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ZOOLOGIA DE MOLUSCOS

E ARTRÓPODES
PROF. DR. RICARDO LOURENÇO DE MORAES
Prof. Me. Ricardo Benedito de Oliveira
REITOR

Reitor:
Prof. Me. Ricardo Benedito de
Oliveira
Pró-reitor:
Prof. Me. Ney Stival
Diretoria EAD:
Prezado (a) Acadêmico (a), bem-vindo Prof.a Dra. Gisele Caroline
(a) à UNINGÁ – Centro Universitário Ingá.
Novakowski
Primeiramente, deixo uma frase de
Sócrates para reflexão: “a vida sem desafios
PRODUÇÃO DE MATERIAIS
não vale a pena ser vivida.”
Diagramação:
Cada um de nós tem uma grande re- Alan Michel Bariani
sponsabilidade sobre as escolhas que fazemos, Thiago Bruno Peraro
e essas nos guiarão por toda a vida acadêmica
e profissional, refletindo diretamente em nossa Revisão Textual:
vida pessoal e em nossas relações com a socie- Felipe Veiga da Fonseca
dade. Hoje em dia, essa sociedade é exigente
e busca por tecnologia, informação e conhec-
Luana Ramos Rocha
imento advindos de profissionais que possuam Marta Yumi Ando
novas habilidades para liderança e sobrevivên-
cia no mercado de trabalho. Produção Audiovisual:
Adriano Vieira Marques
De fato, a tecnologia e a comunicação Márcio Alexandre Júnior Lara
têm nos aproximado cada vez mais de pessoas, Osmar da Conceição Calisto
diminuindo distâncias, rompendo fronteiras e
nos proporcionando momentos inesquecíveis. Gestão de Produção:
Assim, a UNINGÁ se dispõe, através do Ensino
a Distância, a proporcionar um ensino de quali- Aliana de Araújo Camolez
dade, capaz de formar cidadãos integrantes de
uma sociedade justa, preparados para o mer-
cado de trabalho, como planejadores e líderes
atuantes.

Que esta nova caminhada lhes traga


muita experiência, conhecimento e sucesso.

© Direitos reservados à UNINGÁ - Reprodução Proibida. - Rodovia PR 317 (Av. Morangueira), n° 6114
UNIDADE ENSINO A DISTÂNCIA

01
DISCIPLINA:
ZOOLOGIA DE MOLUSCOS
E ARTRÓPODES

MOLUSCOS: FILOGENIA E MORFOLOGIA GERAL


PROF.A DR. RICARDO LOURENÇO DE MORAES

SUMÁRIO DA UNIDADE

INTRODUÇÃO.................................................................................................................................................................. 4
1. FILOGENIA DO FILO MOLLUSCA...............................................................................................................................5
2. MORFOLOGIA GERAL DOS MOLUSCOS................................................................................................................... 7
2.1 O CORPO....................................................................................................................................................................11
2.2 A CONCHA DOS MOLUSCOS.................................................................................................................................. 12
2.3 CIRCULAÇÃO E TROCAS GASOSAS....................................................................................................................... 13
2.4 EXCREÇÃO E OSMORREGULAÇÃO........................................................................................................................ 13
2.5 SISTEMA NERVOSO E ÓRGÃOS SENSORIAIS..................................................................................................... 14
2.6 LOCOMOÇÃO........................................................................................................................................................... 15
2.7 ALIMENTAÇÃO E DIGESTÃO................................................................................................................................... 15
2.8 REPRODUÇÃO E DESENVOLVIMENTO................................................................................................................. 15
CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................................................................. 17

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INTRODUÇÃO
Antes de iniciarmos o estudo desta unidade, vamos nos situar dentro da Biologia:
(1) lembre-se de que, para a manutenção e evolução da bio (vida), são necessárias algumas
“ferramentas” básicas à nutrição e ao equilíbrio bioquímico do organismo, além de características
reprodutivas que possibilitem que a espécie possa continuar existindo, apesar da grande
quantidade de predadores e de dificuldades que o ambiente pode impor; e que (2) a classificação
dos seres vivos organiza e facilita o estudo dos diferentes grupos, sendo que alguns grupos animais
já foram estudados no decorrer do seu curso e outros ainda serão.
Nesta apostila, você encontrará quatro unidades: as duas primeiras referem-se ao Filo
Mollusca, e as duas últimas ao Filo Arthropoda – os maiores grupos de invertebrados. Nos dois
casos, são apresentadas inicialmente a filogenia e as características morfológicas gerais dos grupos,
e então as características morfológicas específicas e ecológicas dos principais grupos de cada um
deles. Com essa organização, você será capaz de perceber o posicionamento filogenético de cada

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grupo dentro do reino animal e compreender as características individuais que lhes possibilitam
seu modo de vida.
Nesta unidade, estudaremos o Filo Mollusca. Dentre os moluscos, já foram catalogadas
mais de 93 mil espécies viventes e 70 mil fósseis. Os membros do Filo Mollusca (do latim molluscus,
mole) possuem hábitos diversificados e estão distribuídos por todo o globo terrestre, com seu
corpo mole e, em muitos casos, dotados de conchas notáveis. O filo apresenta oito classes, das
quais três são mais conhecidas: Gastropoda (caracóis, caramujos e lesmas), Bivalvia (mexilhões e
ostras) e Cephalopoda (lulas e polvos).
Morfologicamente, Mollusca é um dos grupos mais diversificados, basta refletirmos que,
nesse filo, encontramos desde pequeninas lesmas de jardim até o polvo gigante do Pacífico – que
já recebeu estimativas de uma envergadura de 10 metros e massa corporal acima de 250 quilos
–, um invertebrado gigantesco. No entanto, mesmo em um grupo variado como este, podemos
observar um conjunto de características que demonstram suas relações filogenéticas e reforçam
os incontáveis caminhos pelos quais a evolução conduziu o reino animal.
Nesse sentido, ao final destas duas unidades que tratam dos moluscos, esperamos que,
quando você pensar nesse grupo, seja capaz de se lembrar imediatamente de exemplares do
grupo, como caracóis, ostras e polvos, e que desse ponto possa avançar refletindo sobre os demais
representantes do grupo, que tipo de estruturas internas eles possuem, como esses animais
conseguem a energia que os mantém vivos, como se reproduzem e de que outros seres vivos são
próximos evolutivamente, ou filogeneticamente. Se ao final dessas duas unidades você for capaz
de rapidamente recordar estas informações, estaremos começando bem.
Por essa razão, caro aluno, à sua própria maneira e ao método de estudo que melhor
lhe convém, concentre-se em compreender os aspectos gerais do grupo, que lhe servirão como
bom referencial ao estudo dos seres vivos, mas não desvalorize a importância dos detalhes de
cada estrutura e dos detalhes do funcionamento de cada uma delas. Busque fazer relações com o
conteúdo estudado nas demais disciplinas, explore os materiais complementares e dedique-se ao
máximo; afinal, a complexidade da vida não será compreendida “se olharmos apenas pelo buraco
da fechadura”, é necessário “escancarar a porta, e observar o maior número de detalhes possível”.
Bons estudos!

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1. FILOGENIA DO FILO MOLLUSCA


No estudo da filogenia de qualquer grupo, devemos ter claros em nossa mente os conceitos
de Monofilia (grupo de táxons que inclui o ancestral comum mais recente do grupo e todos os
descendentes desse animal), Polifilia (grupo de táxons que não inclui o ancestral comum mais
recente do grupo nem todos os descendentes desse animal) e Parafilia (grupo de táxons que
inclui o ancestral comum mais recente do grupo e não todos os descendentes desse animal). As
características de desenvolvimento de seres protostômios e deuterostômios também são valiosas
para o bom entendimento desta disciplina. Brusca (2013) nos apresenta um bom resumo delas,
no Quadro 1.

Protostômios e Deuterostômios
Diferenças do desenvolvimento entre protostômios e deuterostômios, e alguns filos representativos

PROTOSTÔMIOS DEUTEROSTÔMIOS
Clivagem espiral Clivagem radial

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Blastóporo se torna a boca Blastóporo não se torna boca (geralmente se torna o
ânus)
Cordões nervosos do sistema nervoso central Cordões nervosos do sistema nervoso central não ventrais
ventrais
Mesoderme derivada de mesentoblasto (geralmente Mesoderme surge das paredes do arquêntero
a célula 4d)
´
Musculatura subepidermica derivada, pelo menos Camadas de musculatura subepidérmica derivadas, pelo
em parte, da mesoderme 4d menos em parte, da mesoderme arquentérica
Formação do celoma por esquizocelia Formação do celoma por enterocelia
Embriologia resulta em celomas no adulto com um Embriogênese resulta no arranjo tripartido das cavidades
par simples ou metamericamente disposto em corpóreas (protocele, mesocele e metacele), exceto no filo
pares, ou celoma no adulto reduzido Chordata
Exemplos: Nemertea, Sipuncula, Echiura, Annelida, Exemplos: Echinodermata, Hemichordata, Chordata
Onychophora, Arthropoda, Mollusca

Nota: Alguns autores consideram os platelmintos acelomados (Platyhelminthes) como protostômios porque eles demonstram todas as
características do desenvolvimento dos últimos, exceção feita à ausência do celoma, ausência de um sistema nervoso circum-entérico e
ausência de ânus.

Quadro 1 – Diferenças do desenvolvimento entre protostômios e deuterostômios. Fonte: Brusca (2013).

Para maiores informações sobre termos filogenéticos e interpretação de clado-


gramas, consulte o capítulo 10 do livro:
HICKMAN, C. P. et al. Princípios integrados de zoologia. 16. ed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2016.

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Com base em estudos cladísticos, realizados por análise filogenética explícita, é


provável que o ancestral comum dos moluscos fosse pequeno, com aproximadamente 1 mm
de comprimento, com superfície ventral achatada (utilizada para se movimentar deslizando
por cílios). A maioria das características do grupo, como a clivagem espiral (divisões celulares
iniciais do zigoto que envolve uma inclinação espiral no processo), esquizocelia (espaço celômico
originado de pacotes de mesoderme pareados bilateralmente que aumentam e se tornam ocos)
e larva trocófora (pré-segmentada, com banda ciliar locomotora anterior à região da boca), é
compartilhada por simplesiomorfia no Filo Mollusca (todas as espécies mais antigas ou recentes
compartilham esta característica) com os sipúnculos, equiúros e anelídeos (protostômios). No
entanto, diferentemente dos anelídeos, moluscos não são segmentados, possuem celoma reduzido
e sistema circulatório aberto. Embora alguns pesquisadores defendam que moluscos descendem
de um ancestral segmentado, para muitos outros e para Brusca (2013), os moluscos descendem
de um precursor esquizocelomado e não segmentado. Brusca (2013), sobre o processo evolutivo
dos moluscos, discorre:

Os principais passos na evolução daquele animal que geralmente imaginamos


como um molusco ‘típico’ – ou seja, um molusco dotado de concha – ocorreram

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após a origem dos aplacóforos e conduziram, talvez, a um animal adaptado a um
modo de vida ativo e epibentônico [sobre o substrato]. Tais passos centraram-
se principalmente na elaboração do manto e cavidade do manto, no processo
de modificação da superfície ventral em um pé muscular, bem desenvolvido, e
na evolução de uma glândula dorsal da concha, consolidada, e concha sólida,
constituída de uma ou mais placas, em substituição às espículas calcárias
independentes (BRUSCA, 2013, p. 797).

Perceba que, quando Brusca (2013) se refere aos “aplacóforos” (uma das classes do Filo
Mollusca), já nos indica traços do cladograma desse grande grupo. Hickman et al. (2016) nos
fornecem um cladograma com as principais Classes do Filo Mollusca, e podemos observar as
características que emergiram no processo evolutivo e compõem o Bauplan do grupo, conforme
Figura 1.

Por mais diversificada que possa ser, até mesmo a vida tem suas limitações. O
termo “Bauplan” (do alemão “plano básico” ou “projeto”), empregado na zoologia,
refere-se ao conjunto de características de um grupo que confere estabilidade da
forma, e que é mantida através da evolução e nos táxons filogenéticos divergen-
tes. Somos capazes de definir a estrutura de um organismo, bem como de de-
screver os sistemas e órgãos que o compõem, o que nos aponta as capacidades
e limitações de determinado organismo. Há tarefas básicas de que todo ser vivo
necessita para manter-se vivo, e é nesse sentido que compreender o Bauplan de
um grupo ou espécie colabora com o nosso conhecimento sobre ele.

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Figura 1 – Cladograma com as relações hipotéticas entre as classes do Filo Mollusca. Fonte: Hickman et al. (2016).

O Filo Mollusca é um grupo monofilético com sete sinapomorfias (Figura 1) com um único
ancestral comum originando dois grupos: os Aculifera e os Conchifera. Dentro dos Aculifera,
se encontram os Aplacofora, chamados assim por não possuírem conchas calcárias, somente
espículas calcárias no manto. A rádula é uma característica simplesiomórfica em Mollusca, mas
se perde em Bivalvia. O grupo é constituído de seres filtrantes e a rádula perde sua função, o que
pode ter sido o motivo da perda dessa característica.

2. MORFOLOGIA GERAL DOS MOLUSCOS


Moluscos habitam ambientes marinhos, de água doce ou terrestre, em modo de vida livre
ou até como parasitas. Brusca (2013) nos apresenta um resumo das principais características
gerais dos animais que pertencem ao Filo Mollusca, conforme Quadro 2.
No entanto, tenha em mente que, em um grupo diversificado como este, há uma enorme
quantidade de variações e especificações que devem ser analisadas individualmente. Veja, por
exemplo, a comparação de modificações estruturais nos diferentes grupos exemplificadas pelas
Figuras 2, 3 e 4, apresentadas na sequência – atenção às legendas das imagens.

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Quadro 2 – Características do Filo Mollusca. Fonte: Brusca (2013).

Figura 2 – Molusco generalizado, com sistema circulatório aberto – diagrama para estudo. Estruturas genéricas: Ne-
frídios (para excreção e osmorregulação), Brânquias (ou Ctenídeos, relacionados às trocas gasosas), Rádula (forma-
da por dentes quitinosos, para raspar e cortar), Manto (espessa camada epidérmica-cuticular, que secreta o esqueleto
calcário – concha –, a forte musculatura promove locomoção – pé), Cavidade do manto (espaço entre a massa visce-
ral e o próprio manto e, em geral, abriga brânquias ou ctenídeos), Anel nervoso (conecta-se a fibras que enervam os
tentáculos, músculos e órgãos do sentido). Fonte: Hickman et al. (2016).

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Figura 3 – Anatomia da lula, em vista lateral, sistema circulatório fechado. Estruturas genéricas: Rim (para excreção
e osmorregulação), Brânquias (para trocas gasosas), Rádula (formada por dentes quitinosos, para raspar e cortar),

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Manto, Cérebro (conecta-se a fibras que enervam os tentáculos, braços, músculos e órgãos do sentido). Fonte: Hi-
ckman et al. (2016).

Figura 4 – Anatomia de caracol pulmonado, de sistema circulatório aberto, e massa visceral torcida. Estruturas
genéricas: Rim (para excreção e osmorregulação), Vasos pulmonados (trocas gasosas), Rádula (na boca, formada
por dentes quitinosos, para raspar e cortar), Manto (espessa camada epidérmica-cuticular, que secreta o esqueleto
calcário – concha –, a forte musculatura promove locomoção – pé), Gânglios cerebral e pedioso. Fonte: Hickman et
al. (2016).

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A classificação de moluscos viventes reúne as Classes Caudofoveata, Solenogastres,


Monoplacophora, Polyplacophora, Gastropoda, Bivalvia, Scaphopoda, Cephalopoda – muitas
vezes, as Classes Caudofoveata e Solenogastres são agrupadas em uma única classe denominada
Aplacophora. A seguir, apresentamos o Quadro 3 com as principais características de cada uma
das classes desse grande filo, que pode auxiliá-lo em seus estudos, mas que, de maneira nenhuma,
dispensa o aluno de dedicar-se a uma análise mais detalhada de cada uma delas.

