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Educação Ambiental como

instrumento de superação da
insustentabilidade
Nadja Janke

Conceituando Educação Ambiental

E
ducação Ambiental talvez não seja a expressão mais correta. Não deve haver apenas um único
conceito para um ato tão amplo como educar. Digo educar porque me parece óbvio que Edu-
cação Ambiental e educação representam, em síntese, epistemologicamente, a mesma ação:
educar.
Aliás, quando falamos em Educação Ambiental, temos a é possível educar fora de
nítida impressão de que estamos lidando com uma expressão um ambiente, de um
redundante... Afinal, é possível educar fora de um ambiente, de
espaço, de uma cultura?
um espaço, de uma cultura? A impossibilidade é visível, mas a
expressão Educação Ambiental se justifica, afinal, pelo simples
fato de que serve para destacar dimensões esquecidas pelo fazer educativo, no que se refere ao enten-
dimento da vida e da natureza, em suas dimensões físicas, históricas, políticas, culturais etc.
Portanto, para entendermos Educação Ambiental, nosso primeiro olhar deve estar voltado à
educação. Afinal, qual o papel da educação? Saviani (1997) explica que o homem de hoje é resultado
daquilo que criou como espécie, mas, sobretudo, como ser histórico. Ou seja, ao transformar a na-
tureza para criar a humanidade em si, o homem construiu uma série de manifestações, de conheci-
mentos e técnicas cuja apropriação tornou-se imprescindível à adequação dos indivíduos no conjunto
da sociedade, para sobreviver no ambiente. Podemos entender essa apropriação, essa transmissão de
conhecimentos de geração a geração como um ato educativo.
Assim, a educação tem como objetivo a identificação da cultura, que deve ser apropriada para
que nos tornemos humanos. O fato de transcendermos as possibilidades de cada época, de modo que
novos conhecimentos e atitudes sejam criados e repassados a outros indivíduos, faz com que nossa ca-
pacidade de transformação seja intensa e constante e demonstra nossa dependência do ato educacio-
nal. Ademais, do ponto de vista sociopolítico, todos têm direito à apropriação desses conhecimentos,
fruto do trabalho histórico, para que se desenvolvam e estejam seguros quanto aos constrangimentos
e discriminações que a falta desses mesmos instrumentos possa ocasionar. Daí a importância e o valor
da educação.
Em suma, a educação corresponde aos processos de transmissão/assimilação de conhecimentos, va-
lores, condutas e práticas produzidos historicamente, necessários à compreensão das estruturas individu-
ais e coletivas, sem as quais o ser humano jamais se produziria como tal. Educar é possibilitar a apreensão
fundamental para a construção histórica humana em cada indivíduo.

