Você está na página 1de 6

PLANEJAMENTO

“Planeje com antecedência: não estava chovendo quando Noé construiu a arca. ”
(Richard C. Cushing - 1885-1970 - cardeal norte-americano).

A construção civil é uma atividade que envolve grande quantidade de variáveis e se desenvolve
em um ambiente particularmente dinâmico e mutável. Gerenciar uma obra adequadamente não
é um dos trabalhos mais fáceis e, no entanto, muito de improvisação ainda tem lugar nos
canteiros por todo o mundo.
O planejamento da obra é um dos principais aspectos do gerenciamento, conjunto de amplo
espectro, quem envolve também orçamento, compras, gestão de pessoas, comunicações, etc.
Ao planejar, o gestor dota a obra de uma ferramenta importante para priorizar suas ações,
acompanhar o andamento dos serviços, comparar o estágio da obra com a linha de base1
referencial e tomar providências em tempo hábil quando algum desvio é detectado.
A deficiência do planejamento pode trazer consequências desastrosas para uma obra e, por
extensão, para a empresa que a executa. Um descuido em uma atividade pode acarretar atrasos
e escalada de custos, assim como colocar em risco o sucesso do empreendimento.
Lamentavelmente, não são poucas as obras “tocadas” sem qualquer tipo de planejamento,
valendo-se o engenheiro, ou o arquiteto, apenas de sua capacidade de administrar os assuntos
concomitantemente com o desenrolar da obra. Essa não é, contudo, a maneira mais
aconselhável de se proceder. Planejar é pensar, aplicar, controlar e corrigir a tempo. O
planejamento envolve várias etapas que não podem ser descartadas por falta de tempo ou por
excesso de confiança na própria experiência.
Pode-se afirmar sem medo de errar que quem um dia tem a oportunidade de trabalhar em uma
obra planejada nunca mais se acostuma a trabalhar de outra maneira. O que empolga em
planejamento é que, ao conhecer e dominar os fundamentos teóricos, o planejador se pergunta:
“Por que não pensei nisso antes? ”.
A indústria da construção civil tem sido um dos ramos produtivos que mais vem sofrendo
alterações substanciais nos últimos anos. Com a intensificação da competitividade, a
globalização dos mercados, a demanda por bens mais modernos, a velocidade com que surgem
novas tecnologias, o aumento do grau de exigência dos clientes - sejam eles os usuários finais
ou não - e a reduzida disponibilidade de recursos financeiros para a realização de
empreendimentos, as empresas se deram conta de que investir em gestão e controle de
processos é inevitável, pois sem essa sistemática gerencial os empreendimentos perdem de
vista seus principais indicadores: o prazo, o custo, o lucro, o retorno sobre o investimento e o
fluxo de caixa. Informação rápida é um insumo que vale ouro.
Nesse contexto, o processo de planejamento e controle passa a cumprir papel fundamental nas
empresas, na medida em que tem forte impacto no desempenho da produção. Estudos
realizados no Brasil e no exterior comprovam esse fato, indicando que deficiências no
planejamento e no controle estão entre as principais causas da baixa produtividade do setor,
de suas elevadas perdas2 e da baixa qualidade dos seus produtos.

1
É o planejamento referencial do projeto, o planejamento original, também conhecido como baseline.
2
Toda e qualquer ineficiência que se reflita no uso de equipamentos, materiais, mão de obra e capital em
quantidades superiores àquelas necessárias à produção da edificação.

1
BENEFÍCIOS DO PLANEJAMENTO

Ao planejar uma obra, o gestor adquire alto grau de conhecimento do empreendimento, o que
lhe permite ser mais eficiente na condução dos trabalhos.
Os principais benefícios que o planejamento traz são:
a) Conhecimento pleno da obra
b) Detecção de situações desfavoráveis
c) Agilidade de decisões
d) Relação com o orçamento
e) Otimização da alocação de recursos
f) Referência para acompanhamento
g) Padronização
h) Referência para metas
i) Documentação e rastreabilidade
j) Criação de dados históricos
k) Profissionalismo

Abordando cada um dos benefícios:

a) Conhecimento pleno da obra


A elaboração do planejamento impõe ao profissional o estudo dos projetos, a análise
dos métodos construtivos, a identificação das produtividades consideradas no
orçamento, a determinação do período trabalhável em cada frente ou tipo de serviço
(área interna, externa, concreto, terraplenagem, etc.).
A prática de parar para pensar no trabalho somente poucos dias antes de começá-lo é
totalmente equivocada pois não permite tempo hábil para mudança de planos.
b) Detecção de situações desfavoráveis
A previsão oportuna de situações desfavoráveis e de indícios de desconformidade
permite ao gestor da obra tomar providências a tempo, adotar medidas preventivas e
corretivas, e tentar minimizar os impactos no custo e no prazo.
Por falta de planejamento e controle, a equipe da obra deixa para tomar providências
quando o quadro de atraso já é irreversível.
Quanto mais cedo o gestor puder intervir, melhor. A figura abaixo ilustra o que se
costuma chamar de oportunidade construtiva, que é a época em que se pode alterar o
rumo de um serviço ou do próprio planejamento a um custo relativamente baixo. Com
o passar do tempo, essa intervenção passa a ser menos eficaz e sua implantação, mais
cara - é a oportunidade destrutiva.

