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Economia Aziendale Online Vol. 3, 2/2012: 213-228 Artigos arbitrados

www.economiaaziendale.it DOI:
10.4485/ea2038-5498.003.0016

Contabilidade e relatórios financeiros do governo central:

uma comparação entre a França, a Itália e a União Europeia

Michela Soverchia

Abstrato
Nos últimos anos, muitos países empreenderam reformas em seus sistemas governamentais de contabilidade e relatórios
financeiros, tanto no nível central quanto no nível local, a fim de atender às necessidades de transparência, prestação de contas
e comparação. Além disso, o International Public Sector Accounting Standards Board emitiu o primeiro conjunto de normas
contábeis especificamente dedicadas ao setor público; mas a adoção desses padrões não é obrigatória, portanto nem todas as
reformas do setor público são baseadas neles.
Dado que não existe um modelo normalizado de contabilidade e relato financeiro governamental, o artigo visa centrar a atenção
no continente europeu: em primeiro lugar, analisando os sistemas de contabilidade e relato financeiro do governo central de
dois países europeus (França e Itália), prestando particular atenção sobre as reformas realizadas recentemente, a fim de
comparar esses dois sistemas, destacando semelhanças e diferenças; em segundo lugar, avaliar se os modelos de contabilidade
central francesa e italiana estão alinhados com o sistema da UE, visto que ambos são estados membros da UE.

Palavras-chave: contabilidade do setor público, contabilidade de exercício, relatórios financeiros do governo central.

Tal fenómeno, aliado a muitas causas específicas

1. Introdução
As últimas décadas foram caracterizadas por profundas
transformações que envolveram o setor público de forma
transversal, determinando mudanças relevantes em seus
modelos de trabalho e no papel desempenhado na
sociedade. Trata-se de uma racionalização e
modernização, ainda em curso em muitos contextos,
referida a muitas dimensões do setor público, iniciada e
difundida com diferentes peculiaridades e momentos,
tanto no mundo desenvolvido como nos países em
transição. Têm sido envolvidos diversos tipos de
organismos públicos (locais, nacionais, supranacionais e
internacionais), bem como diversas áreas de intervenção
pública e serviços públicos.
Esses processos ocorreram a partir de um quadro de
crise mais ou menos profunda que envolveu o setor
público. Em geral, a evolução qualitativa e quantitativa da
intervenção pública na sociedade implicou um aumento
substancial das despesas públicas, sem o correspondente
e efectivo aumento dos benefícios; este problema
provocou situações cada vez mais profundas de
desequilíbrio entre os sacrifícios impostos aos
contribuintes e os serviços públicos prestados.
inerentes a contextos únicos, determinou a necessidade
urgente de recuperação da eficiência e eficácia das
entidades públicas, monitorizando a capacidade de
concretização dos seus fins institucionais em condições
financeiras e económicas sustentáveis. No actual contexto
social e económico, este elemento é um factor essencial
para a competitividade internacional dos países, graças às
importantes funções desempenhadas pelo sector público
na produção e prestação de serviços, que influenciam e
apoiam o desenvolvimento e a competitividade das
empresas.
Muitas reformas, desenvolvidas de forma diferente
em vários campos públicos, têm sido trabalhadas sob o
paradigma da Nova Gestão Pública (NPM) (Aucoin, 1990;
Hood, 1991 e 1995; Barzelay, 2001; Gruening, 2001; Pollit
e Bouckaert, 2004; Pollit e outros, 2007). Leva em
consideração diferentes processos de racionalização e
mudança no funcionamento dos entes públicos do ponto
de vista organizacional, gerencial e financeiro, com foco
na busca da melhor solução técnico-produtiva por meio
do uso de práticas como medição de desempenho,
orçamentação por desempenho, gestão por objetivos, que
são princípios e instrumentos empresariais típicos
adaptados ao setor público.