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“[...] o trabalho educativo é Onde fica o ambiente nesse contexto? O ambiente sempre
o ato de produzir, direta e existiu do ponto de vista educacional. Afinal, o próprio saber/
intencionalmente, em cada fazer humano só existe em consequência da transformação/
construção/entendimento desse ambiente. Ambiente é o lugar
indivíduo singular,
onde vivemos, suas dimensões naturais, tanto quanto a cons-
a humanidade que é truída pelo ser humano, individual e coletivamente, expressa
produzida histórica e fisicamente, culturalmente, simbolicamente, em termos de re-
coletivamente pelo lações.
conjunto dos homens” A educação nos ajudou, de certa forma, a construir nossa
(Saviani, 1997, p. 17). atual relação com o ambiente. Afinal, do ponto de vista históri-
co, podemos observar a existência de uma relação direta entre a
educação e o ambiente, o que torna possível um melhor entendimento dos proble-
mas ambientais com que hoje nos deparamos. Pois, se construímos ao longo dos
anos uma relação de exploração com o ambiente, a educação repassou esse tipo de
relação, construída historicamente, até os dias de hoje.
Saviani (1997) nos explica melhor essa relação ao abordar o conceito de
trabalho. Para esse autor, o homem, diferentemente dos demais animais, necessita
produzir continuamente sua existência para garantir a continuidade de sua espé-
cie. Para tanto, ele transforma a natureza, adaptando-a a sua realidade, e o faz por
meio do trabalho. Constrói assim atividades de ação intencional, transformando a
natureza de forma a criar um ambiente humano, o ambiente da cultura. Comple-
ta a ocupação humana do espaço em que o ambiente não é mais o natural e sim
aquele construído pelos homens, para os homens. Danosa ou não, essa ocupação
humana do espaço é transmitida de geração a geração, pela necessidade de manu-
tenção do modo de vida construído historicamente. Visto dessa forma, fica claro
como a evolução histórica desse conceito de trabalho, e a própria organização do
trabalho em nossa sociedade, transformou a natureza a ponto de colocar em risco
o planeta e todos os seres que o habitam.
Porém, se é possível reconhecermos a fonte desse problema em nossa cultura
e nos princípios educacionais que nos fazem repassar, continuamente, essa forma
de atuação humana que nos têm causado tantos problemas, é possível também en-
contrarmos parâmetros para as mudanças desses paradigmas e a consolidação de
uma forma de atuação mais respeitosa para com o ambiente. É nesse sentido que a
Educação Ambiental tornou-se uma necessidade indiscutível, uma das principais
formas participativas de incentivo às novas gerações para que estejam cientes e
atuem criticamente na manutenção dos ambientes, possibilitando uma melhoria
na qualidade de vida.
No processo educacional, em função da situação do ambiental atual, a
emergência de novas ideias e valores tornaram necessária a inclusão de uma
Educação Ambiental que se comprometa em formar indivíduos ambientalmen-
te mais conscientes. No entanto, não se pode dizer que a ação da Educação
Ambiental esteja ligada à questão educacional unicamente como uma forma de
transmissão de conhecimentos, sem qualquer atuação prática. É preciso lembrar

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que os problemas ambientais não são resultado apenas da nossa “falta de conhe-
cimentos” mas também decorrem do tipo de interação, exploração e ocupação
que o homem faz do ambiente e que tem impedido as possibilidades de recons-
trução desse ambiente.
Segundo Rousset (2000), a origem da crise ecológica contemporânea está
no produtivismo e, portanto, as soluções devem se basear na modificação do fun-
cionamento ou produção das sociedades humanas, responsável pelas poluições,
contaminação das águas, escassez de matérias-primas e recursos, destruição de
ecossistemas naturais, além dos fatores sociais e políticos, todos intimamente li-
gados à desigualdade social, responsável por outra série de repercussões nas rela-
ções sociais e ambientais do nosso modo de vida.
Nesse contexto, é preciso que a educação forneça algo mais do que a forma-
ção da individualidade, sendo importante, dessa maneira, reformular parâmetros
para uma educação cidadã. Segundo Porto-Gonçalves (1990), o modo como co-
nhecemos e identificamos a natureza se reflete nas relações sociais e na cultura
de nossa sociedade, servindo de suporte ao nosso modo de vida e de produção.
Assim, a solução para os problemas ecológicos atuais está contida determinan-
temente na reformulação de nossos parâmetros de sociabilidade. Assim, não faz
sentido separar a problemática ecológica da social. “A Educação Ambiental surge
como uma necessidade quase inquestionável pelo simples fato de que não existe
ambiente na educação moderna. Tudo se passa como se fôssemos educados e edu-
cássemos fora de um ambiente” (Grün, 1996, p. 21).
O próprio movimento ambientalista surgiu a partir de um questionamento
sobre uma série de valores da sociedade capitalista. O consumismo exagerado, as
guerras e a destruição da natureza fizeram com que os homens se questionassem
sobre a relação intrínseca entre conservar e sobreviver.
É preciso entender, no entanto, que a ação frente aos problemas ambientais
demorou a se estruturar por depender, intrinsecamente, da concepção da relação
entre homem e natureza, fator determinante para o tipo de interação que o ser hu-
mano manteve com o ambiente ao longo dos anos. Lembremos que a organização
da sociedade moderna, inclusive na política, nas ciências e nas artes, foi marcada
pelo cartesianismo, o dualismo entre homem e natureza. Nesse contexto, a nature-
za era vista apenas como um objeto de estudo, já que o homem era o único “sujei-
to” em relação ao conhecimento. Essa característica representa um dos princípios
do antropocentrismo, do humanismo, pelo qual o homem configura o centro de
todas as relações. O homem era o sujeito do estudo ambiental e contemplava o
ambiente como algo externo a si. No entanto, a preocupação com a conservação
do ambiente foi se tornando forte demais. Atrelada a ela, vinha a necessidade de
se abandonar esse modelo maniqueísta, que distanciava o homem do ambiente nas
ciências e na sociedade de uma forma geral. Ao final dos anos 1980 e início dos
anos 1990, a preocupação da Educação Ambiental era trabalhar em integração
com a natureza. O homem é parte do ambiente e por isso reproduz em si toda a

