constatar que,
no texto, o ponto crucial é o vocábulo “menino”, uma vez que todas as demais
categorias narrativas — tempo, espaço, personagem, enredo, narrador — dele
falam, a ele se referem. Se mudássemos a palavra — por exemplo, modificando
seu gênero para “menina” — já seria outro texto, pois falaria de outra pessoa.
Todos os adjetivos a ele atribuído, os “inho”, bem como os advérbios que giram
em torno dos verbos — suas ações —, são informações fornecidas por uma leitura
atenta para caracterizá-lo e apontar suas particularidades e peculiaridades.
Passamos a conhecê-lo, seus hábitos, o que seus amigos acham dele. Poderíamos
mudar a ordem das palavras ou alterá-las sem modificar o sujeito, mas falaríamos
de outra coisa, e de outra maneira.

Veja que, no final do texto, há a referência ao autor, Ziraldo, o que dá um


indício de um reaproveitamento e contextualização da obra. Observe, também,
como o texto apresenta adjetivação — como as palavras “vento nos pés” e
“pernas enormes” que atribuem particularidades à personagem. Observe que o
texto exerce uma função dupla: possibilita um processo de releitura superficial e,
ao mesmo tempo, aprofundada, um espaço de dupla significação. Não se limita
a um uso que favoreça apenas as classes gramaticais, mas, também, a estrutura
interna do texto.

Esse tipo de atividade limita-se a fugir um pouco do velho esquema


texto-gramática, mas é apenas um dos usos mais essenciais para atividades de
interpretação. Há outros que vão mais além e, como já dizia Chico Buarque:

Todo dia Ela faz


Tudo sempre igual Me sacode
Às seis horas da manhã
Me sorri um sorriso pontual
E me beija com a boca de hortelã...

132
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

O ensino de literatura não pode ser limitar a uma prática repetitiva, a


um uso ad eternum do mesmo corpus teórico e ficcional. Procure se lembrar dos
seus anos na educação básica: já passou por um docente que utilizava sempre a
mesma técnica? Ou que era um pouco diferente dos demais, mas essa diferença
era repetida à exaustão?

Assim como a música de Chico Buarque, essa atividade é um problema


a ser superado: imagine a situação do aluno quando o esquema da aula é,
essencialmente, similar ao de outras? Se o ensino de literatura vira rotina, então
não há, de fato, aprendizagem. O aluno entrará em sala, pegará o livro, observará
se estamos estudando o mesmo período literário ou já adentramos em outro; se
for o mesmo, vai sempre estudar os autores pela mesma régua, pelas mesmas
características, sem aprofundar as particularidades.

Além de não ser nem um pouco didático e, também, contraintuitivo, há


um problema maior do que a leitura como obrigação, que é a rotina:

Nas sociedades regidas pelo capital, nenhum saber é aleatório, todas


as atividades visam ao atendimento de uma demanda, e a escola atua,
em sua grande maioria, como espaço de perpetuação de normas e
valores. Não se torna espaço propriamente de prazer e emancipação,
mas de capacitação. Os textos a serem lidos são avaliados por resenhas
ou resumos, utilizados para a realização de testes ou, até, para evitar
destinos piores — na visão dos alunos —, como ler tal livro e fazer um
relatório de x páginas (GERALDI, 2002, p. 12).

Ele não está sequer se referindo às escolas técnicas ou aos cursos


preparatórios, mas ao que é comumente conhecido como Educação básica. A
necessidade de promover capacitação para um contingente, o qual ocupará os
futuros postos de trabalho, gera uma cultura de organização, padronização e
divisão de todos os saberes, divididos em disciplinas. Observe como, dependendo
do momento, o aluno estudará sobre a Idade Média na aula de Literatura, e só
depois na disciplina de História, se formos usar um exemplo imediato.

3.2 PLANEJAMENTO DIDÁTICO-LITERÁRIO


O texto em sala de aula, já recortado nos livros didáticos, é planejado
para não ser instrumento de emancipação. Sua filosofia de produção, por mais
“dinâmica”, “inovadora” e “ousada” que aparente ser, na verdade é o reflexo de
um meio social no qual os indivíduos são capacitados desde cedo para atuar, ou
seja, para assumir cargos, não para atuarem enquanto indivíduos sociais. Passa
a valer mais o que a pessoa possui — cargos, capacitação, cursos — do que ela
de fato é. A escola reflete essa característica por meio de suas avaliações que, à
semelhança do patrão com seus funcionários, são uma espécie de cobrança, cota
a ser atingida.

133
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

FIGURA 6 – MECANIZAÇÃO DO ENSINO DE LITERATURA

FONTE: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/d/d0/Participantes_do_Enem.jpg>.
Acesso em: 3 fev. 2020.

Isso não difere, por exemplo, devido à presença de avaliações objetivas


ou discursivas. Como já apontamos anteriormente, muitas dessas questões
possuem um direcionamento de resposta, o que não é um problema em si, já
que, nessa faixa de idade, há sim uma limitação de respostas a serem atingidas
justamente pela capacidade discursiva dos alunos, e essa limitação os auxilia
a se concentrarem nesse primeiro momento. O problema, como já abordado,
está relacionado ao uso disso como prática por professores que, em sua época,
também não desenvolveram sua capacidade de leitores e, consequentemente,
não conseguem fazê-lo em sala. Logo, o direcionamento de respostas torna-
se uma verdadeira amarra para ambos, professor e aluno. O docente limita-se
a contar as características dos períodos, e o aluno, a responde da maneira que
aprendera no livro didático. Sua contextualização é perdida, já que o texto não lhe
é significativo. Em suma, as atividades tornam-se muito similares a exercícios de
matemática, nos quais “1+1=2”, como em “se Alencar é um escritor romântico, e
o romantismo teve em sua fase nacionalista um aporte indianista, então Alencar
também foi um indianista”.

ATENCAO

Essas práticas aproximam o texto literário mais de uma leitura objetiva,


ignorando todas as suas potencialidades, o projeto do autor, as subjetividades do leitor,
entre outros aspectos importantes como o contexto, a época entre outros. Observa que a
riqueza do texto literário é a sua capacidade de sempre ter algo a dizer em detrimento de
sua subjetividade inerente.

134
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

Essas práticas precisam ser revistas e constantemente atualizadas,


evitando-se assim a prática da leitura em sala como algo silencioso e que caia
na rotina, limitando-se a abrir o livro, executar as questões e corrigi-las. Essas
ações nos afastam de nossa meta, formar leitores. O hábito da leitura afasta-se por
completo de sua realidade.

Há complicações. Sendo o hábito da leitura associado a todas as áreas de


saber, temos alunos que, ao longo da vida, carregam carência na sua capacidade
interpretativa, não apenas na aula de literatura. Conhecimentos como História,
Sociologia e Filosofia, muitas vezes deixados de lado em detrimento de políticas
estatais, quando utilizadas são influenciadas pelos problemas aqui apresentados.
Os índices absurdos de analfabetos funcionais refletem exatamente isso, alunos
que sabem ler, mas não interpretar. O texto torna-se um simulacro totalmente
distante da realidade, de tal forma que, em uma aula de história, o aluno conhece
todos os pontos, personagens e eventos que culminaram na Revolução Francesa,
mas desenvolveu a habilidade de contextualizá-la no seu cotidiano. Sabe que
significou a queda do Antigo Regime, mas não como isso a influência. Os textos
de filosofia passam a ser material “para quem quer pensar na vida”, e sociologia,
“para fazer política”.

A leitura, em sua apreensão, deve transcender a categoria de atividade


monótona, em suma, a rotina na música de Chico Buarque.

Devemos observar que, na nossa função primordial de facilitação do


surgimento de leitores, ir além das estruturas escolares, propiciando um fazer
primoroso que transcenda às práticas habituais. O prazer atingido não pode ser
meramente contabilizado ou detalhado em uma planilha de metas, mas gera um
capital simbólico incalculável.

3.3 O GOSTO PELA LEITURA


O gosto de tudo

Erasmo Carlos

Eu bebo em sua boca


O gosto de tudo
Eu mato em seu corpo
A sede que eu tenho
Nesse beijo eu tomo
De todos os vinhos
Mistura perfeita
Dos nossos carinhos
O ar que eu respiro
No céu se mistura

135
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

Da boca ofegante
Que a minha procura
Eu bebo nas fontes
De tantas delícias
Me perco em seus montes
Jardins e carícias
Quando eu provo do seu beijo
Eu me perco no sabor
Da pureza dessas fontes
Da beleza desse amor
Nesse campo farto e fértil
Eu desfruto do melhor
Tudo é puro na beleza desse amor
Na árvore plena
Nosso amor conhece
O gosto da fruta
Que a vida oferece
Nós somos a festa
E a dose atrevida
Brindemos agora
O amor e a vida
Quando eu provo do seu beijo
Me confundo no sabor
Da pureza dessas fontes
Da beleza desse amor
Nesse campo farto e fértil
Eu desfruto do melhor
Da pureza dessas fontes
Na beleza desse amor
Quando eu provo do seu beijo
Eu me perco no sabor
Da pureza dessas fontes
Na beleza desse amor
Nesse campo farto e fértil
Eu desfruto do melhor
Na pureza dessas fontes
Na beleza desse amor
Quando eu provo do seu beijo
Me confundo no sabor
Da pureza dessas fontes
Na beleza desse amor
Nesse campo farto e fértil
Eu desfruto do melhor
Tudo é puro na beleza
Na beleza desse amor

136
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

Uma vez que falamos tanto em desenvolver o gosto pela leitura, elemento
base para a formação de um leitor, resolvermos utilizar, ao pé da letra, essa
associação entre “gosto” e “gosto”, com a música O gosto de tudo, de Erasmo
Carlos e Roberto Carlos. Figurativamente, abordamos como se bebe na boca “o
sabor de tudo”. Cabe aqui uma olhada no sentido da palavra, “gostar”:

Sentido pelo qual se percebe o sabor das coisas, paladar; sabor; prazer,
agrado; simpatia, inclinação, pendor; critério, opinião; maneira, moda;
faculdade de julgar os valores estéticos segundo critérios subjetivos,
sem levar em conta normas preestabelecidas; bom gosto (FERREIRA,
2014, p.315).

Etimologicamente, gostar é a capacidade de julgar as propriedades de algo,


valorizando-as, seja de maneira objetiva, seja subjetiva. Em suma, avaliar, apreciar
— como já apontamos, dar critério, opinar. Claro que o ato de gostar de algo está
intimamente relacionado à sua relação sociocultural e histórica, do momento em
que fora produzido e suas formas de produção e perpetuação. É nesse ponto
que nos aproximamos de outro sentido de gostar, “agradar”, promove o deleite
— estético ou não —, e é nesse ponto que se aproxima o sentido da leitura que
buscamos atingir, o de levar a sensação de deleite ao leitor. Mas esse prazer não é
algo que simplesmente brota, mas associa-se ao nosso meio, das experiências de
vida, muitas das quais estamos limitados e não podemos promover uma ruptura
sem grande dificuldade.

Em outras palavras, o prazer, associado ao fazer, relaciona-se com o nosso


dia a dia. Se o aluno gosta de Rock, você já parou para refletir que são essas as
leituras que lhe dão satisfação, que Pitty e Skank lhe são mais prazerosos do que
O Pequeno Príncipe ou Emília no País da Gramática? São essas leituras que lhe dão o
devido “sabor”, e não outras.

Você deve ter percebido como o “gostar” é algo extremamente subjetivo,


não é baseado em parâmetros. Nem todos tem o mesmo gosto, apreciam as
mesmas coisas. Como diz o ditado, “o que seria do azul, se todos preferissem o
vermelho?”

Essas características esbarram nas práticas escolares. A primeira dela


envolve as “disciplinas favoritas”, de maneira que, muitas vezes, literatura não é a
elencada. Os alunos podem gostar de ler, mas não de estudar literatura, lembram?
Como já apontara Ruth Rocha, pode-se associar o hábito da leitura ao de escovar
dentes: fazemos a saúde bucal de maneira mecânica, sem uma reflexão acerca
de nossas ações. Somos habituados desde cedo a fazê-lo, sob risco de punição
pela falta de asseio. Muitos tem preguiça, ou não gostam de escovar os dentes
(2001), motivo que soa extremamente ambígua a expressão “desenvolver hábitos
de leitura”, como se estivéssemos desenvolvendo um sentimento de obrigação
nas pessoas, e não um prazer.

137
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

Mas é essa a raiz de nossos problemas, da nossa prática didática cotidiana.


Faça um exercício muito simples de memória: durante uma atividade de leitura,
qual a porcentagem de alunos que alegam “que não querem ler” ou dão qualquer
outra desculpa, em relação aos que reclamam por não terem sido escolhidos?

Se você pode afirmar que não se encontra numas situações dessas,


parabéns! Mas lembre-se, isso não pode se contrapor ao número de vezes em
que a leitura não fora realizada com os alunos ou, quando feita, foi de maneira
silenciosa, mecânica, visando responder às questões do livro. Se isso ocorre, a
leitura “não tem sabor de mel”, está mais para uma sopa amarga e duramente
degustada. Assim resgatamos uma pergunta feita sobre o leitor: ele se forma, ou
nós o formamos?

Relevante é o testemunho do professor Ezequiel Theodoro da Silva (1986,


p. 22) sobre o seu “hábito” de leitura:

Lembro-me de corpo inteiro fisgado pelos “ásperos tempos”, pela


“agonia da noite”, pela “luz do túnel”, vivendo, apaixonadamente, os
subterrâneos da liberdade e sendo paulatinamente introduzido, por
minha própria vontade, na arte da palavra. E como a palavra, com
Jorge Amado comecei a cultivar o gosto pela leitura de ficção.

Hábito, gosto, gosto, hábito... estamos falando de comida, ou de leitura?


Diga você, a que sabor ele se refere? Viu como a associação entre saber e sabor
está muito associada pela ideia de prazer inerente à ambas?

Mas entre hábito e gosto, propomos o acréscimo dessa palavra que


circundou nossas observações: o prazer da/pela leitura.

Observe como, nas palavras do professor Ezequiel Theodoro da Silva


(ANO), sua prática de leitura associa-se a se apaixonar perdidamente, como uma
experiência sem par. A ambiguidade presente no texto é proposital, pois associa
uma ação a um sentimento, uma emoção, um estado de espírito. Em suma, alguém
que é tomado de um imenso prazer pelo que está realizando, ler.

Gosto e prazer. É de Barthes (1987a, p. 20) a expressão “as palavras têm


sabor”, e ele aponta como, curiosamente, ambas têm a mesma etimologia, em
latim. Vamos observar isso no dicionário:

Saber  do latim sapere: “ter gosto, exalar odor, ter inteligência,


compreender” (FERREIRA, 2014, p. 1715).
Sabor  do latim sapore: “gosto, sabor característico, ação de provar”
(FERREIRA, 2014, p. 1719).

A relação entre o saber e o gostar é intrínseca, atrelada. O professor Ezequiel


Theodoro da Silva (2012) utiliza expressões como se tivesse sido capturado,
“fisgado” pelo prazer de ler. Não se trata de alguém que tem apenas gosto pela

138
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

atividade, mas almeja o máximo da experiência propiciada pela leitura, o prazer,


visto que semanticamente podemos gostar de muita coisa, até mesmo de quem
desgostamos! Como aponta Barthes, em O Prazer do Texto (1990),

Texto de prazer: aquele que contenta, enche, dá euforia; aquele


que vem da cultura, não rompe com ela, está ligado a uma prática
confortável da leitura. Texto de fruição: aquele que coloca em situação
de perda, aquele que desconforta, faz vacilar as bases históricas,
culturais, psicológicas do leitor, a consistência dos seus gostos, dos
seus valores e das suas recordações, faz entrar em crise a sua relação
com a linguagem (BARTHES, 1990, p. 48).

Prazer do texto. Clássicos. Cultura. Inteligência. Ironia, Delicadeza,


Euforia. Domínio. Segurança: arte de viver. O prazer do texto pode
ser definido por uma prática: lugar e tempo de leitura: casa, província,
refeição imediata... [...] O prazer pode ser dito: é daí que vem a crítica.
Texto de fruição: O prazer aos bocados. A língua aos bocados. A cultura
aos bocados. [...] O texto de fruição é absolutamente intransitivo
(BARTHES, 1990, p. 96).

Atenção a escola de palavra, associando o ato de ler algo à atividade de fruir.


Quando o texto é prazeroso, atingimos mais intensamente suas particularidades,
os sentidos subliminares, e isso ocorre até mesmo diante de um texto fora do
âmbito do literário. Quantas vezes você leu um livro técnico, mas percebeu a
influência das leituras daquele escritor? E no caso literário? Consegue detectar
uma influência de Olavo Bilac nos poemas de João Cabral de Melo Neto?

Abordamos essas premissas tanto nesta disciplina, quanto nas anteriores.


É o princípio da intertextualidade, de que os escritores são, antes de tudo,
leitores. Os desenlaces intertextuais dos textos conectam-se com todo um mundo
de estrutura verbal e não verbal, de modo a construir uma série de sentidos no
universo ficcional.

Esse laço de se lançar à leitura é um espaço privado — que é tanto a


escola, os espaços de favorecimento da prática, quanto o mundo imaginativo do
indivíduo — que permite o livre exercício do faz de conta — ficção vem de fingere,
fingimento —, no qual dá-se início a um processo de descoberta, a ponto de que
o ato de ler venha a incomodar o leitor, mas de uma maneira positiva, pois traz à
tona as perguntas que permitem questiona a sociedade. Isso é feito pelos temas,
enredos, estruturas, escolhas linguísticas, tipos de abordagem ou, simplesmente,
pela ideia apresentada.

Cria-se assim um espaço de “angústia saudável”, onde o texto literário


mostra justamente a sua utilidade: ele não possui. A literatura não tem uma
“função”, um valor utilitarista, é mais um espaço de descoberta, estar no mundo.
Um deleite. Diz mais pelo que não diz, espaço de questionamento, do “não”
que se manifesta infinitamente a cada leitura, e continua se ampliando. Eis os
motivos de que uma leitura nunca é a mesma: o universo sociocultural do leitor já
fora ampliado após a primeira leitura, motivo pelo qual uma nova lhe permitirá
perceber sempre novas nuances.

139
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

Abordamos aqui os elementos essenciais a serem seguidos e colocados


em prática para o bom aproveitamento dessa prática tão abordada: hábito, gosto,
prazer, fruição. Podem estar presentes em cada etapa da vida, mas é essencial que
sejam aplicados no ambiente escolar.

Há sempre a tentativa de se implementar o hábito, com resultado mediano


devido a sua mecanicidade. Já os outros elementos muitas vezes distanciam-
se da realidade escolar. Fica claro que no cotidiano da maioria dos ambientes
educacionais há escassez de recursos para grandes planejamentos, mas sabemos
que a construção de uma prática significativa no âmbito da leitura demanda
tempo, parceiro e inimigo dos docentes. Inimigo por fazer com que professor
limite-se a um cronograma que o obriga a resumir saberes a exemplos dinâmicos;
parceiro, pois é através dele, na prática diária, após tentativa e erro, que o mesmo,
pacientemente, dá aplicabilidade a uma série de projetos que, se persistirem,
darão seus devidos frutos, como o desenvolvimento do gosto, do prazer e da
fruição relacionados ao ato de ler. Essa que pode ou não iniciar com os docentes,
pela nossa própria situação de “ter prazer em ler”. Como oferecer ao outro aquilo
que você não tem? O ato de ler, digerindo a ideia de Barthes de saber e sabor, é
exalar prazer, é conversar sobre autores e obras como se fosse de uma viagem,
e de certa forma o é, de maneira que possamos contaminar nossos alunos com
essa variedade de experiências literárias que experimentamos todos os dias. Faz
necessário buscar mecanismos de despertar esse saber exalando no ar a literatura
para que o aluno sinta seu gosto e seja literalmente contaminado por esse saber
em todas as suas nuances, ao ato da fruição, ao prazer estético.

Uma vez que você teve contato com o conceito de mediação de leitura,
apresente, em poucas linhas (entre 10 e 20), um exemplo de projeto de mediação
a ser realizado em sala de aula. Dica: utilize o arcabouço sobre estratégias e tipos
de leitores apresentados até aqui.

4 A MEDIAÇÃO DA LEITURA EM ESPAÇOS NÃO ESCOLARES


Para adentrar nesse campo, faz-se necessário responder a uma pergunta
importante: por que o indivíduo produz literatura, o que o leva a escrever?
É importante que você entenda que o ato da escrita é social, e conhecê-la
profundamente envolve tanto conhecer seu contexto histórico, quanto as coisas
não ditas em determinada época. É por isso que muito do que não é considerado
como literatura — sinônimo de ficção — o é devido ao sistema cultural em que
está inserido. E, por isso mesmo, todo indivíduo o faz sobre influência desse
meio, seja por meio de um pensamento idealizado ou crítico, busca representar
seu respectivo cotidiano, transmitindo saberes, conhecimentos e modos de se
compreender o mundo.

140
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

Neste subtópico abordaremos o texto literário sem nos limitarmos ao


campo da interpretação. Vamos além: nós o contextualizaremos, também, no
campo dos estudos linguísticos. Mas não se preocupe, neste capítulo buscamos
delimitar as características fundamentais do texto literário, bem como seu campo
de estudos.

É provável que você entenda a literatura como “entretenimento”. E ela


é isso e muito mais, antes de tudo, um uso particular da língua, ou seja, uma
forma de linguagem. E se é linguagem, atende a um princípio comunicativo, já
que transmite os saberes e a cultura de dado grupo/país/cultura.

Tente lembrar, por exemplo, do período do Romantismo, do qual


herdamos muitas obras famosas: os livros publicados nessa época tinham a meta
de divulgar o modo de ser da nova elite, a burguesia, a qual ascendeu como
consequência da revolução francesa. É por isso que na historiografia literária
brasileira cada movimento literário está associado a uma época, como o arcadismo
com a inconfidência mineira, ou o romantismo com a independência brasileira.

A literatura vem associada ao seu contexto histórico. Por isso, seu texto
consegue angariar uma amplitude de significados intricados.

NOTA

Arte, expressão cultural e manifestação de uma forma de pensar. Esses


são os três elementos que determinam pontos fundamentais do texto literário. Pensar
sobre a literatura é pensar sobre suas condições de produção e propagação, bem como
determinados textos se perpetuam para além do seu tempo e tornam-se representativos
de toda uma cultura.

A literatura também está associada a um tipo específico de cultura,


representada por um uso particularizado da língua. No livro Memórias póstumas de
Brás Cubas, de Machado de Assis, temos a representação da vida da burguesia carioca
do século XIX, e tal obra segue os parâmetros da norma-padrão, à época. Mas nós
conhecemos uma parcela dessa sociedade via imitação, cópia que o texto literário faz
da realidade. Por isso é uma forma de arte e, também, recriação da realidade via uso
da língua. Mimese, imitação, representação por meio do texto escrito.

Talvez você nunca tenha visitado o nordeste brasileiro, mas é provável que
consiga imaginar a capital baiana, Salvador, devido às ricas descrições presentes na
obra de Jorge Amado. Ou o Sul do país, pelas obras de Veríssimo, e até o interior
goiano por meio das obras de Bernardo Élis. O texto literário completa e complementa
uma visão de mundo, transmitindo percepções, divergentes e, como já citado em
unidades anteriores, ideologias, maneiras de se ver e se estar no mundo.
141
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

FIGURA 7 – A ALTA E A BAIXA, CENÁRIOS DA LITERATURA DE JORGE AMADO

FONTE: <https://www.flickr.com/photos/leandrociuffo/4449735057>. Acesso em: 3 fev. 2020.

Tudo é língua, tudo é linguagem, mas tudo é literatura? Sim, mas não
necessariamente uma forma estrutural de arte. Aliás, há diferenças entre literatura
e manifestação artística: uma é forma de arte, outra, a produção em determinado
contexto, ou seja, sistema.

Não se pode compreender o texto literário — qualquer que seja seu


movimento, estética e período — desassociado do período em que surgiu
(CADEMARTORI, 2002). Isso ocorre porque toda literatura é feita de acordo com
o seu contexto, é produzida em relação a ele. José de Alencar e Lima Barreto
abordam a mesmíssima sociedade carioca em seus livros. Mas o olhar é outro,
sob influência de novas épocas, perspectivas e contextos históricos e sociais. Há
motivos para não termos, por exemplo, um novo Gregório de Matos? Ou outro
Castro Alves? Ou, quem sabe, um recém-nascido Jorge Amado?

Isso ocorre porque esses escritores produziram em momentos específicos


— o Brasil colônia, à época das lutas abolicionistas brasileiras e durante a metade
do século XX nos conflitos da ditadura Vargas —, e deles suas obras não se
desassociam.

Você, ao longo de todo o seu período estudantil, aprendeu que toda


literatura está associada a uma escola literária, mas isso não é algo 100%
verdadeiro. Essa noção de que a literatura pode estar desassociada de um período
vem de Antonio Candido — pesquisador da literatura brasileira —, sobre como
determinadas produções se manifestam no Brasil — principalmente quanto este
não era “Brasil”, já que uma literatura considerada “brasileira”, fruto de um país
independente, só pode ser apontada, pelo menos, a partir de 1822 — mas que não
tem uma relação direta com uma elite que “pensava o Brasil”, mas respirava ares
europeus.

142
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

DICAS

Que tal aprofundarmos nossa compreensão acerca da relação entre língua e


ideologia? Leia o texto do professor José Luiz Fiorin — um profícuo pesquisador da área de
estudos discursivos —, Língua, discurso e política, disponível em: http://www.scielo.br/pdf/
alea/v11n1/v11n1a12.pdf.

No livro Formação da Literatura Brasileira (2000), Antonio Candido aborda


exatamente essa questão, sobre a existência de manifestações literárias no Brasil
que remetem, grosso modo, ao período conhecido como Quinhentismo.

Nossa comparação não é gratuita, pois há certa contenda literária sobre


o surgimento da literatura brasileira. Foi no Modernismo? Ou no Romantismo?
Muitos pesquisadores apontam sua origem no Romantismo, mas, para além
disso, o pesquisador Afrânio Peixoto defende que o texto literário nacional
surge com a Carta de Pero Vaz de Caminha(1993), pois não é apenas texto feito
no Brasil, falando sobre o Brasil, é, também, influenciado pelo Brasil. É nele que
pensava Caminha, bem como uma tradição de escritores — muitos deles, jesuítas
— que, além de cartas, tratados, mapas e demais registros, produziram relatos
em prosa, peças didático-religiosas com o objetivo de catequização, poemas sobre
a aventura da descoberta portuguesa, e o fazem sob a influência do nosso país,
pensando sobre ele. Não compõem uma literatura no sentido lato, mas, sim,
manifestações literárias.

Cabe pensar sobre esse ponto. O texto literário, na acepção que conhecemos,
também tem um caráter tanto social quanto histórico: ele é produzido em
determinada época, e vai acumulando essas características ao longo dos séculos.
Há uma tradição na prosa brasileira que remete à literatura de viagem, e assume
a maturidade com machado de Assis. Muitos dos românticos eram, também,
árcades, e a experiência na temática neoclássica se fez presente em sua obra. O
signo literário na poesia de Castro Alves vem carregado de marcas do lirismo
nacional que germinou com Gregório de Matos.

Esse signo linguístico literário vai se adaptando e reinventando a cada


período, desenvolvendo suas capacidades e se ressignificando a cada momento,
de maneira que o leitor, quando se lança ao puro ato de deleite, pode usufruir
de toda uma tradição que se formou em torno desse signo trapaceiro, limitado
apenas pelo seu conhecimento de mundo.

Falamos aqui sobre como ocorre o fenômeno literário, mas não porque ele
ocorre. Parece estranho imaginar que alguém produz textos literários “do nada”,
sem uma motivação específica. Existiria uma intenção literária? Vamos delimitar
o que viria a ser isso, em alguns pontos:

143
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

4.1 LINGUAGEM E TRAPAÇA


Nada é por acaso. Ela não se limita a ser um instrumento de propagação
de valores, pois é mais do que isso, é uma espécie de ferramenta para propagar
saberes. Basta lembrar que, durante muito tempo — e até os dias de hoje —,
muitas pessoas aprendiam sobre a cultura do seu povo via texto literário. Você
provavelmente aprendeu mais sobre a vida do subúrbio carioca lendo Triste Fim
de Policarpo Quaresma, de Lima Barreto, do que se debruçando sobre um livro de
sociologia!

Esse é o valor do texto literário, pelo fato de que a variedade linguística


ali presente é “trapaceira”: transmite os valores da elite, mas, também, os que são
considerados prejudiciais (CANDIDO, 2000). Através dele conhecemos a história
do rico e do pobre, do rei e do plebeu. É por meio da obra de Monteiro Lobato que
conhecemos uma personagem tão famosa como Jeca Tatu, ou a vida sofrida das
pessoas comuns por meio de escritores como Jorge Amado.

Outro escritor/filósofo/crítico que se propôs a pensar o “fazer literário” foi


Jean-Paul Sartre. Para ele, escrever ficção é agir, ou seja, arte engajada. E aponta
para o texto literário não como criador de imagens/representações, mas espaço de
denúncia. É através do texto literário que o escritor é, também, professor: ensina,
por meio de suas críticas veladas, o leitor a pensar, a reagir.

E
IMPORTANT

Sobre a intenção do autor, leia o artigo de Carlos Ceia para o site E-dicionário
de termos literários, no qual buscou trazer à tona todas as vertentes da crítica a respeito
do termo, através do verbete “intenção”. Disponível em: http://edtl.fcsh.unl.pt/encyclopedia/
intencao/.

Procure-se se lembrar da premissa “todo texto tem seu leitor”. Ele


presume, ou melhor, cria um leitor. Quanto o autor redige sua obra, concebe um
leitor específico, que não é uma pessoa física, mas uma entidade. Os livros de
Agatha Christie, por exemplo, eram feitos concebendo um leitor que estivesse
pronto para embarcar em um mistério, folheando pacientemente as páginas
enquanto o desbravava.

Não é por acaso que, no século XIX, surge o romance de folhetim: com
o crescimento das cidades, aumenta o número de jornais em circulação e,
consequentemente, o número de leitores. Além de notícias, precisam de algo para
passar o tempo, se distraírem. Mas o que antes tinha mero caráter de passatempo,
é apropriado pelos escritores como espaço de denúncia.

144
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

Mas nem tudo pode ser dito, motivo pelo qual a literatura é o espaço
do não dito. Há tabus e outros temas que incomodam a sociedade, mas eles
atingem certa permissividade quando transferidos para a literatura. Quem lê, por
exemplo, Utopia Selvagem de Darci Ribeiro, tende a viajar entre a ficção e a crítica
à Ditadura magnamente oculta entre os capítulos desta obra. A censura colaborou
com a literatura brasileira. Algumas obras trazem essa crítica intrincada ao texto
metaforicamente contextualizada. Somente leitores mais assíduos conseguem
detectar essa trama no texto.

