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Texto para uso exclusivo dos alunos de teologia da FAJE. Está expressamente proibido
de ser compartilhado, pois, será publicado em breve.
de quem, respaldado por uma falsa segurança religiosa, se esquece de como o Deus de
Israel está atento para o modo como seu santo nome é profanado (Am 2,7).
“Em menos de vinte cinco anos, Jeroboão II foi capaz de tomar uma nação que estava
a ponto de morrer e transformá-la em uma das grandes potências do momento. [...]
A calmaria das campanhas militares assírias permitiu-lhe mover-se na direção da
Síria praticamente sem dificuldades. Quando as coisas estavam boas, ele estava
muito, muito bem” (KAISER, 1998, p. 352).
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“O terremoto seria o que os arqueólogos descobriram no nível VI de Hazor, o qual datam por volta de
760 a.C.” (SIMIAN-YOFRE, 2002, p. 32). Esse abalo sísmico foi recordado por Zc 14,5, que se refere a um
“terremoto nos dias de Ozias, rei de Judá”.
2
“’Lebo Hamath’ refere-se ao Vale do Bekaa, um vale entre o Líbano e as montanhas do Ante-Líbano, a
parte sul cujo corredor estava aproximadamente na cidade de Dan. O mar da Arabá é o mar Morto”
(Kaiser, 1998, p. 351).
3
Os contemporâneos de Amós não pecavam por falta de religião, mas sim pela
consciência equivocada, fruto da incapacidade de sintonizar o querer de Iahweh. O
culto corria paralelo à vida. O trato respeitoso com Deus estava longe de se
desdobrar em atitudes misericordiosos nas relações com os mais fracos da sociedade
(VITÓRIO, 2016, p 178).
3
A “antevisão de um fim trágico para Israel faz-se presente na pregação de Amós pelo recurso ao gênero
literário ‘invectiva’, usado para veicular a sua mensagem. Seu componente literário ‘ai dos que...’ não
deixava margem para equívocos. O pano de fundo sociocultural era o lamento fúnebre (qinah),
obrigatório por ocasião do falecimento de uma pessoa, seja ela quem fosse” (VITÓRIO, 2003, p. 126).
4
oferendas não encontro agrado e os sacrifícios pacíficos de vossos animais cevados não
contemplo. Tira de diante de mim o vozerio de teus cantos, a música de tuas harpas não
ouvirei” (Am 5,21-23). Deus manifesta seu desconforto com o culto desprovido da
correspondente prática da justiça, pois “toda vida deveria ser percebida como cúltica”,
isto é, “a performance no culto não possui valor desvinculada da performance em defesa
da vida dos mais fracos” (ROSSI, 2018, p. 89).
Apesar de Amós não fazer uma referência direta à questão da eleição e da aliança,
toda a questão da justiça social gira em torno desses temas, sendo por isso
abordados de forma inovadora e mais concreta na vida do Povo. Tanto a injustiça
como o luxo são atentados ao código da aliança e manifestações de orgulho e
arrogância face à única e exclusiva soberania de Yahwé (CATARINO, 2014, p. 32).
Israel não precisa sair de suas fronteiras para oprimir e explorar. Desde o princípio
aparece dividido em dois grandes grupos: poderosos e fracos, ricos e pobres,
vendedores e vendidos (2,6-16). Apesar de sua aparente paz e prosperidade, é
sociedade consumida no terror, em guerra civil encoberta. Assim afirma o texto mais
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radical de Amós (3,9-11), radical precisamente porque não denuncia fatos concretos,
mas o resultado definitivo” (SICRE, 1990, p. 185).
Amós dirige-se aos opressores e não aos próprios pobres, que jamais estão na
posição de sujeitos, atores livres, antes são apresentados como vítimas da
desumanização, por serem tratados como mercadorias do circuito comercial, como
fontes de lucro. [...] Esse desprezo total da pessoa é o que mais parece afetar o
profeta: torna-se ainda mais gritante no caso de seres sem defesa e
economicamente vulneráveis, mas pode dizer respeito a outras categorias de
pessoas menos desemparadas (FOURNIER-BIDOZ, 1994, p. 44).
