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MODELAGEM NUMÉRICA DA EXPANSÃO DO CONCRETO

SUJEITO À REAÇÃO ÁLCALI-AGREGADO

FARAGE, Michèle Cristina Resende


M. Sc., Doutoranda, PEC/COPPE/UFRJ, farage@coc.ufrj.br

ALVES, José Luis Drummond


D. Sc., Professor Adjunto, PEC/COPPE/UFRJ, jalves@coc.ufrj.br

FAIRBAIRN, Eduardo de Moraes Rego


D. Ing., Professor Adjunto, PEC/COPPE/UFRJ, dudu@coc.ufrj.br

ABSTRACT

In order to analyse the deleterious effects of Alkali- Aggregate Reaction (AAR) on concrete
structures it is being done in PEC/COPPE/UFRJ a study consisting of implementing a chemichal
expansion model in a finite element program. The present work briefly shows some aspects of this
study, such as characteristics and causes of the AAR, as well as the main parameters envolved in
its development. Special attention in given to tension, which influence over AAR expansion is still
today considered rather complex. Results obtained from the developed program, concerning a
cylindric concrete sample, are compared to available data, showing good agreement.

1- INTRODUÇÃO

A R eação Álcali-Agregado (RAA), um dos fatores que podem causar a deterioração de


estruturas de concreto, foi identificada pela primeira vez no início da década de 40, por Stanton,
e já foi detectada em vários países, em estruturas as mais diversas (ANDRADE et alli, 1997).
Os efeitos desta reação − ocorrência de fissuração em mosaico, exudação de gel, expansões
volumétricas − podem levar décadas para serem percebidos, uma vez que a RAA desenvolve-se
de forma lenta. As barragens, por exemplo, são estruturas extremamente suscetíveis de
apresentar patologias provocadas pela RAA as quais podem, a longo prazo, chegar a
comprometer a durabilidade, o funcionamento e até mesmo a segurança deste tipo de estrutura.
Há registros de casos em que a expansão causada por RAA tenha alterado a forma dos
componentes estruturais de barragens, obrigando a que fossem tomadas medidas reparadoras
emergenciais.

As dificuldades encontradas até os dias de hoje para se evitarem ou minimizarem os efeitos desta
reação, além do esforço despendido na recuperação de estruturas atingidas, justificam os estudos
que vêm se desenvolvendo em todo o mundo visando a esclarecer este aspecto do
comportamento do concreto. A seguir apresentam-se, de forma sucinta, as características
principais da RAA e considerações sobre alguns dos parâmetros influentes e sobre a modelagem
do concreto sujeito aos efeitos da RAA.

2- REAÇÃO ÁLCALI-AGREGADO

2.1- Condições para a Ocorrência da RAA no Concreto

A RAA depende da presença simultânea de: agregados reativos, alcalinos encontrados no


cimento e água. De acordo com a composição mineralógica do agregado adotado, classifica-se a
reação em três tipos, segundo a definição de ANDRADE et alli (1997): reação álcali-sílica,
reação álcali-silicato e reação álcali-carbonato. Embora os três tipos de RAA provoquem efeitos
semelhantes sobre o concreto, desenvolvem-se segundo mecanismos próprios e bastante
complexos. Tais mecanismos são descritos de formas variadas na literatura, sendo o proposto
por Glasser e Kataoka (ANDRADE et alli,1997; CAPRA et alli,1995), apresentado abaixo, um
dos mais aceitos.

2.2- Mecanismo da Reação

Considera-se, mais comumente, a reação álcali-agregado como um processo consistindo em


duas etapas:
• formação de um gel viscoso;
• absorção de água pelo gel, que passa então a se expandir, exercendo pressão sobre o
concreto.
Figura 1 - Mecanismo da reação álcali-agregado proposto por Glasser e Kataoka (ANDRADE et alli, 1997).
A figura 1 ilustra este comportamento:

3- PARÂMETROS INFLUENTES SOBRE A EXPANSÃO POR RAA

São diversos os parâmetros a serem analisados no estudo da expansão do concreto provocada


pela RAA. Dentre os principais destacam-se a temperatura, o grau de saturação do concreto e a
tensão.

3.1- Temperatura

Alguns autores (CAPRA et alli,1995; LARIVE,1997) afirmam que a temperatura exerce pouca
influência sobre a amplitude da deformação provocada pela RAA. Segundo Larive apenas a
cinética da reação é afetada pela temperatura. Diversos modelos incluem este efeito cinético com
a adoção de leis do tipo Arrhenius, que são comprovadamente eficazes para a representação de
reações químicas termoativadas.