Não era bem visto falar da hipocrisia da burguesia — como era chamada
a elite pós-revolução francesa —, a qual falava abertamente sobre “amor
verdadeiro”, “moral” e “costumes”, mas vivia de outra maneira. Mas isso se
torna perfeitamente aceitável quando é representado literariamente em Memórias
Póstuma de Brás Cubas, que mostra a vida de um filho da alta burguesia. Ou como
questões como a homossexualidade são abordadas de maneira bem sutil em obras
como O Ateneu, de Raul Pompeia, e Bom crioulo, de Adolfo Caminha.

ATENCAO

A noção de que o signo literário é trapaceiro vem dos estudos de Rolland


Barthes (1987a), para o qual a palavra literária signo linguístico por excelência subverte as
normas existentes e supera o autoritarismo da língua que não apenas dita os termos da
comunicação, mas possui o imperativo de ser dita.

4.2 A FUNÇÃO DO ESCRITOR


É por isso que, para Sartre, o escritor é aquele que não se cala, não se
abstém, opta por manifestar-se diante da visão reduzida que a própria sociedade
tem — ou prefere ter — sobre muitos assuntos. O escritor fala da elite para a elite,
mas, muitas vezes, mostra um lado que todos querem ignorar. Os tabus sociais, as
guerras, a hipocrisia e outras chagas passam a ser transmitida via texto literário,
que utiliza o código literário para, por meio de um pacto silencioso, aborda o
não dito, Darci Ribeiro era mestre nisso. São muito convenientes as explanações
presentes O Livro de Cesário Verde, como o apontamento que os mais bem vistos na
sociedade escondiam seus bastardos.

Sartre salienta a relação conhecida como “pacto ficcional”, acordo tácito


estabelecido entre escritor e leitor. Este aceita que tudo é brincadeira, é jogo
ficcional; aquele, que só porque está contando uma história de faz-de-conta, não
significa que não esteja abordando verdades. E, de maneira sutil, o leitor percebe
isso, e compactua. Nessa acepção, outro escritor famoso, Victor Hugo, recebia
a alcunha de le monde-homme, uma vez que se propôs a produzir uma obra que

145
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

representasse todos os aspectos da França de Napoleão III, abrangesse os aspectos


sociais, históricos, filosóficos... a pobreza, a riqueza, a cultura, enfim, a literatura
enquanto espelho do mundo.

Temos abordado nesta unidade justamente a questão do hábito, do gosto,


do prazer e da fruição da leitura. Na medida em que “fazemos nascer” um leitor
competente, ele aplica as possibilidades da leitura literária, principalmente pela
sua competência para conhecimento do mundo. A literatura é algo muito mais
que ficção. É realidade, ficção, critica, devaneio, uma amalgama de elementos que
a tornam arte, por isso deve ser um saber saborizado.

Mesma premissa fora abordada por José de Alencar no livro Como e por que
sou Romancista. O escritor explica o motivo de escrever romances sobre os mais
diferentes temas e regiões do Brasil, bem como sua intenção de criar uma literatura
que representasse todos os aspectos da sociedade brasileira recém-independente.
O Brasil, à época, era formado por uma população majoritariamente analfabeta
e, não obstante, concentrada em ilhas sociais: Rio, São Paulo, Salvador, ele não
conhecia seu mundo, aquilo que viria a ser chamado como Brasil. Muito da elite
intelectual carioca, que por sua vez não se debruçava em tratados de história
ou geografia, viera a conhecer — embora com críticas — sua terra através do
texto literário. Igual exemplo está na obra A casa das sete mulheres, de Letícia
Wierzchowski Gomes, um exercício ficcional sobre a guerra de farrapos.

AUTOATIVIDADE

Exercícios ficcionais específicos obrigam o escritor a adotar posturas


específicas: pesquisa de campo, seminário, reunião de causos... o caminho é
vasto. Suponha que você é um escritor: que práticas adotaria para compor sua
obra, tendo em mente seu público leitor?

Escrever, antes de qualquer coisa, é agir. É produzir. É se posicionar. O


escritor assume determinado posicionamento pelas escolhas linguísticas que faz,
pela forma que conta histórias e representa a sociedade. E é por isso que a leitura
literária é prática social, é agir didático e, principalmente, é compreender um mundo.

4.3 A PROEMINÊNCIA DO SIGNO LITERÁRIO


Essa linguagem literária, capaz de germinar a criatividade, nutre-se da
linguagem formal, cotidiana, coloquial. Assim, o que a difere de outras formas
de linguagem? Para entendermos, precisamos, antes, responder a uma questão:
o que é, de fato, literatura? À medida que o tempo passa, velhas respostas não
atendem mais às antigas perguntas, necessitando de ser ressignificadas.

146
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

Dizer o que é literatura pode nos levar a um problema sério: para os


gregos da época de Alexandre, o grande, a Ilíada (2009) era fato ou ficção? Se
você respondeu à segunda opção, reveja seus conceitos: ao longo dos tempos,
textos famosos foram destituídos de seu caráter de autoridade, virando apenas
experiência literária. E à medida que as áreas do saber se expandem — surgindo
novas, de modo que a psicologia e a sociologia se desvencilham da filosofia, por
exemplo — as mesmas perguntas agora atendem a um arcabouço cada vez mais
amplo.

Para a área de administração, literatura é produção técnica; para a


sociologia, material de pesquisa; para a área de letras, material de estudo e/
ou literário. Essa vaguidão não é proposital: durante muito tempo, antes da
delimitação do efeito poético inerente a esse tipo de produção, significava muita
coisa, e qualquer coisa era literatura.

Antoine Compagnon, em O Demônio da Teoria (1999), disserta sobre a não


obviedade do termo, ao longo dos tempos. Já foi utilizado para designar qualquer
registro escrito e, mais adiante, e por extensão, cultura oral. Nos dias de hoje, é
tudo o que está impresso, encadernado, catalogado.

Estamos na época em que vários termos estão em desuso, ou vulgarizados:


“clássico”, “romântico”, “grotesco”, “fantástico”... à medida que o texto literário
é apropriado pelas classes mais populares — vira obra memorialista —, mais
termos que no passado indicavam um grupo bem restrito foram perdendo parte
do seu conceito original, com o “clássico”.

A noção de clássico é tudo, menos aquilo a que atribuímos nos dias de


hoje. Isso porque a palavra, contemporaneamente, é utilizada no sentido de algo
“transcendental”, “deslumbrante”, e não como uma obra basilar, a ser usada de
maneira modular por todos.

DICAS

Ítalo Calvino, um dos mais importantes escritores italianos do século XX


disserta sobre a importância de se ler os textos conhecidos como “clássicos”. O autor faz
parte de uma tradição de intelectuais que além da produção ficcional se embrenharam
pela produção crítica baseada no fazer ficcional. Seu livro, Por que ler os clássicos, possui
um capítulo intitulado Guia à "chartreuse" para uso dos novos leitores, abordando a
proeminência dos textos clássicos para incentivo à leitura em sala de aula. Disponível em:
https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4411070/mod_resource/content/1/Por%20que%20
ler%20os%20Cl%C3%A1ssicos%3F%20.pdf.

147
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

Antes de Compagnon (1999), isso já era apontado por Aristóteles na


sua Poética, quando este comentava sobre como as grandes tragédias eram,
essencialmente, intertextuais. Basta observar como a tragédia Jasão e os Argonautas,
por exemplo, apresenta uma estrutura que será imitada posteriormente por
Homero, quando ele compor A Ilíada (2009) e A Odisseia (2002). E ainda mais a
frente — pouquíssimo tempo, só alguns milênios — será a influência para uma
peça de Chico Buarque e Paulo Pontes, A Gota D’água (2002), inspirada no mito
de Medeia, esposa de Jasão.

Poderíamos apresentar muito desse caráter do clássico, de apresentar formas


prototípicas, mas pode ser mais útil abordarmos esse conceito por outro viés: o
da modernidade. Intitulavam-se os intérpretes da realidade — e, por definição, a
mimese é um princípio fundador da literatura — e detentores de um novo valor.

Esse é, essencialmente, o sentido de uma obra clássica. Obra que servirá


de modelo por abordar, de maneira universal, determinadas características das
obras literárias. É por esse motivo que, para muitos, o primeiro dos clássicos foi
Édipo Rei (Sófocles, 1989), pela forma como apresenta a questão mais essencial do
indivíduo: quem sou eu?

Nossos românticos também se consideravam modernos. E com razão.


Muitos dos conceitos sobre a literatura foram atualizados durante e após o
movimento conhecido como “Romantismo”. A palavra em si passou a ter o
sentido de exagero. Desde o Oitocentos não conseguimos compreender o que é
literatura sem associá-la ao texto em prosa. A poesia nos parecia cada vez mais
afastada, novamente associada à música.

Isso, inclusive, trouxe novo sentido para o que seria um clássico, e um


moderno. Clássico, contemporaneamente e popularmente, não é a obra que serve
de modelo e a ser imitada, é o texto que melhor representa um sentimento de
nacionalidade. E, embora hoje não estejamos mais nesse período literário, é um
valor quase ufanista. Afinal, até hoje muita gente é acusada de produzir literatura
que não é “legítima” — vide o caso, por exemplo, de alguns escritores africanos,
cobrados constantemente pelas editoras internacionais a produzem uma literatura
“legitimamente africana”.

O conceito de grande literatura deixa de ser a que segue uma grande


forma, um grande modelo: passa a ser a que produz grandes escritores. João
Cabral de Melo Neto é mais conhecido pelo povo por escrever belos versos na
língua de Camões, do que por desenvolver sua poesia seguindo uma estética
clássica, neoparnasiana.

Ser moderno, nessa modificação do conceito literário, não é mais renovar


a estética, mas a temática. Os escritores realistas e naturalistas buscavam uma
renovação na temática literária. Aluízio de Azevedo apresentava o homem fora
da idealização romântica, mas utilizava as mesmas estruturas que consagraram o
romantismo: texto em prosa, privilegiando o romance.

148
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

4.4 A LITERARIEDADE
Antoine Compagnon (2007) aponta aquela que é a característica essencial
da literatura, o que a difere de qualquer outro texto: sua literariedade. E esta
associa-se à sua intertextualidade.

Um texto é um todo de sentido que possui literariedade, ou seja, a relação


íntima que um texto possui com outro. Já citamos anteriormente a música de
Chico Buarque, Atrás da Porta, e a resgatamos para trazer uma referência à outra
produção textual que lhe é muito semelhante:

Atrás da Porta

Quando olhaste
bem nos olhos meus
E o teu olhar era de adeus
Juro que não acreditei
Eu te estranhei
Me debrucei
Sobre teu corpo e duvidei
E me arrastei e te arranhei
E me agarrei nos teus cabelos
Nos teus pelos
Teu pijama
Nos teus pés
Ao pé da cama
Sem carinho, sem coberta
No tapete atrás da porta
Reclamei baixinho

Dei pra maldizer o nosso lar


Pra sujar teu nome, te humilhar
E me vingar a qualquer preço
Te adorando pelo avesso
Pra mostrar que inda sou tua
Só pra provar que inda sou tua

Parece-lhe familiar? Tente lembrar-se da graduação ou, pelo menos, do


Ensino Médio: a estrutura do texto deve lhe trazer reminiscências, é a mesma de
uma Cantiga, composição poética realizada durante o período conhecido como
“Trovadorismo”. A música Atrás da Porta apresenta muitas características em
comum com esse gênero, em especial, um subgênero de cantigas conhecido como
“Cantiga de Amigo”, no qual há a presença de um interlocutor feminino que
lamenta a partida do amado.

149
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

FIGURA 8 – ATÉ A ÉPOCA DOS TROVADORES, A POESIA NÃO ERA DESASSOCIADA DA MÚSICA

FONTE: <https://1.bp.blogspot.com/_sE_DF4rORf0/S-lMTc_81vI/AAAAAAAAAOg/6InnjxK4_Us/
s1600/trovadores.png>. Acesso em: 3 fev. 2020.

A música resgata vários elementos da lírica medieval ibérica, herdada


por nós via cultura portuguesa. Há fortes elementos na música que remetem às
Cantigas de Amigo, principalmente na relação de um trovador masculino que
emula os anseios de um eu — lírico feminino, a separação entre os amantes, ou a
escolha vocabular que valoriza a sonoridade do poema.

É esse, para Compagnon (2007), o elemento que conceitua a literatura: o


fato de que toda obra literária remete a outra obra, a relação que, ao referenciar,
permite que uma obra literária construa outra.

ATENCAO

Essa premissa é levantada por críticos e escritores, como Fernando Pessoa,


Carlos Reis, Julia Kristeva, Gérard Genette e tantos outros que apontam para o princípio
fundamental da literatura, a literariedade, ser indissociável da intertextualidade.

Porém, a literariedade, em tese, seria uma característica inerente a um


campo mais amplo do que o texto literário: está no campo da linguagem. Toda
língua remete a outra, todo enunciado aponta para outro. O que os diferencia é que
o texto literário se manifesta em uma rede mais sofi sticada, de modo que muitos
textos não permitem a percepção explícita entre este, e sua origem. Dessa maneira,
o texto é intrinsecamente intertextual, mas não necessariamente perceptível.

150
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

O motivo é um só: depende única e exclusivamente de um escritor


sofisticado, e um leitor competente. Porém, mesmo colocada em questão a
competência do escritor, há a questão dessa competência, do leitor habilitado
em desenvolver essas correlações linguístico-interpretativas. E muitos, por mais
que se lancem ao ato prazeroso da leitura, não desenvolvem essas habilidades,
“degustando” parcialmente essa prática.

4.5 A PLURISSIGNIFICAÇÃO LITERÁRIA


Fala-se muito em relação de conotação e denotação, de senso figurado, e
literal. São elementos essenciais do texto literário, e estão presentes não apenas
na representação de eventos, mas nos recursos utilizados para se representar tal
realidade. Nas questões aqui apresentadas, deve se considerar que é por meio
dessa linguagem que o leitor tem contato com o texto e o faz ser significativo na
comunidade que frequenta.

Para seu melhor aproveitamento, cabe ao leitor identificar esses elementos


lexicais que atuam para a construção de sentido, numa relação entre receptor,
emissor e o próprio interacionismo verbal. Para tanto, precisa compreender e
traduzir elementos linguísticos —sintéticos, morfológicos e estilísticos — em prol
de uma ampla interpretação semântica.

Necessitamos, por isso, ampliar o conceito de conotação e denotação, os


quais, como conhecemos. Para a linguística saussuriana, toda palavra possui um
significado cuja função representativa que serve de apoio para a comunicação
humana. Mas observa que essa compreensão de palavras é delimitada por outras
palavras. Tenho “pássaro” em oposição à “peixe”. Porém, essa delimitação
é deficitária por não abarcar, em várias situações, todos os usos cotidianos da
língua. Isso significa dizer, por exemplo, que a palavra “peixe” só tem esse
significado em língua portuguesa e, mesmo assim, é um hiperônimo de linguado,
carpa, cavalo-marinho, lampreia etc.

Há também os casos abstratos, vocábulos vagos e ambíguos, de modo


que se os significantes dos seres humanos são majoritariamente objetivos, os
dos seres que os cercam não desfrutam da mesma denotatividade. Afetividade,
situação, contexto etc., são vários os elementos que influenciam no sentido
conotativo de um texto. E o leitor sempre tem um duplo confronto: os vocábulos
do léxico, adquiridos desde a infância, e aqueles aprendidos durante o processo
de formação por meio das várias etapas e estratificações sociais ao longo de sua
vida. Os vocábulos lexicais transmitidos na época infantil agregam uma carga de
afetividade maior do que os que são aprendidos ao longo da vida — a exemplo
da palavra “mãe” —, influenciando o processo intelectual. Já os adquiridos ao
longo da vida, seja por experiência ou capacitação, são mais conceitos agregados
do cotidiano, eruditos e populares.

151
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

É nessa observação que Rodolfo Ilari (2001) aponta para uma relação
entre conotação/emotividade e denotação/intelectualidade. Comumente o texto
literário, mesmo dotado de amplo uso conotativo, é abordado como campo da
denotação, do acúmulo de saberes, e não de sua interpretação sentimental. O
texto literário em sala de aula não tem a mesma apreensão que qualquer outro,
de maneira que é apenas mais um acúmulo intelectual. É a contextualização e
ressignificação que permite que o indivíduo ao entrar em contato com o texto
literário — em seu processo de formação como leitor — transmita-a para o campo
da conotação, da afetividade.

DICAS

Os estudos acerca da linguagem enquanto metáfora remetem à Aristóteles. A


professora Rosa Lídia Coimbra desenvolve longo estudo no livro A linguagem metafórica,
sobre como a linguagem cotidiana se funda na confluência da conotação e da denotação
e, dessa maneira, sempre se reinventa. Disponível em: http://www.delfimsantos.net/fds/
retorica/imagens/Rosa_Coimbra_ling_metafor.pdf.

Inclusive, é por meio da linguagem conotativa que o falante utiliza que


é possível identificar seu grau de instrução literária — diferente da linguagem
denotativa, que apresenta outras funções —, bem como idade, faixa etária e
formação sociocultural. O uso do seu léxico está associado ao seu uso cotidiano,
bem como a convencionalidade de sua realidade.

É por isso que o fenômeno da leitura baseada numa interação conotativa


aponta para a capacidade ledora do indivíduo como uma construção coletiva,
formada pelas suas experiências no uso plurissignificativo da palavra, ou seja,
com o signo literário.

Logo, a conotação, que se faz considerando a denotação, não é exatamente


uma criação particular de um indivíduo, mas a parte plurissignificativa da
palavra, cujo significado preciso se obtém num contexto.

Por exemplo, se o leitor se depara com as frases “Meu cachorro pegou um


gato” e “Júlio é um cachorro”, observa-se como o termo “cachorro” é polissêmico
e dialógico: polissêmico por assumir vários sentidos, dialógico por negociar com
o leitor essas possibilidades. Se todo texto presume um leitor, então a atividade
de escrita é realizada por meio de uma troca linguística que dispõem dos signos à
disposição. “Cachorro” só possui esses significados — entre outros — na medida
em que atendem à estrutura lexical do falante/leitor. Mesma situação ocorre

152
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

quando, em “Memórias Póstuma de Brás Cubas”, a protagonista refere-se a “tu,


minha leitora”, na medida em que possui um leitor-consumidor que compreende
seu jogo textual e o interpreta.

Esse tipo de fenômeno ocorre pela relação entre o sentido dicionarizado


— denotativo — e o figurado — conotativo. Todavia, um vocábulo é formado por
todas as suas possibilidades representativas na linguagem, já que toda palavra,
todo signo linguístico, tem como característica primordial a qualidade da
polissemia, plurissignificativa. Da mesma maneira que “cachorro”, cujo principal
sentido é “animal doméstico”, do qual vários sentidos possíveis se desaglutinam,
o mesmo ocorre com tantas outras palavras que possuem tanto sentido conotativo
quanto denotativo na língua. É a partir dessa germinação que ocorre no interior
do signo linguístico, possuidor de múltiplas possibilidades de sentido, que se
alimenta o signo literário.

Decorre-se então que a plurissignificação da linguagem literária nasce


do uso convencional que se faz das próprias palavras, da sua qualidade afetiva
para gerar o efeito da conotação, caráter polissêmico que indica sua natureza de
sempre ser ressignificada. Essa linguagem cotidiana é sempre incompleta, forma-
se na interação com o meio social, de maneira que a concepção linguística que
o indivíduo faz do mundo imprevisível. Esse paradoxo é superado exatamente
via texto literário: em sua relação de leitura e melhor conhecimento do mundo, o
indivíduo transcende as limitações da língua que precisa interagir com todo um
mundo para se desenvolver e nunca se completar. Via texto literário, o indivíduo
conhece uma nova linguagem ao mesmo tempo em que passa a compreender
melhor a sua própria capacidade comunicativa. Fato é que o “debruçar-se no
texto” amplia seu mundo, superando as limitações da linguagem comum,
ressignificando suas próprias experiências e expandindo sua capacidade de
ressignificação, de maneira que lhe possibilita transferir a marca afetiva do léxico
aprendido em sua infância para todos os aspectos denotativos da sua capacidade
interpretativa, colocada em prática dia a dia.

5 LEITURA: COMO AVALIAR? HABILIDADES E COMPETÊNCIAS


LEITORAS
Nos tópicos anteriores optamos por apontar as características do processo
de leitura, sua conceituação, formação do leitor, entraves, apropriação dos
significados e significantes linguísticos, bem como suas aplicações cotidianas.
Enfatizamos de maneira insistente no problema da redução da atividade de
leitura a mero exercício de fixação, tendo como propósito transmitir a você a
noção de que o acesso a um material plurissignificativo deve estar imbuído de
uma postura igualmente plurivalente.

153
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

Você, acadêmico, já ouviu falar em SAEB, não é mesmo? O SAEB é um


sistema nacional de avaliação da educação básica, que realiza, através do INEP —
Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais —, a cada dois anos, uma avaliação
com o objetivo de diagnosticar o andamento do sistema educacional brasileiro
e procurar elementos que possam causar interferência no desenvolvimento dos
alunos.

DICAS

Por meio do SAEB o professor avalia o aluno, e esta política pública avalia
professor e aluno de modo a procurar suas deficiências regionais, estaduais por meio de
dados obtidos. Na sua página oficial há relatórios de pesquisas que apontam as fragilidades
dos alunos de graduação relacionadas à sua competência ledora, bem como avanços e
disparidades de outras políticas públicas implementadas. É uma fonte de informação muito
relevante para auxiliar no processo de desenvolvimento de políticas avaliativas, visto que se
trata de um documento nacional. Disponível em: https://medium.com/@inep/resultados-
do-saeb-2017-f471ec72168d.

Dedicamos nessa última parte o espaço para tratar de mais algumas


questões teóricas e, ao mesmo tempo, atividades práticas que, longe de engessar
a leitura, podem ser direcionadas para o melhor aproveitamento da formação
ledora.

5.1 APROPRIANDO-SE DO TEXTO


Falou-se muito sobre o signo literário, a tradução intersemiótica que
promove e, principalmente, a germinação textual que possibilita. Mas também
abordamos a capacidade do leitor em ser germinado, tomar parte dessa leitura,
agir ativamente em relação ao texto de maneira que ele seja significativo.

Mas como se dá esse processo, qual a sua base? Não há outra: a leitura
cotidiana. As informações do dia a dia, a interação linguística nos mais variados
estratos e situações comunicativas, é o que desenvolverá a competência inerente
ao falante e, consequentemente, o leitor. Uma vez que há a noção de analfabeto
funcional, a sociedade carece dessa competência ledora, embora isso seja um
entrave cada vez maior.

154
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

5.2 LITERATURA E NICHO


Tome como base as seguintes questões contemporâneas: os indivíduos
estão, em sua maioria, limitados ao que chamamos de “bolhas sociais”, grupos
que interagem com seu tipo de informação, e consomem apenas isso. Não
é uma novidade como muitos apontam: Em épocas pré-internet, sempre
estivemos limitados ao nosso campo de atuação e de relações sociais, sendo
proporcionalmente poucos os que atravessavam essas barreiras. Eram os “mais
informados”, “cultos”. Ocorre que nos dias de hoje esse fenômeno se dá devido
ao excesso de informações que nos faz selecionar um nicho delas, geralmente
direcionado para gostos, posicionamentos sociais e gostos políticos, de modo que
o excesso de informação se torna mais um regresso do que um avanço.

O resultado disso é que, por exemplo, jovens podem saber muito sobre
a Revolução Russa por influência de um youtuber muito influente — um digital
influencer —, mas não necessariamente competente, enquanto outro youtuber,
que pode inclusive ser um professor, amarga poucos likes. Consequentemente,
a variedade de informações é oriunda mais da influência da pessoa, do que seu
saber.

DICAS

O fenômeno dos leitores de livros de youtubers é algo digno de nota. O jornalista


Sérgio Magalhães aborda a questão em uma reportagem na qual apresenta as principais
características desse fenômeno, bem como esse nicho pode e tem sido responsável pelas
primeiras experiências literárias de muitas crianças e adolescentes. Disponível em: http://
www.baiaodeletras.com.br/livros-de-youtubers-podem-incentivar-a-leitura-entre-os-
jovens/.

Parece-lhe familiar? Vocês já devem ter escutado a história dos exploradores


que trouxeram um ornitorrinco para a Europa e as autoridades, diante do animal,
afirmaram categoricamente que era uma fraude, e muitos optaram por aceitar
essa opinião.

Isso aponta — e devemos ter tal em mente — para a responsabilidade do


mediador da leitura, o qual é um dos incentivadores do leitor em formação: suas
opiniões, escolhas e sugestões tem a capacidade de influenciar o indivíduo, o que
agrega uma obrigação moral com suas indicações. Como apontado anteriormente,
embora sempre fique aquele mistério se somos ou não responsáveis pelo
nascimento do leitor, é fato que podemos ser pela sua morte.

155
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

O ato de ler prediz suas inferências, observações da estrutura,


conhecimento sobre o assunto, entre outros. A capacidade ledora envolve não
afirmar categoricamente que não entendeu o texto, já que sempre é possível
abstrair algo deste. De igual forma, escrever envolve a capacidade de ler sobre
determinado assunto, escutado, pensar e refletir, exatamente o que aponta a
presença de tantos analfabetos, funcionais ou não.

Saber interpretar o código linguístico literário envolve exatamente isso:


dominar a arte da decodificação e do reconhecimento das letras e belas letras. Mas
saber escrevê-las também é parte do processo, já que você organiza seu pensamento,
suas impressões e observações acerca do que leu. Inclusive, esse domínio é o que
delimita o ato de progredir socialmente e culturalmente, ao desenvolvimento da
cidadania. É esse o sentido da expressão “o domínio da norma culta é mecanismo
de ascensão social”. Não queremos apontar o sentido pejorativo defendido por
Marcos Bagno (2007), mas que as leituras que fazemos cotidianamente estão
imbuídas de determinada norma, e ela delimita as competências a serem atingidas
para dominá-la.

O que diferencia um bebê de uma criança? Poderíamos apontar pontos


de vistas científicos, sociais, filosóficos e históricos, mas o senso comum os
diferencia pelo recurso à fala. Observe que, entre crianças, é comum, mesmo
em um grupo com a mesma idade, umas chamarem outras de bebês. Isso ocorre
quando algumas preferem recorrer ao choro ao invés da fala, ou, quando muito
pequenas, não sabem se comunicar perfeitamente.

Trazendo isso para nosso campo, a ideia de “pessoa culta” associa-se a


isso, a alguém que lê muito. Usa-se essa expressão para pessoas que “estudou”, no
sentido de ter cursado o ensino superior, no apontamento de que é ali que temos
contato com os “estudos superiores, a cultura superior”, mas essencialmente
um indivíduo pode atingir um douto pela sua capacidade de leitura, até mesmo
pelas suas experiências sociais. É por isso que a experiência é considerada como
irmã gêmea da velhice, mas cabe que a trapaça promovida pelo signo literário
possibilita que você adquira experiências de outros sem pagar o preço do tempo.

5.3 CAMINHOS DA LEITURA COMPETENTE


Vamos, então, abordar as técnicas e possibilidades de realização de leituras
eficientes dos textos. Deve-se salientar que, culturalmente, a leitura surge:

como inserção do domínio da escrita nas práticas culturais do meio


imediato. Apóiam- se as aprendizagens da leitura sobre as aquisições
culturais de cada leitor, mais que sobre o treinamento escolar de uma
técnica de decifragem. O encontro com a escrita significa remodelar
o horizonte cultural de referência ao contato de outro universo
cultural a que a leitura dá acesso. Assim se converte a leitura em busca
assídua da extensão das referências imediatas do meio em que se vive
(MARQUES, 2003, p. 84).

156
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

Partamos desse apontamento. Harold Bloom, crítico cultural e literário,


faz a seguinte proposição ao ser questionado o que seria o ato da leitura:

A informação está cada vez mais ao nosso alcance. Mas a sabedoria, que
é o tipo mais precioso de conhecimento, essa só poderá ser encontrada
nos grandes autores da literatura. Esse é o primeiro motivo por que
devemos ler.
O segundo é que todo bom pensamento, como já diziam os filósofos
e os psicólogos, depende da memória. Não é possível pensar sem
lembrar – e são os livros que ainda preservam a maior parte de nossa
herança cultural.
Finalmente, e este motivo está relacionado ao anterior, eu diria
que uma democracia depende de pessoas capazes de pensar por si
próprias. E ninguém faz isso sem ler (BLOOM, 2001, p. 35).

Esse é o ponto que muitos não chegam: informar-se não é saber, explanar
sua mente, desenvolver a prática do pensar crítico. É na prática da leitura que
o aluno se constitui como cidadão, ou seja, que interage, faz leituras, escuta,
produz textualmente aquilo que compreendeu, como suas apreensões, críticas
e sugestões. Dessa forma, uma das melhores práticas de desenvolvimento da
faculdade ledora é a relação entre as compreensões do aluno e sua produção
textual.

E
IMPORTANT

Inclusive, é desse ponto que parte o gênero textual “memorial”, através do


qual o aluno explica, com suas próprias palavras, o que compreendeu sobre certo aluno.
Estratégias utilizada por muitos professores, é um caminho viável para leitura de textos de
curta extensão em sala de aula.

Castello-Pereira (2005) aponta as várias práticas de leitura e suas


finalidades, e essas podem se dar em, pelo menos, quatro formas de interação:
informativa, estudo textual, leitura por exemplificação e descompromissada.

A informativa (CASTELLO-PEREIRA, 2005) é muito associada ao uso mais


superficial do texto literário, quando os alunos se limitam à busca por respostas.
Brás Cubas é um autor-defunto ou um defunto-autor? Essa resposta é fácil do que
descobrir numa leitura ligeira se Capitu traiu ou não Bentinho.

O estudo textual presume um leitor mais maduro, competente


e comprometido com a leitura. É o exemplo mais utilizado por
secundarist(CASTELLO-PEREIRA, 2005)as e universitários durante a realização
de atividades, como um seminário. Por motivos óbvios, o exemplo dos alunos
que deveriam ler Ensaio sobre a cegueira para responder a uma questão da prova,
não se encaixam nesse exemplo, já que na prática assistiram apenas ao filme.
157
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

Psicologia e psicanálise são ótimos exemplos da leitura exemplificativa


(CASTELLO-PEREIRA, 2005), com seus vários casos retirados da literatura, como
o complexo de Édipo, o narcisismo, o bovarismo, confabulação, e tantos outros.
Também costuma ser utilizado em trabalhos acadêmicos na interação entre
corpus crítico e ficcional.

