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Piedade como base de uma fé


fervorosa!
Rev. Fábio Henrique do Nascimento Costa

Introdução/Elucidação
Após a transfiguração, Jesus, juntamente
com Pedro, Tiago e João, desceram do
monte, a fim de que ele pudesse realizar
sua jornada rumo a Jerusalém e às
provações que o aguardavam ali. Foi uma
descida da glória e da transcendência
para a normalidade da vida e do
ministério, e Jesus teve de voltar a lidar
com uma “geração incrédula e perversa”.
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Quando leio esta passagem, não consigo


deixar de pensar em uma experiência
semelhante, na qual alguém também
desceu de um monte em direção a uma
geração corrompida, perversa e
degradada, marcada por incredulidade.
Lemos isso no livro de Êxodo:
Ex 32.15-20 “15 E, voltando-se,
desceu Moisés do monte com as
duas tábuas do Testemunho nas
mãos, tábuas escritas de ambos os
lados; de um e de outro lado
estavam escritas. 16
As tábuas eram
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obra de Deus; também a escritura


era a mesma escritura de Deus,
esculpida nas tábuas. 17
Ouvindo
Josué a voz do povo que gritava,
disse a Moisés: Há alarido de
guerra no arraial. 18
Respondeu-lhe
Moisés: Não é alarido dos
vencedores nem alarido dos
vencidos, mas alarido dos que
cantam é o que ouço. 19
Logo que se
aproximou do arraial, viu ele o
bezerro e as danças; então,
acendendo-se-lhe a ira, arrojou das
mãos as tábuas e quebrou-as ao pé
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do monte; 20
e, pegando no bezerro
que tinham feito, queimou-o, e o
reduziu a pó, que espalhou sobre a
água, e deu de beber aos filhos de
Israel.”.
O que Moisés viu quando desceu do
monte Sinai foi o culto de adoração mais
popular já realizado. Todos estavam
presentes, uma vez que a finalidade da
reunião era satisfazer os desejos do povo,
não o desejo de Deus. A cantoria era tão
vigorosa, que soava como a eclosão de
uma guerra a quilômetros de distância, e
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o foco principal era a imagem de um


bezerro produzido com brincos de ouro
ofertado pelo povo.
O mediador da antiga aliança subiu ao
monte, onde se encontrou com Deus e
recebeu a Lei; contudo, ao descer daquele
lugar santo, viu a nação de Israel
totalmente entregue à idolatria. Séculos
mais tarde, nosso Senhor subiu ao monte
da transfiguração, onde sua glória foi
manifesta; ao descer, deparou-se com
uma geração incrédula e perversa.
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Tema: Piedade como base de uma


fé fervorosa!

Desenvolvimento
Ausência de fé
Mateus diz: v. 14-15 “E, quando
chegaram para junto da multidão,
aproximou-se dele um homem, que
se ajoelhou e disse: 15
Senhor,
compadece-te de meu filho, porque
é lunático e sofre muito; pois
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muitas vezes cai no fogo e outras


muitas, na água.”. O termo epiléptico é
utilizado por alguns tradutores com base
nos sintomas mencionados aqui: o garoto
tinha convulsões e, muitas vezes, caía no
fogo ou na água. No entanto, o texto
afirma literalmente que o menino
era um lunático. Para nós, este
estado equivale à insanidade, mas,
no mundo antigo, aqueles que se
comportavam de modo estranho e
excêntrico eram considerados
“perturbados”. Por esta razão,
eram chamados de lunáticos, um
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termo que vem da palavra latina


luna, que significa “lua”. Todavia,
embora os sintomas indicassem que ele
sofria de uma doença, Mateus logo nos
informa que o verdadeiro problema era
uma possessão demoníaca.
O pai do menino disse: v. 16 “. 16