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historicidade e a cultura em que está inserido. A busca da contextualização his-


tórica faz com que o indivíduo se compreenda dentro da relação com o ambiente,
comprometendo-se com uma ética de respeito às gerações passadas e às futuras.
Todas as transformações de parâmetros éticos sobre a relação entre homem
e natureza, e a preocupação com as formas de implantação desses pensamentos no
decorrer das últimas décadas, foram fortemente influenciadas por manifestações
que reclamavam mudanças, incluindo entre elas as várias conferências, congres-
sos, textos e debates vinculados ao tema ambiental. E é no contexto dos documen-
tos produzidos por esses eventos que encontramos a Educação Ambiental vista
como fundamental para alcance da sustentabilidade.
A Educação Ambiental surge como estratégia de ação, pela primeira vez,
em junho de 1972, na Suécia, na primeira Conferência Mundial sobre Meio Am-
biente e Desenvolvimento. Num documento intitulado Declaração de Estocol-
mo, cuja elaboração propunha princípios básicos para a utilização racional dos
recursos ambientais, relacionando-os ao aumento da população e todas as impli-
cações sociais, econômicas e ambientais advindas desse processo, encontramos
a recomendação de um programa internacional de Educação Ambiental a fim de
educar o cidadão comum para o importante papel do manejo e do controle do
meio ambiente (DIAS, 1991). Posteriormente, organizada pela Organização da
Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Tecnologia (Unesco), a Conferência
Intergovernamental de Educação Ambiental, em Tbilisi (capital da Geórgia, na
ex-União Soviética), no ano de 1977, foi de grande importância para o desenvol-
vimento da Educação Ambiental no mundo. Foram definidos objetivos e caracte-
rísticas da Educação Ambiental:
[...] ainda que seja óbvio que os aspectos biológicos e físicos constituem a base natural do
meio humano, as dimensões socioculturais e econômicas, e os valores éticos definem, por
sua parte, as orientações e os instrumentos com os quais o homem poderá compreender e
utilizar melhor os recursos da natureza com o objetivo de satisfazer as suas necessidades.
(COMUNIDADE DE ESTADOS INDEPENDENTES, 2001)

Nessas linhas, fica clara a intenção internacional de trazer a questão


ambiental para o contexto educacional como princípio fundamental para a
construção de sociedades sustentáveis. Em 1992, a Conferência da Onu sobre
Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Eco-92, também abriu importantes cami-
nhos em prol da Educação Ambiental. No capítulo 36 da tão conhecida Agenda 21,
podemos observar as diretrizes gerais para a organização intencional da Educação
Ambiental. Em forma de síntese, podemos dizer que ali encontramos a Educação
Ambiental voltada para o desenvolvimento sustentável.
36.3. O ensino, inclusive o ensino formal, a consciência pública e o treinamento devem
ser reconhecidos como um processo pelo qual os seres humanos e as sociedades podem
desenvolver plenamente suas potencialidades. O ensino tem fundamental importância na
promoção do desenvolvimento sustentável e para aumentar a capacidade do povo para
abordar questões de meio ambiente e desenvolvimento. Ainda que o Ensino Básico sirva
de fundamento para o ensino em matéria de ambiente e desenvolvimento, este último
deve ser incorporado como parte essencial do aprendizado. Tanto o ensino formal como o
informal são indispensáveis para modificar a atitude das pessoas, para que estas tenham
capacidade de avaliar os problemas do desenvolvimento sustentável e abordá-los. O ensi-
no é também fundamental para conferir consciência ambiental e ética, valores e atitudes,