A descompromissada é nossa meta final, a leitura sem compromisso,


desinteressada, voltada para o “saber e sabor”, a fruição e o divertimento
(CASTELLO-PEREIRA, 2005). É a leitura que busca o prazer textual. Todas as
etapas anteriores, válidas, são etapas que, se desenvolvidas, podem direcionar o
indivíduo para esta última.

FIGURA 9 – QUE TIPO DE LEITURA VOCÊ MAIS PRÁTICA?

FONTE: <https://encrypted-tbn0.gstatic.com/images?q=tbn:ANd9GcSVLZOk2C5XA68fYYjKKv-
tfmZHokKwsuwQdgmaKittfcmLiHbqb2w&s>. Acesso em: 3 fev. 2020.

Mas, imbuídos de nossas responsabilidades pedagógicas, qual devem


ser nossas orientações acerca da leitura? Por mais estranho que soe, a tecnologia
que invadiu todos os espaços sociais possibilitou uma ampliação da atividade de
leitura. Lemos revistas digitais, jornais on-line, blogs jornalísticos etc., tudo ao
alcance de um celular, sem a necessidade de irmos até as bancas. O número de
revistas de renome canceladas reflete essa situação. O mundo entra em nossas
residências com notícias de todos os cantos, a todo momento.

Muito dessa informação, como apontado, associa-se a nichos. E embora


desde o início do século já existiam livros digitais, para muitos o texto literário
— tampouco outros, como científicos e da área acadêmica — não são os mais
acessados. E, justamente, a comodidade de encontrar tanto material também
facilitou à busca — geralmente, por meio de um CTRL + F ou CTRL + L — de
trechos específicos, direcionando muitos para a leitura informativa, distanciando-
os do estudo textual e da leitura descompromissada.

158
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

Propõem-se que, para que haja uma migração de uma leitura informativa
para, pelo menos, um estudo textual, deve-se seguir algumas propostas didáticas
e lúdicas. Deve-se, num primeiro momento, fazer uma leitura paratextual,
observando título, assunto, marcas do gênero textual, autoria, se possui imagens,
forma de propagação etc.

Na sequência, deve-se explorar o texto, buscar suas ideias principais


e sublinhá-las — atividade muito comum em artigos e textos de opinião, mas
expansível ao texto literário —. Uma recomendação é que, dependendo do
número de páginas, essa atividade seja realizada na introdução, a qual apresenta
as ideias principais a serem abordadas. É muito comum esse trecho possuir os
elementos essenciais.

Dúvida? A maioria dos contos de fadas, como Branca de Neve e os sete


anões possuem seus elementos essenciais na introdução. Em Memórias póstumas
de Brás Cubas é nesse espaço que sabemos que o narrador faleceu e irá contar sua
história. Nas primeiras páginas de Ártemis Fowl: o garoto gênio do crime também
descobrimos que um garoto planeja roubar o ouro das fadas.

E
IMPORTANT

A arte da sinopse é uma estratégia para desenvolver a concisão, principalmente


na leitura. Alguns conseguem resumir as ideias de uma obra em menos de dez linhas e,
alguns, em menos de 20 palavras! Experimente sintetizar um livro, a história de um livro
muito significativo para você usando uma medida de, digamos, dez segundos, e veja o que
acontece!

Em seguida, seleciona-se o que fora escolhido, fazendo uma leitura mais seletiva, seja pelos
trechos sublinhados, seja pelo resumo de suas ideias. A partir desse ponto é possível uma
leitura mais aprofundada do texto, de acordo com seus propósitos, de aprofundamento ou
não.

Esse breve exercício já exemplifica uma prática de leitura que vai além da informativa, pois é
o primeiro passo para um posicionamento do leitor. É a partir disso que ele pode começar
a desenvolver um labor crítico na prática de leitura, desenvolvendo suas primeiras técnicas
de análise do texto literário.

159
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

Uma vez que abordamos os princípios da análise literária, é


importante darmos prosseguimento ao processo de empoderamento do leitor,
instrumentalizando-o com os mecanismos necessários para desenvolver essa
prática.

Obviamente, não devemos nos limitar à “produção” de um leitor


“mecanizado”, que só é capaz de ler um texto como um estudo textual, e não uma
leitura despretensiosa. Mas devemos ter em mente o seguinte ponto: a maioria
dos alunos sequer tem uma cultura letrada em casa, com poucas influências
— inclusive em lares com grau de formação elevado —, seja pelas carências
educacionais do nosso país, seja pelo favorecimento da competência técnica, ou
seja, nossa sociedade, no âmbito da capacitação, valoriza mais uma formação
denotativa do que conotativa. Mesmo dentre os seus alunos que têm capacidade
ledora razoável, encontrará um número restrito que se lança à essa despretensão
durante o ato de ler.

Guarde essa metáfora: as técnicas de leitura devem ser exercitadas de


tal maneira que, atingindo tal grau de técnica, sejam esquecidas. Por acaso você
precisa lembrar-se da respiração para que ela ocorra?

DICAS

Oswald de Almeida, professor da UEL — Universidade Estadual de Londrina


—, aprofunda essa mesma metáfora sobre a leitura ser um processo consciência que tem
inclusa uma ação inconsciente. Suas premissas abrangem a noção de que toda leitura
feita é realizada a partir de todas as leituras feitas pelo leitor, as quais são constantemente
realimentadas. No texto A leitura: ação consciente e ação inconsciente, ele aprofunda esses
pontos, abordando inclusive outros atores que influenciam nessa ação inconsciente, como
as editoras. Disponível em: https://www.ofaj.com.br/colunas_conteudo.php?cod=674.

Uma vez que você assume essa responsabilidade, deve guiar seus alunos a
esse caminho. Não cobrança, mas incentivo, sendo persistente sem ser insistente.

Dito isso, deve-se estar atento ao tipo de texto a ser lido, como os múltiplos
tipos e gêneros utilizados no meio universitário, por exemplo, e aqueles que são
apresentados na educação básica. Deve-se estar atento ao tipo, formato, estilo
etc., de modo que o aluno possa, ao seu tempo e na medida de suas capacidades,
organizar, ou seja, escrever, uma estrutura que dê conta da percepção que tem do
assunto principal desse texto. É por isso que se sugere a criação de um roteiro de
leitura para que essa análise possa ser feita de modo mais frutífero.

160
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

Esse roteiro, como aponta Antônio Joaquim Severino (2012), apresenta


diversos caminhos e metodologias para uma boa aprendizagem, primeiro
caminho para a fruição textual. Apresentamos aqui algumas das estratégias
que você pode utilizar em sala, visando ao desenvolvimento de um projeto de
domínio da competência ledora.

Tendo em mente os tipos de leitura — informativa, estudo textual, leitura


por exemplificação e descompromissada — já apresentadas e realizadas, o leitor
em formação deve promover um reconhecimento textual, sinalizando escolhas
lexicais, diversidade das ideias, autor, ou seja, elementos textuais, intertextuais e
paratextuais que lhe permita construir um esquema da obra. Observe que, com
o tempo, esse tipo de técnica pode ensinar-lhe a conhecer um autor, sua obra,
estilos, escolhas etc. Mia Couto, escritor moçambicano, tematiza muito sobre
história, sociedade, cultura e pós-colonialismo, além de buscar inovar o léxico
com vários neologismos para transmitir um mundo diferente do nosso, mas ao
mesmo tempo calcado na realidade.

Esse processo permite que seja feita uma análise do texto como um todo,
seus conteúdos, apresentação, temática e a problematizarão do autor, como ele
se posiciona diante de determinada situação, as ideias, subideias e plots. É um
esquema muito útil para se interpretar novelas literárias: observa que na obra
A hora dos ruminantes, de José J. Veiga, tem uma trama principal, os homens da
tapera que começam a exercer poder em Manarairema, e várias sub-histórias,
como a invasão dos bois, dos cachorros, o conflito entre os moradores etc.

Após essa separação, realiza-se uma análise das interpretações iniciais


feitas pelo leitor (SEVERINO, 2012), em suma, um processo dialógico entre o
texto e sua devida contextualização, uma crítica. Verificam-se assim a coerência,
acréscimos, consistência, capacidade do texto de se manter atual, como o autor
demonstra que suas ideias são pertinentes, a progressão textual, bem como sua
relação com o público, como originalidade, suas influências, o posicionamento do
escritor diante das outras críticas etc.

Finaliza-se essa etapa por meio da observação dos problemas levantados


e as reflexões possíveis, de âmbito geral e pessoal — as reflexões possíveis feitas
pelo leitor de modo que o texto lhe seja significativo. Nessa etapa levantam-se
os questionamentos previamente detectados, de modo que seja possível uma
síntese, ou seja, que estas sejam reelaboradas de acordo com as impressões do
leitor (SEVERINO, 2012). Essa etapa tem caráter essencial, pois, durante o ato da
escrita, o leitor transmite sua compreensão do texto literário. Uma resenha crítica,
por exemplo, segue essa premissa, da releitura crítica previamente realizada.

Nessa sequência de etapas é possível a realização de várias leituras do


texto em prol da compreensão das ideias do escritor, concomitante à outras
externas ao texto, como tempo, lugar, produção, influências. J. K. Rowling, ao
criar a personagem Salazar Sonserina, baseou-se no primeiro-ministro português,

161
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

Salazar, pois passara sua infância em Portugal durante a ditadura salazarista.


Muito da obra de Murilo Rubião, escritor mineiro, é influenciada pelo jogo e
ironia linguística presente na obra de Machado de Assis.

Dessa maneira, analisar um corpus textual propicia ao leitor a criação


de seus próprios textos com maior abrangência teórica, indo além da mera
reprodução, mas recontextualização. Ao analisar criticamente o texto literário, o
aluno torna-se uma espécie de coautor do que já fora produzindo, impregnando o
texto de interpretações possíveis associadas ao seu grau de formação sociocultural.
É esse aluno que lê criticamente que, no futuro, produzirá seus próprios textos
literários. Mia Couto, já citado, é um grande leitor de Guimarães Rosa, Jorge
Amado e outros modernistas; Os ultrarromânticos, entre outras leituras, foram
muito influenciados pelos poemas de Lorde Byron. A prosa humanista de Fernão
Lopes, responsável por transmitir a imagem do governo português durante o
início da dinastia de Avis, muito se influenciou na leitura de toda uma vasta
tradição da prosa medieval portuguesa e ibérica.

Dessa forma, para auxiliar na implementação de práticas de leitura e


análise, apresentaremos aqui alguns exemplos de gêneros da análise textual.

5.4 A LEITURA REINVENTADA


O ser humano tem uma capacidade incrível de criar formas, dar sentido,
organizar estruturas. Essa é a maneira de fazer com que o mundo passe a fazer
sentido. Em tempos ancestrais, sacerdotes tribais realizavam rituais para trazer a
chuva em dias que os deuses do céu pareciam nervosos, pois seria o dia perfeito
para fazê-los descarregar sua ira sobre a terra. Povos do deserto — na antiguidade
e contemporaneamente — não consumiam determinados alimentos pois eles
eram proibidos por suas crenças, mas vale salientar que isso também evitava
muitas doenças e problemas de saúde, como o colesterol alto. Seja por meio de
crenças, saberes ou lendas, o homem sempre busca dar algum tipo de forma ao
mundo para que este lhe faça sentido e fácil de transmitir.

O texto literário não é diferente. Em sociedades com baixo ou quase


inexistente grau de alfabetização, as tradições eram passadas oralmente, e
preservadas muitas vezes por sacerdotes incumbidos de retransmiti-las. Nos dias
atuais, com uma concentração alta de leitores, o melhor formato do texto não é
uma série de cânticos, mas, muitas vezes, textos longos. Ainda há narrativas curtas,
mas a capacidade de preservação e propagação da literatura atual favoreceu o
surgimento de verdadeiras sagas literárias formadas por livros faraônicos.

162
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

E
IMPORTANT

E, de fato, desde sempre os leitores fizeram parte de uma casta ora de


sacerdotes, ora de filhos da elite e, nos dias de hoje, de profissionais capacitados. Pergunte-
se se, num país com altos índices de analfabetismo e dificuldades para interpretação textual,
as pessoas que têm um alto grau de interpretação textual não comporiam, ao seu modo,
uma nova elite intelectual.

Esses mesmos livros podem ser readaptados, de maneira que, para o


leitor, estes lhe sejam signifi cativos e atendam às suas dúvidas. E escrever sobre
o que se leu — como abordamos no capítulo anterior — é uma das melhores
formas de se compreender o que se leu e aprendeu. Se a atividade mais realizada
é a “olhada” no texto sem aprofundamento, o leitor, seguindo as estratégias
anteriormente apresentadas, pode começar a se apropriar da temática trazida
pelo escritor recém-lido. Logo, a escrita pessoal é um processo efetivo, necessário
e prioritário do desenvolvimento da capacidade ledora.

FIGURA 10 – O LEITOR ORGANIZANDO SUAS IDEIAS

FONTE: <https://www.seekpng.com/ima/u2e6e6i1a9a9e6a9/>. Acesso em: 3 fev. 2020.

163
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

5.4.1 Fichamento
Uma dessas estratégias/formatos de análise/gênero textual da análise
é o fichamento, no qual o leitor levanta as principais questões da obra lida,
organizando suas temáticas — explícitas e implícitas —, as quais podem ser
consultadas em trabalhos futuros. É possível, tendo como exemplo Senhora, de José
de Alencar, selecionar as personagens, delimitá-las em características, interesses,
objetivos, participação na e contribuição para a trama, enredo principal, enredo
secundário, relação que uns personagens têm com outros etc. Pode-se também
seguir fichando a trama principal, as subtramas, lugares, relação do mundo
ficcional com o mundo real, como os lugares reais são representados na obra etc.

Além do fichamento, há uma série de outros gêneros da análise textual


que podem ser apropriados em prol da criação de sentido, organização de
ideias e reflexão do conhecimento gerado, como a ficha de citações (LAKATOS;
MARCONI, 2010).

5.4.2 Ficha de citações


Nos dias de hoje há os Pibic — Programas de Iniciação Científica
e Tecnológica — no ensino médio, por meio do qual alunos iniciam sua vida
na pesquisa científica e promovem avaliação crítica — embora deficitária —
dos saberes existentes, almejando aprender como desenvolver suas próprias
competências como pesquisadores. Muitos desses Pibic são direcionados ao
texto literário, de maneira a promover análises com base em aspectos e vieses
específicos — como, por exemplo, a representação da mulher em romances de
José de Alencar e Machado de Assis, ou como o projeto de crescimento brasileiro
aplicado por Juscelino Kubitschek  terá reflexos em textos literários daquele
período.

DICAS

Embora não seja o tema desta unidade, cabe um apontamento sobre o Pibic,
suas práticas e desenvolvimentos, principalmente se você, que nunca tinha ouvido falar,
optar por desenvolver um projeto de Pibic direcionado para práticas de leituras. Alguns sites
apresentam todos os detalhes, documentação apresentada e, principalmente, formas de se
solicitar bolsas de pesquisa. Disponível em: http://www.pesquisa.uff.br/?q=content/o-que-
%C3%A9-pibic.

164
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

Ao se realizar um projeto tendo como base um texto literário específico,


ocasionalmente será preciso resgatar certas ideias principais já observadas
— como na leitura por exemplificação — para fundamentar os argumentos
apresentados na releitura promovida pelo aluno. São justificativas presentes em
textos acadêmicos com a finalidade de dar embasamento crítico às suas opiniões.

Para que não seja preciso ler novamente o texto todas as vezes que se
precise fazer um relatório de Pibic, o modelo de ficha de citações é essencial,
pois seleciona e organiza os trechos apontados como fundamentais de uma obra,
catalogando-os em página, ano, autor etc.

As citações comumente utilizadas neste curso são um exemplo, mas


podemos agregar outros conteúdos, como citações da obra O que é leitura (2003),
de Maria Helena Martins:

Tendo já apresentado inicialmente, tenho refletido e exposto minhas


reflexões sobre o que delimitamos como o ato de ler um texto.
(MARTINS, 2003, p. 54)
[...]
Na atual conjuntura imagino que tenha esclarecido a importância de
passarmos por determinadas etapas ao longo de nossa vida para que
o aproveitamento da leitura seja plenamente efetivo e, mais ainda, que
essa habilidade está sempre atrelada a uma necessidade (MARTINS,
2003, p. 79).

5.4.3 Resumo
O resumo, por outro lado, é um gênero textual realizado com frequência,
já que envolve a produção de uma síntese textual baseada principalmente nos
pontos principais detectados no decorrer de sua leitura.

Essa tarefa, por sinal, é muito complexa. Há uma ideia errônea de que
o resumo envolve o recorte das palavras importantes quando, na verdade,
seleciona-se de forma organizada os pontos mais importantes, a essência da
obra. Se para nós que trabalhamos continuamente com o texto é um exercício
com grau de dificuldade que não pode ser ignorado, para o leitor em formação é
uma atividade hercúlea. A concisão é uma habilidade valorizada e buscada, mas
desenvolvida paulatinamente, de maneira que quanto mais cedo seja colocada em
prática, melhor. Seu resultado é facilitar a compreensão textual e, sendo realizado
como promover, amplia as percepções do leitor, já que sua essência já está ali,
delimitada.

Exemplo disso está no resumo que fizemos da obra anterior de Maria


Helena Martins, O que é leitura (2003, p. 45).

165
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

A obra divide-se em seis partes, tratando dos diferentes níveis da


prática de leitura: parte do sensoriamento, da emoção e da razão. Ao
longo da obra a leitura aborda que o ato de ler não se resume ao contato
com os vocábulos, mas a capacidade de interpretar o mundo que nos
cerca. Há uma divagação inicial dos motivos, objetivos e sentidos
por trás da leitura; quando ela desenvolve a questão dos níveis do
ato ledor, correlaciona-o com elementos pertinentes às as sensações,
as emoções e a razão. Consequentemente inter-relaciona os três níveis
das leituras, e como frequentemente um se sobrepõe ao outro. Para
finalizar, aponta como cada leitor possui sua leitura específica, seu
modo de ler e tirar maior proveito da prática, mas que precisa de
capacitação para desenvolver essa competência, seja pela prática, seja
por orientação técnica, de maneira a aperfeiçoar seu desempenho e
atingir a primazia da prática de leitura.

5.4.4 Comentário
Outro método/gênero é o comentário. É muito comum a presença de
comentaristas políticos, jornalísticos e esportivos. O comentário da obra literária
envolve um posicionamento, análise direcionada e apreensões desse texto.
Normalmente, em veículos de comunicação, é feita por vozes de autoridade
como professores e pesquisadores, mas é um gênero muito propício para o leitor,
visto que o coloca em posição, ou melhor, obriga-o a se posicionar. É por isso que
também é chamado de comentário analítico.

Esse modelo, em especial, é um dos que apresenta maior gama de


possibilidades: pode dar origem a debate, seminário, resenha crítica etc., mas o
mais importante é que ele toma como base a apreensão do leitor, sua compreensão
e suas opiniões. É muito frutífero observar os aportes que ele faz na medida em
que contextualiza o texto. Faça um experimento e observe como pode ser muito
curioso seu grupo de alunos afirmar que Brás Cubas era uma pessoa mimada
que nunca “ganhou o sustento pelo suor do seu rosto”, ou que Sirius Black,
personagem da saga de livros Harry Potter, poderia estar vivo se Harry tivesse
prestado mais atenção aos avisos que o futuro falecido lhe dera.

Isso, obviamente, envolve uma leitura comprometida com a obra original,


motivo de esse modelo estar associado ao resumo, por exemplo, pois envolve
sal capacidade de síntese. E, uma vez que o leitor precisa apresentar de maneira
consistente com argumentos seu ponto de vista, uma leitura profunda da obra é
fundamental.

O aluno também pode fazer um fichamento prévio que favoreça seu


trabalho, de maneira a salientar os pontos contundentes. Como aponta Lakatos e
Marconi (2010, p. 59), para organizar um comentário analítico o estudante deve
seguir os seguintes passos:

166
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

1. Tecer comentários sobre o método de escrita do autor, seus


caminhos, escolhas de composição e decisões de roteiro;
2. Analisar profundamente a obra tendo a mesma como base,
observando sua coerência interna;
3. Buscar interpretar os trechos mais complexos, de modo a favorecer
uma leitura mais fluída;
4. Para fins de exercício, comparar o texto literário com outros que
abordem a mesma temática, por exemplo, livros de ficção científica
de autores diferentes.
5. Apontar a relevância da obra para o trabalho redigido, abordando
principalmente os motivos pela escolha do texto específico.

Dessa maneira, cria-se uma sistematização de todo o material bibliográfico


adquirido e consumido ao longo do processo de formação intelectual do indivíduo,
de modo que o mesmo possa ser resgatado de tempos em tempos, possibilitando
uma revisitação das ideias anteriormente apresentadas e recontextualização na
forma de novos escritos.

Essa prática aqui apresentada voltada para o texto literário pode ser
aproveitada, inclusive, na crítica literária pertinente à determinada obra. É fato que
pode ser aproveitada em qualquer tipo de texto, principalmente pela dificuldade
dos alunos — como no ensino superior — de catalogarem tudo o que aprenderam,
entraram em contato e desenvolveram ao longo de um semestre letivo. Dessa
maneira, cria-se um arquivo bibliográfico da sua trajetória intelectual.

Partindo da obra já apresentada, O que é leitura, podemos organizar uma


espécie de comentário:

A obra está inserida na área das ciências humanas, em particular, no dos


estudos que abordam o ensino da linguagem. Há três pontos-chave que são a base
da teorização de Maria Helena Martins, ou seja, os níveis da leitura: sensorial,
emocional, bem como se integram e interagem entre si. Há uma preocupação
da escritora em transmitir, de maneira prática e concisa, o que vem a ser leitura,
prática de leitura, hábito de leitura e como cada um deve/pode descobrir novas
formas de se ler durante o processo de interação com novos textos. Por fim,
encerra sua exposição indicando textos sobre o tema. A leitura informacional
(informação), a leitura de conhecimento (conhecimento) e a leitura de prazer
estético(prazer).

167
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

LEITURA COMPLEMENTAR

A FORMAÇÃO DO LEITOR COMPETENTE – ESTRATÉGIAS DE LEITURA

VALLE, Maria de Jesus Ornelas

Introdução

“Livros não mudam o mundo, quem


muda o mundo são as pessoas. Os livros
mudam as pessoas.”
Mário Quintana

O estudo e o uso de estratégias de leitura foram vistos no trabalho


realizado como meios que desenvolvem habilidades leitoras de compreensão e
interpretação, a partir de narrativas significativas. Sendo a leitura entendida como
um processo de interação entre o leitor e o texto e objeto de utilização autônoma
dos leitores.

É preciso cada vez mais se preocupar com a formação de leitores. Mas


de que espécie de leitores? Aqueles que sejam capazes de mobilizar que tipos
de procedimentos e habilidades? Que estratégias e atividades devem ser
selecionadas para que os alunos desenvolvam estas capacidades envolvidas no
ato de ler? Os procedimentos utilizados na construção das bases necessárias
para a formação destes leitores que se deseja, instrumentalizados para o efetivo
exercício da cidadania são as estratégias de leitura aplicadas nesta pesquisa, a
partir de narrativas curtas.

Segundo Isabel Solé (1988), as estratégias de leitura são as ferramentas


necessárias para o desenvolvimento da leitura proficiente. Sua utilização permite
compreender e interpretar de forma autônoma os textos lidos e pretende despertar
o professor para a importância em desenvolver um trabalho efetivo no sentido da
formação do leitor independente, crítico e reflexivo.

Para aprender as estratégias, o aluno deve integrá-las a uma atividade


de leitura significativa, assim, é preciso articular situações de ensino de leitura
em que se garanta sua aprendizagem significativa. Quando se trata de ensinar
as estratégias responsáveis pela compreensão, o aluno deve vivenciar e assistir
ao que o professor faz quando ele mesmo se depara com a leitura ou com
dificuldade de leitura. Entendemos que é através do movimento entre teoria e
prática em situações reais de leitura, que o professor poderá com lucidez perceber
a possibilidade concreta de acesso ao conhecimento, tornando-se e formando
leitores autônomos e competentes.

168
TÓPICO 2 - A LEITURA NUMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR

Desenvolvimento

A sociedade contemporânea exige o letramento. Vivemos imersos em


imagens, fotografias, letreiros, manchetes de jornais, placas de rua, sinais de
trânsito, cartões de crédito, cheques, notas fiscais, documentos, rótulos, revistas,
livros, entre outros.

Somos leitores em tempo integral, mas não lemos do mesmo jeito os


diferentes textos que se apresentam e nem todos têm acesso ao letramento
necessário para utilizar a leitura no enfrentamento aos desafios da vida em
sociedade e fazer uso do conhecimento adquirido para continuar aprendendo e
se desenvolvendo ao longo da vida.

É papel da escola fornecer aos estudantes, através da leitura, os


instrumentos necessários para que eles consigam buscar, analisar, selecionar,
relacionar, organizar as informações complexas do mundo contemporâneo e
exercer a cidadania.

No entanto, deparamos no dia-a-dia escolar com alunos que não gostam


de ler ou que dizem não entender o que leram, ou ainda, que apenas conseguem
indicar informações presentes no texto, não é este o letramento necessário para o
exercício da cidadania e para o combate aos desafios da vida.

Formar leitores competentes que gostem de ler, que leiam para estudar
e adquirir conhecimentos ou para obter informações para as mais diversas
finalidades é formar as bases para que as pessoas continuem a aprender durante
a vida toda.

De acordo com Solé (1998), poder ler, isto é, compreender e interpretar


textos escritos de diversos tipos com diferentes intenções e objetivos contribui
de forma decisiva para autonomia das pessoas, na medida em que a leitura é um
instrumento necessário para que nos manejemos com certas garantias em uma
sociedade letrada.

A escola é lugar de compartilhar conhecimentos. Na escola, a criança e o


adulto interagem numa relação social específica, a relação de ensino. A criança,
no papel de aluno, é colocada diante da tarefa de compreender as bases dos
conceitos sistematizados ou científicos; o professor é encarregado de orientá-la. É
preciso aprender e ensinar a ler na escola.

A criança necessita da mediação do outro para consolidar e dominar


autonomamente as atividades e operações culturais. Nesse sentido, destaca
Vygotsky (1984), que a educação escolarizada e o professor têm um papel singular
no desenvolvimento do indivíduo. A proposta de leitura enquanto resultado
de interação, parte do pressuposto de que o texto é passível de interpretações
múltiplas e que é função do professor mediar as informações oriundas de uma
esfera social mais ampla do aluno para possibilitar um elo com o texto.

169
UNIDADE 2 - LEITURA: POLÍTICAS E PRÁTICAS

A leitura é um processo que se movimenta entre o que se reconhece no


texto e o que se expropria dele, revelando estratégias dinâmicas de produção
de sentido que possibilitam as várias condições de interação entre sujeito e
linguagem, deve então, ser entendida como habilidade fundante do ser humano,
como prática social e como ato de coprodução do texto.

O sujeito faz uma leitura textual com todo seu ser e sua bagagem
sociocultural, o leitor constitui-se, identifica-se e projeta-se no texto, aproximando-
se e distanciando-se das ideias que o texto sugere, mesclando às suas ideias, as
saliências textuais que lhe sobressaem, o que lhe é permitido pela incompletude
do texto, pelas lacunas deixadas pelo autor.

Para melhor compreender o processo de leitura consideremos as etapas


apresentadas por Cabral (1986), identificadas como: decodificação, compreensão,
interpretação e retenção. A decodificação resulta do reconhecimento dos símbolos
escritos e da sua ligação com os significados; a compreensão ocorre quando o
leitor capta do texto a temática e as ideias principais; a interpretação é a fase de
utilização crítica do leitor, o momento em que faz julgamentos sobre o que lê e
a retenção é o que o leitor absorve do que compreendeu ou interpretou sobre o
texto.

A leitura é um processo interno, mas precisa ser ensinado e uma


importante condição para que isso ocorra, ou seja, para o aluno aprender, é que ele
veja e entenda como o professor faz para elaborar uma interpretação. Os alunos
precisam assistir a um processo de leitura que lhes possibilite ver estratégias de
compreensão do texto em ação em uma situação significativa e funcional.

FONTE: <http://www.gestaoescolar.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/producoes_pde/artigo_ma-
ria_jesus_ornelas_valle.pdf>. Acesso em: 18 fev. 2020.

170
RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

• A prática de leitura está associada a uma série de atividades interdisciplinares,


dentro e fora do ambiente escolar.

• Há a necessidade do desenvolvimento de projetos de mediação de leitura, com


o propósito de desconstruir a forma como o texto literário é abordado em sala
de aula.

• Deve-se desenvolver práticas para que a literatura seja mais do que uma
disciplina escolar, mas um mecanismo de acesso a outros saberes por parte do
aluno, e de maneira constante.

• Há uma série de estratégias que favorecem o desenvolvimento da leitura e da


capacidade interpretativa do aluno.

CHAMADA

Ficou alguma dúvida? Construímos uma trilha de aprendizagem


pensando em facilitar sua compreensão. Acesse o QR Code, que levará ao
AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

171
AUTOATIVIDADE

1 Nos dias de hoje, quando as relações entre literatura e outras formas


midiáticas têm uma relação cada vez mais intrínseca, é curioso observarmos
como, muitas vezes, a abordagem do texto literário em sala de aula carece
de intertextualidade e transdisciplinaridade. Em tempos de tecnologias
educacionais e letramento digital, cabe ao professor aproveitar outras
formas de metodologias atividades em prol do processo de ensino e
aprendizagem, além do desenvolvimento de leitores competentes.

Produza um roteiro de aula no qual você apresenta uma obra literária e sua
correlação com outras mídias.

172
UNIDADE 3 -
RECURSOS DIDÁTICO-
TECNOLÓGICOS A
SERVIÇO DA LEITURA

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• refletir sobre a criação de projetos de mediação da leitura para o contexto


digital;
• identificar o papel do educador na formação do aluno-leitor e no desen-
volvimento de estratégias de mediação da leitura;
• compreender o letramento literário no contexto digital;
• desenvolver a capacidade de análise de recursos educacionais digitais e
critérios de escolha;
• identificar as composições dos textos no ciberespaço e os processos de
leitura desenvolvidos.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em quatro tópicos. No decorrer da unidade
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 – LEITURA NO CONTEXTO DIGITAL: PROCESSOS E


ESTRATÉGIAS
TÓPICO 2 – TECNOLOGIAS DIGITAIS E O LETRAMENTO LITERÁRIO
TÓPICO 3 – COMPOSIÇÕES DO TEXTOS NO CIBERESPAÇO E OS
PROCESSOS DE LEITURA DESENVOLVIDOS
TÓPICO 4 – RECURSOS EDUCACIONAIS DIGITAIS PARA ENSINO DA
LEITURA

CHAMADA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos


em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá
melhor as informações.