Michela Soverchia
Università degli Studi di Macerata, Dipartimento di Economia e Diritto Via
Crescimbeni n. 20 – 62100 Macerata
soverchia@unimc.it
214 Soverchia M. / Economia Aziendale Online Vol. 3, 2 (2012) 213-228
Vários estudos teóricos e empíricos mostram que
diferentes estratégias são usadas para alcançar as
reformas da gestão pública (Jones et al., 2004):
- descentralização e delegação de autoridade e
responsabilidade pela tomada de decisão e
gestão;
- aplicação da tecnologia da informação para melhorar
a gestão dos governos e a capacidade de resposta
aos cidadãos;
- desenvolver e melhorar os sistemas de controle de
gestão;
- introdução de medidas para reduzir a corrupção no
governo, nas empresas e na sociedade;
- desenvolvimento e utilização de indicadores de desempenho;
- integração da medição e gestão do
desempenho.
Nesses processos, também ocorrem as reformas dos
sistemas de contabilidade do setor público: é o New Public
Financial Management (NPFM) (Olson et al., 1998), que
mostra uma importância crescente da dimensão financeira e
contábil das reformas de gestão do setor público. Todos os
campos da contabilidade do setor público foram envolvidos:
contabilidade gerencial, contabilidade financeira e auditoria
(Jones e Pendlebury, 2000). Nesta área, as mudanças nos
sistemas de relatórios financeiros são consideradas um dos
“elementos-chave das reformas financeiras” (Olson et al.,
1998). De facto, os recursos financeiros são condição
essencial para o funcionamento e sobrevivência das
entidades públicas, pelo que o controlo das formas de
utilização destes recursos é um tópico de discussão infindável
para académicos e profissionais.
O objetivo deste estudo é, em primeiro lugar,
analisar os sistemas de contabilidade e relatórios
financeiros do governo central de dois países, França e
Itália, com particular atenção para as reformas
recentemente realizadas, a fim de comparar esses dois
sistemas, enfatizando semelhanças e diferenças. Em
segundo lugar, como esses dois países são membros da
UE, avaliar se as escolhas contábeis dos governos centrais
francês e italiano estão alinhadas com o sistema da UE
recentemente renovado.
O artigo está estruturado da seguinte forma: a próxima
seção estabelece um quadro teórico, fornecendo uma visão
geral da literatura e pesquisas anteriores referentes ao tema
de pesquisa; a terceira seção esclarece o contexto da
pesquisa; a quarta seção é dedicada ao desenho e
metodologia da pesquisa; a quinta seção sintetiza a análise
dos casos selecionados; por fim, é apresentada uma
discussão sobre achados e resultados da pesquisa com
considerações finais.
2 – Embasamento teórico
Dentro da vasta literatura de NPFM e das reformas
implementadas, relatórios financeiros e padrões contábeis
para o setor público são questões muito importantes. Em
particular, a introdução da contabilidade de exercício
sistemas, saindo da contabilidade baseada em caixa, é uma
das linhas mais significativas das recentes reformas contábeis
do setor público.
No entanto, este não é um assunto novo. Várias
tentativas de introdução da contabilidade comercial no
setor público foram feitas no passado: por exemplo, as
realizadas na Espanha no século XVI (Jurado-Sanchez,
2002), no Reino Unido e na Itália no século XIX (Edwards et
al., 2002; Anselmi, 2006), e nos EUA na primeira parte do
século XX (Antony, 2000). As razões pelas quais estas
tentativas não tiveram sucesso são diferentes e variam de
acordo com o contexto específico dos países: o elemento
comum parece ser a sua baixa conformidade com as
necessidades e características do setor público (Anessi
Pessina, 2007: 26).
Na década de 90 do século passado, a adoção da
contabilidade de exercício no setor público foi
impulsionada e considerada “autoevidente” (Lapsley et al.,
2009), vista como uma boa ferramenta para concretizar os
princípios da NPM, como eficiência, eficácia, transparência
e responsabilidade do setor.
Quanto às vantagens decorrentes da implementação
da contabilidade de exercício no setor público, muitos
estudos foram realizados (Parker e Guthrie, 1990; Pallot,
1994; Mellet, 1997; Brorström, 1998; Perrin, 1998; Chan,
2003; IFAC-PSC, 2003b ; FEE, 2007). De acordo com essa
ampla literatura, os principais aspectos positivos são:
- a ligação com a contabilidade de gestão;
- medição dos custos dos serviços prestados e programas
políticos, de forma a maximizar a eficiência e
produtividade das entidades públicas;
- monitoramento de ativos;
- medição e comunicação mais precisas da posição
financeira e desempenho das entidades do setor
público;
- avaliação de longo prazo da sustentabilidade financeira das
políticas públicas;
- a possibilidade de elaborar demonstrações financeiras
consolidadas.
Em suma, espera-se que a contabilidade de exercício
forneça melhores informações para uso interno (para cálculo
de custos e preços, opções de fazer ou comprar, terceirização,
etc.) e uso externo, melhorando assim a transparência, a
prestação de contas e a avaliação de desempenho das
entidades públicas. Estas vantagens correspondem à crítica à
contabilidade de caixa que é acusada de impedir a realização
das medidas e avaliações acima referidas.
Consequentemente, a contabilidade de caixa não poderia
caber no controle da gestão dos recursos públicos, não sendo
capaz de evidenciar a relação entre o consumo de recursos e
os resultados alcançados.
Após um período entusiástico de adoção de novas
ferramentas e técnicas contábeis, um crescente corpo
de literatura destacou que as reformas nem sempre
levam aos resultados esperados (Olson et al., 1998;
Lapsley, 1999; Ter Bogt e Van Helden, 2000) e
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que as práticas do setor privado não são necessariamente
adequadas para serem aplicadas acriticamente no setor público
(Guthrie, 1998), questionando se há uma necessidade real de
contabilidade de exercício no setor público e se esse é o caso para
todos os tipos de entidades públicas.
Estudos teóricos e empíricos apontam mais de
um problema decorrente da implantação da
contabilidade de exercício no setor público, que realiza
atividades extremamente heterogêneas e produz
muitos outputs que nem sempre podem ser medidos
e representados do ponto de vista financeiro (Stewart
e Walsh, 1994).
Do ponto de vista teórico, alguns autores argumentam
que a contabilidade de caixa é mais adequada para o tipo de
atividade do governo, em particular para o governo central,
significativamente preocupado com as transferências de
fundos. Outros autores destacam que as reformas da
contabilidade de exercício não identificaram e seguiram um
padrão conceitual, resultando em uma transferência acrítica e
enganosa de práticas de negócios no setor público (Mautz,
1981; Guthrie, 1998; Ellwood, 2003; Hodges e Mellet, 2003;
Christiaens e Rommel, 2008).
Além disso, surgiram algumas dificuldades
operacionais na implementação da contabilidade de
exercício, dependendo da natureza peculiar e do tipo
de atividades do setor público (Guthrie, 1998; Antony,
2000; Blöndal, 2002; Christiaens, 2004; Newberry e
Pallot, 2005). Em particular:
- a ausência de mercado, que acarreta algumas
consequências relevantes quanto à definição,
avaliação, classificação, depreciação e apresentação
dos ativos;
- a elaboração do balanço de abertura, que
exige a identificação e avaliação de ativos e
passivos no início da reforma contábil;
- dificuldades operacionais dos funcionários do escritório de
contabilidade em registrar transações em um sistema de escrituração
de partidas dobradas, bem como dificuldades dos gestores públicos
em entender os relatórios financeiros baseados no regime de
competência;
- problemas com sistemas de informação, especialmente no
que diz respeito à mudança para o novo sistema de
contabilidade, bem como os seus custos de transição em
relação a tempo, recursos financeiros e humanos.
Em resumo, as características não comerciais da
economia do setor público levam à existência de tipos
específicos de ativos e passivos, despesas e receitas que
não existem nos negócios e levantam a necessidade de
uma estrutura conceitual especial para entidades públicas
(Guthrie , 1998; Chan, 2003; Ellwood, 2003). Pelo
contrário, o desenvolvimento de modelos contábeis e de
mensuração de desempenho cada vez mais avançados,
elaborados e caros subestima as dificuldades de
mensurar o desempenho do governo, acabando por
considerar a mensuração da atividade como um
215
objetivo e não como um meio (Jones et al., 2001; Olson et al.,
2001).
Finalmente, do ponto de vista da gestão, a utilidade dos
relatórios de contabilidade de exercício – especialmente sua
capacidade de melhorar a tomada de decisões de políticos e
outras partes interessadas – parece não ser comprovada, uma
vez que os tomadores de decisão do setor público não
consideram essas informações tão úteis, relevantes e
compreensíveis (Jones e Pendlebury, 2004; Steccolini, 2004;
Brusca e Montesinos, 2006; Wynne, 2008).
3 – Contexto da pesquisa: reformas da
gestão financeira na França, na Itália e na
União Europeia
O foco nas escolhas contábeis feitas pelos governos centrais é
um importante tópico de pesquisa, porque essas entidades
públicas captam e gastam grande quantidade de recursos
financeiros, portanto, a análise de seu sistema contábil e do
relatório financeiro conectado é importante para avaliar sua
capacidade de satisfazer as necessidades financeiras.
prestação de contas por meio de seus stakeholders (Mack e
Ryan, 2006).
Alguns estudos destacam a prevalência, dentro dos
governos centrais, daquelas características e atividades para
as quais a contabilidade de competência é muitas vezes
considerada inadequada. Christiaens e Rommel, por exemplo,
sugerem o uso da contabilidade de exercício quando o
governo se envolve em atividades empresariais, enquanto a
contabilidade de caixa deve ser aplicada quando o governo
presta serviços públicos sem fins comerciais ou lucrativos,
esperando uma combinação dos dois sistemas quando
coexistem diferentes tipos de atividades ( Christiaens e
Rommel, 2008: 59-75).
Outro ponto crítico é que não existe um único tipo de
contabilidade de exercício: a contabilidade de caixa integral e
a contabilidade de exercício integral podem ser consideradas
como dois pontos limites de uma ampla gama de alternativas
diferentes, sendo soluções híbridas (IFAC-PSC, 2000: 15;
Blöndal , 2002: 44).
No continente europeu, a contabilidade
governamental diverge entre os países e dentro dos
países, tanto por diferenças nos sistemas de registro,
quanto por diferentes regras de mensuração e requisitos
de divulgação (Lüder e Jones, 2003; Jones, 2007). Tanto o
sistema contábil continental quanto o anglo-saxão estão
representados: a tradição continental pode ser associada
aos países de direito civil com sistema jurídico romano
(como França, Alemanha, Itália, Espanha), enquanto a
tradição contábil anglo-saxônica é geralmente associado
ao sistema jurídico da common law, como o do Reino
Unido (Torres, 2004). Enquanto a abordagem anglo-
saxônica é influenciada pelo modelo de negócios, o
sistema de contabilidade continental está conectado com
