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UNIVERSIDADE FEDERAL DE JUIZ DE FORA

CURSO DE LICENCIATURA EM LETRAS

CATARINA MENEZES DE JESUS FERREIRA

PORTFÓLIO - PRÁTICAS ESCOLARES DE LÍNGUA PORTUGUESA

JUIZ DE FORA- MG

2023
CATARINA MENEZES DE JESUS FERREIRA

PORTFÓLIO - PRÁTICAS ESCOLARES DE LÍNGUA PORTUGUESA

Portfólio no curso de Licenciatura em Letras da Universidade


Federal de Juiz de Fora – Juiz de Fora-MG como método
avaliativo da disciplina Práticas Escolares de Língua
Portuguesa.

Docente: Dr. Alexandre Cadilhe.

JUIZ DE FORA- MG

2023

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SUMÁRIO

1. APRESENTAÇÃO........................................................................................................5

2. MEMORIAL ................................................................................................................5

3. RESENHAS…..............................................................................................................7
3.1. Artigo: Ensino de Língua Portuguesa: reflexões sobre a necessidade de análise
crítica de textos………………………………………………………………………..………7
3.2. Artigo: Letramento e suas implicações para o ensino de língua materna……......8
3.3. Artigo: Todos nós semos de frontera: ideologias linguísticas e a construção de
uma pedagogia translíngue…………………………………………………………....…..….10

4. ENSAIO.......................................................................................................................11

5. ATIVIDADE DESENVOLVIDA EM SALA DE AULA……..………………...…15

6. PROTÓTIPO DE UM PROJETO DIDÁTICO…………………………………...15

7. REFLEXÕES………………………………………………………………....……..23

8. ANEXOS……………………………………………………………………...……..24
8.1. Entrevistas………………………………………………………………...……..24
8.1.1. Entrevista 1……………………………………………………………………24
8.1.2. Entrevista 2……………………………………………………………………26
8.1.3. Entrevista 3………………………………...………………………………….27
8.1.4. Entrevista 4……………………………………………………………………29
8.1.5. Entrevista com a professora…………………………………………………...31

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9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS……………………………………………..32
9.1. Memorial…………………………………………………………………………32

9.2. Resenhas………………………………………………………………………….33

9.3. Ensaio…………………………………………………………………………….33

9.4. Atividade desenvolvida em sala de aula…………………………………………34

9.5. Protótipo de um projeto didático………………………………………………....34

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1. APRESENTAÇÃO
O presente documento tem como objetivo apresentar, de forma clara e objetiva, os
conhecimentos adquiridos durante a disciplina de Saberes Escolares de Língua Portuguesa e
expor os tópicos abordados do ponto de vista individual de cada discente. Contando com sete
tópicos textuais, o portfólio se desenvolve de acordo com as vivências que cada aluno teve
dentro de sala de aula, e como tais experiências podem ser expostas de forma prática no dia a
dia, durante a nossa formação como educadores.

2. MEMORIAL
Eu nunca tive interesse por leituras que eram obrigatórias dentro das escolas. Estudei a
minha vida inteira em escolas particulares e sempre tive a impressão de que coordenadores e
professores são péssimos para escolher livros que despertem o interesse dos alunos,
principalmente daqueles que ainda estão no Ensino Fundamental e, consequentemente, estão
desenvolvendo uma formação mais básica.
Meu hábito de leitura sempre esteve presente, os meus pais sempre me presenteavam e
me educavam para que eu criasse interesse pelos livros, mas esse hábito não envolvia livros
escolares. Eu detestava eles. Eles nunca me despertavam interesse e, por muitas vezes, a
linguagem não conseguia prender a minha atenção. Tive vários problemas em aulas de Língua
Portuguesa por conta disso, até que, em um ano específico, uma professora conseguiu mudar a
minha opinião.
Me lembro carinhosamente da minha professora de Língua Portuguesa do sexto ano
do Ensino Fundamental II, do Colégio Metodista Granbery, que me ensinou que leituras
escolares podem ser, na verdade, bem divertidas. A leitura do livro “Extraordinário”, de R. J.
Palacio, era obrigatória para todos os alunos e deveríamos começar o ano já com ele em mãos
logo no primeiro dia de aula. Eu já tinha em mente que provavelmente não iria ler, que a
leitura deveria ser feita em casa e teríamos alguma avaliação sobre, o que de fato aconteceu,
mas a dinâmica da leitura foi completamente diferente. Ao invés de lermos individualmente, a
professora propôs uma dinâmica inédita para nós: faríamos a leitura juntos, em sala, sempre
nos últimos vinte minutos de cada aula. Cada aluno iria ler um parágrafo, e assim teríamos a
oportunidade de ir comentando um com os outros sobre nossas opiniões durante o processo.
Deu certo. Não me lembro quanto tempo demoramos para terminar o livro de em
média 300 páginas, mas foi uma experiência superdivertida. Tivemos contato com diferentes
opiniões, interagimos durante todo o livro e toda aula nos deixava mais ansiosos para

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terminarmos o drama – era quase como esperar pelo fim de uma novela. Me lembro até hoje
das risadas que dei, dos apertos no coração que senti, da timidez que me consumiu por ter que
ler para todos em uma sala lotada, mas tudo isso valeu a pena. Eu não sabia que ler um texto
para a escola poderia ser tão divertido e, até hoje, esse é o tipo de dinâmica que eu adoraria
levar para a sala de aula se um dia eu me tornar educadora.
Acredito que alinhar a idade dos alunos ao tipo de leitura que pode ser pedida, não só
ajuda a despertar o interesse pela matéria, mas também pela leitura no geral. “Extraordinário”
é um livro que eu guardo até hoje na minha estante e que fui na pré-estreia assisti-lo nos
cinemas. Não é um dos meus favoritos, mas eu guardo uma memória de muito carinho sobre
ele, principalmente pela experiência única e, ao mesmo tempo, coletiva que tive com ele.
Infelizmente, esse foi um caso à parte. O sistema educacional insiste que os clássicos
da literatura brasileira devem ser exaltados por alunos escolares, o que não deixa de ser uma
verdade, mas não é a leitura ideal para alunos novos e que já não possuem interesse por
qualquer tipo de leitura.
No ano seguinte, ainda no Colégio Metodista Granbery, o meu professor de Língua
Portuguesa do sétimo ano nos propôs uma leitura que, de acordo com ele, mudaria nossa
visão de mundo: “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, de Machado de Assis. Dessa vez, a
dinâmica não foi coletiva, cada aluno teria que ler o livro individualmente e, no final do ano,
escreveríamos um texto sobre nossas impressões como trabalho final.
Eu não li o livro, mas eu tentei. Eu tinha 12 anos de idade, e meu único interesse era
terminar de ler “Percy Jackson e os Olimpianos: O Ladrão de Raios”, que era uma leitura
infanto-juvenil própria para a minha idade, mas eu ainda assim tentei dar uma chance para
Machado de Assis. Não deu certo.
A escrita não me atraiu, tudo aquilo era muito confuso (como assim ele já tava
morto?) e eu não consegui desenvolver a leitura. Eu não fui a única, vários colegas de classe
tiveram dificuldade e decidimos nos juntar para pedir para o professor que o livro fosse
trocado. Tudo o que recebemos foi: “Vocês já têm idade o suficiente para nutrir interesse
pelos clássicos brasileiros”. Eu acho 12 anos uma idade muito nova para ler Machado de
Assis, mas pelo visto o professor pensava diferente.
Meu trabalho final foi feito pelas impressões que minha mãe teve quando ele leu
“Memórias Póstumas de Brás Cubas” pela primeira vez aos 19 anos, e eu fiquei anos fugindo
dos livros do Machado por medo de ainda não ter nutrido interesse algum pela leitura ou pelos
clássicos brasileiros. Não tive vontade de relê-lo mais tarde, nem de pegar qualquer outro

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livro que seja marcante para a literatura brasileira, principalmente pela experiência horrível
que tive.
Acontece que anos depois eu tive que ler “Dom Casmurro” para a apresentação de um
trabalho no segundo ano do Ensino Médio, no Colégio CAVE, e me envolvi imensamente
com o drama Bentinho-Capitu-Escobar. Li o livro inteiro em menos de quatro dias e decidi
que talvez fosse a hora de dar outra chance para Brás Cubas – e dessa vez deu certo. Eu
consegui entender os personagens, adentrei o enredo da história e, por fim, essa leitura
conseguiu deixar um marco na minha trajetória.
Acredito que todo gosto por literatura deve ser criado a partir de leituras que condizem
com a sua idade. Com 12 anos eu queria ler a saga de Harry Potter, aos 17 eu me sentia
confortável em tentar algum romance de Machado de Assis. Aos 21, eu estou relendo a saga
infanto-juvenil “Percy Jackson e os Olimpianos”, mas com uma prateleira repleta de clássicos
brasileiros na minha estante dos quais eu já li e alguns que ainda tenho vontade de ler
novamente.
Está na hora do sistema educacional brasileiro rever seus métodos e entender que, no
nosso país, 44% da população não lê, e em alguns casos a falta de interesse já vem de dentro
das escolas. A escolha de livros com leituras mais intelectuais para crianças do Ensino
Fundamental ao invés de algum romance infanto-juvenil, faz com que esse índice permaneça
o mesmo ou aumente com o passar dos anos. Eu sempre tive pais que me incentivaram a ler
livros que me chamassem a atenção, mas se fosse pelo sistema escolar eu provavelmente
nunca teria desenvolvido esse hábito.
O mercado editorial atual tem se tornado cada vez mais amplo. Os gêneros literários
para pré-adolescentes tem se expandido cada dia mais e podem ser utilizados e trabalhados
dentro das escolas junto com os alunos. A literatura nacional não precisa ser esquecida, mas
uma elaboração deve ser feita antes que possamos chegar até lá. Não se estuda a fórmula de
Bhaskara sem antes entender as noções básicas da matemática, e não deveria se estudar
clássicos brasileiros sem antes desenvolver uma familiaridade com a leitura.

