Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Juiz de Fora - MG
1. RESUMO
Em busca da satisfação total do cliente, os conceitos da qualidade, que por muitos anos
ficaram restritos à área da produç ão, cada vez mais são aplicados aos serviços agregados ao
produto. O aprimoramento da prestação de serviços, em sintonia com a perspectiva dos
clientes, está se convertendo em um desafio para as empresas.
Na indústria da construção civil, dentre os principais serviços agregados ao produto, encontra-
se, principalmente, a assistência técnica. Essa tem como principais funções o atendimento as
reclamações de clientes, a retroalimentação do sistema de produção de edifícios e a
apropriação de custos dos problemas patológicos.
Diante desta conjetura, o presente trabalho contempla a relação entre a satisfação do cliente e
os serviços de assistência técnica do subsetor da construção de edifícios. Para isto, realiza-se,
primeiramente, uma breve explanação teórica sobre a evolução da gestão da qualidade no
subsetor de construção de edifícios e, posteriormente, expõe procedimentos mínimos para a
realização do serviço de assistência técnica, bem como a análise de um estudo de caso
realizado em uma empresa do subsetor de construção de edifícios da cidade de São Paulo.
2. INTRODUÇÃO
O enfoque da gestão da qualidade no subsetor da construção de edifícios, segundo Picchi
(1993), tem evoluído passando de uma visão corretiva, baseada na inspeção, chegando até as
visões mais modernas, baseadas em medidas preventivas e um enfoque sistêmico. Essa
evolução é devido, principalmente, a estabilização monetária, ao aumento da competitividade
entre as construtoras e incorporadoras e a mudança do perfil do consumidor, que tornou-se
mais consciente dos seus direitos (publicação do Código de Defesa do Consumidor em 1992)
e também capaz de reivindicar exatamente suas necessidades.
Para garantir a sobrevivência nesse mercado altamente competitivo e exigente, as empresas
passaram a ter que oferecer produtos com menor custo e com maior capacidade em atender às
exigências dos seus clientes. Primeiramente, com o intuito de reduzir desperdícios e aumentar
a produtividade e, conseqüentemente, diminuir os custos das unidades habitacionais aos seus
clientes, as empresas investiram na racionalização construtiva,. Entretanto, a ‘racionalização,
não garantia que a empresa atendesse às expectativas do cliente em relação aos seus serviços,
principalmente aos relacionados ao pós-vendas, dos quais se destaca a assistência técnica.
Assim, este trabalho tem por objetivo estudar a relação do serviço de assistência técnica com
o sistema de gestão da qualidade no subsetor de construção de edifícios.
5. ESTUDO DE CASO
O estudo de caso foi desenvolvido em uma empresa do subsetor de construção de edifícios de
São Paulo, que possui um sistema de qualidade certificado segundo a norma ISO 9002. Ela
foi fundada em 1985, atua no sub setor de construção de edifícios e também na área de
incorporação imobiliária, sendo a Grande São Paulo sua região de atuação predominante. A
empresa possui uma estrutura organizacional tradicional, ou seja, há uma hierarquia bem
definida que conta com a presença dos diretores no topo da pirâmide, seguidos das médias
gerências, dos engenheiros de obras, mestres de obras, encarregados de serviços e operários.
As informações foram obtidas por meio de entrevistas semi estruturadas com o responsável
pela a área de qualidade e pelo responsável pela equipe de assistência técnica, e também com
o acompanhamento do trabalho da equipe de assistência técnica.
5.1. Entrega do produto ao cliente externo
Com os dados obtidos junto à empresa pôde-se perceber que, com a implantação do Sistema
da Qualidade, a entrega do imóvel a um cliente interno incorporou procedimentos
padronizados, através da adoção de uma ficha de verificação (check-list) elaborada pela
equipe de assistência técnica. Essa ficha contém os principais itens a serem verificados pelo
cliente interno (engenheiro responsável pela obra).
A entrega do imóvel ao cliente externo, segundo um engenheiro da empresa, acontece de
maneira que possibilite o treinamento do cliente aos diversos componentes do imóvel. Esse
treinamento, que engloba desde o ensino de como utilizar uma torneira até como proceder a
limpeza dos diversos componentes do imóvel, visa a minimização da ocorrência de problemas
devido ao uso incorreto e a falta de manutenção do imóvel.