173
174
TÓPICO 1 -
UNIDADE 3

LEITURA NO CONTEXTO DIGITAL: PROCESSOS E


ESTRATÉGIAS

1 INTRODUÇÃO
O professor lê e faz ler os seus alunos. O professor lê e provê conteúdos.
O professor lê e prevê caminhos. O professor lê e se vê melhor nas
suas caminhadas. O professor lê e se reconstrói nas experiências. O
professor lê e se vitaliza incessantemente (SILVA, 2009, p. 28).

A leitura também é algo que contamina e torna seu hospedeiro uma


criatura voraz, curiosa, astuta crítica, criteriosa e muito mais, mas para que esse
contaminar aconteça, como um vírus que se espalha, o hospedeiro tem que estar
encharcado a ponto de espalhá-la como um dente de leão quando soprado ao
vento. O professor que lê tende a lançar sua paixão aos alunos. O desafio está nos
mecanismos atuais para que o processo de mediação de leitura aconteça como
um pousar da pétala da flor e sua semente ali se fixe, seja regada com novidades
e entusiasmo e prospere aula após aula, misturada a emanação dos discentes a
ponto daquele que recebeu possa ter seu próprio jardim e soprar a flor de modo
que povo outros campos.

Para refletirmos sobre os processos de mediação da leitura para o


contexto digital, de textos produzidos e emergentes do contexto digital, devemos
compreender os espaços virtuais em que a leitura se faz presente, nas composições
que assume em contato com diferentes interfaces, e o papel do professor e do
aluno em atos de leitura.

Nesse contexto, esse tópico tem como meta compreender os processos de


mediação da leitura para o contexto digital; bem como, identificar o papel do
educador na formação do aluno-leitor e no desenvolvimento de estratégias de
mediação da leitura.

2 PROCESSOS DE MEDIAÇÃO DE LEITURA NO CONTEXTO


DIGITAL
Você já pensou sobre as situações de leitura que vão se constituindo no
contexto digital?

Já refletiu de que forma a leitura assume novos formatos e composições


afetada pelas interfaces onde se produz?
175
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

De fato, interagimos com gêneros digitais em nosso cotidiano de forma


natural. Fazemos a leitura de postagens feitas por nossos amigos em sites de
redes sociais, de comunicações em grupos que integramos em aplicativos de
mensagens instantâneas, de reportagens produzidas em sites jornalísticos, entre
outros espaços.

A mediação da leitura, neste cenário, ocorre através da interação com


a interface digital e com o texto produzido (hipertexto). Desta forma, o grande
desafio do educador é o de compreender como inserir as tecnologias digitais —
e os textos que se produzem nos espaços digitais — em práticas que visem à
qualificação da leitura do educando.

Cabe ao docente, na sua práxis, considerar que os textos produzidos no


contexto digital possuem características diferentes do texto impresso e trajetos de
leitura potencialmente não lineares; e, que a mediação é o lugar onde o processo
comunicacional de interação entre os sujeitos se estabelece. Neste sentido é
importante que o educador também seja um leitor ativo pois:

[...] para ser um agente de leitura a pessoa tem primeiro que gostar de
ler, ter vontade e compromisso social de compartilhar esse gosto e sua
experiência de leitura com um outro tanto de gente, formando leitores
em ambientes diversos como bibliotecas públicas municipais, escolas,
fábricas, empresas, associações, comunidades e dentro das casas, no
seio de famílias que abrem suas portas para que os livros e a leitura
possam entrar em suas vidas (SANTOS, 2009, p. 40).

Mas é importante lembrar que o processo de mediação da leitura na escola


tem base, inicialmente, em uma relação triádica (Figura 1) estabelecida entre o
professor, o aluno e o objeto de conhecimento (leitura).

FIGURA 1 – ELEMENTOS DA TRÍADE DA MEDIAÇÃO DA LEITURA (1º MOVIMENTO)

FONTE: Os autores

176
TÓPICO 1 - LEITURA NO CONTEXTO DIGITAL: PROCESSOS E ESTRATÉGIAS

Posterior a esta relação que se estabelece a partir da mediação do professor,


o aluno, de forma já mais autônoma, inicia o contato com o texto de forma mais
subjetiva. Neste contexto se inicia uma nova relação triádica (Figura 2), agora
entre o aluno, o objeto de conhecimento (leitura) e o suporte de leitura, que neste
caso é digital.

FIGURA 1 – ELEMENTOS DA TRÍADE DA MEDIAÇÃO DA LEITURA (1º MOVIMENTO)

FONTE: Os autores

São as especificidades destas duas relações, que se estabelecem nos


processos de mediação da leitura, que discutiremos de forma mais profunda.

No primeiro movimento triádico a ação parte das ações propostas pelo


educador visando inserir o aluno em práticas de leitura; considerando que
vivemos na era digital e “a prática de leitura no ensino é um grande desafio que
os educadores se deparam em sala de aula. De que maneira eles conseguem
aproximar seus alunos/leitores ao texto nesse novo tempo em que se questiona
a existência das bibliotecas físicas dos livros impressos?” (TRINDADE, 2015, p.
128).

Primeiramente, é necessário ter em mente que os modos de ensinar e de


aprender não são mais os mesmos, como os alunos também não o são, "hoje,
o aprendizado do mundo é realizado não por uma relação direta, mas antes,
mediado pelas informações que ordenam nossa cultura e dão sentido à nossa
relação com o mundo” (RAMOS, 2007, p. 3). Considera-se que a busca da
construção do conhecimento:

177
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

[...]se dá por meio de um movimento complexo, em que os sujeitos


interagem com a informação, uns com os outros, processando-as para,
de acordo com seu foco e suas possibilidades cognitivas, se apropriarem
dos conteúdos acessados, sendo a mediação da informação etapa
subsidiária do desenvolvimento. Todos (mediadores e usuários), ao
interagir com a informação, são sujeitos do conhecimento interpostos
pelos conteúdos, tecnologias, suportes, meios e ambientes (NEVES,
2011, p. 417).

Da mesma forma, a linguagem se ressignifi cou e novos formatos e


suportes se fazem presentes no contexto digital (Figura 3), tornando a interação e
comunicação entre os sujeitos mais dinâmicas e ágeis.

FIGURA 3 – EXEMPLO DE LINGUAGEM EM INTERFACE DIGITAL

FONTE: <https://twitter.com/OEsfarelado/status/1197665211270008834>. Acesso em: 5 fev. 2020.

Diante de tal fato:

O professor mediador que assume tal desafi o apreende que as novas


tecnologias, a comunicação interativa, assim como a aprendizagem
colaborativa na rede, pode ampliar positivamente o desenvolvimento
da capacidade cognitiva do aluno como a memória, a percepção
e o raciocínio. E a desenvolver, por meio das diferentes superfícies
digitais, capacidades linguísticas de expressão pela linguagem verbal,
visual e sonora (TRINDADE, 2015, p. 133).

A autora, a partir deste questionamento, destaca que a “infl uência


das tecnologias promove uma nova forma de ler, uma vez que os suportes
virtuais dispõem de uma gama de ferramentas interativas, a leitura, com o
condicionamento de uma nova cultura da ‘tela’, já não é mais um processo linear
que todos conhecem por meio da cultura do livro impresso” (TRINDADE, 2015,
p. 128).

Atividades de leitura envolvendo o contato do aluno com a multiplicidade


de hipertextos — aqui compreendidos como unidade de sentido emergente de
diferentes gêneros digitais presentes no ciberespaço — podem potencializar

178
TÓPICO 1 - LEITURA NO CONTEXTO DIGITAL: PROCESSOS E ESTRATÉGIAS

e tornar mais atrativo o contato do aluno com a prática leitora. Um estudo


apresentado pela pesquisadora Anne Mangen, da Universidade de Stavanger na
Noruega, aponta fatores positivos (Figura 4) e negativos (Figura 5) do uso de
meios eletrônicos no desenvolvimento da compreensão leitora.

FIGURA 4 – FATORES POSITIVOS DO USO DE E-READERS

FONTE: <http://f.i.uol.com.br/folha/equilibrio/images/14258690.jpeg>. Acesso em: 5 fev. 2020.

179
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

FIGURA 5 – FATORES NEGATIVOS DO USO DE E-READERS

FONTE: <http://f.i.uol.com.br/folha/equilibrio/images/14258691.jpeg>. Acesso em: 5 fev. 2020.

Van Der Weel (2018), refletindo sobre os dados apresentados por Mangen
(2016), aponta que se antigamente as telas digitais não favoreciam uma boa
experiência de leitura na atualidade a qualidade dos hardwares e softwares
foi aprimorada trazendo à tona uma nova geração de leitores. Em questão de
poucas décadas o e-book (livro digital) capturou a preferência antes dedicada
ao livro impresso. Para o autor, em pouco tempo a tela tornou-se onipresente e
seu uso proliferou em todas as camadas sociais e faixas etárias. A experiência de
leitura, é outro ponto que sofreu modificação, causando mudanças fundamentais
e abrangentes na maneira como lemos; uma das mais presentes é a criação do
livro eletrônico geralmente disponibilizado em um dispositivo digital, também
conhecido como e-reader (dispositivo eletrônico concebido especificamente para a
leitura de e-books) (BATISTA, 2018).

180
TÓPICO 1 - LEITURA NO CONTEXTO DIGITAL: PROCESSOS E ESTRATÉGIAS

E
IMPORTANT

O livro eletrônico não “nasceu” com as tecnologias digitais. A primeira con-


cepção de um livro digital foi pensada por Vannevar Bush (1890-1974), que descreve em
artigo publicado na revista Atlantic Monthly, em 1945, com o título As we may think (Como
podemos pensar). Neste artigo, o autor descreve uma máquina que é capaz de armazenar
e mostrar arquivos armazenados em uma espécie de microfilme, denominada como Me-
mex (Memory Extension). [...] Em 1971 foi criado por Michael Hart (por alguns, considerado
o inventor do livro digital) o Projeto Gutenberg, por meio da digitalização de livros com o
propósito de os disponibilizarem de forma gratuita. O Projeto Gutemberg é considerado a
biblioteca digital mais antiga do mundo.
BATISTA, L. R. A leitura digital por estudantes do curso de biblioteconomia da Uni-
versidade de Brasília. 2018. 50f. Monografia (Graduação em Biblioteconomia) – Uni-
versidade de Brasília, Brasília, 2018. p. 17. Disponível em: https://bdm.unb.br/bitstre-
am/10483/20897/1/2018_LiviaRodriguesBatista_tcc.pdf. Acesso em: 5 fev. 2020.

Emergem, neste cenário, duas categorias de mudança em nossas práticas


de leitura, “hábitos de papel existentes que estão lentamente se transformando em
digitais, e hábitos digitais inteiramente novos e nascidos que alterar a totalidade
da prática de leitura” (VAN DER WEEL, 2018, p. 230, tradução nossa).

Mangen, Olivier e Velay (2019) destacam que o processo de leitura é


sempre mediado por um disposto, eletrônico ou não (Figura 6), com substrato
que apresenta diferentes características. Um livro impresso, por exemplo,
apresenta gramatura e texturas diferentes, além de formatos distintos de fonte
e linearidade de leitura. “Os textos impressos são físicos e tangíveis, enquanto
os textos digitalizados são fi sicamente separáveis do seu meio” (MANGEN;
OLIVIER; VELAY, 2019, p. 1-2, tradução nossa).

FIGURA 6 – LIVRO IMPRESSO E LIVRO DIGITAL EM DISPOSITIVO E-READER

FONTE: <https://www.frontiersin.org/files/Articles/426051/fpsyg-10-00038-HTML/image_m/
fpsyg-10-00038-g001.jpg>. Acesso em: 5 fev. 2020.

181
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

No segundo movimento triádico as interfaces digitais serão parte de


significativa importância no processo de mediação atuando como suporte de
leitura (Figura 7); agora, fazendo a interconexão entre o aluno e o objeto de
conhecimento (o texto digital).

FIGURA 7 – DIFERENTES SUPORTES DE LEITURA

FONTE: <https://www.ultrapassandolimites.com.br/blog/wp-content/uploads/2017/08/a-impor-
tancia-da-leitura.png>. Acesso em: 5 fev. 2020.

Se pensarmos as práticas de leitura de hipertextos em suportes digitais


observamos a importância da qualidade da interface para que a leitura seja um
ato prazeroso.

Destaca-se que, além dos dispositivos digitais necessitarem possuir uma


interface de navegação intuitiva, outras características são importantes para a
qualificação e fluidez da leitura de textos digitais. Para Castro (2013, p. 147) “a
incorporação dos meios digitais na contemporaneidade tem levado o leitor a
novas formas de interação e navegação [...] é preciso saber lidar com a interface
desses textos materializados e principalmente saber navegar e buscar informações
neles”; apesar das múltiplas vantagens que apresentam (Quadro 1).

QUADRO 1 – VANTAGENS E DESVANTAGENS DO E-BOOK


Vantagens Desvantagens
Acesso a milhares de documentos Preferência do leitor pelo formato
impresso
Pesquisa rápida Intermediação de aparelho de leitura
Controle de luminosidade [backlight] Intermediação de software para leitura
(e-reader)
Dicionário disponível pelo e-reader Alto preço
Sublinhar e marcar texto Analfabetismo tecnológico
Versatilidade na orientação do texto (retrato Necessidade de recarregar a bateria do
ou paisagem) aparelho leitor
Criação de biblioteca pessoal Burocratização do processo de compra
online
Grande capacidade de armazenamento Possibilidade de aumento da pirataria,
plágio e falsificação
Tamanho de um livro de papel (14x21 – em Incerteza sobre preservação de dados
média) em formato digital

182
TÓPICO 1 - LEITURA NO CONTEXTO DIGITAL: PROCESSOS E ESTRATÉGIAS

Compatibilidade com vários aparelhos Maior controle por parte das editoras
Níveis de segurança (criptografia) Certificação digital
Marcador de página Obsolescência tecnológica
Bloco de anotações Dúvidas sobre o futuro do direito
autoral
Controle de brilho Inexistência de interoperabilidade
entre os formatos de livros eletrônicos
e aparelhos
Busca por palavras Leitura cansativa
Ajuste ao tamanho e tipo da fonte Comercialização somente via internet,
prejudica os que não têm acesso
Acesso rápido às livrarias on-line e Exclusão digital
bibliotecas digitais (acesso Wi-Fi através do
e-reader)
Possibilita o autor de publicar seu próprio Comercialização de poucos títulos em
ebook formato digital
Memória expansível (e-reader) Ausência de bibliotecas que realizam
empréstimo de e-books
Baterias duradouras (podendo durar dias ou
semanas — e-reader)
Aparelho leve (e-reader)
Leitura na nuvem
FONTE: Adaptado de Batista (2018, p. 19-20)

NOTA

“Alguns e-books têm a opção de áudio para leitores, denominada áudio book.
Tal recurso pode ser utilizado por quem tem algum tipo de deficiência, por exemplo,
cegueira, ou por quem tem dificuldades em realizar a leitura” (BATISTA, 2018, p. 18).

Nas práticas de leitura passamos do contato com o papel ao contato com


múltiplas telas, móveis ou fixas, “a leitura é expandida por intermédio das telas
dos celulares, e-readers, computadores e tablets. Essa diversificação na forma de
leitura possibilita ao leitor várias formas de interação com o livro” (BATISTA,
2018, p. 16).

Para melhor ilustrar os elementos envolvidos na composição de um livro


digital, que afetam a navegabilidade no ato de leitura, vamos analisar a estrutura
de um e-book (Figura 8), “abreviação inglesa de electronic book, livro em formato
digital, que pode ser lido em equipamentos eletrônicos tais como computadores,
PDAs ou até mesmo em celulares que suportam esse recurso” (PAIVA, 2010, p.
84).

183
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

FIGURA 8 – COMPOSIÇÃO DO E-BOOK

FONTE: Os autores

DICAS

Assista à pesquisadora Ana Elisa Ribeiro, no Simpósio Hipertexto e Tecnologias


na Educação, discutindo o atributo do objeto de conhecimento (o livro). Disponível em:
https://youtu.be/LTM7GEatzWA.

Livros digitais podem ser encontrados em vários formatos. Para


Procópio (2010), é uma problemática e motivo pelo qual o livro
eletrônico ainda não havia se tornado tão popular. Os formatos mais
comuns citados pelo autor são: ASCII, TXT, HTM, HTML, CHTML,
XHTML, XML, OPF, LIT, PRC, PDB, PDF, WAP, x-doc, WML,
DocPalm, RTF, RB, EXE, SWF, KML, HLP, TK3, ePub etc., apesar
de alguns arquivos citados não serem necessariamente um e-book.
Desses diversos formatos, existem os específicos para e-readers e outros
que podem ser lidos em diversos aparelhos, como computadores e
celulares e os aparelhos leitores. Alguns formatos são mais populares
entre os leitores de livros digitais, entre estes se destacam: PDF, EPUB,
MOBI (e suas variações) (BATISTA, 2018, p. 27).

AUTOATIVIDADE

Faça uma pesquisa sobre e-books interativos e sua aplicabilidade em


atividades de ensino.

184
TÓPICO 1 - LEITURA NO CONTEXTO DIGITAL: PROCESSOS E ESTRATÉGIAS

3 O PAPEL DO PROFESSOR FORMADOR DO ALUNO


LEITOR E O DESENVOLVIMENTO DE ESTRATÉGIAS DE
MEDIAÇÃO DA LEITURA
O processo de mediação envolve os procedimentos metodológicos
de ensino e de avaliação, o material didático utilizado e a relação
afetiva estabelecida entre os participantes: professor e aluno. Assim,
na mediação o professor pode ficar atento a esses diferentes aspectos
com vistas a promover condições favoráveis para o processo ensino-
aprendizagem e os alunos percebem a presença ou não de tais fatores
(LEITE, 2006 apud SANTANA; ANDRADE, 2018, p. 842).

Professor e aluno têm papel importante no processo de mediação da


leitura que não é uma ação passiva, mas sim um processo de interação. Santana
e Andrade (2018) apontam, desta relação, algumas descobertas dos estudos
de Grotta (2006) em pesquisa sobre aspectos e experiências determinantes na
constituição do sujeito-leitor, destacando pontos importantes da descoberta
(Figura 9).

FIGURA 9 - ASPECTOS E EXPERIÊNCIAS DETERMINANTES NA CONSTITUIÇÃO DO SUJEITO-


-LEITOR

FONTE: Adaptado de Santana e Andrade (2018, p. 844)

Trindade (2015, p. 132) destaca que as mudanças nos processos de leitura


do novo milênio demandam “conhecimento e domínio sobre novas tecnologias
de leitura, torna-se imperativo para o mediador do conhecimento, no caso o
professor, o acompanhamento dessas mudanças”. Para a autora, os educadores,
frente a esse desafio, devem estar preparados para acompanharem as mudanças
nos processos de leitura e navegar, de forma natural, “nos novos meios de leitura
e diferentes suportes” (TRINDADE, 2015, p. 133).

A escola apesar de não ser, geralmente, o espaço inicial em que o educando


tem contato com a leitura do texto digital, sendo que na atualidade logo antes dos
primeiros passos a criança já tem acesso à tela digital (Figura 10).

185
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

FIGURA 10 – CONTATOS COM A TELA DIGITAL NA INFÂNCIA

FONTE: <https://abrilexame.files.wordpress.com/2019/04/gettyimages-453926159.jpg?quali-
ty=70&strip=info&resize=680,453>. Acesso em: 5 fev. 2020.

Ao longo do desenvolvimento do ensino da leitura, cabe ao educador


atuar tanto como mediador do processo de leitura quanto da inclusão digital
do aluno para que este atue de forma crítica frente à navegação em textos nos
espaços digitais onde circulará.

DICAS

A tecnologia pode ser um fator determinante de avanços na educação.


As pesquisadoras Maria Elisabeth de Almeida e Roseli Lopes discutem os benefícios
da tecnologia na escola como forma de inclusão social. Assista à entrevista com as
pesquisadoras. Disponível em: https://youtu.be/nIxPP-253mU.

O docente deve ser um profissional comprometido com o projeto de


leitura e apresentar estratégias para orientar seus alunos, tornando-se
assim, um mediador do processo, abrindo espaços, lançando desafios,
valorizando a caminhada dos alunos, desenvolvendo competências nas
dimensões cognitivas, emocionais, sensoriais e culturais (FORTESKI;
OLIVEIRA; VALÉRIO, 2011, p. 124).

Silva (1998 apud FORTESKI; OLIVEIRA; VALÉRIO, 2011) destaca


aspectos fundamentais da leitura (Figura 11) que devem ser base na proposta de
desenvolvimento de atividade mediadora.

186
TÓPICO 1 - LEITURA NO CONTEXTO DIGITAL: PROCESSOS E ESTRATÉGIAS

FIGURA 11 – FATORES DE LEITURA PARA PRÁTICAS DE MEDIAÇÃO

FONTE: Os autores

De acordo com esta proposta o docente deve trabalhar com textos do


contexto real dos alunos; dessa forma, a inserção de gêneros digitais em atividades
de ensino é uma consequência natural no cenário contemporâneo.

Por isso, é fundamental ao educador:

[...] não somente reconhecer novos suportes de leitura, mas também


diversos conteúdos como textos a serem lidos, que exigem habilidades
de leitura diferentes. E [...] reconhecer que existem mais formas de
interação, e quanto mais possibilidades de formar produtores que
dominem habilidades de produção de conteúdo, melhor (ALMEIDA;
CERIGATTO, 2016, p. 222).

Na visão de Coscarelli (2006, p. 1), “sair do papel e ir para uma página


digital vai modificar a forma de navegação naquele texto, mas nem sempre
essa mudança é tão radical assim, por pelo menos dois motivos: um deles é que
nenhum texto é linear e o segundo é que nenhuma leitura é linear”.

187
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

E
IMPORTANT

O texto, agora também disponibilizado em telas digitais, não deixa de


trazer novos contextos de aquisição de informação, além de imprimir inovações no
comportamento dos leitores. Professores, como uns dos principais atores neste contexto,
devem considerar que não é nem deve ser apenas um processo de mudanças vazio, de
tecnologia por tecnologia, mas de tecnologia por transformação significante e efetiva.

BERNARDO, J. C. O; KARWOSK, A. M. A leitura em dispositivos digitais móveis. Educação


Temática Digital, Campinas, v. 19, n. 4, p. 795-807, out./dez., 2017. p. 796. Disponível em:
https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/etd/article/view/8646355/16864. Acesso
em: 5 fev. 2020.

Castro (2013, p. 147), em seus estudos sobre navegação e trajetos de leitura,


visa identificar se “Os leitores de textos impressos são bons navegadores em
textos de ambientes digitais? Os leitores de textos digitais são bons navegadores
em textos impressos?”. A autora aponta, também, — dentre outras descobertas
(Figura 12) — que saber “navegar nos ambientes digitais, hoje, é uma habilidade
imprescindível” (CASTRO, 2013, p. 147).

FIGURA 12 – NAVEGAÇÃO EM TEXTOS DIGITAIS

FONTE: Os autores

Para a autora a “diferença do impresso para o digital não é a compreensão,


mas sim os gestos de navegação e leitura” (CASTRO, 2013. p. 160). Sendo que, na:

188
TÓPICO 1 - LEITURA NO CONTEXTO DIGITAL: PROCESSOS E ESTRATÉGIAS

Revista impressa [Figura 13], as reportagens possuem mais cores


e mais imagens que na versão digital [Figura 14] e o sumário segue
uma dinâmica bastante diferente e em forma de infográfico. Um texto
multimodal, ou seja, que integra modalidades semióticas bastante
utilizado pelo jornalismo em notícias e reportagens de divulgação
científico-tecnológica (CASTRO, 2013, p. 149).

FIGURA 13 – REVISTA IMPRESSA

FONTE: Castro (2013, p. 150)

FIGURA 14 – REVISTA DIGITAL

FONTE: Castro (2013, p. 150)

189
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

Como fatores de diferença nos suportes, Castro (2013, p. 149) destaca que
“na revista impressa, as reportagens possuem mais cores e mais imagens que na
versão digital e o sumário segue uma dinâmica bastante diferente e em forma de
infográfico”. Outro ponto ressaltado pela autora é de que a revista impressa se
constitui em “um texto multimodal, ou seja, que integra modalidades semióticas
bastante utilizado pelo jornalismo em notícias e reportagens de divulgação
científico-tecnológica” (CASTRO, 2013, p. 149).

Nesta direção, Almeida e Cerigatto (2016, p. 226) defendem que se deve:

[...] fomentar as novas alfabetizações, valorizando as habilidades de


leitura do leitor contemporâneo. Valorizar as leituras ligadas por meio
de hiperlinks, não-sequencial, que exigem habilidades para entender o
significado não só da palavra impressa, mas do som, do vídeo, diante
da tela do computador, do tablete, do celular, podem ser atividades a
serem desenvolvidas.

Estratégias pedagógicas com uso de diferentes abordagens metodológicas;


tais como: SEQUÊNCIA DIDÁTICA, APRENDIZAGEM BASEADA EM
PROJETOS (Project-Based Learning — PBL) ou Aprendizagem Baseada em
Problemas (Problem-Based Learning — PBL) são formatos com grande potencial
de contribuir em situações de ensino que visem a leitura no contexto digital.
A sequência didática em razão de poder apontar de forma processual o
desenvolvimento do aluno; e a aprendizagem baseada em projetos pode se
alinhar as metas de ensino ou as metas de aprendizagem em aplicações práticas
de pesquisa com envolvimento com temas do mundo social.

Em relação aos usos de dispositivos digitais para o desenvolvimento da


leitura, desponta como um dos mais usados os dispositivos móveis que surgem
“como exímios suportes de texto e vêm naturalmente promover a ubiquidade
no processo informativo. [...] novo espaço de leitura e de leitores, sobretudo do
leitor ubíquo caracterizado pela hipermultimodalidade textual, familiarizado
com o touchscreen e o aparato técnico da tecnologia móvel digital” (SANTAELLA
2013 apud BERNARDO e KARWOSKI 2017, p. 796). Os autores alertam que:

[...] no contexto atual, devemos considerar de fato que experiências de


leitura em dispositivos móveis digitais são ainda bem recentes, estão em
processo de consolidação, sobretudo diante da tradição de séculos da
leitura em papel. A leitura em dispositivo móvel digital é um processo
real, mas, em muitas circunstâncias, ainda em amadurecimento. Tanto
em papel quanto em tela digital, a leitura apresenta seus valores de
cognição, sendo relevante o que nos confirma Ribeiro (2009), quando
declara que se o mundo oferece as possibilidades de papel e de cristal
líquido, então é bom que o leitor saiba que pode ter o domínio de todas
(BERNARDO; KARWOSKI 2017, p. 801).

Dessa forma, o que se observa é ainda um caminho em construção de novos


modos de ler e interagir com o texto que agora se apresenta — mais intensamente
— multimodal e hipertextual. Cabe à escola e ao educador desbravar esse caminho
e preparar seus estudantes para esses novos movimentos.

190
TÓPICO 1 - LEITURA NO CONTEXTO DIGITAL: PROCESSOS E ESTRATÉGIAS

O uso da tecnologia no ensino e aprendizagem da leitura

Elizabete Nobre de Azevedo


Fábio Augusto Steyer

Não há mais como fugir das inovações tecnológicas, pois elas já


fazem parte do nosso cotidiano. É preciso acrescentá-la nas salas de aulas
para chamar a atenção dos estudantes, auxiliar a vida do professor e ajudar
também na formação do educando. À medida que o professor se apropria do
domínio dessa tecnologia e começa a utilizá-la com fins didáticos, ele inova
suas aulas deixando-as atraentes e com mais qualidade do ensino, preparando
o aluno para encarar o mundo atual, onde os conhecimentos tecnológicos são
fundamentais para a sua inserção social, cultural e econômica. A educação
na era tecnológica é importante, pois são nos ambientes educativos que
se desenvolvem as competências e as habilidades que possibilitam meios
para que o sujeito possa exercer a sua cidadania. Para Libâneo (1986, p. 17)
“cada sociedade precisa cuidar da formação dos indivíduos, auxiliando no
desenvolvimento de suas capacidades físicas e espirituais, prepará-los para a
participação ativa e transformadora nas várias instâncias da vida social”.

A educação também precisa cuidar da formação dos indivíduos, e ela


vem ao encontro do desafio de um mundo que passa por rápidas transformações,
possibilitando ao leitor acompanhar a inovação tanto em sua vida particular
como em sua vida profissional. Sem esquecer que “toda prática educativa
demanda a existência de sujeitos, um que ensinando, aprende, outro que,
aprendendo, ensina” (FREIRE, 1996, p. 69). É necessário que haja uma relação
mútua entre o professor e o aluno, estabelecendo um vínculo que possibilite o
estado de confiança, prazer e motivação, de maneira a canalizar o interesse do
aluno em aprender e a despertar a vocação do professor em ensinar.

Como o que se pretende com este projeto é justamente despertar o


interesse e o prazer pela leitura, o espaço virtual possibilitará um trabalho
com diversos gêneros textuais, um deles é o hipertexto, que atua como forma
de motivação para o aluno. O uso dos hipertextos se justifica, pois favorece a
intertextualidade em todos os seus níveis. Conforme Rosa (2006, p. 122):

[...] o hipertexto favorece ao não-encerramento. Os links, capazes de


colocá-lo num constante estado me metamorfose, abrem infinitas
possibilidades de encadeamento. Assim, esses nexos eletrônicos
permitem aos usuários recorrer distintos trajetos de leitura em um
conjunto dado de lexias.

Assim, o professor pode provocar uma leitura crítica e plural,


desempenhando o seu papel de educador consciente e formador de opinião,
instigando em seus alunos a motivação (tão necessária) para a leitura e a escrita
realmente eficaz. E um dos meios pedagógicos que pode ser utilizado é a Internet
que permite a ampliação da comunicação humana a partir da integração da

191
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

oralidade, da escrita e do visual. A rede interliga palavras, sons e imagens,


oportunizando ao educando aprender a resolver situações conflitantes que
vivencia em seu dia-a-dia, adquirir capacidades de observação, imaginação e
gosto pelo saber.