2
c) Agilidade de decisões
O planejamento e o controle permitem uma visão real da obra, servindo de base
confiável para decisões gerenciais, como: mobilização e desmobilização de
equipamentos, redirecionamento de equipes, aceleração de serviços, introdução do
turno da noite, aumento da equipe, alteração de métodos construtivos, terceirização de
serviços, substituição de equipes pouco produtivas, etc.
d) Relação com o orçamento
Ao usar as premissas de índices, produtividades e dimensionamento de equipes
empregadas no orçamento, o engenheiro ou o arquiteto “casa” orçamento com
planejamento, tornando possível avaliar inadequações e identificar oportunidades de
melhoria.
Ignorar as produtividades com que os serviços foram orçados significa ficar sem um
importante parâmetro de controle.
e) Otimização da alocação de recursos
Por meio da análise do planejamento, o gestor da obra pode jogar com as “folgas”3 das
atividades e tomar decisões importantes como nivelar recursos, protelar a alocação de
determinados equipamentos, etc. O entendimento do conceito de “folga” é essencial
para o engenheiro ou o arquiteto saber quais tarefas podem ter seu início postergado,
em qual data “mais tarde” se deve mobilizar certo recurso e, também, até quando
determinadas despesas podem ser adiadas sem atrasar a obra.
f) Referência para acompanhamento
O cronograma desenvolvido no planejamento é uma ferramenta importante para o
acompanhamento da obra, pois permite comparar o previsto com o realizado. Ao

3
Margem de tempo que as atividades “não críticas” de um projeto possuem. Essa margem lhes garante
determinada flexibilidade.

3
planejamento original, aquele que se quer perseguir, dá-se o nome de planejamento
referencial ou linha de base (baseline).
É contra a linha de base que se compara o que foi efetivamente realizado no campo e
que se tomam as medidas corretivas cabíveis. Ter um planejamento referencial é
importante também do ponto de vista da gestão de pessoas - ele é meta a ser buscada,
é a “cartilha” que todos devem seguir na condução de suas tarefas diárias.
g) Padronização
O planejamento disciplina e unifica o entendimento da equipe, tornando consensual o
plano de ataque da obra e melhorando a comunicação.
A falta de planejamento e controle gera desentendimentos frequentes, porque o
engenheiro ou o arquiteto têm uma obra na cabeça, o mestre outra e o fiscal ainda
outra.
h) Referência para metas
Programas de metas e bônus por cumprimento de prazos podem ser facilmente
instituídos porque há um planejamento referencial bem construído, sobre o qual as
metas podem ser definidas.
i) Documentação e rastreabilidade
Por gerar registros escritos e periódicos, o planejamento e o controle propiciam a
criação de uma história da obra, útil para resolução de pendências, resgate de
informações, elaboração de pleitos contratuais, defesa de pleitos de outras partes,
mediação de conflitos e arbitragem.
j) Criação de dados históricos
O planejamento de uma obra pode servir de base para o desenvolvimento de
cronogramas e planos de ataque para obras similares. A empresa passa a ter memória.
k) Profissionalismo
O planejamento dá “ares” de seriedade e comprometimento à obra e à empresa. Ele
causa boa impressão, inspira confiança nos clientes e ajuda a fechar negócios.

DEFICIÊNCIA DAS EMPRESAS

Algo que pode ser tristemente constatado no mundo da construção civil é a ausência ou a
inadequação do planejamento das obras. Esse fenômeno é sentido muito mais nas obras de
pequeno e médio portes, em sua maioria efetuadas por empresas pequenas, por profissionais
autônomos, ou mesmo pelos seus proprietários.
A deficiência dos construtores se manifesta em graus variados. Há empresas que planejam, mas
o fazem mal; outras que planejam bem, mas não controlam; e aquelas que funcionam na base
da total improvisação. Enquanto algumas construtoras se esforçam para gerar cronogramas
detalhados e aplicar programações semanais de serviços, outras creem que a experiência de
seus profissionais é o bastante para garantir o cumprimento do prazo e do orçamento.
A deficiência do planejamento pode trazer consequências desastrosas para uma obra e, por
extensão, para a empresa que a executa. Não são poucos os casos conhecidos de frustração de
prazo, estouros de orçamentos, atrasos injustificados, indisposição do construtor com seu
cliente (contratante), e até mesmo litígios judiciais para recuperação de perdas e danos.

