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FACULDADE FRASSINETTI DO RECIFE

CURSO DE GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA

TRABALHO DA DISCIPLINA
DE DESENVOLVIMENTO PSICOLÓGICO II:
ADOLESCÊNCIA

Recife, 03 de maio de 2022


FACULDADE FRASSINETTI DO RECIFE

CLARA BRILHANTE DA NÓBREGA BUARQUE


GIOVANNA GUEDES DE BARROS PERES
MARIA EDUARDA MAGALHÃES C. A. MOTTA
MARIA EDUARDA SAMPAIO DE PONTES JARDIM
NICOLE SALDANHA FELLICE

VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES

Trabalho apresentado no curso de


graduação em psicologia, na Faculdade
FAFIRE, como requisito parcial para
obtenção de nota na disciplina
Desenvolvimento Psicológico II:
Adolescência
Professora da disciplina: Joelma
Correia.

Recife, 03 de maio de 2022

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RESUMO:

Uma em cada quatro das violações dos direitos da criança e do adolescente é de cunho
da violência sexual. Entendemos-a como uma violência estrutural, de caráter culposo
exclusivo do abusador e ressaltamos a existência das questões estruturais sociais, históricas e
governamentais por trás desta violência. Com isso, evidenciaremos diante da temática
abordada, a importância da disseminação do tema Violência Sexual em todos os espaços
públicos e privados, da operação de diversas redes de apoio que devem, indispensavelmente,
ir além das famílias e das políticas públicas que são, por vezes, disfuncionais e ineficazes.
Avaliamos diversos pontos fundamentais para entender a problemática da violência
sexual, como os tipos de violência, as diferenças entre a exploração e o abuso, a
transgeracionalidade, as famílias disfuncionais, os sinais e as repercussões que a criança e o
adolescente apresentam (sendo essas questoes subjetivas), os canais de escutas, as políticas
públicas e como nós, enquanto sociedade e futuros profissionais de psicologia, podemos agir
diante destas situações.
Este trabalho tem como objetivo ressaltar os principais aspectos da violência sexual,
sendo ela abordada em uma dimensão intrafamiliar e extrafamiliar, por conseguinte dando
enfoque as questões sexuais, libidinosas, subjetivas e comportamentais da criança e do
adolescente, vítimas do abuso e também as principais pautas do individuo agressor.

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SUMÁRIO:

1.0 INTRODUÇÃO ………….……………………………………………………………… 4


2.0 DESENVOLVIMENTO……...……………………………………………………………5
2.1 TIPOS DE VIOLÊNCIA…………………………………………………………………. 5
3.0 VIOLÊNCIA SEXUAL…….……………………………………………………………..6
4.0 SINAIS QUE DENUNCIAM A VIOLÊNCIA SEXUAL..……………………………….7
5.0 QUESTÕES SUBJETIVAS E SUAS REPERCUSSÕES..………………………………..8
6.0 CANAIS DE ESCUTA……………………………...…………………………………….9
6.1 POLÍTICAS PÚBLICAS………………………………………………………………...10
7.0 TRANSGERACIONALIDADE……………...…………………………………… ... ... 10
8.0 CONSIDERAÇÕES FINAIS ……………………………………………………………12
9.0 REFERENCIAS…………………………...……………………………………………..13

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1.0 INTRODUÇÃO:

É muito frequente a ideia de que a violência sexual ocorre apenas quando existe a
penetração, mas na verdade, há dentro dessa pauta uma dimensão muito mais ampla. A
penetração é apenas um aspecto que dá amplitude a toda uma problemática.
Essa violência transpassa desde atos libidinosos – como um toque não apenas de
carinho, mas que carrega uma intenção mais incestuosa, mais sexualizada – até atos que não
necessitam do toque em si. O voyeurismo, por exemplo, é o olhar invasor por parte do adulto
que demonstra desejo e é recebido com incômodo pela criança e/ou adolescente. Permitir o
acesso de filmes ou cenas de sexo explícito, com a intenção de tornar a criança mais
susceptível a aquele tipo de ato, é outro exemplo de abuso sexual sem toque ou penetração.
Ou seja, não é necessário o toque físico para que alguém seja vítima de abuso.
Diante disso, entendemos que a violência sexual é qualquer ação ou intenção que não
carregue um ato de ternura, cuidado e respeito para com a sexualidade da criança e/ou do
adolescente e os coloquem em um lugar de coisificação, onde esses pequenos serão usados
como objetos dos quais o adulto irá usurfruir e desmerecer os méritos do infanto e do purbere
para satisfazer seu prazer.