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técnicas e comportamentos em consonância com o desenvolvimento sustentável e que favo-


reçam a participação pública efetiva nas tomadas de decisão. Para ser eficaz, o ensino sobre
meio ambiente e desenvolvimento deve abordar a dinâmica do desenvolvimento do meio
físico/biológico e do socioeconômico e do desenvolvimento humano (que pode incluir o
espiritual), deve integrar-se em todas as disciplinas e empregar métodos formais e informais
e meios efetivos de comunicação. (MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE, 2005)

Portanto, a Educação Ambiental para a sustentabilidade é muito mais do


que a assimilação de conceitos e conhecimento sobre o ambiente. A Educação
Ambiental será responsável por uma nova relação do eu com o outro e com o
mundo. A preocupação é formar indivíduos e cidadãos comprometidos não só
com as próprias necessidades e as necessidades dos outros, mas interessados em
reformular essas necessidades, em reconhecer o que de valioso existe na vida, e
na relação com o mundo. Isso implica um conhecimento interno muito aprofun-
dando, filosófico, existencial, mas também um forte engajamento na partilha da
responsabilidade, por meio da participação radical. Assim, a Educação Ambiental
se traduz em um processo contínuo, constante, em busca da prática da democracia
e da participação radical dos indivíduos em decisões que se traduzam, para todos
nós, em qualidade de vida.
A mudança, em termos práticos, começa pela transformação do nosso olhar
sobre a educação, tanto em espaços formais como em caráter informal.

Educação Ambiental no âmbito escolar


A Educação Ambiental vem firmando seu importante papel na formação do
indivíduo, contribuindo para o exercício de sua cidadania.
Na Conferência de Tbilisi (1975), a Educação Ambiental foi pensada no âm-
bito educativo, por sua inserção no conteúdo e na prática escolar, orientada para a
resolução de problemas concretos do meio, com um enfoque interdisciplinar e uma
participação ativa e responsável de cada indivíduo e da coletividade (DIAS, 2000).
As questões ligadas ao meio ambiente foram introduzidas no panorama da
Educação no Brasil por meio dos Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL,
1997), como tema transversal a ser trabalhado permeando todas as áreas do co-
nhecimento escolar. Ou seja, a Educação Ambiental deve estar inserida nos currí-
culos de forma transdisciplinar, favorecendo assim a noção de complexidade das
questões ambientais. Tendo, portanto, enfoque interdisciplinar e transdisciplinar.
Sato (2003, p. 24) descreve que “o ambiente não pode ser considerado um objeto
de cada disciplina, isolado de outros fatores, ele deve ser abordado como uma
dimensão que sustenta todas as atividades e impulsiona os aspectos físicos, bioló-
gicos, sociais e culturais dos seres humanos”.
Esse é um importante princípio da Educação Ambiental e deve ser levado
em consideração na construção dos novos currículos. Além disso, essa visão
desmistifica aquela de alguns que ainda acreditam que a Educação Ambiental
deve se transformar em uma disciplina escolar. Segundo Carvalho (2004), tanto
nos PCN como na Política Nacional de Educação Ambiental a inclusão de uma
disciplina da área é categoricamente rejeitada para os ensinos fundamental e
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médio, podendo ser adotada, somente quando necessário, apenas no Ensino Su-
perior. O caráter da EA deve ser sistêmico e integrador, e não acomodado a uma
disciplina (CARVALHO, 2004).
Sato (2003) ressalta ainda outra característica ou princípio da EA no que
se refere ao currículo escolar. A EA deve favorecer a ludicidade, a brincadeira, o
dinamismo, como método para o favorecimento do engajamento e da participação
na discussão ambiental. Nesse sentido, a autora ressalta que a inclusão da temática
ambiental nos currículos escolares deve acontecer a partir de atividades diferencia-
das que possam conduzir os alunos a serem agentes ativos no processo de formação
de conceitos. Sendo o professor o mediador do processo de ensino e aprendizagem,
cabe a ele propor novas metodologias que favoreçam a implementação da EA.
Nessa perspectiva, o uso de materiais sobre os temas ambientais em sala de
aula no processo de ensino e aprendizagem pode servir como fonte de informa-
ção. No entanto, não devem ser utilizados com exclusividade. A diversidade entre
esses materiais deve ser a mais ampla possível. A utilização de materiais diversi-
ficados como revistas, jornais, propagandas, filmes, faz com que o aluno sinta-se
inserido no mundo a sua volta (BRASIL, 1997).
Além disso, é preciso dizer que os conteúdos devem ser discutidos e traba-
lhados de forma coletiva, buscando conhecimentos não somente do professor, que
também possui uma leitura individual do mundo, mas também dos educandos,
como nos sugere Meyer (1991, p. 42):
Reconhecendo que a escola não é o único local de aprendizado e que o processo educativo
não se inicia nem se esgota no espaço escolar, torna-se fundamental dialogar com o conhe-
cimento que as pessoas têm acerca do ambiente, aprendido informalmente e empiricamente
em sua vivência e prática social, respeitando-as, questionando-as, levando-as a repensarem o
aprendido. Enfim, possibilitando que elas formulem e expressem suas ideias e descobertas, e
elaborem os seus próprios enunciados e propostas.

