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Dicotomia ou Tricotomia?

http://www.youtube.com/watch?v=X2ALkueLNjc

1. Rev. Welerson Alves Duarte, Igreja Presbiteriana Conseradora. Defende a


posição dicotômica: o ser humano é composto de duas partes: corpo e
espírito/alma; ou seja, é composto de uma parte material (corpo/carne) e outra
não-material (espírito/alma). Sendo corpo e espírito/alma maculados, ou seja, a
queda do ser humano é completa. [O corpo e o espírito/alma são bons, porém
corrompidos].

Sou traducionista dicotomista: o filho herda dos pais a parte material (corpo)
tanto quanto a não-material (espírito/alma), e porque ambos são corrompidos,
o novo ser nasce completamente corrompido (ou seja, corrompido no corpo e
no espírito/alma).

2. Rev. Nilson Fontenelli Piedade, Igreja Metodista Livre. Defende a posição


tricotômica: o ser humano é composto de três partes: corpo, alma e espírito.
Sendo corpo e alma maculados e o espírito imaculado, ou seja, a queda do ser
humano não é completa. [o corpo e a alma são ruins e o espírito é bom].

Sou traducionista dicotomista: o filho herda dos pais o corpo e a alma (que são
corrompidos), mas o espírito é criado e dado por Deus. Lembrando que o
espírito é sempre puro, incorruptível, imaculado, por isso todos os espíritos
voltam a Deus.

Por que o senhor é dicotomista? Primeiro, a ênfase bíblica é na unidade: o


homem foi feito pra vida, ele é composto de partes e essas partes foram
criadas originalmente para não se separarem e é por isso que com a segunda
vinda de Cristo há a ressurreição; o homem não é completo com uma de suas
partes apenas e mesmo quando a Bíblia cita partes o objetivo é enfatizar o todo
(a unidade do homem). Segundo, apesar da ênfase na unidade do homem, ele
é visto como um composto; Deus é um ser simples, não tendo partes, mas o
homem é um ser composto. Mas admito que o assunto de fato não é claro.

Como o senhor entende Gn 2.7: “E formou o Senhor Deus o homem do pó da


terra, e soprou em suas narinas o fôlego da vida; e o homem foi feito alma
vivente”? Em relação a criação do ser humano, temos dois relatos:

a) em Gn 1 mostra qual é o propósito da criação do homem: Deus faz o


homem pra ser, em resumo, o vice-gerente de toda a criação; ele vai dominar
sobre tudo e vamos estabelecer uma aliança na qual ele terá o papel de
desenvolver a criação;
b) em Gn 2 mostra o como, ou seja, “como” Deus fez o homem: Deus tomou da
matéria já feita – terra – e formou o corpo e sopra em suas narinas o fôlego de
vida e ele se torna alma vivente. Aqui temos uma ênfase na unidade do
homem; o homem é descrito como tendo sido criado a imagem e semelhança
de Deus. Deus deu ao homem uma parte material e outra não-material que
juntas vão formar uma unidade que originalmente deveria ser inseparável. O
ser humano acostuma com diversas coisas e se adapta inclusive com coisas
novas/recentes; no entanto, a morte, que nós praticamente nascemos
convivendo com ela e as gerações anteriores idem e nós também sabemos
que as futuras também será assim, nós nunca a encaramos com absoluta
naturalidade, apesar de chamarmos a morte de natural. Por que, então, nunca
nos acostumamos com a morte? Porque não fomos criados para a morte,
mas para a vida. Em Gn 2.7, que desceve a composição do homem feita de
parte material (corpo) e de parte não-material (esse fôlego de vida que fez do
homem “alma vivente” [espírito]), mostra que corpo e espírito são dados por
Deus; i.e., não temos uma “matéria má” e um “espírito bom”, pois Deus
formou a ambos. Deus formou o corpo e o espírito, se relaciona com
ambos, prometeu restaurar a ambos e, na eternidade, se relacionar
eternamente com ambos (ser humano na sua integridade). [A parte material
e não-material do ser humano têm origem divina].