4
A melhor maneira de minimizar esses impactos é produzir um planejamento lógico e racional,
pois assim se dispõe de um instrumento que se baseia em critérios técnicos, fácil de manusear
e interpretar.

CAUSAS DA DEFICIÊNCIA

As causas da deficiência em planejamento e controle podem ser agrupadas em função dos


seguintes aspectos que vêm de longa data:
a) Planejamento e controle como atividades de um único setor
b) Descrédito por falta de certeza nos parâmetros
c) Planejamento excessivamente informal
d) Mito do tocador de obras

Abordando cada um desses aspectos:

a) Planejamento e controle como atividades de um único setor


Um problema sério é que a elaboração do planejamento é muitas vezes encarada como
uma missão enfadonha que o setor técnico da empresa precisa cumprir. O produto final
serve apenas para “fazer figura” perante o cliente. São planilhas, gráficos e cronogramas
que prescindem de análise apurada e muitas vezes nem são aprovados por quem vai
fazer a obra, ou sequer submetidos ao crivo da equipe de produção. Planejamento
serve para ajudar, não para representar um ônus.
Em vez de serem vistos como um processo gerencial que deve permear toda a estrutura
da empresa, o planejamento e o controle muitas vezes são confundidos com o trabalho
isolado de um setor da empresa ou com a simples aplicação de técnicas para a geração
de planos.
Os planos gerados por essa sistemática carecem tanto de uma base de informações
consistente, quanto de procedimentos que garantam a disseminação das informações
geradas aos seus usuários, em um formato adequado e no tempo certo.
Reuniões eficazes de acompanhamento têm o “poder” de doutrinar o pessoal de campo.
O planejamento tem que ser “abençoado” por todos os envolvidos, e as informações de
progresso transmitida a todos, do diretor ao mestre, do estagiário ao almoxarife.
A geração de indicadores de desempenho permite que sejam premiadas as melhores
equipes e detectados os focos de desvio.
Outro problema comum é a equipe fazer o planejamento inicial, mas não atualizá-lo
periodicamente. Sendo a obra um sistema mutável e dinâmico, um planejamento pode
virar letra morta rapidamente se não for atualizado. Planejamento sem controle não
existe, o binômio é indissociável. Se um dos objetivos do planejamento é minimizar as
incertezas da obra, é preciso um mecanismo de apropriação de dados de campo que
permita ao gerente avaliar se seu planejamento está sendo frutífero ou se é melhor
replanejar a obra.

5
b) Descrédito por falta de certeza nos parâmetros
A incerteza é inerente ao processo de construção em função da variabilidade do produto
e das condições locais, da natureza dos seus processos de produção e da própria falta
de domínio das empresas sobre seus processos.
Em vez de ser repudiado por trabalhar com premissas que podem não se verificar na
prática, o planejamento deve ser visto como um exercício técnico que se presta a tentar
prever, dentro do cenário futuro verossímil, o impacto das atividades. As incertezas, à
medida que o tempo passa, vão sendo incorporadas ao planejamento por meio de
alterações e adaptações dos planos com utilização das corretas produtividades dos
serviços nas diversas situações.
A crença antiga de que o desperdício e a informalidade são intrínsecos ao modus
operandi4 da construção já não encontra “acolhida” atualmente.

c) Planejamento excessivamente informal


A informalidade reside no “hábito” de achar que o planejamento são as ordens
transmitidas pelo engenheiro ou arquiteto a seus mestres de obra. Procedendo-se
assim, perde-se o conceito sistêmico de planejamento, com a visão de longo prazo
sendo obstruída pelo imediatismo das atividades de curto prazo.
A falta de um planejamento global formal determina a inadequação dos planos de
médio e curto prazos, acarretando a utilização ineficiente de recursos humanos e
materiais da obra.
De maneira geral, a excessiva informalidade dificulta a comunicação entre os vários
setores da empresa.

d) Mito do tocador de obras


É comum encontrar nas empresas uma supervalorização do “tocador de obras”,
engenheiro ou arquiteto que tradicionalmente tem postura de tomar decisões
rapidamente, apenas com base na experiência e na intuição, sem o devido
planejamento, o que é considerado perda de tempo. Pela falta de planejamento, forma-
se então um círculo vicioso, uma vez que surge a carência do profissional com o perfil
de “tocador de obras”.
Como a construção se desenvolveu historicamente com grande informalidade e em um
ambiente em que o desperdício era tido como “aceitável” e no qual se valorizava o
“tocador de obras” em detrimento do “gerente”, houve um inevitável afastamento do
pessoal de campo em relação ao planejamento e acompanhamento. Nos países mais
desenvolvidos, mestres de obra e encarregados, comparados com seus colegas
brasileiros, dedicam muito mais tempo analisando a programação e pensando com
antecedência nas ações e providências que tomarão nas semanas seguintes.

4
É uma expressão em latim que significa “modo de operação”. Utilizada para designar uma maneira de
agir, operar ou executar uma atividade.

Você também pode gostar