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2.0 DESENVOLVIMENTO:

A violência sexual é compreendida como todo e qualquer ato ou intenção sexual,


única ou repetida, com ação proposital, seja ele em relação hetero ou homossexual, no qual as
crianças e os adolescentes são submetidos a atividades sexuais em que são incapazes, por lei,
de darem consentimento ou para as quais não estão preparados devido a seu estágio
desenvolvimental. Nessa prática, o adulto estimula sexualmente as crianças e os adolescentes,
utilizando-os para obter satisfação pessoal; a sexualidade das crianças é invadida por esse
outro que não necessariamente precisa tocá-la, já que a violência sexual pode se caracterizar
não só como física, mas também como psicológica.
Além destes, existem outros tipos de violência sexual como assédio, voyeurismo,
exibicionismo, pornografia, estupro e exploração sexual das crianças e dos jovens, das quais
serão explicitados mais adiante. É importante pontuar que a violência sexual é um ato
criminoso, sendo dever do Estado a proteção à criança e ao adolescente, de acordo com o
Artigo 130 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), e dever cívil a denúncia contra
todo e qualquer tipo de violência contra crianças e adolescntes.

2.1 TIPOS DE VIOLÊNCIA:

A violência referente às crianças e adolescentes na realidade brasileira contemporânea


é um sério agravante e já é reconhecido como problema relevante na saúde pública. No que
diz respeito aos tipos de violência, podemos citar a violência física, psicológica, sexual,
doméstica, a negligência e o abandono. A primeira é caracterizada a partir da constatação do
uso de força física contra a vítima, de maneira intencional, que ofenda sua saúde e
integridade corporal, podendo ou não deixar marcas no corpo – porém ainda assim lhe
causando sofrimento físico. Em casos extremos, a vítima pode vir a óbito e geralmente essas
ações vêm por parte dos próprios pais ou responsáveis. Podemos dizer então que, a violência
física consiste em uma relação conflitante de força baseada no poder do adulto e nessa
desigualdade entre adulto e criança.
A violência psicológica é a mais difícil de ser identificada e pode acarretar em
diversos danos no desenvolvimento dos jovens, tendo um conjunto de atitudes, palavras ou
ações a fim de envergonhar, censurar, pressionar, humilhar ou ridicularizar a criança ou
adolescente. O resultado dessa violência é reconhecido através dos danos psíquicos, sexuais,
emocionais, sociais ou até mesmo físicos. Porém, enquanto de fato algumas agressões
possam passar despercebidas, outras, em alguns casos, podem ser mais evidentes, como os
xingamentos, humilhações e as chantagens emocionais. Todas essas características têm por
finalidade a intenção de fragilizar o estado emocional e psicológico da vítima.
Já a violência doméstica é “todo ato ou omissão praticado por pais, parentes ou
responsáveis contra criança e ou adolescente que, sendo capaz de causar à vítima dor ou dano
de natureza física, sexual e/ou psicológica, implica, de um lado, uma transgressão do
poder/dever de proteção do adulto. De outro, leva à coisificação da infância, isto é, a uma
negação do direito que crianças e adolescentes têm de serem tratados como sujeitos e pessoas
em condição peculiar de desenvolvimento.” (Azevedo; Guerra, 1998, p. 32). Em relação à
violência por negligência, pode-se afirmar ser a mais comum contra os menores de idade e

