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INSTITUTO PRESBITERIANO MACKENZIE

CENTRO PRESBITERIANO DE PÓS-GRADUAÇÃO ANDREW JUMPER

WILLIAM STEIGENBERGER DE SOUZA

A ORDEM DO PARTICÍPIO EM RELAÇÃO AO VERBO


PRINCIPAL

São Paulo

2021
INTRODUÇÃO:

Discute-se e categoriza-se muito sobre os casos do particípio. Isso contribui


para enxergá-los com mais clareza gramatical. Contudo, quando observa-se a sintaxe
e sua relevância para o discurso, percebe-se que as coisas não são tão claras em
relação ao particípio. Por exemplo, o que mostra que um particípio indica uma ação
anterior, simultânea ou subsequente a ação do verbo principal, a posição do particípio
ou o tempo-forma? Deste modo, o presente trabalho apresentará a importância da
posição do particípio em relação ao verbo principal, no que diz respeito a priorização
da ação.

PARTICÍPIO:

O particípio é uma forma verbal compartilhada. Isto é, “uma categoria de


adjetivo que se baseia em um radical verbal” (RUNGE; FRESCH, 2016), mostrando-
nos que ele tem características verbais e nominais. Ele possui uma formal verbal
infinita, indicando que não gramaticaliza a pessoa da ação.

A POSIÇÃO DO PARTÍCIPIO:

A escolha da posição do particípio em relação ao verbo principal é importante?


Essa tem sido uma pergunta negligenciada por algumas gramáticas. Robertson afirma
que a ordem não influencia a relação entre o particípio e o verbo principal. Falando
sobre o particípio aoristo, diz que não há necessidade de ele preceder o verbo
principal (PICIRILLI, 2014, p. 102).

Ao tratar do particípio, Wallace relaciona os tempos verbais dos particípios, o


momento da ação do particípio em relação ao verbo principal e os seus vários casos
nos aspectos adjetival, substantival e verbal do particípio. Veja o quadro abaixo.

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No quadro, Wallace relaciona muito bem os casos, com o tempo-forma dos
verbos e sua relação temporal com o verbo principal, mas não diz nada acerca da
posição do particípio na sentença. Deste modo, ao falar sobre “chave para
identificação” dos casos, ele não deixa claro com aspectos gramaticais ou sintáticos
do texto grego como se pode identificá-los. Ele apenas diz para o exegeta fazer
perguntas para o particípio. Por exemplo, se o particípio responde a pergunta
“Quando?”, então ele é temporal (WALLACE, 2009, p. 624).

Steven Runge, porém, traz uma nova perspectiva sobre a questão. Ele destaca
que “A coisa mais importante para entender sobre o particípio é a ideia de priorização
da ação” (MATHEWSON; EMIG, 2016). Ou seja, os particípios fornecem informações
básicas ou pré-riquisitos que expliquem ou descrevam com mais detalhes a ação do
verbo principal.

Nesse sentido, Runge vai dar importância para a ordem do particípio em


relação ao verbo principal. Ele mostra que a posição do particípio pode indicar a
categoria dele e o momento da ação em relação ao verbo principal.

Acerca de particípios que antecedem os verbos principais, Runge diz

Se o particípio estiver antes do verbo principal, então a informação


comunicada será pressuposta pragmaticamente ou prontamente
acessível, de fácil entendimento do ouvinte, condição típica
(contexto ou pano de fundo) ou informação temporal. Ele serve de
fundamento contextual, tendo um escopo semântico mais amplo
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para comparar as informações adverbiais e temporais. (Black;
MERKLE, 2020, p.140)

Veja um exemplo em João 13.2-4.

kai. dei,pnou ginome,nou( tou/ diabo,lou h;dh beblhko,toj eivj th.n kardi,an i[na paradoi/
auvto.n VIou,daj Si,mwnoj VIskariw,tou( eivdw.j o[ti pa,nta e;dwken auvtw/| o` path.r eivj ta.j
cei/raj kai. o[ti avpo. qeou/ evxh/lqen kai. pro.j to.n qeo.n u`pa,gei( evgei,retai evk tou/ dei,pnou
kai. ti,qhsin ta. i`ma,tia kai. labw.n le,ntion die,zwsen e`auto,n\ (NA27)

