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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS

CÂMPUS GOIÁS
CURSO DE LICENCIATURA EM FILOSOFIA

ATIVIDADE AVALIATIVA II
ESTÉTICA E FILOSOFIA DA ARTE I
DISSERTAÇÃO SOBRE A REFLEXÃO
DE PLATÃO A RESPEITO DA POESIA

CIDADE DE GOIÁS
SETEMBRO, 2022
UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS
CÂMPUS GOIÁS
CURSO LICENCIATURA EM FILOSOFIA

ATIVIDADE AVALIATIVA II
ESTÉTICA E FILOSOFIA DA ARTE I
DISSERTAÇÃO SOBRE A REFLEXÃO
DE PLATÃO A RESPEITO DA POESIA

Trabalho apresentado por José Octávio Abramo ao


curso de Licenciatura em Filosofia – 5º Período e à
disciplina de Estética e Filosofia da Arte I,
ministrada pelo Prof.º Dr.º Fábio Amorim de
Matos Junior.

CIDADE DE GOIÁS
ROTEIRO PARA O TRABALHO
Disserte sobre a reflexão de Platão a respeito da poesia.

Pretendemos nesta dissertação, apresentar as diversas opiniões de Platão sobre a


poesia e os motivos da sua inicial resistência a ela como forma de educação, até a sua
posterior e radical opinião pela expulsão dos poetas da cidade ideal, formalizada no
livro X d’A República. Para Platão, a educação dos guardiões da cidade deveria estar a
cargo exclusivamente dos filósofos e não dos poetas. Essa crítica se inicia em seus
diálogos Íon e nos livros II, III e X d’A Republica, além do diálogo Górgias, que não
abordaremos ainda por não ter sido objeto de estudo. Procuraremos manter o devido
distanciamento histórico, sem anacronismos que podem ser comuns nesse tipo de
avaliação, mas percebendo também a atualidade de muitos desses temas. Ao final
apresentaremos também, uma opinião própria sobre alguns desses aspectos, que vimos
ter relação com um pequeno texto de Kant sobre o Esclarecimento, mesmo correndo o
risco dessa pretensão reduzir a avaliação final em seu resultado.

A tradição oral da Grécia antiga era sua principal forma de educação e


transmissão dos conhecimentos e histórias, reais ou míticas, para a população em geral,
em sua maioria não alfabetizados, além da óbvia escassez de conteúdos escritos para os
alfabetizados. Dessa forma, os poetas, ao lado dos reis e adivinhos, eram considerados
os senhores da verdade e assim mantinham o status de portadores dessa verdade para a
educação dos jovens. No diálogo Íon, Platão, com Sócrates como seu personagem,
questiona a validade dos poetas e rapsodos pois, segundo o que se entendia por
inspiração, a mensagem poética era dada de forma divina pelas Musas, que a passavam
aos poetas, deles aos rapsodos e daí para o público. Assim, Platão considerava que os
rapsodos não possuiam técnica alguma, pois, caso a possuíssem, saberiam analisar
outros poetas, como um médico, um piloto ou um auriga, poderiam analisar outro de
mesmo ofício, mas não o poeta, por não se tratar de uma técnica, mas sim de um estado
de entusiasmo, em cadeia, das Musas até ele. Comparando a pedra Magnética de
Hércules, que transmite sua atração por diversos elos de ferro, unindo-os, Sócrates
demonstra que as Musas inspiram o poeta, fazendo dele o intérprete dos deuses, os
rapsodos uma segunda cadeia, sendo os intérpretes do intérprete e o público o último elo
dessa cadeia (Platão, n/i., p.3-4). Assim ele faz a desqualificação tanto dos poetas como
dos rapsodos, por serem meros porta-vozes das Musas e deuses. Platão considera que a
verdade somente pode ser atingida pela técnica ou pela episteme, assim os poetas que
atingem, ou dizem atingir, essa verdade, o fazem pelas Musas e não pela razão. O lógos,
que deve ser vinculado a verdade, somente o será assim pelos filósofos que o atingem
pela técnica ou pela epistéme.
Já n’A República, Platão questiona primeiro, no livro II, o conteúdo da poesia,
ao entender que os deuses não deveriam ser retratados como seres cruéis e vingativos e
que a mensagem passada, muitas vezes de violência, em especial aos pais, não deveria
ser ensinada às crianças pequenas ou às pessoas desprovidas da devida razão, ou fazê-lo
ao menor número possível de pessoas, pois isso poderia deixar marcas indeléveis por
toda a vida (Platão, 2018, p.88-89).
No livro III, Platão irá iniciar sua crítica à mímesis, primeiro como método de
incorporação do poeta em seu discurso, após como a personificação do sujeito com o
objeto tratado, de modo profundo, para que o conteúdo fosse apreendido. Dessa forma,
não haveria a distinção entre sujeito e objeto e o afastamento necessário entre eles,
portanto, o conhecimento não seria pelo entendimento da forma, imprescindível para o
filósofo. Isso não seria aceito como educação pois, na verdade, seria apenas uma forma
de decorar determinadas informações, copiá-las e reproduzi-las, mnemônicamente,
fundamental para uma sociedade oral, sem nenhum questionamento e muito menos sem
nenhuma técnica ou epistéme.
A partir do livro X, a crítica à mímesis será aprofundada, pois ele entende que
essa imitação, feita para o público, induzirá o mesmo a acreditar nas aparências como a
verdade, o real, e não como uma imitação passada por verdade:
Quando alguém vem anunciar que encontrou um homem instruído em todos
os ofícios, que conhece todos os detalhes de cada arte, e com mais exatidão
do que qualquer especialista, é preciso responder-lhe que é um ingênuo, e
que, aparentemente, encontrou um charlatão, um imitador, que o iludiu a
ponto de lhe parecer onisciente, por não ser ele próprio capaz de distinguir a
ciência, a ignorância e a imitação. (Platão, 2018, p. 379)