3. RESENHAS
3.1 Artigo: Ensino de Língua Portuguesa: reflexões sobre a necessidade de
análise crítica de textos.
Por Rafaela Lopes

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O artigo tem como objetivo analisar aulas de Língua Portuguesa nos anos de 2013 e
2014, em escolas públicas de Belo Horizonte. Os professores e alunos foram analisados
sob a forma como trabalham textos que circulam na sociedade. A pesquisa trabalhada
contou com o apoio de um docente de ensino superior, professores de língua portuguesa
da educação básica e alunos da graduação da Universidade Federal de Minas Gerais, que
se encontram semanalmente nas escolas para analisar trabalhos de alunos de ensino
médio, com o objetivo de construir soluções para problemas encontrados.
Atualmente, muito se discute a necessidade de implantar novos objetos de ensino nas
aulas de Língua Portuguesa. Há pouco tempo, a discussão se baseava em ministração de
aulas de gramática e, hoje, a discussão se volta para os gêneros textuais. Geraldi (1984,
1997) busca afastar o ensino de língua portuguesa da redação e da gramática, defendendo
que o ponto de partida e de chegada deva ser a produção de texto, e a análise linguística
como um instrumento para auxiliar na melhor escrita e leitura, fazendo com que o aluno
atinja seus objetivos, tanto para si, quanto para o leitor de seu texto.
É a partir disso que será definido o letramento crítico, não apenas leitura e análise do
texto, mas o poder de criticidade. Dar ao aluno ferramentas para que, juntamente com o
seu conhecimento de mundo, possa ter a capacidade de fazer um letramento crítico, não
apenas de assuntos problematizados, mas de todo texto.
Posso me recordar do meu ensino médio. Minha professora de língua portuguesa
trabalhou muito nosso senso crítico. Todas as aulas eram voltadas para leituras de textos, e
ela sempre nos estimulava e perguntava nossa opinião a respeito de determinado tema. Foi
muito importante para o nosso desenvolvimento e nos auxiliou na produção de redações
para possíveis vestibulares.
Portanto, penso que seja de extrema importância que o letramento e o letramento
crítico sejam postos em prática dentro de sala de aula, principalmente nas aulas de língua
portuguesa. O conteúdo das aulas não deve de forma alguma ser considerado neutro, visto
que deve permanecer em constante confronto com ideias, pensamentos, conceitos e
teorias. Estimular o senso de criticidade do aluno é estimular seu desenvolvimento pessoal
e intelectual, portanto, faz-se necessária a produção de atividades e conversas, as quais
eles possam exercer o papel de sujeitos agentes e protagonistas de seu ensino.

3.2 Artigo: Letramento e suas implicações para o ensino de língua materna.


Por Rafaela Lopes
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O artigo tem como objetivo discutir a relevância do letramento no ensino e a
aprendizagem da língua materna em todos os níveis escolares, inserindo o estudo dos
gêneros textuais ao longo da alfabetização, do ensino fundamental e médio.
Professores alfabetizadores se preocupam em melhorar as formas de letrarem seus
alunos, já professores de língua materna tem como o objetivo inserir os diferentes gêneros
textuais. Ao longo de sua vida, o aluno irá se deparar com incontáveis gêneros que ele
pode ter conhecimento ou não, e precisará saber lidar com ele, entender o que precisa
fazer e como escrever para ter um trabalho de excelência.
Os estudos do letramento fazem da leitura e da escrita práticas discursivas. A
facilidade ou dificuldade de aprendizagem não depende única e exclusivamente das
dificuldades ortográficas, mas sim do conhecimento e familiaridade que o aluno tem com
o texto. Quanto mais familiarizado com o gênero, melhor ele compreende e aprende a se
comunicar.
Na experiência citada por Guimarães (1999), os alunos foram submetidos a fazer um
comentário a respeito de um livro, se eles recomendam ou não aquela leitura, e ao final
das atividades foi possível identificar o gênero resenha. O que mais me chamou atenção
foi como eles chegaram a essa conclusão. A professora não deu uma aula sobre resenhas,
não explicou o que era e nem como fazia, os próprios alunos testando textos e testando
gêneros até entenderem que se tratava de uma resenha, e assim puderam conhecer o
gênero.
Muitos alunos detestam aulas de produção de texto. Dizem que não querem escrever,
que tem preguiça de produzir, mas muitas vezes falta um pouco de sensibilidade do
professor. Todos passamos por essa fase, infância, adolescência e juventude, e todos
compreendemos o quão chato e desgastante pode ser produzir um texto no qual o aluno
recebeu uma aula ou duas e nunca teve um contato realmente com aquele gênero. Nós,
como futuros professores, futuros docentes, precisamos nos colocar no lugar do aluno e,
assim como na experiência de Guimarães, elaborar uma forma de “dar o conteúdo” de
forma leve, prática, didática e divertida. Em que o aluno consegue se ver escrevendo
aquilo, não por uma obrigação das tarefas da escola, mas como uma atividade que ele
realmente gostaria de participar. É fato que nem sempre conseguiremos agir dessa forma,
mas é crucial que o professor seja o facilitador da aprendizagem, um mediador para se
alcançar o conhecimento.

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3.3 Artigo: Todos nós semos de frontera: ideologias linguísticas e a construção de
uma pedagogia translíngue.
Por Catarina Menezes

O ensino da língua materna dentro das escolas brasileiras jamais será uma discussão
politicamente neutra. A necessidade de ensino da língua portuguesa começa sua história
durante o período imperial de Dom Pedro II, em que civilizar povos originários e banir a
língua de povos africanos como uma forma de construir um país monolíngue se tornou o
principal objetivo para a popularização do idioma. Idioma este que persistiu durante inúmeros
séculos, depois de passar por repúblicas, ideais iluministas e ideologias de que há uma língua
comum, única e homogênea. No artigo de Adriana Carvalho Lopes e Daniel Nascimento e
Silva, é instaurado um debate sobre a politização do ensino da língua portuguesa que visa
problematizar a ideologia linguística vigente. Normalmente visto como um ensinamento
natural de uma língua materna, o objetivo desse artigo é transportá-lo para o campo da
política, dando um fim à visão natural.
Foi no início da década de 1980, que o movimento pelo direito do acesso à escola
tornou possível a transformação social, afastando o ensino da língua materna de um
paradigma mecanicista e utilitário. Por meio dessa virada pragmática, os Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCNs) se fundamentaram, a fim de compreender a língua como um
conteúdo ideológico e transformador. Além disso, Paulo Freire, através de seu livro “A
Pedagogia do Oprimido”, impactou na formação dos docentes, que passou a ser encarada
como prática no desenvolvimento de indivíduos intelectuais, com poder social.
Dentre as ideologias que aproximam a língua portuguesa, se faz presente a ideologia
monoglota, com a tranquilidade de manter o ensino dentro de um padrão único, desejável e
meramente bom. É assim, então, que somos apresentados a uma pedagogia translíngue no
terceiro tópico do artigo e, por fim, a elaboração de um curso de língua materna multilíngue
por Adriana Lopes por meio da UFRRJ.
Com o objetivo de ter uma abordagem voltada para a diferença, a proposta translíngue
visa estudar as línguas e seus signos em prol da produção de significados. É preciso que o
diferencial entre línguas pare de ser visto com inferioridade dentro do sistema de ensino
brasileiro. Debater sobre multilinguismos é uma solução para que a riqueza e diversidade,
com seus elementos ordinários e singulares, sejam vistas com uma perspectiva diferente da de
língua padrão que desde cedo estamos acostumados a ouvir. Sabemos como a língua
portuguesa funciona, entendemos que nossa herança vem de tempos em que a língua do
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príncipe era essencial para criar vassalos úteis à Coroa. Homens e mulheres que tiveram seus
dialetos e idiomas rebaixados durante a história até chegarmos aos dias atuais, em que grupos
periféricos ainda são oprimidos e excluídos, mesmo dentro de um mesmo idioma comum.
É preciso que o conhecimento de mundo venha para o aluno por meio do ensino
escolar, e estudar as funcionalidades multilíngue, como descrito no curso universitário citado
no artigo, “[...] é sobretudo assumir uma cultura, suportar o peso de uma civilização [...]”
(Franz Fanon, 2008). É trabalhando as diferenças que resistimos à padronização e exclusão
daqueles considerados irregulares.

