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Experimento em Casa - parte 2:

Oscilações amortecidas no pêndulo caseiro

Objetivos
Para a continuidade do experimento em casa com o pêndulo simples, esta atividade
estuda o processo de amortecimento das oscilações do pêndulo e se relaciona com os
conteúdos tratados no Experimento Remoto 3 (oscilações amortecidas). Os objetivos
desta atividade são:

1. Realizar medições com a máxima qualidade possível tendo em vista os


objetivos do experimento e visando contornar as limitações dos equipamentos
disponíveis.

2. Utilizar o método gráfico para avaliar a adequação de relações funcionais


obtidas a partir de modelos construídos a partir de hipóteses distintas. Mais
especificamente, avaliar se é possível rejeitar possíveis modelos para
descrever as observações experimentais.

Introdução
Conforme discutido no roteiro do experimento “Pêndulo simples” de Física
Experimental II [1], quando a dissipação é ignorada no modelo de pêndulo simples, a
dependência temporal do ângulo formado entre o fio e a direção vertical, θ, segue a
equação:

2
𝑑θ 𝑔
2 + 𝐿
𝑠𝑒𝑛 θ = 0 (1)
𝑑𝑡

onde 𝐿 é o comprimento do fio e 𝑔 é a aceleração gravitacional local. A equação (1)


não tem solução analítica, mas usando a aproximação 𝑠𝑒𝑛 θ ≈θ, uma solução simples
válida para pequenas amplitudes angulares pode ser obtida da equação aproximada:

2
𝑑θ 𝑔
2 + 𝐿
θ=0 (2)
𝑑𝑡

Vale a pena relembrar que a equação (2) é matematicamente equivalente à


equação apresentada no roteiro do experimento “Sistema Massa-Mola” de Física
Experimental I [2], que descreve a dependência temporal da elongação, Y, de uma
mola ideal de constante elástica 𝑘 que tem uma massa, 𝑀, presa a ela:

2
𝑑𝑌 𝑘
2 + 𝑀
𝑌=0 (3)
𝑑𝑡
No entanto, no mundo real, as oscilações estão sempre sujeitas a efeitos
dissipativos, o que faz com que a amplitude das oscilações diminua com o passar do
tempo. O tipo de dissipação depende das condições experimentais e, em geral, não é
devido a um único efeito. Mesmo assim, é interessante avaliar como seriam as
oscilações caso a dissipação fosse determinada por um único efeito dissipativo.
Em geral o termo dissipativo é descrito por uma força com mesma direção e
sentido oposto à velocidade do oscilador em cada instante de tempo. Dependendo da
situação física a força pode ter módulo constante (força de atrito “seco”, ou seja, atrito

| 𝑑𝑥 |
constante), ou proporcional a uma potência η do módulo da velocidade, 𝑣 (𝑣 = | 𝑑𝑡 |).
| |
Nos livros, em geral se apresenta apenas o caso em que η = 1. Assim, em resumo, o
tratamento analítico do oscilador harmônico amortecido é descrito adicionando-se uma

força dissipativa 𝐹𝑑 do tipo:

→ η ^
𝐹𝑑 = − 𝑏𝑣 𝑣 (4)

^
onde 𝑣 é um versor que aponta na direção e sentido da velocidade (instantânea) do
objeto no oscilador, 𝑏 é um termo positivo que quantifica a intensidade do
amortecimento, e η é uma constante que descreve o tipo de amortecimento (é
interessante considerar os casos em que o valor de η é 0, 1, ou 2). O sinal negativo

indica que 𝐹𝑑 sempre se opõe ao vetor velocidade do oscilador. Note que se η = 0
temos uma situação de atrito seco. Quando η = 1 diz-se que a situação é de atrito
viscoso, e se η = 2 temos uma situação de atrito inercial.
Identificando-se genericamente a coordenada que descreve a posição do
2
objeto no oscilador por 𝑋 e a frequência angular por ω (𝑋 = θ e ω = 𝑔/𝐿 no caso do
2
pêndulo em pequenas oscilações, equação (2), e 𝑋 = 𝑌 e ω = 𝑘/𝑀 no caso do
massa-mola, equação (3)), a equação do oscilador harmônico amortecido
unidimensional, para uma dissipação proporcional à velocidade elevada à potência η,
pode ser escrita como [3]:

𝑑𝑋
2
2 𝑑𝑋 η 𝑑𝑋
2 + ω 𝑋 + 𝐵|| 𝑑𝑡 || 𝑠𝑖𝑛𝑎𝑙( 𝑑𝑡 ) = 0 (5)
𝑑𝑡

onde 𝐵 é uma constante associada ao termo dissipativo (as equações (2) e (3)
correspondem ao caso em que 𝐵 = 0) e 𝑠𝑖𝑛𝑎𝑙(...) é o sinal do argumento (
𝑠𝑖𝑛𝑎𝑙(𝑈) =− 1 para 𝑈 < 0, 𝑠𝑖𝑛𝑎𝑙(0) = 0 e 𝑠𝑖𝑛𝑎𝑙(𝑈) =+ 1 para 𝑈 > 0), que serve
para garantir que o termo dissipativo seja sempre oposto à velocidade e equivale ao
^
versor 𝑣 na equação vetorial.
No caso em que a dissipação não é muito intensa (i.e. num amortecimento
subcrítico em que ocorrem algumas oscilações completas antes da amplitude da
oscilação cair por um fator 1/e da amplitude inicial) soluções aproximadas para a
dependência temporal da amplitude da oscilação (o “envelope” do gráfico da posição)
podem ser obtidas, resultando em equações diferenciais do tipo [3]:

𝑑𝐴 η
𝑑𝑡
=− αη𝐴 (6)
onde αη é uma constante de normalização (ver ref. 3).
A Tabela 1 mostra as expressões para a solução da eq. (6), ou seja, para a
evolução temporal da amplitude de oscilação, dependendo do tipo de amortecimento
definido por η [3].

Tabela 1. Características das evoluções temporais da amplitude de oscilação de acordo com o


tipo de efeito dissipativo.
Tipo de efeito dissipativo Evolução temporal da amplitude (“envelope”)

η = 0 (atrito seco) 𝐴(𝑡) = 𝐴0 − α0𝑡

η = 1 (arrasto viscoso) 𝐴(𝑡) = 𝐴0𝑒𝑥𝑝(− α1𝑡)

−1
η = 2 (arrasto inercial) 𝐴(𝑡) =
𝐴0
1+α2𝐴0𝑡
= ( 1
𝐴0 )
+ α2𝑡

Nota-se que de acordo com as expressões na Tabela 1, no caso de atrito seco


a amplitude de oscilação decai linearmente, isto é, a posição do oscilador varia no
tempo entre valores máximos e mínimos que vão decaindo em módulo linearmente à
medida que o tempo passa. No caso de atrito viscoso, o decaimento da amplitude com
o tempo é exponencial, e no caso do arrasto inercial, o decaimento é com o inverso de
uma função linear. A Figura 1 mostra uma ilustração das soluções indicadas na Tabela
1, para a função envelope que limita a amplitude de oscilação.

Figura 1. Ilustração das soluções para a função envelope, nos casos de atrito seco (pontilhado
vermelho), atrito viscoso (pontilhado azul), e atrito inercial (pontilhado laranja). A coordenada
horizontal representa o tempo, e a vertical o deslocamento em relação à posição de equilíbrio.
As linhas contínuas indicam a posição em função do tempo para o oscilador, seguindo um
padrão cosseno, limitado pelas funções envelope em cada caso.
Sobre a origem física de cada tipo de dissipação apresentada na Tabela 1, vale
a pena destacar que o caso de dissipação independente da velocidade η = 0 deve
ocorrer no caso em que um atrito seco esteja presente, o que é razoável no caso de
um sistema massa-mola horizontal no qual a massa esteja em contato com uma
superfície, mas não se espera que seja o tipo de dissipação observado em um
pêndulo de fio (exceto se o fio ou a massa estiverem raspando em uma superfície
paralela ao plano de oscilação do pêndulo).
Uma dissipação proporcional à velocidade (η = 1) deve ser observada em
movimentos em fluídos cuja força de arraste seja dominada pelo atrito interno, ao
passo que dissipações proporcionais ao quadrado da velocidade (η = 2) são típicas
de movimentos cuja força de arraste seja dominada pelos efeitos inerciais. De modo
geral, a resistência imposta pelo atrito interno de um fluido é mais importante quanto
mais viscoso for o fluido e quanto menor for o tamanho do corpo e mais lento forem as
velocidades envolvidas.
Comparando-se dados experimentais da amplitude em função do tempo com
as evoluções temporais da amplitude previstas para cada um dos tipos de efeitos
dissipativos indicados na Tabela 1 é possível avaliar quais modelos podem ser
adequados (e quais definitivamente não são adequados) para descrever a condição
experimental.
Para isso, a análise de resíduos será fundamental, pois os modelos que
tiverem resíduos com estruturas claras poderão ser descartados como candidatos a
representar a condição experimental. Porém, o fato dos resíduos não exibirem
estrutura clara não significa que o tipo de efeito considerado no modelo usado no
ajuste seja correto, uma vez que pode haver mais de um tipo de efeito dissipativo
atuando simultaneamente no sistema e esses modelos foram construídos
considerando-se apenas um efeito dissipativo em cada situação. Além disso, dada a
limitação imposta pelas incertezas experimentais, não é possível concluir que um
modelo esteja certo, pois eventualmente uma observação experimental com incerteza
menor pode revelar desvios em relação ao modelo que estavam encobertos pelas
incertezas anteriores. De qualquer modo, é razoável supor que o efeito dissipativo
dominante na situação experimental provavelmente seja do tipo considerado no
modelo que descreve adequadamente os dados experimentais.