Sicre (1990, p. 186-189) identifica oito grupos de denúncias, atrás das quais se
podem detectar ações de indivíduos e de grupos sociais mancomunados na prática do
mal.
a. Os militares cruéis e inescrupulosos no trato com as populações vencidas, que
dizimavam sem piedade, até seu total aniquilamento “com debulhadoras de
ferro” (Am 1,3), perseguiam com a espada, mesmo em se tratando de povos
irmãos (Am 1,11), rasgavam o ventre das mulheres grávidas (Am 1,13) e
tratavam com impiedade os restos mortais dos reis adversários, queimados até
ficarem calcinados (Am 2,1). Esse conjunto de denúncias tem como alvo reinos
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g. Os corruptores dos tribunais e suas ações maléficas que sentem repugnância “de
quem fala com integridade” (Am 5,10), aceitam suborno para beneficiar os ricos
em detrimento do direito dos pobres (Am 5,12), “convertem o direito em absinto
e lançam a justiça por terra” (Am 5,7) e se recusam a “odiar o mal e amar o bem
e estabelecer o direito à porta” (Am 5,14).
4
Basã, situado “entre o Hermon e o Yarmuk, era célebre por suas pastagens. Os ‘touros de Basã” (Ez
39,18; Sl 22,13) bem como os ‘carneiros de Basã’ (Dt 32,14) são proverbiais por sua força” (BOVATI;
MEYNET, 1994, p. 85).
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h. Os comerciantes, com sua falsa piedade, anseiam para que o repouso sabático
passe o mais rápido possível, de modo a poderem voltar a comercializar o grão
e o trigo, porém, “diminuindo o efá, aumentando o siclo e enganando com
balanças fraudulentas”, sem escrúpulos de tornar os pobres objeto de comércio
e vender, até mesmo, o refugo do trigo (Am 8,4-6), na contramão da Lei que
prescrevia, por ocasião da colheita, “esquecer um feixe” no campo, para ser
recolhido pelo estrangeiro, pelo órfão e pela viúva (Dt 24,17-21). Os
comerciantes gananciosos ganhavam dinheiro, até mesmo, com as sobras do
trigo, de modo a não deixar nada para os indigentes.
Para Reimer (1992, p. 57) não se trata de uma denúncia contra “fraudes no
comércio em geral”, tampouco na mira do profeta estão os comerciantes no
sentido próprio dessa palavra. Antes, havia camponeses que armazenavam
cereais e se dispunham a “oferecê-lo como empréstimo a quem necessitar”.
Esses, ao usarem meios fraudulentos, dificultavam “a devolução do empréstimo
pelos pobres” e, com facilidade, acabavam por se apropriar do pedaço de terra
do “camponês empobrecido”.
Amós denuncia “a falta de sensibilidade social, que leva ao desprezo da gente
humilde ou a permitir-se toda espécie de luxo”, origem de “injustiças manifestas”,
muitas vezes, respaldadas “por instituições e costumes, como no caso da escravidão,
dos empréstimos e dos impostos, de modo a originar uma “injustiça legalizada” (SICRE,
1990, p. 186)5.
Amós parece supor um estado de injustiça generalizada nos diversos estratos sociais.
Não apenas acusa os juízes e dirigentes de perverterem a justiça (5,12.15), mas
também recrimina o público em geral porque, ao invés de se interessar em melhorar
a situação dos pobres, os roubavam e lhes tiravam a possibilidade de conseguir suas
justas aspirações. Ainda mais, os desprezavam, pisoteavam, oprimiam e vendiam
como escravos. Consideravam-nos como mercadoria barata (2,6-7; 4,1; 5,11.12;
8,4.6). Mas o que, para Amós, faz transbordar a taça da iniquidade era que os
poderosos impediam os profetas de falar (2,12) (NARDONI, 1997, p. 111).
5
“As críticas de Amós ao Estado tributário em Israel enfocam, no concreto, os três âmbitos dessa
instituição: o exército, o culto nos santuários estatais e a ‘dolce vita’ na corte citadina em Samaria. O
exército funciona como instância coercitiva e a religião nos santuários estatais tende a legitimar
religiosamente os tributos que se tornam abusivos” (REIMER, 1992, p. 53). [Inverti a ordem original das
frases para melhor se adaptarem a essa nota.]
