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Respostas às perguntas relativas à Palestra sobre Gestão de Crises e Comunicação. Prof.

João
José Forni

Cauê Calazans luz


Pergunta: Boa noite! Professor primeiramente obrigado pela oportunidade aprender um pouco
mais. Gostaria de saber o seu ponto de vista quanto ao principal erro na tratativa da crise da
saúde mundial que estamos vivendo. Aparentemente nem o Brasil, nem os EUA e nenhum outro
país do mundo se preparou adequadamente para uma situação como essa que é de baixa

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probabilidade porém de grande impacto.

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Resposta: Cauê. Desde março de 2020, tenho falado muito sobre essa crise. Primeiro, é bom
nós contextualizarmos as várias crises que estamos enfrentando: a sanitária, a política e a

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econômica, Todas imbricadas. O surgimento do coronavírus – e a consequente propagação pelo
mundo – primeiro, assinala uma grande falha da China em cedo perceber a gravidade e

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letalidade do vírus, fechando suas fronteiras e alertando o mundo: ninguém entra e ninguém
sai. E assim, especulamos, poderia a crise ter sido pelo menos contida na China e arredores. O
que aconteceu? A China minimizou o potencial do vírus, silenciando e até prendendo o médico
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que tentava alertar: no hospital, detectamos um novo tipo de vírus. É preciso cuidado para não
contaminar mais etc. etc. Ele foi monitorado, perseguido e preso. Com isso o vírus acabou saindo
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das fronteiras e foi parar na Itália, país europeu que primeiro começou a ter uma contaminação
em massa.
Se por outro lado, a ciência foi muito rápida em primeiro fazer o sequenciamento do vírus e
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descobrir uma vacina, já falei também que de certo modo nos decepcionamos com a ciência por
não ter percebido logo lá no início do ano de 2020 o potencial de contágio desse vírus, alertando
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os países para fecharem as fronteiras. Demorou muito a que a OMS decretasse a existência de
uma pandemia (meados de março). Foi outro erro. Minimizar a crise, lentidão no diagnóstico e
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omissão em tomar as ações de isolamento total e restrições de viagens foram os grandes erros
que os países desenvolvidos e os órgãos de saúde cometeram. São características de crises mal
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administradas.
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O caso do Brasil é muito particular: negacionismo, demora em ações de isolamento e máscaras;


falta de kits de testes pra testagem em massa; falta de uma liderança e comando no nível
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nacional; disputas políticas que se perpetuam até hoje; falta de continuidade no ministério da
saúde (4 ministros em um ano); tudo isso, combinado com uma divisão da população, de um
lado os que seguem os protocolos de cuidados e, de outro, os que seguindo o que o governo

federal faz, desdenham das medidas de proteção e são os maiores propagadores do vírus nas
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capitais e no interior. As empresas, em geral, fizeram o que lhes foi permitido, mas algumas se
saíram melhor: aquelas que tiveram dignidade para falar com os empregados, expor a situação
e adotar medidas em conjunto, até mesmo demissões. Que foram honestas com seus públicos.
Entenderam o cenário e, apesar de fechadas, souberam trabalhar seus públicos.
Os países que se saíram bem nessa crise, com mais rapidez voltando à normalidade, eles
cumpriram os protocolos de lockdown verdadeiro (fecha tudo por tanto tempo), tiveram líderes
que assumiram a condução da crise, e o povo, até por herança cultural, obedeceu ao líder e
colaborou. Até porque as multas eram pesadas. Esses estão saindo mais rápido da crise.
Laudeir Rosa Alves
Pergunta: A grosso modo, prever crise seria ter uma visão pessimista das atividades da
empresa?

