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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESNVOLVIMENTO


DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS
CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOMOTRICIDADE
PROJETO “A VEZ DO MESTRE”

ATUAÇÃO DA PSICOMOTRICIDADE EM PACIENTES


ACOMETIDOS DE ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL

LIANE GOMES DE FREITAS

Orientador: Prof. Antonio Fernando Viera Ney

RIO DE JANEIRO
2003
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESNVOLVIMENTO
DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS
CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOMOTRICIDADE
PROJETO “A VEZ DO MESTRE”

ATUAÇÃO DA PSICOMOTRICIDADE EM PACIENTES


ACOMETIDOS DE ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL

LIANE GOMES DE FREITAS

Monografia apresentada a Universidade


Candido Mendes como requisito parcial
para obtenção do Título de Especialista em
Psicomotricidade.

RIO DE JANEIRO
2003
DEDICATÓRIA

Este trabalho é dedicado aos meus pais,


pelas palavras e atitudes de apoio
durante toda minha vida. Ao meu
marido, por incentivar as decisões, e
estar sempre ao meu lado.
AGRADECIMENTOS

Primeiramente agradeço a Deus, por estar


concluindo este curso tão desejado por
mim. Agradeço aos professores pela
atenção.
“Antes que sejam adquiridos cinco
ingredientes essenciais, o sucesso não
será sucesso.”
Howard Whitman
RESUMO

O Acidente Vascular Cerebral (AVC) é uma síndrome que se caracteriza pelo


aparecimento rápido de sintomas ou de sinais de perda localizada da função cerebral
(parcial ou global), aparentemente devida a causa vascular. A gravidade clínica varia entre
a recuperação completa em horas, a recuperação incompleta, ou a evolução para a morte.

É uma doença com inúmeras causas, prognóstico variável, tipos de tratamento


diferentes e várias estratégias preventivas. A sua melhor definição sempre está na
dependência do diagnóstico por imagem.

A sensibilidade freqüentemente sofre prejuízos, mas raramente está ausente no lado


hemiplégico. São comuns as perdas proprioceptivas, exercendo significativo impacto sobre
as habilidades motoras, é em cima desses sinais que a psicomotricidade atua.

O desenvolvimento do esquema corporal é a representação que cada pessoa tem de


seu corpo, permitindo-lhe situar-se na realidade que o cerca. Esta representação forma-se a
partir de dados sensoriais múltiplos proprioceptivos, exteroceptivos e interoceptivos, que
estão geralmente estão deficitários nos pacientes acometidos pelo AVC.

A reeducação psicomotora é a ação desenvolvida em indivíduos que sofrem


perturbações ou distúrbios psicomotores, intervindo assim no estado patológico deste
indivíduo.
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO......................................................................................................................1

CAPÍTULO I – ANATOMIA VASCULAR CEREBRAL....................................................3

CAPÍTULO II – ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL.....................................................5


2.1 – Definição............................................................................................................5
2.2 – Epidemiologia....................................................................................................6
2.3 – Fisiopatologia.....................................................................................................6
2.4 – Fatores de Risco.................................................................................................7
2.5 – Considerações sobre a Sintomatologia do AVC................................................9
2.6 – Níveis de Oclusão e suas Possíveis Seqüelas....................................................9
2.7 – Sinais e Sintomas..............................................................................................10
2.8 – Problemas Secundários e Complicações..........................................................14
2.9 – Diagnóstico.......................................................................................................15
2.10 – Tratamento Médico........................................................................................15

CAPÍTULO III – PSICOMOTRICIDADE E DESENVOLVIMENTO..............................17


3.1 – A Função Motora.............................................................................................17
3.2 – Tônus Muscular................................................................................................17
3.3 – A Estrutura do Esquema Corporal....................................................................18
3.4 – Fatores e Subfatores Psicomotores...................................................................20

CAPÍTULO IV – REEDUCAÇÃO PSICOMOTORA........................................................32


8

4.1 – Sessão Psicomotora..........................................................................................33

CONCLUSÃO................................................................................................................
......35

REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS.................................................................................37

ANEXO...........................................................................................................................
......39
9

INTRODUÇÃO

O Acidente Vascular Cerebral (AVC), comumente conhecido como


derrame, resulta da restrição da irrigação sangüínea ao cérebro, causando lesão
celular e danos às funções neurológicas, conseqüentemente, perda ou diminuição das
respectivas funções (O’Sullivan e Schmitz, 1993).

Embora a incidência de doença vascular cerebral venha diminuindo nos


últimos 25 anos, o AVC é ainda a terceira causa de morte mais comum nos Estados
Unidos. A incidência de AVC aumenta rapidamente com o aumento da idade; na
faixa etária de 80 a 90 anos.

Os três fatores de risco mais comumente reconhecidos para a doença


vascular cerebral incluem hipertensão, diabetes mellitus e doenças cardíacas. O fator
mais importante desses é a hipertensão. A pressão sangüínea sistólica e/ou diastólica,
pressão de pulso, e variabilidade de pressão são fortes previsores de AVC para todas
as faixas etárias (Battistella e Ribeiro, 1992).

A psicomotricidade consiste na unidade dinâmica das atividades, dos


gestos, das atitudes e posturas, enquanto sistema expressivo, realizador e
representativo do “ser em ação” e da coexistência com outrem.

Envolve toda a ação realizada pelo indivíduo, que represente suas necessidade
e permitem sua relação com os demais. É a integração psiquismo-motricidade
(Bueno, 1998).
10

A pessoa acometida pelo acidente vascular cerebral apresenta disfunções


motoras, que será trabalhada através da reeducação psicomotora, onde a mobilidade
será compreendida em sua evolução, a partir dos movimentos reflexos e
incoordenados, até os movimentos coordenados que t~em finalidade e os gestos, de
valor simbólico.
11

CAPÍTULO I

ANATOMIA VASCULAR CEREBRAL

Segundo MACHADO (1991), o conhecimento da anatomia vascular cerebral


é essencial para a compreensão da sintomatologia, diagnóstico e tratamento do AVC.
Portanto, uma breve revisão do que se considera necessária: o suprimento sangüíneo
extra craniano do cérebro é propiciado pelas artérias vertebrais direita e esquerda.

A artéria carótida interna começa na bifurcação da artéria carótida comum e


ascende nas porções profundas do pescoço até o canal carotídeo. Ela volta-se
rostomedialmente e ascende até o interior da cavidade craniana. Lá, perfura a dura-
máter, ramifica-se nas artérias oftálmica e corióidea anterior e bifurca-se nas artérias
cerebrais média e anterior. A artéria comunicante anterior comunica-se com as
artérias cerebrais anteriores de ambos os lados, dando origem à porção rostal do
círculo de Willis.

