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MAPEAMENTO DE

2017
Mapeamento de Designers Negros/as 2017

PESQUISA

Mapeamento de Designers Negros/as 2017


Realização: Afroguerrilha em parceria com trampos.co

MANIFESTO

“Designers negros: a potência criativa


à altura dos desafios do próximo século”.
Por Ayòbí Design Lab e Afroguerrilha

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ÍNDICE

MANIFESTO
Designers Negros: a potência criativa à
2 altura dos desafios do próximo século
Designers Negros:
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Mapeamento de Designers Negros/as
2017
a potência criativa à altura
5 Perfil | Faixa etária
dos desafios do próximo
século.
6 Perfil | Gênero
Há mais de 500 anos atrás, quando os brancos deixaram a Europa
6 Perfil | Distribuição geográfica
e invadiram várias regiões do mundo, nações e civilizações
milenares já existiam e estavam consolidadas social, economica e
7 Perfil | Atividade
politicamente. Historiadores como Cheik Anta Diop demonstraram
7 Educação que os brancos ainda engatinhavam na história quando a civili-
zação africana já estava de pé e tomava rumos bastante diferentes
10 Mercado e muitas vezes opostos aos do primo mais novo europeu.

12 Designers, mercado e comunidade negra O contato forçado pelo europeu há 500 anos foi seguido de uma
série de violências brutais, algo jamais visto na história, que
derrubaram nações, dizimaram culturas, exterminaram povos e
abalaram a civilização mais próspera e antiga do mundo, a
africana. Das terras de Pindorama, batizadas pelos brancos como
América, até os limites da Ásia, povos inteiros foram submetidos a
um projeto de dominação racial que norteou um certo tipo de

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desenvolvimento econômico, político e cultural imposto ao mos celebrar a riqueza das nossas diferenças, daquilo que nos
mundo através de várias formas de violência, a começar pela colo- torna únicos e que, por algum motivo, sempre tentaram apagar
nização, e que trabalhou intensamente para impedir a continui- de nós.
dade dessas outras culturas e civilizações e exterminar outras
possibilidades de ser, viver e existir no mundo. Quando começamos esse mapeamento, a exclusão das pessoas
negras de vários espaços foi um dos motivos e é uma constante
Importa fazer essas colocações desde o início para lembrar quem óbvia dos dados obtidos, mas é importante ressaltar que não é o
somos, de onde viemos e em que bases foram assentadas as principal ponto. Esse projeto não é pautado por aquilo que o
relações raciais no Brasil e no mundo. Nós, pessoas de origem racismo nos impõe como problema, mas sim por todo o potencial
africana, não viemos do espaço, nem nascemos do encontro com criativo legado por esse outro eixo civilizatório do qual somos
os brancos. Somos os herdeiros de povos milenares, altamente herdeiros e que carregamos no sangue, nos traços físicos, na pele,
desenvolvidos, que criaram e estruturaram as ciências que possi- no cabelo, no gingado, na cultura e na memória ancestral guarda-
bilitaram o desenvolvimento tecnológico e humano no mundo. dos dentro de nós e em nossas comunidades. Existe dentro de nós
Nossa história não começa na abolição da escravidão, tampouco a mesma potência criativa ancestral, trancada e anestesiada por
no sequestro que nos trouxe forçadamente a essas terras onde tantas gerações, que tornou possível desde a origem da
fomos jogados. Temos como legado as culturas não apenas de um matemática até a criação de kilombos como Palmares, uma nação
outro povo, mas de um outro eixo civilizatório onde ser, ter, existir, africana em território brasileiro de cultura, política e economia
criar e construir funcionavam a partir de perspectivas absoluta- complexas onde chegaram a viver mais de 10 mil pessoas. Ainda
mente diferentes, quando não opostas aos do mundo euro-cen- acham que nós podemos pouco? Nós podemos muito. Africani-
trado, e em uma lógica coletiva de existência que pode mesmo ser dade é poder! A força de nossos ancestrais para feitos tão grandes
vista como todo um outro universo. diante da monstruosidade da escravidão foram a vitalidade e cria-
tividade africanas que eles preservaram mesmo depois de
Portanto, não somos todos iguais. gerações longe de África.