Resposta: De modo algum. Eu não diria prever crises, porque a empresa não planeja
determinada crise. Ela deve se preparar, ter todos os elementos para estar preparada, se a crise
chegar, não importa a natureza da crise Seria inconcebível, por exemplo, uma empresa aérea
que não treinasse os tripulantes para situações de pouso forçado, pouso na água, incêndio,
contaminação do ar, sequestro, etc. São situações que podem acontecer com um avião. A
empresa, então, deve saber o que provoca crise, e saber o que fazer naquele momento, com um
mínimo de risco para os clientes e os empregados. A vida sempre em primeiro lugar.
Eu diria que essa empresa é realista e não aventureira. É como se vc fosse fazer uma viagem ao

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exterior e não imaginar, não considerar que você pode perder os documentos; ser assaltado;

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greves nos transportes locais; atentados, até mesmo. Tudo isso deve ser considerado. Seu cartão
pode ser clonado e vc ficar sem cartão de crédito. E até acidentes pessoais, que acontecem
muito com quem viaja para o exterior.

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Gabriel Cardoso Santiago

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Pergunta: Qual a limitação ao ter um equipe de gestão de crise muito grande?
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Resposta: Os teóricos de gestão de crises são unânimes em não recomendar equipes grandes
para fazer o gerenciamento, sob o risco de não funcionar. O Comitê de Crise deve ter no máximo
12 a 15 pessoas. Mais do que isso atrapalha a solução da crise. Esse grupo deve ser muito bem
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selecionado. Porque eles irão conduzir a crise. Quanto maior uma equipe, maior dispersão de
esforços e de informações. Existem áreas imprescindíveis no time de crise, como comunicação,
jurídico, segurança. Mas nem todas as áreas, apesar de importantes para a empresa, precisam
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estar no gabinete de crise. Grandes decisões são tomadas por poucas pessoas, mesmo em
governos poderosos, como EUA, Rússia, China ou Alemanha.
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Mariene Suelen de Oliveira Alquati


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Pergunta: Empresas pequenas também devem ter manual e equipe de enfrentamento a crise?
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Resposta: Dependendo do tamanho, não precisa. Eu reputo que a partir de um faturamento


superior a R$ 5 ou 10 milhões, a empresa começa a tomar corpo e precisa ter uma área de
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contingência pelo menos. Mas isso não significa que um bar, que recebe centenas de pessoas
diariamente não precise ter pessoas que irão gerenciar um eventual fato negativo, que seja
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ameaça à reputação e até mesmo à sobrevivência do negócio. Mas as médias e grandes


empresas deveriam ter uma equipe pronta, treinada e preparada para assumir uma eventual

crise corporativa. O nome nem precisa ser gabinete de crise, mas toda a empresa sabe que há
um grupo estratégico que vai estar presente num momento de crise.
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Vitor Eduardo Vieira França


Pergunta: Na Área de tecnologia, como vou mapear um cenário de crise, com experiências em
outros acontecimentos?

Resposta: Vitor, há bastante tempo a área de tecnologia é um potencial alvo de crises. Pela
natureza do negócio, do business desse pessoal. Há empresas de consultoria ou assessoria no
mercado que mapeiam potenciais danos à imagem da marca e os monitoram. Qualquer sinal,
eles disparam o alarme para que aparelhos com informações sensíveis sejam apagadas.

Há muitos casos de crises que começam na área de tecnologia, até mesmo vazamentos de
informações confidenciais; invasões do sistema da empresa; empregados que invadiram os
aparelhos de outras áreas. A melhor forma de mapear é ter equipes de monitoramento, analisar,
junto com a área de Risk Management, os avanços da empresa para 2021. E, a partir daí, analisar
com a equipe o que poderia ser pavio para uma nova crise. Listar as principais crises acontecidas
com outras empresas, como cyberataques, alagamentos, incêndios, invasão dos sistemas,
interferência de terceiros, etc. e ver se está preparado para determinada crise. Só assim se
constrói um mapa de risco e se pensa no que faria no caso daquela crise.

Fabiana Gonçalves Nogueira Vilela


Pergunta: E no caso da gestão de crise em pequenas e médias empresas? Poderia comentar
mais sobre realidade, professor?

Resposta: Fabiana, desculpe a demora em responder. Crise em pequenas e médias empresas?