Grego skaphe, bote +


estômago + pous , pé
Grego polys , muitas,

Latim bi , duplicado +
plax , placa + phora,

valva , valva, "porta"


Latim cauda , cauda

Grego solen , tubo +

cabeça + pous , pé
Grego mono , um +
Monoplacophora
gaster , estômago

Polyplacophora

várias + gaster ,
Solenogastres

Grego kephale,
Caudofoveata

+ fovea , fossa

Cephalopoda
Grego gaster ,

Scaphopoda
Gastropoda
estômago

pous , pé
Bivalvia
portador
Classe

Monoplacóforos; a Caramujos, Concha Dente-


Exemplar

Chaetoderma , Mexilhões e Polvos, lulas e


Neomenia maioria está Quítons caracóis e de-elefante,
Limifossor ostras Nautilus
extinta lesmas dentálios

Marinhos, de
Marinhos, a Marinho, Marinhos,
Habitat

Marinhos, Marinhos, regiões entre Marinhos ou de Marinhos,


maioria de terrestre ou de bentônicos ou
bentônicos bentônicos marés até as água doce bentônicos
profundezas água doce pelágicos
profundezas
Assimétrico

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pelo efeito da
Simetria bilateral,
Cílindricos e Alongado, torção, Mantido no
com amplo pé Comprimidos
Corpo

Vermiformes comprimidos achatado dorso- geralmente interior da Corpo amplo


achatado; ~ 3cm lateralmente
lateralmente ventralmente abrigado pela concha
de comprimento
concha
enrolada

Sem concha, Em geral


Concha em
com cutícula Formada por 8 Peça única concha
Sem concha, peça única
quitinosa e placas dorsais; tubular, reduzida ou
com espículas Formada por uma enrolada, mas
Concha

espículas com Duas valvas afunilada, ausente,


ou escamas única peça, em em alguns
carcárias em articulamento articuladas aberta nas disposta
calcárias forma de capuz pode ser não
forma de (exclusivo duas linearmente;
embutidas enrolada ou
escamas, deste grupo) extremidades exceto náutilos
ausente
imbricadas que a habitam

Cavidade do
Manto e Cavidade do

Manto forma manto Cavidade do Manto abriga


um cinturão anteriormente manto ampla, e os ctenídios,
Cavidade do Cavidade do Cavidade do
espesso, com 6 ou ao lado manto em geral Cavidade do forma funil
manto

manto manto manto pouco


a mais de 80 direito, sistema fundido manto ampla muscular
rudimentar rudimentar profunda
pares de nervoso e tubo formando (sifão) para
ctenídios digestivo sifões de água locomoção
torcidos
Rádula

Com, e com
Com Com ou Sem Com Com Complexa Sem Com
bico

Grande com
Com
olhos
estatocisto, Rudimentar,
Cabeça

Rudimentar, complexos,
Reduzida Reduzida Distinta e pequena Reduzida olhos e 1 a 2 projeta-se na
sem olhos com braços ou
pares de abertura maior
tentáculos ao
tentáculos
redor da boca

Muscular
Forma um disco
Sem um pé rastejador
muscular ventral, Comprimido Modificado
Muscular e achatado, com (modificado em Quase
fraco, com 8 pares Ventral amplo lateralmente, centrado na

ventral sulco pedioso alguns para cilíndrico


de músculos sem sola região cefálica
ventral nadar e
retratores
escavar)

Sem olhos, Ctenídios,


Sistema
tentáculos, Desprovidos de 1 par de Olhos podem olhos e coração
Sem olhos, com circulatório
Observações

estatocistos, olhos, nefrídios; sem ocorrer em ausentes; com


tentáculos ao redor Com estilete fechado; 1-2
estilete cristalino tentáculos, olhos, outras partes; 1 probóscide e
da boca, com cristalino; 1-2 pares de
ou nefrídios; estatocistos, tentatáculos ou par de estilete
estilete cristalino e nefrídios; ctenídios e
com escudo estilete cristalino estilete ctenídios; 1 par cristalino, 2
ânus posterior nefrídios
pedioso oral e 1 ou nefrídios cristalino de nefrídios pares de
complexos;
par de brâquias tentáculos

Quadro 3 – Características das Classes do Filo Mollusca, divididas em sete classes. Fonte: Brusca (2013) e Hickman
et al. (2016).

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Agora que você já tem alguma ideia das características gerais dos moluscos e
de alguns dos representantes deste fascinante grupo, assista à produção Origens
da Vida desenvolvida pela National Geographic, disponível em uma sequência de
seis vídeos que abordam o grupo desses animais incríveis (Partes 1 a 6, cada um
com aproximadamente 10 minutos). Neles você irá observar o funcionamento de
diversas estruturas, além da diversidade de espécies e modo de vida de alguns
representantes do Filo Mollusca. Parte 1, disponível em: <https://www.youtube.
com/watch?v=io1fPFe_K_Q>.

2.1 O Corpo

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Com corpos que variam de centímetro a metros, moluscos compartilham um plano
corpóreo comum e inconfundível. São bilateralmente simétricos, protostômios com celoma
vestigial, não são segmentados e, em geral, possuem cabeça bem definida. O celoma (cavidade
corpórea completamente circundada por mesoderma, o terceiro folheto germinativo de seres
triblásticos) limita-se ao redor do coração na maioria das espécies, mas pode envolver gônadas,
parte dos rins ou nefrídios, ou do intestino.
É notório que a principal cavidade do corpo é composta por uma hemocele (onde o
sangue, ou hemolinfa, banha os órgãos diretamente, em um sistema circulatório aberto); assim,
em geral, o corpo pode ser dividido em cabeça, pé e massa visceral (onde os principais órgãos são
encontrados).
Denomina-se manto a parede dorsal do corpo que forma um par de dobras, formado
por uma camada epidérmica-cuticular, com músculos circulares oblíquos e longitudinais na
parede do corpo que compõem um pé altamente muscular em animais, os gastrópodes. O pé
é especializado no movimento e, embora sofra modificações nos diferentes grupos, não perde
a função essencial de locomoção. No epitélio superficial, também é possível encontrar cílios,
glândulas de muco e terminações nervosas sensoriais.
Internamente, o par de dobras do manto delimita a cavidade do manto (espaço entre o
manto e a massa visceral). Em geral, é nessa cavidade que encontramos brânquias ou ctenídeos,
relacionados às trocas gasosas necessárias, além de ser possível encontrar as aberturas do tubo
digestivo, excretor e reprodutor. Em moluscos aquáticos, é criada uma corrente contínua de
água, por intermédio de cílios ou contração muscular, que traz oxigênio e alguns nutrientes
para a cavidade e leva para fora dela excretas e elementos reprodutivos. Em algumas espécies, os
ctenídios (brânquias) formam um eixo longo e achatado que se prolonga da parede da cavidade
do manto.

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Para compreender adequadamente as similaridades da vida em diferentes grupos


animais, vale retomar conceitos como de clivagem, de gastrulação e de folhetos
germinativos para entender adequadamente do que tratam os termos diblásticos
e triblásticos. Para tal, sugerimos a leitura do capítulo 8 do livro:
HICKMAN, C. P. et al. Princípios integrados de zoologia. 16. ed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2016.

2.2 A Concha dos Moluscos


Há uma grande variação de conchas entre os moluscos, característica que marca este

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grupo – com exceção dos Aplacophoras, que não possuem concha calcária. Esta estrutura é
secretada por glândulas da concha presentes no manto e apresenta três camadas (de fora para
dentro): perióstraco, camada prismática, camada nacarada, esta última está em contato com o
manto, e nela, lâminas muito finas e onduladas resultam na madrepérola.
A primeira concha aparece na fase larval e cresce continuamente por toda a vida do
animal. Embora as conchas possam variar muito quanto ao tamanho e à forma, todas possuem
um mesmo plano básico de construção, baseado em carbonato de cálcio. As conchas podem ser
formadas por uma, duas ou oito placas calcárias organizadas, provendo proteção e resistência às
partes moles do corpo.
Na Classe Cephalopoda, temos as lulas e as sibas nas quais a concha é reduzida e interna,
temos os polvos nos quais a concha é completamente ausente ou aparece apenas como um pequeno
vestígio, e temos os náutilos, que possuem conchas com câmaras que permitem a flutuação.
Já na Classe Gastropoda, encontramos animais com a concha torcida, torção acompanhada
pela massa visceral de todos os representantes desse grupo. Trata-se de uma rotação de 180º (duas
fases de 90º cada), sempre no sentido anti-horário quando visto do dorso – conforme Figura 5. Há
gastrópodes que mantêm a torção durante a vida adulta e são chamados de torcidos; já aqueles
que revertem secundariamente esta condição durante a vida adulta, total ou parcialmente, são
chamados de destorcidos.
O processo de torção é diferente do processo de enrolamento (enrolamento em espiral
da concha dos gastrópodes, também conhecido como espiralização), embora os dois possam
ocorrer simultaneamente. Embora todos os gastrópodes atuais descendam de ancestrais com
concha torcida e enrolada, evidências fósseis demonstram que estes foram eventos evolutivos
distintos.

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Figura 5 – Torção em uma larva véliger. Fonte: Hickman et al. (2016).

2.3 Circulação e Trocas Gasosas



Em geral, moluscos possuem sistema circulatório aberto (exceto cefalópodes) e
apresentam coração com três câmaras, vasos e seios sanguíneos, e pigmento respiratório no
sangue. Por ser um sistema aberto, o sangue não fica totalmente contido, pelo contrário, ele
flui através de vasos e penetra em seios abertos; mas essa característica torna a distribuição de
oxigênio para os diferentes tecidos do corpo menos eficiente, portanto, é um sistema mais comum
em animais vagarosos – em cefalópodes, o sistema é secundariamente fechado, o que lhes confere
maior agilidade.
O sangue dos moluscos, chamado de hemolinfa, contém várias células; o coração é
encontrado em uma cavidade pericárdica e é composto por dois átrios (ou aurículas) e um único
ventrículo – como exceção à regra, em monoplacóforos e náutilos, encontramos dois pares de
átrios.
As trocas gasosas ocorrem em órgãos especializados como ctenídios, brânquias,
pulmão, manto ou da superfície corporal. A hemolinfa oxigenada é bombeada pelos átrios para
o ventrículo e então para a os vários seios que banham os tecidos com a hemolinfa.

2.4 Excreção e Osmorregulação


A excreção também se relaciona à regulação osmótica dos organismos. Nos moluscos, em
geral, a excreção é feita por metanefrídios (rins), que se abrem de dentro da cavidade pericárdia
e drenam a excreta para o interior da cavidade do manto. Os nefrídios podem drenar regiões
específicas dos animais, mas em gastrópodes, pela perda de conexão com o celoma pericárdio, as
excretas podem ser retiradas diretamente do fluido circulatório.
Em cefalópodes, há maior complexidade de eventos, pois possuem sistema circulatório
secundariamente fechado. Os rins drenam o celoma pericárdico por canais específicos que
desembocam na cavidade do manto e envolvem regiões expandidas dos nefrídios, chamadas
sacos renais, e evaginações da parede delgada, chamadas de apêndices renais, que aumentam a
eficiência do sistema excretor em relação aos demais moluscos.

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2.5 Sistema Nervoso e Órgãos Sensoriais


O sistema nervoso de moluscos geralmente é mais simples que de anelídeos e artrópodes,
nos quais gânglios dispõem-se por segmento corporal. Derivado do plano básico protostômico, o
sistema nervoso de moluscos basicamente consiste em pares de gânglios com cordões conectivos
emparelhados e ventrais; com gânglios cerebrais, pleurais, pediosos e viscerais. O grau de
desenvolvimento dos gânglios varia de acordo com o grupo, de algo mais simples como um anel
nervoso simples que circunda o esôfago, até algo mais complexo como três pares de grandes
gânglios que se interconectam e formam um anel nervoso ao redor do tubo digestivo.
Moluscos possuem vários órgãos sensoriais altamente especializados, de tato, olfato,
paladar, equilíbrio e até visão. Exceto pela Classe Aplacophora, possuem uma grande variação
de tentáculos sensoriais, fotorreceptores, estatocistos e osfrádios (estruturas relacionadas ao
ctenídio, que funcionam como quimiorreceptores). A maioria dos gastrópodes possui um par
de tentáculos cefálicos, mas pulmonados superiores, e muitos opistobrânquios (subclasse de
Gastropoda) possuem dois pares; os tentáculos cefálicos podem apresentar olhos, células táteis
e quimiorreceptoras.

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Como já percebemos, cefalópodes são exceções à regra, e possuem um dos mais
desenvolvidos sistemas nervosos entre os invertebrados. Em cefalópodes, encontramos os pares
de gânglios presentes em outros moluscos, além de gânglios estrelados (responsáveis pela fuga
rápida desses animais), mas é a cefalização extrema que faz a diferença nesse caso, pois formam
lobos de um cérebro grande, que circunda a porção anterior do tubo digestivo. Em cada olho,
há um nervo óptico bem desenvolvido que se liga ao cérebro. Este cérebro é protegido por um
crânio cartilaginoso na maioria dos cefalópodes. Na maioria dos moluscos, os gânglios pediosos
situam-se na posição ventral e se estendem ao pé do molusco, mas em cefalópodes, esses gânglios
se dividem e inervam cada braço e tentáculo do animal.

Moluscos e cefalópodes são bastante distintos externamente. Que fatores nos


levam a crer que são realmente aparentados evolutivamente, quando desconsid-
eramos análises genéticas? Muito antes de termos acesso aos dados e às anális-
es genéticas, moluscos já eram tidos como aparentados. Embora encontremos
estruturas morfologicamente semelhantes internamente, muito do trabalho volta-
do à classificação e determinação histórica e evolutiva dos diferentes grupos é
baseado em hipóteses – o que torna comum a divergência de opiniões sobre o
assunto. Mas em Mollusca especificamente, dentre outras características, é inter-
essante a sugestão de que o funil formado por braços e tentáculos é derivado dos
pés de outros moluscos, devido à inervação das estruturas que se estendem do
manto (pé) aos gânglios nervosos.

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2.6 Locomoção
A maioria dos moluscos possui um pé notório, que pode conter um tipo de sola para
rastejar ventralmente, como em caramujos e lesmas. A sola possui cílios e glândulas que secretam
muco, permitindo que o animal deslize. Em gastrópodes, as glândulas pediosas são grandes e
secretam grande quantidade de muco, suprindo a necessidade de ambientes secos onde podem
habitar.
A contração do pé é, de fato, a principal forma de locomoção dos moluscos, horizontalmente
ou verticalmente. No entanto, há também o movimento por propulsão ciliar realizada por
pequenos moluscos, e a propulsão por jato de água realizada por cefalópodes.

2.7 Alimentação e Digestão



Com um sistema digestivo complexo, em geral, moluscos apresentam um órgão raspador
denominado rádula – estrutura exclusiva dos moluscos. Seja para lentos herbívoros ou vorazes
predadores, a rádula sofreu modificações evolutivas que contribuem para o sucesso dos moluscos

ZOOLOGIA DE MOLUSCOS E ARTRÓPODES | UNIDADE 1


nos mais variados modos de vida.
Da boca, onde é mais comum encontrarmos a rádula, o alimento segue para o esôfago (que
pode ser precedido de uma faringe muscular). Glândulas salivares e enzimáticas frequentemente
estão associadas ao tubo digestivo. No estômago, é comum que haja um ou mais dutos que
conduzem a cecos digestivos (de função digestiva). Do estômago, tem início o intestino, que é
finalizado na cavidade do manto (em um ânus), localizado próximo às correntes exalantes de
água.
Em evaginações do estômago, os cílios desempenham funções que auxiliam a digestão.
Dentre eles, encontramos o estilete cristalino, que estimula a liberação de proteínas e enzimas
digestivas ao rotacionar, misturando partículas alimentares e muco. Em alguns animais, o estilete
cristalino pode atingir até a metade do comprimento corporal do animal.
Assim, a digestão extracelular ocorre no estômago e nos cecos digestivos, e a absorção e
a digestão intracelular ocorrem nas paredes dos cecos e do intestino. Em cefalópodes, a digestão
extracelular predomina, pois o estômago perdeu algumas estruturas primitivas; assim, as enzimas
secretadas pelos cecos e pelo estômago digerem o alimento, que é absorvido no próprio estômago,
nos cecos e no intestino.