A artéria vertebral é uma ramificação da artéria subclávia e penetra no forame


vertebral da 6ª vértebra cervical, deslocando-se, através dos forames dos processos
transversos das seis vértebras cervicais superiores até o forame magno e até o
cérebro. Lá, evolui ventral e medialmente na fosca craniana posterior, unindo-se com
a artéria vertebral do outro lado, para formar a artéria basilar no limite superior do
bulbo. O cerebelo e irrigado por três pares de artérias cerebelares, que se originam do
sistema vertebral-basilar. No limite superior da ponte, a artéria basilar bifurca-se,
para formar as artéria cerebrais posteriores, e a porção posterior do círculo de Willis.
As artérias comunicantes posteriores conectam as artérias cerebrais posteriores com
as artérias carótidas internas, e completam o círculo de Willis.
12

O círculo de Willis ou polígono de Willis é uma anastomose arterial de forma


poligonal situado na base do cérebro, e em casos favoráveis, permite a manutenção
de um fluxo sangüíneo o adequado em todo o cérebro, em casos de obstrução de uma
(ou mais) artérias que irrigam o cérebro.

As veias do encéfalo de um modo geral não acompanham as artérias, sendo


maiores e mais calibrosas do que elas. Drenam para os seios da dura-máter de onde o
sangue converge para as veias jugulares internas que recebem praticamente todo o
sangue venoso encefálico.

As veias do cérebro dispõem-se em dois sistemas, o sistema venosos


superficial e o sistema venoso profundo. Embora anatomicamente distintos, estes
dois sistemas são unidos por numerosas anastomoses.

As veias cerebrais superficiais distinguem-se em superiores e inferiores,


sendo que, a principal veia superficial. O sistema venoso profundo compreende veias
que drenam o sangue de regiões situadas profundamente no cérebro e a veia mais
importante deste sistema é a veia cerebral magna ou veia de Galeno, para a qual
converge quase todo o sangue do sistema venoso profundo do cérebro.
13

CAPÍTULO II

ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL

2.1 – Definição

Segundo BATTISTELLA e RIBEIRO (1992), entende-se pelo termo “doença


vascular” todas as alterações nas quais uma área cerebral é, transitória ou
definitivamente, afetada por isquemias ou (e) sangramento, ou nas quais um ou mais
vasos cerebrais são envolvidos num processo patológico.

As designações “doença cerebrovascular”, acidente vascular cerebral”,


“apoplexia cerebral” ou “derrame” são as que usualmente compreendemos como
sinônimos. Em nosso meio o nome “acidente vascular cerebral” é habitualmente o
mais utilizado e o termo “derrame” é usado em linguagem popular como sinônimo de
AVC.

Os termos acidente, icto e apoplexia geralmente refletem a instalação abrupta


de um processo (apoplexia refere-se mais especificamente à paralisia e perda da
consciência causadas por hemorragia) e, por esta razão, talvez fosse melhor a
utilização de designações mais genéricas como doença vascular cerebral (o termo
cerebral é sempre empregado com um sentido abrangente: cérebro, cerebelo e tronco
cerebral). O icto transitório é definido como um déficit neurológico de causa
vascular, de duração menor do que 24 horas.

O ataque isquêmico transitório (AIT) refere-se à temporária interrupção do


suprimento sangüíneo ao cérebro, porém, apenas alguns minutos, ou por diversas
14

horas. Depois de terminado o ataque, não há evidência de lesão cerebral residual ou


de disfunção neurológica permanente.

2.2 – Epidemiologia

Segundo O’Sullivan e Schimitz (1993), o AVC representa uma causa


importante de incapacidade e morte nos Estados Unidos e de acordo com Nitrini e
Bacheschi (1998) é a quinta causa mais freqüente de morte nos países em
desenvolvimento, sendo superado apenas pelos acidentes, doenças coronarianas,
câncer e doenças infecto-parasitárias.

Para O'Sullivan e Schimitz (1993), a incidência do AVC aumenta


dramaticamente com a idade, atingindo importantes proporções após os 55 anos.
Sendo muito maior em indivíduos entre 65 e 74 anos do que para indivíduos entre
55 e 64 anos.

Embora a maioria dos AVCs afete os mais idosos, uma porcentagem estimada
de 20% dos AVCs ocorre em indivíduos abaixo de 65 anos.

O AVC afeta homens e mulheres quase que igualmente, predominando mais


em negros que em brancos, especialmente nas faixas etárias mais jovens.

2.3 – Fisiopatologia

Diversos mecanismos podem resultar em insuficiência vascular e no AVC. As


causas mais comuns são:

trombos,
embolismo,
hemorragia secundária ou aneurisma, ou,
anormalidades do desenvolvimento.
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Outras causas menos comuns são:

tumores,
abcessos,
processos inflamatórios (como as artreites) e,
traumatismos

A aterosclerose produz a formação de placas e progressiva estenose do vaso.


As principais seqüelas deste processo são a estenose, ulceração das lesões
ateroscleróticas e trombose. A trombose cerebral refere-se à formação ou
desenvolvimento de um coágulo de sangue ou trombo no interior das artérias
cerebrais, ou de seus ramos, levando à isquemia ou oclusão de uma artéria, com um
resultante infarto ou morte tissular (infarto cerebral aterotrombótico ou ICA).

Os êmbolos cerebrais (EC) são pequenas porções de matéria, como: trombo,


tecido, gordura, ar, bactérias ou outros corpos estranhos, que são liberadas na
corrente sangüínea e que se deslocam até as artérias cerebrais produzindo oclusão e
infarto.

Ocorre hemorragia a partir do sangramento anormal, devido à ruptura de um


vaso sangüíneo. Diante de um sangramento cerebral maciço, freqüentemente a morte
ocorre dentro de horas, como resultado de um rápido aumento na pressão
intracraniana e do deslocamento e compressão do tecido cortical adjacente.

2.4 – Fatores de Risco

Hipertensão arterial: considerado o mais importante fator de risco. A


população hipertensa apresenta um risco seis a sete vezes maior do que a sem
hipertensão arterial; Hiperlipidemia: tem sido apontada como causa de progressão
mais rápida da aterosclerose; não é tão conclusivamente aceita como fator de risco
em AVC, mas o aumento de colesterol, tem sido correlacionado com o aumento do
risco de AVC.
16

Diabete Melito: também não é tão nítida a correlação como a hipertensão


arterial, mas especialmente em mulheres e em níveis mais altos de glicemia
associam-se a maior incidência de AVC do que em níveis menores de glicemia.

Alterações cardíacas: sobressaem a insuficiência congestiva e a


coronariopatia. Também relacionam-se a valvulopatia reumática, endocardite
bacteriana, defeitos congênitos, próteses valvulares, arritmias e infarto miocárdio
agudo.

Etilismo: tem sido apontado numa grande quantidade de trabalho atuais como
fator de risco de AVC.