Com as Novas Tecnologias, talvez seja mais fácil introduzir a criança


à cultura letrada. Segundo Papert (1984, p. 7), “as crianças entraram em um
apaixonante e duradouro caso de amor com os computadores, já que o que
elas fazem com os mesmos é tão variado quanto suas atividades”. Sabe-se que
a leitura abre caminho para o enriquecimento intelectual, propiciando reflexão
e manipulação de ideias e a criança que lê faz novas descobertas, empreende
novas viagens que aprofundam o conhecimento já adquirido e faz surgir
novidades. É também através da leitura que as crianças podem mergulhar
e se descobrirem como seres sociais com uma perspectiva de vida, pois ler é
basicamente abrir-se para novos horizontes, é ter possibilidades de experienciar
outra alternativa de existência.

De acordo com PCN Língua Portuguesa (BRASIL 1998, p. 71), “formar


leitores é algo que requer condições favoráveis, não só em relação aos recursos
materiais disponíveis, mas, principalmente, em relação ao uso que se faz deles
nas práticas de leitura.” Acredita-se que a leitura é enriquecida e complementada
pelos dispositivos digitais. Os artefatos conectados à rede podem oferecer
muitas possibilidades de acesso, consulta de dados linguísticos ou culturais,
busca de documentação, troca de opiniões entre leitores, entre outros recursos.
A internet oferece muito mais estímulos para ler e desfrutar da leitura.

Ler e escrever na Internet se tornou uma prática diária uma atividade


comum e muitas vezes prazerosa. As tecnologias atuais são também utilizadas
por internautas ainda em formação escolar. Com a repercussão dos espaços
da Web, nunca se leu e se escreveu tanto. Sendo assim, o espaço virtual é um
fenômeno cultural que não podemos ignorar, e o computador e a Internet são
instrumentos que, quando utilizados dentro de uma proposta pedagógica
consciente, podem contribuir na escola para um trabalho mais eficaz.

FONTE: <http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/cadernospde/pdebusca/produco-
es_pde/2014/2014_uepg_port_artigo_elizabete_nobre_de_azevedo.pdf>. Acesso em: 5 fev.
2020.

192
TÓPICO 1 - LEITURA NO CONTEXTO DIGITAL: PROCESSOS E ESTRATÉGIAS

DICAS

Agora que você já identificou a necessidade de perceber os espaços virtuais em


que a leitura se faz presente — e as composições que assume em contato com diferentes
interfaces — como forma de compreender o processo de mediação da leitura para o
contexto digital, pesquise uma experiência prática de uso de hipertextos em atividades de
ensino. Para aprofundar a reflexão sobre esta atividade sugerimos a leitura do artigo A leitura
em dispositivos digitais móveis de Bernardo e Karwosk. Nesta obra os autores mostram a
viabilidade da leitura em dispositivos móveis digitais. Disponível em: https://periodicos.sbu.
unicamp.br/ojs/index.php/etd/article/view/8646355/16864.

193
RESUMO DO TÓPICO 1

Neste tópico, você aprendeu que:

• Para refletirmos sobre os processos de mediação da leitura para o contexto


digital devemos compreender os espaços virtuais em que a leitura se faz
presente e as composições que assume em contato com diferentes interfaces.

• A mediação da leitura ocorre através da interação com a interface digital e com


o texto produzido (hipertexto). Que a influência das tecnologias promove uma
nova forma de ler, uma vez que os suportes virtuais dispõem de uma gama de
ferramentas interativas, a leitura, com o condicionamento de uma nova cultura
da tela.

• O processo de mediação da leitura na escola tem base, inicialmente, em


uma relação triádica estabelecida entre o professor, o aluno e o objeto de
conhecimento (leitura); e, que posterior a esta relação, que se estabelece a partir
da mediação do professor, o aluno, de forma já mais autônoma, inicia o contato
com o texto de forma mais subjetiva.

• O processo de leitura é sempre mediado por um disposto, eletrônico ou


não, com substrato que apresenta diferentes características, e a diferença do
impresso para o digital não é a compreensão, mas sim os gestos de navegação
e leitura.

• A incorporação dos meios digitais na contemporaneidade tem levado o leitor


a novas formas de interação e navegação, sendo preciso saber lidar com a
interface desses textos materializados e principalmente saber navegar e buscar
informações neles.

• O processo de mediação envolve os procedimentos metodológicos de ensino e


de avaliação, o material didático utilizado e a relação afetiva estabelecida entre
os participantes: professor e aluno. E que a inserção de gêneros digitais em
atividades de ensino é uma consequência natural no cenário contemporâneo.

194
AUTOATIVIDADE

1 Sendo a leitura um elemento importante no processo ensino-aprendizagem,


ela perpassa, atualmente, por um contexto de repensar essa prática
pedagógica. Essa reflexão vem exigindo, ainda, uma análise e compreensão
do contexto em que se vai intervir, para possíveis adaptações ou mudanças.
Uma das mudanças que se pode realizar para a prática prazerosa da leitura
é o uso do computador como suporte dos mais diversos textos presentes
entre os jovens, pois vem revelando grande influência no desenvolvimento
das habilidades de leitura. Além disso, as inovações tecnológicas vêm se
impondo atualmente de uma forma bastante rápida, exigindo modificações
na postura docente e no encaminhamento dos conteúdos escolares.

FONTE: AZEVEDO, E. N.; STEYER, F. A. O uso da tecnologia no ensino e aprendizagem da


leitura. Cadernos PDE. Curitiba, 2014. Disponível em: http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.
br/portals/cadernospde/pdebusca/producoes_pde/2014/2014_uepg_port_artigo_elizabe-
te_nobre_de_azevedo.pdf. Acesso em: 24 jan. 2020.

Segundo Trindade (2015), o professor mediador que assume tal desafio


aprende que as novas tecnologias, a comunicação interativa, assim como a
aprendizagem colaborativa na rede, pode ampliar:

a) ( ) A formação de leitores em ambientes diversos como bibliotecas


públicas municipais, escolas, fábricas, empresas.
b) ( ) Negativamente o desenvolvimento da capacidade cognitiva do aluno
como a memória, a percepção e o raciocínio.
c) ( ) Positivamente o desenvolvimento da capacidade cognitiva do aluno
como a memória, a percepção e o raciocínio.
d) ( ) A experiência de leitura causando mudanças fundamentais e
abrangentes na maneira como lemos.
e) ( ) A incorporação dos meios digitais na contemporaneidade e levar o
leitor a novas formas de interação e navegação.

2 A internet tem gerado diferentes lógicas que a sociedade moderna


desconhece, uma vez que a lógica do mundo digital parece abandonar o
pensamento ocidental porque dissolve as ideias de significados objetivos,
unitários, de historicidade unilinear e privilegiar a não sistematização, os
pensamentos mais livres e subjetivos. Ela torna contingente o espaço-tempo
ordinário, abrindo novos meios de interação e ritmo de cronologias inéditas
(LÉVY, 1996), que se incorporam às nossas práticas sociais a uma velocidade
nunca imaginada. Isso favorece a conscientização da multiplicidade de
culturas, cada qual com sua lógica e racionalidade, próprias e individuais.

As diferentes lógicas, que cercam o ensino/aprendizagem de línguas


principalmente o mediado por TDIC, e as diferentes formas de pensar exigem
o diálogo e a comunicação entre culturas.

195
Novos agentes, novas experiências são reveladas e discutidas, alargando a
base dos debates produzidos pelas críticas da modernidade à herança colonial.
Santos, afirma que:

não há, pois, como fugir à proposta de uma epistemologia que


nos permita caminhar no meio de tanta incerteza e que permita
ver esta, não como um constrangimento, mas antes como o outro
lado da capacitante afirmação de uma insuspeita e inesgotável
diversidade dos saberes e das experiências humanas. [...], que
o ser humano é um ser condenado a transformar necessidade
(finitude, sustentabilidade) em liberdade (diversidade, infinitude)
(SANTOS, 2010, p. 536).

No contexto ocidental atual, de exigências plurilinguistas e multiculturalistas,


a aprendizagem de línguas e de culturas estrangeiras e o domínio de estratégias
de leitura e escrita de gêneros textuais digitais são habilidades que se tornam
indispensáveis. No entanto, como professora de línguas, portuguesa e inglesa,
muitas questões vêm me inquietando sobre esse contexto social digital no qual
estamos (con)vivendo. Na busca por desvendar novas práticas sociais que têm
se instaurado a partir da democratização do saber promovida pela Internet
e suas tecnologias, encontramos a valorização da leitura, uma vez que o
acesso aos materiais digitais se realiza, a princípio, por meio dessa habilidade
linguística, sendo também, uma das mais exigidas pelos diversos segmentos
sociais, em especial o acadêmico. Em virtude do que foi exposto realizamos
uma pesquisa que buscou compreender como os alunos vêm significando a
leitura de gêneros digitais no contexto escola.

FONTE: BACALÁ, V. L. A Leitura de novos gêneros digitais: multiletramentos em construção.


In: SIMPÓSIO INTERNACIONAL DE ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA, 6., 2014, Uberlân-
dia. Anais [...]. Uberlândia: EDUFU, 2014. Disponível em: http://www.ileel.ufu.br/anaisdosielp/
wp-content/uploads/2014/11/1686.pdf. Acesso em: 5 fev. 2020.

Sobre a leitura no contexto digital, avalie as afirmações a seguir:


I- No contexto atual, devemos considerar, de fato, que experiências de leitura
em dispositivos móveis digitais são ainda bem recentes, estão em processo
de consolidação, sobretudo diante da tradição de séculos da leitura em
papel.
II- Os leitores de textos digitais, geralmente, possuem algum conhecimento
desses ambientes. Mesmo o foco desse estudo sendo leitura de revista e
alguns deles não sendo assíduos desse gênero, os leitores utilizaram seus
conhecimentos prévios para fazer a busca.
III- Almeida e Cerigatto (2016) defendem que se deve fomentar o letramento
literário, valorizando as habilidades de leitura do leitor contemporâneo.

Sobre as assertivas anteriores, é correto o que se afirma em:


a) ( ) I, apenas.
b) ( ) II, apenas.
c) ( ) I e II.
d) ( ) II e III.
e) ( ) I, II e III.
196
TÓPICO 2 -
UNIDADE 3

TECNOLOGIAS DIGITAIS E O LETRAMENTO


LITERÁRIO

1 INTRODUÇÃO
A tecnologia cada vez mais se faz presente em todas as ações humanas e a
leitura de textos literários não é uma exceção.

Em nosso cotidiano, percebemos cada vez mais o uso de dispositivos


móveis para atos de leitura que antes eram restritas ao livro impresso. Os e-books
se popularizaram, e a existência de recursos digitais para sua leitura também. Os
leitores de e-books possibilitaram levar consigo um número expressivo de obras
que podem ser acessadas no momento e lugar desejado pelo leitor, emergindo
deste ato o letramento literário consonante o letramento digital.

Com base na compreensão de como o texto vai assumindo especificidades


próprias, este tópico tem como meta compreender o letramento literário no
contexto digital.

2 LETRAMENTO LITERÁRIO
Letramento  é palavra que corresponde a diferentes conceitos,
dependendo da perspectiva que se adote: antropológica, linguística,
psicológica, pedagógica. É sob esta última perspectiva que a palavra
e o conceito são aqui considerados, pois foi no campo do ensino
inicial da língua escrita que letramento – a palavra e o conceito – foi
introduzido no Brasil (SOARES, 2014, s.p.).  

Para compreendermos o termo letramento literário devemos retroceder


à criação da terminologia letramento que surgiu na década de 1990 através de
pesquisas de Kleiman (1995) e Soares (1998), inicialmente:

[...] em decorrência da necessidade de configurar e nomear


comportamentos e práticas sociais na área da leitura e da escrita que
ultrapassem o domínio do sistema alfabético e ortográfico, nível de
aprendizagem da língua escrita perseguido, tradicionalmente, pelo
processo de alfabetização (SOARES, 2017, p. 62).

Observa-se que o termo letramento surge entrelaçado ao conceito de


alfabetização, e vai ao encontro do:

197
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

[...] exercício efetivo e competente da tecnologia da escrita, que


implica habilidades várias, tais como: capacidade de ler ou escrever
para atingir diferentes objetivos – para informar ou informar-se, para
interagir com outros, para imergir no imaginário, no estético, para
ampliar conhecimentos, para seduzir ou induzir, para divertir-se,
para orientar-se, para apoio à memória, para catarse [...]; habilidades
de interpretar e produzir diferentes tipos e gêneros de textos [...]
(SOARES, 2003b, p. 91-92).

Estudos posteriores de Street (2007) e Rojo (2009) vão introduzir o conceito


de letramento múltiplos como forma de contemplar múltiplas variedades
de práticas sociais que envolvem o processo de leitura e escrita no contexto
contemporâneo. De acordo com Rojo (2009) letramentos múltiplos:

[...] envolve, além da questão da multissemiose ou multimodalidade


das mídias digitais que lhe deu origem, pelo menos duas facetas: a
multiplicidade de práticas de letramento que circulam em diferentes
esferas da sociedade e a multiculturalidade, isto é, o fato de que
diferentes culturas locais vivem essas práticas de maneira diferente
(ROJO, 2009, p. 108-109).

Na atualidade, o termo letramento foi sendo usado como forma de


conceituar as práticas sociais de usos da linguagem nas mais distintas abordagens
e denominações (Figura 15).

FIGURA 15 – DIFERENTES TIPOS DE LETRAMENTO

FONTE: Os autores

198
TÓPICO 2 - TECNOLOGIAS DIGITAIS E O LETRAMENTO LITERÁRIO

Dentre os tipos de letramento mais relevantes aos nossos estudos sobre a


mediação da leitura em contextos digitais, se destacam o letramento digital e o
letramento literário. Entretanto, antes de entrarmos na discussão destes conceitos
vamos nos deter a definir duas expressões geralmente relacionadas ao letramento:
práticas de letramento e eventos de letramento.

A distinção entre esses termos (Quadro 2) se faz necessária na medida que


são modelos analíticos “que buscam compreender os usos e os significados da
escrita e da leitura para diferentes grupos sociais e as consequências educacionais,
políticas e sociais de tais usos e significados para os indivíduos e para os grupos
a que pertencem” (STREET; CASTANHEIRA, 2014, s.p.).

QUADRO 2 – DISTINÇÃO ENTRE PRÁTICAS E EVENTOS DE LETRAMENTO

Eventos de letramento Práticas de letramento


Refere-se aos elementos mais observáveis São comportamentos exercidos pelos
das atividades que envolvem a leitura e a participantes em um evento de letramento,
escrita. onde as concepções sociais que o
configuram determinam sua interpretação
e dão sentido aos usos da leitura e/ou
escrita naquela situação particular.
Ocasião em que algo escrito é Possibilita ampliar e detalhar a análise
constitutivo da interação e dos processos e a interpretação tanto das práticas
interpretativos dos participantes, ou seja, sociais que envolvem a linguagem escrita
é o que podemos observar que as pessoas quanto das concepções de escrita e leitura
estão fazendo quando estão usando a predominantes num grupo social.
escrita e a leitura.
Ocorrem em diferentes espaços sociais, Referem-se tanto ao comportamento
assumem diferentes formas e têm funções quanto à conceituação social e cultural que
variadas. confere significado aos usos da leitura e/
ou da escrita.
No cotidiano de uma sala de aula podem Englobam os comportamentos exercidos
ser identificados em situações em que pelos participantes do evento e também as
professor e alunos conversam sobre um suas concepções sociais e culturais.
livro lido pela turma ou sobre uma notícia
de jornal comentada por um aluno.
Distancia-se do contexto imediato em
que os eventos ocorrem, para situá-los e
interpretá-los em contextos institucionais
e culturais.
São múltiplas e diversas, pois dependem
das formas como as pessoas e grupos
sociais integram a língua escrita em seu
cotidiano e dos processos e estratégias
interpretativas utilizadas pelos
participantes de um processo de interação.
FONTE: Os autores

199
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

Compreendido estes termos, vamos nos deter à análise do letramento


digital e sua correlação com o letramento literário. O termo, Letramento Digital:

[...] assim como o letramento, diverge em seu conceito, pois são


várias as definições encontradas para designar o letramento
digital. Acreditamos que isso ocorre porque as tecnologias digitais
possibilitam uma gama variada e diversificada de práticas sociais
e porque surgem novas ferramentas e novas possibilidades muito
rapidamente. Dentre essas definições, muitas delas têm como âncora
a escrita, haja vista serem os atos de ler e escrever o cerne de muitos
conceitos de letramento (PINHEIRO, 2018, p. 606).

Para Ribeiro e Coscarelli (2014, s.p.), letramento digital refere-se “às


práticas sociais de leitura e produção de textos em ambientes digitais, isto é, ao
uso de textos em ambientes propiciados pelo computador ou por dispositivos
móveis [...] em plataformas como e-mails, redes sociais na web, entre outras”.
Para as autoras “saber ler e produzir textos explorando essas linguagens faz parte
das competências dos digitalmente letrados, com exigências sociais e motivações
pessoais cada vez mais precoces (RIBEIRO; COSCARELLI, 2014, s.p.)”; destacam
que dois aspectos são relevantes quando se trata de letramento digital: a) o acesso
à informação, devendo o leitor “estar mais atento do que nunca à autoria, à fonte
da informação, além de ter senso crítico para avaliar o que encontra (RIBEIRO;
COSCARELLI, 2014, s.p.)”; e b) a presença da multimodalidade.

Pinheiro (2018, p. 612), em seus estudos sobre letramento digital na


educação básica, identificou que “grande parte das práticas de letramento digital
dos alunos fora da escola pode ser considerada de usos que mesclam várias
modalidades, como oral, escrita, visual, não tendo primazia nenhuma delas”.

Dilcinho Silva (2018) com base em Coscarelli e Ribeiro (2007), Soares


(2002), Tapscott (1999) — corroborado por Gilster (2006) — destaca a importância
da inserção das tecnologias digitais na escola como forma de ampliar competência
nas práticas de leitura digital (Figura 16) e de escrita dos estudantes possibilitando
aprendizagem significativa e a ressignificação das práxis docente.

200
TÓPICO 2 - TECNOLOGIAS DIGITAIS E O LETRAMENTO LITERÁRIO

FIGURA 16 – COMPETÊNCIAS DA LEITURA DIGITAL

FONTE: Os autores

E
IMPORTANT

Gilster (2006 apud MOREIRA, 2012, p. 4) enfatiza que “muitas fontes de


informação, alguns autores estão comparando conhecimentos técnicos de informática
com pensamento crítico, para que o sujeito seja considerado letrado digitalmente”.

De forma ilustrativa, Moreira (2012) e Ribeiro (2009) apontam as nuances


do letramento e do letramento digital (Figura 17).

201
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

FIGURA 17 – LETRAMENTO E LETRAMENTO DIGITAL

Letramento

FONTE: Adaptado de Moreira (2012) e Ribeiro (2009)

Ribeiro (2009a, p. 19) também destaca que “não há um limite para o


letramento, ele é infi nito. A razão disso é que a humanidade sempre inventará
formas novas de escrever, novos gêneros de texto, suportes de leitura etc., de
acordo com as infi nitas necessidades que temos e teremos, fazendo com que nosso
horizonte de letramento esteja sempre em expansão”. É com base nessa premissa
que consideramos — quando se discute as práticas de leitura no ciberespaço —
importante a compreensão do letramento literário desenvolvido nos espaços
digitais com base nas especifi cidades de promoção do letramento digital.

202
TÓPICO 2 - TECNOLOGIAS DIGITAIS E O LETRAMENTO LITERÁRIO

NOTA

Para Cosson (2010) são três tipos os espaços que a literatura deve ocupar em
sala de aula: o espaço do texto: é análise que compreende sua elaboração e seu sentido,
trata da necessidade de aprendizagem da qual é preciso o contato permanente com o texto
e a mediação do professor; o espaço do contexto: é a mensagem explícita no texto, um
saber sobre outra área, são outras referências que o texto carrega; o espaço do intertexto:
seria a intertextualidade, ou seja, é a relação, o diálogo entre textos.

FONTE: MONTEIRO, M. C.; SILVA, G. B. Letramento literário: um desafio para o ensino de


língua. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL D REPRESENTAÇÕES SOCIAIS, SUBJETIVIDADE E
EDUCAÇÃO, 4.; SEMINÁRIO INTERNACIONAL SOBRE PROFISSIONALIZAÇÃO DOCENTE, 6.,
2017, Curitiba. Anais [...]. Curitiba: EDUCERE; PUC-PR, 2017. p. 7439. Disponível em: https://
educere.bruc.com.br/arquivo/pdf2017/26277_13448.pdf. Acesso em: 5 fev. 2020.

Cosson (2010 apud MONTEIRO; SILVA, 2017) destaca que literatura e


educação se correlacionam de forma direta desde a Antiguidade como forma
de manifestação da cultura, de modo que o letramento literário se insere nas
práticas educativas como meio de “formar um leitor capaz de se inserir em
uma comunidade, manipular seus instrumentos culturais e construir com eles
um sentido para si e para o mundo em que vive (COSSON, 2011, p. 106)”. O
letramento literário emerge, neste contexto, como “o processo de apropriação da
literatura enquanto construção literária de sentidos (PAULINO; COSSON, 2009,
p. 67)”.

Letramento literário é o processo de apropriação da literatura enquanto


linguagem. Para entendermos melhor essa definição sintética, é
preciso que tenhamos bem claros os seus termos. Primeiro, o processo,
que é a ideia de ato contínuo, de algo que está em movimento, que
não se fecha. Com isso, precisamos entender que o  letramento
literário começa com as cantigas de ninar e continua por toda nossa
vida a cada romance lido, a cada novela ou filme assistido. Depois, que
é um processo de apropriação, ou seja, refere-se ao ato de tomar algo
para si, de fazer alguma coisa se tornar própria, de fazê-la pertencer
à pessoa, de internalizar ao ponto daquela coisa ser sua. É isso que
sentimos quando lemos um poema e ele nos dá palavras para dizer o
que não conseguíamos expressar antes (COSSON, 2014, s.p.).

De acordo com Rouxel (2013 apud MONTEIRO; SILVA, 2017) podem ser
mobilizados três tipos de saberes (Figura 18) no letramento literário, sendo vital
que o educador privilegie a diversidade na escolha das obras literárias que serão
usadas em sala de aula.

203
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

FIGURA 18 – SABERES MOBILIZADOS NO LETRAMENTO LITERÁRIO

FONTE: Adaptado de Rouxel (2013 apud MONTEIRO; SILVA 2017, p. 7436)

No que tange às práticas de ensino para o letramento literário, Monteiro e


Silva (2017) apresentam, com base em determinados teóricos, três propostas que
agora vamos conhecer. A primeira, tem como foco a relação do leitor com o texto
literário com base em determinados subsídios teóricos, tais como:

a) A articulação a leitura crítica, da análise e da interpretação do texto


literário para os alunos atingirem um discurso crítico partindo do
reconhecimento das singularidades estéticas do fazer literário;
b) A apresentação das distinções entre os gêneros literários,
percebendo também o diálogo entre as características de diversos
gêneros numa mesma obra literária;
c) A análise da obra literária sob um olhar interdisciplinar,
relacionando-a entre, por exemplo, Literatura e Sociologia,
Literatura e História, Literatura e Psicanálise;
d) O desenvolvimento de estudos da obra literária com base no
interculturalismo;
e) Desenvolvimento de estudos intersemióticos, considerando as
relações entre literatura e outras expressões artísticas (literatura
e pintura ou literatura e música por exemplo) (SILVA, 2003 apud
MONTEIRO; SILVA, 2017, p. 7437).

A segunda proposta tem como fundamento a aplicação de Oficinas


de Leitura que, com base em Girotto e Souza (2010), se organiza em três fases
distintas (Figura 19).

204
TÓPICO 2 - TECNOLOGIAS DIGITAIS E O LETRAMENTO LITERÁRIO

FIGURA 19 – OFICINAS DE LEITURA

FONTE: Adaptado de Girotto e Souza (2010 apud MONTEIRO; SILVA, 2017, p. 7438)

A terceira proposta seria realizada através de eventos de leitura literária


objetivando tornar o texto literário “mais acessível; familiarizar os alunos com
todos os gêneros; permitir a experiência de escrever literatura; compreender e
explicar que nem todas as literaturas são válidas; procurar trabalhar sempre com
textos integrais” (MONTEIRO; SILVA, 2017, p. 7439).

3 A LEITURA E O TEXTO, LEITURA E NOVAS


TECNOLOGIAS
A pluralidade de leituras e de sentido pode ser maior ou menor
dependendo do texto, do modo como foi constituído, do que foi
explicitamente revelado e do que foi implicitamente sugerido, por um
lado; da ativação por parte do leitor, de conhecimentos de natureza
diversa (KOCH; ELIAS, 2008, p. 22).

Quando pensamos a relação entre leitura e o texto — aqui considerado


como algo inacabado, como algo que se constrói por meio de uma atividade
interativa construtora de sentidos (KOCH, 2002) — devemos articular à esta
temática o processo de produção de sentidos.

Vamos conhecer algumas abordagens teóricas sobre como se dá a produção


de sentidos na leitura de um texto.

205
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

Uma das pesquisadoras mais conhecidas da linguística textual, Ingedore


Grünfeld Villaça Koch, em seus estudos sobre os sentidos do texto defende que “o
leitor age como construtor de sentido, utilizando-se de estratégias como seleção,
inferência e verificação” (KOCH; ELIAS, 2008).

Para a autora, o leitor ativo “traz alguns conhecimentos que se realizam


por meio de estratégias distintas como: i) cognitivas, que são as inferências;
(ii) sociointeracionais, a partir da relação com o(s) outro(s) e (iii) textuais que
são relativas à textualização, feitas pelo autor do texto, buscando alcançar sua
intenção, através de marcas” (KOCH, 2002 apud MORAIS; SANTANA, 2011, p. 4).

O conceito de inferência “não é homogéneo (Quadro 3), pois cada


pesquisador o define de maneira distinta, de acordo com o tipo de pesquisa e de
dados que estão sendo analisados. [...] o termo inferência tem sido usado para
descrever as mais variadas operações cognitivas no que se refere aos sentidos
produzidos pelo texto” (SANTOS, 2008, p. 63, grifo nosso).

QUADRO 3 – CONCEITOS DE INFERÊNCIA

Autor(a) Conceito
McLeod (1977) Inferências são informações cognitivamente
geradas com base em informações explícitas,
linguísticas ou não linguísticas, desde que em um
contexto de discurso escrito contínuo e que não
tenham sido previamente estabelecidas.
Frederiksen (1977) Inferências ocorrem sempre que uma pessoa
opera uma informação semântica, isto é, conceitos,
estruturas proposicionais ou componentes de
proposições, para gerar uma nova informação
semântica, isto é, novos conceitos de estruturas
proposicionais.
Beaugrande e Dressler Inferências são operações que consistem em suprir
(1980) conceitos e relações razoáveis para preencher
lacunas (vazios) e descontinuidades em um
mundo textual”. Para esses autores, o processo
inferencial busca sempre resolver um problema de
continuidade de sentido.
Brown e Yule (1983) Inferência são o processo no qual o leitor (ouvinte)
deve ir do sentido literal do que está escrito
(ou dito) ao que o escritor (falante) pretendeu
transmitir”. As inferências seriam, assim, “conexões
que as pessoas fazem quando tentam interpretar a
intenção do autor do texto que ouvem ou leem”.
Para Goodman (1985) Inferência é uma estratégia geral de adivinhação,
com base no que é conhecido. É uma informação
necessária, mas não conhecida”.

206
TÓPICO 2 - TECNOLOGIAS DIGITAIS E O LETRAMENTO LITERÁRIO

Marcuschi, (1985 e 1989) As inferências são processos cognitivos que


implicam a construção de representação semântica
baseada na informação textual e no contexto, sendo
justamente a capacidade de reconhecimento da
intenção comunicativa do interlocutor.
Cain e Oakhill (1999) A atividade inferencial é um fator essencial no
processo de comunicação e compreensão em geral,
podendo ser descrita como um ato que envolve
raciocínio lógico e criativo.
Gutiérrez-Calvo (1999) Inferências são representações mentais que o
leitor / ouvinte constrói e procura entender o texto
/ discurso, a partir da aplicação de seu próprio
conhecimento e indicações explícitas na mensagem
representações mentais de que o leitor / ouvinte
constrói e procura entender o texto / discurso, a
partir da aplicação de seu próprio conhecimento e
indicações explícitas na mensagem.
Dell'Isola (2001) Inferência é um processo cognitivo que gera
uma informação semântica nova a partir de
uma informação semântica anterior, em um
determinado contexto. Inferência é, pois, uma
operação cognitiva em que o leitor constrói novas
proposições a partir de outras já dadas.
FONTE: Santos (2008, p. 64-65)

Para a autora, inferência é o:

[...] resultado de uma estratégia cognitiva cujo produto é a obtenção


de uma informação que não está totalmente explícita no texto. [...] não
é mais do que fazer emergir informação adicional a partir daquela
que é disponibilizada ao leitor através do texto base. Portanto inferir
é suplementar informação não verbalizada no texto (SANTOS, 2008,
p. 65).

Santos (2008) assevera que, com relação à tipologia das inferências,


também ocorre uma variedade distinta de classificações (Quadro 4) segundo
abordagens com olhar à relação semântica, do ponto de vista da direção do texto,
critério de origem, estratégias cognitivas, e respostas por inferência.

207
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

QUADRO 4 – TIPOLOGIAS DE INFERÊNCIA


Teóricos Tipologias
Warren, Nicholas e a) Inferências de relações lógicas: respondem a questões “por
Trabasso (1979) quê?”.
b) Inferências de relações informativas: determinam as
pessoas, coisas, lugares, tempo e o contexto geral de um
dado evento. Respondem a questões: Quem? O quê? Onde?
Quando?
c) Inferências de relações de avaliação: relacionadas ao
julgamento do leitor, e são baseadas em seu sistema de
crenças, valores e conhecimento de mundo.
Singer e Ferreira a) Backward inferences (inferências conectivas): “são aquelas
(1983) que especificam uma conexão entre a sentença corrente e
uma parte anterior do texto”.
b) Forward inferences (inferências preditivas): ao contrário
das inferências conectivas, podem ter um alto grau de
probabilidade, mas não são essenciais para a coerência.
Marcuschi (1989) a) Inferências de base textual: lógicas (dedutivas, indutivas,
condicionais), sintáticas e semânticas (associativas,
generalizadoras, correferenciais).
b) Inferências de base contextuais: pragmáticas (intencionais,
conversacionais avaliativas), práticas (experienciais) e
cognitivas (esquemáticas, analógicas e composicionais).
c) Inferências sem base textual: falseamentos e extrapolações
infundadas.
Morles (1986) e a) Inferência Lógica – Proposição necessária à interpretação
Gutiérrez-Calvo do texto. Apresentam sempre um valor de verdade.
(1999) b) Inferência Elaborativa – Estabelece a ligação entre os
conhecimentos prévios e a proposição fornecida pelo texto,
mas, além da pista linguística fornecida pelo texto. O leitor
faz predições a partir daquilo que lê.
c) Inferência Avaliativa – Proposição centrada no conteúdo do
texto, consistindo em um comentário, juízo ou outra reação
do leitor frente ao texto.
Pearson e Johnson a) As textualmente explícitas – são respostas dadas com base
(1978) em inferências óbvias presentes no texto e facilitadas pela
própria estrutura textual.
b) As textualmente implícitas – são respostas dadas com
base em inferências em que o leitor aciona seus esquemas
mentais, a partir das pistas que o texto oferece.
c) As implícitas no script - ocorrem quando o leitor precisa
usar seu próprio scritp (eventos, factos guardados na
memória, conhecimentos prévios) para chegar à resposta.
FONTE: Santos (2008, p. 67-71)

208
TÓPICO 2 - TECNOLOGIAS DIGITAIS E O LETRAMENTO LITERÁRIO

Koch, em seus estudos sobre produção de sentidos no texto, também


destaca o papel de outro importante elemento na construção de sentidos que é
a referenciação, sendo que “os sujeitos do discurso, interativamente, nas suas
práticas cognitivo-discursivas fazem uso dos processos referenciais tanto em
uma situação de produção oral, quanto em uma de produção escrita” (KOCH;
MARCUSCHI, 1998, KOCH; TRAVAGLIA, 1999 apud MORAIS; SANTANA,
2011, p. 2).