Apresentei-o a teus discípulos, mas


eles não puderam curá-lo.”. Jesus
tinha concedido aos discípulos poder e
autoridade sobre os demônios (Lc 9.1), e
eles haviam se alegrado no poder
recebido Lc. 10. 17 “17 Então,
9

regressaram os setenta, possuídos


de alegria, dizendo: Senhor, os
próprios demônios se nos
submetem pelo teu nome!”. Não há
qualquer registro de que tivessem
enfrentado problemas com a expulsão de
demônios antes desta ocasião, mas seus
esforços foram frustrados ao ajudar este
rapaz. Eles provavelmente fizeram
tudo o que sabiam; mesmo assim,
suas tentativas fracassaram. Posso
apenas imaginar a frustração do pai do
menino, diante da incapacidade dos
discípulos, mas, se transformando em
10

alegria ao avistar Jesus. Ele correu em


sua direção, ajoelhou-se e implorou que
tivesse misericórdia do rapaz.
Mateus registra a resposta de Jesus da
seguinte forma: Mt. 17 17 “Jesus
exclamou: Ó geração incrédula e
perversa! Até quando estarei
convosco? Até quando vos sofrerei?
Trazei-me aqui o menino.”. Se
alguma vez ouvimos Jesus clamando por
pura frustração, é aqui nesta passagem.
Ele descreveu aquela geração as pessoas
vivas naquele momento – como incrédula
11

e perversa. Estas palavras, incrédula e


perversa, estão ligadas. Ser incrédulo é
ser desprovido de confiança na
verdade de Deus, é não ser
comprometido de alma e coração
com os caminhos de Deus. A
palavra traduzida como “perversa”
significa literalmente “distorcida
ou torcida”. O senso de certo e
errado do povo estava distorcido.
Eles admitiam o mal e
ridicularizavam a virtude. Seus
valores estavam de cabeça para
baixo. Em suma, eram perversos.
12

Isto soa familiar para você? Nós vivemos


em uma época em que o mal é celebrado,
e a justiça é ridicularizada. Isto
acontece porque vivemos em uma
época marcada pela ausência de fé.
Àquela altura de seu ministério,
Jesus já estava farto de tamanha
perversidade. A frustração fez com
que lamentasse: “Por quanto tempo
terei de tolerar isso? Por quanto
tempo terei de aturar esta
geração?”
13

Mesmo assim, Jesus ordenou que o pai


trouxesse o garoto e, então, repreendeu o
demônio, e este saiu do menino; e, desde
aquela hora, ficou o menino curado (v.
18).
A fato de Jesus de expulsar o
demônio com facilidade
naturalmente fez com que os
discípulos se perguntassem o que
haviam feito de errado. Por isso,
questionaram o que eles fizeram de
errado: Mt. 19-20a “Então, os
discípulos, aproximando-se de
14

Jesus, perguntaram em particular:


Por que motivo não pudemos nós
expulsá-lo? 20
E ele lhes respondeu:
Por causa da pequenez da vossa
fé.”. Como devemos entender esse
diagnóstico para o motivo do fracasso?
Poucos dias antes, Pedro, falando em
nome de todos eles, fizera uma sublime e
gloriosa confissão de fé: “Tu és o Cristo, o
Filho do Deus vivo” (Mt 16.16). Eles
tinham fé, mas ela era frágil. Ela estava
misturada com dúvida. Ela estava diluída
no pensamento do mundo.
15

Nós somos chamados a viver uma vida de


fé em uma sociedade ímpia.
Todos os dias, toda hora, nos deparamos
com pontos de vista que estão em rota de
colisão com o conteúdo da nossa fé,
pontos de vista que agridem, minam e
sabotam as preciosas verdades a que
tentamos ser fiéis por vezes, com muita
dificuldade. Nós cremos, mas nossa
fé é frequentemente superada pela
incredulidade. Jesus afirmou ser este o
motivo por que os discípulos haviam sido
incapazes de derrotar o inimigo naquela
16