Para Platão, a realidade somente será alcançada pelo entendimento da forma


enquanto ideia, sendo as formas sensíveis um segundo estágio desse entendimento,
como uma cópia dessa verdade e a arte a cópia dessa cópia. Sendo assim,
ontologicamente, a poesia não possui o lógos verdadeiro e estaria num terceiro degrau
abaixo da verdadeira realidade, não podendo, portanto, fundamentar a educação. Isso
deveria ser deixado aos filósofos, que teriam a capacidade de atingir a verdade, ao
perceberem as ideias das formas, e não suas cópias.
Entendemos por fim, que Platão queria apenas o conhecimento verdadeiro, e que
esse fosse o fundamento da educação, sendo, em seu tempo, até revolucionário em suas
ideias. Para ele, a poesia nunca poderia ser a base dessa educação, não discutindo sua
estética, mas suas supostas verdades. Mais ainda, vemos a preocupação do filósofo com
algo que, quase vinte e cinco séculos depois, vivemos em nossa sociedade. A influência
hoje, nem tanto da arte, mas da mídia, em todas as suas formas, é absurda em nossos
dias. Ciências, conhecimento, cultura, são questionados a todo momento. Notícias,
travestidas de entretenimento (algo como um antigo teatro grego), manipulam as mentes
de milhões. Dessa forma, cabe aqui o paralelo com um pequeno texto de Kant, de 1784,
“Resposta à questão: o que é esclarecimento?”, no qual o filósofo prussiano irá
questionar que o esclarecimento se deve mais a uma mudança de atitude do que aos
conhecimentos adquiridos:
Inércia e covardia são as causas de que uma tão grande maioria dos homens,
mesmo depois de a natureza há muito tê-los libertado de uma direção alheia
de bom grado permaneça toda vida na menoridade, e porque seja tão fácil a
outros apresentarem-se como seus tutores. É tão cômodo ser menor. Possuo
um livro que faz as vezes de meu entendimento; um guru espiritual, que faz
as vezes de minha consciência; um médico, que decide por mim a dieta, etc.;
assim não preciso eu mesmo dispender nenhum esforço. Não preciso
necessariamente pensar, se posso apenas pagar; outros se incumbirão por
mim desta aborrecida ocupação. (Kant, n/i., p. 8)

Pensar não é fácil. Pensar por si próprio ainda mais difícil. Sem dúvida Platão
estava certo ao perceber que o povo, em sua generalidade, podia ser facilmente guiado,
como o gado, para “pensar” e “questionar” por outras cabeças.

REFERÊNCIAS
KANT, Immanuel. Resposta à questão: "O que é Esclarecimento?”. Introdução,
tradução e notas por Vinicius de Figueiredo. N/i.

MUNIZ, Fernando. Platão contra a arte. Rio de Janeiro/RJ: Editora Rocco, 2010.

PLATÃO. Íon. Tradução de Humberto Zanardo Petrelli.

PLATÃO. A República. São Paulo/SP: Editora Perspectiva Ltda., 2018.

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