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Brincadeira de Angola
Princípio da Naturalidade
Os dois tipos de educação
O uso da Capoeira para estimular as crianças a manter, bancária
aprimorar e, em muitos casos, recuperar movimentos
pró prios do corpo humano é ponto essencial do trabalho
Em Educaçã o muito se fala no ensino bancá rio, conceito
de corpo e movimento no Mé todo Brincadeira de Angola.
utilizado por Paulo Freire para de inir a simples
O Princıp
́ io da Naturalidade é baseado no uso intencional transferê ncia de informaçõ es por parte do professor,
de movimentos especı́ icos que favoreçam essas sem que haja conhecimento signi icativo por parte do
?
habilidades. aluno. Poré m, outra “educaçã o bancá ria” tã o perniciosa
quanto a primeira e muitıśsimo menos debatida é aquela
que acorrenta os alunos ao “banco” escolar por horas e
Apó s o parto, para atingir a postura ereta, passamos por
horas a io, diariamente, durante anos.
diversos está gios, nos arrastando pelo chã o,
Ensinamos o
experimentando rolamentos e explorando o mundo com o
sedentarismo?
corpo. Com o passar dos anos, a criança tende a imitar os
padrõ es corporais adultos, passando a abandonar
gradativamente algumas habilidades motoras. O sofá , as
cadeiras, as carteiras escolares, a televisã o, os jogos
eletrô nicos, as restriçõ es sociais ao movimento (“Pare de
rastejar, vai sujar sua roupa!”) e até o excesso de deveres
escolares a levam a permanecer por longos perıo
́ dos do dia
em posiçõ es está ticas. O resultado disso sã o adultos
A Capoeira aparece nesse cenário como uma
sedentá rios, com inú meros encurtamentos musculares
alternativa para a prevenção de doenças e para a
resultantes de longos anos de inatividade. Na escolas para
manutenção do bom funcionamento corporal,
crianças de 1 a 6 anos, a cada movimento mais ousado de
possibilitando às crianças um reencontro com
um aluno, nã o raro se ouvem os avisos de “Você vai cair! Vai
quebrar a perna! Pare de correr!”. Nas escolas de Ensino posições corporais recém-utilizadas no seu
movimentaçã o fıśica vã o perdendo espaço para a leitura, engatinhar, andar em 4 apoios, acocorar e opor
para a escrita e para as atividades preparató rias dos braços e pernas a partir do desequilíbrio,
futuros exames de rendimento, o problema é ainda maior. A preparando o corpo de modo orgânico para novas
escola termina por ser, muitas vezes, um local de incentivo experiências corporais.
ao sedentarismo.
As 5 fases do Princípio da Naturalidade: Tabela Naturalidade x Técnica
a) Naturalidade: aquilo que o corpo humano foi moldado para fazer,
sem a necessidade de treinamento especı́ ico. Ex: contrair e expandir,
1a fase: anfıb
́ io (CONTRAÇAO E EXPANSAO)
rastejar, acocorar e engatinhar.
2a fase: ré ptil (ARRASTAR)
b) Té cnica: aquilo que o corpo humano é capaz de fazer, mediado por
3a fase: quadrú pede (ENGATINHAR COM E SEM OS JOELHOS) um processo de ensino-aprendizagem especı́ ico. Ex: gingar com
4a fase: Sım
́ io (ACOCORAR) oposiçã o entre pernas e braços, inverter o corpo sobre a cabeça, dar
Técnica Naturalidade
1 ANO
infantil utilizando uma gama de animais, que vai de caracó is a gaviõ es, de
gorilas a sapos, de ursos a leõ es, proporcionando um ambiente de descoberta 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100%
Um jogo simbó lico de fá cil execuçã o é a “histó ria musicada”: o professor inicia Desenvolvimento Motor
cantando uma histó ria e pedindo à s crianças que interpretem corporalmente o A aquisiçã o de habilidades fıśicas especı́ icas da Capoeira acompanha
que está sendo dito. Por exemplo, cantam-se mú sicas do cancioneiro clá ssico: o desenvolvimento motor infantil. E importante que o professor saiba
“Jacaré tá na lagoa, com preguiça de acordar”, “Atirei o pau no gato”, “Jaula do o que deve esperar de uma criança de determinada faixa etá ria, para
leã o”, “Sapo nã o lava o pé ”, e as crianças imitam os bichos. que nã o queime etapas no processo. O vıd
́ eo exempli ica uma
evoluçã o geral por idades, dando uma referê ncia, mas cada criança irá
evoluir em seu pró prio tempo, por isso é necessá rio um olhar atento
https://youtu.be/sKOwyxHAib4 sobre as especi icidades de cada um, evitando generalizaçõ es.