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acontece a partir das omissões dos responsáveis em sua responsabilidade e obrigação de
prover os cuidados básicos do cotidiano da criança e do adolescente, como alimentação,
higiene, educação, cuidados médicos, vacinas, falta de apoio emocional e psicológico, entre
outras privações dos direitos que têm as crianças e adolescentes assegurados pelo ECA. O
abandono é uma forma de violência parecida com a negligência, também é caracterizada pela
ausência do responsável pelos jovens no que se tange à educação e cuidados básicos
obrigatórios, e existem duas definições para o abandono: parcial e total. O abandono parcial
define-se pela ausência dos pais ou responsáveis, colocando a criança ou adolescente em
situação de risco; enquanto o abandono total é o distanciamento da família ou do grupo
responsável, deixando os de menores desamparados, expostos a diversas formas de perigo.
Por fim, a violência sexual, como o prisma principal deste trabalho, aborda diversas
variantes. É fundamental iniciar esta pauta ressaltando que a violência sexual não consiste
apenas numa violação à liberdade sexual, abarca acima de tudo a violação dos direitos
humanos. De acordo com as leis brasileiras, a ocorrência de violência é presumida em
qualquer ato ou intenção sexual praticado por adultos contra jovens cuja idade seja inferior a
de 14 (quatorze) anos. Entretanto, diversas outras práticas sexuais entre adultos e jovens
acima de 14 anos também são consideradas violências sexuais, conforme varie o contexto:
grau de parentesco ou status de responsabilidade entre o adulto e o de menor, dos meios
aproveitados e usufruídos para o alcance do ato sexual e da existência ou não de
consentimento, ainda que toda autorização vinda do menor, seja, perante a lei, invalidada.

3.0 VIOLÊNCIA SEXUAL:

Comumente, a violência sexual é classificada pelas modalidades de abuso sexual


intrafamiliar, extrafamiliar e exploração sexual comercial. O abuso sexual é referido a toda
situação em que adultos utilizem crianças ou adolescentes para sua gratificação sexual. O uso
do poder pela discrepância etária e desenvolvimental entre abusado e abusador é o maior
ponto identificador dessa situação. A criança encontra-se numa fase onde sua sexualidade
está gradativamente se despertando e o abusador se aproveitará disso para firmar o
acobertamento da situação.
De acordo com a OMS, em 65% dos casos de abuso sexual o suspeito é do grupo
familar da criança ou do adolescente e, em apenas 10% dos casos, as vítimas não o conhece.
O abuso sexual intrafamiliar é qualquer relação sexual entre um adulto e uma criança ou um
adolescente que exista um laço familiar onde o abusador dispõe de um certo poder sobre
esses jovens, cujo poder possa ser de linha hierárquica e/ou econômica e até mesmo afetiva.
O abuso sexual incestuoso ultrapassa as questões sanguíneas, podendo ser considerado
também em casos de famílias adotivas.
Quando pensamos através de uma visão psicanalítica, entendemos que o édipo é o
limitador dos desejos sexuais incestuosos inconscientes dos filhos para com seus pais. As
idealizações que surgem a partir do pensamento da criança de que sua mãe ou seu pai, ou
ambos, são seus objetos de amor e de prazer, são conceituações comuns e saudáveis. É a
partir do limite edipiano que essas crianças entendem que podem satisfazer seus desejos
sexuais com quaisquer pessoas, exceto seus pais. Entretanto, esse limite não é estabelecido no
abuso sexual intrafamiliar. Existe um mito de família feliz estabelecido em toda a sociedade,

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alegando que essa instituição social irá, de antemão, assegurar proteção, modelos
identificatórios, transmissão de valores; é nesse campo familiar primário onde o indivíduo
espera sentir-se protegido, acolhido e respeitado.
Em contraponto, o que acontece na realidade é uma grande incidência de abusos
dentro da estrutura familiar, onde aquele que deveria proteger, dar à criança o limite que
castra a interdição do édipo e respeitar a lei da proibição do incesto, é exatamente aquele que
realiza o abuso sexual. A partir disso, tem-se em questão uma estrutura familiar disfuncional
fruto de um abuso sexual intrafamiliar.
O abuso sexual extrafamiliar é um tipo de abuso que ocorre fora do âmbito familiar.
Porém, de modo geral, o abusador também é alguém que a criança ou o adolescente conhece,
como, por exemplo, os vizinhos, amigos da família, educadores, líderes religiosos, médicos,
entre outras diversas possibilidades. Raramente o autor desse abuso é uma pessoa totalmente
desconhecida, estes seriam exemplos de estupros em locais públicos.
Diferentemente dos exemplos de abusos supracitados, a exploração sexual se
conceitua a partir da mercantilização do sexo, ou seja, o adulto oferece algo em troca por
sexo com a criança ou adolescente. O oferecido pode ser qualquer coisa que chame atenção
do jovem, como dinheiro, comida, direito à moradia, ou algum tipo de favor ou coação. A
exploração sexual também é caracterizada por tráficos de menores com fins sexuais,
pornografia e exploração sexual agenciada ou não agenciada, tirando. a necessidade de que
exista um intermediário.