um significado burocrático de princípios e padrões
contábeis, que os órgãos públicos estabelecem como leis
ou regras administrativas. Como bem conhecido,
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o orçamento tem sido tradicionalmente quase o único
elemento na contabilidade governamental e a influência
da contabilidade do setor privado esteve ausente até
anos recentes (Montesinos e Vela, 2000).
O incentivo aos sistemas de contabilidade
governamental e à harmonização dos relatórios
financeiros parece adquirir cada vez mais
importância, também com particular referência
ao continente europeu, por diferentes razões.
Em primeiro lugar, realizar a consolidação das
despesas e resultados do setor público europeu.
Além disso, a necessidade de promover a
convergência entre a contabilidade nacional
(sistema SEC 95) e a contabilidade
governamental tem sido apontada em diversas
circunstâncias (Jones, 2003; IFAC-IPSASB, 2005).
Lüder (2000: 127) defende “uma mudança das
bases contabilísticas governamentais para o
regime de competência, bem como uma
uniformização transnacional de procedimentos e
práticas” de modo a levar a cabo esta
convergência progressiva – tendo em conta as
características do SEC 95 – também com o
objetivo de melhorar a comparações entre
países. Então,
Nesse contexto, a análise dos casos francês e italiano
é interessante por serem países muito semelhantes
quanto às características dos sistemas institucionais e
administrativos.
A França é uma república semipresidencialista com
tradições estatais legalistas (Pollit e Bouckaert, 2004:
247-255). É um país caracterizado pela tradição histórica
de forte centralização da tomada de decisões e gestão
administrativa (Rechtsstaatcultura administrativa), que
foram particularmente fortalecidos durante o período
napoleônico. Desde o início dos anos 80 do século
passado, no entanto, iniciou-se um processo de
introdução de elementos de descentralização
administrativa por meio da divisão de poderes e funções
entre os governos central e local (Cole e Jones, 2005;
Kickert, 2005). Este processo, que continua nos anos 90,
atinge o seu apogeu com a aprovação da Lei
Constitucional de 28 de Março de 2003, definindo a
França como república descentralizada e introduzindo os
princípios da subsidiariedade e da autonomia financeira.
Dentro desses esforços de modernização, também o
orçamento do governo central e as reformas dos
relatórios financeiros encontram seu lugar.
A Itália é uma república parlamentar com um sistema
jurídico de direito civil (Pollit e Bouckaert, 2004: 264-269). Nos
últimos anos foram realizadas algumas reformas legislativas –
inspiradas no princípio da subsidiariedade – no sentido de se
obter uma relevante descentralização administrativa,
concretizada com a transferência de funções e poderes do
governo central para as regiões e autarquias locais (Longo,
2001; Mussari, 2005a). . Esse processo teve seu ápice com a
aprovação da Lei Constitucional n. 3/2001 – que ainda precisa
ser totalmente implementada –
com o qual o Estado reconhecia aos governos locais
alto grau de autonomia institucional, organizacional,
gerencial e financeira. O processo de reforma contábil
recentemente empreendido pelo governo central
italiano concentrou-se predominantemente no
orçamento e – como um país de direito civil – ocorreu
por lei.
Tendo em conta que estes dois países são estados
membros da UE, ambos membros fundadores, é
interessante comparar os seus sistemas de contabilidade
e relatórios financeiros do governo central com os da UE,
uma vez que devem respeitar as normas económicas e
financeiras da UE, reportando dados financeiros a a
organização supranacional a que pertencem.
A UE é uma administração pública supranacional,
resultado de um complexo e longo processo de cooperação e
integração pacífica voluntária, único e ainda em curso, que
alguns países europeus iniciaram desde os anos 50 do século
passado: é uma organização pública muito mais jovem do que
Estados nacionais. A natureza supranacional da UE influencia
os seus mecanismos institucionais, organizativos e de
funcionamento, caracterizados por um relevante grau de
complexidade e heterogeneidade.
Durante a última década iniciaram-se muitos
processos de reforma, envolvendo várias dimensões
da UE (organização, gestão e controlo), devido quer à
crise institucional ocorrida no final dos anos 90 (Judge
e Earnshaw, 2002) quer ao processo de alargamento:
os membros da UE aumentou de seis para vinte e sete
e este fato tornou inadequado o modelo original
moldado pelos pais fundadores das Comunidades
Européias.
No quadro complexo da UE, neste documento
a atenção está centrada na Comissão Europeia
(CE), uma instituição europeia1com poderes executivos
para garantir a boa implementação da legislação
europeia, orçamento e programas comunitários. Em
seguida, em relação ao modelo contabilístico da UE,
assume um papel de extrema importância, definindo
princípios e regras contabilísticas a aplicar pelas restantes
instituições da UE e tendo por missão consolidar as contas
dos diversos órgãos da UE.
O processo de reforma da CE começou em 2000
com a publicação do livro branco (Comissão Europeia,
2000): o programa de reforma é baseado nos
princípios de responsabilidade, eficiência e eficácia das
ações implementadas e transparência dentro da
Comissão, bem como para atores externos (Levy,
2004). As áreas de intervenção previstas pela reforma
são essencialmente três: a implementação de um
1O quadro institucional da UE é muito complexo: para
além das instituições (as mais importantes são o
Parlamento Europeu, a Comissão Europeia, o Conselho
da UE e o Tribunal de Contas Europeu), existem órgãos
financeiros, órgãos consultivos, órgãos
interinstitucionais e organismos descentralizados
(agências).
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sistema de gestão baseado (também para o processo
orçamentário); a reavaliação das políticas e gestão de
recursos humanos; a reforma dos sistemas de gestão
financeira, controlo e auditoria (Comissão Europeia,
2000).
Além disso, a CE impôs recentemente a adoção
compulsória do IAS/IFRS a todas as empresas listadas nos
estados membros da UE. Mas o que está acontecendo dentro
do setor público? A este respeito, a CE poderá desempenhar
um papel preponderante no futuro, tomando decisões
semelhantes às assumidas para os negócios, ainda que uma
intervenção comunitária possa colidir com a autonomia
nacional dos Estados membros da UE no que se refere aos
seus orçamentos e modelos contabilísticos (Jones , 2007: 103).
No entanto, a comparação de casos nacionais com o caso da
CE é interessante porque os poderes e funções da UE ainda
estão evoluindo, portanto, monitorar o que está acontecendo
com a reforma contábil da UE é importante, porque no futuro
algumas escolhas europeias podem influenciar - de uma
forma mais ou menos obrigatória – a
estados membros da UE2.
4 – Desenho da pesquisa: objetivos, questões e
metodologia
Neste artigo a atenção está voltada para o continente
europeu: conforme explicado na introdução, os objetivos
deste estudo são:
1) analisar os sistemas contabilísticos e de reporte
financeiro dos governos centrais de França e Itália,
com especial atenção para as reformas
recentemente realizadas, de forma a comparar estes
dois sistemas, destacando semelhanças e diferenças,
para perceber se existem alguns elementos comuns;
2) avaliar se os sistemas de contabilidade e relatórios
financeiros dos governos centrais francês e italiano
estão alinhados com o sistema da UE, já que ambos são
estados membros da UE, e isso é considerado um
estímulo importante para as reformas da gestão
financeira do governo.
Os casos selecionados foram escolhidos pelas razões
explicadas na seção anterior. Em resumo:
- França e Itália são países semelhantes quanto à
cultura administrativa, sistema político e
institucional, bem como quanto à cultura contábil;
um dos critérios de seleção e triagem dos casos,
de fato, é a sua homogeneidade (Patton, 2002).
- A atenção também está voltada para o caso da UE: de fato,
mesmo que a França e a Itália sejam atualmente autônomas
na formulação de suas próprias contas governamentais,
2Éinteressante notar que, na sequência da Diretiva do
Conselho 85/2011, no início de 2012 o Eurostat lançou –
em nome da CE – uma consulta pública para avaliar a
adequação das IPSASs para a contabilidade
governamental dos estados membros da UE.
217
ing modelo, ambos são estados membros da UE e
têm de reportar dados financeiros a esta organização
supranacional.
Enquanto para França e Itália a análise incide sobre o
governo central, para a UE o foco recai sobre a Comissão
Europeia (CE), pelo seu importante papel desempenhado na
definição do modelo contabilístico da UE.
A partir dos objetivos de pesquisa mencionados acima, o
seguinte conjunto de questões de pesquisa foi derivado:
- A semelhança administrativa entre a França e a
Itália se reflete nos processos de reforma
contábil realizados e, de um modo geral, no
sistema de contabilidade e relatórios
financeiros do governo central?
- É possível apontar uma influência da UE nas reformas
contabilísticas levadas a cabo pelos Estados-
membros da UE analisados?
- Qual é o papel desempenhado pelas Normas Internacionais
de Contabilidade do Setor Público (IPSAS), o único conjunto
de normas contábeis para o setor público emitidas por um
organismo internacional?
O artigo concentra-se no sistema de contabilidade e
relatórios financeiros, enquanto outros aspectos do modelo
de contabilidade do governo central (como orçamento e seus
relatórios, auditoria, controle de gestão) não foram
considerados, embora alguns deles tenham sido reformados
recentemente nos países selecionados. país-
tentativas3. Para comparar os casos, sua análise foi
realizada de forma homogênea, levando em consideração
os seguintes elementos, estritamente relacionados com o
tema de pesquisa do artigo:
- os processos de reforma contabilística: calendário, ferramentas
utilizadas, atores envolvidos, principais objetivos e conteúdos;
- as escolhas quanto à base dos sistemas
contabilísticos;
- os princípios e normas contábeis;
- o relato financeiro, com particular enfoque nas
demonstrações financeiras.
O método empregado, coerentemente com os
objetivos da pesquisa descritiva e exploratória, é o estudo
de caso múltiplo (Eisanhardt, 1989; Yin, 2003; Fattore,
2005). De fato, como Berry e Otley (2004: 231)
argumentam, a pesquisa baseada em casos pode fornecer
uma rica compreensão do conteúdo, processo e contexto
de um fenômeno empírico.
Esta análise é baseada tanto em documentos, quanto em
em entrevistas com funcionários-chave4. Além de litera-
3Na Itália, por exemplo, os D. Lgs. 150/2009 (conhecida como
“reforma Brunetta”) introduziu um sistema de controle de
desempenho para monitorar o desempenho individual e das
organizações.
4No caso francês, as entrevistas foram realizadas com
funcionários do Ministério do Orçamento, Contas Públicas
e Reforma do Estado; para a Itália, com funcionários que
trabalham dentro do Estado General Ac-
218 Soverchia M. / Economia Aziendale Online Vol. 3, 2 (2012) 213-228

