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CAPÍTULO
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O bjetivo do capítulo
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estabelecidas internamente em unidades fundamentais do sistema nervoso (SN)
denominadas neurônios.
As evidências que definem o fato, de ser, a aprendizagem humana, um
resultado de combinações neuroquímicas são fortíssimas e amplamente demonstradas
em áreas de abrangência da neurociência. As bases fundamentais desta noção teórica se
estabeleceram através de inferências e provas laboratoriais de pesquisas enfocando a
circuitaria neural e bioquímica do aprendizado, cognição e memorização animal (inclusive
a do homem), tendo-se, estas provas, acumuladas em torno de explicações sobre
processos e mecanismos neurais revelados como implícitos na plasticidade do nosso
cérebro. Destacando-se, nelas, estão dois dos principais circuitos responsáveis pela
consolidação de aprendizagem hábil-motora nos neurônios das memórias declarativa e
de procedimentos; 1) O que se tem definido por potenciação de longo termo, abreviado
por LTP e, 2) um outro que se caracteriza em forma de depressão de longo temo, ou
LTD. Lembrando-se aqui que a memória declarativa, no ser humano é caracterizada pela
sua relação com o armazenamento de fatos e eventos, enquanto que a de
procedimentos, a hábitos e outros tipos de conteúdos nela automatizados.
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memória de procedimentos, foi desenvolvido a partir da descoberta do fenômeno
neuroquímico (já referido acima) denominado depressão de longo termo (LTD).
O neurônio
O nosso sistema nervoso é composto por vários bilhões (aproximadamente 100
bilhões!) de neurônios que ao longo do nosso desenvolvimento orgânico se organizam (e
se reorganizam) em correspondência a diretrizes maturacionistas e influências
ambientais. Esta correspondência pode ser entendida como uma busca pelo equilíbrio
funcional que o organismo humano precisa empreender, no desempenho de suas
funções de adaptação e interação com as variações do mundo.
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inteligências múltiplas (Gardner, ) poderíamos dizer que tais conhecimentos são de
ordens artística, ecológica, sinestésica, lógico-matemática, inter e intra pessoal, . . . . e
emocional (Golleman). Isto porque, ao se definir a existência destas inteligências, se
estabelece, também, o pressuposto da existência de memórias a elas associadas.
Conseqüentemente, se conhecimentos são consolidados em neurônios, estes encerram
todos estes tipos de conhecimentos e, talvez, em centros neuronais específicos, cada um
denominado de acordo com o tipo de conhecimento armazenado (exemplo, a memória
emocional guarda conhecimentos de eventos e vivências emocionais).
1. Núcleo
2. Mitocôndrias
3. dendritos
4. Corpos de Nissl
5. Soma (corpo celular)
6. Nucléolos
7. Aparelho de Golgi
8. Tubos micros
9. Axônio
10. Retículo endoplasmático
1. Núcleo – Organela (coberta por uma membrana) que contém o material genético
(cromossomos) que define o desenvolvimento da célula incluindo a capacidade de síntese de
proteínas necessárias à manutenção e vida celular.
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2. Mitocôndrias – Compõem um sistema de produção de energia para “alimentar” a atividade
celular.
7. Aparelho de Golgi – Estrutura caracterizada por uma formação em “foles” ou pregas, tem a
função de armazenar (empacotando) proteínas e peptídios no terminal das visículas sinápticas.
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decorrentes de mudanças plásticas nas pré-sinápses e pós-sinápses dos neurônios que
compõem tanto o sistema armazenador de aprendizagem declarativa, quanto o de
aprendizagem de procedimento.
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A princípio convém se enfatizar aqui o fato de que a célula de Purkinje, a célula do
cerebelo que aprende, nasce no núcleo cerebelar e tem como principal (se não única)
responsabilidade aprender e transmitir informações sobre eventos de motricidade que o
nosso corpo experimenta em referência a si mesmo, ou em integração com o meio
ambiente. Para aprender, esta célula depende de duas informações: (1) uma emergente
do tronco encefálico (informação inerente ao plano motor efetivado pelo neocórtex) que
se propaga até o córtex cerebelar, inicialmente através dos axônios das células de Mossy
que adentram os dendritos das células granulares cujos axônios se desdobram em forma
de “T”, constituindo-se como fibras paralelas. A outra (2), uma informação permanente
sobre o “desenvolvimento da ação motriz” emergente do plano motor que tem origem
em uma pequeníssima estrutura do tronco encefálico baixo denominada oliva. Esta
estrutura é pensada ser a responsável pela integração inicial de estímulos
proprioceptivos que informam as dimensões do movimento do corpo no espaço e flui, até
o córtex cerebelar, através dos axônios da célula trepadeira (Figura 2.4).
