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SUMÁRIO
4. BIBLIOGRAFIA ............................................................................................. 39
1
1. PROGRAMA DA DISCIPLINA
1.1 Ementa
Fundamentos jurídicos da regulação econômica. Intervenção estatal no domínio
econômico. Modalidades de regulação. A reforma do aparelho do Estado e o surgimento
das agências reguladoras. Papel e natureza jurídica das agências reguladoras. Estrutura
organizacional das agências reguladoras. Características e funções regulatórias.
Mecanismos de controle dos atos regulatórios.
1.3 Objetivos
Examinar os conceitos pertinentes ao Direito Regulatório, aprofundando as análises por
meio da utilização de casos concretos.
1.5 Metodologia
Adota-se a metodologia participativa, na qual as aulas ministradas visam a possibilitar a
participação ativa dos alunos não somente na construção e apreensão de conceitos
trabalhados ao longo do curso, mas também na aplicação desses conceitos às suas
atividades práticas.
Direito Regulatório
2
A noção de função reguladora, conforme ensina Diogo de Figueiredo Moreira Neto 1, “surgiu
no Direito com o sentido de harmonizar interesses em certos setores econômicos e sociais
complexos especialmente críticos”.
1
Cf. MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Mutações de direito público. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 385.
2
Marcos Juruena Villela Souto (In: Direito administrativo regulatório. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 46-
47), valendo-se dos ensinamentos de Diogo de Figueiredo Moreira Neto, explica que a autorregulação de
interesses metaindividuais tem fundamento na liberdade constitucional de associação para a proteção de
interesses lícitos (art. 5º, XVII, CF), tanto para defender os interesses individuais homogêneos dos associados
(art. 5º, XXI, CF) como para defender os interesses coletivos e difusos de uma coletividade, podendo abranger
produtores, comerciantes e consumidores em um determinado mercado. Destarte, na autorregulação, segmentos
da população, organizados na forma de associações diversas, exercem um tipo de representação da sociedade,
à medida que seus interesses difusos e coletivos são promovidos e defendidos tanto contra a ação de infratores
privados quanto contra a ação antagônica do próprio Estado (que não assume com exclusividade o controle e o
perfil do que deva entender-se por interesse público). Assim, a ordem jurídica de um país não se resumiria apenas
às normas heterorreguladoras baixadas pelo Estado, mas, também, às normas autorreguladoras produzidas por
tais entidades intermédias, classificadas como entidades públicas não estatais, legitimadas pelo art. 82, IV, do
Código de Defesa do Consumidor, ao lado do Ministério Público, das entidades políticas e das entidades e órgãos
da administração pública para a defesa dos interesses e direitos protegidos pelo Código (não sendo sequer
necessário que tal defesa seja o seu objetivo exclusivo).
3
Podem, assim, surgir modalidades compostas distintas, as quais são designadas por Diogo de Figueiredo Moreira
Neto (Op. Cit. p. 285) como: autorregulação induzida (na qual os agentes regulados são apenas
induzidos/motivados por uma fonte heterorreguladora a produzir sua própria regulação como na produção de
códigos deontológicos); autorregulação compartilhada (na qual os agentes regulados têm seu espaço decisório
próprio limitado pela imposição parcial de decisões específicas heterorreguladoras); e autorregulação dirigida,
(na qual as decisões heterorreguladoras traçam as pautas gerais que as decisões autorreguladoras preencherão
com decisões específicas). Esta última (dirigida) é a que mais se assemelha ao modelo das agências reguladoras
modernas.
Direito Regulatório
3
Por sua vez, na Europa marcada pelas ideologias estatizantes que inspiravam os Estados
do Bem-Estar Social e os Estados Socialistas (Estados interventivos), somente após o fim
da II Grande Guerra, e com o esgotamento daqueles modelos de Estados, é que foi
deflagrado o processo de desmonte dos pesados Estados interventivos 4 e de devolução de
atividades estatizadas à sociedade.
Sob essa ótica, o caminho a ser seguido era o da “desestatização” de atividades que não
satisfizessem necessidades primordiais, operando-se uma transferência da “execução”
pública para a privada, sem escapar à regulação estatal. Faz-se aqui a ressalva de que,
nos serviços públicos universais, o Estado não perde sua titularidade; apenas transfere sua
execução, sob suas normas e seu controle; a perda da titularidade só ocorre quando a Lei
ou a Constituição deixam de considerar um serviço como público, retornando à atividade
ao regime de livre iniciativa sob monitoramento estatal. Nada impede que atividades sem
compromisso de universalidade (e desde que esta seja garantida) possam ser
desempenhadas em regime de liberdade e competição.
4
Segundo Luís Roberto Barroso (Agências Reguladoras. Constituição, Transformações do Estado e Legitimidade
Democrática. Revista de Direito da Procuradoria Geral do Estado. v. 58. Rio de Janeiro, 2002, p. 202), “A quadra
final do século XX corresponde à terceira e última fase (de transformação do Estado), a pós-modernidade, que
encontra o Estado sob crítica cerrada, densamente identificado com a ideia de ineficiência, desperdício de
recursos, morosidade, burocracia e corrupção. O discurso deste novo tempo é o da desregulamentação, da
privatização e das organizações governamentais. No plano da cidadania, desenvolvem-se os direitos ditos difusos,
caracterizados pela pluralidade indeterminada de seus titulares e pela indivisibilidade de seu objeto. Neles se
inclui a proteção ao meio ambiente, ao consumidor e aos bens e valores históricos, artísticos e paisagísticos”.
Ainda segundo Barroso (Op. Cit. p. 203), no Brasil, “ao longo da década de 90, o tamanho e o papel do Estado
passaram para o centro do debate institucional. E a verdade é que o intervencionismo estatal não resistiu à onda
mundial de esvaziamento do modelo no qual o Poder Público e as entidades por ele controladas atuavam como
protagonistas do processo econômico”.
5
Expõe Juan Martin Gonzáles Moras, citado por Marcos Juruena (Op. Cit. p. 36), que o princípio da subsidiariedade
aparece como princípio político de organização social, que discute a relação indivíduo, sociedade e poder público,
de modo a responder à indagação sobre que tipo de tarefas competem ao Poder Público sem invadir a esfera de
autonomia própria dos indivíduos e das organizações sociais intermédias.
Direito Regulatório
4
Nesse sentido, a função regulatória busca alcançar o máximo de eficiência na solução dos
conflitos e problemas, conjugando-se em cada hipótese, as vantagens da flexibilidade
negocial privada com o rigor da coercitividade estatal.
6
Cf. MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Op. Cit. p. 392.
7
Cf. MOREIRA, Vital apud SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito administrativo regulatório. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2005, p. 41.
Direito Regulatório
5
Entretanto, embora a noção clássica de serviço público aparte tal atividade do regime da
livre iniciativa, deve ela ser reduzida ao mínimo de restrição de liberdade econômica, sem
sacrifício do destinatário da prestação, atendidas as condições de generalidade, eficiência
e modicidade das tarifas.
8
Na verdade, em países como o Brasil, que fazem a distinção entre serviço público e atividade econômica (art.