Uso de anticoncepcionais orais: de um modo genérico aumenta o risco de


AVC em cerca de seis vezes em relação à população em geral.

Pessoas com sensível elevação do hematócrito: também estão sob maior risco
de AVC oclusivo, graças à redução generalizada do fluxo sangüíneo cerebral.
Fumo, obesidade, inatividade e estresse: são aspectos controversos como aumento do
risco de AVC.

O uso de drogas: é uma causa importante do AVC, principalmente entre


adolescentes e adultos jovens.

A presença de AIIs é um fator de risco: é extremamente importante, visto que


cerca de 1/3 daqueles indivíduos terminarão por sofrer um AVC dentro de 5 anos.

Como ocorre com o perfil de risco cardíaco, quanto maior o número de


fatores de risco presentes, ou quanto mais elevado o grau de anormalidades de
qualquer dos fatores, maior será o risco de ocorrência de um AVC (O’Sullivan e
Schimitz, 1993).
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2.5 – Considerações sobre a Sintomatologia do AVC

A sintomatologia do AVC é dependente de uma série de fatores, dentre eles


estão:

A localização do processo isquêmico;


O tamanho da área isquêmica;
A natureza e funções da área envolvida;
A disponibilidade de um fluxo sangüíneo colateral.

A sintomatologia também pode depender da rapidez da oclusão de um vaso


sangüíneo, visto que oclusões lentas podem permitir que vasos colaterais assumam a
circulação, mas eventos súbitos não o permitem.

2.6 – Níveis de Oclusão e suas Possíveis Seqüelas

Oclusão da Artéria Cerebral Anterior (ACA): a oclusão proximal a este ponto


acarreta deficiência mínimas. Lesões mais distais produzem deficiências de
hemiparesia contralateral do membro inferior, ou da face. Inicialmente, pode ocorrer
um refluxo de preensão contralateral no membro superior, incontinência, ou estupor.
A lesão do lado direito do lobo frontal pode causar negligência contralateral. A lesão
à área motora suplementar do hemisfério dominante pode acarretar afasia.

Oclusão da Artéria Cerebral Média (ACM): é o local mais comum do AVC,


sua oclusão resulta em sonolência, hemiplegia contralateral e perda sensorial cortical
da face, braço e perna, com a face e braço mais envolvidos que a perna. Também
podem resultar hemianopsia hormônima (defeito do campo visual) e desvio dos olhos
com relação ao lado hemiplégico. São comuns as desordens do esquema
corporal/imagem corporal, síndrome das relações espaciais, agnosias e apraxias (é
uma desordem do movimento aprendido voluntário).
18

Oclusão da Artéria Cerebral Posterior (ACP): o envolvimento dos ramos


subcutâneos e mesencefálicos pode acarretar ampla variedade de deficiências, como:
desordens do movimento (hemiplegia branda, posicionamento atetóide, tremor,
hemibalismo) e defeitos de campo homônimos.

Oclusão da Artéria Carótida Interna (ACI): sua completa oclusão, produz


sintomas clínicos similares aos gerados pela oclusão tanto da ACM, quanto da ACA,
Pode ocorrer um extenso edema cerebral, levando freqüentemente ao coma e à
morte. Oclusões incompletas podem mimetizar tanto os sintomas da ACM, quanto da
ACA.

Oclusões da Artéria Vertebral-Basilar: sua completa oclusão, geralmente


acarreta a perda da consciência, lesão do tronco cerebral e nervos cranianos, e
hemiplegia ou quadriplegia, com postura de descerebração ou descorticação.
Freqüentemente os pacientes morrem, mas podem permanecer comatosos, num
estado vegetativo, ou ainda podem readquirir a consciência, mas ficarão num estado
de deseferentação ou de bloqueio.

O tipo e a extensão da deficiência estão relacionados à localização e extensão


da lesão vascular.

2.7 – Sinais e Sintomas

Função Sensorial

A sensibilidade freqüentemente sofre prejuízos, mas raramente está ausente


no lado hemiplégico.

São comuns as perdas proprioceptivas, exercendo significativo impacto sobre


as habilidades motoras.
19

A perda do tato superficial, dor e temperatura são comuns,


contribuindo para uma disfunção perceptiva e para o risco de auto-lesões.

Defeitos do campo visual, como a hemianopsia hormônima, são comuns nos


casos de hemiplegia.

Funções Motoras

– Estágios de Recuperação

Durante os estágios iniciais do AVC, é comum a flacidez sem movimentos


voluntários. Usualmente, este quadro é substituído pelo desenvolvimento de padrões
motores de espasticidade e em massa, denominados sinergismos. Com o progresso
da recuperação, a espasticidade começa a declinar, tornando-se possível os padrões
avançados de movimento (Machado, 1991).

Este processo de recuperação foi descrito por Twitchell em 1951, sendo


elaborado ainda mais por Brunnstrom, citado por O’Sullivan e Schimitz (1993),
segundo eles, os estágios da recuperação são seqüenciais, mas nem todo paciente
demonstrará uma completa recuperação, podendo atingir um platô em qualquer
estágio, dependendo da gravidade de seu envolvimento e de sua capacidade para
adaptar-se.

Bobath descreve três estágios principais da recuperação: (1) o estágio inicial


flácido, (2) o estágio da espasticidade, e (3) o estágio da recuperação relativa.

– Padrões de Sinergismo

Os padrões de sinergismo dos membros são padrões de movimento


primitivos e estereotipados, associados à presença de espasticidade.
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– Reflexos

Os reflexos posturais estão alterados, freqüentemente em associação com o


estágio de recuperação no qual se situa o paciente.

– Incoordenação

Pode ocorrer incoordenação, devido ao envolvimento cerebelar ou dos


gânglios da base, perdas proprioceptivas, ou debilidade motora. A ataxia dos
membros ou do tronco é comum em pacientes com lesões cerebelares.

– Movimento Funcional

Os danos funcionais ocorrentes após o AVC variam de um paciente para


outro. Geralmente a rolagem, o ato de sentar-se, transferências, o ato de ficar de pé e
o caminhar resultam em problemas significativos para o paciente de AVC moderada
e gravemente envolvido. Habilidades para as atividades da vida diária (AVD), como
a alimentação e a colocação de roupas, também são prejudicadas (Battistella e
Ribeiro, 1992).

Função da Linguagem

Problemas da linguagem freqüentemente resultam de um AVC


envolvendo a artéria cerebral média e o hemisfério esquerdo dominante.
A afasia é o termo geral usado na descrição das desordens da função da
linguagem, previamente intacta, secundariamente à lesão cerebral.
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Função Perceptiva

As lesões do lobo parietal do hemisfério não-dominante (tipicamente o


hemisfério direito para a maioria dos indivíduos) produzem distúrbios da percepção.
Tais distúrbios podem ser: distorções visuoespaciais, distúrbios na imagem corporal,
negligência unilateral, e outros tipos de apraxia.