A chegada das informações, mediadas pelas células de Mossy e a Trepadeira ao
cerebelo, ocorre, a princípio, por intermédio das pré-sinápses dos axônios destas duas
células sobre os dendritos da célula de Purkinje, despolarizando-a. As pós-sinápses
conseqüentes, produzem as modificações tanto nas componências químicas intracélular
da célula de Purkinje quanto nas pós-sinápses da mesma. As mudanças estão bem
descritas na explicação contida na Figura 2.6. Faz-se importante notar que para ocorrer
consolidação do evento sendo aprendido, se faz necessário que as pré-sinápses daquelas
fibras (Fibras em T ou paralelas e trepadeiras) ocorram ao mesmo tempo. Informações
destas células que ocorrem em tempo não simultâneo, não produzem consolidação em
referência a(s) células de Purkinje contactada(s).
Seria então, muito limitante para o processo de consolidação de eventos de
aprendizagem na célula de Purkinge, o fato de que, ali, muitos dos “acasalamentos”
entre pré e pós-sinapses pudessem não se efetivar ao mesmo tempo? Provavelmente
não. A plasticidade do sistema de aprendizagem de procedimentos (bem como o
declarativo) é magnânima a ponto de que apesar dos milhares destes ciclos serem
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concluídos como conjugações “fora de tempo”, milhares delas estarão sendo
apropriadamente conectadas “em tempo”. Isto é, se, por motivos normais, alguns
milhares de sinapses não se efetivarem em tempo de integração, outros milhares
deverão estar, sem dúvida, se integrando.
O fenômeno do LTD de acordo com as explicações acima pode ser interpretado
como um reflexo da integração dos substratos neuroquímicos no interior da célula de
Purkinge. Os substratos neuroquímicos, como visto, são oriundos das vesículas sinápticas
da fibra paralela (ou fibra em T a partir da célula granular que dá continuidade a
comunicação originária da célula de Mossy) e da fibra trepadeira (originárias das células
que compõem a estrutura do tronco encefálico denominada Oliva) evento este que faz
ocorrer a memorização de dados trazidos por estas fibras. Convém se entender que
também fazem parte do fenômeno da LTD, os neurotransmissores (e vários tipos de
proteína) internos da própria célula de Purkinge. Ainda como explicado acima, qualquer
evento de cognição se define através de combinações neuroquímicas, em um processo
denominado consolidação.
Neste instante pergunta-se ao leitor, se ao mentalizar a sua própria imagem
abotoando uma blusa (ato de execução quase diária na vida de qualquer um de nós)
poderia pensar que uma tarefa deste tipo, tanto em processo de aprendizagem quanto
em condição de performance é um resultado de combinações neuroquímicas? Ou seja,
neurônios trocando informações através de sínteses sinápticas? Teria pensado, em um
outro exemplo, que ao abraçar uma pessoa querida, os seus braços fariam apenas
contato (com o corpo da referida pessoa) e o cérebro, através de combinações
neuroquímicas é que sentiria o carinho? Talvez você nunca tenha pensado nisto desta
forma, não é? Pois é, na próxima vez que você estiver ensinado conteúdos hábil-motrizes
para um indivíduo, lembre-se que estes conteúdos de alguma forma se instalam, em
neurônios de estruturas cerebrais, através de combinações da neuroquímicas
procedentes entre eles.