4. ENSAIO
O ensino de língua portuguesa e o futuro: como a linguagem

na educação básica influencia nas escolhas do futuro dos estudantes?

Por Ana Luisa da Silva, Catarina Menezes e Rafaela Lopes

Entendemos que para a realização da entrevista com os estudantes seria necessário


compreender até qual ponto o ensino de língua portuguesa, que tiveram ao longo da vida na
escola, refletia nas escolhas do futuro dos alunos do ensino médio. Sabendo que a educação,
acessada por nós e por eles, pode ter embasamento na colonialidade, como as aulas de língua
portuguesa podem e contribuem para dizimar o desafio que influencia na aquisição do saber
dos estudantes? Como trabalhar uma educação decolonial efetiva de acordo com a base
comum curricular? De qual forma o pensamento crítico vindo da decolonialidade educacional
atua na autonomia das escolhas dos acadêmicos?

“[...] os efeitos do extermínio através da colonialidade, sem reduzi-los ao


processo de legitimação do poder de fazer morrer. Compreende o genocídio
em suas dimensões epistemológicas, representativas, estéticas, materiais e
simbólicas, percebendo como o dispositivo de racialidade justifica a morte e
se fortalece com a multiplicação de mecanismos de produção de morte em
vida para os que encarnam a zona do não ser.” (PIRES, 2018, p. 10-11)

E, ainda: os letramentos utilizados por todo o processo de formação educacional básica


foram marcantes e desenvolveram senso crítico para romper com os epistemicídios? Hoje, ao
apagar das luzes desses estudantes na educação básica, considerando o esperado criticismo
formado na escola durante tantos anos, os alunos estão saindo aptos a criticar?

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Com tantos questionamentos, identificamos que até mesmo as perguntas que tinham
intenção de quebrar o gelo entre o entrevistador e o entrevistado eram parte, também, do que
foi construído no ensino de língua portuguesa na escola. Dessa forma, é perceptível que o
hábito de leitura, ou a falta dele, estão ligados às práticas conservadoras ou inovadoras na
educação de linguagem e a condução do profissional de Letras nesse percurso.

“Ah, porque assim, eu sempre fui… Sempre gostei de ler, né, 2019 comecei a
ler. Aí… E eu gosto muito de português também. Eu sou… bom, um pouco,
assim, em português. Aí… A (nome da professora) falando comigo, né, a
professora, começou a falar comigo e eu comecei a gostar de português,
gostar, e eu falei “ah, vou fazer letras!” (estudante, 18 anos)

Percebe-se, então, que o ponto central da discussão não é somente sobre o hábito de
leitura ser ou não cotidiano para o aluno, e sim o que se absorve das suas leituras. O conteúdo
é capaz de promover as rupturas do pensamento ”moderno-colonial” ao mesmo tempo? Existe
capacitação nesse material para atribuição das escolhas de futuro dos alunos?
Definitivamente, a leitura é a ferramenta em que o professor extrai o suco do saber, porque os
estudantes já possuem conhecimento de mundo ao entrar na sala de aula, mas qual é o
letramento essencial para o aprimoramento dessa habilidade? É necessário fazer com que as
aulas de língua portuguesa possam contribuir para a construção do pensamento decolonial.

Nessa perspectiva, para Walter Mignolo (2003), o pensamento-outro descrito como


decolonialidade exprime-se na diferença colonial. Então, uma possível interpretação para a
fala de Mignolo seria considerar a geopolítica como fator divisor de águas para o ensino.
Portanto, ao decorrer da entrevista, fica notório como a cultura ocidental, fruto da nossa
colonização, é presente nos gostos e escolhas dos estudantes no nosso caso. E como se
desprender dessa lógica de um único mundo possível da modernidade capitalista?

“Eu gosto de ler porque assim, dependendo do livro que eu leio, ele me transporta
da minha realidade. Principalmente os romances que a gente fica assim “caraca!”.
(estudante, 17 anos).

A entrevistada afirma e expressa o gosto pela leitura e, mais tarde, completa dizendo
que sua leitura atual é “Uma Noite na Itália”. Podemos tornar evidente como o acesso às
leituras, mesmo quando não obrigatórias nas escolas, são voltadas para cenários que não
totalizam a pluralidade da sociedade, sendo um claro reflexo das mazelas da falta de
mobilização para fazer valer uma educação decolonial. Se o letramento das escolas não
estimula e problematiza temáticas graves, por que leituras livres valorizam a cultura daqueles

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que são esquecidos? Percebemos, então, um grande movimento da massa para a apreciação da
arte originária do lado bonito do globo.

Assim, em uma sociedade racista, excludente de povos originários, que ainda hoje
valoriza a branquitude e a cultura primitiva colonizadora, traceja-se sob o olhar dos alunos
qual seria o papel dos professores para despertar uma visão que ultrapasse essa fronteira.

“Ah, a educação, ela é atrativa, né, no sentido de que trabalhar com a linguagem na
educação é muito bom. Você tem, é… Falta de base, muitas vezes, você percebe que
os alunos não tem tanta base, mas é a nossa língua, né, no caso a língua portuguesa
que eu trabalho. Então é muito mais fácil você trabalhar a língua portuguesa, eu
acho, do que a matemática ou outras matérias que às vezes o aluno não tem tanta
base, entendeu? E a educação é fundamental, né? A educação você vê que é a
formadora de tudo, né, então tem que ter um trabalho muito grande em torno
disso.” (mulher, professora, 35 anos).

Essa foi a resposta da professora entrevistada quando perguntada do porquê escolher a


educação para atuar profissionalmente. Em destaque para aquilo que é classificado como falta
de base por ela: por que enfrentamos lacunas gigantescas na educação e justificamos com o
enfraquecimento da base na qual o aluno vivenciou? Ainda que o ensino de matemática seja
lecionado por educadores com formação adequada, é também papel do professor de língua
portuguesa contribuir no desenvolvimento nas diversas situações de uso, inclusive para
compreensão de uma aula de matemática.

As entrevistas ocorreram em uma escola particular de Três Rios, cidade no interior do


estado do Rio de Janeiro. Apesar de tratar-se de um colégio particular, é também uma das
escolas mais acessíveis no município, com valor de mensalidade popular e contendo a
proposta de levar ensino de qualidade para aqueles com menor poder aquisitivo. Então, ainda
que estejamos em uma instituição privada, nos damos conta de uma realidade humilde no
cotidiano dos alunos.

“Então, eu gosto… Eu gostei das viagens que teve, mas eu também gostei de
quando a gente começou a estudar redação porque era aquele processo de
criar, né? Escrevia uma história e eu sempre gostei muito de escrever.”
(estudante, 17 anos).

A estudante surpreende ao responder que uma boa memória da escola seria as aulas de
redação e abre espaço para que valorizemos ainda mais o ensino de língua portuguesa. Além

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das viagens escolares, dos passeios e de todas as atividades que ocorreram dentro da escola
durante a vida acadêmica dessa estudante, a criação de um texto como escolha daquilo mais
marcante em sua trajetória, desperta uma reflexão sobre qual seria a melhor maneira de fazer
com que outros alunos sintam o mesmo. Claro, considerando o gosto individual dessa aluna
pela escrita e suas possibilidades como algo não comum entre todos os estudantes, uma vez
que, geralmente, escrever pode ser visto como tedioso, complicado e até desnecessário. Qual é
o nosso papel para mudar essa concepção?

Sob essa análise, conclui-se que o posicionamento político-social adotado pelo


professor domina o resultado do processo de aprendizagem do aluno, uma vez que o material
escolhido para o uso nas aulas é selecionado por aquele que leciona. E, para além disso, a
relação professor-aluno também possui responsabilidade para conduzir a educação decolonial
e extinguir ao máximo os percalços do processo.

“[...] Sim. E mais assim, na verdade quando eu fiz Letras eu não pretendia a
princípio seguir a área de educação, não. Mas quando eu entrei, eu fui atraída por
isso. [...] Sim, aí eu acabei sendo chamada para trabalhar na área de educação,
gostei de trabalhar com as pessoas, né? A vivência com a educação, o poder que
você tem de ajudar o aluno a pensar no futuro dele.” (mulher, professora, 35 anos).

O não interesse pela licenciatura não é novidade na sociedade brasileira que


desvaloriza a educação, os professores e os estudantes. Na verdade, tudo que ronda a
caminhada educacional sofre desmonte não somente por parte governamental, mas também
social. Entretanto, de fato torna-se inviável que haja valorização da sociedade quando o meio
profissional da licenciatura é mundialmente minimizado e rebaixado diante de outras
ocupações julgadas e prescritas como ainda mais essenciais. Portanto, tem-se por fim a baixa
remuneração dos profissionais da área, a falta de manutenção dos direitos e o miserável
respaldo para a classe.