8
b. O dal (fraco, pequeno, de escassos bens), cuja cabeça era pisada “sobre o pó
da terra” (Am 2,7), “forma plástica de mostrar como o humilde era
maltratado” (SOGGIN, 1982, p. 75), sofria a opressão das madames
samaritanas (Am 4,1); era pisoteado pelos juízes iníquos que lhe tomavam o
tributo de trigo (Am 5,11); padecia a violência de ser comprado a troco de
dinheiro (Am 8,6)6.
c. O `anaw (humilde, piedoso) não tem seu direito reconhecido, pois os
opressores “desviam o seu caminho” (Am 2,7), de modo a ser exterminado
da terra pela ação de seus exploradores (Am 8,4).
d. O sadîq (cidadão livre, com direito à justiça e ao culto7), vocábulo também
traduzido por justo, ao perder sua liberdade, vê-se na deprimente situação
de ser vendido por dinheiro (Am 2,6) e vilmente explorado (Am 5,12).
e. A na´ara (moça, jovem), reduzida à condição de escrava por dificuldades
financeiras familiares ou adquirida como despojo de guerra, era abusada
sexualmente por pais e seus filhos, sem nenhum respeito, numa evidente
“profanação do nome santo de Deus” (Am 2,7)8.
f. O mokih (defensor do próprio direito) é odiado pelos juízes iníquos, a quem
acusa por seu desvio de conduta, em aberto desrespeito ao querer divino
(Am 5,10). “Os poderosos odeiam a justiça pois esta é a única que pode fazer
prevalecer os direitos do pobre sobre os poderosos e por isso procuram
pervertê-la” (CATARINO, 2014, p. 34).
g. O dober tamîm (íntegro, correto, verdadeiro) igualmente sofre as
consequências de sua boa conduta, quando confrontado por juízes
perversos, desprovidos do senso da justiça (Am 5,10).
Schwantes (2004, p. 90-96) reconhece que os pobres referidos por Amós “não são
mendigos”, “não são propriamente escravos”, “não são gente da cidade”. Tratando-se
de pessoas com o direito de apresentar seus pleitos na porta da cidade (Am 5,12.15),
deveriam ser “homens livres”, com “acesso à terra, à herança”, que se tornaram “a fonte
das riquezas citadinas”. Podem ser caracterizados como “gente empobrecida”, por ter
sido explorada, num processo de pauperização. São “lavradores empobrecidos”, que se
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Nessa categoria “incluem-se não apenas aqueles que são carentes de bens materiais (Lv 14,21; Ex 30,15),
mas também os enfraquecidos fisicamente (2Sm 13,4), os magros (Gn 41,19), os politicamente
insignificantes (Jz 6,15; 2Sm 3,1) e, em todo caso, também quem sofre uma fraqueza espiritual e moral (Jr
5,4, em paralelo com quem não conhece o caminho do Senhor)” (SIMIAN-YOFRE, 2002, p. 52).
7
Para Sicre (1990, p. 192), “ao perder o direito de participar no culto, na justiça e no exército, perdem
também a relação imediata com Deus, pois Javé, como Deus de Israel, é o Deus de seus homens livres”.
8
“A moça não é apresentada como meretriz nem como prostituta sagrada; parece ser uma moça israelita
desonrada por essa dupla relação. [...] Por se tratar de uma israelita [...], sua desonra redunda em desonra
do nome santo, que quis honrar e garantir as relações sexuais honestas” (ALONSO SCHÖKEL; SICRE DIAZ,
1980, p. 966; cf. ARANGO, 1992, p. 49-51).
9
“O profeta está longe de querer agradar seus ouvintes. Pelo contrário, quer tirá-los
do torpor de uma religião onde Deus é reduzido às dimensões de um ídolo sem poder
de mover os fiéis a praticar a justiça. O foco de suas críticas volta-se para o modo de
agir do povo, mormente da liderança praticante de um culto equivocado” (VITÓRIO,
2016, p. 179).
No horizonte das nações vizinhas de Israel, Amós vê irromper um fogo voraz que
reduzirá a cinzas “a casa de Hazael e os palácios de Ben-Adad” de Damasco, tendo como
consequência o extermínio ou a deportação da população da capital (Am 1,4-5). Um
fogo devorará também “as muralhas de Gaza e seus palácios”; as cidades ao redor e
seus governantes, similarmente, serão alcançadas pelo braço do castigo (Am 1,7-8). As
“muralhas de Tiro e seus palácios” serão igualmente consumidos pelo fogo (Am 1,10).