175, CF), exigindo um vínculo especial de delegação, a responsabilidade pela existência da atividade de
atendimento de um interesse geral é do Estado, assim assumida pela definição legal de estar-se diante de um
serviço público, sendo os títulos de vinculação atributivos de direito a concessão, a permissão e a autorização. É
essa distinção que legitima o particular a demandar o Estado a executar sua obrigação.
Direito Regulatório
6
Na ordem econômica, a atividade regulatória tem por objetivo viabilizar o princípio da livre
iniciativa e a defesa do consumidor, instituindo e preservando a competição onde ela seja
viável e minimizando os efeitos do monopólio onde ele se faça indispensável.
Daí afirmar Calixto Salomão Filho 9 que a teoria jurídica do direito concorrencial busca
garantir a instituição (concorrência) e seu efetivo desenrolar por meio de regras
comportamentais e estruturais (que são procedimentais na medida exata em que não
impõem um resultado, efeito ou comportamento, mas apenas garantem que o
relacionamento entre os concorrentes se dê de forma leal e equânime, sem prevalência de
uns sobre os outros), assegurando a possibilidade de os agentes econômicos coordenarem
suas relações da forma mais justa e eficiente.
9
Cf. SALOMÃO FILHO, Calixto apud SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito administrativo regulatório. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 41.
Direito Regulatório
7
A análise da política regulatória exigiria o exame das várias razões para regular, em
especial o fato de ser voltada para o atendimento do interesse público, de difícil definição,
mas presumindo-se ser o interesse do consumidor por preços razoáveis, práticas honestas
e segurança.
Direito Regulatório
8
10
Cf. BUSTAMANTE, Jorge Eduardo apud SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito administrativo regulatório. Rio
de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 42.
11
As regulações técnicas se referem às coisas suscetíveis de causar danos, sem imposição de barreiras à entrada
de possíveis competidores e sem o objetivo de proteger os consumidores, mas sim os fornecedores, citando-se
como exemplo o seguro de responsabilidade civil. Já as regulações operativas dispõem sobre a forma de
desenvolver atividades com potencial danoso. A implementação dessas regulações pode-se dar mediante
diretrizes específicas (ex ante) ou com um sistema de responsabilidades, que permite a conduta livre, com a
obrigação de assumir certas consequências (ex post). As regulações informativas se referem às características
dos bens oferecidos no mercado, tendo como objeto as condições de segurança. No âmbito da proteção de
consumidores, cite-se o direito à informação, à qualidade e ao controle dos bens e serviços colocados no mercado
de consumo.
12
Cf. ARAGÃO, Alexandre Santos de. Regulação da Economia: conceito e características contemporâneas. In:
Revista de Direito da Associação dos Procuradores do Novo Estado do Rio de Janeiro. v. 11. Rio de Janeiro: Lumen
Juris, 2002, p. 17-42.
Direito Regulatório
9
Nesse sentido, Tércio Sampaio Ferraz Júnior 14, ao classificar as funções regulatórias,
utiliza-se das expressões “quase-legislativas”, “quase-regulamentares” e “quase-judiciais”,
transmitindo a ideia de sua proximidade com as funções legislativa e regulamentar (em
razão das atribuições normativas), e judiciais (em razão da competência para dirimir
conflitos).
Certamente, tal proximidade não está isenta de críticas. Com efeito, Joaquim Benedito
Barbosa Gomes 15, ao tratar das agências reguladoras e de suas funções, assim introduz a
controvérsia:
sobre elas têm sido suscitados questionamentos jurídico-
constitucionais dos mais variados matizes, envolvendo desde a falta
de legitimidade democrática e de compromisso para com a
separação de poderes, que lhes seria inerente, passando pela crítica
a seu modo de atuação a ao suposto “despotismo” que elas
encarnariam, na medida em que, comandadas por técnicos e
“experts” supostamente apolíticos e equidistantes das lutas pelo
poder que se travam entre as diversas facções em que se divide o
corpo social, essas entidades (agências reguladoras) em realidade
estariam se subtraindo ao procedimento democrático de controle
13
Cf. MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Op. Cit. p. 392, 393.
14
Cf. FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Agências Reguladoras: legalidade e constitucionalidade. In: Revista
Tributária e de Finanças Públicas, n. 35. São Paulo: RT, 2000, p. 143 e ss. O texto aborda as dificuldades em se
admitir a competência normativa a entidades independentes, o que, ao que se depreende dos ensinamentos,
esbarraria, em especial, no art. 25 do ADCT e dos arts. 5º, II; 37; 84, IV; 62 e 68 da CF.
15
Cf. BARBOSA GOMES, Joaquim Benedito. Agências Reguladoras: a ‘metamorfose’ do Estado e da Democracia.
Uma reflexão do Direito Constitucional e comparado. In: Revista de Direito da Associação dos Procuradores do
Novo Estado do Rio de Janeiro. v. 11. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, p. 91.
Direito Regulatório
10
Para Tércio Sampaio Ferraz Júnior 16, por força da reserva de lei, estará proibido tudo o que
caracterizar uma delegação abdicatória (renúncia ao poder-dever do Legislativo de exercer
sua competência constitucional). Igualmente impossibilitada estará a regulação sempre
que o Executivo, com relação a determinados conteúdos e sob certas condições, estiver
autorizado pela Constituição a emanar normas com força de lei (decreto-lei, medida
provisória), e excluída estará sua competência regulamentar inominada, só cabendo aí
regulamento de execução nos limites do dispositivo legal (regulamentação para fiel
execução, privativa do Presidente da República).
16
Cf. FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Op. Cit. p. 143 e ss.
Direito Regulatório
11
Por sua vez, segundo a Teoria da Especialização, o legislador reconhece que o agente
regulador deve ser um especialista na matéria, com notório conhecimento sobre o
segmento regulado. Dessa forma, o legislador e o juiz, como generalistas, não entendem
de cada segmento regulado, mas sabem que, dado a sua relevância para o
desenvolvimento, justificando a regulação, deve ter funcionamento eficiente de modo a
atender aos interesses da coletividade regulada. Por tanto, nada mais voltado para o
princípio da eficiência que se atribua poder de explicitar as obrigações genéricas contidas
na lei a que tem esse conhecimento 18. O dever de atender eficientemente aos
17
Cf. OLIVEIRA, José Roberto Pimenta de. apud SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito administrativo regulatório.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 53.
18
O Eg. Tribunal Regional Federal da 1ª Região, no julgamento do Agravo Regimental na Suspensão de Segurança
nº 2001.01.00.037194-6/DF, decidiu que causava grave dano à ordem administrativa, por ferir a independência
dos Poderes, a decisão judicial que deferia a medida liminar, em ação civil pública, para suspender resolução da
ANVISA, que, no exercício de sua atribuição legal, concedera registro de medicamento genérico ao produto
"Gengraf Ciclosporina Modificada Abbott", sob o único fundamento de que este produto não possui a mesma
biodisponibilidade do medicamento de referência "Sandinum Neoral". Decidiu, assim, que: “cumpre, ao Judiciário,
examinar o ato administrativo discricionário unicamente sob o aspecto da legalidade, sendo-lhe vedado ingressar
no campo reservado ao seu mérito (conveniência e oportunidade)”.