revisão da natureza, a análise documental – voltada Em 2006, após a construção do balanço de abertura, as
principalmente para a compreensão das estruturas formais e demonstrações financeiras foram preparadas pela primeira vez de
dos processos contábeis – é baseada em documentos oficiais acordo com as regras atuais.
como demonstrações financeiras, normas e regulamentos Um dos traços distintivos da reforma francesa é o
contábeis, normas contábeis, manuais de contabilidade e chamado sistema dual: enquanto para a gestão das dotações
outros documentos de trabalho produzidos por repartições orçamentárias (o orçamento tem valor de autorização legal)
públicas. As entrevistas semiestruturadas foram utilizadas foi mantido o sistema de contabilidade de caixa realizado com
para captar elementos informais e ampliar as informações escrituração de partidas únicas, foi introduzido um sistema de
coletadas e fornecidas pelos documentos. contabilidade de competência , a fim de fornecer informações
sobre a situação financeira do Estado
5 – Análise de casos de estudo posição e desempenho5.
Os factos e transacções são registados uma
5.1 –França única vez no sistema de contabilidade
orçamental, mas graças à existência de uma
correspondência entre os dois planos de contas –
A modernização do sistema de contabilidade do governo central
o orçamental e o de relato financeiro – estes
francês foi oficializada com o estatuto constitucional sobre leis
lançamentos também alimentam o sistema de
orçamentárias de 1stagosto de 2001 (loi organique relativo aux loi
contabilidade de exercício. Assim, a
de finances–LOLF), que veio substituir as regras contabilísticas
disponibilização da informação contabilística
anteriores, adecreto orgânicon. 2/1959. A LOLF introduziu
financeira deve-se ao tratamento de dados
algumas alterações importantes e relevantes, prevendo-se uma
efectuado a nível central no final do exercício,
aplicação progressiva integralmente implementada em 2006, quer
com base na escrituração orçamental periférica
ao nível do orçamento quer do reporte financeiro. O movimento
(Mussari, 2005b: 31): por esta razão, os valores
de reforma, no entanto, tem raízes anteriores: um passo crucial
dos acréscimos nem sempre são fiáveis e por
foi o relatório do grupo de trabalho de contabilidade de exercício
vezes eles precisam ser ajustados. Tal como
apresentado em 1999 ao Ministério das Finanças (IFAC-PSC,
revelaram as entrevistas, esta vertente –
2003a).
operacional mas crucial para a fiabilidade das
A reforma contábil insere-se no esforço geral de
contas – está a melhorar: todos os anos, com
modernização do Estado iniciado no início dos anos 2000, que
base na experiência anterior de implementação,
envolve também uma reforma orçamentária e uma reforma
o sistema de informação financeira continua a
da gestão pública, baseada na introdução de medidas de
ser atualizado e desenvolvido.
desempenho. Como afirmam alguns discursos oficiais e as
A cultura contábil francesa é muito influenciada pela
entrevistas confirmam, a reforma contabilística francesa
experiência de padronização iniciada na década de 40 do
pretende contribuir para a melhoria da eficiência e
século passado (Standish, 1990). Até agora, as regras
transparência do Estado, tornando a contabilidade um vector
estabelecem que todas as empresas e entidades públicas
de informação, portanto, uma ferramenta de decisão e de
organizem seu sistema contábil com base no Plano de
monitorização. É por isso que esta reforma parece ser
Contas francês (Plano Comptable Geral) que se adapta às
apoiada pelos políticos – é uma reforma política com iniciativa
especificidades e necessidades de informação dos
parlamentar e acompanhamento atento da sua
diferentes tipos de organizações a que se refere de
implementação – vista como um instrumento essencial para a
tempos a tempos. Para organizações públicas, esses
modernização do Estado: isso decorre também da
ajustes ocorrem com regulamentações governamentais:
constituição de um Ministro específico, o Ministro da
por exemplo M21 para hospitais e outros órgãos públicos
Orçamento, Contas Públicas e Reforma do Estado, em 2009.
de saúde e M14 para Municípios (IFAC-PSC, 2003a).
O processo de reforma contabilística assenta na introdução
Os princípios e normas contabilísticas são fixados
de um relato financeiro baseado no regime de competência, com
pelo Estado: o artigo 30.º da LOLF prevê a constituição
o objetivo de tornar a informação financeira mais fiável e
de umaComitê de Normas de Contabilidade Pública,
transparente, de fornecer ao Parlamento e a todos os
nomeado em 2002 e junto do Ministro do Orçamento,
stakeholders do governo central uma melhor informação sobre o
Contas Públicas e Reforma da Administração Central. A
consumo de recursos públicos (Chevauchez, 2002: 285-304 ). As
composição da comissão é regulamentada por lei: oito
entrevistas esclarecidas como importantes estímulos têm sido
membros são indicados por três anos pelo Ministério
também a procura de um melhor conhecimento dos ativos e
do Orçamento e os outros treze são membros da lei
stocks, que suportem uma melhor gestão, e de um conhecimento
(como o diretor de
mais apurado das responsabilidades acumuladas e dos encargos
potenciais, permitindo avaliar a sustentabilidade das finanças
públicas. 5“O sistema de contabilidade pública geral é baseado no
princípio do regime de competência [...]. As regras aplicáveis
à contabilidade pública apenas diferem das aplicáveis às
departamento de contagem; para o caso da UE, com funcionários sociedades pela natureza específica da actuação das
trabalhando dentro da DG Orçamento da CE. administrações públicas” (LOLF, art. 30.º).
 Soverchia M. / Economia Aziendale Online Vol. 3, 2 (2012) 213-228
Orçamento, o director do Tesouro, um membro do Tribunal
de Contas, etc.). O comitê de normas tem a missão de
formular pareceres sobre rascunhos de exposição
apresentados pelos gabinetes do Ministro do Orçamento6.
Esta comissão aprovou dezesseisNormas de
Contabilidade do Governo Centralaté agora, emitido pelo
Ministério da Economia francês (Biondi, 2012; Ministère
du Budget, des Comptes Publics et de la Réforme de
l'État, 2012). Além disso, também umEstrutura Conceitual
para Contabilidade do Governo Centralfoi emitido,
elaborado com especial referência aos padrões do Plano
de Contas Francês, IPSAS e IASB, ainda que algumas
soluções originais possam ser necessárias para melhor
medir e representar algumas especificidades do governo
central, como aconteceu, por exemplo, para o Excedente/
Declaração de Déficit (Veja abaixo).
As dezesseis normas contábeis do governo
central têm uma estrutura homogênea que
inclui:
- uma introdução, que explica o padrão, quaisquer
características específicas do governo central na
área em consideração, as escolhas contábeis e
como o padrão se compara a outros padrões de
referência (IPSAS, IAS/IFRS);
- o corpo padrão com uma estrutura de quatro partes:
escopo, tratamento contábil, avaliação e requisitos
de divulgação para mostrar nas notas;
- alguns exemplos ilustrando como a norma se
encaixa no contexto legal e financeiro.
Conforme estabelecido na norma contábil 1, as
contas gerais do governo central francês são
compostas por vários documentos, de acordo com a
prática comercial internacional.
Em primeiro lugar o cbalanço patrimonial do governo
interno: a demonstração do patrimônio líquido/patrimônio.
Apresentado em forma de lista, ele mostra todos os ativos, que
são uma lista de itens do balanço com valor econômico positivo
para o governo central (ativos fixos, ativos circulantes, acréscimos
e receitas diferidas do exercício), e passivos, que são obrigações
para com outras entidades reconhecidas na data de relato
(incluem provisões para riscos e responsabilidades, dívidas
financeiras, dívidas não financeiras, outras responsabilidades,
acréscimos e gastos diferidos do exercício). Além disso, a
demonstração do patrimônio líquido/patrimônio líquido mostra
itens de caixa separados em ambos os lados do ativo e do passivo
e um “patrimônio líquido
conjuntos/equity” como um item de linha7.
6UMAComitê de Interpretação das Normas de Contabilidade
Públicatambém foi criado em 2004: de fato, às vezes a
implantação das normas contábeis necessita de um processo
de interpretação, pois novos itens, desconhecidos quando da
adoção da norma, podem gerar questionamentos e dúvidas
na implantação.
7Anorma contábil I.1 aponta que não pode ser
comparada ao patrimônio líquido de uma empresa,
219
Então odeclaração de superávit/déficit do governo
central, incluindo todas as despesas e receitas do ano,
divide-se em três partes:
- entãodeclaração de despesas, que mostra o valor total
das despesas líquidas não cobertas pelas receitas das
atividades correspondentes; nesta demonstração, os
números são divididos em três grupos principais:
a) despesas operacionais líquidas (demonstradas com
base na sua natureza, como despesas com pessoal,
compras, amortizações) e provenientes da
diferença com receitas operacionais (como vendas
de bens e serviços);
b) Despesas líquidas de intervenção (indicadas
por beneficiário, tais como transferências a
empresas, autarquias, etc.);
c) despesas financeiras líquidas (tais como juros e
perdas cambiais e ganhos em transações
financeiras);
- adeclaração de receitas líquidas soberanas, estruturado
por categorias (impostos e outras receitas soberanas),