ocasião, e é por isso que, muitas vezes,


nós não conseguimos levar a vida fiel que
almejamos ter.
Jesus prosseguiu dizendo: Mt. 17. 20b
“Pois em verdade vos digo que, se
tiverdes fé como um grão de
mostarda, direis a este monte:
Passa daqui para acolá, e ele
passará. Nada vos será
impossível.”. Na tradição judaica da
época, a ideia de mover montanhas por
meio da fé fazia parte da compreensão
metafórica do poder existente na
17

confiança em Deus. Jesus disse que, se os


discípulos tivessem fé verdadeira, seriam
capazes de mover montanhas– e
certamente poderia expulsar um
demônio de uma pobre alma.
Necessidade de oração fervorosa
Por fim, Mateus diz que Jesus concluiu a
explicação com uma declaração curiosa:
Mt. 17.21 “21 [Mas esta casta não se
expele senão por meio de oração e
jejum.]”. Existe certo
questionamento quanto a esta frase
pertencer de fato ao texto original
18

de Mateus, pois ela não está


presente em todos os manuscritos
primitivos. No entanto, a afirmação
está presente no Evangelho de Marcos
(9.29); logo, podemos afirmar realmente
que essas palavras fazem parte do que
Jesus disse na ocasião. A questão mais
pertinente para nós é o que ele quis dizer
com estas palavras.
Creio que Jesus estava dizendo aos
discípulos que, quando
acrescentamos jejum à oração, o
ato de nos abster dos alimentos
19

enfatiza a importância e a
gravidade daquilo que estamos
pedindo ao Pai. Quando nos
aproximamos de Deus com oração
e jejum, fazemo-lo com um senso
de urgência. Eu acredito que a
maioria dos crentes hoje ora, mas
penso também que a maior parte
das nossas orações tem caráter
superficial. Muitos, na infância,
aprendem a recitar: “Querido Deus, por
favor, abençoe a mamãe, o papai, o tio
fulano, a tia fulana e o resto da família.
Também peço que me guarde esta noite.
20

Amém.” Para muitos de nós, a oração


nunca avança muito além desse ponto.
Nossas petições são marcadas por
uma natureza mecânica,
desprovida de paixão, e de fervor.
Quando lemos as páginas do Antigo
Testamento, encontramos um estilo
muito diferente de oração. Eis apenas um
exemplo: Gn 32.22-29 “22 Levantou-se
naquela mesma noite, tomou suas
duas mulheres, suas duas servas e
seus onze filhos e transpôs o vau de
Jaboque. 23
Tomou-os e fê-los
21

passar o ribeiro; fez passar tudo o


que lhe pertencia, 24
ficando ele só;
e lutava com ele um homem, até ao
romper do dia. 25
Vendo este que
não podia com ele, tocou-lhe na
articulação da coxa; deslocou-se a
junta da coxa de Jacó, na luta com o
homem. 26
Disse este: Deixa-me ir,
pois já rompeu o dia. Respondeu
Jacó: Não te deixarei ir se me não
abençoares. 27
Perguntou-lhe, pois:
Como te chamas? Ele respondeu:
Jacó. 28
Então, disse: Já não te
chamarás Jacó, e sim Israel, pois
22

como príncipe lutaste com Deus e


com os homens e prevaleceste. 29

Tornou Jacó: Dize, rogo-te, como te


chamas? Respondeu ele: Por que
perguntas pelo meu nome? E o
abençoou ali.”.

Essa foi a maior luta de todas – afinal, ao


lutar com um anjo, Jacó estava lutando
com Deus. Jacó, a despeito da identidade
de seu oponente, não o deixou ir embora.
Este é o tipo de oração acerca do qual
Jesus estava falando, o tipo de oração
23

necessário para se vencer as forças do


inferno. É uma oração com urgência, algo
que precisa de uma solução rápida, além
disso a persistência. É uma oração
semelhante às súplicas da mulher que
não desistiu até o juiz dar ouvidos ao seu
caso (Lc 18.1-5). É lutar durante toda a
noite em oração, se necessário.
Sou cristão há alguns anos, e, neste
tempo, Deus me abençoou com muitas
respostas incríveis, maravilhosas e
impressionantes às minhas orações.
Nenhuma oração ficou sem resposta, pois
24