Idêntico destino terá Edom (Am 1,12). Quanto a Amon, será ateado fogo nas muralhas
da capital, que consumirá seus palácios, e seus habitantes verão o rei ser conduzido para
o exílio junto com a liderança do povo (Am 1,14-15). Moab padecerá o castigo do fogo
que consumirá os palácios e matará seus habitantes, juntamente como o juiz e seus
chefes (Am 2,2-3). A insistente alusão ao fogo que tudo consome não deixa margem
para dúvida em relação ao pensamento do profeta no tocante ao destino de quem
espezinha sem compaixão os seres humanos indefesos.
O leitor de Amós, em face da descrição da trágica sorte dos reinos vizinhos, pode
imaginar o que está preparado para Israel, a quem Deus enviou o profeta com a missão
de denunciar os pecados. De fato, o profeta tem palavras certeiras para falar do que
espera a sociedade que se recusa a fazer o direito e a justiça como pauta de seu agir.
À listagem das graves faltas de Israel (Am 2,6-8) segue o anúncio do que o espera. A
imagem do chão esmagado, “como o esmaga uma carroça cheia de feixes”, sublinha a
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Carrière (2010, p. 351) considera que “os oráculos de Amós surgiram da consciência de um fim
próximo e incontornável”.
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“A carroça, pesadamente carregada, que cava profundas fendas na terra que ela sulca, pronta a se
quebrar, seria uma alusão ao terremoto que provoca rachaduras na terra” (BOVATI; MEYNET, 1994, p. 49;
Am 1,1).
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Como isso não acontece, o Deus dos exércitos deportará seu povo “para além de
Damasco”, privando-o de habitar na Terra da promessa (Am 5,27). Sorte semelhante
terá quem “se deita em leitos de marfim e estão estirados em seus divãs”, num estilo de
vida cínico, comparado à situação dos explorados (Am 6,4-6). “Serão deportados à
frente dos deportados”, pondo-se fim à sua vida nababesca e inconsequente (Am 6,7).
“A cidade e tudo o que há nela” serão entregues nas mãos dos pilhadores, de modo que
ficará deserta, pois “se restarem dez homens em uma casa, todos eles morrerão”, não
sobrando um sobrevivente sequer (Am 6,9-10). O Senhor “abaterá a casa grande,
deixando-a em escombros e a casa pequena, fazendo-a em pedaços” (Am 6,11). O
Senhor agirá por meio de “uma nação que vos tiranizará desde a entrada de Emat até a
torrente de Arabá” (Am 6,14). A motivação do castigo divino é sempre o mesmo:
“Convertestes em planta venenosa o direito e o fruto da justiça em absinto” (Am 6,12).
realmente deportado de seu território” (Am 7,17). Trágico fim para um servidor de
Deus!
Haverá “em todas as praças, lamúrias; e em todas as ruas dizem: ´Ai! Ai!´” e o
agricultor será “chamado para o luto” e “os que conhecem cantos fúnebres” serão
convocados para fazer lamentações, quando o Senhor passar no meio do povo (Am 5,16-
17). A intervenção de Deus na história será contundente. “Converterei vossas festas em
luto e todos os vossos cantos em lamentação. Vestirei a todos com pano de saco e
tornarei calva toda cabeça. Estabelecerei isso como luto pelo filho único e seu fim será
como um dia amargo” (Am 8,10). Então, de nada valerá buscar o Senhor, pois não se
deixará encontrar (Am 8,11-12). No momento oportuno, quando Israel foi advertido de
várias maneiras, na tentativa de que voltasse ao Senhor, “não voltastes a mim” (Am 4,6-
12). Tendo chegado ao fim o tempo da paciência divina, resta a Israel uma só coisa:
“Prepara-te para encontrar o teu Deus” (Am 4,12), de cuja presença será impossível
escapar (Am 9,1-4).
Uma imagem pastoril ilustra a sorte de Israel. “Como um pastor arranca da boca de
um leão duas pernas ou um pedaço de orelha, assim serão arrancados os filhos de Israel
que se assentam em Samaria, na borda de um leito ou num divã de damasco” (Am 3,12).
A metáfora faz alusão a Ex 22,12 para retratar a situação da Samaria. “O leão
corresponde ao exército inimigo, mas, ao mesmo tempo, trata-se do Senhor que pune
a injustiça de Israel tratando-o como presa dos predadores” (BOVATI; MEYNET, 1994, p.