Tabela das diferenças do mesmo movimento entre as idades
https://www.youtube.com/watch?v=EkIW3hy1xBc
O que esperar, em mé dia, que um grupo de determinada idade consiga realizar:
Ginga ser capaz de movimentar- ser capaz de colocar o pé ser capaz de alternar os ser capaz de gingar botando ser capaz de gingar opondo
se equilibradamente dominante para frente e dois pés para frente e para os pés somente para trás mãos e pés
para trás trás
Rabo-de-arraia ser capaz de equilibrar-se ser capaz de levantar um ser capaz de levantar o pé ser capaz de passar o pé ser capaz de passar o pé
com as mãos no chão pé do chão, ficando em três e inverter para o com rotação interna do com rotação externa do
apoios caranguejo quadril quadril
Aú ser capaz de equilibrar-se ser capaz de tirar ser capaz de girar para o ser capaz de girar para os ser capaz de fazer uma
com as mãos no chão simultaneamente os dois lado dominante dois lados "estrela" esticada para o
pés do solo lado dominante
Bananeira ser capaz de tentar escalar ser capaz de equilibrar-se ser capaz de equilibrar-se ser capaz de equilibrar-se ser capaz de lançar o
a parede com os pés com as mãos no chão e os na parede e cair na parede somente com corpo de forma
dois pés na parede equilibradamente com os um pé no alto e o outro autônoma, dominando o
dois pés no solo no ar lançamento e a queda da
parada de mãos na parede
NATURALIDADE
Movimentar o corpo com 6 tipos de padrã o, relacionado à s 6 FASES
O que é?
ANTERIORES à condiçã o bıp
́ ede: contrair-expandir, arrastar, engatinhar, 4
apoios, có coras, oposiçã o a partir do desequilıb
́ rio (corridas com mudança
de direçã o, dança, ginga).
Nossos pressupostos metodoló gicos vã o in luenciar diretamente nossa prá tica
de ensino e a expressã o corporal de nossos alunos, pois eles se relacionam
individual. Dessa forma, a cada aula um golpe pode ser “inventado” ou
“descoberto” por uma criança. Seguindo esse pensamento, o professor pode
facilitar a aprendizagem incentivando cada uma a expressar sua pró pria
versã o da Capoeira, facilitando o surgimento de sua dança individual,
autô noma.
com o mundo primordialmente atravé s do corpo.
Se a autonomia é um dos objetivos principais de um trabalho educativo, por
Vamos buscar movimentaçõ es estereotipadas, baseadas em padrõ es externos,
que nã o incentivá -la atravé s da livre expressã o artıśtica, tendo o corpo e a
ou vamos buscar a descoberta e o desenvolvimento da criatividade?
mú sica como veıćulos?
Cada pessoa tem o potencial de ter um estilo de Capoeira pró prio, desde que
O Mé todo BRINCADEIRA DE ANGOLA utiliza basicamente 3 FORMAS DE
nã o seja formatada por um sistema de treinamento puramente mecâ nico.
APRENDIZAGEM:
Mestre Pastinha dizia: “A Capoeira Angola só pode ser ensinada sem forçar a
IMITAÇAO – SEGUIR UM MODELO naturalidade da pessoa. O negó cio é aproveitar os gestos livres e pró prios de
A imitaçã o é utilizada quando desejamos que as crianças nos seguiam e cada um”. A Capoeira Regional original, por sua vez, era em termos de
apreendam nossos padrõ es. E excelente para a transferê ncia de conteú dos e movimento quase idê ntica à Angola, com cada praticante se movimentando
té cnicas, seja corporais ou musicais. de um jeito particular.
A interpretaçã o é utilizada, por exemplo, na oitiva, quando a criança ica “Quais são os dois tipos de Capoeira?”
observando e depois tenta fazer igual, mas acaba fazendo parecido. O objetivo
é ver como a criança interpreta o que acabou de ver. “A minha e a sua”.
