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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS


ESCOLA DE MÚSICA E ARTES CENICAS
MUSICOTERAPIA

CASSIEL FARIA FREITAS

Musicoterapia e Neuroreabilitação: Resenha crítica – A musica nunca parou


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 A memória é uma parte fundamental da comunicação humana, sem ela não haveriam motivos
para viver, a vida seria um constante vazio, sem qualquer significado. Izquierdo (Questões
sobre Memória, 2004) profere que memória se refere à aquisição, conservação e evocação de
informações. O processo de aquisição das informações coletadas se denomina “aprendizado”,
enquanto que a evocação das mesmas é designada por recordação ou lembrança. De acordo
com o autor há três tipos de memória, categorizadas em conformidade com a sua duração: A
primeira refere-se à memória imediata, a segunda apresenta a memória de curta duração e a
terceira descreve a memória de longa duração.

No filme “A música nunca parou” o paciente teve a memória prejudicada por um tumor
cerebral que destruiu completamente a sua capacidade de criar novas memórias e acessar as
memórias antigas, o que o fez perder completamente a capacidade do aprendizado e
recordação deixando-o em uma vida inerte. Porém com o estimulo musical foi possível
resgatar algumas memórias e se estabelecer uma comunicação para gerar um novo estilo de
vida.

Segundo Carl Jung, a música é uma expressão simbólica do Inconsciente, enquanto toca o
mais profundo de nosso ser, a alma. Ao entrar em contato com a música as reações são
instintivas, não vem da razão e nem mesmo é possível o controle sobre elas. Quando Gabriel
tem o seu primeiro contato com a introdução da música dos Beatles a memória gerada por
aquela música permite a volta do mesmo ao plano consciente e permite que ele se comunique
e por um curto período de tempo “volte a ser o que era antes”.

Posteriormente a musicoterapêuta (MT) recorre ao uso de ritmos para criar/relacionar falas e


momentos do dia a dia do paciente, deixando-o cada vez mais independente. Segundo Sekeff
(1996), “o ritmo é filosoficamente falando é tudo aquilo que flui. Psicologicamente é forma,
forma no movimento. Musicalmente, é organização do tempo”. Tendo este conceito em mente
a MT desenvolveu frases e canções que possibilitaram a comunicação fluida e organizada de
Gabriel.

Na Musicoterapia não somente é importante e satisfatório o


fazer musical, mas, o fazer juntos. O ritmo cumpre uma função
persuasiva não verbal não somente pra atuar, mas atuar juntos
(GASTON, 1968).

Um possível elemento facilitador do processo de desenvolvimento foi o fato do paciente já


possuir um conhecimento musical sólido, fazendo assim com que as atividades propostas pela
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MT fossem mais facilmente executadas além de permitir que, por meio do ritmo/música, ele
se comunicasse com mais facilidade com o meio externo.

Outro ponto muito importante trabalhado pela MT foi a criação de vínculo com o paciente e a
sua família, fazendo-a parte do processo, e para isso ela “conheceu sua vivência musical, suas
preferências musicais, ou seja, saber sobre o repertório de sua vida (o que de fato foi
demonstrado pelo resgate que as músicas proporcionavam as antigas memórias). Oferecer
uma música ou uma canção que seja significativa para o paciente, demonstra que o
musicoterapêuta deve se despojar dos preconceitos em relação aos gêneros musicais se ele
deseja estabelecer vínculo com o indivíduo para ajudar na melhora da qualidade de vida do
mesmo, independente da faixa etária” (Macon dos Santos, Hélio, 2016).

Contudo o ponto chave do filme foi a criação de novas memórias, uma hipótese da
musicoterapêuta que foi comprovada no momento em que uma musica nova foi tocada no
show do Graceful Dead e uma nova memória foi gerada por meio da emoção. Segundo
BRAZ (2013), A memória emocional ocorre nas respostas emocionais aprendidas em relação
a diferentes estímulos, como: medos racionais e irracionais, sentimentos de aproximação ou
repulsa (fator este que no filme conectaram as músicas a determinadas memórias). A memória
emocional tanto fixa bons como maus acontecimentos; por exemplo, se um pianista teve um
lapso de memória durante uma apresentação, poderá ter duas reações: não tocar mais essa
peça ou estudar este trecho de tal forma que nunca mais poderá esquecê-lo.

O exemplo do pianista se conecta bem ao lapso de 20 anos de esquecimento vivido por


Gabriel após um grande trauma vivido. Sua mente bloqueou todas as informações posteriores
ao acontecimento e a partir daí começou a fixar as memórias naquilo que ele mais gostava,
música. E a partir dela resgatar memórias antigas, proporcionar a criação de novas memórias
e gerar qualidade de vida ao paciente e a sua família como consequência.

As experiências musicais constituem eventos que conjugam as sensibilidades do indivíduo e


da coletividade, compondo um tecido social denso de significados. Por meio dessas
experiências, os indivíduos desenvolvem e estabelecem formas de conhecimento e
entendimento das realidades nas quais estão imersos. (Alencar, Maria Amélia et al, 2008)
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Referencias:

1. BRAZ, Ana Lucia Nogueira. MEMÓRIA: TIPOS E ATRIBUTOS. In: LIMA, Sônia
Regia Albano de (Org.). Memória, Performance e Aprendizado Musical: Um Processo
Interligado. Jundiaí: Paco Editorial, 2013, p. 66, 78, 84.

2. CONGRESSO INTERNACIONAL DA FACULDADES EST, 3., 2016, São


Leopoldo. Anais do Congresso Internacional da Faculdades EST. São Leopoldo: EST,
v. 3, 2016.

3. Fernandes, Adriana, Pedreira, Flávia, Alencar, Maria Amélia, RiosSebastião Música,


sociabilidade e memória. Sociedade e Cultura [en linea]. 2008, 11(2), 155-157[fecha
de Consulta 22 de Diciembre de 2022]. ISSN: 1415-8566. Disponible en:
https://www.redalyc.org/articulo.oa?id=70311249002

4. GASTON, Thayer. Tratado de Musicoterapia. Buenos Aires: Paídos, 1968. p. 15. “El
ritmo no es sólo el fator principal en la organización de música, sino también quién
está hablando en general, el que proporciona la energia”. (tradução nossa)

5. IZQUIERDO, Ivan. Questões Sobre Memória. São Leopoldo: Editora Unisinos, 2004.
p.19

6. SEKEFF, Maria de Lourdes. Curso e dis-curso do Sistema Musical (tonal). São Paulo:
Annablume, 1996. p. 51.

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