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Resumo: O presente artigo objetiva apresentar reflexões e análises compar- Ana Katia Alves Santos
tilhadas por pesquisadoras e profissionais com história de atuação no campo Universidade Federal da Bahia
da primeira infância e na formação de professores. Destaca, na sua análise, aksantos@ufba.br
a concepção de criança como sujeito de direito e o paradigma da proteção
integral que lhe dá sustentação, mais conhecido como Estatuto da Criança Adriana Franco Queiroz
Universidade Federal da Bahia
e do Adolescente e o seu complemento, voltado para crianças pequenas, a adrianafq@hotmail.com
saber o Marco Legal da Primeira Infância. Destaca, também, a Base Nacional
Comum Curricular (BNCC) no que tange a Educação Infantil. Apesar de leis
e declarações de significado, no entanto, o artigo sistematizou resultado que
chama atenção para a violação dos direitos da criança, dando especial aten-
ção à uma dessas violações, tão presente no cotidiano brasileiro: o trabalho
infantil. O texto finaliza com debate sobre o papel das instituições infantis
(escola) no diagnóstico, prevenção e denúncia de abusos que levam a viola-
ção dos direitos infantis. A metodologia se baseou em pesquisa de natureza
qualitativa, desenvolvidas pelas autoras em seus estudos acadêmicos, bem
como na prática profissional no campo da Educação desde a Primeira infância
e formação de professores.
Palavras-chave: Criança. Direitos. Primeira infância. Escola. Trabalho infantil.
Introdução
O debate sobre a infância se alarga e fortalece na
contemporaneidade, tornando-se objeto emblemático desde o
século XX. Este debate é relevante e necessário na medida em
que as crianças são sujeitos de direitos, mas nem todas têm a
garantia de tais prerrogativas, ao contrário ainda ocorre, em
escala mundial, a violação dos seus direitos. O direito de estudar
como estabelece o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e
a legislação educacional no Brasil não é efetivamente garantido
a todas as crianças e adolescentes, não só por falta de acesso ao
estabelecimento de ensino, principalmente em determinadas
modalidades como da Educação Infantil, mas em alguns casos por
necessidade material do grupo familiar que os afasta da escola para
os introduzir no trabalho. E a escola pública, por outro lado não
está preparada para lidar com a situação, garantindo o direito de
aprendizagem para as crianças que trabalham.
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naturalidade. Assim que nossas crianças começam a falar, (2) Vide obras resultados de
pesquisa de doutorado das autoras
ensinamos-lhes seu nome, o nome de seus pais e sua idade. Santos (2006 e 2017) e Queiroz
(2002).
Ficamos muito orgulhosos quando Paulinho, ao ser perguntado
sobre a sua idade, responde corretamente que tem dois anos
e meio. De fato sentimos que é importante que Paulinho não
erre: o que seria dele se esquecesse a sua idade? Na savana
africana a idade é ainda uma noção bastante obscura, algo não
tão importante a ponto de não ser esquecido.
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desenvolvimento, ou refugiadas vitimadas por guerras e desastres
naturais, são alarmantes. Segundo a autora, número espantoso de
crianças morre ao nascer ou com pouquíssimo tempo de vida, dentre
as que sobrevivem grande parte, em especial as meninas (caso
forte em países asiáticos), terão pouco acesso a educação e saúde
de qualidade, grande parte dos bens consumidos pelas nações mais
pobres depende do trabalho infantil sempre barato (caso Brasil), há
crescente expansão da parcela da população chamada infância de
rua, dentre outros fatores que fortalece a violação de direitos.
Visando então a construção de espaços sociais e educativos
de proteção e garantia de direitos plenos à infância, é preciso que
antes nos posicionemos quanto a própria concepção de criança
como SUJEITO DE DIREITOS, nos fazendo antes perguntas básicas
para essa construção. As crianças brasileiras são, de fato, sujeitos
de direitos desde a primeira infância? Os adultos que interagem
com as crianças estão preparados e fundamentados para defender,
garantir e difundir os seus direitos, sejam estes pais, responsáveis
e/ou profissionais da educação?
A abordagem da criança como sujeito de direitos é recente
tanto no contexto social mais amplo quando na educação de forma
restrita. E, para que os direitos já estabelecidos para as crianças no
contexto brasileiro sejam efetivados é necessário que os adultos
construam ampla compreensão relativa a concepção da criança
como sujeito de direitos. Nesse sentido, é importante que os cursos
de formação de professores garantam a abordagem de temáticas
referente a cidadania e aos direitos humanos, que permitam que
esses profissionais possam atuar na perspectiva da defesa dos
direitos das crianças.
Desde 1990, com a validação do Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA), também conhecido como Paradigma da proteção
Integral, o Brasil em sentido legal, deixa para trás a lei anterior,
conhecida como Código de Menores ou Melo Matos (1942), legislação
que tinha caráter discriminatório, repressivo, não educativo, por
tratar de forma seletiva os “menores” infratores, não considerando
a criança como sujeito de direitos. Somente com o marco legal do
ECA, Lei nº 8.069 de 13 de julho de 1990 (BRASIL, 1990), edificado
nos princípios e fundamentos da Convenção sobre os Direitos da
Criança de 1989, o Brasil toma a criança como prioridade absoluta
e inicia processo de proteção e defesa ampla dos seus direitos.
Esse novo marco legal representou significativa conquista na luta
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são merecedoras de justiça especializada e diferenciada daquela (3) Dados do documento Primeira
Infância: Avanços do marco legal
direcionada para os adultos, devido às suas necessidades específicas. da primeira infância. CEDES -
Centro de Estudos e Debates
Complementando, o ECA e em consonância com os seus Estratégicos. Brasília, 2016.