Pacientes com distorções visuoespaciais podem não ser capazes de julgar a


distância, dimensões, posição, velocidade de movimento, forma, ou relação das
partes com relação ao todo.

Pacientes com negligência unilateral geralmente não estão cientes do que


acontece no lado hemiplégico. Uma forma grave envolve a franca negativa de que os
membros hemiplégicos pertencem ao paciente.

Comportamento Mental

O paciente pode apresentar duas característica:

Instabilidade emocional: é definida como emoções instáveis ou


intercambiáveis, podendo resultar após um AVC agudo, onde o paciente é incapaz de
inibir a expressão das emoções espontâneas, podendo mudar rapidamente da
gargalhada para o choro, e novamente para a gargalhada. O choro freqüente é muitas
vezes acompanhado por depressão, geralmente diminuindo com o passar do tempo.

Demência: caracteriza-se por um declínio generalizado nas funções corticais


superiores, inclusive julgamentos incorretos, consciência deficiente, memória fraca,
redução na comunicação e alterações do comportamento ou do humor.
Freqüentemente estas alterações estão associadas a episódios de isquemia cerebral,
sinais neurológicos focais e hipertensão.
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2.8 – Problemas Secundários e Complicações

Além das seqüelas decorrentes do AVC, é freqüente os pacientes


apresentarem alguns problemas secundários, dentre eles, alguns estão citados aqui:

Problemas psicológicos
Contraturas e deformidades
Trombose Venosa Profunda (TVP)
Dor ( em queimação no lado hemiplégico)
Problemas urinários e intestinais
Disfunção oro-facial
Disfunção do ombro
Etc.
Não esquecendo de que as seqüelas e/ou as suas complicações
secundárias dependem do local e da extensão da lesão.

2.9 – Diagnóstico

Para se chegar à um diagnóstico definitivo, o médico deve procurar conhecer


a história da doença, realizar o exame físico e testes diagnósticos (O’Sullivan e
Schimitz, 1993).

Deve-se obter uma história acurada do paciente, ou de membros da família,


no caso de um paciente inconsciente ou incomunicável. Também investiga-se a
história passada do paciente, inclusive os episódios de AITs ou traumatismos
cranianos, presença de fatores de risco importantes ou secundários, medicamentos, e
a história familiar pertinente.
Qualquer alteração recente nas funções do paciente (seja transitória ou permanente)
deve ser detidamente investigada.

O exame físico do paciente abrange uma investigação dos sinais clínicos


(freqüência cardíaca, freqüência respiratória, pressão arterial) e sinais de
23

descompensação cardíaca. Também realiza-se o exame neurológico e testes


neurovasculares.

Dentre os testes diagnósticos, há uma série de rotina executados, abaixo


especificados:
Testes laboratoriais avaliam o estado geral da circulação sistêmica e função
corporal.

Os exames de eletrocardiograma e raios-x enfocam mais especificamente


pulmões e
coração.

A tomografia axial computadorizada (“TAC-sacn”), do crânio delineia as


alterações na estrutura cerebral, detectando as causas não vasculares do AVC.

Estes achados permitem uma localização mais precisa das lesões, tendo
revolucionado o diagnóstico do AVC.

2.10 – Tratamento Médico

O tratamento médico vai depender do quadro clínico que se encontrar o


paciente. O paciente que se encontrar com um quadro de AIT, poderá ser avaliados
em busca do diagnóstico da causa da insuficiência vascular, e para que seja instituído
um tratamento preventivo do AVC, podendo este, consistir da administração de
anticoagulantes, de terapia inibidora de plaquetas ou vasodilatadores. A arteriografia
craniana pode ser realizada quando o diagnóstico é incerto ou quando pode ser
considerada necessária a cirurgia reconstrutiva.

O tratamento médico dos pacientes com AVC, irá variar caso esteja o AVC
em progresso (AVC em evolução), ou completado (nenhum evento novo nas últimas
24 horas). Também irá variar dependendo do tipo de AVC, grau de deficiência
neurológica e estado do paciente. As preocupações clínicas primárias consistem em:
24

assegurar oxigenação e circulação adequadas;


restaurar o equilíbrio hídrico e eletrolítico;
impedir a hipoglicemia;
controlar ataques ou infecções, conforme seja necessário.
Mas pode haver necessidade da terapia medicamentosa na manutenção de um
quadro favorável (O’Sullivan e Schimitz, 1993).
25

CAPÍTULO III

PSICOMOTRICIDADE E DESENVOLVIMENTO

3.1 - A Função Motora

A função motora compreende o tônus muscular e o movimento propriamente


dito como também o estado de tensão/distensão das vísceras (Bueno, 1998).

3.2 - Tônus Muscular

Todo movimento humano, sob todas as suas formas, inclusive no relaxamento


elabora-se sobre o fundo tônico. O tônus muscular é uma tensão dos músculos pela
qual as posições relativas das diversas partes do corpo são corretamente mantidas e
que se opõe às modificações passivas destas posições.

Em condições normais o músculo esquelético está em repouso aparente, pois


ele é sede de uma constante contração tônica. Esta contração é controlada por centros
nervosos localizados no cerebelo e nódulos estriados.

Verifica-se o estado do tônus muscular através da resistência de um músculo


à mobilização passiva de um segmento do corpo.
26

3.3 - A Estrutura do Esquema Corporal

A construção do esquema corporal, a organização das sensações relativas ao


próprio corpo em relação com o mundo exterior tem um papel fundamental no
desenvolvimento da criança, pois é o ponto de partida para ela agir (Alves, 2003).

O tônus muscular e mobilidade são dois aspectos complementares e


indissociáveis do esquema corporal. A educação psicomotora irá conduzir a criança a
estruturar o seu esquema corporal através de atividades de:

- Controle do tônus muscular


- Deslocamentos globais do corpo
- Equilíbrio do corpo

A compreensão do que seja esquema corporal é de fundamental


importância para o trabalho na área de psicomotricidade.

O esquema corporal pode ser considerado como uma intuição de conjunto


ou um conhecimento imediato que temos do nosso próprio corpo, seja em posição
estática ou em movimento, em relação às diversas partes entre si e, sobretudo, nas
relações com o espaço e os objetos que o circundam.