Considerando-se o que foi explicado em termos da aprendizagem de
procedimentos, poderíamos agora conclusivamente conceber ser o cerebelo o local de
aprendizagem motora e, também, de armazenamento (memorização) desta
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aprendizagem específica? A resposta seria que, em grande parte, sim, e em outra parte,
não. A aprendizagem motora, ou seja, o desenvolvimento de habilidades motoras ocorre
em função de armazenamentos da mecânica inerente a cada habilidade e, de
armazenamentos de conteúdos lógicos inerentes à objetividade que ela possa conter. A
efetivação de um ato motor, conseqüentemente, decorre de uma integração entre as
memórias de procedimento e declarativa, conjugadas em seu propósito. Estas
memorizações têm base creditada em forma de “esquemas”, configurações plásticas que
modulam a ação (Ver a Teoria do Esquema, Schmidt, 1975, no capítulo 1). Entendendo-
se que um esquema motor compreende a conjugação de um grupo de neurônios
(provavelmente milhares de neurônios) que aprenderam sobre uma determinada classe
de movimentos, para subsidiar, por exemplo, um evento de arremesso de uma bola à
uma cesta de basquetebol, o arremessador certamente se basearia em um esquema
composto por conhecimentos declarativos e de procedimentos como mostrado na Figura
2.6.
Logicamente, para que o arremesso, implícito no exemplo acima, possa se
desenvolver de forma adequada, se faz necessário que o esquema motor, para ele
utilizado, seja bom e, as adaptações a ele feitas, se integrem, de forma precisa, às
demandas do momento. Esta dependência estará, como não poderia deixar de ser, afeta
ao conteúdo das vivências anteriormente armazenadas nos dois tipos de memórias já
referidos.
Depressão de longo-termo (LTD) e a sua função na aprendizagem de
procedimentos.
Voltando a noção já apresentada, dois tipos de informações (1) as relativas ao
plano motor (oriundas de um conjunto de estruturas do tronco encefálico) e (2) outras
relacionadas ao desenvolvimento do plano, sob forma de movimento (informações
oriundas de uma estrutura nervosa chamada Oliva) são necessárias para a ocorrência de
um evento de aprendizagem motriz. Procedendo-se o registro encefalográfico destas
duas informações simultaneamente, Masao e Ito (Ver Bear e associados, 2002)
demonstraram que a célula de Purkinge baixava a sua atividade (depressão). Ao
contrário, quando a medição era feita em função das duas informações, mas, não
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simultaneamente, a atividade desta célula aumentava ou permanecia inalterada (Ver
Figura 2.4).
Na Figura 2.4. Na relação R(A), o registro da célula de Purkinge não se altera ou aumenta
em potência pelo fato da estimulação elétrica nas fibras trepadeiras e paralelas (fibra T) ocorrer em
diferentes tempos. Na relação R(B), ocorre a depressão pelo fato daquelas fibras estarem sendo
eletrificadas simultaneamente. Adaptada de Bear e associados, 2002.
R (A) R (B)
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Figura 2.5. a,b,c,d. Mostrando as várias etapas de um evento de aprendizagem sendo consolidado no
cerebelo. a) Início de um potencial de ação pré-sináptico nos núcleos das células trepadeira e paralela, que
fazem fluir neurotransmissores através dos seus correspondentes axônios, findando na efetivação de uma
pré-sinápse sobre dentritos da célula de Purkinje que despolariza. b) O potencial (pré) de ação faz abrir os
canais de Ca2 e Na(s)+ correspondentes no dendrito da célula de Purkinje. Como conseqüência, o nível
intracelular de Ca2 e Na(s)+ naquela célula aumenta. c) Da mesma forma, o potencial de ação da despolarizada
célula paralela faz fluir a ativação dos receptores glutamatérgicos pós-sinápticos no dendrito da célula de
Purkinje em função do glutamato emitido através do terminal pré-sináptico da fibra paralela. O resultado da
pós-sinápse desencadeadora da abertura do portal receptor metabotrópico do glutamato é a ativação da
proteína Kinase-c (por efeito da acoplagem proteína G - - componente intra-celular, à enzima fosfolipase-C
e, como conseqüência, a enzima fosfolipase-C faz produzir uma molécula denominada segundo mensageiro
que ou diácido-acetil-glicerol que finalmente resulta em um núcleo molecular conhecido como Proteína
Kinase-C.
Vernon colocar a Figura acima dividida do seguinte modo (colocando as partes nos espaços mais acima
ainda):
1. Desenho da figura 24.15 do Bear que mostra, ao lado do grande quadro, a figura
da célula trepadeira com as sinapses da fibra paralela e trepadeira. Para ficar
adaptada, alongue os axônios das duas fibras e mostre (em setinhas) o correr do
neurotransmissor por dentro das fibras até chegar a pré-sinapse (esta e a parte
a). Depois pegue um aumento somente da parte sináptica relativa a fibra
trepadeira e mostre também a despolarização neste lado (esta é a parte (b) ).