Não obstante, respostas como “não sei” e “talvez futuramente” foram dadas durante a
entrevista e são as respostas que cercam o futuro dos estudantes quando perguntados sobre um
possível interesse na classe dos trabalhadores da educação. Porém, em sintonia com a fala da
maioria dos alunos entrevistados, é interessante observar o posicionamento da professora
sendo o mesmo antes da oportunidade para lecionar. Então, o que e como nós, futuros
profissionais da educação, mobilizaremos um movimento contrário à negativa da nossa
ocupação? Nos questionemos: já negamos nossa futura profissão? Caso sim, a negativa tem a
ver com a visão em massa equivocada da sociedade sobre a licenciatura?

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“Então, eu acho que é um material bom, né, se comparado em alguns lugares. E, eu
acho que ajuda muito, né? Porque se você não tiver um conhecimento da literatura,
da linguagem, acho que… Sei lá, te ajuda a você conseguir cargos melhores.”
(estudante, 17 anos)

Diante do exposto, concluímos a experiência da entrevista, com observações


importantes e percepções sobre a condução e recebimento das aulas de língua portuguesa em
uma escola de rede particular. Em síntese, os estudantes entrevistados são um experimento de
um grande grupo que partilha das mesmas questões e incertezas, grupo que trabalharemos em
um futuro não tão distante. Assim, acima de qualquer outra dúvida, encerramos nos
questionando: como mudaremos e inovaremos o ensino colonial para modificar o futuro dos
nossos alunos?

5. ATIVIDADE DESENVOLVIDA EM SALA DE AULA


- Como promover uma educação linguística comprometida com a cidadania?

Todo cidadão tem um conjunto de direitos e deveres que os rege. O direito ao voto,
por exemplo, é garantido para todos. A cidadania, então, tem a função de garantir a
permanência desse conjunto de leis para a formação de uma sociedade justa.
A educação, portanto, é essencial para que a cidadania continue nos eixos. A formação
de pessoas responsáveis, solidárias, humildes, conhecedoras de seus direitos e deveres é de
suma importância para a construção de um país democrático e livre.
Dentro das escolas, a aprendizagem e o exercício da cidadania não precisam ir muito
além de uma aula de língua portuguesa. Para Steven Ten Brinke, cada aluno terá um nível de
conhecimento único e diferente de qualquer outro colega de classe. Na aula de português,
esses aprendizados serão expandidos. A linguagem dos alunos e seus conhecimentos culturais
e sociais serão desenvolvidos a fim de favorecer sua comunicação oral e escrita, reconhecidas
como parte do processo de desenvolvimento social.

6. PROTÓTIPO DE UM PROJETO DIDÁTICO


Por Ana Luisa da Silva, Catarina Menezes e Rafaela Lopes

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O tema da aula, com base no documento de competência três da BNCC para
linguagem e suas tecnologias, objetiva tratar sobre os direitos humanos e as injustiças
presentes no Brasil. Desse modo, pretende-se instigar os alunos a refletirem sobre seus
direitos e como esses direitos têm sido violados. Por que vivemos em uma sociedade que não
se preocupa com a fome, falta de moradia, baixo poder aquisitivo, saúde precária e tantos
outros temas primordiais para a sobrevivência íntegra? Por que banalizamos questões
cotidianas problemáticas que influenciam negativamente a vida da sociedade? Pretendemos,
então, mobilizar a competência da BNCC, com textos que para além de remeterem os alunos
às mazelas, também fortalecem o pensamento crítico desses estudantes.

TEXTO 1

QUINO. Mafalda. Disponível em: https://raquelcardeiravarela.wordpress.com/2014/09/22/mafalda/

TEXTO 2
Eu sei, mas não devia

Eu sei que a gente se acostuma. Mas não devia.

A gente se acostuma a morar em apartamento de fundos e a não ter outra vista que não seja as
janelas ao redor.
E, porque não tem vista, logo se acostuma a não olhar para fora.
E porque não olha para fora logo se acostuma a não abrir de todo as cortinas.
E, porque não abre as cortinas, logo se acostuma a acender mais cedo a luz.

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E, à medida que se acostuma, esquece o sol, esquece o ar, esquece a amplidão.

A gente se acostuma a acordar de manhã sobressaltado porque está na hora.


A tomar café correndo porque está atrasado.
A ler jornal no ônibus porque não pode perder tempo da viagem.
A comer sanduíche porque não dá pra almoçar.
A sair do trabalho porque já é noite.
A cochilar no ônibus porque está cansado.
A deitar cedo e dormir pesado sem ter vivido o dia.

A gente se acostuma a abrir o jornal e a ler sobre a guerra.


E, aceitando a guerra, aceita os mortos e que haja número para os mortos.
E, aceitando os números, aceita não acreditar nas negociações de paz, aceita ler todo dia da
guerra, dos números, da longa duração.

A gente se acostuma a esperar o dia inteiro e ouvir no telefone: hoje não posso ir.
A sorrir para as pessoas sem receber um sorriso de volta.
A ser ignorado quando precisava tanto ser visto.

A gente se acostuma a pagar por tudo o que deseja e o de que necessita.


E a lutar para ganhar o dinheiro com que pagar.
E a ganhar menos do que precisa.
E a fazer filas para pagar.
E a pagar mais do que as coisas valem.
E a saber que cada vez pagará mais.
E a procurar mais trabalho, para ganhar mais dinheiro, para ter com que pagar nas filas em
que se cobra.

A gente se acostuma a andar na rua e a ver cartazes.


A abrir as revistas e a ver anúncios.
A ligar a televisão e a ver comerciais.
A ir ao cinema e engolir publicidade.
A ser instigado, conduzido, desnorteado, lançado na infindável catarata dos produtos.

17
A gente se acostuma à poluição.
As salas fechadas de ar condicionado e cheiro de cigarro.
À luz artificial de ligeiro tremor.
Ao choque que os olhos levam na luz natural.
Às bactérias da água potável.
À contaminação da água do mar.
À lenta morte dos rios.
Se acostuma a não ouvir o passarinho, a não ter galo de madrugada, a temer a hidrofobia dos
cães, a não colher fruta no pé, a não ter sequer uma planta.

A gente se acostuma a coisas demais para não sofrer.


Em doses pequenas, tentando não perceber, vai se afastando uma dor aqui, um ressentimento
ali, uma revolta acolá.
Se o cinema está cheio, a gente senta na primeira fila e torce um pouco o pescoço.
Se a praia está contaminada a gente só molha os pés e sua no resto do corpo.
Se o trabalho está duro, a gente se consola pensando no fim de semana.
E se no fim de semana não há muito o que fazer a gente vai dormir cedo e ainda fica satisfeito
porque tem sempre sono atrasado.

A gente se acostuma para não se ralar na aspereza, para preservar a pele.


Se acostuma para evitar feridas, sangramentos, para esquivar-se da faca e da baioneta, para
poupar o peito.
A gente se acostuma para poupar a vida que aos poucos se gasta e, que gasta, de tanto
acostumar, se perde de si mesma.
COLASANTI, Marina. Eu sei, mas não devia, Jornal do Brasil, 1972. [Acesso em 10 jan. 2023]. Disponível em:
https://www.escritas.org/pt/t/13438/eu-sei-mas-nao-devia

TEXTO 3
Rap do Silva
(MC Bob Rum)

Todo mundo devia nessa história se ligar


Porque tem muito amigo que vai pro baile dançar
Esquecer os atritos, deixar a briga pra lá
18
E entender o sentido quando o Dj detonar
(E essa é uma homenagem a todos os Silvas do Brasil)

Era só mais um Silva que a estrela não brilha


Ele era funkeiro, mas era pai de família
É só mais um Silva que a estrela não brilha
Ele era funkeiro, mas era pai de família

Era um domingo de Sol, ele saiu de manhã


Pra jogar seu futebol, deu uma rosa pra irmã
Deu o beijo das crianças, prometeu não demorar
Falou pra sua esposa que ia vir pra almoçar

Mas era só mais um Silva que a estrela não brilha


Ele era funkeiro, mas era pai de família
É só mais um Silva que a estrela não brilha
Ele era funkeiro, mas era pai de família

Era trabalhador, pegava o trem lotado


Tinha boa vizinhança, era considerado
E todo mundo dizia que era um cara maneiro
Outros o criticavam porque ele era funkeiro
O funk não é modismo, é uma necessidade
É pra calar os gemidos que existem nessa cidade

Todo mundo devia nessa história se ligar


Porque tem muito amigo que vai pro baile dançar
Esquecer os atritos, deixar a briga pra lá
E entender o sentido quando o Dj detonar

E era só mais um Silva que a estrela não brilha

Ele era funkeiro, mas era pai de família

É só mais um Silva que a estrela não brilha

19
Ele era funkeiro, mas era pai de família

E anoitecia, ele se preparava

É pra curtir o seu baile que, em suas veias, rolava

Foi com a melhor camisa, tênis que comprou, suado

E, bem antes da hora, ele já estava arrumado

Se reuniu com a galera, pegou o bonde lotado

Os seus olhos brilhavam, ele estava animado

Sua alegria era tanta ao ver que tinha chegado

Foi o primeiro a descer e, por alguns, foi saudado

Mas, naquela triste esquina, um sujeito apareceu

Com a cara amarrada, suando, estava um breu

Carregava um ferro em uma de suas mãos

Apertou o gatilho, sem dar qualquer explicação

E o pobre do nosso amigo, que foi pro baile curtir

Hoje, com sua família, ele não irá dormir

Porque era só mais um Silva que a estrela não brilha

Ele era funkeiro, mas era pai de família

É só mais um Silva que a estrela não brilha

Ele era funkeiro, mas era pai de família

Era só mais um Silva que a estrela não brilha

Ele era funkeiro, mas era pai de família

Só mais um Silva que a estrela não brilha

Ele era funkeiro, mas era pai de família

Era só mais um Silva

20
MC BOB RUM. Rap do Silva. Rio de Janeiro: 1996. Disponível em:
https://www.vagalume.com.br/bob-rum/rap-do-silva.html. Acesso em 10 jan. 2023.

