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Intervenção da Igreja Católica na Inglaterra

No século XVI, sobe ao trono inglês Henrique VIII, da dinastia Tudor. Apesar de
não ser o sucessor direto de seu pai, com a morte de seu irmão mais velho,
Arthur, o príncipe de Gales, ele herdou a primeira posição na linha sucessória,
ascendendo ao trono, e casando-se com a viúva de seu irmão, Catarina de
Aragão. Catarina era uma princesa espanhola filha dos reis católicos Fernando
e Isabel e, como seus pais, uma católica fervorosa. Seu casamento com
Henrique VIII era favorável às duas casas reais, espanhola e inglesa, pois
mantinha a aliança dos dois reinos. Cabe lembrar que os casamentos eram a
mais efetiva forma de tecer alianças entre as dinastias europeias.

Entretanto, Catarina não conseguiu dar ao rei um filho homem para ocupar
seu lugar no trono e perpetuar a dinastia Tudor. Em 1527, o rei solicita ao
papa, Clemente VII, a anulação de seu casamento, a fim de casar-se
novamente. Segundo os princípios católicos, o divórcio não é permitido, daí o
pedido de anulação. Mas, se tomasse uma decisão favorável ao rei da
Inglaterra, a Igreja estaria se posicionando, automaticamente, contra o reino
da Espanha. O rei espanhol, Carlos V, era sobrinho de Catarina e a Espanha,
que já havia iniciado a expansão ultramarina, possuía um vasto império
colonial que propiciava a expansão da fé católica e, portanto, o aumento de
seu poder.

Diante disso, o papa não concede o pedido real. Conceder a anulação


significava perder o apoio da Espanha, além da enorme humilhação a que
seria submetida a família real espanhola, com a rejeição de uma princesa.

A negação de seu pedido para anular o casamento foi o estopim para que o rei
rompesse com a Igreja católica e fundasse uma nova, a anglicana, que, no
lugar do papa, tinha o próprio rei como líder. Mas, as implicações políticas
desse rompimento são muito mais profundas. Henrique pretendia unificar
definitivamente a Inglaterra e via na interferência católica um empecilho a
este processo. Sem precisar levar os desejos e os interesses papais em
consideração, pode concentrar o poder político em suas mãos, fortalecendo o
trono inglês. Por outro lado, fez um poderoso inimigo, o reino espanhol.

Além da Inglaterra, os movimentos reformistas eclodiram em outros lugares


da Europa. Estes movimentos são fruto de uma série de mudanças ocorridas
no século XV. Durante a Idade Média, as práticas da Igreja católica já haviam
sido questionadas, mas seu poder conseguiu sufocar e banir esses
questionamentos, acusando cientistas e homens comuns de heresia.
Entretanto, com o fortalecimento da burguesia e a formação dos estados
nacionais, uma nova realidade se faz presente.

Na Europa moderna, a mentalidade, progressivamente, deixa de ser


teocêntrica - Deus no centro de todas as coisas - e passa a ser antropocêntrica
- o homem no centro de todas as coisas. As reformas protestantes são uma
expressão da mudança pela qual a sociedade passava, e na qual a burguesia
tem um papel determinante.

Como prática, a Igreja católica condenava o lucro e a usura, e pregava a


pobreza e a caridade como forma de chegar aos céus, desconsiderando o fato
de que ela mesma era uma instituição riquíssima. No período medieval, o
discurso católico promoveu a conformidade dos servos e evitou revoltas e
rebeliões já que ainda que tenha tido uma vida de privações na terra, estes
mesmo servos herdariam o reino dos céus. Mas, o nascimento de uma rica
classe burguesa, cuja riqueza advém das transações mercantis e, portanto, do
lucro, passem a questionar o catolicismo. Dentro da Igreja também existem
estes questionamentos, devido a gritante incompatibilidade entre o discurso e
a prática católicos. A venda de indulgências e de relíquias sagradas, a
existência de religiosos que possuíam esposa e filhos e diversas outras práticas
que não estavam conformes a ideologia pregada pelo clero provocou a
dissidência. Na Alemanha, o monge Martinho Lutero escreveu suas 95 teses e
as afixou na porta da igreja de Wittenberg. Lutero fazia uma crítica
contundente à Igreja católica e condenava a venda das indulgências.
Por suas ideias, Lutero foi ameaçado pelo Papa com a excomunhão e o
imperador Carlos V convocou a Dieta de Worms, em 1521, para que o monge
negasse suas afirmações contra a Igreja católica. Lutero se apresentou diante
do imperador, mas reafirmou o que havia escrito em suas 95 teses. Diante
disso, o imperador expulsa Lutero de sues domínios e a Igreja católica o
excomunga. Lutero refugia-se na Saxônia e fica sob a proteção de Frederico
III. Mesmo com a perseguição católica, o luteranismo ganha diversos adeptos,
o que demonstra a insatisfação coma religião católica.

Na França, o reformista João Calvino, assim como Lutero, passa a questionar


os dogmas católicos. Calvino acreditava e defendia a doutrina da
predestinação, segundo o qual os homens já nascem salvos ou não. Cabe a
cada um identificar, durante a sua vida, os sinais dessa salvação, que
consistem, sobretudo, na prosperidade individual. Se o homem prospera em
seus negócios através do trabalho, isso indica que ele é um homem salvo. Essa
valorização do trabalho e da prosperidade vai ao encontro dos interesses
burgueses e o calvinismo passa a ter diversos adeptos.

A reação católica não tardou. Em 1545 é convocado o Concilio de Trento com


o objetivo de tomar medidas que contivessem a expansão protestante e a
perda de fiéis da Igreja católica. Ao contrário do que se possa esperar, a
Igreja não cedeu e se tornou ainda mais rígida em seus princípios. O Concilio
estabelece o Index Librorum Prohibitorum uma lista de livros proibidos aos
católicos, além de recuperar a Inquisição, que tinham como função corrigir os
desvios da fé católica. Os dogmas são reafirmados e a relação que a Igreja
mantinha com os reinos ibéricos permitiu que ela fizesse um enorme
movimento de conversão com os habitantes das terras americanas.

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