Merece, ainda, especial destaque, o seguinte trecho do voto do Relator, ao reconhecer e privilegiar a especialidade
técnica da Agência no exercício de sua competência: “O impetrante quer que o Poder Judiciário não considere o
Ciclosporina Gengraf como um remédio genérico. Curioso seria forçar os juízes a escolherem entre qual parecer
é o ‘mais certo’, sendo que há um órgão administrativo especializado para tal análise que é a ANVISA. Mostra-
se, conforme exposto acima, a grave lesão à ordem jurídica e à saúde pública, já que a liminar vigente, objeto
da presente Suspensão de Segurança, invade a competência da ANVISA e decide se um remédio é ou não de
certa natureza, sem o necessário conhecimento técnico”.
No mesmo sentido, o Eg. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do RESP nº 572070/PR, buscou privilegiar
as normas e decisões das Agências Reguladoras para integrar, a partir do substrato técnico que lhe é próprio, os
conceitos jurídicos indeterminados, conforme se observa do seguinte trecho de sua ementa: “Administrativo.
Telecomunicações. Telefonia fixa. Lei n. 9.472/97. Cobrança de tarifa interurbana. Suspensão. Área Local. Ação
Civil Pública. Código de Defesa do Consumidor. 1. A regulamentação do setor de telecomunicações, nos termos
da Lei n. 9.472/97 e demais disposições correlatas, visa a favorecer o aprimoramento dos serviços de telefonia,
em prol do conjunto da população brasileira. Para o atingimento desse objetivo, é imprescindível que se privilegie
a ação das Agências Reguladoras, pautada em regras claras e objetivas, sem o que não se cria um ambiente
favorável ao desenvolvimento do setor, sobretudo em face da notória e reconhecida incapacidade do Estado em
arcar com os eventuais custos inerentes ao processo. 2. A delimitação da chamada "área local" para fins de
configuração do serviço local de telefonia e cobrança da tarifa respectiva leva em conta critérios de natureza
predominantemente técnica, não necessariamente vinculados à divisão político-geográfica do município.
Previamente estipulados, esses critérios têm o efeito de propiciar aos eventuais interessados na prestação do
serviço a análise da relação custo-benefício que irá determinar as bases do contrato de concessão. 3. Ao adentrar
no mérito das normas e procedimentos regulatórios que inspiraram a atual configuração das "áreas locais" estará
o Poder Judiciário invadindo seara alheia na qual não deve se imiscuir (...)”.
Direito Regulatório
12
Fica, dessa forma, afastada qualquer dúvida sobre a capacidade do regulador, sendo a ele
conferida autoridade derivada, estritamente graduada nos limites da lei e do interesse
público.
Direito Regulatório
13
Diogo de Figueiredo Moreira Neto 20, por sua vez, para justificar a legalidade e a
legitimidade da atividade regulatória, distingue a atividade normativa regulatória da
regulamentação da lei e da delegação legislativa, definindo-a como a deslegalização
(retirada, pelo próprio legislador, de certas matérias, do domínio da lei, passando-as ao
domínio de normas infralegais) 21. A lei de deslegalização não adentraria na matéria de que
trata, mas apenas abriria a possibilidade a outras fontes normativas, estatais ou não, de
regulá-la por atos próprios, que, por óbvio, não mais serão de responsabilidade do Poder
Legislativo, ainda que possa continuar a ser exercido o controle político sobre eventuais
exorbitâncias.
Não há, pois, em sede doutrinária, como sustentar que as agências reguladoras não
poderiam expedir normas a respeito do funcionamento de determinado serviço público ou
segmento da economia, sob o argumento de que estariam editando regulamentos
privativos do chefe do Poder Executivo.
Nessa mesma linha e sob os mesmos fundamentos doutrinários, leciona Alexandre Santos
de Aragão que:
19
Cf. ARAGÃO, Alexandre Santos de. As agências reguladoras independentes e a separação de poderes: uma
contribuição da teoria dos ordenamentos setoriais. Revista Diálogo Jurídico, nº 13, abril-maio. Salvador: Centro
de Atualização Jurídica, 2002.
20
Cf. MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. In: Revista de Direito
Administrativo, v. 215, jan./mar. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 71-83. Cabe, aqui, interpretar o pensamento
de Diogo de Figueiredo Moreira Neto, frisando que tal autor, ao distinguir a deslegalização da delegação
legislativa, quis, exatamente, afirmar que não se trata da delegação de Poderes repudiada pelo art. 2º da CF. O
que a lei faz é atribuir ao regulador o papel de preencher a moldura com conhecimentos técnicos e à luz da
realidade em que a lei vai ser aplicada. O legislador limita-se a estabelecer a obrigação – o dever de eficiência –
e os objetivos a atingir. O regulador vai definir, por meio de atos normativos ou executivos (conforme o número
de destinatários e o seu grau de conhecimento sobre o mercado), a técnica de execução da vontade da lei.
21
A tese da deslegalização foi acolhida pelo Eg. STF, conforme se observa da ementa do RE nº 140.669/PE:
“Tributário. IPI. Art. 66 da Lei nº 7.450/85, que autorizou o Ministro da Fazenda a fixar prazo de recolhimento
do IPI, e portaria nº 266/88/MF, pela qual dito prazo foi fixado pela mencionada autoridade (...). Elemento do
tributo em apreço que, conquanto não submetido pela Constituição ao princípio da reserva legal, fora legalizado
pela Lei nº 4.502/64 e assim permaneceu até a edição da Lei nº 7.450/85, que, no art. 66, o deslegalizou,
permitindo que sua fixação ou alteração se processasse por meio da legislação tributária (CTN, art. 160),
expressão que compreende não apenas as leis, mas também os decretos e as normas complementares (CTN,
art. 96). Orientação contrariada pelo acórdão recorrido. Recurso conhecido e provido”.
Direito Regulatório
14
Ressalva-se aqui, também, que não parece razoável sustentar que uma norma regulatória
possa revogar uma lei, quer do ponto de vista formal, quer do ponto de vista material; a
lei pode traçar um novo marco regulatório o qual permita que os padrões técnicos e
financeiros considerados na norma legal anterior sejam substituídos por novos padrões
instituídos pela norma regulatória; trata-se, apenas, de modificação do conteúdo interno
da norma (ou, em outras palavras, do insumo); o centro de decisão política, no entanto,
não sai do legislador para o regulador, sob pena de subverter-se o princípio democrático,
afastando a legitimidade da ação administrativa em favor da instituição da tecnocracia na
Administração Pública. A formulação das políticas públicas cabe ao agente que recebeu
diretamente da sociedade tal competência; a função regulatória, frise-se, é a de
implementação dessas políticas, não a de formulá-las.
22
Cf. ARAGÃO, Alexandre Santos de. O poder normativo das agências reguladoras independentes e o Estado
Democrático de Direito. Revista de Informação Legislativa, ano 37, nº 148, out./dez. 2000. p. 287.
Cabe aqui explicitar que a inserção de conceitos jurídicos indeterminados é considerada uma técnica legislativa
que visa a permitir que a delimitação ou quantificação desses conceitos se faça caso a caso, diante da situação
fática que se apresente e por quem possua conhecimento técnico para tanto (teoria da especialização). A questão
que aqui se coloca diz respeito à existência ou não de discricionariedade administrativa (ou discricionariedade
técnica), por parte do agente regulador, para, em seus atos, integrar esses conceitos – caso em que não caberia
controle do Judiciário sobre o mérito administrativo (conveniência e oportunidade) desses atos –, ou se tais
conceitos devem ser integrados pelo método interpretativo e, assim, admitindo apenas uma solução justa
(podendo o Poder Judiciário exercer controle sobre tais atos, verificando se foi acertada a interpretação desses
conceitos).