evidenciando as receitas decorrentes do exercício dos
poderes da administração central, sem contrapartida
direta equivalente para outras partes;
- adeclaração de superávit/déficit operacional líquido para
o período, que mostra a diferença entre as despesas
líquidas e as receitas soberanas líquidas decorrentes das
duas partes do documento acima mencionadas. Neste
caso, a norma 1 não segue nem o Plano de Contas
Francês, nem IAS 1 e 7, IP-SAS 1 e 2, sugerindo uma solução
original. A estrutura detalhada desse demonstrativo
realmente aponta para uma das mais importantes
peculiaridades gerenciais do governo central. Despesas e
receitas não estão conectadas, ao contrário do que ocorre nas
empresas com fins lucrativos: o consumo de recursos
relacionados aos serviços prestados não tem um valor
correspondente devido, uma vez que as receitas públicas têm
natureza majoritariamente tributária, especialmente nos
governos centrais.
odemonstrativo de fluxo de caixaapresenta
entradas e saídas relativas a ativos e passivos do
exercício e classifica-os por categorias:
- os fluxos de caixa das atividades operacionais, que
correspondem aos recebimentos e pagamentos
vinculados a transações e intervenções (exceto
investimentos) e outros recebimentos e pagamentos que
possam ser vinculados à atividade operacional, como os
fluxos de caixa correspondentes a despesas e receitas
financeiras;
- fluxos de caixa de transações de investimento, que
correspondem a recebimentos e pagamentos
decorrentes da aquisição e alienação de ativos fixos;
- fluxos de caixa de operações de financiamento, que
correspondem a recebimentos e pagamentos relativos a
já que não há capital inicial ou algo equivalente a
ele.
220 Soverchia M. / Economia Aziendale Online Vol. 3, 2 (2012) 213-228
operações de financiamento externo do governo
central.
Como de costume, onotas às demonstrações financeiras
fornecer informações úteis para ler e entender os itens
principais, como dados sobre despesas relatadas por função
e ministros. Além disso, devido ao sistema dual, as notas
incluem tabelas de transição para identificar as diferenças
entre contas orçamentárias baseadas em caixa e
demonstrações financeiras baseadas em competência.
5.2 –Itália
O processo de reforma da gestão financeira empreendido
pelo governo central italiano concentrou-se
predominantemente no orçamento e – como um país de
direito civil – ocorreu por lei. A reforma contabilística iniciada
em 1997 manteve o sistema tradicional de contabilidade de
caixa, utilizando o regime de caixa em conjugação com o
regime de compromisso (conforme confirmado pela Lei
196/2009, relativa à contabilidade e finanças públicas). Sem
introduzir um regime de competência compulsório
sistema de contagem8, foi implementado um sistema de
contabilidade analítica, com base nas medições de custos a
remeter para os centros de custos, de forma a obter
informação sobre os recursos públicos empregados pelos
diferentes departamentos e unidades e, ainda, utilizar essa
informação para apoiar o processo de orçamentação (Pavan e
Reginato, 2005).
Este sistema de contabilidade, que entrou em vigor em
2000, baseia-se em:
- um plano de contas;
- um mapa de centros de custo, decorrente de centros de
responsabilidade em que se divide cada unidade organizacional,
de forma coerente com a estrutura orçamentária;
- um gráfico de serviços prestados;
- um manual de princípios e regras contábeis,
fornecendo instruções operacionais (Secretaria de
Contabilidade Geral do Estado, 2008).
Este sistema de contabilidade analítica (não são
consideradas receitas) destina-se a apoiar a elaboração
de um orçamento de especialização estruturado em
centros de custo, derivado do orçamento de caixa legal.
Nela constam os objetivos a atingir em termos de funções
a desempenhar e serviços e atividades a desenvolver,
através da afetação de recursos humanos, financeiros e
instrumentais e de objetivos aos gestores responsáveis
pelas diversas unidades orgânicas. Mas a alocação de
recursos é realizada com o tradicional regime de caixa
orçamento, o único que tem valor legal9: o orçamento de
competência é uma “ferramenta de conhecimento”, derivada do
8A Lei 196/2009 prevê a possibilidade de implementar um regime
de contabilidade de exercício apenas para “objectivos de
conhecimento” (art. 2º).
9ALei 196/2009 define uma nova classificação da
despesa, baseada em missões e programas, rubricas
sobre as quais o Parlamento é chamado a votar.
orçamento baseado em caixa, e pelas entrevistas é compreensível
que em alguns Departamentos seja visto mais como um fardo
burocrático do que uma ferramenta útil de gestão.
O registo contabilístico dos custos é feito
semestralmente, de acordo com o princípio da
contabilidade de exercício “que toma como referência
o custo, ou seja, o consumo real dos recursos – bens e
serviços – e não os encargos, que representam o
desembolso de caixa relacionado com a sua
aquisição” (Estado Departamento de Contabilidade
Geral, 2008: 7). Esses custos não decorrem do sistema
de contabilidade financeira baseado em partidas
dobradas, mas sim do regime de caixa, com ajustes de
sistema extracontábil, e não são utilizados para a
elaboração das demonstrações financeiras.
Dado que o governo italiano não possui um sistema de
contabilidade financeira baseado no regime de competência, ele
não emitiu normas contábeis relacionadas a relatórios financeiros.
Os princípios gerais de contabilidade são estabelecidos pela
Constituição e outras leis, mas dizem respeito substancialmente
apenas ao orçamento.
O relatório anual italiano é composto por duas
demonstrações principais: além da conta
orçamentária, baseada em caixa e contabilidade de
caixa modificada (imagem espelhada do
orçamento), também é elaborado o balanço. Dá
informação sobre a posição financeira do Estado
resultante no final do ano, destacando as variações
nos bens de capital e no capital próprio. Esta
demonstração mostra os ativos e passivos do
governo: a estrutura, prevista em lei (D. Lgs.
279/1997 e Decreto Interministeriale 18 de abril de
2002) e dividida em classes, é coerente com o
sistema SEC 95. A classificação de ativos é mais
detalhada que a de passivos (somente passivos
financeiros): fornece ativos financeiros (dinheiro,
créditos), “ativos não financeiros produzidos” (como
edifícios, estoques, patrimônio histórico e artístico,
Em seguida, o relatório anual inclui tabelas de transição
para clarificar a ligação entre os resultados da contabilidade
de caixa e o balanço final e, desde 2007, a correspondência
entre a contabilidade de caixa e a contabilidade de custos,
mostrando os pontos integradores e retificadores, conforme
afirma D. Lgs. 279/1997, arts. 11.
Não é fornecido nenhum documento que demonstre o
desempenho financeiro e os resultados do período.
Apesar dos esforços, a mensuração e divulgação de
ativos e passivos italianos parecem ainda não ser suficientes:
além dos problemas relativos às regras de avaliação e
requisitos de representação financeira para todas as
entidades do setor público (por exemplo, sobre ativos de
capital), o principal elemento negativo é que os números
apresentados no balanço não derivam de uma sistemática
escrituração, mas de registro de inventário10. este
10Além disso, faltam alguns itens importantes,
como provisões e provisões de receitas e despesas
diferidas do exercício, riscos e despesas.
 Soverchia M. / Economia Aziendale Online Vol. 3, 2 (2012) 213-228
facto suscita dúvidas quanto à fiabilidade dos números, como
refere o Tribunal de Contas (Tribunal de Contas, 2009), e
obriga por vezes a uma simplificação extrema: pensem nas
amortizações, introduzidas apenas a partir de 2000.
Actualmente, o balanço é elaborado com dados estatísticos e
pretende-se mais como um instrumento de monitorização
das responsabilidades dos particulares pelos diversos activos
e passivos, do que como um instrumento de medição,
representação e valorização do património do Estado.
Em suma, o orçamento de caixa tradicional parece
ser o documento mais importante até agora, primeiro
para os políticos, quanto à função de alocação de seus
recursos. As entrevistas confirmam o que afirmam vários
estudiosos italianos, que há muito pouco interesse pelo
relatório anual – tanto a conta do orçamento quanto o
balanço – e pela reforma contábil em geral por parte do
parlamento.
5.3 –Comissão Europeia
No processo de reforma da gestão financeira da CE iniciado
em 2000 (Comissão Europeia, 2000), encontra o seu lugar o
projecto de modernização contabilística – denominado ABAC,
contabilidade de exercício: diz respeito ao sistema
contabilístico e ao reporte financeiro, bem como à
contabilidade financeira consolidada da UE declarações. Ini-
iniciado em 2002 (Comissão Europeia, 2002)11, o programa ABAC
está concluído, ainda que a CE esteja permanentemente
trabalhando em melhorias, especialmente no que diz respeito à
infraestrutura de TI e regras contábeis. A reforma contabilística
atingiu um dos seus passos mais importantes na preparação das
contas anuais de 2005, totalmente assente no novo sistema de
contabilidade de exercício.
Como revelaram as entrevistas, houve um
importante estímulo por parte do Tribunal de Contas
Europeu e do Parlamento Europeu: esta pressão prende-
se em larga medida para proceder a uma alteração do
sistema de informação da Comissão de modo a fornecer
informação adicional. Consequentemente, a Comissão