Escritas e desenhadas pelo cartunista argentino Quino, as tirinhas da Mafalda são


sempre representadas por uma menina que é defensora dos direitos humanos, que visa a paz
mundial e se revolta com a situação política e social do mundo. Não obstante às diversas
outras obras do autor, a tirinha acima utiliza do humor para polemizar assuntos como a
desigualdade social e a violência.

Nos dois primeiros quadrinhos, observamos Mafalda levantar da cama, possivelmente


de uma noite de sono, perguntando sobre a fome, a miséria e as armas nucleares: teriam sido
elas enfim exterminadas do planeta? Ao receber a resposta de que nenhuma dessas questões
tiveram um fim, ela então se pergunta “Então para que foi que a gente mudou de ano?!”. O
humor da charge se encontra aqui. A ideia de que a mudança de ano – como nos bordões de
“ano novo, vida nova” – traria um mundo novo, sem pobreza, fome e hostilidades, faz com
que reflitamos. Como pode, ao passar dos anos, entendermos o problema e continuarmos
tratando como algo normal? Hoje, cerca de 33 milhões de brasileiros não têm garantia do que
comer, e continuamos a normatizar essa situação sem que ações sejam feitas para revertê-la.
Caímos, enfim, no comodismo.

Dentro das salas de aula, a charge de Quino pode ser usada como uma forma de criar
uma consciência social coletiva. Uma forma de introduzir seria, em uma sala de informática
ou como dever de casa, pedir aos alunos que pesquisem mais sobre o Quirino, sobre a
Mafalda e sobre as questões sociais e políticas que são destacadas em seus textos. É
importante compreender o autor e entender sua obra antes de que se possa, de fato, interpretar
a mensagem que ele está tentando passar para seus leitores. Caso se sintam interessados, é
afável que também procurem textos complementares que visam abordar de forma clara e
compreensiva temas que são comumente expostos pela Mafalda

Após fazerem suas pesquisas e lerem algumas tirinhas de Quino e/ou textos
complementares, está na hora de se reunir. Em duplas, trios ou grupos, a tirinha do Texto 1
será distribuída para toda a sala e cada grupo deve escrever suas interpretações acerca da
charge. Em seguida, quando cada grupo tiver terminado de reunir suas análises, a turma deve

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se reunir em círculo e cada grupo deve debater sobre suas opiniões, críticas e esclarecimento
de suas observações.

O educador irá acompanhar a turma o tempo todo, debatendo, estimulando o seu senso
de criticidade junto com os alunos e expondo os seus conhecimentos acerca dos direitos
humanos, da desigualdade, violência, discriminação, negligência e tanto outros males que
adoecem o mundo diariamente. A consciência deve ser construída de modo expositório, de
maneira didática, mantendo sempre um diálogo entre alunos e professor.

Já na segunda proposta de letramento podemos trabalhar o texto “Eu sei, mas não
devia” da autora Marina Colasanti que foi publicado em 1972 e circula até os dias atuais.
Podemos dizer que há textos, músicas e poemas em nosso mundo que são atemporais,
independente da época em que foram lançados, sempre estarão em constante processo de
ensinamento, nunca deixam de perder o seu valor apesar do tempo passado.

O texto de Marina Colasanti é um excelente exemplo de um conteúdo atemporal. Ele


relata a respeito de tudo aquilo que vivemos constantemente todos os dias e muitas das vezes
não percebemos que nos acostumamos. Sejam situações boas, sejam situações ruins, tudo
aquilo que se repete diversas e diversas vezes vira algo cômodo e vai se normalizando até não
percebermos quando há um equívoco em nossas vidas. A problemática falada no texto é a
respeito deste comodismo que aos poucos se tornam injustiças ignoradas, justamente por
estarmos acostumados. Este é um texto que deve ser lido não somente na escola, mas
estimular os alunos a levar este texto para casa, sentar com os pais na hora de alguma refeição
e lerem todos juntos.

É possível trabalhar este texto em sala de aula com todas as turmas do ensino básico,
desde o Fundamental I até o Ensino Médio. Este texto é um texto muito especial e com uma
mensagem muito forte. Pode ser feita uma grande roda na sala de aula e pedir para cada aluno
fazer a sua leitura individualmente, após alguns minutinhos eles podem combinar entre si qual
trecho do texto mais fez sentido para cada um, conversar sobre ele e depois, junto com a
turma ler em voz alta. Após esse momento de leitura individual, diálogo em grupo com os
colegas e escolha do trecho, pode ser feita a leitura integral na sala de aula para todos, cada
um lendo o seu trecho escolhido e ao final dizer para os colegas e para o professor o porquê
escolheu aquele trecho. Assim, é uma forma do professor trabalhar o conteúdo do texto de
forma didática, clara e ainda ter a oportunidade de conhecer um pouquinho mais seus alunos.

22
Por fim, para finalizar a reflexão sobre a competência três da BNCC, propomos a
utilização da música lançada em 1996 pelo carioca MC Bob Rum. A letra da canção narra a
história de um “Silva”: jovem homem da periferia que morre no caminho de um baile funk.
Nessa ótica, a música tornou-se um hino brasileiro que marca para além da atemporalidade, a
ilustração da realidade de tantos outros jovens periféricos que são dizimados por motivo
algum no caminho do baile, trabalho, escola e qualquer outro trajeto.

Ademais, a escolha do nome da música não é proposital: no Brasil, hoje, há cerca de


quase sete milhões de brasileiros que partilham do sobrenome Silva. Então, o sobrenome
comum marca a história, que não deveria, mas é comum entre os brasileiros: pais, maridos,
irmãos, filhos, netos e “Silvas” inocentes pagando pelo preconceito daqueles intolerantes à
cultura da própria nação. Desse modo, com a grande representatividade da composição, a letra
foi selecionada como letramento capaz de fazer com que o estudante reflita sobre os direitos
humanos.
Assim, a possível atividade com os estudantes fazendo uso da música para, finalmente,
respeitar e atender à proposta da competência requerida da Base Nacional Comum Curricular
(BNCC), seria utilizar de aparelhos de som para reprodução da canção em sala de aula. A
partir disso, após a escuta da composição, é papel do professor instigar discussões sobre as
problemáticas apresentadas na letra. Espera-se, dessa maneira, contribuir para o criticismo dos
estudantes através de uma aula não tão comum de língua portuguesa.
Portanto, nota-se que a escolha dos textos do protótipo foi realizada com necessidade
que conversassem entre si. Todos os textos falam sobre a atemporalidade de problemas
graves, banalização de mazelas da sociedade brasileira e, também, procuram aclamar a cultura
e mobilizar o pensamento crítico dos alunos.

7. REFLEXÕES
Durante todo o meu período como estudante da disciplina de Saberes Escolares da
Língua Portuguesa, tive muito a aprender e entender sobre o que é e como é ser um educador
em formação dentro do sistema educacional brasileiro. Por diversas vezes, foi dito nesse
documento que a atuação de um professor não é bem vista. Não é comum vermos alunos do
ensino fundamental e ensino médio almejando essa profissão, idealizando uma carreira dentro
da educação.
O meu maior desafio ao entrar na faculdade de Letras foi pensar em como eu poderia
ser uma profissional que trabalhasse junto com os alunos, e não em uma hierarquia, onde eu

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teria o poder de fala dentro de uma sala de aula. Ainda estou no início do curso, a formação é
longa, mas com essa disciplina eu consegui me integrar mais aos assuntos que envolvem não
só a minha formação, mas a integração dos futuros alunos aos quais darei aula como uma
forma de constante aprendizado. É sobre passar os meus conhecimentos e, ainda assim, estar
continuamente recebendo ensinamentos por meio do convívio. Uma sala de aula deve ser um
lugar acolhedor, onde todos têm o direito de se expressar, questionar, afirmar e aprender.
Eu pouco me integrava com textos que se relacionassem a esses assuntos, nunca tive
base e muito menos sabia onde correr atrás, mas os textos complementares foram de suma
importância para o desenvolvimento das aulas e dos meus estudos fora da Universidade
Federal de Juiz de Fora. A nossa evolução dentro da sala de aula não teria sido a mesma sem
os materiais dispostos pelo professor no início do semestre.
Por fim, espero ansiosamente por uma oportunidade em que eu possa colocar em
prática tudo aquilo que aprendi e assimilei no decorrer do curso. Entendo agora o quão difícil
é o trabalho de um educador, mas todos os desafios são válidos quando se tem em mente o
apoio e suporte que você está dando para a formação de outra pessoa que tem a chance de se
tornar um profissional competente e bem sucedido.