Com a implantação do Sistema de Gestão da Qualidade a empresa, em busca da satisfação do
cliente, também aprimorou o seu Manual do Proprietário. Desse aprimoramento, vale ressaltar
a sua padronização (formato, informações fornecidas) e personalização (plantas baixas,
inovações tecnológicas). Entretanto, percebeu-se que o Manual do Proprietário não contêm
1
Método eficaz para se obter uma grande quantidade de informações comparáveis e quantificáveis, aferindo a
satisfação dos usuários em relação a aspectos técnicos, funcionais e comportamentais do edifício construído
2
Método que possibilita uma fácil identificação de alguns aspectos técnicos e funcionais, que estão diretamente
relacionados com o desempenho do ambiente construído
uma proposta de planos de inspeção e manutenção preventivas para as atividades de
manutenção que não sejam usuais (revestimento de fachada, alguns componentes dos sistemas
elétrico e hidráulico etc).
5.2. Solicitação do cliente a assistência técnica
O setor responsável pelo atendimento das reclamações do cliente é formado por cinco
pessoas: um arquiteto e quatro operários polivalentes. Esses operários possuem diversos
cursos do SENAI (pintor, pedreiro, assentador de placas cerâmicas etc) e especial treinamento
de prestação de serviço.
A efetivação da reclamação do cliente na empresa ocorre somente com o envio, pelo cliente,
de uma comunicação escrita, cujo modelo consta na última página do manual do proprietário,
com a descrição do problema. Após o recebimento deste documento, o responsável pela a
assistência técnica, abre uma solicitação de assistência técnica (SAT) com uma numeração
relacionada com o número da edificação, número da solicitação e ano. Após a documentação
da reclamação, o responsável pela a assistência técnica comunica-se com o cliente para
agendar um horário para a análise da solicitação. O agendamento é feito em função da
disponibilidade do cliente, da disponibilidade da empresa e da complexidade do problema
descrito.
5.3. Análise da solicitação do cliente
A realização da análise da reclamação do cliente é realizada pelo arquiteto, responsável pela
equipe de assistência técnica. Este profissional, apesar de possuir um ótimo conhecimento do
processo produtivo da empresa, não apresenta uma experiência na análise de problemas
patológicos, ou seja, não conhece profundamente a metodologia para a definição de
manifestações patológicas.
Dessa maneira, torna-se freqüente a adoção de medidas paliativas para a solução do problema,
mesmos para problemas mais simples. Além disso, notou-se que também ocorre a adoção de
medidas paliativas devido ao interesse da empresa em atender, o mais breve possível e com
menor incômodo, a solicitação do cliente. Entretanto deve-se ressaltar que, a adoção desse
tipo de solução representa uma visão de curto prazo da empresa e de falta de compromisso
com a satisfação total do cliente, mesmo que a solução da causa real provoque um incômodo
imediato de maior proporções.
5.4. Programação e realização do serviço
Diagnosticado o problema e verificado a responsabilidade da empresa, a equipe de assistência
técnica informa ao cliente os serviços que serão realizados, estabelecendo um prazo de
execução. Esse prazo é função da disponibilidade do cliente, da complexidade do problema e
da disponibilidade da equipe de assistência técnica.
A formalização do comprometimento da empresa para a execução dos serviços é realizada
com o preenchimento do SAT. Esse documento contém a descrição dos serviços a serem
realizados, os problemas patológicos identificados e a conseqüente responsabilidade por esses
e as datas de início e término do reparo.
Os reparos mais comuns (pintura, troca de sifão etc) são realizados pelos operários
polivalentes sob a coordenação do gerente de assistência técnica, enquanto os serviços mais
especializados (instalações elétricas e hidráulicas, impermeabilização etc) são transferidos as
empreiteiras responsáveis pelo serviço durante a execução do edifício.