3.2 - Umidade

A presença de água é fundamental para a ocorrência da RAA, como já mencionado. Resultados


experimentais (ADEGHE et alli,1995; ANDRADE et alli,1997; CAPRA et alli,1995; LARIVE,
1997) mostram que é necessária uma umidade relativa mínima de cerca de 70% e que a reação é
atenuada ou até mesmo interrompida caso o elemento atingido seja submetido a uma secagem.
Informações detalhadas sobre este aspecto da RAA podem ser obtidas na referência (LARIVE,
1997).

3.3 - Tensão

A questão básica no que se refere a este assunto é se existe ou não o acoplamento entre a tensão
e a expansão por RAA.

Na maioria dos trabalhos considera-se o acoplamento entre a tensão e a expansão por RAA. Em
uma publicação de 1995 STARK tece considerações a este respeito, com base em resultados
obtidos de ensaios laboratoriais sobre corpos de prova de concreto submetidos a tensões
triaxiais de compressão uniformes, variando de 1,90 a 2,70 MPa. Segundo o autor, os corpos de
prova ensaiados não apresentaram qualquer sinal de expansão, o que o levou a afirmar que a
tensão pode reduzir significativamente a expansão causada por RAA. ADEGHE (1995) também
admitem este acoplamento ao propor um modelo para o cálculo de estruturas afetadas pela RAA
no qual a expansão é considerada como dependente da tensão aplicada. Os autores basearam-
se em medições de deformações em uma estrutura de barragem para desenvolver um modelo de
expansão acoplada à tensão, apesar de reconhecerem que os dados disponíveis sobre a
interação entre tensões e taxas de expansão em condições de tensão biaxial e triaxial fossem
insuficientes. CURTIS (1995), por sua vez, utilizou um modelo de expansão acoplada à tensão
ao desenvolver um programa para simulação dos efeitos da RAA em estruturas, modelo este,
segundo o autor, o mais adequado para reproduzir os resultados obtidos a partir de medições
que foram realizadas em componentes de uma barragem.

Já CAPRA (1995) e SELLIER (1995; 1997) consideram o desacoplamento entre a cinética da


reação e a tensão, citando um estudo desenvolvido por Shayan e Quick sobre dormentes de
estrada de ferro feitos de concreto pré-moldado e protendido. As estruturas analisadas no
trabalho citado, protendidas na direção longitudinal, apresentaram fissuras nesta mesma direção,
o que evidencia que uma tensão pode reduzir, por efeito estrutural, a variação de comprimento
na direção de aplicação do carregamento, mas não na direção perpendicular à da carga.
SELLIER (1995; 1997) também considera o desacopla mento entre a expansão por RAA e a
tensão ao proporem um modelo do concreto sujeito à RAA. Tal comportamento foi comprovado
por LARIVE (1997), que realizou um extenso e abrangente programa experimental consistindo
em ensaios de corpos de prova. O trabalho de Larive merece destaque, pelo caráter inovador e
extremamente esclarecedor que apresenta.

3.1.1- Estudos de Larive sobre o acoplamento entre tensão e expansão

O comportamento de Corpos de Prova (CPs) cilíndricos feitos de concreto reativo foi


comparado ao de corpos de prova feitos de concreto inerte, os dois materiais apresentando
características mecânicas muito semelhantes apesar da variação dos agregados utilizados em suas
composições. Os CPs foram submetidos a quatro valores distintos de tensão uniaxial: 0 MPa
(expansão livre), 5 MPa , 10 MPa e 20 MPa. Foram então traçadas, em função do tempo,
curvas da expansão longitudinal (que é a direção de aplicação do carregamento) e da expansão
na direção transversal. A figura 2 mostra o aspecto das curvas obtidas1.

∆D/D
expansão livre
∆L/L

10 MPa

5 MPa
5 MPa 20 MPa
expansão livre
10 MPa

20 MPa

tempo tempo
(a) Expansão longitudinal x tensão (b) Expansão transversal x tensão

Figura 2 - Aspecto das curvas obtidas por LARIVE (1997) para a expansão longitudinal e transversal ao longo do
tempo.

Observa-se que a expansão na direção longitudinal (variação da altura do CP) foi extremamente
reduzida. Tais resultados podem levar a crer que a aplicação de uma tensão uniaxial reduza os
efeitos da RAA, no entanto, verificou-se o contrário nas curvas de expansão transversal
(variação do diâmetro do CP). As medições efetuadas nas duas direções foram utilizadas no
cálculo da variação volumétrica total, de forma aproximada, pela expressão 1:

1
A referência (LARIVE,1997) apresenta as curvas reais obtidas a partir dos ensaios
εsw

po Log(p)

Figura 3 - Curva da expansão do concreto por RAA em função da tensão (CURTIS,1995).