A referência passa a ser considerada como o resultado da operação


que realizamos quando, para designar, representar ou sugerir algo,
usamos um termo ou criamos uma situação discursiva referencial com
essa fi nalidade: as entidades designadas são vistas como objetos-de-
discurso e não como objetos-do-mundo (KOCH, 2002, p. 79).

Na visão de Morais e Santana (2011, p. 2) “as funções discursivas


desempenhadas pelas estratégias de referenciação encontram-se relacionadas
ao contexto (ambiente linguístico) imediato e à forma pela qual o referente (um
objeto, uma entidade, uma representação, uma expressão) ao ser lançado vai
sendo ativado e/ou reativado durante a progressão textual”.

Soares (1998), nesse sentido, destaca que o texto não preexiste a sua leitura
e leitura não é aceitação passiva; mas uma construção ativa. É no processo de
interação desencadeado pela leitura que o texto se constitui.

Koch e Elias (2010, p. 73) destaca, a partir de Horman (1976), que o leitor,
com base no Princípio da Continuidade de Sentido, “põe em funcionamento todos
os componentes e estratégias cognitivas que tem à disposição para dar ao texto
uma interpretação dotada de sentido”, sendo que “no conjunto dos conhecimentos
constitutivos para a produção de sentido “destaca-se o conhecimento de outros
textos” (KOCH; ELIAS, 2010, p. 73). Dessa forma, o terceiro elemento usado pelo
leitor no processo de produção de sentido a ser apresentado é a intertextualidade
que em textos produzidos no contexto digital assumem potencial ampliado.

Na produção de sentido que decorre da leitura de um texto, frequentemente


o leitor deve mobilizar conhecimentos de outros textos (Figura 20) para que o
sentido se produza ou seja ampliado.

FIGURA 20 – EXEMPLO DE INTERTEXTUALIDADE

FONTE: Koch e Elias (2010, p. 81)

209
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

Para as autoras, o que mobiliza a produção de sentido na leitura do texto,


o que gera o efeito de humor é a intertextualidade com a letra da música de Tom
Jobim Aguas de Março “[...] é uma cobra, é um pau, é João, é José, é um espinho na
mão, é um corte no pé (KOCH e ELIAS, 2010, p. 81)”. A intertextualidade pode
se constituir de forma explicita ou implícita (Figura 21).

FIGURA 21 – TIPOS DE INTERTEXTUALIDADE

FONTE: Adaptado de Koch e Elias (2010, p. 87-92)

NOTA

“Em sentido amplo, a intertextualidade se faz presente em todo e qualquer texto,


como componente decisivo de suas condições de produção. Segundo J. Kristeva. Criadora
do termo, todo texto é um mosaico de citações de outros dizeres que o antecederam e lhe
deram origem […] faz parte da memória social de uma coletividade” (KOCH e ELIAS, 2010,
p. 86).

3.1 UM OLHAR AO TEXTO LITERÁRIO EM INTERFACES


DIGITAIS
“Até à segunda metade desse século, para designar especificamente a arte
verbal, o corpus textual, eram utilizadas palavras como “poesia”, “verso” e “prosa”
(que hoje reconhecemos enquanto classificação de géneros literários)” (LOPES,
2010, p. 2). O texto literário, nosso foco de estudo, de acordo com Silva (2007
apud LOPES, 2010, p. 3) são “resultante da atividade de criação estética, possuem
características estruturais peculiares que os diferenciam inequivocamente dos
textos não literários”.

Lopes (2010), com base em Reis (2001) e Centeno (1986), destaca que o
texto literário resulta:

210
TÓPICO 2 - TECNOLOGIAS DIGITAIS E O LETRAMENTO LITERÁRIO

de uma vontade de comunicação. Mas aquilo que o define é, mais do


que a vontade de comunicação, a sua capacidade de significar. É esta
característica que o distingue de qualquer texto normal, puramente
utilitário. No texto literário não se trata só de comunicar, trata-se acima
de tudo de significar (e quanto maior a sua capacidade de significação
mais literário ele será). Texto literário é aquele em que a comunicação
não se opera e não atua ao nível só consciente, mas a outro nível,
que podemos chamar simbólico, proveniente de e dirigindo-se ao
inconsciente. Ao outro eu, não racional, de sombra, ao Eu universal,
que se contrapõe (e o abarca, por ser mais vasto do que ele) ao eu
individual. O eu individual, o ego, abarca apenas a consciência.
O Eu universal abarca o todo da personalidade, que inclui tanto o
inconsciente como a consciência. Ora o texto será tanto mais literário
quanto mais do inconsciente, ou do todo da personalidade, provier, e
quanto mais ao inconsciente, ao todo da personalidade, se dirigir, com
ele se encontrando e sobre ele atuando. [...] O texto literário é o local
de projeção dos conteúdos do inconsciente, individual ou coletivo, de
uma psyche. [...] Podemos aproveitar para a definição do texto literário
a ideia de que é o texto que vive do que a mensagem contém, e não do
que ela simplesmente diz (LOPES, 2010, p. 9).

NOTA

O vocábulo “literatura”, durante o século XVIII, continuando ainda a designar


o conjunto das obras escritas e dos conhecimentos nelas contidos, passa a adquirir uma
acepção mais especializada, referindo-se especialmente às “belas artes”, ganhando assim
uma conotação estética e passando a denominar-se a arte que se exprime pela palavra.

LOPES, P. Literatura e linguagem literária. Lisboa: Repositório Institucional Camões;


Universidade da Beira Interior, 2010. p. 1. Disponível em: https://repositorio.ual.pt/
bitstream/11144/200/1/Literatura%20e%20linguagem%20literaria.pdf. Acesso em: 5 fev.
2020.

No que tange ao texto literário digital, Corrêa (2004, p. 13) ressalta que a
ocupação deste tipo de texto no meio eletrônico é ainda incipiente e que demanda
“um outro autor e um outro leitor — os princípios normativos não existem e são
quando implementados sempre voláteis. As experiências dos e-books buscam
encontrar um meio termo entre a tradição do meio impresso e o meio eletrônico”.

Para Lopes (2010, p. 5) o texto literário em sua gênese literária se relaciona


a “três âmbitos autônomos que envolvem: uma dimensão sociocultural, uma
dimensão histórica; e uma dimensão estética”.

211
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

Tais dimensões presentes nos textos literários, consideradas as


especifi cidades de diferentes formatos e interfaces digitais – bem como a expansão
de distintos suportes de leitura – são intensamente ressignifi cadas.

o surgimento do ciberespaço, onde estão situados virtualmente todos


os textos digitais, propiciou grande liberdade para a produção e
a divulgação de textos literários, pois, além de não acarretar custos
signifi cativos na maior parte dos casos, não há qualquer regulação ou
controle editorial para se publicar uma obra em blogs ou em sites da
internet (KIRCHOF, 2016, p. 204)

Karnal (2014, p. 399) esclarece que “há no Brasil, hoje, uma produção
intensa de poesia e poetas novos que surgiram muito em razão da internet. Se
por um lado há baixa produção e consumo desse gênero no mercado editorial
impresso, por outro lado há milhares de blogs, muitos sites e revistas on-line”.

Kirchof (2016) pontua de forma muito clara a ampla possibilidade


de novas composições do texto literário (Figura 22), não somente como obra
digitalizada impressa mas como a composição de “textos híbridos e dinâmicos
que mesclam recursos de hipertexto, multimídia, hipermídia, interatividade,
agregando som, letras, imagens, movimento e possibilidade de ler utilizando
múltiplas plataformas” (KIRCHOF, 2016, p. 208).

FIGURA 22 - PRINTSCREEN DA TELA DO APP LIVRO O PEQUENO PRÍNCIPE, DE ANTOINE


SAINT-EXUPÉRY, COM ATIVIDADES LÚDICAS

FONTE: Kirchof (2016, p. 214)

Com tantas possibilidades de interação com o texto literário digital e a


convergência entre suportes impressos e digitais, cabe a escola a inserção do texto
literário emergente e produzido no ciberespaço.

212
TÓPICO 2 - TECNOLOGIAS DIGITAIS E O LETRAMENTO LITERÁRIO

Agora que você já identificou as especificidades do texto literário como


forma de compreender o processo de mediação da leitura para o contexto digital,
pesquise uma experiência prática de uso de textos literários digitais em atividades
de ensino. Para aprofundar a reflexão sobre esta atividade, sugerimos a leitura
do artigo Literatura na era digital: expansão dos suportes e convergência de mídias,
de Alinny Rodrigues Pereira Silva. Na obra, a autora discute a incorporação
de sistemas semióticos como possibilidades de criação inventiva sob o viés da
literatura contemporânea. Acompanhe a seguir:

A literatura na era digital: expansão dos suportes e convergência de mídias

Alinny Rodrigues Pereira Silva

Nas últimas décadas a literatura aparece em novos suportes, que vão


além do livro impresso. Com isso surgem novas ferramentas de construção
do texto e novos papéis para autor e leitor. A literatura incorporou sistemas
semióticos que vão além do verbal: visual, cinético, sonoro, digital, entre
outros, que realizam de maneira inovadora, velhas experiências e descobertas.
Abre-se um leque de possibilidades de criação inventiva sob o viés da literatura
contemporânea que mantêm uma relação com a tradição, mas que soa como
novidade.

A prosa da década de 1970, conforme Schøllhammer (2011), já se


inspirava no jornalismo e nas técnicas de reportagem. Este mesmo estilo se
manteve entre autores no fim da década de 1980 e início da década de 1990.
Grande parte deles formaram-se em cursos de jornalismo ou comunicação e se
mantiveram ligados às formas jornalísticas e concomitantemente às linguagens
audiovisuais, incorporando técnicas de roteiro diretamente na prosa ou,
escrevendo ficção e sua adaptação para o cinema. É o caso de escritores como
Marçal Aquino que tem uma produção diversificada com adaptações de contos
e romances para o cinema e Fernando Bonassi, que além de publicar suas ficções
em livro, trabalha em outros formatos tais como projetos cinematográficos e
televisivos. Bonassi também atua nos mais diversos formatos, em literatura
juvenil, poesia, roteiros de cinema, programas de televisão (tais como Castelo
Rá-tim-bum), jornalismo, teatro e prosa. Nota-se nesta geração de escritores
que a editora deixou de ser a única opção para divulgação de suas obras, pois
estes trabalham em todos os campos possíveis, da imprensa aos meios visuais
de comunicação, perpassando pelo cinema, televisão, teatro e pela produção
de textos para sites.

Conforme Schøllhammer (2011) é cara à literatura brasileira


contemporânea o traço da presentificação , ou seja, o imediatismo de seu
processo criativo e uma ânsia por intervir sobre uma Termo cunhado por
Beatriz Resende (2008) que sugere olhar para o presente, de forma que o
sentido de presente apareça com força e múltiplas formas, pois há na maioria
dos textos, a manifestação da urgência, por meio de uma presentificação
radical, preocupação com o presente que contrasta com um momento histórico.

213
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

Este sentido de urgência, de presentificação, se evidencia por atitudes de


intervenção imediata de novos autores no universo da produção literária. A
Literatura na era digital: expansão dos suportes e convergência de mídias
realidade presente conturbada. Indaga-se a eficiência estilística da literatura
e seus impactos a uma dada realidade, juntamente com sua responsabilidade
social e cultural de seu tempo. E essa intervenção se dá por meio das novas
tecnologias que:

[...] oferecem caminhos inéditos para esses esforços, de maneira


particular, com os blogs, que facilitam a divulgação dos textos,
driblando os mecanismos do mercado tradicional do livro, bem
como o escrutínio e o processo seletivo das editoras. Com essas novas
plataformas de visibilidade da escrita surgiu um inédito espaço
democrático e foram criadas condições para um debate mais imediato
em torno de novas propostas de escrita (SCHØLLHAMMER, 2011, p.
13).

Há uma aproximação da literatura, até então elitizada, visto como algo


sublime e aurático, com as massas. Perde-se na literatura o seu sentido de
transcendência para uma abertura ao cotidiano, tendo-se o seu acesso ampliado
e democratizado, além do surgimento de um novo perfil de público leitor. Neste
sentido, Garramuño (2014), afirma que a articulação dos textos com e-mails,
blogs, entre muitas outras variantes trata-se de imbricar as práticas literárias na
convivência com a experiência contemporânea.

[...] a midiatização da literatura também ganha outra dimensão,


tratando-se agora não apenas de recurso para revitalizar as formas
literárias, mas de diferentes momentos de produção textual numa
nova cadeia de produção em que o livro deixou de ser o produto final
e apenas representa uma etapa provisória de um desdobramento de
significantes em novos formatos mais voláteis e porosos da mútua
penetração dos diferentes níveis (SCHØLLHAMMER, 2011, p. 63).

Desse modo, a literatura constitui-se como parte do mundo e


imiscuída nele, e não mais como esfera independente e autônoma. Garramuño
(2014) discorre que a literatura adquiriu funções extrínsecas ao próprio
campo disciplinar, pois as disciplinas vão se perfurando para que os limites
transbordem. A literatura incorporou múltiplos tons, temas e convicções
na era da comunicação informatizada, que não se limita mais ao papel ou à
declamação.

FONTE: <http://e-revista.unioeste.br/index.php/travessias/article/view/18099/11969>. Acesso


em: 5 fev. 2020.

214
RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

• O letramento e letramento literário têm base comum na formação de seu


significado.

• Não há unicidade na composição do conceito de letramento literário.

• Determinados saberes são mobilizados no letramento literário.

• O texto é algo inacabado, como algo que se constrói por meio de uma atividade
interativa construtora de sentidos.

• Algumas abordagens teóricas impactam como se dá a produção de sentidos na


leitura de um texto.

• Há diferentes tipologias de inferência, e o papel da referenciação na construção


de sentidos e que a intertextualidade se faz presente em todo e qualquer texto,
como componente decisivo de suas condições de produção.

• Na produção de sentido que decorre da leitura de um texto, frequentemente


o leitor deve mobilizar conhecimentos de outros textos para que o sentido se
produza ou seja ampliado.

• O texto literário, é resultante da atividade de criação estética, possuem


características estruturais peculiares que os diferenciam inequivocamente dos
textos não-literários.

• O surgimento do ciberespaço, onde estão situados virtualmente todos os textos


digitais, propiciou grande liberdade para a produção e a divulgação de textos
literários.

215
AUTOATIVIDADE

1 Faça uma pesquisa de outros tipos de obras literárias que podem ser
encontradas no formato e-book e reflita de que forma a acesso ao livro
digital nas escolas pode motivar a leitura do texto literário.

216
TÓPICO 3 -
UNIDADE 3

COMPOSIÇÕES DO TEXTO NO CIBERESPAÇO E OS


PROCESSOS DE LEITURA DESENVOLVIDOS

1 INTRODUÇÃO
A tecnologia está cada vez mais presente nas práticas de leitura
contemporâneas, principalmente entre os mais jovens.

Nativos digitais, na atualidade, além de leitores de hipertextos são


produtores de conteúdo nos mais distintos espaços, de sites de redes sociais a
blogs sobre temática de seu interesse.

De forma, muitas vezes, intuitiva navegamos por textos digitais, sem a


compreensão do papel da tecnologia na mediação de nossas ações no mundo
digital, e das possibilidades que se apresentam na leitura.

Com base na compreensão de que o texto no espaço virtual é afetado


pelas interfaces por onde o sujeito se desloca e das situações comunicativas que
se insere, este tópico tem como meta compreender os percursos de leitura do
hipertexto e aspectos da multimodalidade e do sincretismo.

2 LENDO O HIPERTEXTO
Ao explorarmos os novos gêneros literários que surgiram com a
informática, tais como a poesia eletrônica, narrativas hipertextuais,
experiências textuais combinatórias, dentre outras, podemos
conquistar aqueles que ainda não são leitores, pois a leitura em
meio informatizado ainda é pouco explorada no ambiente escolar,
configurando-se como uma novidade. Além disso, o computador pode
apresentar-se mais atrativo em alguns aspectos, principalmente para
o jovem de hoje que possui um perfil diferente do jovem do século
passado (NEITZEL et al., 2013, p. 56).

O mundo virtual apresenta uma série textos com distintas formas


composicionais e possibilita ao leitor diferentes – mesmo que limitadas –
possibilidades de navegação no ato de leitura. “Diante da tela do computador,
nossa bagagem de leitores do hipertexto impresso (e não necessariamente de
todo e qualquer escrito) pode facilitar nossa ação de navegação diante do écran”
(NEITZEL, 2009, p. 166).

217
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

Nos espaços de leitura e de escrita pelos quais circulamos, fazemos


escolhas de navegação permitidas pela interface, tais escolhas — quando
se discute o processo de leitura — podem potencializar a fruição do texto e a
produção de novos sentidos, sendo que o texto passa por um contínuo processo
de ressignificação pelo movimento de atualização. Importante ressaltar que;

[...] o texto digital não usurpa os papéis convencionais do autor e


leitor. A leitura convencional é concebida como tendo sinais de um
livro externo e se institui no livro interior da mente. O computador
complica esta imagem: o autor está agora presente no livro, não
metaforicamente como o autor sempre esteve na história da escrita,
mas operacionalmente, porque o computador pode direcionar o curso
da leitura (BOLTER, 1991, p. 190, tradução nossa).

Para Kenski (2007, p. 31) a prática de leitura mediada pela tecnologia digital
promove rupturas nas “formas narrativas circulares e repetidas da oralidade e
com o encaminhamento contínuo e sequencial da escrita, e se apresenta como um
novo fenômeno descontínuo, fragmentado e, ao mesmo tempo, dinâmico, aberto
e veloz. [...] se abre para o estabelecimento de novas relações entre conteúdos,
espaços, tempos e pessoas diferentes”, tais especificidades se materializam no
hipertexto.

O conceito de hipertexto é bastante discutido e apresenta algumas


variações de acordo com o teórico que o discute (Figura 23).

FIGURA 23 - CONCEITOS DE HIPERTEXTO

FONTE: Os autores

218
TÓPICO 3 - COMPOSIÇÕES DO TEXTO NO CIBERESPAÇO E OS PROCESSOS DE LEITURA DESENVOLVIDOS

Para Castro (2013, p. 147) é necessário “saber lidar com a interface desses
textos materializados e principalmente saber navegar e buscar informações
neles”.

O hipertexto deve ser visto como o locus de processos virtuais que dá


vida ao modo de enunciação digital. Este, por seu turno, é uma forma
singular de enunciar, isto é, uma maneira própria de dispor, compor e
superpor, entrelaçadamente em uma mesma plataforma enunciativa,
os recursos semióticos de natureza linguística e não linguística, fato
este que o torna distinto da escrita alfabética, ainda que dependente e
profundamente nela enraizado (XAVIER, 2009, p. 92).

De acordo com Coscarelli (2006, p. 1) “sair do papel e ir para uma página


digital vai modifi car a forma de navegação naquele texto [...] por pelo menos dois
motivos: um deles é que nenhum texto é linear e o segundo é que nenhuma leitura
é linear”; portanto, conhecer os atributos do hipertexto (Figura 24) pode ser um
modo de potencializar a compreensão das formas de leitura do texto digital.

FIGURA 24 – ATRIBUTOS DO HIPERTEXTO

FONTE: Adaptado de Lévy (2004 apud GARCIA, 2017, p. 34-35)

219
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

É com base nesses atributos que as características do hipertexto se


apresentam, sendo elas: a intertextualidade, a velocidade, a precisão, o dinamismo,
a interatividade, a acessibilidade, a estrutura em rede, a transitoriedade e a
organização multilinear. Em relação ao formato o hipertexto pode ser potencial,
de colagem e cooperativo (Figura 25).

FIGURA 25 – FORMATOS DO HIPERTEXTO

FONTE: Adaptado de Sousa Júnior e Alves (2018, p. 50)

Observem que os diferentes formatos e as especifi cidades de cada interface


vão direcionar os movimentos de leitura e os percursos que o leitor poderá seguir.
De fato:

[...] o hipertexto não tem nem segue uma ordem canônica. [...] todo
caminho escolhido pelo navegador no hipertexto defi ne uma leitura
igualmente convincente e apropriada, através da qual a relação de
cada hiperleitor com o texto muda radicalmente. O hipertexto em rede
não tem sentido único, mas apresenta multiplicidade signifi cativa,
sem a imposição de um sentido dominante (XAVIER, 2009, 175).

Marcuschi (2001 apud MAGNABOSCO 2009, p. 1397) correlaciona o


hipertexto às formas clássicas de produção textual delineando as características
que determinam a sua natureza (Figura 26).

220
TÓPICO 3 - COMPOSIÇÕES DO TEXTO NO CIBERESPAÇO E OS PROCESSOS DE LEITURA DESENVOLVIDOS

FIGURA 26 – A NATUREZA DO HIPERTEXTO

FONTE: Adaptado de Marcuschi (2001 apud MAGNABOSCO, 2009, p. 1396-1397).

Para Dias e Novaes (2009, p. 3) “muitos dos textos que hoje circulam na
sociedade são materializados em ambientes digitais, e é preciso que os indivíduos
construam habilidades para lidar com esses textos”.

A tecnologia computacional pode, assim, contribuir para ampliar as


práticas leitoras, assumindo um papel de destaque na formação de
sujeitos que encontram afinidades com a leitura na tela. A novidade
cativa-os pelas novas possibilidades literárias, mas é uma prática que
não pode ser episódica, precisa estar aliada a outras que garantam o
acesso ao texto (NEITZE et al., 2013, p. 60).

Segundo Leite (2016, p. 18), “na leitura digital existe a interface material.
O leitor agora interage com o texto, dialogando com o mesmo, não apenas em
caracteres referentes à interpretação e apreensão de significados, mas também
na possibilidade de sua manipulação gráfica, tendo a possibilidade de alterá-lo,
suprimi-lo, imprimi-lo”.

221
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

Nas práticas de leitura é importante reconhecer que:

O texto no papel é escrito e é lido linearmente, sequencialmente – da


esquerda para a direita, de cima para baixo, uma página após a outra;
o texto na tela – o hipertexto é escrito e é lido de forma multilinear,
multissequencial, acionando-se links ou nós que vão trazendo telas
numa multiplicidade de possibilidades, sem que haja uma ordem
predefinida (SOARES, 2002, p. 150).

3 TEXTO SINCRÉTICO E MULTIMODALIDADE


A semiótica usa o conceito de sincretismo para designar, inicialmente,
a sobreposição de funções irradiadas a partir de um mesmo elemento
[...] para designar como sincrético um objeto que, acionando várias
linguagens de manifestação, está submetido, como texto, a uma
enunciação única que confere unidade à variação (TEIXEIRA, 2009,
p. 46-47).

Para Teixeira e Sousa (2014), o sincretismo objetiva — por meio dos estudos
da semiótica discursiva — compreender a heterogeneidade da multimodalidade
considerando não sua composição multifacetada, mas compreendendo-o o texto
multimodal como unidade enunciativa de significação. As autoras se voltam
à mobilização de múltiplas linguagens e como integralidade do processo de
enunciação; gerando um sintagma novo e único. “Quando ocorre a composição de
um plano de expressão em que linguagens diferentes estão em jogo, em função de
um enunciado, tem-se o sincretismo” (SCHERER, 2018, p. 179). Considerando tal
correlação entre o sincretismo e a multimodalidade, nesta seção aprofundaremos a
discussão sobre multimodalidade e sua relação com os espaços digitais de leitura.

O leitor com múltiplas habilidades de leitura e escrita ainda


compreende a tecnologia e o desenvolvimento dos textos multimodais,
sabendo como utilizar diferentes tipos de textos e de tecnologias,
assim como textos que se valham de sistemas semióticos individuais
ou combinados (ALMEIDA; CERIGATTO, 2016, p. 226).

A multimodalidade é um dos enfoques de estudo da semiótica social


que defende o texto multimodal como espaço onde toda a comunicação e
representação da linguagem se constitui (JEWITT, 2009).

No que tange ao espaço digital, Marcuschi (2005, p. 21) destaca a


proliferação de novos gêneros de textos que possibilitam a criação de “formas
comunicativas próprias com um certo hibridismo que desafia as relações entre
oralidade e escrita e inviabiliza de forma definitiva a velha divisão dicotômica
ainda presente em muitos manuais de ensino de língua”.

De acordo com Silvestre (2015, p. 98), o texto multimodal “é uma unidade


de significação, constituída pelos recursos semióticos dos diversos sistemas
escolhidos pelo produtor de texto, num contexto de situação, para determinados
fins comunicativos”.

222
TÓPICO 3 - COMPOSIÇÕES DO TEXTO NO CIBERESPAÇO E OS PROCESSOS DE LEITURA DESENVOLVIDOS

Multimodalidade, na perspectiva de Rojo e Moura, (2012 apud SALACHE;


KNUPPEL 2016 p. 6) “se caracteriza pela multiplicidade de linguagens
(animações, design, imagens, vídeos, infográficos, áudios, entre outros) e carrega
a perspectiva de novas leituras e novas práticas de letramentos, ou seja, que os
textos multimodais exigem”.

Para Kress e Leeuwet (1996 apud SCHÖNINGER; FADRIQUE; ASSMAN,


2016, p. 200) esse novo texto que se forma no espaço digital, o texto multimodal,
é construído através de múltiplos modos semióticos que em uso “são diversos,
cada qual com propósitos específicos, que se complementam no texto com o
propósito de corresponder às tarefas comunicativas e representacionais.

NOTA

Modos semióticos são “meios para materializar o sentido. Podemos citar, ainda,
que os modos são um meio de ‘capturar’ ou ‘transcrever’ o mundo” (ARAÚJO; GUALBERTO,
2018, p. 47).

Entretanto, Descardeci (2002, p. 20) alerta que o texto multimodal não


surge com o advento das tecnologias digitais, para o autor “qualquer que seja
o texto escrito, ele é multimodal, isto é, composto por mais de um modo de
representação. [...] há além do código escrito, outras formas de representação
como a diagramação da página (layout), a cor e a qualidade do papel, o formato
e a cor (ou cores) das letras, a formatação do parágrafo”.

De fato, o texto multimodal encontrou no ciberespaço um ambiente fértil


para sua disseminação, o que está conectado às múltiplas linguagens que compõe
os gêneros digitais; o que se torna um desafio ao educadores que precisam
promover práticas de ensino para responder às demandas da nova cultura digital
(MONTE MÓR, 2015).

O alerta, no entanto, segundo Almeida e Cerigatto (2016, p. 227), é para que


o “trabalho multimodal na educação valorize as novas tecnologias, linguagens
híbridas e diferentes mídias, não se concentrando apenas no desenvolvimento de
habilidades técnicas para o uso de mídias e tecnologias”.

Nas modalidades de leitura e escrita da sociedade multimodal o


texto é ‘aberto’ – ou ainda, ‘promíscuo’ – dada à sua permissão de
manipulação dos hiperlinks por parte do leitor e mergulhar nos dados
ali disponíveis combinando as informações de modo digital. [...] essa
‘abertura’ acontece porque o hipertexto é, ‘fisicamente’, acolhedor, ele
hospeda ‘materialmente’ outras obras hipertextualizadas. Ele absorve
a essência de outros hipertextos, por isso tende a apagar as fronteiras
(BRITO; SAMPAIO, 2013, p. 301).

223
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

Para Dias (2018), há significativas vantagens na inserção da


multimodalidade em práticas de ensino (Figura 27).

FIGURA 27- VANTAGENS DO USO DA MULTIMODALIDADE EM PRÁTICAS DE ENSINO

FONTE: Adaptado de Dias (2018, p.164)

Vieira e Ferreira (2017) destacam a necessidade da qualificação do leitor


do texto multimodal e apontam determinados procedimentos que podem ser
adotados na leitura de textos multimodais (Figura 28).

FIGURA 28 - PROCEDIMENTOS DE LEITURA DE TEXTOS MULTIMODAIS

FONTE: Adaptado de Vieira e Ferreira (2017, p. 119-120)

224
TÓPICO 3 - COMPOSIÇÕES DO TEXTO NO CIBERESPAÇO E OS PROCESSOS DE LEITURA DESENVOLVIDOS

O HIPERTEXTO E A MULTIMODALIDADE EM PRÁTICAS TEXTUAIS


COM BLOG NO ENSINO DE LÍNGUAS

Manoela Oliveira de Souza Santana


Rodrigo Camargo Aragão

Como não é producente dissociar ensino de línguas e tecnologia,


conforme asseveram as OCEM1, Pretto (2011) propõe um pensar sobre a
questão das linguagens, as quais estão intimamente vinculadas aos aparatos
tecnológicos disponíveis aos jovens que passam a usá-las de forma intensa,
construindo novas linguagens como as possibilidades de comunicação móvel
ofertam. Nesse viés, entende-se que concretizar um trabalho com as linguagens
prescinde lidar com os letramentos digitais. Este é abordado por Kleiman
(2003) como um processo que transcende a aquisição de códigos por uma
competência autônoma — entendido como alfabetização —, pois consiste em
vivências sociais e culturais de práticas discursivas em contextos e instituições
específicos.

Soares (2001), ao compartilhar de um entendimento sobre letramento,


trata de alfabetização como aquisição de uma tecnologia: a de codificar e a de
decodificar a língua escrita; e faz referência ao letramento como o uso social da
leitura e da escrita que responde adequadamente às demandas sociais.