81). Para Simian-Yofre (2002, p. 73), “o acento da comparação não se coloca sobre a
identidade dos que serão poupados (alguns israelitas que habitam na Samaria) nem
sobre o fato de terem sido salvos, mas sobre as dimensões da destruição”.
O profeta aponta uma saída na eventualidade de uma conversão com gestos
concretos. Se Israel odiar o mal e amar o bem e estabelecer o direito nos julgamentos
que acontecem na porta da Samaria, “talvez o Senhor, Deus dos exércitos, se
compadeça do resto de José” (Am 5,15)11. Portanto, o futuro de Israel depende de uma
opção, que está nas mãos das lideranças, desafiadas a mudar a sorte dos empobrecidos
e oprimidos por uma guinada radical no trato com eles.
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“Talvez se pressuponha que Israel tenha sido, afinal, reduzido apenas ao planalto central, tendo perdido
os territórios da Galileia e das planícies (José é, de fato, o nome coletivo de Efraim e Manassés, que
habitavam tal planalto)” (SOGGIN, 1982, p. 121).
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garantir seus direitos faz com que a injustiça cometida contra eles seja encoberta com
o manto da impunidade.
O neoliberalismo com o seu dogma do lucro obtido a qualquer custo, acoplado à
ideologia da pós-modernidade e sua supervalorização do consumo e do prazer, abre
espaço para a ganância dos comerciantes, inescrupulosos em sua praxe de enganar os
incautos consumidores no preço, na medida, na qualidade e na quantidade. O lucro
obtido pelo caminho do engano não faz pesar a consciência de quem explora.
A triste realidade do tráfico e do comércio de seres humanos, mormente mulheres,
uma das grandes fontes de lucro no mercado internacional, corresponde a uma chaga
incurável no coração da humanidade. A violência sexual de pais e filhos servindo-se da
mesma jovem empregada, sem qualquer direito, encontra paralelos em milhões de
mulheres prostituídas, sem qualquer direito ou respeito por sua dignidade,
transformada em fábricas de prazer para clientes ávidos.
O fenômeno da escravidão também se perpetua numa incontável multidão de
homens e mulheres fadados a trabalhar em condições subumanas, como se fossem
escravos, para saciar a ganância de latifundiários e empresários, mas também, nas
mansões das famílias ricas, onde se encontram as “vacas de Basã” modernas, que lhes
negam os direitos mínimos de trabalhadores. São muitas as capas que encobrem a
escravidão, impedindo que lhe seja dado o verdadeiro nome: trabalhadores sem carteira
assinada, prestadores de serviço cujo pagamento está aquém do que merece,
trabalhadores sazonais trazidos de longe e obrigados a se contentarem com o mínimo
em vista de economizar dinheiro a ser enviado às famílias etc.
A religião tem sido instrumentalizada em favor da manutenção do status quo,
gerando falsa segurança tanto na consciência dos agentes da injustiça, travestidos de
líderes religiosos, quanto na consciência das milhões de pessoas que se deixam iludir
com suas promessas de riqueza e prosperidade. A injustiça deu origem a um estilo de
religião totalmente aderente a seu esquema desumanizador.
Fica a pergunta: Onde estão os Amós latino-americanos, prontos a lutar pelo direito
e pela justiça em favor dos mais pobres? Onde está quem, em nome da fé, coloca-se na
contramão dos esquemas perversos de opressão, abençoados e confirmados por um
modelo de religião feito de propósito para justificar a injustiça que vitimiza os mais
pobres? Onde estão as mentes lúcidas capazes de discernir a realidade e perceber o
triste fim de um projeto de sociedade que exclui e marginaliza os estratos inferiores,
fadado a se contentar com as migalhas que caem da mesa dos ricos?
Voltar ao testemunho do pastor de Técoa será uma opção sensata para os discípulos
e discípulas de Jesus de Nazaré, comprometidos com o advento do Reino de Deus.
Referências bibliográficas
ALONSO SCHÖKEL, L.; SICRE DIAZ, J. L., Profetas – Comentario II. Madrid: Cristiandad,
1980.
ARANGO, J. R., Opressão e profanação do santo Nome de Deus: Estudo do vocabulário
de Amos 2,7b, Revista de Interpretação Bíblica Latinoamericana nº 11 (1992) p.
43-56 [edição brasileira].
BOVATI, P.; MEYNET, R., La fin d´Israël. Paroles d´Amos. Paris: Cerf, 1994.
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