Estava sendo servido o jantar, e o diabo já havia induzido Judas Iscariotes, filho de
Simão, a trair Jesus. Jesus sabia que o Pai havia colocado todas as coisas debaixo do seu
poder, e que viera de Deus e estava voltando para Deus; assim, levantou-se da mesa, tirou
sua capa e colocou uma toalha em volta da cintura. (NVI)

Note que os verbos ginome,nou, beblhko,toj e eivdw.j estão construindo o cenário


para Jesus se levantar da mesa e lavar os pés dos discípulos. Os particípios mostram
que era um jantar (determinada hora e um contexto específico), o diabo já tinha
colocado no coração de Judas a ambição por trair Jesus (mais elementos contextuais)
e Jesus sabia que o plano de Deus estava em curso (características acerca de Jesus).
Assim, após apresentar isso, o texto diz que Cristo é movido a lavar os pés dos
discípulos, ensinando-os acerca do serviço.

Portanto, se o particípio anteceder o verbo principal, então ele indicará


condições contextuais conhecidas dos ouvintes e aspectos temporais.

Falando sobre particípios que seguem ao verbo principal, Runge diz, “se o
particípio estiver depois do verbo principal, então a informação comunicada será a
razão, resultado, propósito e causas ou modos relacionados ao verbo principal”
(BLACK; MERKLE, 2020, p.141).

Veja um exemplo em Efésios 1.19-20

kai. ti, to. u`perba,llon me,geqoj th/j duna,mewj auvtou/ eivj h`ma/j tou.j pisteu,ontaj kata. th.n
evne,rgeian tou/ kra,touj th/j ivscu,oj auvtou/Å }Hn evnh,rghsen evn tw/| Cristw/| evgei,raj auvto.n
evk nekrw/n kai. kaqi,saj evn dexia/| auvtou/ evn toi/j evpourani,oij (NA27)

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e a incomparável grandeza do seu poder para conosco, os que cremos, conforme a atuação
da sua poderosa força. Esse poder ele exerceu em Cristo, ressuscitando-o dos mortos e
fazendo-o assentar-se à sua direita, nas regiões celestiais, (NVI)

Nesse exemplo, ao analisar os particípios evgei,raj e kaqi,saj,Wallace questiona


se é uma informação de quando o poder de Deus foi exercido em Cristo ou se foi
como o poder de Deus foi exercido (WALLACE, 2009. p. 624). Por outro lado,
aplicando o conceito do Runge, é mais possível que os particípios indiquem o modo
ou os efeitos da manifestação do poder de Deus.

Portanto, se o particípio seguir ao verbo principal, então ele indicará o modo,


resultados, efeitos e propósitos do verbo principal na sequência do discurso.

Gráfico que apresenta o que Runge defende sobre a posição do particípio em


relação ao verbo principal

A ordem do particípio em relação ao verbo principal é importante, porque indica


quais são os tempo-forma dos particípios e a relação temporal das ações ou estados
deles ligados ao verbo principal.

Os particípios que antecedem o verbo principal estão no aoristo, em sua grande


maioria. Isso é observado nos Evangelhos Sinóticos e o livro de Atos que apresentam
94,1% dos particípios pré-posicionados são aoristos. Enquanto que 5,9% dos
particípios aoristos estão pós-posicionados (PICIRILLI, 2014; p.109). Ou seja, o
particípio aoristo é “não-marcado” quando antecede o verbo principal e “marcado”
quando é posterior ao verbo. É possível aparecer um particípio presente ou perfeito
antes do verbo principal. Mas, são mais raros.

Quando o particípio vem após o verbo principal, frequentemente, o seu tempo-


forma predominante é o presente, sendo possível aparecer no aoristo e no perfeito. O
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que nos chama a atenção é a raridade do particípio no futuro, com uma aparição em
Mateus e 4 em Atos (cf. Tabela de Particípios Adverbiais no NT, PICIRILLI, 2014;
p.110).

Portanto, entendo que escolha pressupõe significado, quando o particípio


aparece após o verbo principal, o tempo-forma presente será o “não-marcado”,
enquanto que o aoristo, perfeito e futuro terão mais proeminência na comunicação de
aspectos do verbo principal no discurso.