2.8 Reprodução e Desenvolvimento


Moluscos não apresentam reprodução assexuada, a maioria das espécies é dioica
(animais que produzem gametas femininos ou gametas masculinos), mas algumas espécies são
hermafroditas (produzem tanto gameta masculino quanto feminino).
A fecundação pode ser externa, como ocorre com espécies que lançam seus gametas na
água, ou interna, como observada em espécies que desenvolveram estratégias de reprodução que
incluem a retenção e o transporte de gametas.
Há espécies em que o desenvolvimento dos embriões ocorre internamente, mas os ovos
podem ser soltos no ambiente. Polvos geralmente depositam seus ovos agrupados em estruturas
que lembram um cacho de uva.
O desenvolvimento é basicamente igual ao dos demais protostômios, com clivagem
espiral típica. O desenvolvimento pode ser direto, misto ou indireto, com estágio larval, que é
exclusivo dos moluscos: o de véliger, que pode possuir pé, concha, opérculo e outras estruturas
semelhantes às dos adultos – veja um exemplo na Figura 6.

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ZOOLOGIA DE MOLUSCOS E ARTRÓPODES | UNIDADE 1


Figura 6 – Ciclo de vida de ostras, incluindo a larva véliger. Fonte: Hickman et al. (2016).

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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com maior popularidade de animais conhecidos como caracóis, lesmas, mexilhões, ostras,
lulas e polvos, moluscos apresentam uma grande diversificação, mas possuem características que
nos permitem agrupá-los com certa facilidade, como a presença de rádula, de pé muscular com
função locomotora e a secreção de concha. Com oito classes atuais, a filogenia é controversa,
como na maioria dos grupos de seres vivos, que neste caso inclui a possibilidade de terem
compartilhado um ancestral comum com os anelídeos e artrópodes. Mas os estudos continuam,
afinal não é tarefa simples inferir sobre o passado.
De grande maioria marinha, há também representantes terrestres, adaptados a diferentes
modos de vida. Diversos moluscos apresentam relevância socioeconômica, pois são vetores de
doenças, assim como também são fonte de renda e alimento para as diferentes classes econômicas
da sociedade humana, fato que remonta a tempos antigos.

ZOOLOGIA DE MOLUSCOS E ARTRÓPODES | UNIDADE 1


Com estruturas corporais que lhes permitem enfrentar as adversidades de ambientes
aquáticos de água doce ou salgada, e também ambientes terrestres secos, estes animais sofreram
grandes modificações ao longo do processo evolutivo, que lhes permitiram grande diversificação
e uma representação com mais de 160 mil espécies, entre fósseis e viventes.
Mesmo em se tratando de animais diminutos ou gigantescos, o corpo mole dos
moluscos e sensível a mudanças ambientais bruscas os torna bons indicadores ambientais.
Predadores agressivos, como alguns cefalópodes, podem ter contribuído para o surgimento
de novas características em outros grupos, como veremos nas unidades seguintes. Mas como
presas, moluscos não são as mais fáceis de serem capturadas, pois utilizam suas conchas como
ferramentas de defesa.
A provável modificação ocorrida dos pés de moluscos ancestrais aos atuais braços e
tentáculos de cefalópodes nos traz uma noção interessante de como os processos evolutivos, de
especialização de estruturas corpóreas, trabalham.
A visão generalista apresentada nesta unidade nos dá maior embasamento para
compreender as especificidades que serão abordadas na Unidade II desta apostila. Esperamos que
tenha se aprofundado nos estudos, como falamos inicialmente, e tenha aproveitado os materiais
complementares indicados para leitura, bem como os vídeos sugeridos.

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UNIDADE ENSINO A DISTÂNCIA

02
DISCIPLINA:
ZOOLOGIA DE MOLUSCOS
E ARTRÓPODES

MOLUSCOS: ECOLOGIA E CARACTERÍSTICAS


DOS PRINCIPAIS GRUPOS
PROF.A DR. RICARDO LOURENÇO DE MORAES

SUMÁRIO DA UNIDADE

INTRODUÇÃO ................................................................................................................................................................ 19
1. CLASSE CAUDOFOVEATA..........................................................................................................................................20
2. CLASSE SOLENOGASTRES....................................................................................................................................... 21
3. CLASSE MONOPLACOPHORA..................................................................................................................................22
4. CLASSE POLYPLACOPHORA....................................................................................................................................23
5. CLASSE GASTROPODA.............................................................................................................................................25
6. CLASSE BIVALVIA.....................................................................................................................................................28
7. CLASSE SCAPHOPODA............................................................................................................................................. 31
8. CLASSE CEPHALOPODA...........................................................................................................................................32
CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................................................................................36

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INTRODUÇÃO
Após abordarmos as características gerais de moluscos na Unidade 1, nesta unidade,
abordaremos algumas características específicas de cada uma das oito classes atualmente
indicadas como componentes do Filo Mollusca: Claudofoveata, Solenogastres, Monoplacophora,
Polyplacophora, Gastropoda, Bivalvia, Scaphopoda e Cephalopoda.
Nesta unidade, o objetivo é possibilitar que você possa compreender como as características
gerais do grupo refletiram no modo de vida e evoluíram para permitir que esse grupo apresentasse
a grande diversidade atual. Além disso, esperamos que você perceba a importância ecológica
desses animais, tanto do ponto de vista das relações ambientais que encontramos no meio
natural quanto do ponto de vista das relações ambientais estabelecidas com os seres humanos e
as modificações que causamos no meio ambiente.
Você irá conhecer mais detalhes sobre a forma e o desenvolvimento do corpo, a secreção

ZOOLOGIA DE MOLUSCOS E ARTRÓPODES | UNIDADE 2


de concha quando ela está presente (e quando não está), a forma da circulação sanguínea e das
trocas gasosas realizadas pelos animais nas diferentes situações ambientais, como esses animais
realizam a excreção de substâncias que não devem mais ficar alojadas em seus corpos, como
realizam a regulação osmótica de acordo com o meio em que vivem, além de particularidades
do sistema nervoso e sensorial de alguns deles, seus modos de captura e digestão de alimento, e
alguns casos de especificidades reprodutivas e de desenvolvimento.
Ao longo desta unidade, também são apresentadas as subclassificações mais aceitas pela
comunidade científica, o que lhe permite situar-se quanto ao grupo ou agrupamento de indivíduos
quando nos referimos a um membro do Filo Mollusca utilizando tanto seu nome latinizado (de
classificação) quanto o nome normatizado pelo nosso idioma (por exemplo: Pulmonata, nome
latinizado de uma subclasse de Gastropoda, e pulmonados, nome normatizado pela língua
portuguesa brasileira).
Como na unidade anterior, esperamos que você aproveite a indicação dos materiais
complementares e aprofunde seu conhecimento, tanto no que se refere a conceitos biológicos
quanto a conhecimento geral do modo de vida desses animais tão diversificados.

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ENSINO A DISTÂNCIA

1. CLASSE CAUDOFOVEATA
Os táxons Caudofoveata e Solonogastres (apresentados a seguir) anteriormente estavam
reunidos em uma única classe: a Aplacophora (FRANSOZO, 2017; HICKMAN et al., 2016).
Embora ambas possuam representantes que habitem profundidades marinhas de 200 metros a 3
mil metros, tenham corpo vermiforme e sejam desprovidos de concha, atualmente são agrupados
em duas classes irmãs distintas.
Esses animais apresentam coloração corpórea entre o marrom e o creme, e podem medir
de poucos milímetros a aproximadamente 14 centímetros. São cavadores e habitam substratos não
consolidados, nos quais constroem galerias verticais para si, para se posicionarem verticalmente,
mantendo uma extremidade (da cavidade do manto e das brânquias) para cima. Com rádula
reduzida e poucos dentes, alimentam-se de microorganismos e detritos.
Desprovidos de pé, seu manto forma um tubo cilíndrico. Com três regiões bem definidas
(anterior, posterior e mediana), seu corpo apresenta numerosas espículas alongadas – veja Figura
1. Na região posterior, é encontrada a cavidade do manto, que abriga um par de brânquias, ânus

ZOOLOGIA DE MOLUSCOS E ARTRÓPODES | UNIDADE 2


e a abertura dos gonodutos (são dioicos, de fecundação externa). Fransozo (2017) nos traz a
subclassificação dessa classe, conforme o Quadro 1 a seguir.

Figura 1 – Exemplar de Caudofoveata. Corpo coberto por espículas alongadas. Indicadas as regiões anterior, poste-
rior e do tronco (mediana). Fonte: Fransozo (2017).

Família Limifossoridae
Família Prochaetodermatidae
Família Chaetodermatidae
Quadro 1 – Subclassificação da Classe Caudofoveata. Fonte: Fransozo (2017).

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2. CLASSE SOLENOGASTRES
Composto por cerca de 250 espécies, esta classe agrupa animais marinhos, geralmente
sem rádula e com pé não muscular representado por um sulco mediano ventral (sulco pedioso –
veja Figura 2) – a locomoção é feita por cílios. Também habitam o substrato, como caudofoveatas,
mas podem viver sobre e se alimentar de cnidários. Com corpos que variam de 1 milímetro a 30
centímetros de comprimento, são hermafroditas protândricos (produzem gametas masculinos
quando jovens e gametas femininos quando mais velhos), mas possuem fecundação interna.
Esses animais não possuem brânquias verdadeiras; ao invés disso, realizam suas trocas
gasosas por brânquias secundárias, formadas por pregas no manto, também chamadas de papilas
respiratórias. O sistema digestório de solenogastres não é dividido em compartimentos e o
alimento segue por um tubo digestório volumoso que termina em um tubo curto e simples. Na
região pericardial, células de ultrafiltragem realizam a função excretora, já que esses animais são
desprovidos de metanefrídios.

ZOOLOGIA DE MOLUSCOS E ARTRÓPODES | UNIDADE 2


Figura 2 – Exemplar de Solenogastres, com espículas calcárias no corpo. Indicado sulco pedioso. Fonte: Fransozo
(2017).

Consideradas as diferenças entre os tipos de cutícula, espículas, glândulas do tubo


digestório, segundo Fransozo (2017), Solenogastres possui quatro ordens distintas, conforme o
Quadro 2.

Ordem Pholidoskepia
Ordem Neomeniamorpha
Ordem Sterrofustia
Ordem Cavibelonia
Quadro 2 – Subclassificação da Classe Solenogastres. Fonte: Fransozo (2017).

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3. CLASSE MONOPLACOPHORA
Anteriormente considerada um táxon extinto, em 1952 foram encontrados espécimes
vivos no oceano Pacífico. São animais bentônicos, com rádula, com uma única concha, de simetria
bilateral e contorno arredondado, que podem medir até 4 centímetros, com pé grande e achatado,
e oito pares de músculos pediosos, boca anterior e ventral – veja Figura 3.

ZOOLOGIA DE MOLUSCOS E ARTRÓPODES | UNIDADE 2


Figura 3 – Neopilina, Classe Monoplacophora. Espécimes vivos que variam de 3 mm a 3 cm de comprimento. A.
Vista ventral, B. Vista dorsal. Fonte: Brusca (2013).

O celoma desses animais circula as gônadas e o coração. Eles possuem de 5 a 6 pares de


brânquias, e de 3 a 6 pares de metanefrídios. São dioicos, de fertilização externa e desenvolvimento
ainda desconhecido, segundo Fransozo  (2017). Fransozo (2017) ainda nos traz algumas
informações interessantes sobre a possível filogenia que envolve esse táxon:

A repetição de estruturas externas e internas como brânquias, músculos


retratores, aurículas e metanefrídios é uma característica dos monoplacóforos
viventes, já que as espécies fósseis exibem apenas cicatrizes musculares múltiplas.
As espécies fósseis evoluíram ao longo de duas linhas, representadas pelo táxon
Cyclomya, com uma concha simetricamente enrolada, e pelo táxon Tergomya,
cuja concha é achatada e não enrolada, no qual, provavelmente, estão incluídas
as formas viventes.

Os Cyclomya desapareceram no período Devoniano e podem ter sido os ancestrais dos


gastrópodes e cefalópodes, se esses táxons se originaram de ancestrais com concha enrolada.
Os Tergomya podem também ser os ancestrais dos gastrópodes, caso estes tenham evoluído de
conchas não enroladas (FRANSOZO, 2017, p. 458).

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ENSINO A DISTÂNCIA

Diversos são os desafios encontrados por animais invertebrados e vertebrados


nos ambientes terrestres e aquáticos. Ricklefs (2018) trata sobre isso em seu liv-
ro, mais especificamente nos capítulos 2 e 3. Aperfeiçoe seus conhecimentos so-
bre o tema e leia:
RICKLEFS, R. A economia da natureza. 7. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan,
2018.

4. CLASSE POLYPLACOPHORA

ZOOLOGIA DE MOLUSCOS E ARTRÓPODES | UNIDADE 2


Animais marinhos, bentônicos, geralmente encontrados em zona entremarés, mas também
habitam grandes profundidades. O tamanho do corpo desses animais varia de 3 milímetros a 40
centímetros, são conhecidos como quítons – veja Figura 4.

Figura 4 – Quíton muscoso, Mopalia muscosa. A superfície superior do manto, ou “cinturão”, é coberta com pelos e
cerdas, uma adaptação para defesa. Fonte: Hickman et al. (2016).

Seus corpos são achatados dorso-ventralmente e possuem um pé ventral amplo, coberto


por concha formada por sete ou oito placas calcárias articuláveis, que se sobrepõem. Possui rádula
geralmente muito longa, com inúmeras fileiras de transversais com 17 dentes em cada uma delas
e, em alguns casos, revestidos com um mineral que contém ferro em sua composição, a magnetita
– adaptação que permite a raspagem contínua de superfícies rochosas.

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Com dois metanefrídios em forma de U, e cavidade pericárdica grande e localizada sob


as duas últimas placas da concha, a quantidade de brânquias varia de acordo com a espécie e,
em uma única espécie, pode variar de acordo com o tamanho do animal, podendo se estender
paralelamente ao pé, conforme Figura 5.

ZOOLOGIA DE MOLUSCOS E ARTRÓPODES | UNIDADE 2


Figura 5 – Polyplacophora em vista ventral, mostrando brânquias na cavidade palial, paralela ao pé. Fonte: Fransozo
(2017).

Geralmente dioicos, de fecundação externa ou interna, possuem gônadas fundidas que


se estendem da terceira à sexta valva. Os ovos são encapsulados por uma membrana espinhosa
que permite a flutuação e eclodem em uma larva trocófora – não existe larva véliger; no entanto,
algumas espécies que incubam seus ovos na cavidade do manto podem apresentar desenvolvimento
direto. Brusca (2013) nos traz a subclassificação do grupo, veja Quadro 3.

Ordem Lepidopleurida
Ordem Ischinochitonida
Ordem Acanthochitonida
Quadro 3 – Subclassificação da Classe Solenogastres. Fonte: Brusca (2013).

Alguns consideram que se a repetição de órgãos observada em Neopilina e em


alguns quítons for evidência de metamerismo, anelídeos e moluscos compartilh-
ariam um ancestral segmentado (HICKMAN et al., 2016).

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5. CLASSE GASTROPODA
Esta classe constitui o grupo mais diversificado de moluscos. Com grande irradiação
adaptativa, diversos exemplares ocupam os mais variados habitats, de água doce, marinha
e terrestre, em ambientes arenosos ou lamosos, nos quais são capazes de se enterrar ou de
permanecer como plâncton. Há registros fósseis constantes desde o Cambriano, e a estimativa é de
que possuam quase 100 mil espécies, das quais mais de 70% são espécies viventes. De modo geral,
devido aos nomes das três subclasses que compõem Gastropoda, chamamos de prosobrânquios
lapas e búzios, de opistobrânquios lesmas-marinhas e lebras-do-mar, e de pulmonados lesmas e
caracóis terrestres e de água doce.