As controvérsias sobre o tema foram bem abordadas por Sérgio Guerra, em artigo intitulado Discricionariedade
técnica e Agências Reguladoras – uma abordagem em sede doutrinária e pretoriana (In: Direito Administrativo:
estudos em homenagem a Diogo de Figueiredo Moreira Neto. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 869-909),
cuja leitura se recomenda.
Direito Regulatório
15
Assim é que, para a elaboração de atos normativos das agências, tem sido estabelecida
em lei a obrigatoriedade de prévia consulta pública sobre a minuta (vide, por exemplo, o
art. 42 da Lei nº 9.472/97, que trata dos atos da Agência Nacional de Telecomunicações,
a qual fiscaliza a gestão privada do serviço público de telecomunicações). É o sistema
adotado na CVM para legitimação e eficácia de suas normas.
A regulação executiva se desenvolve, basicamente, por meio de: (i) atos de consentimento
de ingresso no mercado (mediante licenças, autorizações, permissões); (ii) adjudicação do
objeto de contratos administrativos de concessões e permissões de serviços públicos, de
uso de bens públicos ou do exercício de atividades econômicas relacionadas a bens ou
serviços públicos; (iii) atos de fiscalização, de direção, de intervenção e a eventual
imposição de penas ou obrigações da correta execução da atividade consentida ou
contratada, nos limites estabelecidos na moldura regulatória (que envolve a Constituição,
lei, normas da entidade reguladora e atos de consentimento ou de adjudicação). Estão
incluídas na função executiva a tarefa de aprovar reajustes e revisões de tarifas e preços 23,
como também a arrecadação da taxa de regulação, que é uma das condições de
permanência no mercado.
23
O STJ, no julgamento do MS nº 2887/DF, decidiu, inclusive, pela possibilidade de a União fixar preços (no caso,
o preço do gás liquefeito de petróleo) no exercício da função regulatória, como forma legítima de intervenção na
economia, conforme demonstra o seguinte trecho de sua ementa: “A Constituição Federal, no seu art. 170,
preceitua que a ordem econômica é fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tendo por
finalidade assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os princípios
que indica. No seu art. 174, pontifica que, como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado
exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento. Desses dispositivos resulta claro
que o Estado pode atuar como agente regulador das atividades econômicas em geral, sobretudo nas de que
cuidam as empresas que atuam em um setor absolutamente estratégico, daí lhe ser lícito estipular os preços que
devem ser por elas praticados”.
Direito Regulatório
16
Conforme sintetiza Carlos Ari Sundfeld, a sociedade deseja ver os conflitos individuais
surgidos tratados por entidades que, além de imparciais, possuam conhecimento específico
sobre o assunto:
Não alguém que entenda de direito apenas (isto é, das técnicas de
produção e hermenêutica normativa), mas que entenda do
problema específico: quem saiba das dificuldades para compor
harmonicamente o conflito, consiga dar a solução mais harmoniosa
por equidade baseando-se em critérios técnicos, etc. 25.
24
No Brasil, foi o caso das agências reguladoras de energia (ANEEL), de telecomunicações (ANATEL) e de petróleo
(ANP), que agem em nome da União em função de outorga legal de competência por ocasião da criação de tais
entidades. Questiona-se, contudo, esse modelo, haja vista que as atribuições devem ser tratadas distintamente,
conforme as funções e responsabilidades de cada agente no cenário regulado. Os modelos de entidades
reguladoras estaduais, no entanto, não contemplam as funções de poder concedente mas, basicamente, as de
fiscalização do setor. Essa singular particularidade está para ser corrigida com a edição do Projeto de Lei do
Senado n° 52/2013 que, se aprovado, representará a Lei-quadro das Agências Reguladoras no Brasil.
25
Cf. SUNDFELD, Carlos Ari. apud SOUTO, Marcos Juruena Villela. Op. Cit. p. 62.
Direito Regulatório
17
Somente não havendo consenso passa-se à via arbitral, momento em que entram em jogo
a ponderação ou a subsunção na formulação de uma decisão.
A arbitragem administrativa não se confunde com a arbitragem comercial, posto que esta
última depende da sua aceitação por consenso.
A utilização da via arbitral em substituição à via jurisdicional estatal pode ter sua
constitucionalidade questionada, sendo, portanto, objeto de críticas. No entanto, na lição
de Humberto Theodoro Júnior 26 os argumentos a demonstrar a constitucionalidade da via
arbitral são: (i) o fato de que, sem embargo da força jurisdicional de que se reveste a
sentença arbitral, a natureza do fato gerador da arbitragem é a de um contrato, ou de um
“negócio jurídico bilateral”; (ii) a atividade desenvolvida no juízo arbitral não escapa ao
controle de legalidade a cargo do Judiciário; (iii) não cabem aos árbitros, mas aos juízes
regulares do Poder Judiciário a concessão das medidas liminares coercitivas, sejam
cautelares ou de antecipação de tutela; (iv) quando faltar consenso entre as partes, a
própria controvérsia acerca da imposição do cumprimento da cláusula arbitral e da
definição dos termos do compromisso será dirimida pelo Poder Judiciário; (v) quando a
arbitragem se der por organismo estrangeiro, a sentença somente será admitida à
execução no Brasil depois de submeter-se à homologação pelo Supremo Tribunal Federal.
Quanto à peculiaridade que envolve a restrição do uso da arbitragem pelo Código de Defesa
do Consumidor – Lei nº 8.078/90 – que assume relevância em função de abranger,
também, os usuários de serviços públicos (arts. 6º, X e 22), prossegue no ensinamento,
citando Barbosa Moreira, que a proibição da cláusula compromissória pelo CDC não
equivale a um banimento completo do juízo arbitral do âmbito das relações de consumo.
O que não tolera a lei protetiva do consumidor é a cláusula que o obrigue a só discutir seus
direitos por meio do mecanismo da arbitragem. Nada impede, segundo Barbosa Moreira,
que após o advento da lide, consumidor e fornecedor acordem em submetê-la à arbitragem
e, à vista disso, ajustem livremente um compromisso. É que, resistindo ou não à cláusula
compromissória, no contrato, sempre será possível a pactuação do compromisso. A
nulidade daquela cláusula, então, não contamina o compromisso voluntariamente
celebrado.
O que não se pode tolerar, por flagrante inconstitucionalidade, é a exclusão, pela lei, da
apreciação de lesão a direito pelo Poder Judiciário, que não é o caso do Juízo arbitral. O
que se exclui pelo compromisso arbitral comercial é o acesso à via judicial, mas não à
jurisdição. Não se poderá ir à justiça estatal, mas a lide será resolvida pela justiça arbitral.
Em ambas, há, por óbvio, a atividade jurisdicional.
Dessa forma, a decisão regulatória pode ser elevada à categoria de norma regulatória
(transformação da adjudication em rulemaking), desde que observados os parâmetros
exigidos para tanto (especialmente o direito de participação), nada impedindo a extensão
26
Cf. THEODORO JUNIOR, Humberto apud SOUTO, Marcos Juruena Villela. Op. Cit. p. 67.