A partir do momento que o indivíduo descobre, utiliza e controla o seu


corpo, o esquema corporal é estruturado e passa a ter consciência dele e suas
possibilidades, na relação com o meio ambiente em que vive. Vivenciar estímulos
sensoriais, para descriminar as partes do próprio corpo e exercer um controle sobre
elas, implica:
- a percepção do corpo;
- o equilíbrio;
- a lateralidade;
- a independência dos membros em relação ao tronco e entre si;
- o controle muscular;
- o controle de respiração.
27

Vayer (1984), citado por Alves (2003) afirma:

“Todas as experiências da criança (o prazer e


a dor, o sucesso ou o fracasso) são sempre
vividas corporalmente. Se acrescentarmos
valores sociais que o meio dá ao corpo e a
certas partes, este corpo termina por ser
investido de signicações, de sentimentos e de
valores muito particulares e absolutamente
pessoais”. (p. 48)

Vemos, portanto, que o corpo não é somente algo biológico e orgânico, mas
que também expressa emoções e está repleto de siginifcados que são adquiridos
através da relação do indivíduo com o meio. Esses valores, aos quais Vayer (1984),
citado por Alves (2003) se refere, influenciarão na formação do esquema corporal e
principalmente na imagem corporal. Para Morais (1998) e Santos (1987), “a imagem
é uma impressão que se tem de si mesmo, subjetivamente”, e o esquema corporal.

A noção de esquema corporal é como noção de âmbito fisiológico. Ela


representa a experiência que cada um tem de seu corpo, quando em movimento ou
em posição estática, em relação com o meio. É consciente, um simples movimento
depende de seu esquema corporal.

O desenvolvimento do esquema corporal é a representação que cada pessoa


tem de seu corpo, permitindo-lhe situar-se na realidade que o cerca. Esta
representação forma-se a partir de dados sensoriais múltiplos proprioceptivos,
exteroceptivos e interoceptivos (Alves, 2003).
28

3.4 - Fatores e Subfatores Psicomotores

De acordo com Negrine (1987), compreendem os elementos que concorrem


para a produção ou não de resultados motores. São eles:

• Estruturação Espaço-Temporal

Resulta da integração de uma estrutura temporal e de outra espacial e que


estão relacionadas às percepções auditivas, visuais e proprioceptivas.

A estruturação espaço-temporal surge durante os movimentos e quando da


relação com os objetos e pessoas distribuídos (as) pelo espaço, onde ocorrem as
experiências com a lateralidade.

O corpo é provido de um sofisticado sistema neurofisiológico que permite


interpretar as informações do espaço em que está ‘’mergulhado’’ o indivíduo. Este
localiza-se a si próprio para depois se localizar no espaço e localizar os objetos e
pessoas.

• Praxia Global

A praxia global tem como função principal a organização da atividade


consciente e a sua regulação, programação e verificação. Compreende tarefas
motoras seguidas e simultâneas que se desenrolam num determinado período de
tempo e que exigem a atividade conjunta de vários grupos musculares (Le Bouch,
1983).

A praxia evoca quatro condições básicas: um projeto, vários engramas,


ligações projeto-engramas e instrumentos neuromusculares de expressão e comandos
em função do projeto.
29

Observa-se uma intenção por trás do movimento que será mantida ou


modificada por uma programação (que faz uma consulta à linguagem interior), uma
análise dos efeitos (receptores das ações) e uma auto-regulação (estabelecida por um
controle da atenção voluntária).

• Organização

Compreende a habilidade em calcular as distâncias e promover os ajustes


necessários dos planos motores para percorrer um determinado espaço, baseando-se
nas capacidades de análise espacial, processamento e julgamento das distâncias e das
direções, planificação motora e verbalização simbólica da experiência.

A tarefa requer a fusão de dados direcionais e espaciais ao mesmo tempo


que intervém uma programação do comprimento dos passos. A estrutura espacial é
guiada pela área de integração visual que contribui no fornecimento de informações
para os centros motores a fim de ajustamento das passadas (Le Bouch, 1983).

• Representação Topográfica

Retrata a noção espacial e a capacidade de interiorização de uma trajetória


espacial apresentada num levantamento topográfico (planta do campo) e das
coordenações espaciais que são os vários pontos e linhas distribuídos (as).

• Coordenação Óculo-Manual

Compreende a capacidade de coordenar movimentos com os membros


superiores de acordo com as referências perceptivo-visuais presentes no espaço.
Envolve a percepção de distâncias, alturas e características dos alvos ou objetos tais
como forma, altura, comprimento, largura, textura, etc.; e a consciência cinestésica
do segmento corporal que irá executar o movimento (Chazaud, 1976).
30

Durante o ato motor entram em ação a capacidade de reprogramação de


seqüências motoras em face de uma análise de todos os efeitos decorrentes desde o
ato motor até a seleção dos engramas (experiência motora memorizada).

• Coordenação Óculo-Pedal

Compreende a capacidade de coordenar movimentos com os membros


inferiores de acordo com as referências perceptivo-visuais presentes no espaço.
Observação: Acompanha o mesmo raciocínio da coordenação óculo-manual.

• Dissociação

Fonseca (1983) relata que entende-se por dissociação a capacidade de


individualizar os segmentos corporais que tomam parte na execução de um gesto
intencional. A dissociação reveste-se de uma formulação melódico-quinestésica que
põe em causa aspectos do auto comando motor e aspectos de adaptação a situações
que exijam continuidade rítmica de execução. Dissociar é sinônimo de diferenciar, e
no campo da psicomotricidade está em relação com o grau de dificuldade do controle
mental do gesto.

Nesta observação, interessa verificar a possibilidade de independência dos


vários segmentos corporais, quando estruturados em função de um fim. A
independência segmentar que nos é mais significativa é a que se estabelece entre o
trem superior (diferenciação dos braços em relação ao tronco) e o trem inferior
(diferenciação das pernas em relação ao tronco).

O tronco está organizado pelo seu sistema cruzado, em forma de torção com
os membros. Situa-se na continuidade dos movimentos dos membros, unindo as
mãos e os pés. Sendo assim procura-se perceber a dissociação segmentar como uma
estrutura resultante da coordenação.
31

Numa primeira análise verifica a independência dos dois membros


superiores entre si. Posteriormente analisa-se a diferenciação dos dois membros
inferiores entre si, tomando em consideração, tanto num caso como no outro, a
execução de movimentos de percussão (membros superiores) e de batimento
(membros inferiores), em função de um ritmo de metrônomo. Nesta observação
temos, como preocupação essencial, verificar a libertação da globalização do gesto,
que normalmente se encontra presa em crianças.

Em 3° e 4° caso, procura-se inter-relacionar a execução de movimentos


unilaterais. Solicita-se ao paciente, para realizar um batimento de pé e de mão do
mesmo lado, em seguida do lado contrário.

Em seguida as observações que se seguem visam a dissociação da mão


direita e esquerda, do pé direito e esquerdo. Exemplo: do primeiro sinal bater com a
mão esquerda, depois com a mão direita, ao segundo; em seguida um batimento do
pé esquerdo, e por último no quarto sinal um batimento do pé direito. A prova deve
ser continuada e permitir a observação de aspectos relativos ao controle e
coordenação do gesto.

Deve-se tomar nota da qualidade do gesto (crispado, sacado, armonioso,


etc.) da disponibilidade e da elegância psicomotora. Pode-se observar as variações de
execução, as blocagens, as hesitações, as inibições, e através delas tomar consciência
das relações automática e voluntária.