A espécie de gastrópode conhecida como Janthina janthina secreta bolhas pelo

ZOOLOGIA DE MOLUSCOS E ARTRÓPODES | UNIDADE 2


pé e flutua na superfície da água. Há ainda grupos capazes de perfurar conchas
e corais ou de secretar substâncias tão resistentes pelo pé que são capazes de
aderir a superfícies a até à concha de outros moluscos. Como se não bastasse,
outro representante desse incrível grupo, herbívoro, é capaz de manter intactos os
cloroplastos do seu alimento e aproveitar o produto da fotossíntese como nutri-
entes. E, não se engane, as estratégias desse grande grupo não param por aí.

Na Figura 4, na Unidade I, é demonstrada a estrutura geral e interna de um gastrópode.


Nesse grupo, há três inovações importantes: (1) a concha foi convertida de um escudo protetor para
um refúgio protetor, (2) a torção da concha ocorre já na fase embrionária, (3) desenvolvimento de
uma cabeça, concentração de gânglios cefálicos.
A concha, embora seja pesada e reflita na baixa velocidade de reação do animal, é a
principal defesa de muitos deles. Em gastrópodes, a concha é única (univalve) e pode ser enrolada
ou não – em geral, há enrolamento para direita – veja Figura 6. O ápice é a primeira concha, que
surge ainda na fase larval do animal, e as deposições longitudinais na borda da concha marcam o
crescimento em linhas de crescimento.

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Figura 6 – Concha do búzio Busycon. A. e B. Busycon carica, uma espécie com concha enrolada para direita. Uma
concha dextrógira tem abertura no lado direito, quando mantida com o ápice para cima e a abertura voltada para o
observador. C. B. contrarium, uma espécie sinistrógira, ou com a concha enrolada para a esquerda. O ápice contém
a menor e mais velha volta da concha. Fonte: Hickman et al. (2016).

A circulação de gastrópodes inclui coração, artérias, veias, seios venosos e uma rede
fina de lacunas capilarizadas; no entanto, como resultado da torção da concha, a aurícula direita
torna-se vestigial ou desaparece. Há gastrópodes com um ou dois metanefrídios, que se abrem
na cavidade pericárdica. Em geral, gastrópodes marinhos excretam amônia e os de água doce
podem liberar excretas nitrogenadas como amônia, ureia, ácido úrico e aminoácidos. Animais
das subclasses Prosobranchia e Opisthobranchia fazem suas trocas gasosas através de brânquias
que estão alojadas na cavidade do manto. Na subclasse Pulmonata, as trocas gasosas acontecem
graças à alta vascularização da cavidade do manto, que entra em contato com o ar por uma
abertura chamada pneumostômio, veja Figura 7.

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ENSINO A DISTÂNCIA

ZOOLOGIA DE MOLUSCOS E ARTRÓPODES | UNIDADE 2


Figura 7 – Gastropoda pulmonado mostrando pneumostômio (abertura de acesso à cavidade do manto modificada
pela falta de brânquias). Fonte: Fransozo (2017).

Gastrópodes possuem a maior variedade de formas de reprodução dentre os moluscos.


Embora existam representantes hermafroditas simultâneos (protândricos ou partenogênicos),
nos quais a cópula pode ser recíproca ou pode ocorrer autofecundação, o maior número de
espécies é dioico, com fertilização que pode ser interna ou externa. Em geral, os ovos são grandes
e ricos em vitelo, com casca calcária, depositados em cordões envoltos por uma espessa matriz
gelatinosa. Gastrópodes basais que liberam gametas na água produzem larvas trocóforas livre-
natantes, que se desenvolvem em véliger. Em outras espécies de gastrópodes, a larva véliger pode
viver um longo período no plâncton, ou ainda, ter o início da torção durante esse período do seu
ciclo de vida. Brusca (2013) nos traz a subclassificação do grupo, veja o Quadro 4.

Subclasse Prosobranchia
Ordem Archaeogastropoda
Ordem Mesagastropoda
Ordem Neogastropoda
Subclasse Opisthobranchia
Subclasse Pulmonata
Ordem Archaeopulmonata
Ordem Basommatophora
Ordem Stylommatophora
Ordem Systellommatophora
Quadro 4 – Subclassificação da Classe Gastropoda. Fonte: Brusca (2013).

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6. CLASSE BIVALVIA
Bivalves possuem duas conchas (valvas) mantidas unidas dorsalmente por um ligamento,
as valvas são aproximadas uma da outra por músculos adutores que, ao se contraírem, movem-nas
no sentido contrário ao movimento natural do ligamento, veja a Figura 8. Vivem em ambientes de
água doce, estuarinas e marinhos, desde a zona de entremaré até as profundezas, com tamanho
corporal que varia de 1 milímetro a 1 metro de comprimento. Em geral, são filtradores e dependem
da corrente criada pelo movimento de seus cílios para se alimentarem. Podem impulsionar seu
corpo com o fechamento abrupto das valvas em um tipo de natação por propulsão, ou podem
locomover-se com um movimento de “estica e puxa” utilizando o pé delgado. Esses animais não
possuem cabeça ou rádula e a cefalização é reduzida.

ZOOLOGIA DE MOLUSCOS E ARTRÓPODES | UNIDADE 2


Figura 8 – Tagelus plebius, a unha-de-velha (classe Bivalvia). A Vista externa da valva esquerda. B Interior da valva
direita mostrando cicatrizes onde os músculos estavam fixados. O manto estava fixado na sua área de inserção. C
e D Seções que mostram a função do músculo adutor e do ligamento da charneira. Em C, o músculo adutor está
relaxado, permitindo ao ligamento da charneira manter as valvas separadas. Em D, o músculo adutor está contraído,
mantendo as valvas juntas. Fonte: Hickman et al. (2016).

Na Figura 9, podemos observar dois sifões, geralmente formados por prolongamentos


do manto, que ficam estendidos até a coluna d’água, enquanto o restante do corpo encontra-se
escondido abaixo do sedimento (infauna). Também existem espécies que vivem cimentados ao
substrato, compondo a epifauna, algo mais próximo aos bivalves primitivos, que eram formas não
sésseis da epifauna. O pé desse tipo de bivalve pode apresentar uma glândula que libera o bisso,
uma proteína escleratizada que ajuda na fixação do animal ao substrato, mas em outros, como as
ostras, a secreção é ainda mais resistente e recebe o nome de glândula de cimento.

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ENSINO A DISTÂNCIA

As trocas gasosas ocorrem pelo manto e pelas brânquias; estas são geralmente modificadas
para auxiliar na alimentação e derivam de ctenídios primitivos. Em bivalves, o sistema nervoso
é formado por pares de gânglios que inervam a região cefálica, o manto e a área do pé; muitos
possuem filamentos sensoriais que saem da região do manto em forma de tentáculos, ocelos, ou
olhos (com uma córnea, uma lente, uma retina e uma camada pigmentar).

ZOOLOGIA DE MOLUSCOS E ARTRÓPODES | UNIDADE 2


Figura 9 – Adaptações dos sifões em bivalves. A Espécie na qual os sifões inalante e exalante são claramente visíveis
acima da superfície sedimentar. B a D Em muitas formas marinhas, o manto prolonga-se para formar longos sifões.
Em A, B e D, o sifão inalante conduz para dentro tanto o alimento quanto o oxigênio. Em C, os sifões são respira-
tórios; as longas probóscides dos palpos, ciliadas, exploram a superfície do lago e conduzem alimento para a boca.
Fonte: Hickman et al. (2016).

Especialmente nas famílias Pterridae (marinhas) e Anodontidae (de água doce) ocorre
a formação de pérolas quando um corpo estranho entra e fica alojado entre a concha e o manto.
O manto então reveste esse corpo com sucessivas camadas nacaradas, na tentativa de defender
o animal contra o corpo invasor, no entanto o crescimento exagerado desse revestimento (uma
grande pérola) prejudica o animal.

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Brusca (2013) nos traz a subclassificação desse grupo, veja o Quadro 5.

Subclasse Protobranquia
Ordem Nuculida
Ordem Solemyida
Subclasse Lamellibranquia
Superordem Filibranchia
Superordem Eulamellibranchia
Ordem Paleoheterodonta
Ordem Veneroida
Ordem Myoida
Subclasse Anomalodesmata
Quadro 5 – Subclassificação da Classe Bivalvia. Fonte: Brusca (2013).

ZOOLOGIA DE MOLUSCOS E ARTRÓPODES | UNIDADE 2


Bivalves de água doce já povoaram o leste dos EUA com cerca de 300 espécies
diferentes, mas hoje mais de 24 espécies já foram extintas da região e outras mais
de 60 correm o mesmo risco. Como o modo de vida de humanos e bivalves podem
ter colaborado para esta triste realidade? Bivalves são animais filtradores, com
pouca ou nenhuma capacidade de mobilidade que lhes permita migrar de uma
região para outra. Os humanos, por sua vez, continuam a causar modificações físi-
cas, químicas e biológicas nos mais variados ambientes, de forma intencional ou
acidental. A poluição e a sedimentação da mineração, industrialização e agricultu-
ra, que diminuem a qualidade do ambiente, além da introduzirem espécies exóti-
cas, como o mexilhão-zebra trazido nos lastros de navios que vieram da Europa,
que elevam demais a competição por nutrientes suspensos na água circundante,
prejudicam bivalves nativos no leste do EUA. O equilíbrio ambiental é frágil e todas
as modificações podem causar grandes prejuízos, não apenas para os bivalves,
mas talvez também para outras espécies como a do ser humano, mesmo que ain-
da não tenham sido cogitados.

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ENSINO A DISTÂNCIA

7. CLASSE SCAPHOPODA

Representantes dessa classe de animais são exclusivamente marinhos, bentônicos,


capazes de habitar profundezes de até 6 mil metros, com tamanho corporal entre 4 milímetros e
15 centímetros, com cerca de 500 espécies viventes conhecidas, e são comumente chamados de
dentes-de-elefante ou dentálios, veja Figura 10.
O corpo alongado dos escafópodes é coberto por uma concha tubular (excretada pelo
manto fundido, que forma um cilindro), aberta nas duas extremidades, sendo a extremidade
anterior mais larga que a posterior. Sem olhos, tentáculos, brânquias ou osfrádio, com cabeça
pouco diferenciada e boca munida de mandíbula, rádula e captáculos (tentáculos filiformes
ciliados e musculares com extremidade expandida e aglutinante), esses animais vivem enterrados
no substrato arenoso ou lamoso, com certo grau de inclinação de seu corpo, com a extremidade
posterior voltada para cima. Em geral, são microcarnívoros da infauna e alimentam-se de
foraminíferos capturados pelos captáculos.

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Figura 10 – A concha dente-de-elefante, Dentalium (classe Scaphopoda). A. O animal enterra-se no lodo ou na areia
e se alimenta por meio dos tentáculos preênseis (captáculos). Correntes de água para a respiração são promovidas
por ação ciliar, entrando através da abertura na extremidade menor da concha e então expelida pela mesma abertura
por ação muscular. B. Anatomia interna de Dentalium. Fonte: Hickman et al. (2016).

O pé auxilia na ação de enterrar-se verticalmente, pela ancoragem do pé, como nos


bivalves, em um movimento de “estica e puxa”. Escafópodes possuem gânglios cerebrais, gânglios
pediosos, viscerais, pleurais e bucais, com receptores sensoriais associados ao manto e às aberturas.
A retração periódica do pé ejeta a água que entrou pela abertura posterior e levou oxigênio até
a cavidade do manto para as trocas gasosas (já que não possuem brânquias). Nesse processo,
também são ejetadas as excretas e os gametas (são dioicos, com fecundação externa, com larva
trocófora e fase véliger).

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Escafópodes são mais recentes nos registros fósseis e, provavelmente, evoluíram de um


ancestral comum aos bivalves, com rádula e brânquias – bivalves teriam perdido a rádula e
escafópodes, as brânquias.

8. CLASSE CEPHALOPODA
Conhecidos como polvos, lulas e náutilos, esses animais representam a classe mais
especializada dos moluscos. São todos animais marinhos, bentônicos ou pelágicos e predadores
ativos. Possuem pé realmente bastante modificado, que forma uma espécie de funil que funciona
como sifão de água e prolonga-se até formar um círculo (ou coroa) de braços ou de tentáculos ao
redor da boca – um esquema corporal interno pôde ser observado na Unidade I, Figura 3. Esses
animais podem medir de 8 milímetros a 14 metros de comprimento e encontramse em um grupo
com cerca de mil espécies de cefalópodes viventes, dos quais uma grande variedade pode ser
encontrada na região do Indo-Pacífico.
Na subclasse Coleoidea, octópodes (polvos) apresentam cabeça simples e arredondada,

ZOOLOGIA DE MOLUSCOS E ARTRÓPODES | UNIDADE 2


dois olhos conspícuos e oito braços com ventosas musculares (sem anéis córneos); teutódes (lulas)
apresentam cabeça grande e alongada, com estabilizadores natatórios, dois olhos conspícuos, oito
braços e dois tentáculos com ventosas musculares e com anéis córneos. A película que recobre
o disco achatado das ventosas é trocada com frequência para manter a habilidade de sucção, e
octópodes ainda usam seus braços para exploração tátil do ambiente.

Chamamos de convergência ou evolução convergente a presença de estruturas


semelhantes que não foram herdadas no processo evolutivo de um ancestral
comum. Por muito tempo, olhos de cefalópodes e de vertebrados foram citados
como exemplo de convergência, e olhos de artrópodes eram tidos como outro
exemplo de independência evolutiva. No entanto, atualmente reconhecemos que
todos os animais triblásticos com olhos compartilham, no mínimo, dois genes
preservados ao longo da evolução das espécies.

Cefalópodes são dioicos. Um dos braços nos machos adultos é utilizado para pegar o
espermatóforo armazenado em sua própria cavidade e depositar na cavidade do manto da fêmea,
próximo ao oviduto, veja Figura 11. Os ovos fecundados são anexados a outros objetos, como
pedras, de onde juvenis eclodem, sem fase larval livre-natante. Enquanto alguns octópodes
cuidam dos ovos, fêmeas de náutilo-de-papel secretam uma cápsula (uma “concha”) na qual os
ovos se desenvolvem.

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Figura 11 – Cópula em cefalópodes. A. Sibas acasalando. B. O polvo macho usa um braço modificado para depositar
espermatóforos na cavidade do manto da fêmea, para fecundar seus ovos. Polvos frequentemente cuidam de suas
desovas durante o desenvolvimento embrionário. Fonte: Hickman et al. (2016).

Os mesmos gânglios encontrados em outros moluscos também estão presentes em


cefalópodes, mas neste grupo estão fundidos, formando um cérebro. Com órgãos sensoriais bem
desenvolvidos, contando com células táteis, quimiorreceptoras, órgãos olfatórios e até linhas
epidérmicas na cabeça e nos braços com células sensoriais capazes de detectar movimento na
água (parecidas à linha lateral de peixes), cefalópodes possuem ainda uma excelente visão, embora
não enxerguem cores. Esses animais, que possuem formas de comunicação por movimentos
e sinais corporais, são capazes de distinguir formas e aprender observando outros polvos: em
experimentos controlados, um polvo é capaz de aprender que tipo de forma (quadrado ou
retângulo) recompensa positivamente o animal, e então repetir o comportamento para ser
recompensado.

Veja você mesmo um pouco das habilidades que um corpo mole, mas musculo-
so, aliado à capacidade de aprendizado, é capaz de realizar. Disponível no link:
<https://www.youtube.com/watch?v=_oDVFZSubUE>.

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Polvos perderam completamente sua concha. Lulas e sibas possuem uma pequena concha
interna envolvida pelo manto e constituem os endococleados (com concha interna), já os náutilos
são ectococleados (com concha externa), veja Figura 12. A concha em nautiloides é enrolada,
porcelanosa por fora e nacarada por dentro; e, diferentemente da concha de gastrópodes, é
formada por uma série de câmaras, separadas internamente umas das outras, mas conectadas
por um cordão de tecido nervoso (sifúnculo). Embora pareçam pesadas, as câmaras da concha se
enchem de gás e auxiliam na flutuação; nela o corpo do animal ocupa apenas a última câmara, a
mais recente.