Não somos iguais aos brancos e, definitivamente, não queremos Se cada povo vítima da supremacia branca se voltasse para encon-
ser. Redescobrir nossa africanidade faz perceber o quanto deve- trar na riqueza de sua ancestralidade, em suas origens, as

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soluções criativas para resgatar sua autonomia e superar seus
desafios, não viveríamos em um mundo como o de hoje. Não é
possível que a mesma fonte de tantas desgraças no mundo possa
ser também a que vai resolver tudo isso. Por isso, é urgente nos
descolonizarmos, pois quando mudamos nossas perspectivas,
também mudamos aquilo que vemos no horizonte. Quando fala-
mos de racismo, é imprescindível falar da colonização branca e de
todo o atraso que ela impôs ao mundo por imobilizar a potência
criativa dos povos que violentou, dos nativo-americanos aos
oceânicos, além de tentar exterminar outras formas de ser, viver e
existir no mundo.

Nós, designers negros e negras, precisamos recuperar nossa


africanidade e reconhecer em nós mesmos essa potência criativa
legada por nossa ancestralidade africana, que pode fortalecer
nossa comunidade e oferecer ao mundo saídas formuladas
através de outras perspectivas e que apontem para outros hori-
zontes. Esse mapeamento busca encontrar essas potências espalha-
das pelo Brasil e fazer as conexões entre elas para desencadear
um renascimento criativo de perspectivas não-ocidentais que nos
permita projetar soluções à altura dos desafios do próximo século.

Robin Batista
AY Ò B Í / A F R O G U E R R I L H A

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Mapeamento de Designers Negros/as 2017

PESQUISA

Mapeamento de 23% 9,7%

Designers Negros/as 2017 8,7%


Os dados dessa pesquisa são resultado das respostas de 852
pessoas que se autodeclararam Negras / Afrodescendentes 36,3%
ou Afro-indígenas. As pessoas que declararam ser Asiáticas, 22,3%
Indígenas ou Brancas, tiveram suas respostas ignoradas nos
dados a seguir.

P E R F I L | FA I X A E TÁ R I A
17 a 22 anos 33 a 37 anos
Os dados colhidos na pesquisa mostra que o perfil dos
designers ou estudantes de design negros e negras no Brasil 23 a 27 anos Mais de37 anos
é bastante jovem, sendo que 58,6% tem entre 17 e 27 anos 28 a 32 anos
de idade.

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Mapeamento de Designers Negros/as 2017

PERFIL | GÊNERO PERFIL | DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA

Há uma diferença de 21,5% entre as pessoas que declaram Os estados que concentram o maior número de estudantes
ser do gênero masculino e as que declaram ser do gênero de design e/ou designers negros e negras são São Paulo,
feminino, sendo que os homens são 60%. O número chama Rio de Janeiro, Bahia e Minas Gerais. Porém, os números
atenção pelo fato de as mulheres negras serem maioria são desproporcionais em relação a população negra
entre a população negra no Brasil. Já na profissão do design distribuída por Estado, já que São Paulo, que tem uma popu-
estão em menor número. lação negra de 34,6%*, conta com o alto número de 34,4%
de todos os designers do Brasil, enquanto que a Bahia, que
tem uma população negra de 76,3%*, tem apenas 7,7%
desses designers.

60%
SP BA
RJ MG
Outros 32,5%
23%
34,4%
38,5% 7,4%
7,7% 18%
Feminino Masculino
*Mapa da Distribuição Espacial da População
Outro ou prefiro não dizer
Segundo a Cor ou Raça, 2013. IBGE.