Quanto ao tempo da ação do particípio em relação ao verbo principal, Wallace


mostra que a ação do particípio pode ocorrer: i) antes da ação do verbo principal, se
ele estiver no aoristo ou perfeito; ii) simultaneamente a ação do verbo principal, se ele
estiver no presente e, às vezes, no aoristo; iii) após a ação do verbo principal, se ele
estiver no futuro e, às vezes, no presente.

Para Mathewson e Emig, a posição do particípio em relação ao verbo principal


pode contribuir para o entendimento do momento da ação do particípio em relação a
ação do verbo principal. Quando o particípio antecede o verbo principal,
provavelmente, a ação do particípio parece ser antecedente à do verbo principal.
Quando o particípio vem após o verbo principal, está no aoristo e o verbo principal
também, provavelmente, a ação do particípio seja simultânea principal. Quando o
particípio vem após o verbo principal e não ocorre as condições anteriores,
provavelmente, a ação do particípio seja subsequente a do verbo principal
(MATHEWSON; EMIG, 2016. p. 278-279)

Sendo assim, a ordem do particípio em relação ao verbo principal não


determina sua ação em relação a ação do verbo principal, mas indica e orienta a uma
decisão com mais elementos sintáticos.
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CONCLUSÃO:

Por fim, considerando a complexidade do particípio, suas nuanças e a vasta


gama de categorização dele, pode-se concluir que a ordem do particípio em relação
ao verbo principal pode indicar a proeminência de elementos do discurso e tomadas
de decisões mais seguras.

A posição do particípio comunica informações interessantes quanto a


“priorização da ação”. Deste modo, podemos interpretar o discurso destacando e
salientando o que o autor quis destacar. Essa proeminência acerca dos elementos do
discurso é uma grande contribuição da ordem do particípio em relação ao verbo
principal.

Outra contribuição é a orientação quanto as categorizações gramaticais do


particípio. Às vezes, não se tem claramente o que o particípio quer informar sobre o
verbo principal ou aspectos circunstanciais. Sendo assim, ao analisar a posição do
particípio, possivelmente, tenha-se mais elementos e mais recursos sintáticos para
nos assegurarmos da nossa decisão.

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BIBLIOGRAFIA:

ALEXANDRE JÚNIRO, Manuel. Exegese do Novo Testamento: um guia básico


para o estudo bíblico. São Paulo: Vida Nova, 2016.

BLACK, David A.; MERKLE, Benjamin L. (org.) Linguistics and New Testament
Greek. Baker Publishing Group, 2020. Edição do Kindle.

CHUNG, Chun Kwang. Ide ou Indo? Igrejas Missionais e o Uso do Particípio na


Grande Comissão de Mateus 28.19. Publicado em FIDES REFORMATA XXIV, Nº 2
(2019). p. 51-60

KÖSTENBERGER, Andreas J. Convite à interpretação bíblica: a tríade hermenêutica.


Tradução: Daniel H. Kroker, Marcus Throup, Thomas de Lima. São Paulo: Vida Nova,
2015.

KÖSTENBERGER, Andreas J .; ALEXANDER, T. Desmond. Salvation to the Ends


of the Earth (second edition) (New Studies in Biblical Theology). IVP, 2020. Edição
do Kindle.

MATHEWSON, David L.; EMIG, Elodie Ballantine. Intermediate Greek Grammar:


Syntaxe for Students of the New Testament. Baker Publishing Group, 2016. Edição
do Kindle

PICIRILLI, Robert E. Order and Relative Time in the Participles of the Greek New
Testament. Plubicado em JETS 57/1 (2014), p. 99–110.

RUNGE, Steven E.; FRESCH, Christopher J. The Greek Verb Revisited: A Fresh
Approach for Biblical Exegesis (Locais do Kindle 5722-5723). Lexham Press, 2016.
Edição do Kindle.

SILVA, Fernando Henrique; ALBUQUERQUE, Roque. Semântica modal e coerência


ideacional no particípio genitivo absoluto grego. Publicado em INTERAÇÃO,
Curitiba, jan./mar. 2021, v.21, n. 1. p. 475-491

WALLACE, Daniel B. Gramática Grega: Uma Sintaxe Exegética do Novo


Testamento. Tradução: Roque Nascimento Albuquerque. Editora Batista Regular do
Brasil. São Paulo, 2009.

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