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Naturalmente, uma pequena ou média empresa não precisa ter uma estrutura de gestão de

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crises semelhante à de uma grande empresa. Até por questões de custo. Mas o fato de ser
pequena não quer dizer que ela não vá ter crise; ou que não deva estar preparada. Por que?
Porque às vezes uma pequena crise toma dimensões tão grandes que leva o negócio a uma crise

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maior e, no limite, a ter que fechar o estabelecimento. Há vários exemplos semelhantes. Veja o
case do Bar Quitandinha, que tem uma análise no meu site. Um bar popular, com uma grande

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clientela, que desdenhou de uma problema com uma frequentadora, esta foi para as redes
sociais e criou uma enorme crise para o negócio.
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A pequena empresa deveria no mínimo ter alguém experiente pra ser a pessoa que comandaria
uma eventual crise; alguém que conheça muito bem o negócio e conheça os empregados;
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alguém que também pudesse ser o porta-voz, sem medo da mídia; e principalmente, um
monitoramento das redes sociais, para intervir no caso de uma crise. Pode ser o consultório do
dentista; pode ser a padaria; ou uma média empresa de varejo. O que não pode é achar que não
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vai ter crise. A começar com os próprios empregados.


do

Fernanda Bernardo
Pergunta: A gestão de crise é igual à gestão de riscos, ambas podem ser feitas juntas? Ou o
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comitê deve separar momentos separados para cada um?


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Resposta: Fernanda. Desculpe a demora em responder. A gestão de riscos esta imbricada na


gestão de crises. Como falei na palestra, no passado se pensava que gestão de crises seria
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intervir na hora em que o fato negativo acontecesse. Mas não é assim. A gestão de crises no
sentido lato significa ou compreende desde a prevenção até o pós-crise, ou seja, não é em
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momentos separados, a gestão de riscos é uma parte da gestão de crises. Quando você cria um
Mapa de Riscos pra empresa, já está trabalhando com Gestão de Crise. Por isso, hoje,

principalmente, muitos livros sobre Gestão de Crises já incluem estudos sobre Gestão de Riscos.
Então, Gestão de Crise não é igual à Gestão de Riscos e nem é igual à Comunicação de Crise. Mas
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estes são partes integrantes do processo que chamamos de Gestão de Crises. Numa empresa, o
segmento de Gestão de Riscos inclui a governança, o Compliance, a Auditoria, a Controladoria,
enfim todos os órgãos que trabalham para evitar erros na empresa, incluindo, se tiver, a área de
Risk Management.

Felipe Augusto De Castro E Silva


Pergunta: Se o professor for responder perguntas no final: já ouvi falar que na usina de
Fukushima existia um planejamento de crises baseado no pior desastre nuclear do tipo que se
tinha registro, porém como o desastre de Fukushima foi pior do que qualquer um já registrado,
foi impossível mitigar problemas gravíssimos. Como definir o escopo do planejamento de crises
sem ter um histórico de acontecimentos similares?
Resposta: Felipe. O caso de Fukushima é muito interessante para estudo. Sim, eles tinham e
sempre estiveram preocupados para acidentes parecidos com o de Chernobyl, que foi um ponto
fora da curva na energia nuclear. Erro que levou ao superaquecimento do reator e à explosão,
com contaminação do ambiente em outros Continentes. Em Fukushima certamente havia todo
um treinamento para isso, como nas demais 53 usinas nucleares do Japão.