5.5. Apropriação dos custos envolvidos no atendimento
A empresa antes da implantação do Sistema de Gestão da Qualidade não possuía um
orçamento para o setor de assistência técnica, sendo os serviços de reparos dependentes da
aprovação da administração e seu custo atribuído aos custos diversos da empresa. Após a
implantação do Sistema da Qualidade a empresa adotou uma estrutura de apropriação dos
custos de assistência técnica, que consta de seis itens: hidráulica; elétrica; trincas e fissuras;
esquadrias; impermeabilização e cobertura; outros serviços. A atribuição de um custo de
assistência técnica em um desses itens está relacionada com a causa fundamental do
problema. Por exemplo, caso uma pintura apresente problemas relacionados a umidade,
verifica-se, inicialmente, se a causa do problema é impermeabilização ou vazamento. Caso a
umidade esteja relacionado a um vazamento de uma tubulação, o custo da assistência técnica
é apropriado no item referente a parte hidráulica.
A empresa está desenvolvendo esse sistema de controle de custos dos problemas patológicos
na tentativa de obter mais um instrumento capaz de fornecer informações úteis para a
retroalimentação do processo construtivo. Este controle possibilitará que a empresa além de
tomar medidas preventivas para os problemas de maior freqüência, também tome ações
preventivas para os problemas de maior custo de reparo.
Entretanto, é importante que as reclamações sejam apropriadas com maior nível de
detalhamento, de tal forma que seja possível identificar o serviço, o sub-serviço ou material e
a forma de manifestação. Somente dessa maneira será possível uma retroalimentação do
sistema com a priorização de ações das áreas de projetos e especificações, suprimentos e
execução, e conseqüentemente, evitar a reincidência dos problemas e melhorar
constantemente a qualidade do produto e do processo.
5.6. Ações preventivas
Com a implantação do Sistema da Qualidade pela empresa, houve a introdução de um banco
de dados capaz de armazenar os problemas patológicos em função do tipo, da freqüência de
ocorrência e por edificação. Esse banco de dados é utilizado para gerar as ferramentas
necessárias para o processo de melhoria do sistema de gestão da qualidade – gráfico de
Pareto, diagrama de árvore etc. Com a análise destas ferramentas, o setor de assistência
técnica identifica os principais problemas patológicos ocorridos nas edificações da empresa.
Após a identificação dos principais problemas, ocorre a análise desses em uma reunião de
engenharia, na qual participam engenheiros, mestre-de-obras, empreiteiros, diretores, o
arquiteto e o gerente da qualidade. Durante essa reunião, os participantes procuram identificar
as causas fundamentais do problema, determinando o diagrama de causas e efeitos.
Posteriormente à identificação da causa fundamental do problema, procura-se conceber um
plano de ação para evitar a ocorrência desse problema nos futuros empreendimentos, e
determinar uma solução definitiva a ser utilizada pela assistência técnica nas próximas
ocorrências e até mesmo nas ocorrências já analisadas (“recall”).
5.7. Levantamento da satisfação do cliente em relação aos serviços prestados
A empresa não possui nenhum instrumento de verificação da satisfação do cliente com
relação a prestação do serviço de assistência técnica bem como do seu produto. A avaliação
da empresa da satisfação do cliente com o produto ocorre somente com a análise do índice de
solicitação de assistência técnica. Segundo Tschohl (1996), uma análise da satisfação dos
clientes utilizando somente este parâmetro pode ser prejudicial ao desempenho da empresa,
uma vez que o índice de relação entre reclamações transmitidas ao setor de assistência técnica
e as reclamações não-reportadas pode variar de 1 a 2000. A importância da avaliação desse
tipo de reclamação pôde ser observado durante a visita de análise de solicitação ao cliente, na
qual um usuário reclamou, de forma informal, do desempenho acústico das vedações verticais
do edifício.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com a evolução do conceito da qualidade as empresas do setor da construção civil passaram a
adotar uma postura mais ativa em relação à questão da qualidade, onde a visão corretiva
cedeu espaço para uma visão com o foco no cliente e enfoque no processo como um todo.
Essa nova abordagem da qualidade adotada pelas empresas do subsetor de construção de
edifícios vem ao encontro da nova série de normas da ISO 9000, que determina a necessidade
de um indicador da política da qualidade adotada pelas empresas: “a política da qualidade
deve ser coerente com as metas organizacionais do fornecedor e as expectativas e
necessidades de seus clientes”. Notando-se, dessa forma, que as empresas que pretendem ser
competitivas no mercado da construção civil devem, além de garantir um produto com
menores índices de defeitos, oferecer uma excelente prestação de serviços ao cliente,
principalmente referente a realização da assistência técnica.