comprometeu-se a melhorar e modernizar o seu sistema
contabilístico. Por outro lado, também houve uma
pressão indireta dos recentes desenvolvimentos na
contabilidade do setor público, já que muitos governos
nacionais (também estados membros da UE) e outras
organizações internacionais adotaram a contabilidade de
exercício e reformas gerais da gestão financeira.
Entre os principais instrumentos utilizados para a
concretização do programa ABAC figuram o Regulamento
Financeiro e as Normas de Execução, aprovados na sua “nova”
versão pelo Parlamento e pela Comissão, em que é clara a opção
pela introdução da contabilidade de exercício com base no IP-SAS
(Gray, 2006): “adoção de normas contábeis
11O caminho de repensar o modelo de contabilidade da UE
abriu-se a partir de 2000, com um estudo realizado por um
grupo de académicos, que forneceu sugestões e ideias sobre
a redefinição do relato financeiro da UE (Montesinos, 2000).
221
e métodos, o contabilista da Comissão orientar-se-á
pelas normas contabilísticas internacionalmente
aceites para o sector público, mas poderá afastar-se
delas sempre que a especificidade das Comunidades o
justifique” (art. 133.º, n.º 2, Regulamento Financeiro).
O sistema de contabilidade atual é um sistema dual:
a contabilidade de exercício foi implementada sem sair da
contabilidade de caixa, usada para gerenciar as dotações
orçamentárias. Em particular, no que diz respeito à
contabilidade orçamental, as despesas são registadas pelo
regime de caixa modificado, as receitas pelo regime de
caixa; no que se refere à contabilidade financeira, é de
competência e realizada por partidas dobradas. A
coexistência dos dois sistemas contabilísticos é possível
graças à relativa integração de software (Comissão
Europeia, 2007 e 2008).
Com base no que estabelece o Regulamento Financeiro
(art. 124), as demonstrações financeiras são elaboradas de
acordo com os princípios contábeis geralmente aceitos, que
são o princípio da continuidade, prudência, métodos
contábeis consistentes, comparabilidade da informação,
materialidade, não compensação, realidade sobre a
aparência, contabilidade baseada no regime de competência.
As Normas de Execução fornecem uma interpretação destes
princípios com referência às características e atividades
peculiares da UE (art. 186-192).
Em seguida, o Tesoureiro da CE, auxiliado por um
Comitê Consultivo para Normas Contábeis, emitiu
dezessete normas contábeis. A Comissão é composta
tanto por membros internos (como o Gabinete de
Contas da CE, um contabilista de uma agência da UE
para questões relativas à consolidação, etc.) como por
membros externos (como um representante do IFAC/
IPSASB, um professor contabilidade, etc.); o seu papel
consiste em emitir um parecer profissional
independente sobre as normas e regras contabilísticas
propostas pelo contabilista da Comissão e aconselhá-
lo sobre os princípios de relato financeiro e a aplicação
das normas (Introdução às regras contabilísticas,
ponto II.5).
Através destas regras contabilísticas – relativas às
principais rubricas das demonstrações financeiras, suas
regras de mensuração e requisitos de divulgação – a CE tem
tido em conta as atividades e peculiaridades comunitárias e:
- identificou quais IPSAS podem ser aplicadas
diretamente, sem necessidade de integração;
- detalhou e adaptou algumas IPSAS;
- criou alguns novos padrões em relação às áreas
deixado descoberto por IPSAS12.
Toda norma é dividida em parágrafos: além de
uma seção introdutória sobre os propósitos gerais da
norma contábil, palavras-chave, mensurações
12Por exemplo, a regra contábil 5 é dedicada ao pré-
financiamento, uma das peculiaridades da atividade da CE.
222 Soverchia M. / Economia Aziendale Online Vol. 3, 2 (2012) 213-228
as regras de certificação e os requisitos de divulgação são
listados; última parte é a secção das regras de referência, onde se
encontram as IP-SAS (também as não aplicáveis, com motivações
específicas), as IAS/IFRS (completando ou substituindo as IPSAS,
se as houver) e os artigos de regulamentação financeira a que o
documento se refere listados.
Os relatórios financeiros da UE incluem vários
documentos e anexos. Todas as instituições e organismos
europeus têm de elaborar demonstrações financeiras com
base nas regras contabilísticas acima mencionadas, para além
das contas orçamentais.
Nobalanço patrimonial, elaborados em forma de lista,
tanto o ativo quanto o passivo são divididos entre circulantes
e não circulantes: sua soma algébrica permite determinar o
patrimônio líquido. Esta rubrica inclui, para além do resultado
económico do exercício (excedente ou défice), algumas
reservas – também a de aplicação do justo valor – e
os montantes a serem cobrados dos Estados membros13.
oconta de resultados económicos, também elaborada
em forma de lista, contém as receitas e despesas
operacionais: as primeiras se dividem em receitas de recursos
próprios e de contribuições e outras receitas operacionais, as
segundas em despesas administrativas e despesas
operacionais. Em seguida, calcula-se o resultado econômico
do exercício somando-se o superávit das atividades
operacionais, receitas e despesas financeiras, movimentação
do passivo de benefícios a empregados e participação no
superávit líquido (déficit) das coligadas e joint ventures.
Embora não haja peculiaridades quanto à declaração de
mudanças nos ativos líquidos–de acordo com os requisitos do
IP-SAS - com referência atabela de fluxo de caixa A CE
emprega o método indireto, apesar do IPSASB recomendar a
aplicação do método direto. As operações são agrupadas em
três áreas: atividades operacionais, aumentos/diminuições de
responsabilidades com benefícios a empregados e atividades
de investimento.
Então,as notas às demonstrações financeiras
fornecer informações analíticas e integrativas sobre o
conteúdo dos itens contábeis nas declarações acima
mencionadas, incluindo informações adicionais prescritas
pela prática contábil internacionalmente aceita, quando
tal informação for relevante para as atividades da CE (Fi-
13O património líquido resultante das demonstrações financeiras
consolidadas da UE de 2010 tem um valor negativo, oposto ao
resultado económico positivo, devido a peculiaridades específicas
das actividades da UE, no que se refere às relações de fundos com
os Estados membros: “Este valor representa a parte das despesas
já incorridas pelos da UE até 31 de dezembro de 2010, que deve
ser financiado por orçamentos futuros. Muitas despesas são
reconhecidas de acordo com as regras de contabilidade de
exercício no ano N, embora possam ser efetivamente pagas no
ano N+1 e financiadas com o orçamento do ano N+1. A
contabilização destas responsabilidades, aliada ao facto de os
correspondentes montantes serem financiados por orçamentos
futuros, faz com que as responsabilidades superem largamente
os ativos no final do ano” (Comissão Europeia, 2011: 62).
Regulamento Financeiro, par. 126.2). Embora cada
instituição e órgão da UE tenha de elaborar
demonstrações financeiras, a CE também deve
elaborar demonstrações financeiras consolidadas
da UE compostas pelas mesmas demonstrações
acima mencionadas. A CE continua a alargar o
número de entidades da UE incluídas no processo
de consolidação e a melhorar a homogeneidade
dos dados contabilísticos, graças à introdução
progressiva do sistema ABAC em organismos cada
vez mais descentralizados (Comissão Europeia,
2007; Grossi e Soverchia, 2011). A partir de
discursos e entrevistas oficiais é compreensível que
o processo de reforma contabilística da UE, levado a
cabo principalmente pela CE e em particular pela
DG Orçamento, tenha obtido o apoio dos políticos.
Ainda que nos primeiros anos tenha sido
importante o trabalho de apoio da DG Orçamento
no sentido de explicar (especialmente aos
parlamentares) algum aspecto técnico,
6 – Discussão dos achados: análise
comparativa
Referindo-se aos processos de reforma da gestão financeira, este
documento presta atenção especial ao sistema de contabilidade e
reformas de relatórios financeiros recentemente realizadas na
França, Itália e na CE. Eles são mais ou menos contemporâneos: a
tabela 1 mostra o ano formal de início, mesmo que os processos
de mudança muitas vezes tenham origens mais distantes.
Em relação aos seus objetivos, em termos de
«resultados mínimos» podem considerar-se
alcançados, ainda que em alguns casos poucos
aspetos tenham de ser melhorados: por
exemplo, quanto à CE, nem todas as agências
descentralizadas migraram para o sistema ABAC,
também como contas do Fundo Europeu de
Desenvolvimento. Como países de direito civil –
também pode ser incluída a UE, considerando
que seu sistema administrativo é muito
influenciado pela cultura administrativa francesa
por razões históricas – os processos começaram
e foram regulados por lei e normas
administrativas. Quanto aos sistemas de
contabilidade, os casos analisados mostram que
a França e a CE optaram por introduzir um
sistema de contabilidade de exercício, enquanto
a Itália se encontra numa situação diferente e
parece afastar-se das tendências internacionais
(tabela 2). Na realidade,
não alimentar o processo de preparação do balanço14.
14Sistemas de contabilidade gerencial também existem
em outros países analisados, mas não são citados por
estarem fora dos objetivos do trabalho.
 Soverchia M. / Economia Aziendale Online Vol. 3, 2 (2012) 213-228 223