0.2
variação da altura do CP (%)

0.18
0.16
0.14
0.12
0.1
0.08
0.06 programa
0.04 Larvi e
0.02
0
0 100 200 300 400 500 600 700
tempo(dias)

Figura 4 - Comparação entre a curva de LARIVE (1997) e a curva obtida do programa.

∆V ∆ L ∆D
= +2 (1)
V L D

Tabela 1- Resultados obtidos por LARIVE (1997) nos ensaios de CPs sob expansão livre
σ expansão livre 5 MPa 10 MPa 20 MPa
0,199 0,023 0,014 -0,003
0,102 0,153 0,208 0,125
0,403 0,329 0,430 0,247

Características do Material
4
Módulo de Elasticidade= 2,5x10 MPa
Coeficiente de Poison= 0,23
Parâmetros Característicos

ε∞= 0,196%

τ= 33,4 dias

τlat= 82,9 dias

Dados da Malha
Número de elementos= 214

Número de nós= 78

Número de incrementos de tempo = 29

Onde:

é a variação total de volume,

é a variação da altura do CP e

a variação do diâmetro do CP.

Os resultados obtidos, apresentados na tabela 1, mostram que a variação volumétrica total dos
corpos de prova sob tensões uniaxiais de 5 e 10 MPa foi comparável à dos corpos de prova
deixados sob expansão livre, tendo as deformações impedidas na direção longitudinal dos CPs
sido compensadas por maiores deformações tranversais. Já para tensões de 20 MPa, verificou-
se uma redução significativa da expansão volumétrica, o que pode ser explicado pelo fato de se
tratar de um nível de tensão superior a 30% da resistência do concreto ensaiado. A redução da
expansão, portanto, não foi causada por um menor desenvolvimento da RAA, mas pela
ocorrência de uma microfissuração de origem mecânica que abriu espaço para os produtos da
reação se alojarem, diminuindo a expansão do concreto.

Com base neste estudo Larive comprova o desacoplamento entre a reação química e a tensão, e
propõe um modelo de expansão livre por RAA.

4 - MODELO DA EXPANSÃO POR RAA

A modelagem da RAA é muito complexa porque, aos vários parâmetros que influenciam o
comportamento do concreto, somam-se características particulares da reação química - que
ocorre de forma não homogênea no volume da estrutura, por depender da presença dos
componentes químicos, caracterizando-se como um fenômeno local.

4.1 - Modelo da expansão acoplada à tensão

Tradicionalmente, a expansão por RAA é representada por modelos que consideram o


acoplamento com a tensão. O mais comumente adotado é expresso por :

. sw = . u p ≤ po
ε. ε. u log  p  (2)
sw = − K   p ≥ po
ε ε  po 

onde: p é a média das tensões nas três direções principais; po é a tensão até a qual a taxa de

expansão do concreto é constante; u é o valor máximo da taxa de expansão livre do concreto;


.
ε
. é a taxa de expansão do concreto e K é a constante que determina a tensão de
εsw
confinamento a partir da qual a taxa de expansão do concreto é nula. A figura 3 mostra o
aspecto da curva tensão x taxa de expansão do concreto obtida a partir da expressão 2,
representando-se a tensão na forma logarítmica.

Tal modelo adota as seguintes hipóteses simplificadoras: a taxa de expansão é igual nas três
direções principais e as influências da temperatura e da umidade são desprezadas.

4.2 - Modelo da expansão desacoplada da tensão

LARIVE (1997) propõe uma expressão que representa a expansão livre (εch) do concreto em

função de três parâmetros independentes: o valor assintótico da expansão livre (ε ∞), o tempo de

latência (τlat ) e o tempo característico (τ). Estes três parâmetros foram identificados para
diferentes tipos de concreto através do ajuste de várias curvas obtidas experimentalmente a partir
de CPs expostos a condições variadas de umidade e temperatura. Adotou-se na análise dos
dados um programa baseado na técnica dos mínimos quadrados.

Segundo este modelo, representado pela expressão 3, o comportamento macroscópico do


material compõe-se de duas fases principais: a fase de latência, durante a qual a expansão é
progressiva e tende a aumentar com a abertura de fissuras, e a fase de atenuação exponencial, na
qual a eficácia dos produtos da reação diminui por causa do aumento do espaço poroso

provocado pelas deformações. Tanto τlat quanto τ, que definem as duas fases de
desenvolvimento da expansão, dependem da umidade e da temperatura.

-t
1− e τ
(3 )
εch = ε ∞ 1 + e − t- τ lat
τ

onde t é o tempo.

5- IMPLEMENTAÇÃO NUMÉRICA

Tendo por objetivo realizar a análise de estruturas de concreto massa sujeitas à deformações por
RAA, vem se realizando no PEC/COPPE/UFRJ a implementação da expansão por RAA no
concreto em um programa de elementos finitos. O programa em questão consiste na análise
ela stoplástica de estruturas de concreto, com adoção de elementos tetraédricos com 4 nós.