Há ainda na dissociação, outra prova que visa relacionar aspectos da


agilidade, da coordenação e da dissociação.

Trata-se de solicitar ao paciente a realização de uma prova mais dinâmica,


que pode dar origem a reação de desorganização e descoordenação, visto exigir uma
maior perfeição motora:
32

1° - Afastar e juntar as pernas (agilidade)

2° - O mesmo movimento, com batimento de palmas no momento da junção


das pernas (coordenação)

3° - O mesmo movimento com batimento de palmas no momento do


afastamento das pernas (dissociação)

4° - Os mesmos saltos, com batimento de palmas no primeiro e segundo


tempos.

No que se refere ao caráter de dissociação, há os movimentos coordenados


dissociados, em que ambas as mãos executam movimentos distintos. Por exemplo:
enquanto se corta uma folha de papel com uma tesoura segura pela mão dominante, a
folha de papel é segura pela outra mão. este exemplo refere-se ao tipo simples de
dissociação. Mas pode-se executar movimentos mais complexos de dissociação, isto
é, enquanto uma das mãos realiza uma tarefa, a outra realiza outra diferente, por
exemplo: bater com uma mão na mesa e com a outra alisá-la.

Dentro deste grupo de movimentos há outros movimentos distintos que são


os movimentos gestuais que acompanham geralmente as conversações e ajudam a
expressão facial e corporal; são gestos naturais necessários para a harmonia da
conduta motora e se caracterizam por sua amplitude variável. São os movimentos em
que participam tanto o braço, como antebraço e a mão.

Nestes movimentos gestuais há dois tipos de dissociação: a manual e a dos


membros superiores e inferiores.

1.Dissociação manual - trata-se sobretudo da apreciação da dissociação


manual:
⇒ Bater sobre a mesa com as duas mãos, depois só com a esquerda;
⇒ De novo as duas mãos, depois só a direita;
33

⇒ Bater as duas mãos juntas em pronação, depois uma em pronação e outra


em supinação.
⇒ Estuda-se a seguir a "pianotage": os dedos batem rapidamente sobre a
mesa: mãos juntas e separadas.
⇒ Aprecia-se a oposição do polegar a cada um dos dedos (nos dois
sentidos); os movimentos de afastamento dos dedos, de dobramento.

2. Dissociação dos membros superiores e inferiores -


A) É procurada entre os cinco a oito anos, fazendo bater o pé e bater as
mãos; depois, pedindo-se uma batida de mãos e duas de pé. A prova é inicialmente
ajudada pela ordem verbal, depois deve-se desenrolar sem apoio.

B) Além dos oito anos, faz-se o sujeito saltar no lugar ajuntando e afastando
os pés; retoma-se a prova fazendo as mãos baterem no primeiro tempo, no segundo,
nos dois, etc.

• Ritmo e Ritmica

- Ritmo e alegria do movimento


A palavra grega rhytmós significa movimentos ondulares. Indica uma
alternância regular de força, velocidade e duração que pode ser motora, visual ou
auditiva (Bueno, 1998).

O ritmo do movimento é uma alternância entre a contração e o relaxamento


e pode ser forte ou fraco, rápido ou lento, acelerando ou diminuindo a velocidade,
súbito ou hesitante de durações diferentes.

O ritmo do movimento é algo vivo; constitui uma expressão natural do


estado de ânimo e da natureza de cada indivíduo.

O ritmo dos movimentos não deve ser confundido com batimentos, não
deve ser contado, mas deve ser experimentado e percebido. Esta percepção do ritmo
34

do movimento, juntamente com a circulação acelerada causada por ele, evoca a


alegria do movimento que é o principal objetivo da ginástica.

- Movimento rítmico
Mesmo quando bebê a criança experimenta movimentos rítmicos - ela
mama em um certo ritmo. Mais tarde ela engatinha, anda e corre ritmicamente, assim
como, como escreve seus movimentos são rítmicos. Todos estes movimentos variam
mais ou menos de indivíduo para indivíduo, sob a influência de fatores como:
percepção e reação, comprimento comparativo dos membros, temperamento e estado
de ânimo momentâneo.

A inteligência assim como as condições e características mentais e físicas,


determinam o ritmo de movimento da criança o qual pode mudar por influência
psicológica.

- A cooperação de diferentes sentidos:


O ritmo pode ser percebido através de vários sentidos:

Audição: O ritmo auditivo é observado na música, na fala, nas ondas


batendo na praia etc.

Sentido cinestésico: O ritmo cinestésico é encontrado em movimentos, tais


como, respirar, andar, correr e dançar.

Tato: O ritmo pode ser sentido através do tato, o qual é utilizado para
ensinar o surdo, por exemplo, no qual o ritmo da música de piano é conduzido
através do chão até a criança ( o sentido cinestésico também é envolvido aqui).

Visão: Visualmente o ritmo é experimentado através dos movimentos das


pessoas e dos animais, das árvores curvando-se ao vento, das ondas encurvando-se
na superfície do mar. O ritmo também pode ser observado no arranjo e na relação das
cores, linhas e formas de paisagens, na pintura, na escultura e na arquitetura.
35

Senso de tempo: O comprimento das notas e a duração dos intervalos podem


ser observados.

- Rítmica
A palavra rítmica ou harmonia significa a ciência do ritmo, e também pode
abranger o estudo do ritmo do movimento.

Entretanto, a palavra rítmica, tal como utilizada na linguagem ordinária,


significa as muitas maneiras diferentes de produzir ritmos e movimentos rítmicos,
tais como: copiar simples padrões rítmicos, o que realmente significa copiar formas
métricas (metro: medida de verso ou de música ) de elementos acentuados ou não
pela percussão sobre instrumentos, ou batendo palmas com os pés.

Como treinamento para audição e concentração, esta espécie de rítmica


pode ser uma excelente preparação para o aprendizado dos rítmos da linguagem,
assim como para realização de outras espécies de movimentos com música.

O psicomotricista, por exemplo, pode produzir padrões rítmicos simples que


as crianças tentam acompanhar enquanto se movimentam ao redor da sala, ou o
professor pode tocar um disco e deixar as crianças acompanharem a música enquanto
se movem mais ou menos à vontade.

- Influência dos fatores extrínsecos nos comportamentos rítmicos


Desde o nascimento, o organismo, com seus rítmicos espontâneos, é
confrontado a uma realidade temporalmente estruturada, seja por razões puramente
físicas como alternância dos dias e das noites, seja pela influência das normas sócio-
culturais. Colocado frente a uma realidade temporalmente estruturada, o organismo
deve poder adaptar-se e encontrar seu próprio equilíbrio. Chama-se este processo de
sintonização (Negrine, 1987).