Quadro 1 – Processos de reforma contabilística e de reporte financeiro

França Itália CE
relatórios financeiros baseados contabilidade de custos para apoiar relatórios financeiros baseados em
Objetivo
na contabilidade de exercício processo orçamentário contabilidade de exercício

Começar 2001 2000 2000

Situação atual concluído concluído concluído
- lei (Estatuto - lei (L. 94/1997, D. Lgs. - Direito (Regulamento Financeiro
Ferramentas Constitucional 2001) 279/1997, L. 196/2009 e Normas de Execução)
- normas de contabilidade e normas ministeriais) - normas de contabilidade

- Ministro da Economia
- Ministro de finanças - Orçamento da DG da CE
e Finanças
atores - Comitê de Normas de - Normas Contábeis
- Secretaria Estadual de
Contabilidade Pública Comitê
Contabilidade

Quadro 2 – Base dos sistemas contabilísticos

França Itália CE

x x
Contabilidade de caixa x
(receitas) (receitas)
x x
Contabilidade de caixa modificada x
(despesas) (despesas)
x
Contabilidade de competência - x
(decorrente da contabilidade orçamentária)

Por esta razão, o sistema de contabilidade italiano tem sido
submetido a algumas críticas. As inovações contábeis
introduzidas nos últimos anos estão voltadas para a
mensuração dos custos, ignorando completamente a
evolução das receitas, não decorrendo de uma escrituração
por partidas dobradas – que deveria ser sua fonte “natural”
de dados – mas de um regime de caixa e de caixa modificado,
baseado em no método de entrada única: esta pode ser a
fonte de falta de dados e baixa confiabilidade (Pavan e
Reginato, 2005: 72).
Também em França, a informação patrimonial deriva da
contabilidade orçamental mas é diferente, porque este
processo é realizado por uma ferramenta de informação
integrada e alimenta e adapta-se à elaboração das
demonstrações financeiras.
A escolha do sistema dual é outro elemento que define as
reformas contabilísticas francesa e comunitária: caracteriza-se
pela manutenção da contabilidade de caixa juntamente com a
contabilidade de exercício. Isso provavelmente se deve tanto a
uma introdução mais gradual dessas mudanças contábeis – pelo
projeto de transição de custos e pela tradição histórica e hábitos
do pessoal administrativo em lidar com a contabilidade de caixa
(IFAC-PSC, 2003b) – quanto por peculiaridades do governo central
e da CE atividades, em sua maioria constituídas por transações de
fundos.
Os princípios contábeis desempenham um papel importante entre as
ferramentas utilizadas para realizar o projeto de reforma contábil.
processos. As Tabelas 3 e 4 resumem e comparam os casos
analisados: excluindo a Itália pelas razões acima, alguns
pontos de encontro podem ser percebidos.
Quanto aos princípios gerais de contabilidade, eles não
coincidem perfeitamente, mas há muitas analogias: tanto a
França quanto a CE fazem uma lista deles, referindo-se
diretamente aos principais pressupostos em que se baseiam
tanto o modelo IASB quanto o modelo IPSAS (como
continuidade , contabilidade de exercício e consistência, bem
como a alguns dos pressupostos de importância secundária).
A lista elaborada pelo French Conceptual
Framework é aberta, não necessariamente exaustiva:
“abrange os princípios que parecem ser comuns a
todas as normas de contabilidade empresarial. O
facto de um princípio não ser mencionado não
significa que não se considere aplicável ao governo
central” (Estrutura Conceitual, par. III.1).
No que diz respeito às normas contabilísticas, a
França e a CE optaram por emitir normas contabilísticas
especialmente dedicadas ao relato financeiro do Estado.
Em ambos os casos, é evidente que essas normas têm as
IPSAS como principal referência, ainda que a posição da
CE pareça mais forte: enquanto a França aponta o plano
de contas francês em primeiro lugar, a CE reconhece
diretamente a autoridade das IPSAS, conforme
estabelecido pelo Financial Regulamento.
224 Soverchia M. / Economia Aziendale Online Vol. 3, 2 (2012) 213-228

Tabela 3 – Princípios contábeis

França CE
(Estrutura Conceitual) (Regulamento Financeiro e Normas de Execução)
- Observância - Base de Continuidade
- Representação fiel - Prudência
- Visão Verdadeira e Justa 15 - Métodos contábeis consistentes
- Regime de competência
- Comparabilidade de informações
- Base de Continuidade - Materialidade
- Consistência dos Métodos - Sem rede
- Qualidade da Informação: - Realidade acima da aparência
- Compreensibilidade - Contabilidade por competência
- Relevância
- Confiabilidade (neutra,
prudente e completa)

Tabela 4 – Padrões contábeis de relatórios financeiros

França CE
Normas de Contabilidade do Governo Central Regras Contábeis
Estrutura Conceitual para Contabilidade do Governo
Introdução
Central
1. Demonstrações Financeiras 1. Contabilidade do Grupo