8. ANEXOS
8.1. ENTREVISTAS
Entrevistas completas feitas com os alunos e professora em uma escola particular em
Três Rios, no Rio de Janeiro.

8.1.1. ENTREVISTA 1
Entrevistadora: Ana Luisa da Silva Santos
Entrevistado: Alfredo Xavier Henrique Costa - 17 anos

Ana Luisa: Tudo bem? Então Alfredo, queria saber de você se você tem hábito de leitura.
Alfredo: Tenho.
Ana Luisa: Você gosta?
Alfredo: Uhum, gosto.
Ana Luisa: E, se você tá lendo algum livro no momento, qual o tipo de leitura que te desperta
interesse? Se é fantasia…
Alfredo: É fantasia, e no momento eu tô lendo “É assim que começa”.
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Ana Luisa: “É Assim que Começa”? Já li, é muito bom! Então você gosta de ler, é um hábito
seu?
Alfredo: Aham.
Ana Luisa: Beleza. Você já teve alguma leitura que foi pedida na escola?
Alfredo: Já.
Ana Luisa: Qual livro foi? Foi mais de uma?
Alfredo: Não, eu li um que era “De Mãos Atadas”, eu acho. Se eu não me engano.
Ana Luisa: Foi pedido dentro da escola para você?
Alfredo: Dentro da escola.
Ana Luisa: Entendi. O que você achou dessa experiência? Achou que foi uma leitura fácil,
você entendeu fácil ou não?
Alfredo: Foi o primeiro livro que eu li, na verdade.
Ana Luisa: Entendi.
Alfredo: Aí foi por ele que eu comecei a ler os outros.
Ana Luisa: Ah, entendi, dentro da escola. Você lembra em qual ano, mais ou menos?
Alfredo: Foi no nono (ano).
Ana Luisa: No nono ano. Legal. Tá. Qual é a sua melhor memória da atividade dentro da
escola? Uma feira, um passeio, uma aula dentro da sala de aula ou fora da sala de aula…
Alfredo: Ah, foi… Deixa eu pensar. Eu acho que foi a… As feiras que tem no colégio.
Ana Luisa: As feiras?
Alfredo: Sim. De linguagens.
Ana Luisa: De nações, de linguagens, saraus? Já tiveram sarau?
Alfredo: Sim.
Ana Luisa: Beleza. Você pretende fazer faculdade?
Alfredo: Sim.
Ana Luisa: Qual curso?
Alfredo: Letras.
Ana Luisa: Muito bom, letras! Quando que te despertou esse interesse na letras?
Alfredo: Ah, porque assim, eu sempre fui… Sempre gostei de ler, né, 2019 comecei a ler.
Ana Luisa: Uhum.
Alfredo: Aí… E eu gosto muito de protuguês também. Eu sou.. bom, um pouco, assim, em
português.
Ana Luisa: Entendi. Gramática…
Alfredo: Sim, gramática. Eu… É, no geral, gramática.
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Ana Luisa: Uhum.
Alfredo: Aí… A Lidiane falando comigo, né, a professora, começou a falar comigo e eu
comecei a gostar de protuguês, gostar, e eu falei “ah, vou fazer letras!”
Ana Luisa: Entendi. Então foi a sua vivência na escola que te inspirou a área de educação ou
foi algum outro motivo?
Alfredo: Não, foi a vivência na escola.
Ana Luisa: Isso aqui para você, você idealiza, você acha interessante?
Alfredo: Aham.
Ana Luisa: Beleza, vamos lá. O que você acha – apesar de você querer fazer Letras, então a
sua opinião vai ser um pouco particular – o que você acha das aulas de língua portuguesa?
Para você, dentro da escola, você gosta?
Alfredo: Acho muito bom.
Ana Luisa: Você acredita que elas te ajudam a desenvolver o seu senso crítico de alguma
forma? Talvez nas aulas de redação?
Alfredo: Sim.
Ana Luisa: Você tá no terceiro ano, não é? Então tá acostumado a escrever redação para o
ENEM.
Alfredo: E ajuda a interpretar também outras situações, né? Que você consegue ter outro olhar
para as coisas.
Ana Luisa: Exatamente. Entendi, Alfredo, muito obrigada!

8.1.2. ENTREVISTA 2
Entrevistadora: Ana Luisa da Silva Santos
Entrevistado: Ane Rayssa Diniz Brasilino - 17 anos

Ana Luisa: Então vamos lá, Ane. Você tem hábito de leitura?
Ane: Tenho.
Ana Luisa: Mas você gosta de ler, você lê porque é necessário…?
Ane: Eu gosto de ler porque assim, dependendo do livro que eu leio, ele me transporta da
minha realidade. Principalmente os romances que a gente fica assim “caraca!”.
Ana Luisa: Então você gosta muito de romance?
Ane: Sim.
Ana Luisa: Você tá lendo um agora?

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Ane: Tem um que era para eu estar lendo, mas como tá período de prova eu dei uma parada. É
“Uma Noite na Itália”.
Ana Luisa: Hm, legal!
Ane: Eu vou ler ele ainda.
Ana Luisa: Aí você vai lendo ele? Mas tá bom, é a sua leitura do momento, “Uma Noite na
Itália”. Beleza. E teve alguma leitura que foi pedida para você fazer na escola? Pra alguma
atividade?
Ane: Já, que foi o da coleção série Vaga-Lume, que geralmente eles usam nas escolas mesmo
porque são temas mais infanto-juvenil.
Ana Luisa: Ah, entendi.
Ane: Eu li foi “O Supertênis”, também teve… “De Mãos Atadas” também.
Ana Luisa: Entendi. Você teve várias leituras.
Ane: É, eu gostei de ler eles porque eles têm uma leitura assim, sabe? Uma linguagem mais
jovial e você entende, é mais fácil de entender. Eu acho que, assim, a gente entende mais,
principalmente quando é adolescente, né.
Ana Luisa: Ah, entendi! Então você já adiantou a minha próxima pergunta que eu ia te
perguntar o que você tinha achado desses livros, se foi uma leitura fácil ou uma leitura difícil.
Então você considerou uma leitura fácil, deu para entender numa boa?
Ane: Fácil, aham.
Ana Luisa: Tudo bem. E assim, qual é a sua melhor memória dentro da escola de atividade?
Uma feira, um passeio, uma aula dentro da sala de aula ou fora da sala de aula…
Ane: Então, eu gosto… Eu gostei das viagens que teve, mas eu também gostei de quando a
gente começou a estudar redação porque era aquele processo de criar, né? Escrevia uma
história e eu sempre gostei muito de escrever.
Ana Luisa: Entendi. E foi a partir de qual ano da escola, você lembra?
Ane: Acho que a partir do sexto ano que a gente tinha.
Ana Luisa: Do sexto ano que vocês começaram a trabalhar com criação de texto, gêneros
literários e tudo mais?
Ane: Uhum.
Ana Luisa: Beleza. Você pretende fazer faculdade?
Ane: Sim.
Ana Luisa: Qual curso que você quer?
Ane: Publicidade.

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Ana Luisa: Publicidade, legal! Você acha que a sua vivência na escola em algum momento vai
te fazer voltar para a área da educação? Porque publicidade a gente sabe que não… Talvez
não mexeria tanto, a não ser que você faria uma publicidade dentro de uma escola, mas você
acha que em algum momento você teria essa vontade pela sua vivência dentro da escola
durante esses anos?
Ane: Acho que sim porque… Pelos (inaudível), né? Que a gente tem um conhecimento, a
gente aprende, então eu acho que na publicidade a gente tem que ter esse contato.
Ana Luisa: Entendi. Mas aí não te despertaria uma vontade de ser professora ou diretora,
orientadora?
Ane: Não sei. Talvez futuramente.
Ana Luisa: Talvez futuramente, mas até então…
Ane: Até então não.
Ana Luisa: Não? Beleza. E o que você acha das aulas de língua portuguesa? Elas funcionam
bem para você?
Ane: Eu acho que sim, né. É o essencial.
Ana Luisa: Entendi. Você acredita que elas ajudam no seu desenvolvimento, te ajudam a
pensar de alguma forma diferente? Quando você tem contato com os textos na aula, você acha
que isso te faz refletir durante a construção da redação? Como que é para você, assim, o
material que trabalham com você em sala de aula?
Ane: Então, eu acho que é um material bom, né, se comparado em alguns lugares. E, eu acho
que ajuda muito, né? Porque se você não tiver um conhecimento da literatura, da linguagem,
acho que… Sei lá, te ajuda a você conseguir cargos melhores.
Ana Luisa: É, com certeza, né? Então tá bom, Ane, muito obrigada!