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No entanto, a efetiva implantação do ECA e do Marco Legal da (4) Denominação comumente
utilizada para se referir ao Estatuto
Primeira Infância, em território nacional, ainda é tímida e a violação da Criança e do Adolescente, lei já
citada anteriormente.
dos seus direitos continua se dando das mais diversas formas. A
Unicef em relatório cujo título é ECA 25 anos avanços e desafios
para a infância e a adolescência no Brasil ressalva que:
[...] Crianças indígenas, por exemplo, têm duas vezes mais risco
de morrer antes de completar 1 ano do que as outras crianças
brasileiras. Mais de 3 milhões de crianças e adolescentes estão
fora da escola [...] a exclusão escolar afeta particularmente
pobres, negros, indígenas e quilombolas. Muitos abandonam
a sala de aula para trabalhar e contribuir com a renda familiar
ou porque têm algum tipo de deficiência. Outros vivem em
periferias dos grandes centros urbanos, no Semiárido, na
Amazônia e na Zona Rural. (UNICEF, 2015, p. 5)
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estabelecimentos públicos, mas é comum encontrar crianças (5) Referente a dissertação de
mestrado, quando pesquisou
trabalhando nas ruas, sozinhas ou juntamente com suas famílias, a condição de trabalho de 19
crianças e adolescentes em dez
principalmente no comércio ambulante, perambulando pelas ruas família chefiadas por mulheres que
residiam no bairro de Saramandaia
e praias da cidade. em Salvador Bahia.
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era o único motivo que lhe tirava do trabalho, onde supostamente (7) O livro “Na vida dez, na escola
zero” mostra como a matemática
poderiam ser crianças em processo lúdico de aprendizagem, mas empírica utilizada ao trabalho
de comércio ambulante deveria
infelizmente as escolas públicas ainda estão presas em moldes ser considerado pela escola que
trabalha a matemática de forma
rígidos de gerenciamento e não se tornaram o espaço de ludicidade tradicional.
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Figura 1: Princípios para as políticas da primeira infância segundo a Eurochild
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Com destaque para os Direitos de Aprendizagem e
Desenvolvimento, que são:
Figura 2: BNCC-Direitos de Aprendizagem e Desenvolvimento
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conta da criação dos filhos, para não os submeter ao trabalho precoce. (11) Vale destacar que a
Constituição Federal de 1988,
Diante dessa situação, cabe então a escola, fundamentada pelos três assim com a LDB de 1996 tratam
das questões da infância em
documentos citados (ECA, Marco Legal da Primeira Infância e BNCC) artigos específicos.
Palavras finais
As reflexões e análises aqui sistematizadas, nos fez concluir
que o mundo e em especial o Brasil, conta com significativo
acervo legal que nos respaldam na defesa dos direitos das crianças,
enquanto adultos que interagem com crianças. como parentes
e/ou professores podemos atuar de forma mais proativa nas
instituições infantis. No caso brasileiro, alguns documentos legais
abordam as questões da infância,11 sendo motivo de destaque
neste texto: o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Marco Legal da
Primeira Infância e a Base Nacional Comum Curricular. Além disso,
experiências internacionais apontam para a ampliação do olhar e
garantia de direitos às crianças, a saber, por exemplo, a Declaração
Euro Child, importante rede de organizações da sociedade civil,
que conta com o apoio de organizações internacionais como a
Unicef e a Unesco.
No entanto, no Brasil e em muitos países do mundo, como
resultado, constata-se que as crianças, desde a primeira infância,
ainda não são sujeitos de direitos “plenos”, o que se observa é a
insistente violação dos seus direitos fundamentais a educação e
a saúde, com destaque no Brasil para a criança em situação de
trabalho. O trabalho precoce retira a criança da escola e a expõe a
riscos que comprometem a saúde, prejudicando a sua constituição
física e formação educacional. Nesse sentido, o trabalho na infância
não deve ser tolerado e precisa ser combatido, sendo fundamental a
contribuição da escola na defesa ao direito a educação, assim como
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por investigadores y profesionales con una historia de acción en el campo de
la primera infancia y la formación docente. También destaca la concepción
de los niños como sujetos de derecho y el paradigma de protección integral
que los respalda, mejor conocido como el Estatuto del Niño y del Adolescente
(CEPA) y su complemento, dirigido a niños pequeños, a saber, Marco. De
la Primera Infancia. También destaca la Base Común Nacional Curricular
(BNCC) con respecto a la Educación Infantil. Sin embargo, a pesar de las
leyes y las declaraciones de significado, el artículo sistematizó un resultado
que llama la atención sobre la violación de los derechos del niño, prestando
especial atención a una de estas violaciones, tan presente en la vida cotidiana
de Brasil: el trabajo infantil. El texto finaliza con un debate sobre el papel
de las instituciones infantiles (escuela) en el diagnóstico, la prevención y
la denuncia de abusos que conducen a violaciones de los derechos de los
niños. La metodología se basó en la investigación de carácter cualitativo,
desarrollada por los autores en sus estudios académicos, así como en la
práctica profesional en el campo de la educación desde la primera infancia
y la formación del profesorado.
Palabras clave: Niño. Derechos. Primera infancia. Escuela. Trabajo infantil.
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BRASIL, Presidência da República. Lei n.13.257 de 8 de março de 2016.
Dispõe sobre as políticas públicas para a primeira infância e altera a Lei
nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente),
o Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo
Penal), a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo
Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, a Lei nº 11.770, de 9 de
setembro de 2008, e a Lei nº 12.662, de 5 de junho de 2012. Diário
Oficial da União, Brasília, DF, 9 mar. 2016. Disponível em: http://www.
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