Nesse contexto, considera-se relevante uma prática de ensino de línguas


articulado à tecnologia, com vistas no multiletramento, na inclusão digital e
centrada no texto multimodal e na hipertextualidade. Sobre multimodalidade,
Brasil (2006) e Dionísio (2011) consideram que os recentes avanços tecnológicos
têm oportunizado o surgimento de novas formas de interação que implicam
a necessidade de revisão e ampliação das interações humanas e de alguns
conceitos no âmbito do processamento textual e das práticas pedagógicas que
lhe são decorrentes, uma vez que imagem e palavra mantêm relação cada vez
mais próxima e integrada. Para ela, entre imagem e palavra, não há uma relação
de supremacia, mas a harmonia visual ou não entre ambos.

Há referência a uma lógica da copresença de elementos que se relacionam


por meio de arranjo e disposição. Os dois modos de linguagem não fazem a
mesma coisa e não coexistem simplesmente. A noção de multimodalidade
das formas de O Hipertexto e a Multimodalidade em práticas textuais com
blog no ensino de línguas – representação que compõem uma mensagem foi
introduzida por Kress & Van Leeuwen (1996) na área da Semiótica Social,
buscando compreender todos os modos de representação no texto linguístico.

Os autores propõem que se pense numa linguagem constituída como


multimodal, em que o sentido advenha da relação textual estabelecida entre
os diferentes modos utilizados para sua constituição e não que se pense
isoladamente em cada um deles.

225
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

Outra referência pertinente para análise de textos multimodais, conforme


Mayer (2001) é a teoria cognitiva da aprendizagem multimodal. Essa teoria faz
menção a alguns princípios citados por Dionísio (2011) como o: da multimídia
(aprende-se melhor a partir de palavras e imagens do que apenas de palavras);
de contiguidade espacial (aprende-se melhor quando palavras e imagens
correspondentes são apresentadas próximas do que quando estão afastadas
umas das outras na página ou na tela de computador); da contiguidade temporal
(a aprendizagem é mais eficaz quando palavras e imagens correspondentes
são apresentadas simultaneamente do que sucessivamente); da coerência
(aprende-se melhor quando palavras, imagens e sons são incluídos); princípio
da modalidade (estudantes aprendem melhor de animação e narração que de
animação e texto na tela); da redundância (estudantes aprendem melhor de
animação e narração que de animação, narração e texto na tela); das diferenças
individuais (efeitos do design são mais fortes para os aprendizes com menor
conhecimento e menor noção de espaço do que para aqueles com maior
conhecimento e maior noção de espaço).

Quanto ao hipertexto, discute-se que as referências a ele surgiram nos


anos de 1960, com Theodor Holm Nelson, um dos coordenadores do primeiro
sistema hipertextual colocado em prática citando Nelson (1993), considera
que o hipertexto é a unificação de ideias e dados interconectados, como uma
instância que coloca em evidência tanto um sistema de organização de dados
como um modo de pensar.

No âmbito da linguística, para Gomes (2007), não há uma definição clara


sobre hipertexto. Como seu surgimento se deu a partir das potencialidades
da informática, algumas possibilidades de precisá-lo, geralmente, se prendem
a conceitos técnicos e ao seu uso em detrimento de suas características
linguísticas. Gomes (2007, p. 20) analisa o hipertexto, relacionando seus
aspectos linguísticos, sem perder o foco de seu caráter tecnológico.

Xavier (2002), Lévy (2003) e Pinheiro (2005) salientam que com a


concepção de texto na visão sociointeracionista e o desenvolvimento das
tecnologias digitais, que diminuem o tempo e a distância para a interação entre
os enunciadores, há um espaço para o aparecimento do hipertexto como uma
produção multienunciativa processada sobre a tela do computador bem peculiar
à sociedade contemporânea. Possenti (2002), Koch (2002) e Coscarelli (2006)
em suas discussões sobre o hipertexto, apresentam algumas semelhanças, pois
consideram que todo o texto pode ser entendido como um hipertexto, vendo-o
não como um modo enunciativo, mas como uma nova forma de gênero textual.

Conforme Koch (2002), a diferença entre texto e hipertexto estaria


apenas no suporte e rapidez de acesso, já que o último apresenta as condições
básicas de textualidade, redefinindo o papel do leitor como coautor do texto.

226
TÓPICO 3 - COMPOSIÇÕES DO TEXTO NO CIBERESPAÇO E OS PROCESSOS DE LEITURA DESENVOLVIDOS

Marcuschi (2006), Lévy (2006), Coscarelli (2006), Pinheiro (2005)


citam como características centrais do hipertexto: a não - O Hipertexto e
a Multimodalidade em práticas textuais com blog no ensino de línguas -
linearidade (possibilidade de se escolher diferentes links contidos no hipertexto);
a volatilidade (por não possuir nem oferecer estabilidade), a topografia (por não
ser hierárquico nem tópico como os textos lineares); a fragmentariedade (na
ligação de porções em geral breves, como possíveis retornos ou fugas, o que faz
o leitor frequentemente, perder o controle da leitura); a acessibilidade ilimitada
(os nós de uma rede hipertextual são heterogêneos; podem ser compostos de
imagens, sons, palavras e o processo sociotécnico colocará em jogo pessoas,
grupos, artefatos, com todos os tipos de associações que pudermos imaginar
entre eles); a multissemiose (dá ao leitor condições para que o significado
seja apreendido por vários sentidos simultaneamente); a interatividade
(interconexão interativa, viabilizada pela multissemiose e pela acessibilidade
ilimitada, bem como pela contínua relação do leitor com os muitos autores,
até mesmo em tempo real, de modo que, muitas vezes, simula uma interação
verbal face a face) e a iteratividade (diz respeito à natureza intrinsecamente
intertextual marcada pela recursividade de textos ou fragmentos na forma de
citações, notas, consultas etc.).

Assim, o educador, diante do avanço que as ciências e as tecnologias


trouxeram, precisa se adaptar e fazer uso adequado do encontro das
linguagens, da profusão dos textos para produzir, na sala de aula, um ambiente
de aprendizagem mais agradável, eficaz e estimulante, vez que os educandos
trazem para as escolas questões que dizem respeito diretamente ao mundo
interconectado pelas linguagens, fazendo com que se sintam desafiados.
Construir espaços para o uso dessas novas formas de linguagem e o diálogo
entre elas, bem como de outros paradigmas para a leitura e a escrita ajudam os
alunos a trazerem sua realidade cotidiana para a sala de aula e a se expressarem
conforme o seu mundo.

FONTE: <http://www.hipertextus.net/volume10/03-Hipertextus-Vol10-Manoela-Santana&Ro-
drigo-Aragao.pdf>. Acesso em: 5 fev. 2020.

DICAS

Agora que você já identificou a potencialidade de usar textos multimodais —


como forma de compreender o processo de mediação da leitura para o contexto digital —,
pesquise uma experiência prática de uso de textos multimodais em atividades de ensino.
Para aprofundar a reflexão sobre esta atividade sugerimos a leitura do artigo A arte de
ler e criar por meio de textos multimodais, ade Meira e Silveira. Nesta obra, as autoras
apresentam o Projeto de Intervenção Pedagógica, A arte de ler e criar por meio de textos
multimodais, desenvolvido em 2017, no Colégio Estadual Maria da Luz Furquim, em Rio
Branco do Sul, Paraná com o intuito de desenvolver o letramento crítico.

227
RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico, você aprendeu que:

• A compreensão do texto no espaço virtual é afetada pelas interfaces por onde


o sujeito se desloca e das situações comunicativas.

• O mundo virtual apresenta uma série textos com distintas formas composicionais
e possibilita ao leitor diferentes — mesmo que limitadas — possibilidades de
navegação no ato de leitura.

• A prática de leitura mediada pela tecnologia digital promove rupturas nas


formas narrativas circulares e repetidas da oralidade e com o encaminhamento
contínuo e sequencial da escrita, e se apresenta como um novo fenômeno.

• O conceito de hipertexto é bastante discutido e apresenta algumas variações de


acordo com o teórico que o discute.

• É necessário saber lidar com a interface desses textos materializados e


principalmente saber navegar e buscar informações neles.

• O hipertexto se constitui a partir de determinados atributos, características e


apresentam distintos formatos.

• O hipertexto não tem e nem segue uma ordem canônica, sendo que todo
caminho escolhido pelo navegador no hipertexto define uma leitura igualmente
convincente e apropriada, através da qual a relação de cada hiperleitor com o
texto muda radicalmente.

• A tecnologia computacional pode contribuir para ampliar as práticas leitoras,


assumindo um papel de destaque na formação de sujeitos que encontram
afinidades com a leitura na tela.

• O sincretismo objetiva — por meio dos estudos da semiótica discursiva —


compreender a heterogeneidade da multimodalidade considerando não sua
composição multifacetada, mas compreendendo-o o texto multimodal como
unidade enunciativa de significação.

• A multimodalidade é um dos enfoques de estudo da semiótica social que defende


o texto multimodal como espaço onde toda a comunicação e representação da
linguagem se constitui.

228
• O texto multimodal é uma unidade de significação, constituída pelos recursos
semióticos dos diversos sistemas escolhidos pelo produtor de texto, num
contexto de situação, para determinados fins comunicativos.

• O texto multimodal não surge com o advento das tecnologias digitais, e que
qualquer que seja o texto escrito, ele é multimodal, isto é, composto por mais
de um modo de representação.

• Há significativas vantagens na inserção da multimodalidade em práticas de


ensino.

• Há necessidade da qualificação do leitor do texto multimodal e alguns


procedimentos podem ser adotados na leitura de textos multimodais.

229
AUTOATIVIDADE

1 A importância das novas tecnologias digitais de comunicação e informação


— TDCI —, em particular a internet, é tema de interesse nos variados
domínios de produção do saber. As TDCI são celebradas como modo
de democratização do acesso à educação e ao conhecimento, condição
desejável por muitas das sociedades modernas. Em um país como o
Brasil, porém, em que os problemas de desigualdade social são notórios,
discutem-se tanto a “exclusão digital” quanto a “infoinclusão” mediante
essa chamada democratização do acesso (cf. AFONSO,2001; TAKAHASHI,
2008; LASTRES, ALBAGLI, 1999). A utilização crescente do computador
e da internet demandam, portanto, pesquisas de cunho social e, dessa
perspectiva, o papel da linguagem torna-se central (CRYSTAL, 2001; 2005;
ANIS, 2001 apud MARTIN, 2007; MARTIN,2007). O que releva no ambiente
da tela do computador são elementos linguísticos que emergem da interação
do escrevente com o leitor das páginas hipertextuais. De fato, no domínio
da Linguística, já existem inúmeros estudos cujo objeto são os e-mails
(CRYSTAL, 2001, em especial capítulo 4; PAIVA, 2004; MARCUSCHI,2004),
os bate-papos virtuais (BRAGA, 1999; HILGERT, 2000;ARAÚJO; BIASI-
RODRIGUES, 2004; MADEIRA, 2004; MARCUSCHI, 2004;FUSCA, 2007;
LUIZ SOBRINHO, 2007), os fóruns de discussão (CORRÊA , 1999a; 1999b;
CUSIN-BERCHE, MOURLHON-DALLIES , 2000; XAVIER; SANTOS, 2005),
as aulas virtuais e a questão do ensino a distância (BEACH; LUNDELL, 1998;
as home pages (KOMESU, 2001), os Blogs (KOMESU, 2005; SCHITTINE,
2004). Há, certamente, muito a ser investigado em termos dos usos da
linguagem e da constituição do(s) sujeito(s) sob as condições de produção
das tecnologias digitais.

O lugar atribuído à linguagem e, principalmente, à escrita, suscita diversas


questões entre usuários e não usuários do sistema, como as que buscam
salientar uma “transformação” da escrita com o uso da internet, vinculada
a uma suposta “degradação” dessa modalidade, com comprometimento
do processo de ensino-aprendizagem de crianças e de jovens. Essa visão
apreciativa — depreciativa — sobre a língua, fundada no senso comum, não
se restringe ao território brasileiro.

FONTE: <http://periodicos.pucminas.br/index.php/pedagogiacao/article/view/11019/8864>.
Acesso em: 5 fev. 2020.

Sobre as especificidades dos textos produzidos em contexto digital, NEITZEL


et al. (2013) afirmam que:
a) ( ) O texto digital não usurpa os papéis convencionais do autor e leitor. A
leitura convencional é concebida como tendo sinais de um livro externo e
se institui no livro interior da mente.

230
b) ( ) A prática de leitura mediada pela tecnologia digital promove
rupturas nas formas narrativas circulares e repetidas da oralidade e com o
encaminhamento contínuo e sequencial da escrita
c) ( ) Ao explorarmos os novos gêneros literários que surgiram com
a informática, tais como a poesia eletrônica, narrativas hipertextuais,
experiências textuais combinatórias, dentre outras, podemos conquistar
aqueles que ainda não são leitores, pois a leitura em meio informatizado
ainda é pouco explorada no ambiente escolar, configurando-se como uma
novidade
d) ( ) O hipertexto deve ser visto como o lócus de processos virtuais que dá
vida ao modo de enunciação digital.

2 A Internet tem gerado diferentes lógicas que a sociedade moderna


desconhece, uma vez que a lógica do mundo digital parece abandonar o
pensamento ocidental porque dissolve as ideias de significados objetivos,
unitários, de historicidade unilinear e privilegiar a não sistematização, os
pensamentos mais livres e subjetivos. Ela torna contingente o espaço-tempo
ordinário, abrindo novos meios de interação e ritmo de cronologias inéditas
(LÉVY, 1996), que se incorporam às nossas práticas sociais a uma velocidade
nunca imaginada. Isso favorece a conscientização da multiplicidade de
culturas, cada qual com sua lógica e racionalidade, próprias e individuais.

As diferentes lógicas, que cercam o ensino/aprendizagem de línguas


principalmente o mediado por TDIC, e as diferentes formas de pensar exigem
o diálogo e a comunicação entre culturas.

Novos agentes, novas experiências são reveladas e discutidas, alargando a


base dos debates produzidos pelas críticas da modernidade à herança colonial.
Santos, afirma que:

não há, pois, como fugir à proposta de uma epistemologia que


nos permita caminhar no meio de tanta incerteza e que permita
ver esta, não como um constrangimento, mas antes como o outro
lado da capacitante afirmação de uma insuspeita e inesgotável
diversidade dos saberes e das experiências humanas. [...], que
o ser humano é um ser condenado a transformar necessidade
(finitude, sustentabilidade) em liberdade (diversidade, infinitude)
(SANTOS, 2010, p. 536).

No contexto ocidental atual, de exigências plurilinguistas e multiculturalistas,


a aprendizagem de línguas e de culturas estrangeiras e o domínio de estratégias
de leitura e escrita de gêneros textuais digitais são habilidades que se tornam
indispensáveis.
No entanto, como professora de línguas, portuguesa e inglesa, muitas questões
vêm me inquietando sobre esse contexto social digital no qual estamos (con)
vivendo. Na busca por desvendar novas práticas sociais que têm se instaurado a
partir da democratização do saber promovida pela Internet e suas tecnologias,
encontramos a valorização da leitura, uma vez que o acesso aos materiais
digitais se realiza, a princípio, por meio dessa habilidade linguística, sendo

231
também, uma das mais exigidas pelos diversos segmentos sociais, em especial
o acadêmico. Em virtude do que foi exposto realizamos uma pesquisa que
buscou compreender como os alunos vêm significando a leitura de gêneros
digitais no contexto escola.

FONTE: BACALÁ, V. L. A Leitura de novos gêneros digitais: multiletramentos em construção.


In: SIMPÓSIO INTERNACIONAL DE ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA, 6., 2014, Uberlân-
dia. Anais [...]. Uberlândia: EDUFU, 2014. Disponível em: http://www.ileel.ufu.br/anaisdosielp/
wp-content/uploads/2014/11/1686.pdf. Acesso em: 5 fev. 2020.

Sobre a multimodalidade presente no contexto digital, avalie as afirmações a


seguir:

I- O leitor com múltiplas habilidades de leitura e escrita ainda compreende


a tecnologia e o desenvolvimento dos textos multimodais, sabendo como
utilizar diferentes tipos de textos e de tecnologias, assim como textos que se
valham de sistemas semióticos individuais ou combinados.
II- De acordo com Silvestre (2015, p. 98), o texto multimodal “é uma unidade
de significação, constituída pelos recursos semióticos dos diversos
sistemas escolhidos pelo produtor de texto, num contexto de situação, para
determinados fins comunicativos”.
III- Dias (2018) destaca a necessidade da qualificação do leitor do texto
multimodal e apontam determinados procedimentos que podem ser
adotados na leitura de textos multimodais; dentre elas: Análise dos
recursos não verbais e suas potencialidades para a produção dos sentidos
(personagens, objetos, cenário, cores, formatos, perspectiva, posicionamento,
saliência, moldura e tipografias).

Sobre as assertivas anteriores, é correto o que se afirma em:


a) ( ) I, apenas.
b) ( ) II, apenas.
c) ( ) I e II.
d) ( ) II e III.
e) ( ) I, II e III.

232
TÓPICO 4 -
UNIDADE 3

RECURSOS EDUCACIONAIS DIGITAIS PARA


ENSINO DA LEITURA

1 INTRODUÇÃO
Práticas de ensino da leitura, com o advento das tecnologias digitais,
rompem a barreira do livro físico e incorporam-se às telas e interfaces digitais.

A leitura de obras clássicas da literatura, como Os Lusíadas de Camões, não


está restrita ao livro físico e ao custo de sua produção. Entretanto, são distintas as
diferenças entre o livro físico e o livro digital, e acabe ao educador explorar tais
diferenças.

Considerando a leitura assumindo novas composições, esse tópico tem


como meta discutir as possibilidades e potencialidades do uso de recursos
educacionais digitais na interação com o texto.

2 RECURSOS EDUCACIONAIS DIGITAIS: TIPOS,


CLASSIFICAÇÕES, USOS
As tecnologias digitais vêm adentrando com uma maior frequência
os mais diversos âmbitos da sociedade, incluindo os ambientes
educacionais, que também vêm sendo transformados por esses
instrumentos. O uso do computador vem ganhando destaque dentro
dos muros da escola e, desse modo, faz-se necessário ampliar a
discussão sobre a disposição e o manuseio de recursos educacionais
em sala de aula (HITZSCHKY et al., 2016, p. 558).

Frente a este panorama nos deparamos — enquanto educadores — com


as mais distintas inovações tecnológicas que podem ser usadas como apoio ao
processo de mediação do conhecimento. O uso de recursos educacionais digitais
pode potencializar a inserção de novas metodologias de ensino e fomentar a
qualidade no processo educacional, de tal forma que sua escolha deve recair
sobre critérios pedagógicos extremamente bem delineados que comporão o
planejamento de ensino do docente.

De acordo com Ramos, Teodoro e Ferreira (2011, p. 13) recurso educacional


digital é “toda entida­de digital produzida especificamente para fins de suporte ao
ensino e aprendizagem”.

233
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

HITZSCHKY et al. (2016, p. 562) atestam a importância dos recursos


educacionais digitais como “ferramentas para a difusão do saber, podendo ter
como um dos seus objetivos principais, o de favorecer o processo de ensino e
aprendizagem, levando o aluno a construir o conhecimento de forma mais
participativa e dinâmica”.

Na visão proposta pela CIEB (2019, p. 5) os recursos educacionais são:

[...] quaisquer recursos digitais que possam ser utilizados no cenário


educacional, abrangendo assim um contexto bastante amplo e que
contempla diversas terminologias comumente já estabelecidas nas
últimas duas décadas com relação ao tema, tais como, por exemplo,
objetos de aprendizagem, recursos educacionais abertos, objetos
educacionais reutilizáveis, entre outras.

Podem abordar diferentes temáticas ou disciplinas e assumir distintas


características (Figura 29).

FIGURA 29 – ESPECIFICIDADES DOS RECURSOS EDUCACIONAIS DIGITAIS

FONTE: Adaptado de CIEB (2019, p. 50)

Dois dos recursos mais citados na literatura sobre o tema são os Objetos de
Aprendizagem (OA) e os recursos educacionais abertos (REA). Vamos conhecê-
los?

234
TÓPICO 4 - RECURSOS EDUCACIONAIS DIGITAIS PARA ENSINO DA LEITURA

Um Objeto de Aprendizagem é definido como uma entidade,


digital ou não digital, que pode ser usada, reusada ou referenciada
durante o ensino com suporte tecnológico. Exemplos de ensino
com suporte tecnológico incluem sistemas de treinamento baseados
no computador, ambientes de aprendizagem interativa, sistemas
instrucionais auxiliados por computador, sistemas de ensino a
distância e ambientes de aprendizagem colaborativa. Exemplos de
Objetos de Aprendizagem incluem conteúdo multimídia, conteúdos
instrucionais, objetivos de ensino, software instrucional e software
em geral bem como pessoas, organizações ou eventos referenciados
durante a aprendizagem apoiada por tecnologia (WILEY, 2000, p. 5).

Para Behar et al. (2009, p. 67) um objeto de aprendizagem pode ser


qualquer recurso educacional digital “por exemplo, textos, animação, vídeos,
imagens, aplicações, páginas web de forma isolada ou em combinação, com fins
educacionais. São destinados a situações de aprendizagem tanto na modalidade
a distância quanto semipresencial ou presencial”.

Em outra perspectiva Filatro (2008, p. 54) conceitua Objetos de


Aprendizagem como “porções” de conhecimento em que “seus elementos internos
são organizados por meio de um mecanismo de empacotamento de conteúdos
(do inglês, content packaging), que representa a estruturação dos conteúdos e o
conjunto de regras para sequenciar a sua apresentação”. Além da identificação
dos autores os OA “são identificados por descritores que trazem [...] regras de
uso e propriedade intelectual, requisitos técnicos, tipo de mídia utilizada e nível
de interatividade, entre outros [...]” (FILATRO, 2008, p. 54).

E
IMPORTANT

Tarouco (2012 apud BARBOSA, 2014) discorre sobre os metadados definindo-


os como descritores dos atributos que serviram para catalogar o OA. Catalogar um objeto
de aprendizagem é atribuir-lhe informações que o identifiquem, tais como seu autor,
palavras-chave, assunto, versão, localização, tipo de mídia, nível de interatividade, entre
outras. Logo, metadados são dados sobre dados, ou informações que se atribuem ao
objeto de aprendizagem a fim de que seja possível sua localização e recuperação.

Os objetos de aprendizagem podem ser classificados com base em seus


objetivos e funcionalidades (Quadro 5).

235
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

QUADRO 5 – CLASSIFICAÇÃO DE OBJETOS DE APRENDIZAGEM

TIPO DE OA DESCRIÇÃO EXEMPLOS


Apresentação Instrução direta, usando Uma sequência instrucional sobre
recursos com a intenção a os tipos de cédulas do sistema
de transmitir um conteúdo monetário brasileiro.
específico.
Prática Exercício e prática, jogo Questão que exija do aprendiz a
educacional ou representação relação do número de cédulas e
que permita a prática e a possibilidades para expressar uma
aprendizagem de certos quantia em dinheiro.
procedimentos.
Simulação Representação de algum Representação que permita
processo ou sistema da vida atividades com simuladores
cotidiana financeiros de poupança ou
aplicação.
Conceitual Representação de conceitos Representação que permita a
chave ou conceitos manipulação de quantias de
relacionados ao conteúdo de dinheiro, em unidades, dezenas,
uma disciplina. centenas etc., ou em decimais,
centesimais etc.
Informação Expõe a informação Representação que permita ao
organizada. aprendiz calcular o valor total
acumulado, guardando-se certa
quantia fixa ao longo de um período
(ideia de poupança).
Representação Apresentam-se os dados da Representação de um caixa
contextual maneira que emerge de um eletrônico de um banco, permitindo
cenário autêntico. ao aprendiz definir maneiras e
combinações de cédulas para um
saque.
FONTE: Adaptado de Churchil (2007 apud BARBOSA, 2014, p. 36-37)

Os objetos de aprendizagem podem ser produzidos pelos próprios


educadores com uso de ferramentas digitais simples como através da exploração
de um aplicativo de apresentação (powerpoint) ou da produção de uma filmagem
em aparelho de smartphone. O ponto central é que ele esteja relacionado aos
objetivos de ensino e, como característica principal, seja reutilizável.

Existem muitos repositórios de objetos de aprendizagem. Os repositórios


de objetos de aprendizagem possibilitam “o armazenamento propriamente dito
dos OAs; o controle de versões e publicações; a busca dos objetos a partir de suas
características expressas mediante o uso de metadados; o controle de acesso; a
avaliação dos objetos” (RODRIGUES; BEZ; KONRATH, 2014, p. 102-103). Vamos
navegar por alguns para conhecer um pouco das possibilidades pedagógicas
deste recurso educacional digital?

236
TÓPICO 4 - RECURSOS EDUCACIONAIS DIGITAIS PARA ENSINO DA LEITURA

FIGURA 30 - REPOSITÓRIOS DE OBJETOS DE APRENDIZAGEM

FONTE: Os autores

Agora você conheceu alguns objetos de aprendizagem e observou que


práticas de mediação de leitura de diferentes gêneros — dentre eles os digitais —
e de letramento literário, podem ser fortalecidas e potencializadas por recursos
educacionais digitais.

Um exemplo de uso múltiplos de objetos em atividades de mediação


de leitura de obras literárias é apresentado por Melo e Bertagnolli (2012, p. 13)
quando, a partir do uso da lousa interativa, propuseram aos alunos “estudo
simultâneo de romances e suas respectivas adaptações cinematográficas”.

237
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

Uma sugestão de trabalho está na análise do romance Cidade de


Deus (1997), de Paulo Lins. O professor e os alunos, simultaneamente,
analisariam a obra literária e o filme homônimo produzido por
Fernando Meirelles (2002). Um elemento recorrente, a ser explorado
em ambas as obras, é justamente a presença e o papel da fotografia na
representação das mazelas da sociedade contemporânea, desencadeada
pela personagem Buscapé (Figura 3). O professor poderia a explorar
em aula o romance partindo de seus elementos visuais e, à medida
que esses elementos fossem surgindo, os alunos complementariam
com fotos e reportagens as ideias da obra, previamente selecionadas e
organizadas. Desse modo, o objeto de aprendizagem seria construído
pelo professor e pelos alunos, na sala de aula, de forma coletiva e
colaborativa. [...] Cabe destacar que todas as exibições de imagens,
sejam por filmes, fotografias ou textos literários, bem como o áudio
produzido, são gerenciados por ferramentas específicas da lousa
interativa, a qual permite agrupar os mais diversos tipos de mídia em
uma única mídia final, que pode ser reutilizada na forma de um objeto
de aprendizagem (MELO; BERTAGNOLLI, 2012, p. 13-14).

As autoras defendem que “no estudo do romance contemporâneo, o


trabalho a partir de objetos de aprendizagem torna-se ainda mais frutífero, pois
possibilita a aproximação de imagens captadas pela lente do leitor com a de
gêneros artísticos cada vez mais inseridos na literatura recente, como a fotografia
e o cinema” (MELO; BERTAGNOLLI, 2012, p. 15).

NOTA

Diversos recursos digitais adquirem contornos educativos, buscando o


aperfeiçoamento dos processos de ensino e aprendizagem, entre eles, ferramentas não
pensadas com fins educacionais, como Google Drive e WhatsApp, ou sites de redes sociais
como o Facebook.

Recursos educacionais abertos (REA) são outra opção para inserção de


recursos digitais em práticas de mediação e leitura. Eles são compreendidos
como “recursos de ensino [Figura 31], aprendizagem e pesquisa que estão em
domínio público, ou que foram disponibilizados sob alguma licença que permita
seu uso livre (free) ou mesmo sua modificação (repurposing) por outros” (ATKINS;
BROWN; HAMMOND, 2007, p. 4, tradução nossa).

238
TÓPICO 4 - RECURSOS EDUCACIONAIS DIGITAIS PARA ENSINO DA LEITURA

FIGURA 31 – RECURSOS EDUCACIONAIS ABERTOS

FONTE: Adaptado de Hylén (2005 apud RODRIGUEZ; TAGA; VIEIRA, 2011, p. 183)

De acordo com a Unesco (2012), Recursos Educacionais abertos (REA) são:

[...] materiais de ensino, aprendizagem e investigação em quaisquer


suportes, digitais ou outros que se situem no domínio público ou
que tenham sido divulgados sob licença aberta que permite acesso,
uso, adaptação e redistribuição gratuitos por terceiros, mediante
nenhuma restrição ou poucas restrições [figura 32]. O licenciamento
aberto é construído no âmbito da estrutura existente dos direitos
de propriedade intelectual, tais como se encontram definidos por
convenções internacionais pertinentes, e respeita a autoria da obra
(UNESCO, 2012, s.p., grifo nosso).

FIGURA 32 – CARACTERÍSTICAS DOS RECURSOS EDUCACIONAIS ABERTOS

REDISTRIBUIÇÃO

FONTE: Adaptado de Wiley (2014)

239
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

3 RECURSOS EDUCACIONAIS DIGITAIS EXEMPLOS DE


PRÁTICAS DE LEITURA
De pé, desfiando o texto em direção horizontal, ou em recinto fechado,
folheando um códice pesado; ao ar livre ou em um gabinete, absorvido
pelo livro portátil, ou sentado, com as pernas encolhidas sob um
teclado e os olhos vidrados na luz do monitor. Todos esses gestos,
embora se tenham tornado possíveis com o passar do tempo, não
se excluíram necessariamente. O que se quer dizer, portanto, é que
cumulativamente, o leitor atual conhece mais práticas de ler do que
um leitor de séculos atrás (RIBEIRO, 2009b, p. 76).

Há práticas de leitura que podem ter como fomento ou suporte de ensino


recursos educacionais digitais e a há práticas de leitura que são mediadas por
tecnologias digitais como o e-book; neste subtópico abordaremos os dois modos
de uso pedagógico das novas tecnologias em atos de leitura.

No caso do uso de recursos educacionais digitais como fomento a práticas


de leitura de obras literárias, por exemplo, podemos refletir sobre dois exemplos
distintos: o uso de um videoclipe musical e o uso de excertos de um filme que
mobilize a atenção — ou seja, da preferência — dos alunos (Quadro 6).