1-A sintonização. Esta sintonização participa primeiro no campo do


comportamento global, na organização dos grandes rítmicos vitais: alimentação,
36

sono, a fim de permitir que o ritmo circadiano se instalar progressivamente. A este


respeito, a atitude familiar é muito importante.

2-A influência do meio nos ritmos espontâneos. Pode-se emitir a hipótese de


que a inter-relação entre o organismo materno e o organismo da criança tem um
papel fundamental na instalação de automatismos cadenciados mais primitivos, tais
como ritmias, balanceamento cadenciados de cabeça ou de tronco. Esta ritmias são a
tradução de uma oscilação tônica, ou pulsação, fazendo alternar tensão-relaxação sob
a dependência da atividade espontânea da formação reticular.

A relação entre o balanceio e a estimulação do aparelho labiríntico cria um


mecanismo de auto-alimentação que reveste um caráter fundamentalmente hedônico
e primitivo que se observa em deficientes mentais e nas crianças que se desligam do
meio. Este corte com o meio manifesta-se em certas psicoses ou em certos casos de
autismo.

- Ritmo e Afetividade
A forma como é vivida a relação com a outra pessoa joga um papel muito
importante no movimento ou, ao contrário, pode bloquear a espontaneidade do
movimento, do que depende seu caráter harmoniosamente rítmico (Picq e Vayer,
1988).

Mais tarde, no transcurso do período de investigação e aquisição das praxias


fundamentais, a importância da atitude educativa do meio é essencial para manter e
aprimorar uma boa ordem temporal do movimento e da espontaneidade. O meio deve
favorecer as experiências práxicas em um clima bom de segurança e de bem-estar.
Em outros termos, o meio que priveligia a dimensão intelectual em detrimento da
experiência vivida do corpo terá uma influência importante, a favor da atividade
cortical no processo córtex-subcórtex.
37

• Sincinesias

O estudo do movimento voluntário revela que, quando nos expressamos


corporalmente através de uma ou outra ação, nem sempre os movimentos executados
obedecem a um controle cortical, acionado pelo sistema piramidal.
Movimentos e/ou expressões involuntárias, muitas vezes, estão presentes
em determinados ações, sem que o executante perceba estes movimentos parasitas
desencadeados e manifestados pelo corpo no momento em que realiza determinados
atos voluntários (Fonseca, 1983).

- Conceitos e Classificações

As SINCINESIAS são consideradas como um dos elementos da debilidade


motora, juntamente com as paratonias e as inabilidades, e que podem ser encontradas
em indivíduos psiquicamente normais e até intelectualmente superiores.

Da mesma forma, certos indivíduos com debilidade neurológica podem


apresentar desenvolvimento notável da força e da agilidade motora, constituindo um
exemplo inverso de que o cérebro motor, por vezes, é poupado, enquanto o cérebro
psíquico é detido em sua evolução.

Há de destacar-se que, nem sempre, as sincinesias representam debilidade


motora, até porque a imaturidade do feixe piramidal determina comportamento
motores involuntários que as caracterizam.

Entende-se, principalmente que as sincinesias podem ser definidas como


movimentos e/ou expressões involuntárias manifestadas pela criança no momento em
que realiza determinado movimento voluntário.

Para contribuir com o estudo das sincinesias Airton Negrine propõe a


seguinte classificação:
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1-Sincinesias Faciais: ⇒ de expressão


⇒ de movimento

2 - Sincinesias Segmentares: ⇒ Hipertônica


⇒ Similar

SINCINESIAS FACIAIS: São movimentos ou expressões faciais


involuntárias manifestadas pelo indivíduo quando ele realiza algum movimento ou
expressão voluntária com qualquer parte do corpo (geralmente as mãos).

As sincinesias faciais podem ser manifestadas de duas formas distintas:

- Sincinesias Faciais de Expressões:


São aquelas manifestadas com expressões faciais (caretas), caracterizadas
como: abrir a boca, elevar as sobrancelhas, etc., enquanto algum segmento corporal
realiza algum movimento voluntário.

- Sincinesias Faciais de Movimento:


São manifestações dinâmicas realizadas com parte ou partes da face,
caracterizado como: morder a língua, elevar e baixar sucessivamente as
sobrancelhas, etc., enquanto o indivíduo realiza movimentos voluntários com
determinado segmento corporal.

SINCINESIAS SEGMENTARES: São caracterizadas como a falta de


controle segmentar nos braços, mãos e dedos, isto é, manifestam-se em atitudes
involuntárias no segmento contrário àquele que realiza o movimento voluntário.
Nesse caso também classifica-se em dois tipos distintos:

Sincinesia Segmentar Hipertônica


Refere-se ao estado de tensão da musculatura que se desencadeia no
segmento contrário àquele que realiza o movimento voluntário.
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Nesse caso a Sincinesia ocorrida se dá de forma estática, isto é, sem


movimento no segmento contrário, muito próximo ao estado paratônico, que se
refere a uma dificuldade de relaxamento segmentar.

Sincinesia Segmentar Similar


Refere-se a movimentos desencadeados de forma involuntária do segmento
contrário àquele que realiza um determinado movimento voluntário.
Nesse caso, a Sincinesia aparente é evidenciada de uma forma dinâmica,
onde a característica principal é o movimento.

No momento em que se propõe uma classificação das sincinesias, deve-se


destacar que podem se r encontrados outros tipos de sincinesias e que vão depender
da posição em que se encontra a pessoa em que está sendo observada.

Por exemplo: se colocarmos um indivíduo sentado em uma cadeira e lhe


solicitarmos que abra e feche a mão sucessivamente, poderemos observar sincinesias
faciais e segmentares na mão contrária, ou ainda, sincinesias segmentares nos
membros inferiores.

Quando avaliamos, portanto, as sincinesias em um indivíduo, colocando-a


em posição em pé, estamos conseqüentemente, neutralizando as possíveis sincinesias
dos segmentos inferiores . O mesmo caso poderá acontecer se colocarmos uma
criança sentada no solo, apoiando suas mãos no chão, e lhe solicitarmos que, com um
pé faça extensão e flexão ou a circundação para fora e para dentro.

Neste caso, as sincinesias manifestadas poderão ser faciais ou segmentares


no pé contrário, porque as possíveis sincinesias dos segmentos superiores estarão
neutralizadas pelo apoio das mãos no solo.
40

CAPÍTULO IV

REEDUCAÇÃO PSICOMOTORA

Segundo Meur e Staes (1989), é a ação desenvolvida em indivíduos que


sofrem pertubações ou distúrbios psicomotores, por exemplo indivíduo acometido
pelo acidente acidente vascular cerebral.

A reeducação psicomotora tem como objetivo retomar as vivências anteriores


com falhas ou as fases da educação ultrapasadas inadequadamente. Em termos
gerais, reeducar significa educar o que o indivíduo não assimilou adequadamente em
etapas anteriores. Deve começar em tempo hábil em função da instalação das
condutas psicomotoras, diagnosticando as dificuldades a fim de traçar o programa de
reeducação.