Essas e outras características devem ser levadas em consideração ao se


incorporar a EA aos currículos escolares. No entanto, não existe uma fórmula,
um método onívoro e completo. O educador também deve viver a experiência de
construir essa possibilidade, agregando a ela o seu próprio modo de entender a
Educação. A base primeira de um bom entendimento e treinamento está na dis-
cussão coletiva dos conteúdos, dos métodos, das experiências para uma Educação
que seja o alicerce para um novo conceito de sociedade.

Educação Ambiental
em espaços não formais
Sabemos que educar não é exclusividade do ensino escolar. Todas as pes-
soas possuem uma leitura de mundo que é anterior e ulterior àquela do ambiente
escolar: as vivências práticas, do cotidiano, do mundo do trabalho, da espiritua-
lidade, que complementam o ser humano em todos os âmbitos de sua vida e de
sua relação com o ambiente. A Educação Ambiental, nesse sentido, pode ser uma

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prática atrelada a qualquer grupo de trabalho, grupo social, ONG, associação de


moradores, sindicatos, entre outros.
Mas qual o papel da Educação Ambiental para esses grupos, como deve ser
estruturada? Quais são os princípios norteadores desse trabalho?
Obviamente que os princípios da Educação Ambiental são os mesmos para
todo o trabalho na área. No entanto, as metodologias devem ser apropriadas ao
público-alvo, favorecendo a proximidade do tema com o grupo que pretende es-
tudá-lo. Por exemplo, no caso de um grupo de sindicato, as metodologias devem
ser iniciadas pelo próprio movimento de consciência de classe, sobre as questões
relativas aos direito e deveres do trabalhador, para então inserir outros grupos
de discussão. No caso de um grupo de crianças de um bairro, por exemplo, as
metodologias devem ser trabalhadas de forma lúdica, como uma brincadeira,
tentando buscar nesses indivíduos os temas mais interessantes para serem pro-
blematizados. Como esses, outros exemplos demonstram que cada grupo merece
uma atenção particular, especial, mas, de qualquer forma, o envolvimento com o
conhecimento deve nortear esses trabalhos por um novo ambiente, internalizado,
do saber.
Em qualquer situação, tanto em cada pessoa, individualmente, quanto conectivamente,
no interior de pequenos grupos ou equipes dentro de uma turma de alunos, ou envolven-
do toda a turma, há um trânsito contínuo entre o-que-já-se-sabe e o-que-se-vai-saber:
um intervalo desigualmente sempre transponível entre aquilo que se reconhece como
um-saber-da-turma (de um grupo e, na sua unidade menor, de um aluno individualmen-
te), como algo já-aprendido, e aquilo, muito próximo, que-ainda-não-se-sabe: aquilo
que está-para-ser-aprendido, que vai-ser-aprendido. Que será aprendido como a fração
cultural do saber socialmente disponível. A fração de algum conhecimento, valor ou
o que seja, vindo da experiência vivida, vindo de algum ramo da ciência, vindo da
literatura, vindo de... que o contexto das interações entre as pessoas “ali” criou. E que,
então, cada um individualmente, cada pequena unidade afetiva e relacional de uma
“turma de alunos” irá incorporar aos seus processos e às suas estruturas cognitivas de
conhecimento-aprendido-e-agora-sabido. (Brandão, 2003, p. 116-117)