QUADRO 6 - RECURSOS EDUCACIONAIS DIGITAIS COMO FOMENTO A PRÁTICAS DE LEITURA

Agente Mobilizador Atividade de introdução Obra Literária


Videoclipe da música A poesia no Modernismo e na Literatura Macunaíma,
Até quando? De Gabriel o Contemporânea. de Mário
Pensador. de Andrade
Disponível em: https:// O Modernismo, principalmente em sua 1ª fase, (1ª fase
youtu.be/1nIiOU1qDUg caracteriza-se pela busca da inovação, pela modernista)
agressividade e pela subversão radical dos padrões de
arte tradicional.
Para, então, começarmos a entender a este movimento
artístico que redefiniu a concepção do próprio fazer
poético, vamos analisar uma composição de Gabriel
O Pensador — um artista contemporâneo cujas
produções, em geral, se destacam pela transgressão e
pela crítica social. Assista ao videoclipe da música Até
quando? e, em seguida, por meio de um debate com
toda a turma, discuta as questões propostas.
Fonte: <https://canal.cecierj.edu.
br/122016/9e109da1a2ab18bb810c7def427d1e23.pdf>.
Acesso em: 7 fev. 2020.

240
TÓPICO 4 - RECURSOS EDUCACIONAIS DIGITAIS PARA ENSINO DA LEITURA

Excerto do Filme Troia Entre os heróis Aquiles e Galaaz Ilíada de


(diálogo entre Aquiles e Homero
Heitor) Disponível em: Qual é seu herói preferido? Hércules, Lancelot, Super-
http://projetoseeduc. homem, Batman, Mulher Maravilha, Rambo... Todos
cecierj.edu.br/eja/ esses personagens possuem características físicas e/
recurso-multimidia- ou morais que despertam nossa admiração. E, por
professor/portugues/ isso, podem ser compreendidos como modelos de
novaeja/m1u09/ comportamento. O que veremos, nesta atividade, é que
m1u10_01_video.html o ideal de homem traduzido pelo herói muda de tempos
em tempos, a depender da cultura de cada época. Para
isso, leremos dois textos. O primeiro é uma adaptação
do poema épico Ilíada, a narrativa mais famosa dos
feitos de Aquiles na Guerra de Tróia. A narrativa é um
legado da Antiguidade Clássica, aproximadamente
do século VIII a. C. – período histórico marcado
pela crença em diferentes deuses (politeísmo) e por
constantes guerras territoriais, nas quais os guerreiros
deveriam demonstrar sua coragem, força e destreza.
O segundo texto é um fragmento do Canto III da
novela de cavalaria A demanda do Santo Graal, que
narra as aventuras de Galaaz e dos demais Cavaleiros
da Távola Redonda, do Rei Artur, em busca do Santo
Graal, cálice sagrado no qual José de Arimateia colheu
o sangue de Jesus durante a crucificação. Trata-se de
uma narrativa da Idade Média, aproximadamente do
século XIII d. C. – período em que, pelos princípios
cristãos, concebia-se Deus como centro de toda a vida
(teocentrismo) e exaltavam-se os valores da humildade,
do respeito, da moderação e da abnegação. Leia, com
atenção, os dois textos. Destaque as características de
cada herói. Em seguida, explique de que maneira a
caracterização desses dois personagens reflete valores
culturais da Antiguidade Clássica e da Idade Média,
respectivamente.
Fonte: <http://projetoseeduc.cecierj.edu.br/eja/
recurso-multimidia-professor/portugues/novaeja/
m1u18/Um_heroi_para_cada_tempo.pdf>. Acesso em:
7 fev. 2020.
FONTE: Os autores

No uso de recursos educacionais digitais como suporte de ensino às


práticas de leitura um exemplo é o uso de aplicativos para dispositivos móveis
(Quadro 7).

241
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

QUADRO 7 – RECURSOS EDUCACIONAIS DIGITAIS COMO SUPORTE DE PRÁTICAS DE LEITURA


Agente de Descrição Endereço Habilidades da BNCC
Suporte eletrônico
Socrative Aplicativo que permite a https:// EM13LGG701:  explorar tecnologias
conferencistas interagir com o escoladigital. digitais da informação e comunicação
público a partir do smartphone, org.br/odas/ (TDIC), compreendendo seus princípios e
tablet ou computador. O socrative-42748 funcionalidades, e utilizá-las de modo ético,
programa permite dinamizar criativo, responsável e adequado a práticas
o discurso, permitindo que de linguagem em diferentes contextos.
se responda à plateia em seus EM13LGG702:  avaliar o impacto das
aparelhos, contanto que se tecnologias digitais da informação e
disponha de conexão à Internet. comunicação (TDIC) na formação do sujeito
Material interessante para sala e em suas práticas sociais, para fazer uso
de aula, visto que o professor crítico dessa mídia em práticas de seleção,
pode assumir o papel do compreensão e produção de discursos em
conferencista, e os alunos, da ambiente digital.
plateia. (Além do dinamismo EM13LGG704:  apropriar-se criticamente de
propiciado pela ferramenta, processos de pesquisa e busca de informação,
é uma forma de o aluno com por meio de ferramentas e dos novos formatos
dificuldades de comunicação no de produção e distribuição do conhecimento
coletivo elucidar suas dúvidas). na cultura de rede.
Nautilus Nautilus é uma adaptação https:// EF15LP16: ler e compreender, em colaboração
interativa da narrativa "Vinte escoladigital. com os colegas e com a ajuda do professor
mil léguas submarinas", de Jules org.br/odas/ e, mais tarde, de maneira autônoma, textos
Verne. A narrativa, com áudio, jogo-dos- narrativos de maior porte como contos.
revela as paixões humanas e as sinonimos EF67LP28:  ler, de forma autônoma, e
mais drásticas consequências a compreender – selecionando procedimentos
que elas podem levar. A bordo e estratégias de leitura adequados a diferentes
do seu submarino, um professor objetivos e levando em conta características
obcecado por conhecimento, dos gêneros e suportes –, romances infanto-
seu criado comedido e um juvenis, contos populares, contos de terror,
arpoador com impulsos lendas brasileiras, indígenas e africanas,
violentos são obrigados a se narrativas de aventuras, narrativas de enigma,
unir ao rebelde Capitão Nemo, mitos, crônicas, autobiografias, histórias em
um gênio criativo movido quadrinhos, mangás, poemas de forma livre e
pelo ódio, obstinado pela fixa (como sonetos e cordéis), vídeo-poemas,
independência e com sede de poemas visuais, dentre outros, expressando
aventura. Juntos, eles exploram avaliação sobre o texto lido e estabelecendo
as maravilhas e os mistérios dos preferências por gêneros, temas, autores.
fundos dos mares. Além disso, EF69LP53:  ler em voz alta textos literários
são apresentadas informações diversos — como contos de amor, de humor,
sobre o escritor. Observação: é de suspense, de terror; crônicas líricas,
necessário baixar o aplicativo. humorísticas, críticas; bem como leituras
orais capituladas (compartilhadas ou não
com o professor) de livros de maior extensão,
como romances, narrativas de enigma,
narrativas de aventura, literatura infanto-
juvenil, — contar / recontar histórias tanto
da tradição oral (causos, contos de esperteza,
contos de animais, contos de amor, contos de
encantamento, piadas, dentre outros) quanto
da tradição literária escrita, expressando a
compreensão e interpretação do texto por
meio de uma leitura ou fala expressiva e
fluente, que respeite o ritmo, as pausas, as
hesitações, a entonação indicados tanto pela
pontuação quanto por outros recursos gráfico-
editoriais, como negritos, itálicos, caixa-alta,
ilustrações etc., gravando essa leitura ou esse
conto/reconto, seja para análise posterior,
seja para produção de audiobooks de textos
literários diversos ou de podcasts de leituras
dramáticas com ou sem efeitos especiais e
ler e / ou declamar poemas diversos, tanto

242
TÓPICO 4 - RECURSOS EDUCACIONAIS DIGITAIS PARA ENSINO DA LEITURA

de forma livre quantode forma fixa (como


quadras, sonetos, liras, haicais etc.),
empregando os recursos linguísticos,
paralinguísticos e cinésicos necessários
aos efeitos de sentido pretendidos, como o
ritmo e a entonação, o emprego de pausas e
prolongamentos, o tom e o timbre vocais, bem
como eventuais recursos de gestualidade
e pantomima que convenham ao gênero
poético e à situação de compartilhamento
em questão.
EF69LP49: mostrar-se interessado e
envolvido pela leitura de livros de literatura
e por outras produções culturais do campo
e receptivo a textos que rompam com seu
universo de expectativas, que representem
um desafio em relação às suas possibilidades
atuais e suas experiências anteriores de
leitura, apoiando-se nas marcas linguísticas,
em seu conhecimento sobre os gêneros e
a temática e nas orientações dadas pelo
professor.
PoemApp: Mapa da Poesia do Brasil é uma https:// EF67LP28:  ler, de forma autônoma, e
o Mapa da cartografia da cena poética e escoladigital. compreender — selecionando procedimentos
Poesia literária do Brasil em forma org.br/odas/ e estratégias de leitura adequados a diferentes
de aplicativo para smartphone poemapp- objetivos e levando em conta características
Android e website. É como o-mapa-da- dos gêneros e suportes —, romances infanto-
se fosse um ‘Waze’ da poesia. poesia juvenis, contos populares, contos de terror,
Para publicar seus eventos, lendas brasileiras, indígenas e africanas,
sites, saraus, pontos de leitura, narrativas de aventuras, narrativas de
slams, baixe gratuitamente o enigma, mitos, crônicas, autobiografias,
aplicativo PoemApp em seu histórias em quadrinhos, mangás, poemas de
celular Android de forma forma livre e fixa (como sonetos e cordéis),
rápida e suave. Pelo aplicativo é videopoemas, poemas visuais, dentre outros,
possível inserir direto no mapa expressando avaliação sobre o texto lido
os seus pontos de poesia. As e estabelecendo preferências por gêneros,
informações inseridas pelos temas, autores.
usuários do aplicativo estarão EF69LP54:  analisar os efeitos de sentido
disponíveis para consulta tanto decorrentes da interação entre os elementos
no aplicativo quanto em nosso linguísticos e os recursos paralinguísticos
site. e cinésicos, como as variações no ritmo,
as modulações no tom de voz, as pausas,
as manipulações do estrato sonoro da
linguagem, obtidos por meio da estrofação,
das rimas e de figuras de linguagem
como as aliterações, as assonâncias, as
onomatopeias, dentre outras, a postura
corporal e a gestualidade, na declamação
de poemas, apresentações musicais e
teatrais, tanto em gêneros em prosa
quanto nos gêneros poéticos, os efeitos de
sentido decorrentes do emprego de figuras
de linguagem, tais como comparação,
metáfora, personificação, metonímia,
hipérbole, eufemismo, ironia, paradoxo e
antítese e os efeitos de sentido decorrentes
do emprego de palavras e expressões
denotativas e conotativas (adjetivos, locuções
adjetivas, orações subordinadas adjetivas
etc.), que funcionam como modificadores,
percebendo sua função na caracterização
dos espaços, tempos, personagens e ações
próprios de cada gênero narrativo.

243
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

EF89LP33:  ler, de forma autônoma, e


compreender — selecionando procedimentos
e estratégias de leitura adequados a
diferentes objetivos e levando em conta
características dos gêneros e suportes
— romances, contos contemporâneos,
minicontos, fábulas contemporâneas,
romances juvenis, biografias romanceadas,
novelas, crônicas visuais, narrativas de
ficção científica, narrativas de suspense,
poemas de forma livre e fixa (como haicai),
poema concreto, ciberpoema, dentre outros,
expressando avaliação sobre o texto lido
e estabelecendo preferências por gêneros,
temas, autores.

FONTE: Os autores

Como foi possível observar, os recursos educacionais digitais podem,


inclusive, promover o desenvolvimento de habilidades propostas pela Base
Nacional Comum Curricular — BNCC — para o ensino da leitura na educação
básica. Nossa última reflexão tem como tema os e-books, livros digitais — livros
que podem ser lidos em dispositivos computacionais (FLATSCHART, 2019) —
no qual o processo de leitura é mediado por tecnologias digitais reconhecendo
vantagens e desvantagens que esse formato de leitura pode promover (Quadro 8).

QUADRO 8 – VANTAGENS E DESVANTAGENS DA LEITURA DE LIVROS DIGITAIS


Vantagens Desvantagens
Facilidade de download dos livros Leitura mais lenta e cansativa
através da internet
Transportar vários livros e um único Não possibilita anotações manuais
dispositivo
A edição, divulgação e acesso atinge um Pouca divulgação dos exemplares
maior número de pessoas disponíveis
Acesso de muitas pessoas a mesma obra Elevado preço de dispositivos de
leitura (necessários para alguns
livros)
Busca eficiente de palavras-chaves ou Fontes e contrastes inadequados
termos
Alguns são interativos e uso de recursos Existência de grande quantidade de
multimídia obras sem recursos multimídia
Permitem ligação por hiperlinks e Crescente prática de crime contra os
consulta a outros materiais digitais direitos do autor
Ajudam a fomentar o conhecimento livre Informações às vezes mal
na rede estruturadas.
FONTE: Adaptado de Bottentuit Jr (2009, p. 435-436)

244
TÓPICO 4 - RECURSOS EDUCACIONAIS DIGITAIS PARA ENSINO DA LEITURA

DICAS

Veja um exemplo de interatividade ocorre no clássico Cinderela possibilitando


novas experiências ao leitor infantil. Disponível em: https://nosycrow.com/apps/Cinderella/.

Stumpf et al. (2011, p. 3), muito apropriadamente, destaca que:

[...] muitos usuários, já habituados com a prática da leitura em livros


impressos, sentem dificuldades de ler na tela de um computador.
O computador e seu texto “volátil” subvertem alguns dos aspectos
simbólicos do livro [...] e afetam a maneira como é visto por seu leitor/
usuário. No ciberespaço, a busca constante em aproximar o universo
virtual da realidade humana, possibilita a construção de dispositivos e
interfaces gráficas com recursos que simulam o espaço físico. São links
que conduzem o leitor de um ponto ao outro do texto com um simples
clique. Além disso, os dispositivos mais atuais vão além dos recursos
de hipertexto, permitindo a inserção de outras ferramentas que
proporcionam interação do usuário com elementos gráficos do livro
digital. A exemplo dessas novas tecnologias, destacam-se os tablets,
aparelhos eletrônicos em formato de uma prancheta, que apresentam
como principal característica, aplicativos com interfaces sensíveis ao
toque.

Pires (2010) destaca a importância do uso da hipermídia como


potencializadora da prática de leitura em ambientes virtuais, sendo que “durante
o ato de leitura de uma obra hipertextual, o leitor poderá ser despertado, também,
pelos elementos visuais dispostos e articulados nas páginas (tela) que abrigam a
sequência narrativa” (PIRES, 2010, p. 108).

NOTA

“São vários os tipos de formatos que o livro digital pode assumir, tais como:
RB, PDF, LIT, PDB, PRC6, ePub etc. (Quadro 9). Entre eles, destacam-se o PDF e o ePub. As
possibilidades de navegação também vão depender do software que será utilizado para a
abertura do arquivo” (STUMPF et al., 2011, p. 5-6).

245
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

QUADRO 9 – FORMATOS DE E-BOOK


FORMATO DESCRIÇÃO
HTML É uma linguagem para descrever a estrutura de páginas da web.
XML É um formato baseado em texto simples para representar informações
estruturadas: documentos, dados, confi guração, livros, transações, faturas
e muito mais.
TXT Arquivos de texto comum.
RTF É um formato de fi cheiro que muitos programas de processamento de
texto reconhecem; originalmente criado no WordPad.
ePUB É um formato padrão de distribuição e intercâmbio de publicações digitais.
É um meio de representar embalagem e codifi cação de conteúdo Web
estruturado e semanticamente melhorado — incluindo o HTML5, CSS,
SVG, imagens e outros recursos — para distribuição em um formato de
arquivo único.
MOBI É um formato criado pela Amazon para os livros eletrônicos.
PDF (fi gura 1) É utilizado para representar documentos da mesma forma, independente
do software, hardware ou sistema operacional.
Rb É utilizado pelo Rocket e-book, um leitor portátil de livros digitais.
Pdb Podem ser lidos em Palms ou qualquer celular que opere com o sistema
PALM, com acesso à Internet. Embora tenham a extensão genérica *.pdb,
são feitos especifi camente para o iSilo.
FONTE: Araújo et al. (2013, p. 16, grifo nosso)

FIGURA 33 – E-BOOK EM FORMATO PDF, ACESSADO PELO SOFTWARE ADOBE READER

FONTE: Stumpf et al. (2011, p. 6)

246
TÓPICO 4 - RECURSOS EDUCACIONAIS DIGITAIS PARA ENSINO DA LEITURA

Araújo et al. (2013, p. 15) destaca que “a evolução do livro para o formato
digital também possa acarretar numa evolução da leitura. Talvez isto seja possível,
mas o mais provável é que a mudança de suporte não faça com que ninguém se
torne leitor, pois o hábito de leitura normalmente é iniciado desde cedo [...]”.

Nesse debate entre o livro físico e o virtual, Meira (2006, p. 6) indica que
o principal “não é o fim ou não do papel e sim a qualidade e utilidade do que
vai estar nele, real ou virtual, daqui pra frente”; sendo que “a apresentação do
livro está relacionada com o desenvolvimento tecnológico e cultural presentes em
diferentes épocas de sua existência formal” (TEIXEIRA, 2015, p. 29).

DICAS

Agora que você já identificou que o uso de recursos educacionais digitais


pode potencializar a inserção de novas metodologias de ensino e fomentar a qualidade
no processo educacional e as práticas de leitura, pesquise uma experiência prática de uso
de textos literários digitais em atividades de ensino com uso de Recursos Educacionais
Abertos. Indicamos a leitura da obra O aluno como autor: recursos digitais e o redimen-
sionamento do ensino da literatura de Ana Carolina Sampaio Coelho. Na obra a autora
discute como as tecnologias de comunicação e informação (TICs) estão redimensionan-
do o ensino da literatura. Disponível em: http://www.unirio.br/escoladeletras/o-aluno-co-
mo-autor-recursos-digitais-e-o-redimensionamento-do-ensino-da-literatura.

247
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

LEITURA COMPLEMENTAR

Ensino de literatura e objetos de aprendizagem: uma proposta interacionista

Cimara Valim de Melo


Silvia de Castro Bertagnolli

O ensino da literatura na sociedade da informação

Vivemos em um mundo em rede. Um mundo formado por conexões


de todos os tipos e complexidades, capazes de alterar as relações humanas
e provocar a reestruturação dos vínculos sociais. Desde a reconfiguração
geopolítica mundial, que culminou com o a queda do muro de Berlim (1989) e
o fim da Guerra Fria (1991), uma nova ordem global tomou lugar, marcada pela
despolarização político-econômica e cultural. Para Castells (2011), é fundamental
para a compreensão dessas transformações a compreensão do novo sistema que
assume as rédeas das relações humanas a partir dos anos de 1970, com o advento
das Tecnologias da Informação e da Comunicação (TIC).

[...] um novo sistema de comunicação que fala cada vez mais uma
língua universal digital tanto está promovendo a integração global
da produção e da distribuição de palavras, sons e imagens de nossa
cultura como personalizando-os ao gosto das identidades e humores
dos indivíduos. As redes interativas de computadores estão crescendo
exponencialmente, criando novas formas e canais de comunicação,
moldando a vida e, ao mesmo tempo, sendo moldadas por ela.
(CASTELLS, 2011, p. 40).

Na sociedade em rede, o conhecimento pode ser percebido como


multiplicidade. Com isso, os saberes literários e tecnológicos provocam, no
novo milênio, a visualização, tanto do indivíduo como da sociedade, a partir da
imagem da enciclopédia aberta proposta por Calvino (1999) ou da biblioteca de
Babel borgeana (1998). Eis um dos desafios da educação na era da informação:
promover o desenvolvimento humano integral a partir de estratégias de ensino
aprendizagem que abranjam a totalidade dos textos e da vida. No trabalho
com gêneros discursivos, literários ou não, a leitura de textos assume grande
importância, pois o texto traduz “a multiplicidade de sujeitos, vozes e olhares
sobre o mundo” (CALVINO, 1999, p. 132).

A revolução tecnológica tem penetrado todas as esferas da vida humana


e provocado profundas mudanças nas formas de percepção do tempo, do espaço,
da linguagem, do ‘eu’ e do ‘outro’. A literatura, nesse contexto, enquanto matéria
linguística, é formada por uma rede de fios dialógicos, em interação dinâmica, que
adentram a cultura digital e as demais manifestações artísticas, experimentam a
liberdade de criação proveniente de diferentes tipos gêneros discursivos e mídias,
produzindo, com essas possibilidades de interação, novas concepções estéticas
e olhares sobre o mundo em transformação. A Internet, “a espinha dorsal da
comunicação global mediada por computadores (CMC)” (CASTELLS, 2011, p.

248
TÓPICO 4 - RECURSOS EDUCACIONAIS DIGITAIS PARA ENSINO DA LEITURA

431), constitui-se como o principal elemento de interação mundial e expansão


dos vínculos sociais. Contudo, Castells (2011, p. 445) alerta que geralmente
prevalecem os “laços fracos múltiplos” os quais, se são úteis ao fornecimento de
informações e ao encontro de indivíduos que ocupam diferentes espaços físicos,
por outro lado, corroboram à formação de uma população de seres solitários
e, consequentemente, à sustentação do sentimento de vazio que acompanha o
indivíduo, tema recorrente no romance contemporâneo.

Assim como a Internet, também a tecnologia multimídia, caracterizada


“pela integração de diferentes veículos de comunicação e seu potencial
interativo” e conhecida por estender a comunicação eletrônica para o domínio da
vida (CASTELLS, 2011, p. 450), configura-se como ambiente simbólico propício
à formação de conexões que contemplam as dimensões culturais de diferentes
tempos – isso porque as Tecnologias da Informação e da Comunicação (TIC)
não se opõem às culturas anteriores a elas; ao contrário, integram e absorvem-
nas. Com relação ao vínculo entre as tecnologias multimídia e a cultura, Castells
afirma que:

[...] talvez a característica mais importante da multimídia seja que ela


capta em seu domínio a maioria das expressões culturais em toda a sua
diversidade. Seu advento é equivalente ao fim da separação e até da
distinção entre mídia audiovisual e mídia impressa, cultura popular e
cultura erudita, entretenimento e informação educação e persuasão.
Todas as expressões culturais, da pior à melhor, da mais elitista à mais
popular, vêm juntas nesse universo digital que liga, em um supertexto
histórico gigantesco, as manifestações passadas, presentes e futuras
da mente comunicativa. Com isso, elas constroem um novo ambiente
simbólico. Fazem da virtualidade nossa realidade (CASTELLS, 2011,
p. 458).

Como podemos perceber, literatura e TIC não se opõem. Ao contrário,


podem convergir para o amplo desenvolvimento artístico-cultural por meio
da valorização do livro, da leitura e das dimensões humanas inerentes ao
fazer literário. Com a exploração das novas tecnologias, é possível revigorar as
possibilidades para o ensino de literatura nos diferentes níveis e modalidades de
ensino. Isso porque as novas gerações de leitores são formadas por indivíduos
que, em geral, já nascem imersos na cultura midiática e digital, embora nem
sempre estejam inseridos na cultura do livro. Dessa forma, a exploração das
possibilidades de interação entre literatura, mídias e artes, através de objetos de
aprendizagem, pode se constituir como um interessante caminho na busca pelo
desenvolvimento do hábito e da habilidade da leitura.

Chartier (2002, p. 21), ao analisar a transformação das práticas de leitura


na sociedade contemporânea, indaga: “como pensar a leitura diante de uma
oferta textual que a técnica eletrônica multiplica mais ainda do que a invenção da
imprensa?” Tal questão, responsável por desacomodar aqueles que têm na leitura
o seu corpus de trabalho, leva-nos à busca de estratégias para a recriação do
hábito de ler. O leitor, frente ao texto eletrônico, “cada vez mais móvel, maleável,
aberto” (CHARTIER, 2002, p. 25) e às possibilidades de interação e conectividade

249
UNIDADE 3 - RECURSOS DIDÁTICO-TECNOLÓGICOS A SERVIÇO DA LEITURA

advindas dos hipertextos, passa por um processo de transfiguração, pois deixa,


muitas vezes, de experimentar as possibilidades da leitura contínua e profunda,
mais presentes no texto físico. Com isso, o papel do professor torna-se fundamental
no trabalho com textos literários, a fim de que sejam exploradas as mais diversas
formas de leitura e interação. Para isso, é necessária uma metodologia voltada à
formação de leitores, a partir de uma visão dialética entre os elementos internos e
externos à obra de arte e da preocupação com as relações dialógicas estabelecidas
nos textos e entre eles e outras manifestações artístico culturais, como observa
Cereja:

Ao nosso ver, uma metodologia consequente de ensino de literatura


deve estar comprometida com a formação de leitores de textos
literários. Nesse sentido, o texto literário deve ser não só o objeto
central das aulas, mas também abordado com base em pelo menos
duas dimensões: as de suas relações com as situações de produção
e recepção – nas quais se incluem elementos do contexto social, do
movimento literário, do público, da ideologia, etc., conforme a visão de
Antonio Candido – e as de suas relações dialógicas com outros textos,
verbais e não verbais, literários e não literários, da mesma época ou de
outras épocas, conforme o conceito de dialogismo de Mikhail Bakhtin
(CEREJA, 2005, p. 161).

FONTE: <https://periodicos.ifrs.edu.br/index.php/tear/article/view/1715/1374>. Acesso em: 5 fev.


2020.

250
RESUMO DO TÓPICO 4
Neste tópico você aprendeu que:

• O uso de recursos educacionais digitais pode potencializar a inserção de novas


metodologias de ensino e fomentar a qualidade no processo educacional e as
práticas de leitura.

• Recursos educacionais digitais são quaisquer recursos digitais que possam ser
utilizados no cenário educacional; que podem abordar diferentes temáticas ou
disciplinas e assumir distintas características.

• Práticas de mediação de leitura de diferentes gêneros — dentre eles os


digitais — e de letramento literário podem ser fortalecidas e potencializadas
por recursos educacionais digitais.

• Um objeto de aprendizagem é definido como uma entidade, digital ou não


digital, que pode ser usada, reusada ou referenciada durante o ensino com
suporte tecnológico.

• Os objetos de aprendizagem podem ser classificados com base em seus objetivos


e funcionalidades, e que podem ser produzidos pelos próprios educadores
com uso de ferramentas digitais.

• Recursos Educacionais Abertos (REA) são materiais de ensino, aprendizagem e


investigação em quaisquer suportes, digitais ou outros que se situem no domínio
público ou que tenham sido divulgados sob licença aberta que permite acesso,
uso, adaptação e redistribuição gratuitos por terceiros, mediante nenhuma
restrição ou poucas restrições.

• Há práticas de leitura que podem ter como fomento, ou suporte de ensino,


recursos educacionais digitais e a há práticas de leitura que são mediadas
por tecnologias digitais como o e-book — livros que podem ser lidos em
dispositivos computacionais — no qual o processo de leitura é mediado por
tecnologias digitais.

• A evolução do livro para o formato digital também pode acarretar numa


evolução da leitura.

CHAMADA

Ficou alguma dúvida? Construímos uma trilha de aprendizagem


pensando em facilitar sua compreensão. Acesse o QR Code, que levará ao
AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

251
AUTOATIVIDADE

1 Uma das contribuições importantes da tecnologia para a qualidade e a


equidade da educação é possibilitar o acesso a recursos educacionais digitais
que oferecem material didático em múltiplos formatos e plataformas.

O estímulo à produção de recursos educacionais digitais tem sido uma


tendência entre as correntes pedagógicas mais inovadoras e objeto de políticas
públicas voltadas a intensificar a presença das tecnologias da informação e da
comunicação nas escolas.
Esse é um enorme ganho para educadores e educandos. Porém, é preciso
preparar os usuários desses recursos para que reconheçam os benefícios de
tais inovações, para que consigam identificar o que mais lhes servirá como
apoio ao processo de ensino — aprendizagem e para que sejam capazes de
utilizar — e, melhor ainda, de produzir — recursos educacionais de forma
inovadora, em seu cotidiano.
Diante da profusão de recursos educacionais que começam a surgir nas
redes, em repositórios e plataformas online, é importante, primeiramente,
entender a natureza dessa produção. Também é fundamental orientar formar
os professores e alunos sobre os indicadores de qualidade pedagógica e
tecnológica dos recursos. Só assim eles poderão escolher materiais adequados
às suas necessidades e que impactem positivamente a aprendizagem,
conquistando o interesse dos estudantes, otimizando tempo de aula e
proporcionando ganhos para a gestão das escolas.
Como contribuição para formação nesse tema, o Centro de Inovação para a
Educação Brasileira (CIEB) convidou o professor Cristian Cechinel, integrante
da Rede de Inovação para Educação Brasileira (www.cieb.net.br/rede-ieb),
da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), a elaborar o estudo
“Modelos de curadoria de recursos educacionais digitais”. O trabalho traça
um panorama abrangente do universo dos recursos digitais, relatando os
modelos e critérios de curadoria utilizados para formação de repositórios e
para a avaliação de qualidade dos recursos educacionais digitais.
O documento também apresenta exemplos de modelos de curadoria e de
distribuição de recursos educacionais digitais já em prática em redes de ensino
no Brasil e em outros países.

FONTE: <http://cieb.net.br/cieb-estudos-5-modelos-de-curadoria-de-recursos-educacio-
nais-digitais/>. Acesso em: 5 fev. 2020.

De acordo com Ramos, Teodoro e Ferreira (2011, p. 13) recurso educacional


digital é:
a) ( ) Ferramentas para a difusão do saber, podendo ter como um dos seus
objetivos principais, o de favorecer o processo de ensino e aprendizagem.
b) ( ) Quaisquer recursos digitais que possam ser utilizados no cenário
educacional.

252
c) ( ) Toda entida­de digital produzida especificamente para fins de suporte
ao ensino e aprendizagem.
d) ( ) Uma entidade, digital ou não digital, que pode ser usada, reusada ou
referenciada durante o ensino com suporte tecnológico.
e) ( ) Destinado a situações de aprendizagem tanto na modalidade a
distância quanto semipresencial ou presencial.

2 Sobre Especificidades dos Recursos Educacionais Digitais avalie as


afirmações a seguir:

I- Possuem diferentes licenças e condições de uso: gratuitos, pagos, abertos


e adaptáveis, fechados. Assumem diferentes formatos: textos, imagens,
vídeos, áudios, páginas web.
II- Assumem diferentes tamanhos ou granularidades: conteúdos atômicos
independentes, lições, aulas completas, capítulos, livros.
III- Representação contextual: apresentam-se os dados da maneira que emerge
de um cenário autêntico.

Sobre as assertivas anteriores, é correto o que se afirma em:


a) ( ) I, apenas.
b) ( ) II, apenas.
c) ( ) I e II.
d) ( ) II e III.
e) ( ) I, II e III.

253
254
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