4.0 SINAIS QUE DENUNCIAM A VIOLÊNCIA SEXUAL:

O abusado e o abusador não tem um perfil definido, situações de abuso acontecem


independente da classe social, do sexo, da religião, da cultura, se é intra ou extrafamiliar e
nem importa a estruturação familiar. A violência sexual pode acontecer literalmente em
qualquer contexto, lugar, pessoa, tanto para o autor da vioência, quanto para a vítima.
Os sinais revelados pelas crianças e pelos adolescentes são variados porque os abusos
também variam. Como já foi explicitado anteriormente, não é via de regra o abusado ficar
com marcas corporais, ou até mesmo se dar conta de que foi violado, acontecendo, muitas
vezes, da vítima só descobrir do abuso sofrido muitos anos após o ocorrido, e isso se dá por
consequência da falta de informações necessárias, da educação sexual e pela manipulação
bem sucedida por parte do abusador.
Muitos dos sinais podem aparecer como pesadelos, insônia, agressividade excessiva,
dificuldade para se alimentar, os indivíduos excessivamente sexualizados antes do tempo de
seu desenvolvimento, masturbação em excesso, quando vão brincar e procuram reproduzir o
que sofreram, dificuldades de aprendizagem, dificuldade de imaginação (que seria um
prejuizo/empobrecimento das fantasias), medo do toque fisico e o relacionamento difiícil com
pessoas do mesmo sexo de seu abusador. Esses são alguns dos sintomas, diante da
diversidade de outras vias de demonstração de abuso.

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Outros sinais revelados pela criança ou adoslencente são os sintomas físicos, caso o
indivíduo seja tocado – não necessariamente por um toque com intenção sexual – e essa ação
lhe causar medo, sensação de suor, dor de estômago ou angústias, tornando-se um sinal de
que algo está errado. Ou, ainda, quando o jovem é violento/agressivo em excesso, isso pode
indicar que ele capture esse exemplo em casa e esteja reproduzindo o comportamento
apreendido.

5.0 QUESTÕES SUBJETIVAS E SUAS REPERCUSSÕES:

As consequências da violência sexual para uma criança ou adolescente não resulta


apenas em questões fisicas, mas abrange em questões comportamentais e atitudinais que nem
sempre são expressadas de maneira explícita. As crianças e adolescentes vítimas de abuso
sexual acabam por ter, comumente, uma visão distorcida do mundo e dos relacionamentos,
podendo sofrer de baixa autoestima, isolamento social, problemas afetivos, dificuldades nas
relações interpessoais, culpa; além de ainda ficarem confusas em relação aos papéis e/ou
funções familiares, uma vez que aqueles que deveriam proteger, proporcionam o completo
oposto, afetando não só o desenvolvimento geral da criança abusada, mas principalmente o
desenvolvimento psíquico.
Por esse motivo, quanto antes as crianças tiverem acesso aos procedimentos
necessários, com acompanhamento médico e psicológico, maiores são as chances de
superarem a experiência traumática e aumentarem a oportunidade de seguirem uma vida mais
prazerosa e saudável. No que tange aos indicadores fisicos de um abuso sexual, podemos
citar como destaque as doenças psicossomáticas, algumas enfermidades da pele ou
digestivas, além de infecções urinarias, dificuldades de caminhar , dificuldades ao sentar,
lesões e outros.
É importante compreender, ainda, o silêncio por parte das crianças quando se trata de
violência sexual e as razões pelas quais ele existe. Muitos são os motivos que fazem as
vítimas decidirem por não contar aos familiares o ocorrido, seja a ameaça por parte do autor
da violência, seja o medo do descrédito daqueles que deveriam protegê-la, ou até a culpa
sentida por pensar ter provocado, merecido o que passou; e, muitas vezes, a criança sente
também medo das consequências que virão pelo ato da denúncia, uma vez que entendem as
repercussões geradas à sua família. Além disso, é interessante pontuar que existe um
mecanismo de defesa por parte das crianças e adolescentes que é uma certa identificação com
o agressor, quando ela recebe toda a culpa da violência sofrida, aceitando, assim, toda a
violência e abuso, acreditando ser merecedora dele. Com isso, a situação se perpetua,
havendo uma submissão do abusado para com o abusador, por essa identificação pela
manipulação, gerando uma situação bastante delicada e complicada de se sair.
Uma coisa imprescindível a ser destacada é que existe diferença quando o abuso é
contra crianças e contra adolescentes em vários aspectos, e também na questão da
culpabilização, já que a criança não é vista com capacidade de sedução. O adolescente, com a
maturação do corpo e maior desenvolvimento psicosexual, possuiria a habilidade de tomar a
iniciativa para a relação – ou outras formas de violência sexual –, sendo enquadrado na
possibilidade de ser o iniciador, provocador; tornando impune aquele que possui toda a culpa
e se tornando culpado. Com isso, é importante a atenção às possíveis acusações, em que