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Mapeamento de Designers Negros/as 2017

P E R F I L | AT I V I D A D E EDUCAÇÃO

A maioria das pessoas entrevistadas já é profissional ou Por qual modelo de ensino você estuda
trabalha e estuda nas áreas do design. Apenas 15% disseram ou estudou Design?
ser apenas estudantes.
79,7% das pessoas entrevistadas estudam ou estudaram
design no ensino superior, sendo que 64,1% dessas fazem ou
fizeram curso de bacharelado. 11,6% das pessoas disseram ter
estudado design de forma autodidata, porém verificamos nas
39,6% perguntas de resposta livre que a maioria dessas pessoas não
3,3% seguiu alguma metodologia de estudos bem estruturada em
termos de conteúdo ou não conseguiu explicar que metodolo-
15% gia usou para uma formação técnica e teórica autodidata de
qualidade.
42,1%
64,1%
15,6%
11,6%
Estudante de Design 8,7%
Profissional de Design
Estudante e profissional de Design Bacharelado Autodidata
Professor(a) de Design Tecnólogo Técnico

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Mapeamento de Designers Negros/as 2017

EDUCAÇÃO EDUCAÇÃO

Você já sentiu algum desconforto ne Você estuda e/ou atua em que área
universidade / curso em que estuda do Design?
design por ser negro(a)?
A maioria, 51,7%, disse já ter sentido algum desconforto na A imensa maioria das pessoas entrevistadas, 75,2%,
universidade / curso em que estuda design por ser negra ou estudam e/ou trabalham com design gráfico. A surpresa é
negro. que o número de pessoas negras que estudam e/ou
trabalham com Interface e Experiência (UI/UX) é de 27,7%.
Professoras e professores negros que lecionam em cursos
51,7% de design são 4,8% do total.
48,3%
Professor (a) 4,8%
Sim Não Estudante* 8,9%
Industrial 14,3%
Gráfico 75,2%
Moda 10,3%
Interiores 4,3%
Motion 8,5%
UX 15%
UI 12,7%
Web 21,2%

*Sou estudante e meu curso de Design não


tem especificação por área.

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Mapeamento de Designers Negros/as 2017

EDUCAÇÃO

O currículo ou conteúdo de sua formação Caso a resposta seja "Sim",


educacional inclui / incluiu teóricos(as) comente quais:
e designers negros(as) / africanos(as)
como referência?
Carol Barreto
Aqui vem o óbvio. A imensa maioria das referências apresentadas
pela academia, entre teóricos e profissionais, são pessoas bran- Emory Douglas
cas. Além de não haver uma crítica da história e da teoria do Estêvão Silva
design considerando perspectivas culturais e históricas não-oci-
Jean Michel Kibushi
dentais, os próprios designers negros ou teóricos que influenciam
o design quase nunca aparecem, com raras exceções. Jean-Michel Basquiat
Milton Santos
Moustapha Alassane
Ralph Gilles

96,6% Não
Sim
Robson Santos
Rubem Valentim
Stuart Hall
Sylvia Harris
3,4%

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Mapeamento de Designers Negros/as 2017

EDUCAÇÃO MERCADO

Você já teve professores(as) negros(as) Qual sua situação econômica


em seu curso de Design? no momento?

A maioria, 61,6%, disse nunca ter tido professores negros em 70,1% das pessoas entrevistadas dizem estar trabalhando
seu curso de Design. como designers, empregadas ou autônomas. Já o número de
estudantes ou profissionais de design negras e negros que
estão em situação de desemprego é de 22,6%, quase o dobro
da taxa de desempregados no Brasil, que está em 12,4%*.

42,1%

61,6% Não
28%
22,6%
7,4% Empregado(a) como designer.
Sim Designer autônomo(a).
Desempregado(a).
38,4% Empregado(a) ou autônomo(a),
mas não como designer.

*Dados do 3° trimestre de 2017 da Pesquisa Nacional


de Amostra por Domicílios (Pnad) Contínua Mensal, IBGE.

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Mapeamento de Designers Negros/as 2017

MERCADO

Você já sentiu algum desconforto em uma


entrevista de emprego por ser negro(a)?

Quase metade das pessoas entrevistadas disseram já ter


sentido algum desconforto em uma entrevista de emprego
por ser negro ou negra.