Os objetivos, de uma forma geral, também são os mesmos, A Educação Ambiental


a Educação Ambiental deve capacitar o indivíduo a agir individu- deve capacitar o
al e coletivamente, amparado pelo olhar da sustentabilidade. Ob-
indivíduo a agir
viamente, cada grupo possui uma dinâmica e uma busca por uma
série de respostas que é interna ao grupo, e o educador ambiental
individual e coletivamente,
deve respeitar essas expectativas. O trabalho deve começar por amparado pelo olhar
satisfazer as necessidades dos grupos, de forma a fazer com que da sustentabilidade.
os indivíduos se sintam interessados pelo processo educativo e compartilhem com
os outros esse momento, na internalização de novos conhecimentos construídos
coletivamente.
Muitas vezes, os temas e objetivos desses grupos estão relacionados com
seu fortalecimento interno, tanto na promoção da participação, no engajamento
da comunidade nas questões ambientais em que se inserem, como na problema-
tização e no enfrentamento das questões relacionadas à qualidade de vida.
Dessa maneira, os indivíduos são convidados a participar do processo am-
biental, aprendendo a dialogar com o outro na busca da compreensão do seu am-

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biente. O processo é o de troca de ideias, de valores, de conhecimentos, na busca


por um saber contextualizado, abrangente, construído sob o ponto de vista de toda
a comunidade. Não se trata, portanto, de conhecer apenas como se estruturam as
interações ecológicas, como reciclar resíduos, ou como diminuir o consumo de
água: trata-se de conhecer as reais necessidades de conhecimento do grupo que
está inserido na ação, buscando com isso trabalhar pela melhoria do seu ambiente
e conhecer a melhor forma de atuação nesse ambiente. Por isso, os temas são mui-
to variados, desde questões relacionadas aos indicadores de qualidade de vida,
como o conhecimento da história do ambiente, buscando com isso adquirir uma
sensação de pertencimento ao lugar. Para Brandão (2003, p. 91), a relação com
a realidade que se procura estudar cresce quando a olhamos de forma coletiva e
intencional, sendo possível uma mistura entre conhecimentos e subjetividades:
Ele está situado na tomada de consciência de que quando eu convoco aquilo que procuro
estudar, a sair do lado da coisa e da estrutura formal para o lado da relação e do aconteci-
mento vivenciado, a minha interpretação, qualquer que ela seja e de onde quer que venha,
não pode mais ser dada através de um discurso axiomático-dedutivo e inevitavelmente re-
dutivo, mas em uma compreensão fundada na aventura assumida da intersubjetividade.

De qualquer forma, grande parte desse trabalho só faz sentido se buscar


inserir a participação como metodologia. A participação é o grande pilar dos
programas informais de Educação Ambiental. Principalmente com relação aos
trabalhos com adultos.
A intenção, acima de tudo, é formar indivíduos empenhados em seu papel
participativo, capazes de usar suas ideias, sua vontade e sua voz na busca de cada
vez mais espaço, de possibilidade de decisão, de luta reivindicatória. A luta é pela
plena e absoluta construção de cidadãos.