Direito Regulatório
18
Entretanto, é claro que a parte beneficiada pela decisão regulatória não pode ficar à mercê
da vontade da parte omissa em cumprir voluntariamente a decisão, podendo, neste caso,
provocar a autoridade decisória para determinar o atendimento do ato administrativo
decisório sob as penas da lei e dos atos normativos regulatórios.
Segundo Diogo de Figueiredo Moreira Neto 27, tem-se identificado uma superação dos
métodos impositivos da heterorregulação estatal com a valorização dos novos métodos
consensuais de consulta e de negociação, próprios da autorregulação. A mescla desses
métodos resultou no hibridismo característico das instituições reguladoras modernas, que
vinham obtendo sucesso em superar as crises setoriais, com soluções híbridas –
administrativamente negociadas e impostas (o que vem a ser o conceito central da solução
administrativa da regulação). A decisão política consistia em optar pela aplicação de
soluções harmonizadoras politicamente neutras.
Nesse sentido, a tendência é, tanto nos setores sociais como nos setores econômicos
sensíveis, buscar alcançar uma solução por meio de um processo de harmonização e
negociação entre os diversos interesses envolvidos, ao invés de se impor uma solução
unitária, padronizada e pré-ordenada. Dessa forma, não cabe mais ao Estado decidir entre
atuar como agente econômico ou como dirigente econômico, devendo ele aceitar e assumir
sua função de regulador econômico.
27
Cf. MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Op. Cit. p. 390, 391.
Direito Regulatório
19
Para Carlos Ari Sundfeld 30, essa distinção entre serviço público e atividade econômica não
tem razão de ser, interessando apenas saber de que maneira a atividade é regulada. Por
exemplo, as atividades econômicas de saúde privada são tão ou mais reguladas que o
serviço público de transporte coletivo de passageiros.
Conclui-se que a atividade econômica não transformada em serviço público continua sendo
privada; a regulação só reduz a liberdade, mas não atrai a titularidade estatal nem cria o
regime de responsabilidade civil objetiva, típico das prestadoras de serviços públicos. O
que pode acontecer é a responsabilidade pela omissão na fiscalização, que não recairá
sobre a empresa privada, mas sobre o Estado, pelo fato da omissão do serviço, cabendo
para tanto discutir se a omissão é razoável ou não.
Note-se que existem serviços considerados como serviço econômico de interesse geral,
que vem a ser figura intermediária entre a atividade econômica e o serviço público, sendo
que, neste último, têm-se o reconhecimento do direito do indivíduo de receber uma
prestação de interesse geral a preço módico, com regularidade, e, acima de tudo, com
generalidade.
Frise-se que somente os serviços que não exijam, em sua prestação, o exercício da
supremacia estatal sobre o particular (poder de império, autoridade) podem ser
transferidos à iniciativa privada, sob regulação estatal, substitutiva ou sempre que
possível, promotora do mercado.
28
No julgamento da Apelação Cível nº 70005877014, em que se pretendia o afastamento da aplicação de lei
municipal que impunha limite ao número de veículos que poderiam explorar a atividade de transporte escolar, a
Segunda Câmara do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul decidiu pela inconstitucionalidade do
referido diploma legal, considerando que o transporte escolar não se enquadra na definição de transporte coletivo
de interesse local a que alude o art. 30, V, da Constituição da República, como serviço público municipal.
29
Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão,
sempre por meio de licitação, a prestação de serviços públicos.
30
Cf. SUNDFELD, Carlos Ari. Direito administrativo econômico. São Paulo: Malheiros, 2001.
Direito Regulatório
20
Cumpre registrar também que o custeio dos serviços públicos representa a fixação de uma
política pública, mantendo-se na Administração aquilo que depende exclusivamente da
presença do Estado 31.
Em síntese, diz-se que a noção de serviço público em sentido estrito envolve a conjunção
de quatro elementos: (i) o elemento objetivo, que é a presença do interesse geral (fato
social que vai motivar a disciplina estatal de restrição da liberdade); (ii) o elemento
subjetivo, que é a necessária prestação pelo Estado, ainda que indiretamente; (iii) o
elemento formal, que é a necessária (por força da lei ou da Constituição) prestação do
serviço sob regime público 32; e, modernamente, (iv) o elemento teleológico, que
representa uma mudança de mentalidade, refletindo a preocupação da sociedade com a
qualidade das prestações que lhe são oferecidas, não mais importando se quem as presta
é o Estado ou o particular, e sim se o resultado é satisfatório, eficiente.
Dessa forma, dentro de uma realidade de Reforma do Estado, busca-se, sempre que viável,
a introdução da competição na exploração dos serviços e a universalização do acesso aos
serviços básicos, fortalecendo o papel regulador do Estado em substituição à sua condição
de gestor, aumentando a oferta e a qualidade na prestação de serviços, a criação de
oportunidades atraentes de investimento e de desenvolvimento tecnológico e industrial,
dentro de um ambiente competitivo e harmônico com as metas de desenvolvimento social
do país.
31
As taxas, tarifas e preços são destinadas, em regra, a remunerar o capital investido, manter o serviço em
operação, aprimorar a tecnologia e proporcionar o justo lucro ao empresário, conforme lei definidora da política
tarifária editada no âmbito de cada entidade federada competente (art. 175, III, CF), distinguindo-se a função
de autoridade monetária e poder concedente, não se admitindo o uso da tarifa para fins de controle da inflação.
Essa separação é, aliás, um dos elementos motivadores do surgimento das agências reguladoras independentes,
com poderes para disporem sobre tarifas públicas e para baixarem ordenamentos setoriais.
Como se trata de política pública (de gestão e de custeio) ao órgão regulador caberá estabelecer os comandos
necessários à sua implementação, editando os competentes atos normativos e, em sendo o caso, participando
da formulação dos editais de licitação e dos contratos de delegação do serviço a particulares e, ainda, auxiliando
na própria formulação dessa política (fornecendo ao núcleo estratégico do Estado os subsídios e as sugestões que
o acompanhamento do mercado recomendar).
Os reajustes e as revisões de tarifas, que têm o papel de preservar o equilíbrio do contrato, matéria técnica
também atribuída ao regulador que, como dito, não pode, nesse mister, alterar o modelo politicamente escolhido.
32
Quanto ao elemento formal, cumpre dizer que os serviços públicos prestados em regime público podem ser
objetos de permissão ou concessão (em que se mantém a titularidade do serviço com o ente público), e os
serviços econômicos de interesse geral (prestados em regime privado) são aqueles prestados por particulares
que recebem da Administração Pública um título jurídico vinculado ao preenchimento de determinadas condições
para seu ingresso no mercado, chamado de autorização, embora seja vinculada, e não discricionária.
Direito Regulatório
21
Fala-se em eficiência pela competição, a qual pode ocorrer em diversos níveis. Dessa
forma, tem-se a competição pelo mercado, evidenciada na licitação (que viabiliza a
competição pelo serviço em igualdade de oportunidade a todos os particulares que desejam
contratar com o poder público, alcançando-se a melhor proposta para a Administração
Pública, que, em síntese, representa o atendimento do princípio da economicidade); a
competição no mercado (quando é livre a concorrência); a competição entre mercados
(quando há competição, por exemplo, entre transporte rodoviário e aquaviário);
competição entre serviços públicos e atividades econômicas livres (entre serviços
prestados em regime público e serviços prestados em regime privado, como a que se
estabelece entre o serviço postal e o serviço de entregas expressas).