2. Despesas 2. Demonstrações Financeiras

3. Receitas soberanas 3. Despesas e contas a pagar

4. Receitas Operacionais, Receitas de Intervenções e
4. Receita de Operações de Câmbio
Receitas Financeiras
5. Ativos Intangíveis 5. Pré-financiamento

6. Ativos tangíveis 6. Ativos fixos intangíveis

7. Ativos Financeiros 7. Ativos fixos tangíveis
8. Inventários 8. Locações

9. Contas a receber correntes 9. Estoque

10. Componentes da posição de caixa do governo central 10. Provisões, Ativos e Passivos Contingentes
11. Dívidas Financeiras e Instrumentos Financeiros Derivados 11. Ativos e Passivos Financeiros
12. Provisões para Riscos e Passivos, Passivos Não
12. Benefícios dos Empregados
Financeiros e Outros Passivos
13. Compromissos a Divulgar nas Notas Explicativas às
13. Conversão de Moeda Estrangeira
Demonstrações Financeiras

14. Políticas Contábeis, Mudanças nas Estimativas 14. Resultado Econômico do Ano, Erros
Contábeis e Erros Fundamentais e Mudanças nas Políticas Contábeis
15. Eventos Após a Data do Relatório 15. Divulgação de Partes Relacionadas

16. Apresentação da Informação Orçamentária nas

16. Relatórios de segmentos
Contas Anuais
17. Receita de Transações Não Cambiais (impostos
e Transferências)

15 “As normas e procedimentos em vigor são aplicados de forma a proporcionar umaRepresentação fieldo conhecimento que os
responsáveis pela elaboração das demonstrações financeiras têm da substância e materialidade dos eventos registrados nas
demonstrações”. Por outro lado,visão verdadeira e justanão é definido diretamente: “A legislação francesa e europeia estipula
que quando a aplicação de uma norma contabilística não é suficiente para proporcionar uma imagem verdadeira e apropriada,
deve ser prestada informação adicional nas notas às demonstrações financeiras. Além disso, em circunstâncias excepcionais, se
a aplicação de uma regra não fornecer uma imagem verdadeira e justa, deve haver um desvio da regra. Tais desvios devem ser
mencionados e explicados nas notas com informação sobre o seu impacto nas demonstrações financeiras” (Estrutura Conceitual,
par. III.1).
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No que se refere ao relato financeiro, o único documento
comum entre os casos analisados é o balanço. Além da
situação peculiar italiana, alguns elementos de
convergência se colocam entre a França e a CE: elas
também elaboram o demonstrativo de desempenho
financeiro, o demonstrativo de fluxos de caixa e as notas,
enquanto apenas a EC elabora o demonstrativo de
mudanças no patrimônio e o consolidado financeiro
declaração (tabela 5).
Claro que as declarações não são as mesmas, nem na
estrutura nem na denominação, devido à liberdade que as
IPSAS permitem neste campo. Com referência ao balanço, as
demonstrações são bastante semelhantes, enquanto as
demonstrações de desempenho financeiro têm muito mais
distinções (a Itália não tem nenhuma), principalmente
preocupadas com o grau de informação detalhada.
No entanto, em alguns casos, os pontos de contato são
apenas formais, referidos à representação nos documentos. Com
efeito, diferentes linhas de comportamento são adotadas em
relação às regras de mensuração de ativos – por exemplo, ativos
patrimoniais, ativos militares e ativos de infraestrutura – que são
alguns dos aspectos críticos mais importantes e intimamente
relacionados à pecuária das atividades do governo central.
Tabela 5 – Demonstrações Financeiras
França
Demonstração do Patrimônio Líquido/Patrimônio
Declaração de superávit/déficit
Demonstração do Fluxo de Caixa
Notas às Demonstrações Financeiras
7. Conclusão
Este artigo examina o sistema de contabilidade e
relatórios financeiros do governo central de dois
países – França e Itália – e uma instituição
supranacional, a CE.
A semelhança administrativa entre a França e a Itália
parece não se refletir nos processos de reforma contabilística
realizados e nos seus relatórios financeiros. A França optou
por seguir as tendências internacionais implementando um
sistema de contabilidade de regime de competência,
enquanto na Itália o sistema de contabilidade ainda se dedica
principalmente ao monitoramento da execução orçamentária:
não fornece dados para a apresentação da posição financeira
e do desempenho do governo. O principal ponto crítico não é
tanto a escolha de não implementar a contabilidade de
exercício, mas diz respeito à introdução da contabilidade de
custos com base na contabilidade de caixa tradicional: daí as
contas anuais incompletas.
Mais semelhanças entre a França e a CE surgiram,
tanto para a escolha do sistema dual - mesmo que
225
mentiras. Só para dar alguns exemplos, em
França o valor do sistema rodoviário nacional
baseia-se no seu custo de reconstrução e na
valorização do custo de reparação do desgaste
das infraestruturas que o compõem; enquanto
na Itália a avaliação das estradas é baseada no
custo histórico. Então, no balanço francês, as
florestas são avaliadas a um custo simbólico ou
arbitrário não revisável; no italiano são
valorizados descontando-se os rendimentos
futuros derivados da sua utilização: isto significa
que muitos deles não são valorizados de todo,
porque grande parte das florestas existentes não
são utilizadas por razões económicas. Quanto às
responsabilidades com pensões, nas contas
francesas são apresentadas nas notas, como
compromissos extrapatrimoniais; na Itália, esse
item não é relatado; quanto à CE,
Essas diferenças influenciam diretamente a valoração e
apresentação dos ativos e passivos públicos, em seu sentido
mais amplo (também quanto à equidade intergeracional),
reduzindo a comparabilidade.
Itália CE
Balanço patrimonial Balanço patrimonial
Anexos Conta de Resultados Económicos
Tabela de fluxo de caixa
Demonstração das Alterações nos Ativos Líquidos
Notas às Demonstrações Financeiras
Demonstrações Financeiras Consolidadas da UE
realizados tecnicamente de diferentes maneiras – e para a
composição dos relatórios financeiros. No entanto, não existe uma
homogeneidade de vocabulário técnico: mas é sabido que o
emprego de diferentes vocábulos muitas vezes advém de
conceitos contabilísticos divergentes, como aponta Jones (2007:
91). Além disso, também existem algumas diferenças em nível
substancial: regras de mensuração adotadas divergentes
decorrentes de diferentes padrões contábeis e também diferentes
fases de cumprimento do processo de reforma. A aplicação da
contabilidade de competência completa é um processo longo e
muito caro para organizações públicas amplas e complexas como
os governos centrais.
Não parece identificável uma influência particular da UE
nas reformas contabilísticas levadas a cabo pelos Estados-
membros europeus analisados. Muitas semelhanças entre a
CE e a França aparecem, além dos processos contemporâneos
de reforma contábil: isso provavelmente se deve à
semelhança da cultura administrativa, decorrente de razões
históricas. Mas eles também fizeram escolhas diferentes, já
que na França a tradição contábil nacional é forte e o principal
ponto de referência na definição de padrões é o Plano de
Contas francês.
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As IPSAS não têm ainda a mesma importância que as
IFRS, uma vez que a adoção destas normas contabilísticas
não é obrigatória para as entidades públicas europeias.
No entanto, sua autoridade de influência parece ser
confirmada por sua adoção pela CE, que indiretamente
apóia o uso das IPSAS pelos membros da UE
Estados-Membros com o seu Regulamento Financeiro16.
Ainda não está claro se a informação de competência é
considerada realmente usada onde o orçamento ainda é
baseado em caixa: neste ponto, os resultados das entrevistas
são bastante vagos, o ponto comum entre os entrevistados
franceses e da CE é que esses processos são complexos e
implicam muito tempo, poucos anos é um período muito
curto para avaliar seu impacto nos processos decisórios
políticos e gerenciais. Este é um ponto crucial para pesquisas
futuras.
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elas também foram adotadas por algumas organizações
públicas supranacionais-internacionais, como a OCDE, a
OTAN (que já possui um relatório financeiro baseado em
IPSAS) e as Nações Unidas (que começaram a atualizar
seus processos contábeis e espera-se que produza um
relatório financeiro compatível com IPSAS em 2010).
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