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Figura 12 – Nautilus, um cefalópode. A. Nautilus vivo. B. Seção longitudinal, mostrando as câmaras cheias de gás
de concha e diagrama da estrutura corporal. C. Seção longitudinal através da concha de um amonoide. Fonte: Hi-
ckman et al. (2016).

Em cefalópodes, a boca é circundada por uma membrana, e internamente é possível


encontrar mandíbula, rádula e glândulas salivares. A circulação da água é realizada pelo movimento
de músculos e, no interior do manto, encontramos brânquias, gonóporos, nefridióporos e ânus.
Com exceção dos náutilos, a maioria dos cefalópodes usa a liberação de uma nuvem de
tinta como proteção. Sépia é o fluido escuro (marrom ou preto) contendo alta concentração de
melanina, que é secretado pela glândula de tinta localizada dentro do saco de tinta e expelido pelo
ânus quando o animal se sente ameaçado.
Além desse comportamento defensivo, cefalópodes contam com a presença de várias
células pigmentadas recobrindo seu corpo, em geral, sob controle do sistema nervoso. Essas
células permitem que o animal mude seu padrão de coloração, através da contração ou expansão
de pequenos músculos ligados a cada uma delas. A mudança de coloração pode ser utilizada
como camuflagem ou como sinalização de ameaça a outros machos, por exemplo.

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Nautilus são predadores bentônicos e usualmente se alimentam de crustáceos decápodes.


Lulas alimentam-se essencialmente de peixes e outras lulas capturadas na coluna d’água. Já polvos
são carnívoros generalistas e é comum que se alimentem de bivalves, crustáceos e gastrópodes
(dos quais são capazes de perfurar a concha). Veja a subclassificação de Cephalopoda apresentada
por Brusca (2013) no Quadro 6.

Subclasse Nautiloidea
Subclasse Coleoidea
Ordem Sepioida
Ordem Teuthoida
Ordem Octopoda
Ordem Vampyromorpha
Quadro 6 – Subclassificação da Classe Cephalopoda. Fonte: Brusca (2013).

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesta unidade, vimos algumas especificidades que explicam tanto o entendimento de


alguns cientistas em querer manter Caudofoveata e Solenogastres como uma única classe quanto
especificidades que justificam a separação desses animais em duas classes distintas.
Ao longo da unidade, foi possível observar que o número de placas ou conchas, bem como
sua disposição no corpo dos animais também influenciam sua classificação. Em cada caso, por
mais similares que os animais sejam, houve sempre a necessidade de ajustes que possibilitassem
maior aproveitamento no ambiente, dos nutrientes, ou do espaço interno do corpo, de acordo
com o meio ambiente no qual se desenvolveram.
Em gastrópodes, por exemplo, ao que tudo indica, a torção da concha levou à perda
de brânquias, à consequente inutilização e perda de um átrio cardíaco, e ao surgimento de um
pneumostômio para que a oxigenação dos tecidos ocorresse. Já em bivalves, o modo de vida sob
o substrato levou ao surgimento de sifões que promovessem a circulação da água no interior do

ZOOLOGIA DE MOLUSCOS E ARTRÓPODES | UNIDADE 2


corpo, oxigenando os tecidos e retirando excretas.
Cefalópodes, como já havíamos visto na primeira unidade desta apostila, continuam a
surpreender, com suas grandes modificações estruturais e comportamentais. Surpreendem desde
o uso de braços e tentáculos especializados, inclusive durante a reprodução, até a presença de
uma grande concha que permite a flutuabilidade do animal. E, é claro, não vamos nos esquecer
da capacidade de aprendizagem dos octópodes pela simples observação, como vimos.
Não é por acaso que o Filo Mollusca está entre os invertebrados mais bem-sucedidos
no processo evolutivo da vida em nosso planeta. Finalizando esta unidade e o estudo dos
moluscos nesta apostila, temos certeza de que você foi capaz de conhecer e compreender melhor
a composição e o funcionamento de estruturas internas encontradas nesses animais, de grande
importância sanitária, ambiental, social e econômica para o ser humano.

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UNIDADE ENSINO A DISTÂNCIA

03
DISCIPLINA:
ZOOLOGIA DE MOLUSCOS
E ARTRÓPODES

ARTRÓPODES: FILOGENIA E
MORFOLOGIA GERAL
PROF.A DR. RICARDO LOURENÇO DE MORAES

SUMÁRIO DA UNIDADE

INTRODUÇÃO ................................................................................................................................................................39

1. FILOGENIA DO FILO ARTHROPODA.........................................................................................................................40

2. MORFOLOGIA GERAL DOS ARTRÓPODES..............................................................................................................42

2.1 O CORPO...................................................................................................................................................................45

2.1.1 EXOESQUELETO.....................................................................................................................................................46

2.1.2 APÊNDICES........................................................................................................................................................... 47

2.2 SUSTENTAÇÃO E LOCOMOÇÃO.............................................................................................................................48

2.3 CRESCIMENTO........................................................................................................................................................48

2.4 CIRCULAÇÃO E TROCAS GASOSAS.......................................................................................................................49

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2.5 EXCREÇÃO E OSMORREGULAÇÃO.......................................................................................................................50

2.6 SISTEMA NERVOSO E ÓRGÃOS SENSORIAIS.................................................................................................... 51

2.7 ALIMENTAÇÃO E DIGESTÃO.................................................................................................................................. 52

2.8 REPRODUÇÃO E DESENVOLVIMENTO................................................................................................................ 52

CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................................................................ 54

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INTRODUÇÃO
A evolução da vida é realmente algo incrível. Pequenas diferenças, com o passar de
milhares de anos, ao longo de milhares de gerações, tornam-se grandes diferenças, caracterizam
grupos e determinam o modo de vida de milhares de espécies distintas.
Do grego Arthron, “articulação”, e podos, “pés”, o termo artrópodes se refere essencialmente
à presença de articulação em apêndices corporais que realizam a locomoção e a comunicação
com o meio ambiente no qual o animal está inserido. Artrópodes representam mais de 60% de
todas as espécies de seres vivos descritas no planeta Terra e cerca de 80% de toda a diversidade
animal. Artrópodes habitam os mais variados habitats, e os representantes incluem os crustáceos
de ambientes aquáticos, insetos, aranhas, escorpiões, centopeias, lacraias e muitos outros animais
conhecidos por qualquer ser humano. Hickman et al. (2016) nos apresentam sua reflexão sobre
o processo evolutivo do grupo:

Em algum momento e em algum lugar durante a era Pré-Cambriana, aconteceu


um importante marco da evolução da vida na Terra. A cutícula macia do ancestral
segmentado de animais que hoje denominamos artrópodes foi endurecida com

ZOOLOGIA DE MOLUSCOS E ARTRÓPODES | UNIDADE 3


a deposição adicional de proteína e de um polissacarídeo inerte denominado
quitina. O exoesqueleto circular ofereceu proteção contra predadores e outros
perigos ambientais, e conferiu a seu possuidor uma lista formidável de outras
vantagens seletiva (HICKMAN et al., 2016, p. 650).

Nesta unidade, iniciaremos o estudo de outro grande grupo de invertebrados, o


maior deles, o grupo dos artrópodes. Por ora, iremos nos concentrar em conhecer as características
gerais desse grupo, qual a provável história evolutiva que possibilitou seu surgimento, que aspectos
de seu corpo nos sugerem um parentesco evolutivo com outros grupos e que características os
tornaram os mais bem-sucedidos invertebrados do planeta Terra, levando alguns a considerar
que este é o planeta dos artrópodes, no qual a humanidade vive.
Mantenha e aperfeiçoe o hábito de se concentrar nas principais características e nas
consequências delas no modo de vida dos animais, pois, na última unidade, iremos tratar de
especificidades de cada um dos subfilos pertencentes ao Filo Arthropoda.

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1. FILOGENIA DO FILO ARTHROPODA


Artrópodes são considerados parte de um grupo maior, os Panarthropodas, composto
também por Onychophora (espécies viventes terrestres, segmentadas, com características mais
próximas aos anelídeos e artrópodes) e Tardigrada (entre 0,1 e 1,7 mm, têm ampla distribuição,
com características semelhantes aos onicóforos e artrópodes). Alguns traços evolutivos sugerem
que anelídeos, artrópodes, onicóforos e tardígrades sejam descendentes de um ancestral
segmentado comum que surgiu no Pré-cambriano, mas os estudos continuam.
A classificação criada por Robert Snodgrass no início da década de 1930, demonstrada no
Quadro 1 a seguir, ainda é encontrada em muitos livros atuais. Ao lado desta, podemos observar
a classificação atualizada, diante de novas descobertas fósseis, dados morfológicos e moleculares,
além de descobertas genéticas.

Esquemas de Classificação dos Artrópodes


A Classificação dos Artrópodes em A Classificação dos Artrópodes em Cinco

ZOOLOGIA DE MOLUSCOS E ARTRÓPODES | UNIDADE 3


Três Subfilos (sensu Snodgrass, 1938) Subfilos (conforme Brusca, 2013 )

Filo Arthropoda Filo Arthropoda


Subfilo Trilobita Subfilo Trilobitomorpha
Subfilo Chelicerata Subfilo Cheliceriformes
Classe Merostomata Classe Chelicerata
Subclasse Xiphosura Subclasse Merostomata
Subclasse Eurypterida Ordem Eurypterida
Classe Arachnida Ordem Xiphosura
Classe Pycnogonida Subclasse Arachnida
Subfilo Mandibulata Classe Pycnogonida
Classe Crustacea Subfilo Crustacea
Classe Atelocerata (=Tracheata) Subfilo Hexapoda
Subclasse Hexapoda Classe Entognatha
Subclasse Myriapoda Classe Insecta
Subfilo Myriapoda
Quadro 1 – Esquemas de classificação dos artrópodes, de 1930 e 2013. Fonte: Brusca (2013).

Segundo Brusca (2013) e Hickman et al. (2016), atualmente temos uma classificação mais
amplamente aceita composta por: subfilos Trilobitomorpha; Crustacea; Hexapoda; Myriapoda;
Cheliceriformes. Hickman et al. (2016) ainda nos apresentam um cladograma das prováveis
relações evolutivas de características presentes em cada um deles, conforme Figura 1.

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Figura 1 – Cladograma dos artrópodes existentes, com as prováveis relações entre os quatro subfilos. Apenas algu-
mas sinapomorfias estão incluídas aqui. Os crustáceos e os hexápodes são mostrados como táxons-irmãos, no clado
Pancrustacea. Uma relação de táxon-irmão entre Pancrustacea e Chelicerata está baseada na posse compartilhada de
mandíbulas e dados de filogenias moleculares. Fonte: Hickman et al. (2016).

Os arthropodas são monofiléticos com três sinapomorfias (Figura 1). A mandíbula é


uma característica autopomórfica surgindo inicialmente em Arthropoda, separando-os em um
novo grupo denominado Mandibulata dentre os artrópodes. Em Mandibulata, estão incluídos
Myriapoda, Crustacea e Hexapoda. Contudo, há três características sinapomórficas que separam
o grupo Pancrustacea dos demais; e nele estão presentes Crustacea e Hexapoda. No entanto,
devemos observar que alguns autores sugerem que os Hexapoda se originaram de Crustacea,
diferentemente do apresentado no cladograma anterior.

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2. MORFOLOGIA GERAL DOS ARTRÓPODES


Brusca (2013) nos traz uma reflexão interessante sobre os artrópodes:

Se vamos compreender, de alguma forma, a ‘essência dos artrópodes’, então


devemos primeiro entender o efeito das principais sinapomorfias desse filo
– o exoesqueleto duro e articulado – a qual distingue esses animais de seus
parentes de corpo mole, em particular os anelídeos. Lembre-se que os anelídeos
são caracterizados por apresentarem corpos segmentados, espaços celomáticos
arranjados de forma serial, e que surgem da região localizada em frente ao pigídio
durante a embriogênese teloblástica, e músculos circulares e longitudinais
bem desenvolvidos na parede do corpo. Agora, imagine-se envolvendo uma
criatura como um anelídeo dentro de um exoesqueleto rígido. Que tipos de
problemas estruturais e funcionais teriam de ser resolvidos para que tal animal
sobrevivesse? Embora haja um bom número de soluções possíveis, os artrópodes
desenvolveram um conjunto particular de adaptações altamente bem-sucedidas,
conhecido como a artropodização. A artropodização tem suas raízes nos

ZOOLOGIA DE MOLUSCOS E ARTRÓPODES | UNIDADE 3


Onychophora e Tardigrada, mas alcançou o aproveitamento total somente nos
artrópodes (BRUSCA, 2013, p. 493).

No Quadro 2, temos um resumo das principais características gerais dos animais que
pertencem ao Filo Arthropoda, segundo Brusca (2013). Além disso, diversas estruturas externas
e internas podem ser observadas nas Figuras 2 e 3, apresentadas na sequência.

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Quadro 2 – Características do Filo Arthropoda. Fonte: Brusca (2013).

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Figura 2 – Anatomia geral do corpo de insetos. Fonte: Brusca (2013).

Figura 3 – Anatomia interna de dois insetos comuns, barata e gafanhoto. Fonte: Brusca (2013).

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2.1 O Corpo
Artrópodes possuem corpo segmentado e recoberto por um rígido exoesqueleto. É a
presença de membranas intersegmentares e articulações que dão flexibilidade ao corpo dos
artrópodes. A maioria dos segmentos (somitos) do corpo tem 1 par de apêndices (raramente
2), que podem ser unirramados ou birramados (estes termos serão mais bem abordados no
tópico 2.1.2), veja as Figuras 4 e 5. O corpo dos artrópodes é uma hemocele aberta, com os
órgãos banhados no fluido hemocelomático, ou sangue. O corpo é revestido por uma cutícula
(em camadas), que é secretada pela epiderme, e cada segmento do corpo (somito) está envolto
por placas esqueléticas chamadas de escleritos. As pernas e asas desses animais articulam-se na
região pleural, em áreas não esclerotizadas (não endurecidas). Os apêndices sofreram incontáveis
modificações e podem exercer diversas funções.
Os somitos e os apêndices formam tagmas, como, por exemplo, cabeça, tórax e abdômen,
em um processo denominado tagmose, e são especializados em certas funções, de acordo com o
grupo de artrópodes analisado.

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Figura 4 – Estruturas de um crustáceo da Classe Malacostraca. Fonte: Brusca (2013).

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Figura 5 – Morfologia externa de um crustáceo. Fonte: Brusca (2013).

2.1.1 Exoesqueleto
Artrópodes possuem exoesqueleto cuticular secretado pela epiderme subjacente com
quitina e proteínas com graus variáveis de calcificação por sais de cálcio, como o carbonato e o
fosfato. É o exoesqueleto rígido que fornece a sustentação ao corpo, além de ponto de apoio para
a musculatura (apódema). Para a dureza da cutícula, as proteínas devem passar por um processo
conhecido por tanização. Assim, há três camadas que compõem o exoesqueleto: a epicutícula
(proteína e lipídios, com função protetora), a endocutícula (quitina e proteína, com função de
flexibilidade) e a exocutícula (quitina e proteína tanizada, com função de dureza); no entanto,
existem diferentes tipos de exoesqueleto de acordo com o habitat em que os animais vivem.
A rigidez do esqueleto impõe que o crescimento ocorra pelo processo de mudas periódicas
(ecdise) – veremos mais detalhes a seguir –; assim, o crescimento externo do animal fica restrito à
troca de exoesqueleto. O enrijecimento do novo exoesqueleto varia de acordo com a espécie e, até
ser concluído, o animal fica vulnerável a predadores e ao estresse osmótico, já que não tem “sua
armadura” ou a camada de cera para protegê-lo da perda de água, por exemplo.
A cutícula teve forte influência na vantagem evolutiva de artrópodes, pois os protege
de lesões, predadores e estresse osmótico, e ainda possibilita o recebimento de informações
provenientes do ambiente, como veremos ao falarmos dos apêndices.