não existe oração sem resposta. Muitas


vezes, a resposta de Deus é não – e esta é
uma resposta. Jesus compreendia isso.
Quando orou no jardim do Getsêmani
pedindo que o cálice da ira do Pai
passasse dele, o Pai disse não, e Jesus
bebeu o cálice (Mt 26.39-44). No entanto,
Deus já respondeu positivamente aos
meus pedidos de formas maravilhosas.
Também observei uma forte ligação entre
as respostas mais extraordinárias às
orações que fiz ao longo da vida e a
paixão e premência com que eu as
proferi. Sem dúvida, eu me importo com
25

tudo aquilo pelo que oro, mas não oro


com a mesma paixão e com o mesmo
fervor em todos os casos.
O autor da epístola de Tiago, no Novo
Testamento, não foi o apóstolo Tiago,
irmão de João, mas um dos irmãos de
Jesus (Mt 13.55). Ao que parece, ele só se
converteu após a ressurreição; porém,
tornou-se um líder na igreja de
Jerusalém (At 15.13; Gl 2.9) e era
conhecido como um homem
particularmente justo. Seu apelido era
“joelhos de camelo”, pois seus joelhos
26

eram sobremaneira calejados, como os de


um camelo, por passar muito tempo em
oração. Havia algo que ele sabia sobre
oração, e isto redigiu em sua epístola:

Tg. 5.13-18 “13 Está alguém entre vós


sofrendo? Faça oração. Está
alguém alegre? Cante louvores. 14

Está alguém entre vós doente?


Chame os presbíteros da igreja, e
estes façam oração sobre ele,
ungindo-o com óleo, em nome do
Senhor. 15 E a oração da fé salvará o
27

enfermo, e o Senhor o levantará; e,


se houver cometido pecados, ser-
lhe-ão perdoados. 16
Confessai,
pois, os vossos pecados uns aos
outros e orai uns pelos outros, para
serdes curados. Muito pode, por
sua eficácia, a súplica do justo. 17

Elias era homem semelhante a nós,


sujeito aos mesmos sentimentos, e
orou, com instância, para que não
chovesse sobre a terra, e, por três
anos e seis meses, não choveu. 18
E
orou, de novo, e o céu deu chuva, e
a terra fez germinar seus frutos.”.
28

Mais uma vez, aqui no exemplo de Elias,


vemos um exemplo de oração fervorosa.
Há uma pergunta que sempre fazem: “As
nossas orações são capazes de fazer Deus
mudar de ideia?” Se existe alguma
ocasião em que me identifico com a
frustração de Jesus diante de uma
geração incrédula, é quando ouço essa
pergunta. A própria pergunta já fornece a
resposta. Sou capaz de fazer o Todo-
Poderoso mudar de ideia? Será que
vou acrescentar informações que
lhe eram desconhecidas até o
29

momento em que me ajoelhei e o


coloquei a par de minha situação?
Ele sabe do que eu preciso antes
que eu conte. Será que posso
corrigir seus conselhos dando a ele
a minha sabedoria às suas
intenções? A oração não faz Deus
mudar de ideia. Assim que afirmo
isso, entretanto, as pessoas
perguntam: “Bem, então, por que
orar?” Dizer que a oração não faz
Deus mudar de ideia não significa
que a oração seja inútil.
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Devemos, então, orar? Sim, e com o


maior fervor possível. Como Tiago diz,
“Muito pode, por sua eficácia, a súplica
do justo”.
Se você realmente quiser ver a mão
invisível de Deus operando em sua vida,
trabalhando em tempos de crise e de
lutas, coloque premência em suas
orações. Coloque fervor em suas orações.
Não permita que elas sejam apenas
declarações superficiais; esforce-se para
segurar Deus como Jacó fez. Lute com ele
dia afora, noite afora. Não pare até que
31

ele te abençoe. É disso que a verdadeira


oração é feita. É isso o que move
montanhas. É isso o que muito pode o
justo.
Aplicação
Conclusão

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