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podem se cometer erros inalteráveis na vida de uma vítima que se culpada – além das
sequelas geradas no psiquismo desse jovem.
O adolescente, por sua vez, não consegue lidar com a culpa, sente-se com baixa
autoestima e se dá conta de que aquele outro, o agressor, não o tratou com respeito, como
filho, mas sim como objeto, reafirmando a ideia de que violência sexual é uma coisificação
do ser humano. Há casos da culpa sentida pelo adolescente ser tamanha que o leva a cometer
atos contra si mesmo, chegando muitas vezes ao suicídio.
Para mais, existem vítimas que entram numa hipersexualidade ou sexualidade
precoce, outras entram num quadro de degradação, prostituição. Há também os casos de
repetições, nos quais, mais na frente, os abusados escolhem parceiros abusivos e, quando tem
seus filhos, não são capazes de perceber a violência sofrida por eles – pois aquela foi sua
realidade. Outras vezes, brincadeiras de cunho sexual de forma constante e repetitiva podem
ser também sinais de abusos e repercussões na vida daquela vítima.

6.0 CANAIS DE ESCUTA:

Todos os integrantes de uma sociedade podem e devem ser um canal de escuta, então
saber ouvir e agir corretamente é essencial. Os adultos devem estar atentos e, se possível, tentar
adentrar no universo simbólico da criança, proporcionando a ela um ambiente de confiança e
segurança no qual ela possa se expressar, seja por meio da fala ou de brincadeiras, sentindo-se
confortável para compartilhar suas experiências e vivências. Quando há uma queixa, deve-se
realizar o procedimento padrão indicado pela Organização Mundial de Saúde (OMS):
encaminhar o caso para uma equipe multiprofissional, formada por médicos, psicólogos,
assistentes sociais e, a depender do caso, recorrer à justiça.
No contexto clínico, quando chegam essas demandas, é preciso analisar com cautela a
situação, pois cada caso envolve aspectos únicos e, por consequência, procedimentos
específicos a serem seguidos. De acordo com o Código de Ética da Psicologia, o psicólogo,
em casos de serem informados de infrações da lei, pode decidir pela quebra de sigilo
profissional e realizar a denúncia.
No entanto, quando se trata de violência contra crianças e adolescentes, se o abuso for
revelado durante o processo por meio da vítima, não é indicado fazer imediatamente a
denúncia, pois iria fragilizar o paciente já vulnerável e, juntamente, a relação terapêutica. O
mais apropriado é que durante o processo terapêutico, o profissional forneça o fortalecimento
do cliente, amparo psicológico e preparo emocional para que ele procure alguém de confiança
na família capaz de protegê-lo, relate o ocorrido e parta dessa pessoa a denúncia. Dessa
forma, a criança ou adolescente não se encontra mais vulnerável e continua com o processo
terapêutico inalterado. No entanto, caso esta pessoa receba a informação e continue a manter
o silêncio e proteger o abusador, ou nos casos em que não exista ninguém com que a criança
possa se amparar, o psicólogo, agora, deve intervir e realizar a denúncia. Mas a decisão do
profissional, ainda assim, é precedida pela conversa com a criança, preparando-a para as
consequências daquela situação.
É importante, ademais, compreender a escola como um canal primordial de escuta,
além de possuir um potencial papel de proteção. Entendendo que a escola é o local onde a
criança passa a maior parte do seu tempo, criando vínculos e desenvolvendo as mais diversas