8.1.3. ENTREVISTA 3
Entrevistadora: Ana Luisa da Silva Santos
Entrevistado: Gabriel Antonio Bastos Pinto - 17 anos

Ana Luisa: Beleza, Gabriel, então você tem o hábito de leitura?


Gabriel: Não.
Ana Luisa: Não tem hábito de leitura. Mas você gosta? Tipo assim, alguma vez que você já
tenha lido você gostou, apesar de não ter hábito? Ou não é muito chegado? Também tem esse
direito.
Gabriel: É… Eu não gosto muito de ler. Eu não tenho costume e não gosto de ler.
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Ana Luisa: Ah, entendi, então beleza.
Gabriel: É…
Ana Luisa: É isso, mais nada a dizer, não tem costume e não gosta muito. Tudo bem, seu
direito. Você já teve alguma leitura que foi pedida na escola?
Gabriel: Já, várias vezes.
Ana Luisa: Várias, é? Quais livros que te pediam? Você lembra do primeiro?
Gabriel: Foi… Acho que “Miguel…” e não sei o nome. É, algum nome assim.
Ana Luisa: E foi no sexto ano ou não?
Gabriel: Foi no sexto ano.
Ana Luisa: Foi no sexto ano, legal. O que que você achou da experiência dessa leitura? Foi
fácil de entender?
Gabriel: Foi uma leitura bem fácil, tipo assim, o nível da idade então era bem fácil. Era legal.
Ana Luisa: Você achou legal, então foi uma boa leitura para você, na época agregou bastante
e tudo mais.
Gabriel: Sim.
Ana Luisa: Beleza. Qual é a sua melhor memória de atividade dentro da escola? Você
consegue me dizer assim se foi uma feira, um passeio, uma aula fora ou dentro da sala de
aula?
Gabriel: Acho que… Acho que as feiras, os passeios…
Ana Luisa: Entendi, mas aí você considera as feiras de nações, de linguagens, sarau…
Gabriel: Acho que o sarau e a feira das nações são as que mais eu gosto.
Ana Luisa: São as que você mais gosta, então seriam suas melhores experiências na escola.
Você tá no terceiro ano, não é?
Gabriel: Sim.
Ana Luisa: Você vai sair com uma boa lembrança desses momentos?
Gabriel: Sim.
Ana Luisa: Beleza, então foram suas melhores aulas. Vamos lá, você pretende fazer
faculdade?
Gabriel: Sim.
Ana Luisa: Qual?
Gabriel: Psicologia.
Ana Luisa: Psicologia? Que legal! Então você é da área de humanas. Você gosta dessa área?
Gabriel: Sim.
Ana Luisa: Beleza, e por que que você escolheu a psicologia?
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Gabriel: É porque tipo assim, eu fazia psicólogo, aí eu gostei da experiência e vi que ajudava
as pessoas, e eu tenho um lado que sempre gosta de ajudar o próximo, então a psicologia, eu
percebi, é algo que pode ajudar muito as pessoas em várias situações da vida dela.
Ana Luisa: Entendi, então seu momento que você precisou ser ajudado você descobriu que
você também gosta muito de ajudar os outros. Legal. Você acha que a sua vivência na escola
em algum momento vai te fazer ir para a área de educação? Seja como professor, orientador…
Talvez a psicologia tenha a ver com orientação também. Ou você não quer entrar nesse meio
da educação?
Gabriel: Não.
Ana Luisa: Não, não gosta muito?
Gabriel: Não.
Ana Luisa: Tá bem, então. E o que você acha, assim, das aulas de língua portuguesa? Você
acha que elas te ajudaram a chegar, até mesmo nesse… Nesse ponto que a psicologia para
você era uma boa escola, você acha que te ajudou a desenvolver um senso crítico a partir
disso, a partir dos textos que você tem em sala de aula? O que você acha disso?
Gabriel: Acho que sim.
Ana Luisa: Acha que sim, mas você gostava? O que você achou das aulas de língua
portuguesa?
Gabriel: Ah, eu gosto. Eu gosto das aulas de língua portuguesa.
Ana Luisa: Tá. Como elas são trabalhadas com você, assim, com livro didático ou tem
momentos de pauta, de reflexão… Como que são?
Gabriel: São mais os livros, livros didáticos.
Ana Luisa: Entendi. Beleza. Muito obrigada, Gabriel!

8.1.4. ENTREVISTA 4
Entrevistadora: Ana Luisa da Silva Santos
Entrevistado: Letícia Lourdes Carvalho Araújo de Moraes - 17 anos

Ana Luisa: Beleza, Letícia, então você tem o hábito de leitura?


Letícia: Hábito não, mas…
Ana Luisa: Você gosta?
Letícia: É, eu gosto. Quando eu quero ler eu pego lá o livro e leio direitinho. Às vezes eu
demoro duas ou três semanas para voltar a ler o livro, mas vai.
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Ana Luisa: Tudo bem, mas você pega e lê?
Letícia: Uhum.
Ana Luisa: Você tá lendo algum no momento, então?
Letícia: Eu tô lendo da série “Bridgerton” que tem na Netflix.
Ana Luisa: Qual que você tá lendo?
Letícia: Eu tô lendo o (livro) um ainda. Eu comprei os quatro…
Ana Luisa: Ah, entendi. Tá gostando?
Letícia: Tô.
Ana Luisa: Ah, que bom, tá muito bom. Maravilhoso! Você comprou os quatro primeiros?
Acho que são sete (livros), se eu não me engano.
Letícia: É, sete.
Ana Luisa: Isso aí! Vamos lá. Então você já teve alguma leitura pedida na escola? Qual que
foi, ou você não lembra?
Letícia: Já tive um que teve que fazer até maquete, essa maquete deu um trabalho do cacete. É
“A Rua É Meu Quintal”, acho que no sexto ano.
Ana Luisa: Aham, “A Rua É Meu Quintal” no sexto ano. Você gostou? O que que você achou
dessa leitura?
Letícia: Ah, gostei. É mais pra criança, né?
Ana Luisa: Então foi fácil, você conseguiu desenrolar… Você acha que pra Letícia daquela
época foi… Foi fácil da Letícia entender? Você lembra de trechos da história ou não lembra
de muita coisa?
Letícia: Não lembro, não, mas…
Ana Luisa: Lembra que a maquete deu trabalho.
Letícia: Uhum.
Ana Luisa: Então tá bom. Qual é a sua melhor memória assim, apesar de ter tido essa
memória ruim de ter que fazer uma maquete que deu trabalho, qual que é a sua melhor
memória dentro da escola? Uma feira, uma apresentação, um sarau…
Letícia: Eu sempre lembro dos ensaios de dança que tem aqui na escola. Eu gostava de
ensaiar, mas só que chegava na hora da apresentação e sempre tinha algo de errado.
Ana Luisa: Aí você não curtia muito, mas o ensaio…
Letícia: É, eu gostava dos ensaios, das feiras que tinha que decorar e eu gosto de decorar as
coisas.
Ana Luisa: Entendi, legal. Você pretende fazer faculdade?
Letícia: Sim.
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Ana Luisa: Pretende fazer o que?
Letícia: Pretendo fazer arquitetura.
Ana Luisa: Arquitetura? Legal, muito bom!
Letícia: Eu tinha pensado primeiro em design de interiores, mas aí eu pensei “ah, vou fazer só
uma coisa” porque aí eu faço uma coisa grande, sabe? Teto…
Ana Luisa: Ah, entendi.
Letícia: Não só decorar as casinhas lá.
Ana Luisa: Entendi, legal. E você acha que a vivência na escola te ajudou a chegar nesse
ponto de que você querer fazer uma faculdade, ou você teve algum outro motivo que te fez
querer continuar estudando?
Letícia: Acho que não.
Ana Luisa: Não foi a escola exatamente?
Letícia: Não.
Ana Luisa: Que te ajudou, que fez você querer continuar estudando?
Letícia: Não.
Ana Luisa: Mas você acha que a sua vivência na escola te ajudaria então… Te ajudaria não, te
faria então querer continuar na área de educação? Ser professora, orientadora, diretora ou
nada disso?
Letícia: Talvez. Alguns trabalhos que eu faço aqui na escola para ajudar a diretora, substituir
professor, me faz pensar até que não seria uma má ideia me tornar professora… Já que minha
mãe é diretora também então eu vivo…
Ana Luisa: Essa área da educação já é comum, já é um ambiente que você tá acostumada?
Legal. E o que você acha das aulas de língua portuguesa? Você acha que elas te ajudam de
alguma forma? O que você acha dos textos que são trabalhados com você?
Letícia: Eu acho interessante.
Ana Luisa: Você gosta?
Letícia: É, eu… eu gosto, sabe? Eu gosto mais da parte de literatura porque redação eu não
me dou bem, não. Não sei argumentar quase nada.
Ana Luisa: Então a escrita para você é uma das áreas da língua portuguesa que você tem mais
um pézinho atrás?
Letícia: É.
Ana Luisa: Mas você acredita que o que é trabalhado, os textos, eles te ajudam de alguma
forma? Pelo menos um pouco a escrever?