O problema de Fukushima, que aconteceu em março de 2011, como consequência do tsunami


que chegou àquela região, foi não ter feito a barreira de contenção, para evitar o alagamento
do sítio da usina. Não lembro se falei na palestra, que havia duas usinas próximas à Fukushima
Daiichi, uma delas a Fukushima Daini, ao sul, e outra a Usina de Onagawa, ao norte, próxima de
onde houve o desastre, que não tiveram problemas com a altura das ondas que invadiram a
Fukushima Daiichi. Por que? Porque fizeram o dever de casa, construindo muros de contenção

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de mais de 10 metros, como recomendavam os relatórios feitos em 2008, que a Tepco,

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administradora da Usina ignorou. Conforme constatado por dois relatórios independentes.
Esse erro humano, diga-se de passagem, levou à grave crise de Fukushima, que o Japão paga até
hoje. Era possível evitar o desastre sim, tanto que até o 1o ministro japonês caiu por causa desse

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acidente, por não conseguirem explicar como permitiram isso. Nesse caso, havia estudos que
indicavam: os desastres naturais estão ficando mais violentos, mais deletérios e mais caros. O

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tsunami com aquela intensidade era previsto. Tanto que havia treinamento em escolas para
subirem para os andares de cima, no caso desses tsunamis, como recentemente mostrou a Rede
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Globo, nos 10 anos de Fukushima. Nenhum relatório de alerta pode ser menosprezado quando
se trata de gerenciamento de crises.
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Sebastião Oliveira
Pergunta: Existe um painel nacional e internacional com dados que apontam para crises em
potencial no Brasil e no mundo? Se afirmativo qual seria?
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Resposta: Sebastião. O Fórum Econômico Mundial que se realiza todo o ano na Suíça faz um
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exaustivo estudo das crises ou melhor das ameaças mundiais, todo o ano. E ele divulga esse
relatório, classificando as crises por impacto e probabilidade. Isso em nível mundial. A ONU, por
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meio da OCDE, da Unicef também monitora ameaças que poderiam gerar crises graves e emite
alertas sobre isso. Eu diria que os países não levam a sério muitas dessas ameaças... que vão dos
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desastres naturais, muitos previstos, até o Cyberataque, o terrorismo (em parte contido), a crise
dos refugiados, imigração, etc. Os países com uma cultura de prevenção como Japão, Coreia do
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Sul, Canadá, Dinamarca, Noruega, Reino Unido levam a sério esses relatórios. Infelizmente, na
América Latina não temos essa cultura. Há condições sim de mapear as principais ameaças para
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o próximo ano, por exemplo, tanto no nível sanitário, quando político, econômico e social. Mas
não temos no Brasil, com raras exceções, um organismo que esteja realmente cuidando disso.

Antonio Nabor Da Silva Junior


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Pergunta: Professor, ao lidar com uma crise institucional, o profissional de gestão de crises deve
concentrar sua atenção na imagem da instituição, o que implica priorizar a comunicação com o
público externo em detrimento da comunicação interna ou priorizar o público interno?

Resposta: Antonio. Essa é sempre uma boa pergunta, porque a maioria das empresas têm
dificuldade de lidar com o público interno. Cuidar da imagem implica também cuidar do público
interno, até porque ele é um dos principais formadores de opinião sobre a empresa. Se ele
estiver bem informado sobre a crise, o que está se fazendo, como está sendo mitigada, com
seriedade, etc. ele vai multiplicar isso, até porque a crise grave bate na autoestima do
empregado. Ele não gosta de ver sua empresa malhada na mídia ou ridicularizada pelos
concorrentes. A comunicação com o público externo, se for bem conduzida na crise, é o insumo
básico da comunicação interna. O empregado tem orgulho de ver a diretoria defendendo a
empresa na mídia e explicando, com transparência, com humildade a verdade sobre a crise.
Erros todas as empresas cometem. Falhas qualquer negócio pode ter. O que o empregado não
admite é tentar minimizar o erro e que, ao fim e ao cabo, vai bater lá na ponta, no atendimento.
Hoje a comunicação tem uma amplitude que é difícil limitar o que é interno ou externo, porque
as redes sociais democratizaram a informação para qualquer pessoa. Não precisa a grande mídia
destacar, basta que a rede social repercuta e o estrago está feito. Então, há necessidade de
contemplar os dois públicos com um discurso assertivo, claro, transparente sobre os fatos
negativos. Isso, naturalmente, sensibilizará o público interno. Não há como separar esses dois
públicos.

Obrigado a todos que perguntaram,


João José Forni

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