Se alma e espírito de fato se referem à partes diferentes [à coisas distintas],


então como poderíamos entender algumas passagens (veja abaixo) que
aparentemente usam os termos de forma intercambiáveis?

a) É a alma ou o espírito que está diante do Senhor?: Ec 12.7: “..., e o


espírito volte a Deus, que o deu” e em Ap 9.6: “E naqueles dias os homens
buscarão a morte, e não a acharão; e desejarão morrer, e a morte fugirá deles”
e em Ap 20.4: “E vi tronos; e assentaram-se sobre eles, e foi-lhes dado o poder
de julgar; e vi as almas daqueles que foram degolados pelo testemunho de
Jesus, e pela palavra de Deus...”.

b) Sobre as emoções: É a alma ou o espírito de Jesus que está


angustiada?: “Agora a minha alma está perturbada; e que direi eu? Pai, salva-
me desta hora; mas para isto vim a esta hora” – Jo 12.27; “Tendo Jesus dito
isto, turbou-se em espírito, e afirmou, dizendo: Na verdade, na verdade vos
digo que um de vós me há de trair” – Jo 13.21. Essas duas passagens se
referem à situações diferentes, mas é o mesmo sentimento (angústia).

c) Sobre a obra redentora: Quem é salva, a alma ou o espírito?: “Pois que


aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro, se perder a sua alma? Ou que
dará o homem em recompensa da sua alma?” – Mt 16.26; “Seja, este tal,
entregue a Satanás para destruição da carne, para que o espírito seja salvo no
dia do Senhor Jesus” – I Cor 5.5.
Quando a Escritura diz sobre o ser humano, ela não enfatiza a parte; a ênfase
não está em dizer que uma parte do homem sofreu algo, mas está no todo,
pois quando diz que “a alma é que morre” está dizendo que o homem é que
morre, ou quando diz que “a alma que pecar essa também morrerá”, está
dizendo que o homem é que morre, pois a alma não morre sozinha. Se alma e
espírito são coisas distintas, por que o autor use termos que ele sabe que
significam coisas distintas para se referir a mesma coisa?

De todos esses exemplos acima (“a”, “b” e “c”), parece mais fácil acreditar que
se trata de uso intercambiável de termos. No pensamento hebraico temos o
que se chama de paralelismo – sinônimos que são usados pra reforçar uma
ideia. Talvez seja esse o caso quando se usa intercambiavelmente os termos
alma e espírito, mostrando asssim uma ênfase e não uma distinção. A
mentalidade hebraica usava de muito paralelismo. (Creio na inspiração verbal
das Escrituras, ou seja, nenhuma palavra nas Escrituras está colocada por
acaso).

Exemplos de paralelismo na mentalidade hebraica (Antigo Testamento):

a) “Senhor, escuta [ouve] a minha voz [petição]; sejam os teus ouvidos atentos
[inclina os teus ouvidos] à voz das minhas súplicas” – Sl 130.2, ou seja, “ouve”
e “inclina os teus ouvidos” são a mesma coisa, assim como “petição” e
“súplica”;

b) “[Eu] Aguardo ao Senhor; a minha alma o aguarda, e espero na sua palavra”


– Sl 130.5, ou seja, “eu” e “minha alma” são a mesma coisa.