Como já dito, os serviços públicos podem ser prestados direta ou indiretamente pelo
Estado, sendo uma opção a descentralização da gestão dos serviços públicos.
Por força do princípio da legalidade, a opção pela concessão depende de lei que lhe autorize
e fixe os termos, ressalvadas as hipóteses que a Constituição Federal, a Constituição
Estadual e a Lei Orgânica Municipal já tenham autorizado (no Brasil, a Lei nº 9.074/95,
art. 2º, teve o intuito de devolver o tema aos legisladores locais para decidirem acerca das
concessões, podendo fazê-lo por lei geral ou específica); o mesmo se diga quanto à
alienação das empresas estatais prestadoras de serviço público, que pressupõe a
concessão ou permissão do respectivo serviço (buscando-se a maximização de seu valor).
A descentralização não afasta o dever de fiscalização da qualidade do serviço, que envolve
o atendimento dos princípios inerentes à sua gestão, já que o usuário, legalmente
equiparado ao consumidor, tem direito à sua adequada e eficaz prestação (art. 6º, X, da
Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990) 33.
Nesse sentido, a Lei nº 8.987/95, no caput de seu art. 6º, dispõe que toda concessão ou
permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários.
Por sua vez, o parágrafo primeiro esclarece que serviço adequado é o que satisfaz as
condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade,
cortesia em sua prestação e modicidade das tarifas.
33
A exemplo do que foi dito, cita-se trecho da ementa do Acórdão do Eg. STJ, proferido no RESP nº 572906/RS,
de 28/06/2004: “É de sabença que as agências reguladoras consistem em mecanismos que ajustam o
funcionamento da atividade econômica do País como um todo, principalmente da inserção no plano privado de
serviços que eram antes atribuídos ao ente estatal. Elas foram criadas, portanto, com a finalidade de ajustar,
disciplinar e promover o funcionamento dos serviços públicos, objeto de concessão, permissão e autorização,
assegurando um funcionamento em condições de excelência tanto para o fornecedor/produtor como
principalmente para o consumidor/usuário”.
Direito Regulatório
22
O Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90), em seu art. 22, estabelece que os
órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou qualquer
outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes,
seguros e, quanto aos essenciais, contínuos 34. Interessante questão que sofreu alteração
com o advento da Lei nº 8.987/95, é a que envolve o princípio da continuidade do serviço
público diante da falta de pagamento da tarifa pelo usuário.
Ocorre que, em se tratando de serviço prestado por empresa estatal, por força do princípio
da solidariedade, toda a coletividade, por meio do pagamento de tributos, custeava o
orçamento fiscal para subvencionar a empresa estatal para que ela funcionasse sem
receber a tarifa para o pagamento do serviço.
Com o regime de concessão, era preciso oferecer mais segurança para o investidor privado,
de forma a não lhe impor o custo da inadimplência, de difícil previsão.
Alguns autores, como José dos Santos Carvalho Filho 35, defendem que se faça a distinção
entre serviços compulsórios (serviços de fruição obrigatória) e serviços facultativos (de
fruição voluntária), sendo essa facultatividade ou essa obrigatoriedade tanto do ponto de
vista de sua obtenção como do ponto de vista de sua prestação. Os compulsórios assim o
são porque o Estado impôs coercitivamente e, via de regra, são remunerados por taxa, de
forma que eventual dívida é para com o Estado, que possui meios privilegiados para sua
cobrança. Dessa forma, os obrigatórios não poderiam ter seu fornecimento interrompido.
34
Embora sejam categorias distintas, o usuário é equiparado ao consumidor, no plano legal, para assegurar ao
usuário as mesmas medidas que existem para a defesa do consumidor. Mas podem receber tratamento
diferenciado, como ocorre com os direitos dos usuários de serviços concedidos. Esta é uma categoria específica
de usuário, que, por sua vez, não é uma categoria de consumidor, mas outra categoria jurídica, que pode ser
objeto de tratamento distinto. Foi o que fez o legislador, ao estabelecer que o usuário de serviço público, para
ter direito à prestação do serviço, tem de pagar a contraprestação correspondente.
Com isso, o que se fez foi dar o tratamento específico, suprimindo o tratamento geral. A norma posterior derroga
a anterior naquilo que é incompatível; a norma especial derrogaria a norma geral, ainda que usuário fosse uma
categoria de consumidor.
35
Cf. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006,
p. 275.
Direito Regulatório
23
Ocorre que, como dito acima, à medida que a execução de alguns serviços foi sendo
transferida para o particular, a natureza de sua remuneração passou a ser contratual, não
se tratando mais de taxa, e sim de preço.
Conforme explica Carvalho Filho 36, foi o que aconteceu com o serviço de abastecimento de
água, posto que, antes das privatizações, o entendimento, jurisprudencial, inclusive,
firmou-se no sentido de não poder ter seu fornecimento suspenso em razão de ser serviço
imposto obrigatoriamente pelo poder público e ser remunerado por taxa. Entretanto, após
as privatizações desse serviço, passou a atividade a ter maior caráter negocial, sendo paga
por tarifa e, portanto, passível de suspensão por falta de pagamento. Cita ainda decisão
da Primeira Seção do STJ, no REsp nº 337.965/MG, que entendeu que nesses casos a
norma aplicável não seria o art. 22 do Código de Defesa do Consumidor, que garante a
continuidade dos serviços essenciais, e sim o art. 6º, § 3º, da Lei das Concessões, que
autoriza aquela providência por parte do concessionário.
36
Cf. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. Cit. p. 275-276.
Direito Regulatório
24
37
Cf. SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito administrativo regulatório. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005,
p. 245-246.
Direito Regulatório
25
Por isso, as agências assumem, ao mesmo tempo: (i) função executiva, ao exercer o poder
de polícia no setor que regula (concessão, permissão e autorização de serviços, expedição
de licenças, autorização de reajustes e revisões contratuais, etc.); e (ii) função normativa,
quando edita normas “com vistas a traduzir, por critérios técnicos, os comandos previstos
na Carta Magna e na legislação infraconstitucional” 39 – ou seja, o ato normativo regulatório
visa a esclarecer e interpretar, tecnicamente, os conceitos trazidos na lei.
Em relação a essa função normativa, temos o chamado rulemaking, que consiste nos atos
que passam a ter um caráter normativo, de forma a abranger mais amplamente as relações
entre os setores da sociedade que atinge. Vale lembrar que, como leciona Cornelius M.
Kerwin 40, o rulemaking ocorre quando as agências reguladoras se utilizam da “autoridade
legislativa que lhes é dada pelo Congresso”.
Por outro lado, temos a adjudication, que implica a coerência das decisões da agência por
meio do uso de precedentes, de modo que casos tecnicamente semelhantes sejam
decididos da mesma forma, não se sujeitando a ocasionalidades.
38
Cf. BENJÓ, Isaac. Fundamentos de economia da regulação. Rio de Janeiro: Thex, 1999, p. 109.
39
Cf. GUERRA, Sérgio. Controle judicial dos atos regulatórios. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 100.