Educação Ambiental e cidadania


Na Educação Ambiental, há uma grande distância entre informar e formar.
Não basta transmitir inúmeras informações sobre o que se deve fazer e o que pode
melhorar o ambiente: é preciso formar cidadãos conhecedores dessas questões,
indivíduos que não só ouçam mas que também procurem conhecer sobre a reali-
dade ambiental. Indivíduos que se comprometam com as mudanças necessárias à
qualidade ambiental de forma autônoma e responsável.
A Educação Ambiental tem, portanto, um caráter humanizador, formador,
e deve favorecer a compreensão e desvelar as determinações impostas pela reali-
dade humana, de forma a reconstruir em si os valores de civilidade e humanida-
de construídos historicamente. Ou seja, deve instrumentalizar o indivíduo para
compreender e agir de forma autônoma, por meio das relações sociais, sobre sua
própria realidade histórica. Deve contribuir na promoção de indivíduos críticos e
reflexivos capazes de pensar e repensar sua própria prática social.
Segundo Loureiro (2004), é na construção de uma nova ética que se trabalha.
Uma ética que tenha como base a reflexão sobre a complexidade da prática social
para, partindo dela, construí-la sob um ponto de vista novo, ecológico. Ecológico no
sentido de que represente um “embate democrático entre ideias e projetos que buscam
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a hegemonia na sociedade e no modo como esta se produz e se reproduz, problemati-


zando valores vistos como absolutos e universais” (LOUREIRO, 2004, p. 51).
Só assim a Educação Ambiental pode construir na base do pensar e do agir
o princípio da responsabilidade com o outro, do bom-senso, da cidadania e do res-
peito para a resolução dos problemas que são tanto individuais como coletivos, na
busca por relações mais harmônicas entre todos, e com o ambiente. Dessa forma,
o respeito à diversidade também surge como manifestação autêntica, porque não
há nada mais belo do que a versatilidade dos seres vivos, das culturas, das mani-
festações naturais (SATO, 2003).
É para isso, afinal, que nos serve o conhecimento: para ajudar na melhoria
de nossas vidas, na elaboração de nossas vontades, de nossos desejos. O conheci-
mento apreendido a partir da experiência com o outro, buscando nessa relação uma
nova ética de compromisso, de cidadania, de expectativas comuns, possui um alto
potencial modificador e ordenador da busca pela felicidade comum. Poeticamente,
Brandão (2002, p. 18) nos diz que
Pouco a pouco aprendemos a relativizar a história de longos ciclos, centradas em gran-
des feitos, grandes momentos e grandes heróis, para nos voltarmos às múltiplas histórias
culturais de antecedentes, contemporâneos e consócios como nós mesmos. Nós ao lado
de tantas pessoas “sem nome em placas de rua” mas de um passado remoto, os verdadei-
ros heróis da “nossa história”, porque a geração de mulheres e homens são os constru-
tores cotidianos do que esteve e está aí como uma cultura. A nossa cultura. Habitantes
de carne e osso da criação de cotidianos que são, de uma comunidade de Belém Velho, a
Porto Alegre, ao Rio Grande do Sul, ao Brasil, a outros amplos círculos de nosso Mundo,
antes e agora, criadores de sociedades, de culturas e de histórias, tanto ou mais do que
heróis montados a cavalo. E então, poderemos descobrir, junto com as inúmeras pessoas
das muitas comunidades populares, que aqueles heróis esporadicamente aparecem em
momentos de uma história cujo dia a dia somos nós, as pessoas comuns, quem constrói
e quem, portanto, pode dar sentido e transformá-la. (BRANDÃO, 2002, p. 188)

A Educação Ambiental procura, portanto, trazer ao indivíduo a importân-


cia de problematizar sobre suas necessidades reais, buscando no mundo muito
mais do que a aquisição material, mas sim novas relações com os outros, novas
formas de tratar a diversidade, numa crítica radical da modernidade por meio da
prática da cidadania e de uma ética ecológica em que o outro e o ambiente não
sejam esquecidos e possam fazer parte do sonho de felicidade de todo nós.

1. Cada aluno deve criar um conceito de Educação Ambiental.


2. Depois, devem ser formados grupos em que serão discutidos esses conceitos e recriado um
novo conceito, do grupo todo.
3. Os alunos devem representar esse conceito do grupo em forma de teatro, ou por meio de um
desenho, uma frase, um símbolo.
4. Apresentar a conclusão para os demais grupos.
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