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2.1.2 Apêndices

Os apêndices dos artrópodes são projeções articuladas da parede do corpo. Músculos


extrínsecos, que conectam o membro ao corpo, e músculos intrínsecos, confinados ao membro,
movimentam as várias peças do apêndice (ou artículos) e permitem a ação rápida dos animais.
Exemplos de apêndices birremes (ou filopódios; do grego phýllon, “em forma de folha”)
são os com grandes exitos, como brânquias, limpadores de brânquias ou remos para natação,
por isso geralmente são associados a artrópodes nadadores, como no Subfilo Crustacea, e se
restringem a apenas crustáceos e trilobitas (extintos). Apêndices sem grandes exitos são chamados
unirremes (ou estenopódios; do grego stenós, “estreito”) – veja Figura 6.
Apêndices apresentam pelos, cerdas e espinhos sensoriais, que podem estar adaptados
para funções sensoriais, manipulação de alimento, uma locomoção mais eficiente e muito mais
rápida, e natação.

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Figura 6 – Dois caracteres importantes dos artrópodes: os apêndices podem ser unirremes (perna de uma abelha) ou
birremes (membros de uma lagosta); as peças bucais podem incluir quelíceras (aranha) ou mandíbulas (gafanhoto).
Note que a presença/ausência de brânquias não está relacionada com a forma do apêndice. Fonte: Hickman et al.
(2016).

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A grande diversidade observada nos apêndices dos artrópodes surgiu pelo poten-
cial exclusivo dos genes homeobox (Hox), e outros genes de desenvolvimento, e
a cadeia de genes regulados por eles, que, embora sejam conservativos, são flex-
íveis em sua expressão. Então, qual seria a capacidade de um único gene em in-
fluenciar na diversidade de espécies ao longo da evolução? Atualmente, sabemos
que o desenvolvimento de apêndices é influenciado, em particular, pelos genes
Distalless (Dll) e Extradenticle (Exd), que são independentes entre si e podem ou
não ser expressos, durante toda a vida ou parte do ciclo de desenvolvimento dos
animais. Dll é um gene antigo que ocorre em muitos táxons animais, mas sua
manifestação é tão diversa quanto seu alto potencial em contribuir com a diversi-
dade da vida.

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2.2 Sustentação e Locomoção
O exoesqueleto dos artrópodes lhes dá suporte e mantém a forma corporal. Neste grupo,
os músculos são organizados em forma de feixes curtos, que se estendem entre os segmentos do
corpo, ou através das articulações de apêndices e outras regiões, ligando-as. Pares de músculos
antagônicos e pontos de cutícula (fina e flexível) atuam em conjunto para que o movimento
ocorra.
Artrópodes se locomovem por várias formas de caminhar, rastejar, nadar, saltar, flutuar,
perfurar, arrastar e correr, sobre terra ou sob a terra ou água. O voo é a única forma de locomoção
que não depende do uso de apêndices típicos do grupo, baseados em articulação.

Sugerimos que assista a este vídeo para observar a variedade dos tipos de asas em
insetos. Disponível no link: <https://www.youtube.com/watch?v=5q3CRH69snk>.

2.3 Crescimento
A muda é um fenômeno característico dos artrópodes e de alguns outros invertebrados
– no entanto, esta não é tida como uma característica homóloga, embora já tenha sido sugerida.
A rigidez do esqueleto impõe que o crescimento ocorra pelo processo de mudas periódicas, que
são controladas pelo hormônio ecdisona; por essa razão, é conhecida como ecdise. Durante
os estágios de intermuda, denominados instares, ocorre o crescimento real dos tecidos dos
artrópodes até o corpo “preencher” seu envoltório de exoesqueleto. Com a secreção de enzimas
que fazem a digestão de parte da antiga, separa-se o exoesqueleto da epiderme do animal, até que
este possa se libertar do velho exoesqueleto, chamado de exúvia – veja Figura 7.

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Figura 7 – Sequência da muda na lagosta Homarus americanus. A. Ruptura da membrana entre a carapaça e o abdô-
men e o início de uma lenta elevação da carapaça. Esse passo pode consumir duas horas. B. e C. Liberação da cabeça,
tórax e, finalmente, do abdômen. Esse processo, em geral, toma não mais do que 15 minutos. Imediatamente após a
ecdise, os quelípodes estão desidratados e o corpo é muito mole. A lagosta continua a absorver água rapidamente de
maneira que, em 12 horas, o corpo aumenta 20% em comprimento e 50% em peso. A água dos tecidos será substitu-
ída por proteínas nas semanas subsequentes. Fonte: Hickman et al. (2016).

Em cada grupo, o animal liberta-se por linhas específicas que se abrem e pelas quais o
animal pode sair. Durante o processo de muda, uma nova cutícula está sendo secretada e, ao

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libertar-se, o artrópode entra em um período de pós-muda ou pós-ecdise, no qual a cutícula é
endurecida. Em alguns animais, esse processo ocorre ao longo de toda a vida, mas, em outros,
cessa em determinado ponto, quando um tamanho máximo é atingido – o estágio de não ecdise
ou intermuda permanente. Veja um gráfico que compara o crescimento externo de um artrópode
e de um não artrópode (tamanho do corpo em função do tempo), na Figura 8.

Figura 8 – Crescimento comparado entre artrópodes e não artrópodes. A linha contínua grossa indica o padrão de
crescimento de um artrópode, no qual é considerado o tamanho externo do animal, associado às mudas. A linha
tracejada indica o crescimento real dos tecidos do artrópode. A linha cinza representa o crescimento típico de um
não artrópode. Fonte: Brusca (2013).

2.4 Circulação e Trocas Gasosas


Artrópodes possuem sistema circulatório aberto, com coração contrátil dorsal, artérias e
hemocele (seios sanguíneos). As trocas gasosas ocorrem pela superfície corporal, por brânquias,
traqueias (tubos aéreos) ou pulmões foliáceos.
Artrópodes são, em geral, animais de grande atividade e, para isso, sua estrutura corporal
deve ser capaz de conduzir oxigênio aos tecidos e às células, aumentando a taxa metabólica durante
as atividades intensas. As estruturas para troca gasosa nos artrópodes não são homólogas, ou seja,
são homoplásticas, evoluíram independentemente, sem um ancestral comum.

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ENSINO A DISTÂNCIA

E, por essa razão, são um reflexo da quantidade de água disponível no ambiente e do tamanho do
corpo do animal.
Artrópodes aquáticos possuem brânquias, outros artrópodes aquáticos de pequeno porte
realizam as trocas gasosas por uma fina cutícula. As formas terrestres, em geral, retiram o oxigênio
do ar por pulmões foliáceos, traqueias, ou túbulos em apêndices abdominais.
Com sistema circulatório aberto, o sangue (hemolinfa) é drenado do coração por meio
de pequenos vasos até o hemocelo (espaços nos tecidos preenchidos por sangue), no qual são
irrigados os órgãos internos. O sangue retorna pelo seio pericárdico e entra no coração por
aberturas denominadas óstios. O sangue contém amebócitos e pigmentos respiratórios de natureza
proteica, hemocianina e, mais raramente, hemoglobina. Veja, na Figura 9, a representação do
sistema circulatório de um inseto.

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Figura 9 – O sistema circulatório dos insetos. A. O abdômen de um inseto (em seção transversal). B. A circulação de
sangue em um inseto com sistema circulatório completamente desenvolvido, as setas indicam o curso da circulação.
C. Uma barata, com diafragma dorsal e os músculos alares dispostos de forma contínua sobre a parede ventral do
coração e dos vasos. Fonte: Brusca (2013).

2.5 Excreção e Osmorregulação


Artrópodes possuem estruturas excretoras denominadas glândulas coxais, antenais ou
maxilares, ou órgãos excretores denominados túbulos de Malpighi. Esses animais desenvolveram
estruturas excretoras altamente eficientes que são fechadas internamente – uma característica
adaptativa compartilhada.
Diferentemente dos anelídeos (protostômios segmentados e celomados, com nefrídios
com nefróstomas abertos), os artrópodes reduziram o número total de unidades excretoras, como
em crustáceos adultos nos quais persistem apenas um par de nefrídios (nefromixia) associado a
segmentos da cabeça, ou seja, glândulas antenais ou maxilares. Nos aracnídeos, podem existir
até quatro pares de nefrídios que se abrem na base das pernas locomotoras, ou seja, as glândulas
coxais.

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Os túbulos de Malpighi são estruturas excretoras que surgem como túbulos de fundo
cego que se estendem para dentro da hemocele a partir da parede do trato digestivo, retirando
excretas, água, sais e nutrientes do hemocélio e lançando-os diretamente no estômago, onde
porções aproveitáveis são absorvidas e a concentração da urina é aumentada. Túbulos de Malpighi
estão presentes em quatro grupos de artrópodes terrestres: aracnídeos, miriápodes e insetos
(assim como tardígrades).

Túbulos de Malpighi são túbulos com fundo cego que se abrem no intestino da
grande maioria dos insetos e de alguns miriápodes e aracnídeos, e funcionam
essencialmente como órgãos excretores. Brusca (2013) aborda com mais detal-
hes o tema, e dá a chance de você explorar o livro sobre esse assunto utilizando
o índice alfabético (no final do livro, com a indicação das páginas onde o termo
é abordado), algo realmente útil em livros com grande quantidade de conteúdo,
co-mo livros de Zoologia. Aprofunde seus conhecimentos sobre os Túbulos de

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Mal-pighi, explore e leia:
BRUSCA, R. C. Invertebrados. 2. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013.
Túbulos de Malpighi são túbulos com fundo cego que se abrem no intestino da
grande maioria dos insetos e de alguns miriápodes e aracnídeos, e funcionam
essencialmente como órgãos excretores. Brusca (2013) aborda com mais detal-
hes o tema, e dá a chance de você explorar o livro sobre esse assunto utilizando
o índice alfabético (no final do livro, com a indicação das páginas onde o termo
é abordado), algo realmente útil em livros com grande quantidade de conteúdo,
co-mo livros de Zoologia. Aprofunde seus conhecimentos sobre os Túbulos de
Mal-pighi, explore e leia:
BRUSCA, R. C. Invertebrados. 2. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013.

2.6 Sistema Nervoso e Órgãos Sensoriais


Artrópodes possuem um sistema nervoso semelhante ao dos anelídeos, formado por duas
ou três regiões. Crustáceos, hexápodes e miriápodes possuem um cérebro tripartite composto
pelo protocérebro e deutocérebro (gânglios anteriores) e tritocérebro (gânglio posterior); este
último geralmente forma cognitivos em volta do esôfago.
A presença do exoesqueleto teve um importante efeito na natureza dos receptores
sensoriais. Artrópodes possuem órgãos sensoriais bem desenvolvidos, que possibilitam padrões
comportamentais mais complexos do que a maioria dos invertebrados e até organização social.
Em sua maioria, são receptores químicos e mecânicos externos, constituídos por vários tipos de
cerdas móveis, poros e fendas, denominados, como um todo, sensilas. Os estímulos recebidos
pelos receptores são transmitidos aos neurônios.

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Artrópodes têm uma ótima percepção do que acontece no ambiente. Apresentam órgãos
sensoriais que vão desde olhos compostos (em mosaico) até aqueles relacionados com o tato, o
olfato, a audição, o equilíbrio e a recepção química. Há uma variedade de estruturas cutâneas, em
forma de cerdas, espinhos e cavidades – os exteroceptores – que possibilitam a comunicação com
o meio ambiente. Além disso, artrópodes podem apresentar três tipos de fotorreceptores: ocelos
simples, ocelos complexos com lentes e olhos compostos ou facetados. Os olhos compostos de
artrópodes são formados por unidades fotorreceptoras denominadas omatídeos, sendo que cada
uma delas tem o próprio campo visual e é alimentada por um nervo óptico próprio conectado ao
nervo principal – alguns artrópodes podem conter milhares de omatídeos.

Os olhos compostos de artrópodes, embora possam ser encontrados nos quatro


subfilos vivos do grupo, foram perdidos ou modificados em diversos táxons inferi-
ores ao longo de todo o Filo Arthropoda. Já os Túbulos de Malpighi, apresentados
no item anterior, são uma característica tida como um exemplo de convergência

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evolutiva entre aranhas e insetos, já que as evidências anatômicas e de desen-
volvimento desses grupos indicam que os túbulos de Malpighi se desenvolveram
independentemente.

2.7 Alimentação e Digestão


Os artrópodes possuem hábitos alimentares que incluem herbivoria e carnivoria
(macrofagia), hematofagia, depositivoria e suspensivoria. Por não terem cílios motores para
captura de partículas alimentares, artrópodes utilizam apêndices variados para poderem capturar
o alimento.
Com trato digestório completo, que conta com boca e apêndices associados, estômago e
ânus, o alimento é encapsulado em uma membrana, permeável às enzimas digestórias, secretada
pelas células do estômago – uma característica dos artrópodes –, a mesma estrutura responsável
pela absorção dos nutrientes.

2.8 Reprodução e Desenvolvimento


Em geral, artrópodes são dioicos, de fertilização interna, com órgãos reprodutores
pareados e ductos. São ovíparos, ovovivíparos ou vivíparos, e frequentemente apresentam
metamorfose. Pode ocorrer a presença de estágios larvais durante o desenvolvimento pós­
embrionário – veja as Figuras 10 e 11 –, com número e duração variáveis de acordo com a espécie;
mas em muitos grupos, o desenvolvimento é direto, e do ovo eclode um animal semelhante ao
adulto. Alguns grupos podem apresentar partenogênese.
Artrópodes e Anelídeos possuem desenvolvimento embrionário com segmentação
teloblástica (segmentos sucessivamente adicionados a partir da zona teloblástica posterior de
crescimento).

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Figura 10 – Desenvolvimento holometábolo de um coleóptero. Fonte: Brusca (2013).

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Figura 11 – Desenvolvimento hemimetábolo em um hemíptero. Fonte: Brusca (2013).

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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como você já deve ter percebido a esta altura, a filogenia dos grupos é um processo
em constante aperfeiçoamento. As diferentes evidências que surgem da descoberta de fósseis, de
análises moleculares, de análises funcionais de estruturas corpóreas e demais estudos exigem que
adequemos nossa linha de pensamento e reorganizemos a classificação dos seres vivos na busca
pela verdade histórica da evolução da vida em nosso planeta.
Em grupos diversificados, como é o caso dos artrópodes, é importante que nos
mantenhamos críticos ao que já é aceito como fato científico, sem nos privar de imaginar novas
possibilidades que sejam capazes de explicá-lo – como citado quanto ao parentesco provável de
artrópodes, onicóforos, tardígrades e anelídeos, ou ainda, quanto à expressão dos genes Dll e Exd.
O crescimento externo do corpo por meio de mudas é característica dos artrópodes, mas
em cada grupo a abertura do exoesqueleto que será descartado se dá de acordo com a espécie.

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O exoesqueleto, embora ofereça resistência corporal, também determina outra característica: a
presença de apêndices articulados necessários para locomoção, alimentação e comunicação com
o meio ambiente.
No estudo das características gerais, vimos que apêndices birremes são atribuídos a
artrópodes aquáticos, nadadores, o que torna os apêndices unirremes predominantes no grupo.
E o modo como as trocas gasosas, a excreção e a osmorregulação ocorrem está diretamente
relacionado ao meio no qual o animal vive.
Com a maior diversidade de espécies do Reino Animal, os artrópodes atuais raramente
ultrapassam os 60 centímetros, mas seus ancestrais chegaram a 3 metros de comprimento, com
voracidade que provavelmente exerceu forte pressão seletiva e adaptativa em outros artrópodes
ou em outros grupos de animais ao longo do processo evolutivo.
Alimento para muitos grupos, artrópodes também caçam artrópodes, e contribuem com
os humanos no controle ambiental de pragas, embora também possam ser a própria praga. Mas,
no fim das contas, a maioria dos artrópodes contribui com a espécie humana, como polinizadores
de plantas, como fonte de proteína, entre outras – veremos mais detalhes na próxima unidade.