40
Cf. KERWIN, Cornelius M. Rulemaking: how government agencies write law and make policy. 2nd ed.
Washington D.C.: CQ Press, 1999, p. 4.
Direito Regulatório
26
Também compete às agências reguladoras a resolução de conflitos que possam surgir entre
os entes regulados, com vistas não só à reparação de eventuais danos ou prejuízos como
também às consequências que poderão ser geradas a partir de tal decisão, visto que ela
não envolve somente as partes do conflito, mas todo o setor regulado. Surge, aqui, a
regulação judicante. Conforme a definição de Alexandre Santos de Aragão 42:
Paulo César Melo da Cunha 43 sintetiza que tal atividade “implica na formulação das
orientações, definição e operacionalização das regras, sua implementação e aplicação
(...)”.
41
Cf. MONCADA, Luís S. Cabral de. Estudos de direito público. Coimbra: Coimbra Editora, 2001, p. 127-134.
42
Cf. ARAGÃO, Alexandre Santos de. Regulação da economia: conceito e características contemporâneas. In:
Cadernos temáticos: direito regulatório. Rio de Janeiro: Siqueira Castro Advogados, 2004, p. 121.
43
Cf. CUNHA, Paulo César Melo da. Regulação jurídica da saúde suplementar no Brasil. Rio de Janeiro: Lumen
Juris, 2003, p. 57-58.
Direito Regulatório
27
44
Cf. MELNICK, R. SHEP. Regulation and the courts: the case of the Clean Air Act. Washington: The Brookings
Institution, 1983, p. 60.
45
Cf. MOREIRA, Egon Bockmann. Os limites à competência normativa das agências reguladoras. In: ARAGÃO,
Alexandre Santos (Coord.). O poder normativo das agências reguladoras. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 216.
46
Cf. JUSTEN FILHO, Marçal. Op. Cit. p. 203-204.
Direito Regulatório
28
Frise-se aqui que o controle da atividade regulatória deve maximizar a relação entre
celeridade e eficiência – não devendo ser excessivo ao ponto de inviabilizar a atuação da
agência, como também deve circunscrever-se aos limites do arcabouço jurídico
brasileiro 47.
Nesse sentido, é coerente que haja mecanismos específicos que garantam o melhor
desempenho da atividade regulatória. Surgem daí questionamentos quanto à autonomia
das agências e sua submissão a instrumentos de controle. Esclarecendo esse ponto, Marçal
Justen Filho 48:
A necessidade de autonomia no desempenho de funções
regulatórias não pode imunizar a agência reguladora de submeter-
se à sistemática constitucional. A fiscalização não elimina a
autonomia, mas assegura à sociedade que os órgãos titulares de
poder político não atuarão sem limites, perdendo de vista a razão
de sua instituição, consistente na realização do bem comum.
Esse controle deverá recair não apenas sobre a nomeação e
demissão dos administradores das agências, mas também sobre o
desempenho de suas atribuições. Deverá submeter-se à fiscalização
a atuação das agências relativamente à adoção de políticas públicas,
de edição de normas tanto gerais e abstratas como individuais e
concretas.
O controle dos atos regulatórios, conforme a classificação apontada por Marcos Juruena
Villela Souto 49, é assim traçado:
47
Como o entendimento de DALLARI, Adilson. Painel V: O controle por meio do Congresso. Criação da comissão
permanente de controle das agências reguladoras. In: Quem controla as agências reguladoras de serviços
públicos? Seminário internacional: debates e trabalhos apresentados em Brasília, setembro de 2001. Brasília:
IHB, 2001, p. 192.
48
Cf. JUSTEN FILHO, Marçal. O direito das agências reguladoras independentes. São Paulo: Dialética, 2002, p.
584-585.
49
Cf. SOUTO, Marcos Juruena Villela. Op. Cit. p. 350.
Direito Regulatório
29
O controle dos atos regulatórios por meio do Executivo resume-se ao controle interno,
posto que as autarquias estão vinculadas estruturalmente à Administração. Tal mecanismo
está disposto no art. 27 do Decreto-lei nº 200/67, que define as medidas a serem adotadas
para o controle da Administração Indireta, a chamada supervisão ministerial.
Entre essas medidas, destacamos as trazidas por Alexandre Mazza 50, que arrolou:
Mesmo sendo dotada de autonomia, a agência reguladora não fica isenta do controle do
Poder Executivo; ela deve atuar conforme os objetivos sobre os quais foi criada. É nesse
diapasão que Cosmo Graham 51 exemplifica que os governos usam mecanismos de controle
de forma a garantir que suas metas políticas sejam alcançadas, como, por exemplo, se dá
na escolha do dirigente da agência. Ainda diz o autor que, dessa forma, uma boa atuação
da agência reguladora pode significar a legitimação das metas propostas pelo Governo.
50
Cf. MAZZA, Alexandre. Agências reguladoras. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 203-204.
51
Cf. GRAHAM, Cosmo. Regulating public utilities: a constitutional approach. Portland, Oregon: Hart Publishing,
2000, p. 46-49.
Direito Regulatório
30
Conforme ainda a lição sempre atual de Marcos Juruena Villela Souto 52:
Outro ponto a ser travado diz respeito à sua autonomia orçamentária, à medida que as
agências têm sofrido interferência por parte do Poder Executivo no tocante à destinação
das receitas oriundas da arrecadação da taxa de regulação – muitas vezes destinada à
cobertura de déficits em outras rubricas orçamentárias da Administração Central,
representando clara e evidente interferência na autonomia daquelas entidades
reguladoras.
Entre as questões levantadas acerca do controle administrativo, surge uma polêmica ainda
não pacificada, que vem a ser a da possibilidade de interposição de recurso hierárquico
impróprio contra os atos proferidos pelas agências reguladoras, apresentados perante a
Administração. Este recurso é dirigido à autoridade administrativa hierarquicamente
superior àquela que tem seus atos questionados. Conforme leciona Maria Sylvia Zanella di
Pietro 53, se o recurso não decorre da hierarquia, só é cabível se expressamente previsto
em lei.
52
Cf. SOUTO, Marcos Juruena Villela. Op. Cit. p. 357.
53
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2001, p. 594. Também
coaduna com esse pensamento MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 24. ed. São Paulo:
Malheiros, 1999, p. 610-611. Veja-se também o Acórdão prolatado no RMS nº 12.467/MG da 5ª Turma do
Superior Tribunal de Justiça, proferida em 20/04/2006 e publicada em 22/05/2006, D.O. p. 220.
Direito Regulatório
31
Por outro lado, a admissão de recurso hierárquico impróprio apresentaria, nas palavras de
Alexandre Santos de Aragão 54, contradição com os objetivos jurídicos que estabeleceram
as agências reguladoras. De nada adiantariam as exceções que lhes são inerentes com
vistas à garantia da confiabilidade regulatória, pois estaria, assim, vulnerável aos
interesses e às vontades de ministros, secretários, etc.