Esse fato pôde ser comprovado com o estudo de caso, onde observou-se que a necessidade de
um melhor atendimento aos seus clientes levou a incorporação de um setor responsável pela a
assistência técnica. Apesar desse setor apresentar algumas deficiências, a empresa deu um
primeiro passo para superar a visão tradicional do processo construtivo da edificação, que
identifica o edifício como produto final desse processo. Pode-se perceber também a
importância da assistência técnica para a retrolimentação do processo produtivo do edifício
com a identificação das causas das patologias e posterior prevenção, em nível de projeto ou de
execução, de futuras ocorrências. Além disso, notou-se a preocupação da empresa em definir
um procedimento para realizar a avaliação pós-ocupação de seus edifícios, uma vez que busca
identificar as exigências dos seus consumidores.
Além das informações obtidas pela análise dos problemas patológicos, as empresas do
subsetor de construção de edifícios devem também adotar um procedimento de avaliação de
pós-ocupação. Com a adoção dessa avaliação, as empresas desse subsetor estarão
evidenciando a adoção de uma visão sistemática do processo de construção de um edifício e,
conseqüentemente, obtendo a satisfação dos seus clientes.
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CENTRO DE TECNOLOGIA DE EDIFICAÇÕES – CTE. Programa de implantação de sistema de
gestão da qualidade para empresas construtoras : módulo 12. São Paulo, SINDUSCON – SP/CTE,
1997.
CENTRO DE TECNOLOGIA DE EDIFICAÇÕES – CTE. Sistema de gestão da qualidade para
empresas construtoras . São Paulo, SEBRAE/SINDUSCON-SP, 1995.
CHASE, R.B; DASU,S. Você sabe o que o seu cliente está sentindo?. Revista Exame, São
Paulo, nº15, p.88-96, julho 2001.
CHURCHILL, G.A; SUPRENANT, C. An investigation into the determinants of customer
satisfaction. Journal of Marketing Research, v.19, n.4, p. 491-504, Nov. 1982.
ENGEL, J.F.; BLACKWELL R.D.; MINIARD, P.W. Consumer be havior. Chicago, 1985.
GIAMMUSSO, S.E. O cliente dá as cartas. Revista Qualidade na Construção, nº22 Ano III
2000. P. 30-34.
JONH, V.M. O projeto e a manutenção de edifícios. Revista Arquitetura e Construção, São
Paulo, n. 26, p.128-32, out/nov. 1989.
JURAN, J.M.; GRYNA, F.M. Controle da Qualidade : componentes básicos da função
qualidade. Trad. De Maria Cláudia de Oliveira Santos. São Paulo, McGraw-Hill, 1991. V5.
LICHTENSTEIN, N.B. Patologia das construções: Procedimento para formulação do diagnóstico de
falhas e definição de conduta adequada à recuperação de edificações. São Paulo, 1985. Dissertação
(Mestrado) – Escola Politécnica, Universidade de São Paulo.
MELHADO, S.B. Notas de aula da disciplina Qualidade na Indústria da Construção Civil.
Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, 2001.
MESENGUER, A.G. Controle e garantia da qualidade na construção civil. São Paulo, SindusCon;
Projeto, 1991.
OLIVER, R. L. A connitive model of the antecedents and consequences of satisfaction decisions .
Journal of Marketing Research, v. 17, n.4, p. 460-69, Nov. 1980.
PICCHI, F.A. Sistemas de qualidade: uso em empresas de construção de edifícios. São
Paulo, 1993. Tese (Doutorado) – Escola Politécnica, Universidade de São Paulo.
REYGAERTS, J. Diagnostic des cas de phatologie du bâtiment. CSTC Revue, Bruxelles,
(4): 11-15, 1980.
SCARDOELLI, L.S. et al. Melhorias de qualidade e produtividade: iniciativas das empresas de
construção civil. Porto Alegre, SEBRAE, 1994.
SOUZA, R. Metodologia para desenvolvimento e implantação de sistemas de gestão da
qualidade em empresas construtoras de pequeno e médio porte. São Paulo, 1997. Tese
(Doutorado) – Escola Politécnica, Universidade de São Paulo.
TSCHOHL, J. A satisfação do cliente: Como alcançar a excelência através do serviço ao
cliente. São Paulo, Makron, 1996.