53,2%
Não
Sim

46,8%

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Mapeamento de Designers Negros/as 2017

Como designer, você já teve empreendedores(as)


Designers, mercado negros(as) como clientes?

e comunidade negra NUNCA tive 50,1%

51% dos empreendedores no Brasil são SIM, JÁ tive


pessoas negras. Por que nosso design 49,9%
não está à serviço dessas empresas?

Como você identifica racialmente a MAIORIA


Três perguntas feitas na pesquisa nos dão um panorama da dos seus clientes?
relação dos designers negros e negras com a própria comunidade
negra, levando em conta a importância e as especificidades dessa Brancos 91%
profissão e o retorno que esses designers trazem à comunidade. Negros 7%
Outros 2%
50,1%* dos designers negros NUNCA tiveram clientes negros.
80%* NUNCA tiveram pessoas negras como líderes nas Nas empresas em que trabalhou como designer, você
empresas em que trabalharam como designers. já teve líderes negros(as)??
91%* dos designers negros trabalham, na maioria das vezes ou
sempre, somente com clientes brancos.
20%
NUNCA tive
SIM, JÁ tive
* Excluídas as pessoas que disseram ainda não atuar 80%
profissionalmente.

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Esses dados repetem uma realidade triste que pode ser verificada Segundo o estudo, apesar da enorme desigualdade de renda em
em todas as atividades econômicas de alto valor de mercado. Nós, comparação com os brancos, o povo negro no Brasil tem uma
designers, trazemos de volta para a comunidade negra pouco ou renda somada de R$1,6 trilhão. Onde vai parar todo esse
nenhum retorno, além daquele imediato gerado pela renda que dinheiro? A resposta é óbvia: nos empreendimentos e bolsos
ajuda nossas famílias pontualmente. Deixamos nossa comuni- brancos, já que, como consumidores, quase sempre compramos
dade, adentramos espaços elitizados e brancos, como a universi- de brancos, e, como designers, ajudamos quase sempre somente
dade e o mercado de design, mas não para nos qualificarmos e empresas brancas com tudo o que o design pode oferecer.
trazermos de volta recursos e conhecimento de forma estratégica
para fortalecer a comunidade. O valor que geramos para os clien- Se acreditamos realmente que o design tem o poder de transfor-
tes ou empresas brancas onde trabalhamos, em recursos materi- mar, porque não trazemos de volta para nossa comunidade todo
ais e imateriais, é muito maior do que a baixa remuneração que o conhecimento e habilidades que adquirimos para gerar opor-
trazemos de volta para casa. tunidades de projetos e negócios, melhorar a qualidade dos
nossos empreendimentos, estimular a criação de emprego e
Em outras palavras, é o que mostram os dados: estudamos, aumento de renda, fortalecendo a comunidade economica-
trabalhamos e nos desenvolvemos profissionalmente para servir mente? Não precisamos parar de trabalhar em empresas brancas
aos brancos, aumentar os lucros do brancos, melhorar as empre- ou de ter clientes brancos. Mas, se queremos enfrentar o abismo
sas dos brancos, oferecer todos os benefícios do design aos econômico criado pelo racismo nos qualificando profissional-
empreendimentos brancos e tira-los da crise, e nossa comunidade mente, deveríamos planejar nossos projetos de design, e até
fica com a sobra, com as migalhas de nossa condição profissional. nossa carreira, mais estrategicamente, buscando um desenvolvi-
mento individual que também nos fortaleça como coletividade.
Quem é a comunidade negra?

Atualmente, o povo negro no Brasil representa 55% da população Robin Batista


- somos maioria. Também somos 51% dos empreendedores do AY Ò B Í / A F R O G U E R R I L H A
país. "Se a população negra brasileira (112 milhões) formasse um
país, seria o 11° maior país do mundo", diz Renato Meirelles, presi-
dente do instituto de pesquisa Locomotiva, que realizou o estudo
O Desafio da Inclusão.

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