54
ARAGÃO, Alexandre Santos de. Agências reguladoras e a evolução do direito administrativo econômico. Rio de
Janeiro: Forense, 2002, p. 349. Comungando também desse posicionamento, MARCOS JURUENA VILLELA SOUTO
esclarece que “não deve caber controle administrativo pela via do recurso hierárquico impróprio, admitindo-se
que a decisão da agência reguladora possa ser revista ou modificada por um agente político (como um Ministro
ou Secretário de Estado, por exemplo). Isso retiraria toda a independência da entidade e a segurança dos
investidores, que ficariam, assim, sujeitos a critérios políticos (e, porque não dizer, demagógicos) de julgamento”
apud. GUERRA, Sérgio. Ob. Cit. p. 254.
55
MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. Agências reguladoras independentes: fundamentos e seu regime
jurídico. Belo Horizonte: Fórum, 2005, p. 75.
56
Cf. SOUTO, Marcos Juruena Villela. Op. Cit. p. 362.
57
BOWERS, James R. Regulating the regulators: an introduction to the legislative oversight of administrative
rulemaking. New York: Preager, 1990. p. 18 (“o veto legislativo em qualquer ação legislativa é o que tem efeito
de cancelar ações tomadas tanto pelo chefe do Executivo ou alguma agência administrativa, desde que haja
estatutos que autorizem essas ações”).
Direito Regulatório
32
58
MELLO, Vanessa Vieira de. Regime jurídico da competência regulamentar. São Paulo: Dialética, 2001, p. 107-
109.
Direito Regulatório
33
As propostas de regulação das agências devem ser submetidas, antes de sua adoção, a
comitê designado especialmente para aprovar ou revisar tais atos. Isso decorre do
interesse do Poder Legislativo em “recuperar o poder perdido com a (re)delegação ou de
aliviar o público afetado com a norma que extrapole os limites” 60. Salienta-se aqui que
essa é somente uma das formas possíveis de que dispõe o Legislativo para controlar os
atos regulatórios, posto que, conforme seja de seu interesse, pode formular nova lei que
incida sobre determinada agência reguladora, desde que, obviamente, busque
implementação ou correção das decisões regulatórias.
Sua competência para exercer esse tipo de controle é consagrada no texto constitucional,
como vemos evidenciada no art. 71, caput 61. Adiante, nos incisos do referido artigo, são
arroladas as competências da Corte de Contas. Rodrigo Pironti Aguirre de Castro 62,
referindo-se à lição de Luiz Alberto Blanchet, aponta, entre as funções que competem ao
Tribunal de Contas:
apreciar a legalidade dos atos de admissão de pessoal na Administração Direta
e Indireta, ressalvados os cargos em comissão;
59
Cf. MASTRANGELO, Claudio. Agências reguladoras e participação popular. Porto Alegre: Livraria do Advogado,
2005, p. 134-135.
60
Cf. SOUTO, Marcos Juruena Villela. Op. Cit. p. 364.
61
Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas
da União, (...).
62
CASTRO, Rodrigo Pironti Aguirre de. Processo administrativo e controle da atividade regulatória. Belo Horizonte:
Fórum, 2005, p. 105.
Direito Regulatório
34
Também comunga desse posicionamento Claudio Mastrangelo 64, o qual ainda expõe que,
conforme o art. 71, III, CR 65, figura entre as competências atribuídas ao TCU o exame,
para fins de registro, de admissões de pessoal e concessões de aposentadorias, a fim de
verificar se são executadas dentro dos limites da legalidade, deixando claro que isso não
abrange o conteúdo das decisões das autarquias.
63
Cf. JUSTEN FILHO, Marçal. Op. Cit. p. 588-590.
64
MASTRANGELO, Claudio. Ob Cit. p. 135-136.
65
“(...) apreciar, para fins de registro, a legalidade dos atos de admissão de pessoal, a qualquer título, na
administração direta e indireta, incluídas as fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, excetuadas as
nomeações para cargo de provimento em comissão, bem como a das concessões de aposentadorias, reformas e
pensões, ressalvadas as melhorias posteriores que não alterem o fundamento legal do ato concessório”.
Direito Regulatório
35
O controle judicial incide sobre a legalidade do ato, dando-se por meios processuais tais
como o mandado de segurança, a ação civil pública, a ação popular, o mandado de injunção
e o habeas data, dos quais dispõem aqueles titulares de direitos lesados pela ilegalidade
do ato para motivar o controle do Judiciário. Dessa forma, temos a lição de Alexandre
Mazza 66:
Ao Poder Judiciário compete controlar as atividades das agências
reguladoras e de seus agentes públicos quando questionadas,
mediante provocação dos interessados, por meio de ação popular
(art. 52, LXXIII, da Constituição Federal), ação civil pública (Lei n.
7.347/1985), mandado de segurança (art. 511, LXIX, da
Constituição Federal), habeas data (art. 52, LXXII, da Constituição
Federal), ação de improbidade administrativa (Lei n. 8.429/1992),
ou qualquer outra ação judicial visando a prevenir ou reprimir atos
e omissões atentatórios às normas e princípios pertencentes ao
ordenamento jurídico pátrio.
66
MAZZA, Alexandre. Op. Cit. p. 204.
67
Cf. JUSTEN FILHO, Marçal. Op. Cit. p. 588-590.
Direito Regulatório
36
Frise-se aqui que também é cabível a análise do mérito dos atos das agências reguladoras
independentes, desde que haja “uma perfeita e clara identificação dos reais motivos que
levaram o agente regulador na adoção da decisão” 68, em observância ao princípio da
motivação do ato administrativo.
É importante também frisar o papel do Ministério Público no controle judicial das agências
reguladoras, pois, quanto ao tema, o parquet também possui atribuições específicas,
mormente no que tange à titularidade da legitimação ativa para ação popular e ação civil
pública. Conforme leciona Marçal Justen Filho 70:
68
Cf. GUERRA, Sérgio. Op. Cit. p. 263.
69
Ibidem, p. 265.
70
Cf. JUSTEN FILHO, Marçal. Op. Cit. p. 588-590.
Direito Regulatório
37
Tal controle é de suma importância para a realização das políticas públicas, podendo ser
visto como o principal na legitimação da atividade regulatória. As determinações oriundas
da sociedade civil podem até ser submetidas à apreciação dos órgãos colegiados da agência
reguladora, levados por meio de seus representantes 73.
Por fim, convém apresentar outra figura de valiosa importância ao controle da atividade
regulatória: é a instituição de uma espécie de defensor da comunidade regulada; um
ouvidor 74 a quem, conforme os arts. 3º e 11 da Lei nº 9.986/2000, compete prestar
informações e esclarecimentos ao público, bem como responder-lhes, diretamente, seus
questionamentos, sendo ainda o representante da agência perante órgãos de defesa dos
direitos do consumidor.
71
Nesse sentido, SOUTO, Marcos Juruena Villela. Op. Cit. p. 356.
72
Cf. CASTRO, Rodrigo Pironti Aguirre de. Op. Cit. p. 101.
73
Como temos em JUSTEN FILHO, Marçal. Op. Cit. p. 584-585.
74
Assemelhando-se à figura do ombudsman, que surgiu na Suécia, como um alto funcionário da administração
que ocuparia um cargo, por determinada duração, que teria como objetivo zelar pelo interesse dos consumidores.
75
Ibidem, p. 587.
Direito Regulatório
38
Direito Regulatório
39
4. BIBLIOGRAFIA
ALMEIDA, Aline Paola Correa Braga Câmara de. As tarifas e as demais formas de
remuneração dos serviços públicos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 15. ed. São Paulo:
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