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UNIDADE ENSINO A DISTÂNCIA

04
DISCIPLINA:
ZOOLOGIA DE MOLUSCOS
E ARTRÓPODES

ARTRÓPODES: ECOLOGIA E CARACTERÍSTICAS


DOS PRINCIPAIS GRUPOS
PROF.A DR. RICARDO LOURENÇO DE MORAES

SUMÁRIO DA UNIDADE

INTRODUÇÃO ................................................................................................................................................................56
1. SUBFILO CHELICERIFORMES.................................................................................................................................. 57
1.1 “TEIAS” DAS ARANHAS E SEU ACASALAMENTO..................................................................................................60
2. SUBFILO MYRIAPODA..............................................................................................................................................60
3. SUBFILO CRUSTACEA...............................................................................................................................................62
4. SUBFILO HEXAPODA................................................................................................................................................66
5. SUBFILO TRILOBITOMORPHA................................................................................................................................70
CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................................................................. 73

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INTRODUÇÃO
Agora, com conhecimentos gerais acerca do grupo, nesta última unidade, podemos
avançar em nossos estudos e nos aprofundar nas especificidades de cada um dos subfilos:
Cheliceformes, Myriapoda, Crustacea, Hexapoda e Trilobitomorpha.
De modo geral, artrópodes são vetores de diversas doenças causadas nos humanos por
vírus, bactérias e protozoários. Há ainda outras relações negativas com a humanidade, como
acidentes com artrópodes venenosos, destruição de plantações por ataque direto (pragas) ou
transmissão de doenças às plantas. No entanto, esses animais também são indispensáveis para
polinização natural, para realização do controle de pragas em plantações (controle biológico) e,
ainda, como fonte de toneladas de proteína animal utilizada pelos humanos na alimentação, o
que faz bilhões de dólares girarem na economia anualmente.
Ácaros, por exemplo, estão entre os principais transmissores de doenças, pois carregam

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uma série de agentes infecciosos, incluindo riquétsias, vírus, bactérias, fungos e protistas do
grupo dos Apicomplexa – perdem apenas para outro grupo de artrópodes, os mosquitos.
Com morfologia que varia em tamanho e forma, encontramos de animais microscópicos
a outros com mais de 4 metros de tamanho, e de vermes totalmente desprovidos de pernas a
outros com até 375 pares de pernas. De agora em diante, procure situar seus conhecimentos
gerais para compreender as especificidades desse variado grupo.
Conheceremos um pouco sobre a produção de teias de aranha, o ciclo de vida com
estágio larval de crustáceos e os movimentos que possibilitam o voo em insetos. Veremos que
são animais muito ativos, carnívoros, herbívoros ou onívoros, com especificidades reprodutivas e
hábitos variados – como é de se esperar do maior grupo de invertebrados do planeta Terra.

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1. SUBFILO CHELICERIFORMES
Quelicerados, com registros que datam de mais de 445 milhões de anos, incluem aranhas,
carrapatos, ácaros, escorpiões e outros grupos que incluem euriptéridos já extintos. Sem antenas
e com corpos formados por dois tagmas (um cefalotórax e um abdômen), apresentam seis
pares de apêndices no cefalotórax, incluindo um par de quelíceras (peças bucais), um par de
pedipalpos e quatro pares de apêndices locomotores. Outra característica desse grupo é a forma
de alimentação, que envolve a sucção dos tecidos de suas presas. Brusca (2013) nos traz um
resumo das principais características de quelicerados, veja o Quadro 3.

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Quadro 1 – Principais características do Subfilo Cheliceriformes. Fonte: Brusca (2013).

Existem três classes de Cheliceriformes: Pycnogonida (aranhas-do-mar), Merostomata


(límulos) e Arachnida (aranhas, escorpiões e ácaros) – dentre as quais o estudo da Classe
Arachnida apresenta maior relevância devido às relações ecológicas que afetam a humanidade.

Límulos são verdadeiros “fósseis vivos”, dizem os especialistas. Estudos que vis-
am compreender como ess’es animais permaneceram vivos e com características
tão similares às apresentadas por seus ancestrais mais primitivos não param.
Para conhecer um pouco sobre esses animais e os estudos que os envolvem, veja
o vídeo disponível no link: <https://www.youtube.com/watch?v=ycmARS9LLeE>.

Os animais pertencentes à Classe Arachnida possuem muitas diferenças com relação à


forma e aos apêndices. Essencialmente, são animais de vida livre e ocorrem principalmente em
regiões quentes e secas. Com mais de 80 mil espécies descritas, há registros fósseis de escorpiões
no período Siluriano, e de aranhas e ácaros no final da era Paleozoica.

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Em geral, aracnídeos são predadores e têm ferrões, pinças, glândulas de veneno ou


aguilhões – em alguns casos, essas estruturas surgiram da modificação de outras, como de
quelíceras (ferrões) e pedipalpos (pinças). A maioria dos aracnídeos não causa dano algum ao ser
humano, mas exceções como a viúva-negra, a aranha-marrom e o escorpião amarelo podem ser
um verdadeiro perigo. A picada de carrapatos e ácaros, além de incômoda, pode ser danosa ao
ser humano pela transmissão de doenças, de forma direta ou indireta (por prejudicar a produção
de alimentos, por exemplo). Alimentando-se inclusive de insetos que incomodam demais o ser
humano, aracnídeos geralmente liberam enzimas digestivas sobre as presas ou dentro delas para,
em seguida, sugarem o líquido pré-digerido, algo que é possível graças a uma poderosa faringe
sugadora.
A maioria dos aracnídeos para de passar por processo de muda quando chega à fase
adulta. No abdômen, encontram-se os órgãos reprodutivos e respiratórios, como as traqueias
e os pulmões foliáceos. Quando comparamos os corpos de aranhas, escorpiões e ácaros, temos
que: a aranha possui um corpo compacto, com cefalotórax (prossoma) e abdômen (opistossoma),
ambos não segmentados e unidos por um fino pedicelo; escorpiões possuem cefalotórax curto,
um pré-abdômen (mesossomo) de sete segmentos e um pós-abdômen (metassomo) longo e
delgado, de cinco segmentos, que termina em um aguilhão; já o corpo dos ácaros apresenta uma

ZOOLOGIA DE MOLUSCOS E ARTRÓPODES | UNIDADE 4


fusão completa entre cefalotórax e abdômen, sem nenhuma divisão externa perceptível – veja as
Figuras 1, 2 e 3. Os três grupos apresentam quelíceras poderosas e pedipalpos que auxiliam na
captura de presas e na alimentação, mas variam em cada grupo devido às suas especificidades. O
abdômen de algumas aranhas apresenta um segmentado, característica muitas vezes considerada
de caráter ancestral.

Figura 1 – Anatomia interna de uma aranha. Fonte: Hickman et al. (2016).

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Figura 2 – Escorpião: vista dorsal (A) e ventral (B). et = esterno; ms = mesossoma; mt = metassoma; om = olhos
medianos; op = opérculo genital; pd = pedipalpo; pe = perna; pn = pente; Pr = prossoma; qc = quelícera; te = télson.
Fonte: Fransozo (2017).

Figura 3 – Ácaro. gn = gnatossoma; id = idiossoma; pd = pedipalpo; pe = perna; ol = olhos laterais; qc = quelícera.


Fonte: Fransozo (2017).

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1.1 “Teias” das Aranhas e seu Acasalamento


O abdômen é a parte menos quitinizada do corpo das aranhas, o que contribui para o
desenvolvimento dos óvulos maduros no corpo da fêmea, que exigem mais espaço. Mas isso não
é tudo; neste tagma, existem pequenas saliências de forma cônica chamadas de fiandeiras por
onde os fios produzidos nas glândulas sericígenas saem e podem ser tecidos pelo animal. Todas
as aranhas produzem teias por meio das fiandeiras, mas as teias podem ter diferentes formas e
funções.
Muitas aranhas formam teias para capturar e prender suas presas; outras usam um único
fio solto ao vento para carregá-la para longe (o que contribui para a dispersão da espécie), além
de outras utilidades. As fêmeas utilizam os fios para produzir ootecas e os machos produzem uma
teia espermática. O macho deposita uma gota de esperma sobre a teia tecida e pega o esperma
para armazená-lo em cavidades especiais presentes nos seus pedipalpos. Quando finalmente
acasala, o macho insere os pedipalpos na abertura genital da fêmea e armazena seu esperma nos
receptáculos seminais dela. A fêmea, por sua vez, deposita seus ovos em uma bolsa de seda, a qual
pode ser carregada ou presa a uma teia ou a uma planta. Nas ootecas, tecidas graças às fiandeiras,

ZOOLOGIA DE MOLUSCOS E ARTRÓPODES | UNIDADE 4


os embriões crescem dentro dos ovos e lá permanecem até que a ooteca se rompa e libere os
jovens – o número de ovos varia de acordo com a espécie, de 100 a 2 mil aproximadamente.

Imagine animais muito parecidos com escorpiões, com 3 metros de comprimen-


to, indo na sua direção. Felizmente, para nós, os euriptéridos já estão extintos,
mas sabemos que são os maiores exemplares fósseis de artrópodes que con-
hecemos, e ocorreram desde o período Ordoviciano até o Permiano. Com grandes
semelhanças com os escorpiões e também com os límulos, tinham quatro pares
de pernas locomotoras, abdômen com 12 segmentos e um télson pontiagudo, e
uma cabeça com seis segmentos fundidos e munidos de olhos simples e com-
postos, além de quelíceras e pedipalpos. Foram predadores dominantes em seu
tempo e, em alguns casos, tinham grandes garras esmagadoras. Inclusive, suas
características nos levam a crer que o desenvolvimento da armadura dérmica nos
primeiros peixes possa ter ocorrido pela forte pressão predatória feita pelos eu-
riptéridos sobre os ancestrais dos peixes atuais.

2. SUBFILO MYRIAPODA
Os miriápodes são artrópodes terrestres, com o corpo alongado formado por segmentos
com um ou dois pares de pernas. São facilmente reconhecíveis pelo grande número de pernas
e um tronco não diferenciado em tagmas distintos (tronco e abdômen), como ocorre com os
hexápodes. Com cerca de 17 mil espécies conhecidas, esse grupo ocorre na maior parte do planeta,
com maior diversidade nos trópicos ou em regiões temperadas quentes. Possuem tamanhos que
variam de 2 a 13 centímetros na maior parte das espécies, embora algumas exceções possam
chegar a ter mais de 30 centímetros de comprimento.

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Existem quatro classes de miriápodes: Chilopoda (centopeias ou lacraias), Diplopoda


(piolhos­de­cobra, gongolôs ou embuás), Pauropoda (paurópodes) e Symphyla (sínfilos).
Em geral, vivem no solo e em folhas, mas também podem ser encontrados dentro ou
embaixo de troncos e pedras, em guano de morcegos, bromélias, entre outros. Os corpos das
centopeias podem conter de alguns poucos até 177 segmentos – com exceção do segmento logo
após a cabeça e dos dois últimos do corpo, cada segmento tem um par de pernas articuladas. O
movimento é serpenteforme, e o último par de pernas é mais longo do que os outros com função
sensorial, enquanto os apêndices do primeiro segmento formam garras com veneno – veja Figura
4.

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Figura 4 – Esquema das partes do corpo de uma centopeia, sendo a vista dorsal, vista ventral da cabeça e da porção
posterior do corpo. tr = tronco; an = antena; pc = placa cefálica; t = tergito; p = pernas; ca = cabeça; cf = coxoesterno
focipular; e = esternito; ue = último esternito; cx = coxopleura; cp = campo poroso; ac = apêndice coxopleural; up =
última perna. Fonte: Fransozo (2017).

No Quadro 2, podemos observar as principais características destacadas por Brusca


(2013). As trocas gasosas em miriápodes são realizadas por traqueias que transportam os
gases diretamente para todas as células do corpo, sistema traqueal que provavelmente evoluiu
independentemente de outros artrópodes. Da mesma forma, o surgimento dos túbulos de
Malpighi (responsáveis pela excreção) ocorreu independentemente do surgimento dessa estrutura
encontrada em Chelicerata.

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Quadro 2 – Características do Subfilo Myriapoda. Fonte: Brusca (2013).

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Os milípedes (piolhos-de-cobra) não são tão ativos como as centopeias e caminham com
um movimento lento e gracioso, sem serpentear. Geralmente encontrados em locais escuros e
úmidos, a maioria desses animais é herbívora e se alimenta de matéria vegetal em decomposição,
e raramente de vegetais vivos. Os milípedes podem se enrolar quando perturbados e muitos se
protegem de predadores produzindo fluidos tóxicos ou repelentes, em glândulas localizadas ao
longo da lateral do corpo.

3. SUBFILO CRUSTACEA
Em meio às espécies mais conhecidas, como as de caranguejos, camarões, lagostins e
tatuzinhos-de-jardim, são conhecidas mais de 67 mil espécies de crustáceos. Dentre os animais
com maior diversidade em designs corporais, os crustáceos ocupam uma enorme variedade de
habitats, fato garantido pela capacidade inerente de tagmatização (especialização de segmentos
para diferentes funções)  dos crustáceos e a posse de segmentos no corpo e de apêndices
especializados. Encontramos crustáceos das regiões equatoriais às polares ao redor de todo
o globo, de regiões costeiras ao fundo dos oceanos mais profundos, de estuários aos costões
rochosos, de cavernas subaquáticas às águas continentais, em relação simbiótica com outros
animais e, inclusive, no ambiente terrestre, embora os crustáceos não tenham tantas adaptações a
esse meio, como outros artrópodes. São os únicos artrópodes com dois pares de antenas, e todos
seus apêndices são birremes (com exceção provável às primeiras antenas). Veja no Quadro 3,
apresentado por Brusca (2013), as principais características desse subfilo.

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Quadro 3 – Principais características do subfilo Crustacea. Fonte: Brusca (2013).

Hickman et al. (2016) nos apresentam um cladograma com as principais relações entre
os grupos dentro de Crustacea e, ainda, com Hexapoda – veja a Figura 5. Os tagmas não são
homólogos a Crustacea ou entre suas classes, isso porque segmentos diferentes fundiram-se e
formaram a cabeça ou o cefalotórax.
Do mesmo modo que outros artrópodes, os crustáceos apresentam o corpo segmentado,
ou seja, composto por seções repetidas linearmente, mas diferem por possuírem apêndices
birremes. O plano do corpo dos crustáceos dispõe de um número variável de somitos, desde oito
em Ostracoda até 42 em Branchiopoda. Em geral, o corpo dos crustáceos possui, no mínimo,
dois tagmas: cabeça com cinco segmentos (com ou sem um escudo cefálico ou “carapaça”) e o
tronco multissegmentado (número de segmentos varia conforme a classe). A parte anterior do
tronco é chamada de tórax (péreon) e a posterior, abdômen (pléon); no entanto, na maioria dos
crustáceos, um ou mais segmentos torácicos estão fundidos à cabeça e formam o cefalotórax –
veja Figura 6.
Na Figura 6, ainda podemos observar que os músculos estriados estão presentes em
grande parte do corpo dos crustáceos, arranjados, em geral, em grupos antagônicos (flexores e
extensores). O abdômen dos lagostins possui poderosos flexores, importantes para a explosão de
velocidade durante a fuga de predadores.
Em geral, crustáceos apresentam dois pares de antenas (antênulas e antenas), ocelos e
olhos compostos, dois pares de maxilas (maxílulas e maxilas), glândulas antenais ou maxilares
(nefrídios excretores) e estágio larval náuplio (com exceções, por exemplo, em caranguejos,
ermitões, lagostas, lagostins, tatuíra, entre outros). Malacostraca é o maior grupo em crustáceos,
e seu plano corporal típico, de uma cabeça com cinco segmentos fundidos, um tórax com oito
segmentos e um abdômen com seis (sete em algumas espécies), demonstra um plano ancestral
nessa classe.

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Figura 5 – Cladograma mostrando as relações hipotéticas entre os hexápodes e as classes dos crustáceos. Estes for-
mam um clado diagnosticado pelo compartilhamento de numerosas características derivadas. Os caracteres segui-
dos de ponto de interrogação podem ser características ancestrais, e não características compartilhadas derivadas. O
ácron é a região anterior da cabeça e não é contado no segmento. Fonte: Hickman et al. (2016).

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Figura 6 – Estrutura interna de um lagostim macho. Fonte: Hickman et al. (2016).