A atribuição da reeducação está contida em várias áreas profissionais:


pedagogia, fisioterapia, terapia educacional, fonoaudiologia, dentre outros. Mas o
mais importante para uma boa reeducação é a tranqüilidade e o intercâmbio afetivo e
presente do reeducador com o indivíduo, condição básica para uma boa reeducação.

O artigo 7 da proposição da lei francesa de 15/02/74 cita que a reeducação


deve ser “neurológica em sua técnica, psicológica e psíquica em sua meta, destinada
pela intermediação do corpo atuar sobre as funções mentais e psicológicas
perturbadas tanto na criança como no adolescente ou no adulto”.

A reeducação embasa sua eficácia no fato de que se remonta às origens, aos


mecanismo de base que estão na origem da vida mental, controle gestual e do
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pensamento, controle das reações tônico-emocionais, equilíbrio, fixação na atenção,


justa preensão do tempo e do espaço.

4.1 - Sessão Psicomotora

As sessões de reeducação realizam-se em função do indivíduo ou do grupo


por um profissional habilitado, em local apropriado (sala e materiais) por meio de
atividades (psicomotoras) que desenvolvam o indivíduo no seu todo, global e
harmonicamente (Meur e Staes, 1989).

Em relação ao local de trabalho, esse pode ser interno ou externo e de


preferência exclusivo para atividades psicomotoras. Se é espaço interno deve ser uma
sala ampla a fim de que as pessoas possam correr, saltar, ficar tranqüilas e para uma
não interferir na atividade da outra se assim desejar. Deve ser ventilado, com janelas
mais altas que a altura das pessoas; se possível, um piso revestido com emborrachado
para poderem trabalhar com meias ou descalços e sem problemas com materiais
úmidos (água, tinta, etc.). Deve ter espelho, quadro negro e armários com os
materiais ali colocados. Lapierre sugere uma disposição conforme o objetivo, mas
entendemos que o mais importante é sabermos o que o indivíduo necessita e o que
cada material propicia, aliando a necessidade à possibilidade de exploração de seus
conteúdos por meio dos materiais.

Em relação à freqüência e duração da sessão, depende do trabalho


desenvolvido, mas não deve ser inferior a uma vez semanal de 45 minutos, podendo
chegar a sessões diárias, conforme a necessidade. Contudo, uma vez semanal é pouco
se não for associada a outras terapias, de forma interdisciplinar. O número de sessões
dependerá da natureza da dificuldade, da idade, do seu desenvolvimento e das
experiências vividas, ou seja de seu processo próprio.

Em relação à organização da sessão, é importante que esse momento seja de


prazer e de liberdade para a pessoa. Não podemos nunca deixar de lado o prazer do
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movimento, da ação e da sensação prazerosa resgatada aí. A dosagem das propostas


deve levar a um resultado positivo com variabilidade de consignas, materiais e da
própria proposta, sendo a escolha do material feita pelo próprio terapeuta e às vezes
pelo indivíduo. As colocações espontâneas deverão ser ouvidas no momento, mesmo
que algumas vezes interrompam a ação motora. O humor faz parte das atividades,
deixando um ambiente descontraído e alegre.

Acreditamos que nenhuma técnica, por mais apropriada que seja, resolverá
um problema, mesmo o puramente intelectual, se a qualidade do relacionamento
entre reeducador e pessoa não estiver firmado na afetividade, e ainda mais, se não
passar pela via corporal.
43

CONCLUSÃO

Um acidente vascular cerebral (AVC), resulta em um déficit neurológico


súbito e específico. É o aspecto repentino do déficit neurológico - segundos, minutos,
horas, ou poucos dias, que caracteriza o distúrbio como sendo vascular.

Embora a hemiplegia possa ser o sinal mais óbvio de um acidente vascular


cerebral e o principal interesse dos terapeutas, outros sintomas são igualmente
incapacitantes, incluindo a disfunção sensorial, afasia ou disartria, defeitos de campo
visual e comprometimento mental e intelectual. A combinação específica desses
déficits neurovasculares possibilita detectar tanto a localização quando o tamanho da
lesão. Os acidentes vasculares cerebrais podem ser classificados de acordo com o
tipo patológico - trombose, embolia ou hemorragia - ou de acordo com fatores
temporais - completado, em evolução, ou ataques isquêmicos transitórios.

A psicomotricidade constitui o estudo relativo às questões motoras e psico-


afetivas do ser humano. A mesma seria o ponto de encontro entre a expressão motora
(o que a pessoa faz ) e a característica pessoal-emocional de cada ser humano (o que
a pessoa sente).

O corpo é o seu ponto de referência e o seu interesse objetivo de estudo. As


alterações corporais constituem-se, assim, no motivo das suas pesquisas e no da sua
intervenção.

A psicomotricidade é, dessa forma, um tipo de psicoterapia de índole


corporal.
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Com isso, conclui-se neste estudo que através da reeducação psicomotora a


pessoa com AVC irá retomar as vivências anteriores com falhas, através de
atividades psicomotoras.
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REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

ALVES, F. Psicomotricidade: Corpo, Ação e Emoção. Rio de Janeiro: Wak, 2003, p.


31-52.

BATTISTELLA, L. R. e RIBEIRO, S. J. B. Hemiplegia – Reabilitação. São Paulo:


Atheneu, 1992, p. 01-106.

BUENO, J. M. Psicomotricidade – Teoria e Prática. São Paulo: Lovise, 1998, 17-20,


57-61, 85-86.

CHAZAUD, Jacques. Introdução à psicomotricidade. editora Manole, São Paulo,


1976.

FONSECA, Vítor da. Psicomotricidade. Martins Fontes Editora, São Paulo, 1983.

LE BOULCH, Dr. Jean. Desenvolvimento psicomotor do nascimento até os seis


anos. Artes Médicas, Porto Alegre, 1982.

LE BOULCH, Dr. Jean. Psicomotricidade. Secretaria da Educação Física Desportos


- M.E.C, Uberlândia, 1983.

MACHADO, A. B. M. Neuroanatomia Funcional. Rio de Janeiro: Atheneu, 1991, p.


67-73.

MEUR, A., STAES, L. Psicomotricidade: Educação e Reeducação. São Paulo:


Manole, 1989.
46

NEGRINE, Airton da Silva. A coordenação psicomotora e suas implicações. editora


Pallotti, Porto Alegre, 1987 .

O’SULLIVAN, S. e SCHIMITZ, J. Fisioterapia: Avaliação e Tratamento. 2 ed. São Paulo:


Manole, 1993, p. 385-399.

PICQ, L. & VAYER, P. Educação psicomotora e retardo mental. editora Manole, São
Paulo, 1988.
47

ANEXO

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