Idem para a sinápse da fibra paralela (esta será a parte (c). Finalmente , junte as
partes b + c formando o quadro d. Atenção: Proceda de forma que o desenho
geral da Figura 1 fique mais ou menos como abaixo.
De acordo com a Figura 2.5 (acima), o aprendizado de um evento por uma célula
(sobre forma de memorização/consolidação) decorre da combinação de várias proteínas
(neurotransmissores) emergentes de outras células que são hermetizadas juntamente
com outras proteínas internas da célula que aprende. Vejamos a racionalidade desta
aprendizagem neural, mas antes lembrando que as aprendizagens que ocorrem no
cerebelo são de natureza mecânica, ou seja, a feitura do ato motor desprovido da
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“racionalidade” sobre a sua devida aplicação em ações objetivas. Assim sendo, seria este
tipo de aprendizagem eficiente em ambientes abertos à contra-ação? Isto é, ambientes
típicos de jogos coletivos? Logicamente que não. Um jogo como o voleibol, por exemplo,
requer altas demandas cognitivas tais como em um momento que o jogador precisa
empreender um levantamento na rede, situação em que uma série de análises cognitivas
(melhor altura, direção, longe do bloqueio adversário...) deverá ser utilizada em benefício
do sucesso na ação. Estas análises (cognitivas), compostas pelo córtex cerebral, são
dependentes da memória declarativa em consonância com a de procedimentos. A
memória declarativa, diferentemente da de procedimentos, reside, como até então se
sabe, no lóbulo temporal médio do neocórtex e partes aprofundadas deste (várias
estruturas diencefálicas). A Figura abaixo (Figura 2.7), realça as varias estruturas
nervosas que compõem, em parte, o sistema de memória declarativa.
Figura 2.7. Partes do sistema de memória declarativa, incluindo o lóbulo temporal médio
e, estruturas diencefalicas componentes deste sistema.
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Jogar um
pouco mais Bola
alto devido ao
peso da bola . .
.
cesta
MD Rosto
do
MP arrem
essad
or
Mesma braços
distância,
mesma bola, pescoço
arremesso com
força
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“contornos”, amplo e possível de facilitar a criatividade em novas situações. O fator
quantidade implica em se saber o número e variedade de repetições desenvolvidas em
“torno” da tarefa em aprendizagem.
Logicamente que práticas recentes. com um determinado evento. dispõe, o
mesmo, à situação mais própria para uso pelo indivíduo processador, do que eventos
pouco utilizados e/ou vivenciados em períodos distantes. Mas de qualquer forma, a
prática anteriormente vivenciada por aprendiz, certamente deverá contribuir como forma
de economia no prosseguimento de um aprendizado específico (em muitos casos,
inclusive eventos de aprendizagem relacionada). Ou seja, memórias passadas ajudando
a um aprendizado presente que poderá ajudar aprendizados futuros. Assim sendo, vale
a pena a concepção de que um aprendizado adequado é aquele que contém informações
que podem promover grande economia ao aprendizado de eventos subseqüentes, quer
seja ele de relação específica, ou não.
Como pode ser interpretado a partir do conteúdo deste presente capítulo,
conhecer sobre como a aprendizagem hábil-motora se concretiza em termos neurais
pode, em muito, ajudar a tarefa do professor de desportos em geral. Outro fator
importante é o de saber como aplicar, este conhecimento discutido sobre memória, à
prática de ensino propriamente dita. No capítulo seguinte este tema será abordado de
forma que aquele profissional possa entender algumas aplicações pedagógicas que
podem positivamente influenciar a aquisição hábil-motora da criança através de treinos
específicos à memorização.
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Considerando-se ser, a aprendizagem hábil-motora, uma posse do cérebro através de
seus neurônios, como esta aprendizagem neles se instala?
A teoria aplicada
REFERÊNCIA
Bear, M.F., Connors, B.W., e Paradiso, M.A. (2002). Neurociências: Desvendqando o
Sistema Nervoso. Porto Alegre: Artmed.
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Hebb, D. O. (1949). The Organization of Behavior: A Neuropsychological Theory. New
York: Wiley.
Massao e Ito
Gardner
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