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Os lagostins e seus parentes apresentam uma enorme homologia seriada com
17 tipos distintos de apêndices, a mais elaborada no Reino Animal. Veja maiores
informações sobre o tema em:
HICKMAN, C. P. et al. Princípios integrados de zoologia. 16. ed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2016.

Em crustáceos, é comum o desenvolvimento indireto, com uma larva do tipo náuplio,


com apenas três pares de apêndices: primeira antena unirreme, antenas birremes e mandíbulas
birremes – todos são apêndices natatórios nesse estágio. Os demais apêndices e os segmentos
são adicionados com sucessivas mudas, até a forma corporal adulta – veja Figura 7. Há
outros quatro tipos de larvas comuns aos crustáceos: metanáuplio, protozoe, zoe e pós-larva;
independentemente da variação, o nome “zoe” caracteriza a presença de exopoditos natatórios e
ausência de pleópodes; além disso, o estágio avançado de “zoe” é denominado “misis”.

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Figura 7 – Ciclo vital do camarão-do-golfo, Farfantepenaeus. Os peneídeos desovam em águas de profundidade
entre 40 e 90 metros. As formas larvais são planctônicas e movem-se em direção à costa para alcançar águas com sali-
nidades mais baixas do que as do mar para se desenvolverem como jovens e adultos bentônicos. Os adultos retornam
para águas mais profundas afastadas da costa. Fonte: Hickman et al. (2016).

4. SUBFILO HEXAPODA
O subfilo Hexapoda recebe este nome pela presença de seis pernas, todas unirremes. Os
hexápodes têm três tagmas (cabeça, tórax e abdômen), e o subfilo é dividido em duas classes:
Entognatha e Insecta. Veja o cladograma apresentado por Hickman et al. (2016) na Figura 8.
Entognatha agrupa espécies com as bases das peças bucais encerradas dentro de uma
cápsula cefálica; diferentemente de Insecta, que agrupa animais com peças bucais ectognatas,
ou seja, bases das peças bucais fora da cápsula cefálica. Entognatos são divididos em três ordens:
Protura, Collembola e Diplura, animais muito pequenos, que podem passar despercebidos.

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Figura 8 – Cladograma mostrando as relações hipotéticas entre os Hexapoda. Muitas sinapomorfias foram omitidas.
As ordens Protura, Collembola e Diplura são entognatas. Essas ordens, mais Tgysanura, originam-se antes dos pri-
meiros ancestrais com asas. As ordens Odonata e Ephemeroptera formam Paleoptera, nas quais as asas ficam esten-
didas lateralmente. As demais ordens apresentam asas que podem se dobrar para trás sobre o abdômen (Neoptera).
A superordem Orthopterodea inclui as ordens Zoraptera, Psocoptera, Hemiptera, Thysanoptera e Phthiraptera; e a
superordem Holometabola compreende todas as ordens holometábolas. Fonte: Hickman et al. (2016).

Hexápodes agrupam, na Classe Insecta, os populares insetos: baratas, besouros, borboletas,


formigas e outros. Com grande diversificação, são de grande importância socioeconômica,
embora seu tamanho chegue a apenas cerca de 10 centímetros de comprimento. Essa importância
se dá, entre outras coisas, por sua contribuição na polinização de plantas, na decomposição
de matéria orgânica e no controle biológico de pragas, embora sejam alguns deles mesmos as
pragas ou vetores de doenças (dengue, zika, febre amarela, Doença de Chagas etc.). Devido à sua
sensibilidade às mudanças ambientais, também são considerados importantes bioindicadores.
Brusca (2013) nos apresenta um resumo das principais características do grupo, veja o Quadro 4.

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Quadro 4 – Principais características do subfilo Crustacea. Fonte: Brusca (2013).

Hexápodes possuem plano corporal básico com cabeça, tórax e abdômen: no tórax,
apresentam três pares de pernas; no abdômen, não apresentam apêndices locomotores. Para a
locomoção, feita por pernas, os hexápodes dependem da sustentação do exoesqueleto. Para evitar
que uma perna interfira no movimento da outra, uma forma de locomoção comumente adotada
pelos insetos é a sequência alternada de tripé: enquanto, de um lado do corpo, há duas pernas
tocando o chão, no outro, há apenas uma das pernas, alternando-as enquanto o movimento
ocorre.
Os insetos foram os primeiros seres vivos a voar, e são os únicos invertebrados a fazê-
lo. A maioria dos insetos possui dois pares de asas, mas há três ordens nas quais as asas foram
reduzidas a apenas um par: em besouros, dípteros e estrepsípteros. Em insetos modernos, as
asas se desenvolveram como evaginações do tegumento e finas membranas de cutícula, que, pela
ação combinada de músculos direta e indiretamente envolvidos com o voo, tornam esses animais
capazes de viajar através do ar.
Asas podem ser finas e membranosas (moscas), grossas e duras (asas anteriores dos
besouros), coriáceas (asas anteriores de gafanhotos), cobertas por finas escamas (borboletas e
mariposas), ou cobertas por pelos (tricópteros). O movimento das asas é controlado por músculos
diretos de voo, ligados diretamente a uma parte da asa; e músculos indiretos de voo, que não
estão ligados à asa e provocam o movimento da asa ao alterar a forma do tórax – veja Figura 9.

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Figura 9 – A. Musculatura de voo de insetos como a barata, nos quais a elevação das asas dá-se por meio da muscu-
latura indireta e o abaixamento pela musculatura direta. B. Em insetos como moscas e abelhas, tanto o movimento
para cima como para baixo é dado pela musculatura indireta. C. O padrão de figura em “8” seguido pela asa de um
inseto em voo durante a elevação e o abaixamento das asas. Fonte: Hickman et al. (2016).

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As estruturas internas básicas dos insetos podem ser observadas na Figura 10. Devido ao modo de vida terrestre,
a necessidade de reduzir a perda de água os levou a desenvolver um sistema traqueal, que, além disso, permite a
troca rápida de oxigênio e gás carbônico. O sistema traqueal é formado por uma rede de tubos de parede fina que se
ramificam a todas as partes do corpo – a evolução desse sistema ocorreu de forma independente do encontrado em
outros grupos de artrópodes, como nas aranhas. As traqueias são revestidas com cutícula, que é trocada junto com
a cutícula externa durante as mudas.

Figura 10 – Estrutura interna de uma fêmea de gafanhoto. Fonte: Hickman et al. (2016).

O sistema digestivo apresenta boca com glândulas digestivas, esôfago, papo para
armazenagem e moela para maceração em alguns insetos, além de estômago e cecos gástricos,
e ainda intestino, reto e ânus. Embora parte da digestão possa ocorrer no papo, a absorção é
realizada no mesênteron.
Muitos insetos são parasitas na fase adulta, na larval ou, em alguns casos, em ambas as
fases – como pulgas e piolhos, respectivamente. Mas, em sua maioria, os insetos são fitófagos ou
herbívoros (alimentam-se de fluidos e tecidos vegetais) e, em geral, podem comer quase qualquer
planta. Há lagartas de mariposas e borboletas que comem somente folhas de plantas específicas,
há algumas espécies de formigas e cupins que cultivam fungos para se alimentar. Ainda, há
besouros e larvas de insetos que são saprófagos (alimentam-se de animais mortos), e outros são
insetos predadores, que capturam e comem outros insetos e animais.

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Insetos mais primitivos apresentam desenvolvimento direto, mas insetos mais avançados
apresentam desenvolvimento indireto complexo, com formas realmente distintas entre larva,
pupa e adulto. Não há dúvidas de que o desenvolvimento indireto é uma característica derivada
(recente, contrária de “basal”, que se refere à primitiva).
A partenogênese é mais comum em animais que vivem em ambientes extremos, mas
em geral são dioicos. A partenogênese pode envolver a determinação sexual, como em abelhas,
vespas e formigas, nas quais ovos diploides (fertilizados) se tornam fêmeas, e haploides (não
fertilizados) se tornam machos.
Insetos maduros sexualmente são chamados de imagos, e a cópula e inseminação, em
geral, são diretas – processo que apresenta uma grande diversificação de comportamentos de
corte, de acordo com a espécie, de cópula durante o voo, liberação de espermatozoides no solo à
perfuração do corpo da fêmea. É comum que, na reprodução, ocorra atração química ou visual,
envolvendo feromônios, exibição, estimulação tátil, cantos, pulsos luminosos ou longos rituais.

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O campo do estudo comportamental de insetos é gigantesco. Grande parte de
estudos recentes tem envolvido feromônios que, embora seja considerada uma
área de estudo ainda embrionária, já sabemos que são frequentes em processos
de reprodução e agregação de indivíduos. Já somos capazes de sintetizar cerca
de 225 feromônios distintos para utilizar no controle de pragas, e conhecemos
outros 225 aproximadamente.

Os ovos são cobertos por uma membrana espessa denominada córion, e secreções
fornecem endurecimento e capacidade adesiva aos ovos. Insetos geralmente depositam uma
grande quantidade de ovos de uma única vez, mas animais como a barata envolvem vários ovos
em um casulo protetor.
Em geral, emergem dos ovos animais com pouca variação em relação aos adultos;
este desenvolvimento é denominado simples. Mas há animais que apresentam uma série de
modificações em seu desenvolvimento (metamorfoses). Se as metamorfoses forem radicais, o
desenvolvimento é conhecido como holometábolo, mas se forem graduais, são chamamos de
desenvolvimento hemimetábolo (veja as Figuras 10 e 11 na unidade anterior).
Durante o estágio de pupa, o animal não se alimenta e mal se move, e consome as reservas
de energia acumuladas ao longa da vida, geralmente enquanto ingeriam uma grande quantidade
de alimento, como as lagartas fazem com folhas.

5. SUBFILO TRILOBITOMORPHA
Sobre estes extintos artrópodes, dos quais conhecemos cerca de 4 mil espécies, podemos
afirmar que tinham tamanho variado de alguns poucos a mais de 70 centímetros de comprimento
– veja Figura 11. Viveram em praticamente todos os mares e oceanos entre 250 e 542 milhões de
anos atrás (Era Paleozoica), fato amplamente registrado graças ao esqueleto biomineralizado por
quitina, proteínas e carbonato de cálcio desses animais, que permaneceram fossilizados.

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Figura 11 – Variação da dimensão de carapaças de diferentes trilobites, incluindo formas milimétricas (Agnóstida)
até formas gigantes (Isotelus rex), com mais de 70 cm de comprimento. Fonte: Fransozo (2017).

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Os distintos modos de vida são um dos aspectos mais interessantes sobre a evolução dos
trilobites. Baseados em estudos da anatomia funcional, de associações faunísticas, do tipo de
sedimento e até em pistas e pegadas fossilizadas de trilobites (icnofósseis), sabe-se que, em geral,
esses animais foram exclusivamente marinhos, bentônicos (alguns grupos eram planctônicos ou
nectônicos), e ocuparam desde águas rasas e ambientes de recife até bacias oceânicas profundas,
em um contexto no qual grupos distintos ocupavam ambientes distintos.
Todas as ocorrências conhecidas demonstram que os trilobites foram
exclusivamente marinhos e adotaram diversos modos de alimentação, de predadores, detritívoros,
planctonívoros, simbiontes ou mesmo filtradores.
Ao que tudo indica, muitos trilobites deveriam passar parte do tempo enterrados no
substrato, como é o caso de um grupo comum no Devoniano das bacias sedimentares do Paraná,
Parnaíba e Amazonas: os homalonotídeos (Phacopida). Outro exemplo interessante é o dos
Olenina, que são interpretados como simbiontes devido à estrutura corporal que provavelmente
fornecia uma ampla superfície para brânquias, nas quais se desenvolveriam bactérias sulfurosas.
Provavelmente devido ao ambiente, algumas espécies possuíam grandes olhos compostos,
com estruturas de proteção contra o excesso de luz solar, enquanto outros, por viverem em áreas
desprovidas de luz, sequer possuíam olhos.
Um aspecto interessante do comportamento desses animais é o enrolamento do corpo, que
formava uma pequena cápsula protetora, possível graças à articulação dos segmentos torácicos,
que protegia as partes moles na região ventral, além das antenas e dos apêndices locomotores –
capacidade que se desenvolveu no Cambriano, provavelmente pela necessidade de se defender de
outros artrópodes primitivos gigantescos, de cefalópodes e de outros invertebrados.

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Alguns trilobites enrolados foram encontrados em ambientes profundos, pobres


em oxigênio e ricos em matéria orgânica e gás sulfídrico. Será que a defesa contra
predadores era a principal causa do enrolamento? As condições desfavoráveis à
vida nas quais alguns fósseis trilobites foram encontrados não nos permitem des-
cartar a hipótese de que o enrolamento seja também uma resposta às condições
estressantes do meio e não apenas uma resposta à predação. A dificuldade em
estudar o modo de vida e o comportamento de um animal extinto é óbvia. No
entanto, evidências continuam a ser encontradas e, com a experiência e os conhe-
cimentos acumulados de cientistas do mundo todo, continuamos a desvendar os
vários mecanismos adotados por diferentes espécies ao longo da história da vida
em nosso planeta.

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O esqueleto dorsal (ou carapaça) dos trilobites era formado por estruturas fusionadas
e outras articuladas que cobriam os segmentos do corpo (tergito). Na região anterior, a fusão
formava um tagma rígido (céfalo); na porção mediana, tergitos articulados e flexíveis formavam
o tórax; e, na porção posterior do corpo, os tergitos fusionados formavam uma placa rígida
(pigídio) – veja Figura 12.

Figura 12 – Morfologia geral da carapaça de trilobites. Corpo trilobado longitudinalmente e segmentado transver-
salmente. À esquerda um Burmeisteria (Phacopida), Polimerada, do Devoniano da Bacia do Paraná, Brasil, e à direita
um Agnostida, Miomerida, do Cambriano. Fonte: Fransozo (2017).

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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como vimos, há diversos fatos interessantes sobre os subfilos de Artropoda. Por exemplo,
a classe que agrupa os aracnídeos talvez seja a que mais desperta medo, embora apenas uma
pequena parte represente perigo real. As estruturas que nos aterrorizam (ferrões, presas, pinças e
glândulas de veneno) são apêndices modificados. Em Arachnida, estão agrupados aranhas,
escorpiões e ácaros, animais com estruturas corporais bastante diversificadas umas das outras.
De animais que parecem verdadeiros fósseis vivos aquáticos, como os limulus, às
adoradas joaninhas (ladybug, em inglês, inspiração atual de um desenho animado de sucesso),
dotadas de capacidade de voo, passando por centopeias, lacraias, carrapatos, ácaros, moscas,
cigarras, escorpiões, aranhas e opiliões, artrópodes habitam praticamente todo o globo terrestre,
especialmente as áreas mais quentes do planeta – e ainda possuem um importante representante
já extinto, os trilobitas.
Embora o exoesqueleto tenha, sem dúvida, sido um grande marco do sucesso evolutivo

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desse grupo, a combinação das demais características morfológicas e fisiológicas também
contribuiu para o sucesso desses animais – a tagmatização e a especialização de apêndices
representa grande parte disso.
A capacidade de perceber o meio ambiente à sua volta, graças aos apêndices especializados,
possibilita a organização desses animais em sociedades, como as colmeias e os formigueiros.
Os estágios de desenvolvimento podem incluir fases larvais e metamorfose do corpo que, em
algumas espécies, é velada pelos pais – cuidado parental. Enfim, embora muitas características
tenham sido apresentadas, ainda há uma gama de outras especificidades que enriquecem ainda
mais o estudo desse grande grupo de invertebrados.
Chegamos à última etapa desta apostila e desta disciplina, e esperamos que você tenha
compreendido, além das características gerais e específicas dos principais grupos de invertebrados,
que o conhecimento, assim como o estudo da vida, é um processo em constante movimento, que
nunca finda. Muito Obrigado!

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REFERÊNCIAS
BRUSCA, R. C. Invertebrados. 2. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013.

FRANSOZO, A. Zoologia de invertebrados. Rio de Janeiro: Roca, 2017.

HICKMAN, C. P. et al. Princípios integrados de zoologia. 16. ed. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2016.

RICKLEFS, R. A economia da natureza. 7. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2018.

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