Procedimento experimental

Todos os alunos do grupo devem declarar sua contribuição para a realização das atividades.
Esse procedimento é usual em publicações científicas internacionais, em que é solicitado
acrescentar essa declaração ao final do texto. O grupo será responsável pela veracidade da
declaração, que deve ser indicada após a Conclusão no Caderno de Dados e no Relatório.

O procedimento experimental consiste na determinação da amplitude do


pêndulo em função do tempo para avaliar a adequação dos modelos apresentados na
Tabela 1. Cada aluno deverá fazer essa medida no seu próprio pêndulo para um único
comprimento (preferencialmente, todos os integrantes do grupo devem fazer o
experimento em comprimentos similares do pêndulo de modo a facilitar a comparação
dos resultados obtidos).
1) Adaptação do pêndulo para possibilitar medir a amplitude de oscilação

Usaremos o pêndulo construído no Experimento em Casa parte 1 (para


determinar a aceleração gravitacional) com algumas alterações para que seja possível
medir a amplitude de oscilação do pêndulo em função do tempo. Uma solução é
adaptar um transferidor com centro no ponto de apoio do pêndulo (caso em que só a
parte superior do fio precisa ser registrada, de maneira similar à das fotos do
experimento de Pêndulo Simples do Laboratório Virtual de Mecânica [4]).
Outra solução é colocar uma escala (régua ou fundo quadriculado) posicionada
próximo à extremidade inferior do fio, caso em que a amplitude angular de oscilação
𝐴 = θ𝑀 é determinada pela relação entre o cateto oposto no ponto extremo do
movimento, 𝑥𝐸, (medido na escala) e o cateto adjacente, ℎ (medido previamente):

𝑥𝐸 = ℎ ⋅𝑡𝑎𝑛 θ𝑀 (7)

Figura 2. Esquema para a determinação da posição angular por meio da medida do


afastamento do fio em relação à vertical. A linha vertical deve corresponder à orientação do fio
do pêndulo na posição de equilíbrio.

Além disso, para evitar problemas de alinhamento entre a escala, o plano de


oscilação do pêndulo e a câmera, é mais indicado usar como amplitude a metade da
amplitude medida nos dois extremos do movimento (o tempo correspondente a essa
amplitude é o momento em que o pêndulo passa pela posição equilíbrio entre os dois
extremos considerados).

2) Coleta dos dados experimentais

Para que seja possível avaliar as relações propostas para a dependência da


amplitude de oscilação com o tempo dadas pelas equações apresentadas na Tabela 1
é necessário determinar como a amplitude diminui com o tempo. No entanto, em geral,
a redução da amplitude em cada oscilação é muito pequena, especialmente na etapa
final do movimento do pêndulo. Assim, não vale a pena medir a amplitude em todas as
oscilações, só sendo necessário medir a amplitude algumas vezes de forma a cobrir
todo o movimento (cerca de 10 valores de amplitude bem distribuídas no tempo já
deve ser o suficiente).
Se o tempo para a amplitude da oscilação diminuir de maneira significativa não
for muito grande (por exemplo, até 5 minutos para que a amplitude se torne inferior a
5% da amplitude inicial), uma solução simples é filmar o movimento do pêndulo
durante todo o tempo e só fazer a leitura da amplitude de parte das oscilações
(aumentando o espaçamento conforme a amplitude diminui). Esse método tem a
vantagem de que os tempos correspondentes a cada amplitude medida podem ser
obtidos diretamente no tempo da filmagem exibida no Tracker [5].
No entanto, se o tempo para haver uma redução significativa da amplitude for
muito grande, a filmagem de todo o movimento pode ser inadequada por gerar um
arquivo muito grande. Nessa situação, uma solução possível é colocar um cronômetro
medindo o tempo desde o início do experimento próximo ao pêndulo de modo que o
tempo indicado pelo cronômetro apareça na filmagem e, então, realizar diversas
filmagens curtas (do tempo correspondente a cerca de umas duas oscilações do
pêndulo para garantir que ao menos um par de pontos extremos sejam registrados) de
modo a cobrir o tempo de decaimento da amplitude. Este procedimento é mais
complicado, mas é uma possível solução para evitar o uso de filmes muito longos.