Como entender Hb 4.12? Apesar dos textos do Novo Testamento serem


escritos em grego, a maioria dos seus escritores era hebreus, portanto, tinha
uma mentalidade hebraica e isso justifica o uso de paralelismo, mesmo usando
o idioma grego. Em Hb 4.12 se diz: “Porque a palavra de Deus é viva e eficaz,
e mais penetrante do que espada alguma de dois gumes, e penetra até à
divisão da alma e do espírito, e das juntas e medulas, e é apta para discernir os
pensamentos e intenções do coração” Juntas e medulas não foram feitas para
serem divididas; elas formam o corpo humano (é a parte material), assim como
espírito e alma são a mesma coisa. O texto diz que a “palavra de Deus” tem
poder para dividir alma e espírito. Ora, se alma e espírito são distintos, então o
poder da palavra de Deus é diminuído, porque para separar coisas distintas
não precisa de muito poder/força, diferentemente do que acontece se for
separar/partir a mesma coisa. Alguns estudiosos dizem que há duas palavras
gregas que significam “dividir”: a) dividir/separar coisas distintas b) dividir/partir
a mesma coisa [e é essa segunda opção que temos em Hb 4.12].
A passagem de I Ts 5.23 “E o mesmo Deus de paz vos santifique em tudo; e
todo o vosso espírito, e alma, e corpo, sejam plenamente conservados
irrepreensíveis para a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo“ é a mais usada
para ensinar que o ser humano é formado de 3 partes (tricotômico) já que
aparecem as palavras “corpo, alma e espírito” em ordem. Seguindo esse
raciocíonio, as passagens de Mc 12.30 “Amarás, pois, ao Senhor teu Deus de
todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todo o teu entendimento, e de
todas as tuas forças; este é o primeiro mandamento” e de Lc 10.27 “E,
respondendo ele, disse: Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, e
de toda a tua alma, e de todas as tuas forças, e de todo o teu entendimento, e
ao teu próximo como a ti mesmo” estariam elas, pois, ensinando que o ser
humano é formado de 4 partes?

Nem Paulo (I Ts 5.23) e nem Jesus (Mc 12.30; Lc 10.27) estão preocupados
em ensinar de quantas partes o homem é composto/feito; Paulo está dizendo
que o homem de forma integral (como um todo) seja santificado enquanto
Jesus está dizendo que o homem de forma integral deve amar a Deus. Eles
estão usando de uma figura de linguagem que cita elementos pra dar ênfase
ao todo, ou seja, Jesus poderia ter dito “amarás, pois, o Senhor teu Deus com
todo o seu ser”, e Paulo “que vocês sejam santificados em todo o seu ser”. Há
uma ligação direta entre “amar a Deus sobre todas as coisas” e “buscar a
santificação”, pois não há santifiação se não há verdadeiro amor por Deus.
Buscamos a santificação não para sermos salvos, mas porque amamos a
Deus. (Ele nos amou primeiro e nos deu deste amor e agora nós queremos
agradá-Lo e cumprir com o propósito da nossa existência manifestando o
nosso amor). Buscamos a santificação porque Deus é santo e o lugar onde Ele
está e pra onde nós estamos caminhando ir é um lugar santo (“Segui a paz
com todos, e a santificação, sem a qual ninguém verá o Senhor” – Hb 12:14).

Apesar da Escritura não ser suficientemente clara sobre esse tema (visão
dicotomista e tricotomista), ela não pode estar ensinando as duas coisas; uma
tem de estar correta. Mas a ênfase está na integralidade, na unidade. O
Evangelho precisa ser algo que trate o integral do homem, tanto a sua
parte material quanto a sua parte não-material. A transformação que o
Evangelho faz tem de ser por completo, ou seja, a redenção que Cristo
veio adquirir não foi só para o “espírito” (ou só pra “alma”), ou só para o
“corpo”, mas uma redenção ao homem por completo.

Se o ser humano é feito de corpo, alma e espírito (três coisas de naturezas e


funções distintas) e um deles (espírito) não está corrompido, então isso quebra
a unidade, que é a ênfase bíblica. Não consigo aceitar o argumento dos
tricotomistas de que existe uma relação entre o homem ser composto de 3
partes com a Trindade. Na Trindade nós temos funções/papéis distintas (na
obra da redenção), mas o Pai, o Filho e o Espírito Santo são iguais em
essência, por isso a unidade; enquanto que as três partes que comporiam o ser
humano seriam de natureza e poder distindos, ou seja, corpo não é da mesma
essência de espírito que não é da mesma essência de alma, então, não é
apenas função diferente, mas natureza diferente. [Pergunta para os
tricotomistas: Como é possível algo corrompido, como a alma, conviver/habitar
com algo puro (espírito)?].