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habilidades, a escola torna-se, muitas vezes, lugar de acolhimento, onde os profissionais
precisam estar atentos aos sinais dados, principalmente porque pode ser onde a vítima fale
sobre a violência sofrida. Pode acontecer através de uma aula, numa conversa com os
colegas, ou uma professora, num contexto em que se sinta confortável e conte o que está
passando.
Dessa forma, torna-se essencial que a escola faça um trabalho de prevenção, num
processo conjunto com às famílias e os diversos profissionais, abrangendo e abordando o
tema da educação sexual, de maneira adequada e séria, que varie de acordo com o
desenvolvimento psíquico e etário da criança e do adolescente. É imprescindível trabalhar
com as crianças questões relativas a gêneros, as identidades sexuais, a relacionamentos
interpessoais, ao conhecimento do próprio corpo, já que com as informações necessárias,
vários acontecimentos relacionados a este tema podem ser evitados; ensinando e mostrando
que existem diferentes formas de toques, que existem os carinhos ternos e os carinhos
sexualizados. O abuso se encontra no silêncio, na falta de informação e formação.

6.1 POLÍTICAS PÚBLICAS:

Juntamente com as escolas e os adultos responsáveis, temos os órgãos de políticas


públicas que compõem toda uma rede de proteção, que trabalham juntos para oferecer todo o
apoio necessário às crianças e adolescentes. Alguns desses órgãos, que são capacitados para
que se realizem encaminhamentos, são o SEPAVIS, o CERCCA e o IMIP, onde há estruturas
para lidar com essas problemáticas. Em conjunto com esses órgãos, existe o Disque 100, o
CRAS, o CREAS e o Conselho Tutelar e, para qualquer denúncia que viole os direitos
humanos, as delegacias; o ECA, que além de receber as denúncias, obriga os profissionais de
saúde e de educação a fazer o comunicado, através do que é chamado de notificação
compulsória. Caso haja omissão por parte desses profissionais, os mesmos podem sofrer as
devidas consequências, como multas e, em casos de negligência extrema, podem perder a
licença profissional para com a atuação clínica.
As políticas públicas, em sua maioria, acabam sendo falhas, então é de extrema
importância a conscientização e a abordagem dessa temática dentro das diversas áreas da
sociedade, fornecendo informações e orientações, sendo importante debates sobre esses temas
para que se espalhem por todos os espaços e meios sociais. Além disso, é de suma
importância a preparação e a qualificação de todos os profissionais que lidam com essas
problemáticas, para que, assim, as falhas diminuam e possa se alcançar uma melhor rede de
proteção às crianças e aos adolescentes.

7.0 TRANSGERACIONALIDADE:

Diante do contexto da violência sexual, existe a violência transgeracional, a qual diz


respeito aos acontecimentos advindos de várias gerações, sendo caracterizada como a
violência por parte de pessoas do mesmo ciclo familiar, íntimas ou próximas. Já se tem
diversos casos os quais apontam que, muitas vezes, o adulto que pratica o abuso sexual já foi
também vítima ou vivenciou algo relacionado a essa questão. Estes adultos têm uma
desordem no desenvolvimento afetivo e pode ter sido marcado de uma forma tão forte que

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passe a reproduzir a violência sofrida ou assistida, seja ela qual for. Em muitos desses casos
em que a violência é intrafamiliar, o adulto violentado na infância venha a se tornar cúmplice,
omita ou, em muitos casos, sequer consiga enxergar a situação. Uma das explicações para
esses eventos de obnubilação é que o adulto em questão não tenha elaborado a violência
sofrida na infância.
Algo que não é bem compreendido, elaborado e simbolizado na infância poderá
retornar nas novas gerações, uma vez que o que foi recalcado mantém-se no inconsciente,
gerando impulsos a partir de tais questões. Dessa forma, o adulto pode criar situações
favoráveis para que as violências aconteçam com os seus próprios filhos ou indivíduos de seu
ciclo familiar. Algo curioso nesse processo de transgeracionalidade é que existe, a partir da
violência de seus filhos ou pessoas próximas, uma oportunidade do adulto reviver os traumas
ou reelaborar o que foi vivido.
Podemos presumir com segurança que nenhuma
geração pode ocultar à geração que a sucede nada de seus
processos mentais mais importantes, pois a psicanálise nos
mostrou que todos possuem, na atividade mental
inconsciente, um apparatus que os capacita a interpretar as
reações de outras pessoas, isto é, a desfazer as deformações
que os outros impuseram à expressão de seus próprios
sentimentos (Freud, 1974c, p. 188).