CRIAÇAO – INVENTAR UM MODELO
Trabalhando Criatividade
Princípio da Cooperatividade
A cooperaçã o foi o que permitiu ao Homo Sapiens construir redes de Treinar por prazer
proteçã o social para atuar no mundo como um coletivo, seja caçando, seja
Quando o assunto é treinar por prazer, podemos aprender mais com
plantando, seja cuidando da prole. A Teoria da Evoluçã o darwinista prega
uma criança de 3 anos do que com um mestre de Capoeira. As
a sobrevivê ncia dos mais aptos, e os mais aptos, em nossa espé cie, sã o
crianças só brincam por prazer. Quando o “treino”, a brincadeira,
aqueles que cooperam melhor, garantindo sua reproduçã o e a
começa a icar maçante, elas imediatamente param e começam com
transmissã o dos seus genes. O ú ltimo macho alfa que inventou de
as frases temidas por todo professor: “Já está acabando?”, “Tô
enfrentar sozinho um tigre-dentes-de-sabre nã o deixou herdeiros.
cansado”, “Nã o quero mais brincar”. Imagine se nos treinos de
O mundo competitivo adultos fosse igual e a cada treino maçante todos parassem e
reivindicassem seu direito ao prazer! Estarıámos mais em
Já no mundo moderno, a competiçã o desenfreada leva à uma ideia de que
consonâ ncia com os princıp
́ ios da vadiagem!
somente os mais fortes vencerã o, e por isso o treinamento para a
competiçã o torna-se parte estruturante das funçõ es assumidas pelas
instituiçõ es educativas.
Você nã o tem que treinar para ser melhor do que ningué m, você nã o
E a Capoeira com isso? tem que treinar para ser melhor do que você mesmo. Treine por
A Capoeira se baseia em outro paradigma, irmando a ideia de que o jogo, prazer, treine para descobrir novas possibilidades, treine porque
o prazer e a aprendizagem devem nascer em um ambiente de harmonia e gosta da sensaçã o. Aproveite cada minuto de um treino prazeroso e
cooperaçã o. certi ique-se de que saiu mais feliz do que quando entrou.
dança das cadeiras inclusiva e cooperativa convidando-os para icar no colo dos que conseguiram.
A cada rodada, uma cadeira é retirada, até que sobre somente uma,
onde todos devem sentar juntos, organizando-se para nã o caıŕem.
COOPERATIVIDADE
Os jogos que propomos consistem em fazer exatamente a
mesma coisa que na dança das cadeiras tradicional, entretanto Um paradigma que prega que todos tê m que ganhar
O que é?
seguimos dois paradigmas diferentes: no primeiro jogo, o para ser BOM PARA TODOS.
objetivo é a inclusã o de todos, para a sensaçã o do
empoderamento. No segundo, é pedido aos alunos que rodem
em volta das cadeiras utilizando movimentos da Capoeira e que, Como trabalhar? Fazer jogos que tenham OBJETIVOS COMUNS a todos
ao se retirar uma cadeira, todos, sem exceçã o, tenham que os jogadores.
conseguir sentar nas restantes. Nada mais deve ser dito, para
que os pró prios jogadores descubram como realizar tal tarefa,
O objetivo é a formaçã o de indivıd
́ uos que colaborem
que consiste em ceder um espaço para os companheiros que Por quê?
entre si, que enxerguem objetivos comuns e façam
planos conjuntos para o BENEFICIO GERAL.
Princípio da Historicidade A Histó ria brasileira é geralmente contada a partir do ponto de vista
do colonizador europeu, introjetando noçõ es no senso comum e
naturalizando conceitos como “descobrimento do Brasil” ou
Lei 10639
LEI N° 11.645, DE 10 MARÇO DE 2008 “democracia racial” no discurso do cidadã o escolarizado. Como
acreditamos na Capoeira como ferramenta social de transformaçã o,
Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, modificada
precisamos de professores que pensem criticamente o mundo e que
pela Lei no 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que estabelece as
tenham conhecimento de quanto o conhecimento histó rico in luencia
diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo
nas relaçõ es de desigualdade na sociedade atual.
oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História
e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”. A lei 11.645 foi um avanço neste sentido e o capoeirista deve estar
apto para colocá -la em prá tica, criando referê ncias positivas para
O PRESIDENTE DA REPUBLICA Faço saber que o Congresso Nacional personagens relegados pela mıd
́ ia, de forma a facilitar uma
Art. 1o O art. 26-A da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, As mú sicas da Capoeira sã o uma verdadeira biblioteca oral,
perpetuando saberes, mitos, ritos e valores histó ricos caros à cultura
passa a vigorar com a seguinte redaçã o:
popular, podendo levar o educando a perceber que ele pró prio é um
“Art. 26-A. Nos estabelecimientos de ensino fundamental e de ensino novo elo numa corrente histó rica que envolve personagens como
mé dio, publicos e privados, torna-se obrigató rio o estudo da histó ria Zumbi dos Palmares e Besouro Cordã o de Ouro.
e cultura afro-brasilera e indıǵena.
A possibilidade de vivenciar dramaticamente os personagens que se
§ 1o O conteú do programá tico a que se refere este artigo incluirá interpretam pode auxiliar na aprendizagem e na capacidade de
diversos aspectos da histó ria e da cultura que caracterizam a re lexã o, criando as condiçõ es para a apariçã o do pensamento crıt́ico.
formaçã o da populaçã o brasileira, a partir desses dois grupos A forma como a Capoeira conta essas histó rias é sempre em
é tnicos, tais como o estudo da histó ria da Africa e dos africanos, a narraçõ es mıt́icas, geralmente musicais, que ao serem dramatizadas,
luta dos negros e dos povos indıǵenas no Brasil, a cultura negra e permitem ao educando vivenciar no seu pró prio corpo a sensaçã o de
https://www.youtube.com/watch?v=H1lz9Z7o9Ek
tema: Zumbi
mú sica: uma mú sica que fale de Zumbi
movimento: passar por baixo
jogo: pega-pega
MATERIAL DE APOIO
Ensinar somente UM conceito ou personagem histó rico a
Como trabalhar?
Filmes como Kirikou e Maré Capoeira, e histó rias de heró is negros como cada aula e construir lentamente os novos conceitos,
Besouro Preto, Zumbi ou Mestre Bimba fazem uma representaçã o imagé tica baseando-sesempre nos já ensinados. Ex: falar do seu
positiva da Africa e da cultura negra. Mestre em uma aula e fazer um jogo baseado nele. Na aula
seguinte, falar do Mestre do seu Mestre. Na seguinte, do
Mestre do Mestre do Mestre até chegar aos antigos (Bimba,
http://educacaopublica.cederj.edu.br/revista/artigos/ideologia-racial
-brasileira-o-racismo-subjacente-nas-historias-em-quadrinhos Pastinha etc.) e à Africa.
https://www.youtube.com/playlist?list=
PLIM2LV6NOahyb7S1KY3NLTMcldNWLgK3u
Tabela resumida:
HISTORICIDADE
Naturalidade Utilize movimentos que favoreçam o contrair-
O que é? Trabalhar com personagens ou fatos da Histó ria e da expandir, o arrastar, o engatinhar, o andar em
cultura do Brasil nã o é contaçã o de histó rias aleató rias, 4 apoios, o icar de có coras eo conquistar a
como a da “borboletinha que tá na cozinha” ou contos do oposiçã o de membros a partir do
baseadas em personagens ou FATOS HISTORICOS Criatividade Dar somente instruçõ es orais, falando o que
relacionados à CAPOEIRA: maltas, Guerra do Paraguai, fazer, mas nã o como fazer, aceitando todas as
Mestre Bimba ou até mesmo a histó ria do seu pró prio movimentaçõ es ou expressõ es como corretas.
Mestre.
Historicidade Trabalhar com personagens ou fatos da
“Mas eu nã o posso dar uma aula sobre o Saci ou a Mula- Histó ria e da cultura do Brasil, desde o seu
Sem-Cabeça?” Mestre até os mais diversos mitos de nossos
sım
́ bolos culturais.
Claro que pode! E deve! Uma coisa nã o exclui a outra. Use
tanto uma quanto a outra. Misture. Transforme e crie! Cooperatividade Fazer atividades em que todos tê m que
ganhar para que cada um seja vencedor.
O importante no eixo da Historicidade é entender que
estamos falando de uma aproximaçã o com a ancestralidade
especı́ ica da Capoeira.
Os eixos são transversais e complementares.
Em momento algum um exclui o outro.