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Letícia: Ajuda, porque se eu ler um texto de apoio antes eu consigo argumentar melhor na
redação. Tem texto, assim, que é bem curtinho, não fala quase nada, e eu fico meio com
dificuldade para saber, mas tem uns textos (inaudível).
Ana Luisa: Então tem alguns letramentos que são um pouco mais enxugados e eles te trazem
uma dificuldade?
Letícia: Sim.
Ana Luisa: Tá bom, Letícia. Muito obrigada!

8.1.5. ENTREVISTA COM A PROFESSORA


Entrevistadora: Ana Luisa da Silva Santos
Entrevistado: Lidiane, professora de língua portuguesa

Ana Luisa: Tá bom, Lidi. Por que você escolheu atuar na área de educação?
Lidiane: Ah, a educação, ela é atrativa, né, no sentido de que trabalhar com a linguagem na
educação é muito bom.
Ana Luisa: Uhum.
Lidiane: Você tem, é… Falta de base, muitas vezes, você percebe que os alunos não tem tanta
base, mas é a nossa língua, né, no caso a língua portuguesa que eu trabalho. Então é muito
mais fácil você trabalhar a língua portuguesa, eu acho, do que a matemática ou outras
matérias que às vezes o aluno não tem tanta base, entendeu?
Ana Luisa: Entendi.
Lidiane: E a educação é fundamental, né? A educação você vê que é a formadora de tudo, né,
então tem que ter um trabalho muito grande em torno disso.
Ana Luisa: Então foi o que te atraiu a… Entendi.
Lidiane: Sim. E mais assim, na verdade quando eu fiz letras eu não pretendia a princípio
seguir a área de educação, não. Mas quando eu entrei, eu fui atraída por isso.
Ana Luisa: Entendi, foi durante o processo.
Lidiane: Sim, aí eu acabei sendo chamada para trabalhar na área de educação, gostei de
trabalhar com as pessoas, né? A vivência com a educação, o poder que você tem de ajudar o
aluno a pensar no futuro dele.
Ana Luisa: Entendi.
Lidiane: A incentivar a trabalhar ali a linguagem para ele conseguir alcançar o que ele quer.
Ana Luisa: Entendi. Beleza, e como você seleciona os letramentos que você usa nas aulas?
Lidiane: Normalmente?
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Ana Luisa: Aham. Provas…?
Lidiane: Então, a minha seleção também vai muito pelo meu gosto. Assim, eu gosto de
trabalhar música, poemas em geral, crônicas… Então, assim, eu tento variar o currículo
mínimo que se exige, né, para cada série, e escolho ali os que eu mais gosto para trabalhar
com eles. Gosto muito de crônicas reflexivas, né, para incentivar.
Ana Luisa: Entendi. Incentivar o pensamento crítico também, né, do aluno.
Lidiane: Com certeza, tem muita coisa boa.
Ana Luisa: Você acredita que as atividades extra sala de aulas, né, que não são feitas dentro da
sala de aula, são importantes para o desenvolvimento dos alunos? Você acha que talvez até
um pouco mais importante do que… Uma coisa não vai anular a outra, mas você acha que é
um bom complemento, ou você acredita que a sala de aula já dá conta de tudo?
Lidiane: Não, são essenciais, né? Porque assim, na escola sempre tem atividades viáveis, o
professor tá ali, tem o colega, mas em casa ele se encontra mais autônomo, né? Fora, em casa,
ou fora de casa mesmo, o que ele for fazer da escola eu acho que ele começa a se perceber
como um construtor da aprendizagem dele muito mais fora do que quando ele é guiado, né?
Ana Luisa: Quando ele tem alguém guiando, né?
Lidiane: Quando ele tem alguém guiando, isso.
Ana Luisa: Entendi.
Lidiane: Mesmo a gente orientando, né, é ali que ele vai pensar e desenvolver.
Ana Luisa: Entendi, e você acredita também que propostas que nem sarau… Esses tipos de
trabalho, você acha que eles vão combinar bastante para o desenvolvimento do aluno ou tem
como dar uma aula só com o que tem no livro didático?
Lidiane: Não, não. O sarau, assim, ele é muito rico porque ele começa a ver também a beleza
de tudo que ele estuda, né? Porque eu vejo assim, tem muito aluno que estuda por obrigação,
né, ele pega um poema e ele lê por obrigação. Um poema é pra ler, pra interpretar, responder.
Agora, quando ele declama o poema, quando ele leva isso para um sarau, né, de uma forma
mais lúdica, mais… Interagindo ali com os outros colegas, aí ele começa a ver beleza naquilo.
A maioria deles vai conseguir ver essa beleza.
Ana Luisa: É, essa era a minha próxima pergunta, você acha que eles engajam bem com esse
tipo de atividade? Talvez mais do que dentro de sala de aula… Como que funciona, assim,
com os seus alunos, com as turmas que você teve até hoje?
Lidiane: Aqui na escola, né, eles engajam muito. São muito, assim, é.. Responsáveis,
desenvolvem muito isso sem precisar ficar cobrando.
Ana Luisa: Entendi.
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Lidiane: Diferentemente de uma atividade da escola, eu acho que isso traz uma riqueza muito
grande em todos os sentidos pra eles, né?
Ana Luisa: Entendi, e eles conseguem, assim, pegar os textos e fazer uma boa leitura
daquilo… Texto que eu digo é qualquer letramento que eles tiverem, assim, música, alguma
coisa do tipo, e desenvolver bem em cima daquilo? Ou você sente que tem uma… Alguém
trava por algum motivo, ou você acha que boa parte tem um aproveitamento bom?
Lidiane: Eu acho que boa parte tem um bom aproveitamento, eles conseguem entender bem,
né. E quem tem mais dificuldade acaba sendo envolvido ali pelos que…
Ana Luisa: Pelo que tá acontecendo, né, no geral.
Lidiane: É, justamente.
Ana Luisa: É uma forma também de eles aprenderem mais sobre.
Lidiane: Muito, e verem coisas que estão bem além da época deles, né? Que aconteceu antes.
Ana Luisa: Entendi.
Lidiane: Música… A cultura toda, né?
Ana Luisa: Que também tem tudo a ver com a linguagem, né?
Lidiane: Tudo a ver com a linguagem.

9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
9.1. MEMORIAL
PAZ, Walmaro. No Brasil, 44% da população não lê e 30% nunca comprou um livro, diz
Rafael Guimaraens: No Dia Mundial do Livro, o escritor comenta o desafio de escrever e
editar em um país que não lê. Brasil de Fato, Porto Alegre, 24 abr. 2022. Disponível em:
https://www.brasildefato.com.br/2022/04/24/no-brasil-44-da-populacao-nao-le-e-30-nunca-co
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9.2. RESENHAS
GERALDI, João Wanderley. O texto na sala de aula. Paraná: Assoeste, 1984.

GERALDI, João Wanderley. Portos de Passagem. 4ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

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KLEIMAN, A. B. Letramento e suas implicações para o ensino de língua materna. Signo, v.


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LOPES, Adriana Carvalho; Daniel Nascimento e Silva. Todos nós semos de frontera:
ideologias linguísticas e a construção de uma pedagogia translíngue. Linguagem em
(Dis)curso – LemD, Tubarão, SC, v. 18, n. 3, p. 695-713, set/dez. 2018.

FREIRE, Paulo. A Pedagogia do Oprimido. 1º edição. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra LTDA,
2013.

FRANON, Frantz. Pele Negra, Máscaras Brancas. 1º edição. ed. São Paulo: Ubu, 2020. 320 p.

9.3. ENSAIO
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ensino de filosofia. Educar em Revista [online]. 2020, v. 36 [Acessado 10 Janeiro 2023],
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OLIVEIRA, Luiz Fernandes de e Candau, Vera Maria Ferrão. Pedagogia decolonial e


educação antirracista e intercultural no Brasil. Educação em Revista [online]. 2010, v. 26, n. 1
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9.4. ATIVIDADE DESENVOLVIDA EM SALA DE AULA


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OLIVEIRA, Maria Bernadete. Política Linguística, Cidadania e Ensino de Língua Portuguesa.
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9.5. PROTÓTIPO DE UM PROJETO DIDÁTICO


GUEDES, Aline. Retorno do Brasil ao Mapa da Fome da ONU preocupa senadores e
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LOURENÇO, Beatriz. 7 tirinhas de Mafalda para refletir sobre os tempos atuais. [S. l.], 30
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QUINO. Mafalda. [S. l.], 22 set. 2014. Disponível em:


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