Tudo isso envolve uma herança psíquica, que não foi bem simbolizada e interpretada
pelo sujeito, assim apresentando vazio e lacunas na transmissão, de modo que o fator
psíquico inconsciente atravesse diversas gerações, como foi dito acima. Essas transmissões
envolvem tanto o dito quanto o não dito e acabam por trazer um impacto enorme no
desenvolvimento das gerações seguintes, caso não sejam bem elaboradas e significadas no
passado. Ainda há, além disso, casos nos quais a vítima só toma consciência da violência
vivida na vida adulta, a partir de alguma situação em sua vida afetiva, nos seus
relacionamentos ou até no processo terapêutico. Podendo identificar, aí, situações mal
elaboradas e trabalhadas da infância que trazem repercussões irreversíveis na vida do sujeito.
A herança arcaica é importante para investigação dos sofrimentos psíquicos, resultante
do processo de transmissão psíquica, que obtêm conteúdos intergeracionais e transgeracionais
que se mostram por meio de manifestações sintomáticas. O processo de transmissão tem
participação fundamental na composição da subjetividade – a transmissão de culturas, por
exemplo –, porém, por outra via, também são transmitidos o sentimento de culpa, fantasias,
desejos recalcados, lutos não elaborados, condições narcísicas, entre outros.
Com isso, infere-se a suma necessidade de abordar esse assunto, trabalhá-lo ainda na
fase da infância e adolescência, apesar de todos os obstáculos – sabendo que em 60% dos
casos, as crianças não revelam –, para a elaboração e simbolização de tais questões no
psiquismo de indivíduos ainda vulneráveis, mas que serão os futuros adultos possuidores da
decisão de perpetuar a violência ou mitigá-la, proporcionando proteção, autonomia e
liberdade.

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8.0 CONSIDERAÇÕES FINAIS:

A partir da compreensão da gravidade e complexidade da Violência Sexual contra


Crianças e Adolescentes, é possível inferir a importância da discussão deste tema, juntamente
com debates, estudos e conscientização, como meio de prevenção e capacitação de
profissionais da área, especialmente psicólogos.
Com base nas informações supracitadas, pode-se compreender a violência sexual
como estrutural na sociedade, mantendo-se presente em questões atuais e geracionais. Em
contrapartida, baseando-se numa visão psicanalítica e em dados os quais afirmam que
abusadores foram abusados no passado – não por via de regra –, entende-se a existência de
uma transgeracionalidade da violência, em que as questões não elaboradas e simbolizadas na
infância de quem sofreu abuso poderão ser transmitidas às gerações futuras, havendo uma
renovação nos casos de abuso e violência.
Com isso, os estudos trazidos por este artigo salientam o papel do psicólogo na
urgente necessidade de trabalhar a questão da violência sexual contra crianças e adolescentes
de forma conjunta nesses dois aspectos: o social, fortalecendo as políticas públicas,
fornecendo debates, conscientização, educação sexual nas escolas, capacitação dos
profissionais, e diversas outras demandas; e no aspecto clínico, trabalhando, desde a tenra
idade, os traumas sofridos por essas crianças e adolescentes, proporcionando autonomia para
elaborar suas questões a fim de que, quando chegar sua vez de decidir o adulto que virar a
ser, possa escolher ser um sujeito a sanar as questões estruturais da sociedade e pessoais de
sua história.

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9.0 REFERÊNCIAS:

FUTURA, Canal. Que Abuso é Esse? e Que Exploração é essa?. 2014. Disponivel em:
<https://youtu.be/4v7lCEMlFyo e https://youtu.be/NVOcwEN8Hng>

Azevedo; Guerra, 1998, p. 32

Freud, 1974c, p. 188

Entrevista realizada com a Professora Doutora Fernanda Wanderley Correia de


Andrade CRP-02/4339

VASCONCELOS, Maria; MALLAK, Linda. Compreendendo a Violência sexual em uma


perpectiva multidisciplinar. São Paulo; Fundação ORSA Criança e Vida; 2002.

SAYÃO, Yara. Refazendo Laços de Proteção: Ações de prevenção ao abuso e à


exploração sexual comercial de crianças e adolescentes. São Paulo : CENPEC :
CHILDHOOD – Instituto WCF-Brasil, 2006

RODRIGUES DOS SANTOS, Benedito; IPPOLITO, Rita. -- São Paulo : Childhood -


Instituto WCF-Brasil : Prefeitura da Cidade de São Paulo. Secretaria de Educação, 2009.

PRECIOSA. Direção: Lee Daniels. Nova York, 2009. Lionsgate. Youtube.

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