3) Sugestões experimentais e cuidados relevantes

Apesar deste experimento também ser sobre o pêndulo, os objetivos são


diferentes dos da parte 1 do experimento em casa. Assim, pode ser útil considerar as
sugestões a seguir:

- Dissipação da energia mecânica: ao contrário do experimento anterior, se os


efeitos dissipativos forem muito pequenos o movimento pode ter uma duração
muito elevada, dificultando a filmagem do efeito do amortecimento. Assim, se
no pêndulo original o tempo para haver uma redução significativa da amplitude
for muito grande, vale a pena considerar o uso de um objeto menos denso para
ser a “massa” do pêndulo ou mesmo um objeto de mesma densidade e forma,
porém de tamanho menor (como uma porca menor).

- Escolha do comprimento do pêndulo, L: como estamos interessados em


determinar a amplitude da oscilação é necessário que o pêndulo se mantenha
próximo aos pontos extremos por tempo suficiente para serem registrados na
filmagem, o que favorece o uso de comprimentos maiores. Além disso, se a
amplitude de oscilação for medida usando o método de triangulação ilustrado
na Figura 2, quanto maior o comprimento do cateto oposto, ℎ, mais preciso
será a determinação da amplitude, o que também favorece o uso de pêndulos
com comprimentos maiores.

- Excitação de outros modos de oscilação: deve-se evitar que o pêndulo


tenha uma trajetória cônica. Como a filmagem é longa, vale a pena realizar
alguns testes antes para aprender como iniciar o movimento de forma a se
evitar que isso aconteça.

- Paralaxe: como o celular será usado para determinar a amplitude da oscilação,


deve-se tomar o cuidado de fixar bem o celular, colocando-o em uma posição
afastada do arranjo, de modo que fique centralizado e perpendicular ao plano
do movimento para reduzir problemas de paralaxe.
Análise de dados

Cada aluno deve obter dados da amplitude em função do tempo e realizar


ajuste desses dados usando os 3 modelos apresentados na Tabela 1. O uso do ATUS
ou do WebRoot são aconselháveis para esta análise, uma vez que possibilitam a
realização dos três tipos de equações propostas sem a necessidade de linearização, o
que facilita comparar a amplitude dos gráficos de resíduos. A decisão de quais
modelos descartar deve ser feita com base na análise de resíduos, pois a presença de
estruturas claras nos resíduos é uma indicação clara de que o modelo considerado é
inadequado. O objetivo final é indicar qual dos modelos podem ser adequados e quais
devem ser descartados para todos os alunos do grupo e, para o caso dos modelos
adequados, os valores dos coeficientes de dissipação obtidos devem ser indicados e
comparados entre os integrantes do grupo.

Lembre-se de registrar o experimento em seu Caderno de Dados para utilizar


na elaboração do Relatório 2.

Referências

[1] Roteiro do Experimento Remoto 1A - Medidas com Pêndulos. Apostilas da


disciplina 4302114 Física Experimental II - 2021. Disponível em:
https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/6390018/mod_label/intro/E1A.pdf?time=1630424289041
[Acessado em: 26 de outubro de 2021]

[2] Apostila da disciplina 4302113 Física Experimental I - 2021. Experimento 3A.


Disponível em:
https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/5898122/mod_label/intro/E3S1-2021.pdf
[Acessado em 26 de outubro de 2021]

[3] X. Wang, C. Schmitt e M. Payne. Oscillations with three damping effects, European
Journal of Physics vol. 23 (2002) pág. 155-164.

[4] Laboratório Virtual de Mecânica. Experimento do Pêndulo Simples. Disponível em


http://www.fep.if.usp.br/~fisfoto/rotacao/penduloSimples/index.php
[Acessado em 26 de outubro de 2021]

[5] Software Tracker. Disponível em: https://physlets.org/tracker .


[Acessado em 26 de outubro de 2021]

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