Quando Cristo diz: “Raça de víboras, como podem vocês, que são maus, dizer
coisas boas? Pois a boca fala do que está cheio o coração” – Mt 12:34.
Coração, nesse caso, é o centro da vida; é aquilo que controla o que
chamamos de faculdade da alma. Na faculdade da alma (espírito) estão a
razão, as vontades e as emoções; Deus nos dotou desses três elementos
(razão, vontade e emoção):

1. Antes da queda: a razão possibilitava o homem entender o que Deus queria


e dar valor a isso; a vontade era a capacidade de querer fazer aquilo que ele
entendeu o que Deus quer; e a emoção é ter prazer em fazer aquilo que Deus
quer.

2. Depois da queda: A queda afetou o homem todo porque foi no coração, que
é a fonte da vida, onde habitam razão, vontade e emoção: “Sobre tudo o que
se deve guardar, guarda o teu coração, porque dele procedem as fontes da
vida” – Pv 4:23]. Como esse coração está corrompido, então ele corrompe o
corpo todo. De modo que essa ordem de razão, vontade e emoções, no
homem caído, ela está invertida: o homem determina o que ele vai fazer é com
base no que lhe dará prazer; então, o que me dá prazer eu quero e isso eu dou
valor. O que a regeneração (o trabalhar do Espírito Santo) faz é inverter esse
papel, pois dá ao homem a capacidade de enchergar o que de fato tem valor,
de modo que, quando o crente erra, ele sabe o que está fazendo, ou seja, ele
está indo contra aquilo que ele entendeu que não deveria fazer. [mas o crente
pode deliberadamente contrariar a voz do Espírito Santo].

Como entender Ecl 12.7 “E o pó volte à terra, como o era, e o espírito volte a
Deus, que o deu” se o espírito é herdado dos pais? Isso se refere à criação
original. Nós não viemos diretamente do pó; o que nós temos (corpo e espírito)
foi gerado por alguém (nossos pais e assim sucessivamente); apenas Adão
veio diretamente do pó e recebeu o espírito diretamente de Deus. Somos pó
porque somos descendentes de Adão. Pra afirmar que o corpo e o espírito são
herdados dos pais, veja o caso de Eva: Deus tira a costela de Adão e forma
Eva e ela se torna alma vivente sem que haja um relato de Deus ter soprado
nela o espírito. Então, ou mulher não tem espírito, ou ela recebeu não só a
parte material como também a sua parte não-material do marido. Isso explica a
corrupção do gênero humano. A Bíblia não é suficientemente clara quanto à
isso. Mas há três teorias vigentes:

a) Traducionismo: (veja a explicação sobre traducionista dicotômico e


traducionista tricotômico no início desse estudo);
b) Criacionismo: No momento do nascimento/gestação, e não se sabe quando,
Deus cria um espírito novo [Mas isso é complicado pra aqueles que crêem na
criação de seis dias apenas e a partir disso só providência; aí você tem um
problema com a criação nova do espírito];

c) Preexistencialismo: No seis dias Deus criou todos os espíritos armazendo-os


no céu e conforme as pessoas vão sendo geradas, Ele vai dando o espírito
novo.

Deus tira a costela de Adão e forma Eva e ela se torna alma vivente sem que
haja um relato de Deus ter soprado nela o espírito. Então, ou mulher não tem
espírito, ou ela recebeu não só a parte material como também a sua parte não-
material do marido. Isso explica a corrupção do gênero humano.

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