Utiliza-se para a solução do problema quasi-estático não-linear uma técnica incremental-iterativa


baseada no método de Newton-Raphson Modificado (CRISFIELD,1991), empregando a matriz
de rigidez inicial. A cada iteração do processo Newton, a solução do problema linearizado
emprega uma versão elemento-por-elemento do método dos gradientes conjugados (EBE-PCG)
(BARRET; COUTINHO,1993; FERENCZ,1989), que dispensa a montagem, armazenamento e
fatoração de matrizes globais.

O modelo de expansão por RAA adotado foi o proposto por LARIVE (1997), considerando
tensão e deformação por RAA desacopladas.

6- EXEMPLO NUMÉRICO

Procurou-se, inicialmente, reproduzir com o programa um dos ensaios realizados por LARIVE
(1997) sobre corpos de prova cilíndricos feitos de concreto reativo, sob expansão livre. A figura
4 apresenta a comparação entre a curva de Larive, representada pela expressão 3, e a curva
obtida através da implementação numérica realizada. Os dados do CP analisado são fornecidos
na referência (LARIVE,1997) e mostrados na figura 5.
13 cm

24 cm

Figura 5 - Dados do corpo de prova analisado.

7- CONCLUSÕES

Pode-se observar que, para o caso de expansão livre, o programa desenvolvido fornece
resultados satisfatórios. O próximo passo neste estudo consiste em superpor às deformações por
RAA os efeitos de carregamentos externos, reproduzindo o comportamento não linear
provocado pela microfissuração interna provocada pela tensão e possibilitando a aplicação do
programa a estruturas mais complexas no que se refere às condições de contorno, carregamento
e geometria.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ADEGHE, L., HINDY, A., HO, M. R. H. Saunders G S Concrete Growth, Proc. Second
International Conference on Alkali-Aggregate Reactions in Plants and Dams , USCOLD,
20 pp., 1995;
ANDRADE, W. e Equipe de Furnas. Concretos Massa, Estrutural, Projetado e
Compactado com Rolo. Ensaios e Propriedades, 1.ed., Rio de Janeiro, Ed. Pini, 1997;
BARRET, R. et alli , Templates for the Solution of Linear Systems: Building Blocks for
iterative Methods ;
CAPRA, B., BOURNAZEL, J., BOURDAROT, E. Modeling of Alkali-Aggegate Reaction
Effects in Concrete Dams, Proc. Second International Conference on Alkali-Aggregate
Reactions in Plants and Dams , USCOLD, 15 pp., 1995;
COUTINHO, A., ALVES, J., LANDAU, L., EBECKEN, N. Avaliação de Estratégias
Computacionais para o Método dos Elementos Finitos em Computadores Vetoriais, Revista
Internacional de Métodos Numéricos para Cálculo y Diseño en Ingenieria, Vol. 9, no 3,
pp. 271-297, 1993;
CRISFIELD, M. Non-Linear Finite Element Analysis of Solids and Structures, vol.1, Ed.
J. Wiley, 1991;
CURTIS, D . Modeling of AAR Affected Structures using the GROW3D FEA Program, Proc.
Second International Conference on Alkali-Aggregate Reactions in Plants and Dams,
USCOLD, 22 pp., 1995;
FERENCZ, R. Element-by-element Preconditioning Techniques for Large -Scale,
Vectorized Finite Element Analysis in Nonlinear Solid and Structural Mechanics, PH.D.
Thesis, Division of Applied Mechanics, Stanford University, 1989;
LARIVE, C. Apport Combinés de L’Alcali-Réaction et des ses Effets Mécaniques , tese
de doutorado, França, 327 pp., 1997;
SELLIER, A., BOURNAZEL, A., MÉBARKI, A. Une Modélisation de la Réaction Alcalis-
Granulat Intégrant une Description des Phénomènes Aléatoires Locaux, Materials and

Structures, vol.28, no 181, 11pp., Aug/Sep, 1995;


SELLIER, A., CAPRA, B. Modèlisation Physico-Chimique de la Réation Alcali-Granulat:
Apport au Calcul des Structures Dégradées, Revue française de génie civil , Vol 1, n3/1997,
36 pp., 1997;
STARK, D. Alkali-Silica Reaction and its Effects on Concrete, Proc. Second International
Conference on Alkali-Aggregate Reactions in Plants and Dams , USCOLD, 9 pp., 1995.
AGRADECIMENTOS

À Capes, que financia este projeto através da concessão de bolsa de estudo e do acordo
CAPES/COFECUB, firmado entre a COPPE e o LCPC (Laboratoire Central des Ponts et
Chaussées).

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