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Embora se reconheça que a estratégia empresarial é um meio

ESTRATÉGIA EMPRESARIAL
que contribui para que as organizações atinjam seus objetivos,
esse não é um conceito tão simples de ser aplicado no dia a dia das
empresas. Considerando que toda organização está inserida em
um contexto que é composto de uma série de desafios e oportuni-
dades, o primeiro passo para desenvolver uma estratégia empresa-
rial de sucesso é conhecer esse contexto e avaliar se a organização
está preparada para atuar e competir nele.
Não há uma estratégia empresarial melhor ou pior. O que pode
ser argumentado é que existe um alinhamento estratégico mais
ou menos adequado ao contexto empresarial. Portanto, o objetivo
deste livro é apresentar ao leitor uma maneira holística de como as
empresas podem interpretar o ambiente no qual estão inseridas e,
com isso, estabelecer uma dinâmica interna de atuação.

TOMAS S. MARTINS

Código Logístico Fundação Biblioteca Nacional


ISBN 978-85-387-6560-8

59046 9 788538 765608


Estratégia Empresarial

Tomas S. Martins

IESDE BRASIL
2020
© 2020 – IESDE BRASIL S/A.
É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito do autor e do
detentor dos direitos autorais.
Projeto de capa: IESDE BRASIL S/A. Imagem da capa: Envato Elements

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO


SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
M347e

Martins, Tomas S.
Estratégia Empresarial / Tomas S. Martins. - 1. ed. - Curitiba [PR] :
IESDE, 2020.
154 p. : il.
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-387-6560-8

1. Administração de empresas. 2. Planejamento empresarial. 3. Plane-


jamento estratégico. I. Título.
CDD: 658.4012
20-62143
CDU: 005.51

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IESDE BRASIL S/A.


Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200
Batel – Curitiba – PR
0800 708 88 88 – www.iesde.com.br
Tomas S. Martins Doutor e mestre em Administração de Empresas pela
Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR).
Especialista em Gestão Empresarial pela FAE Business
School. Graduado em Letras pela Universidade Federal
do Paraná (UFPR) e em Direito pela Unicuritiba.
Consultor e mentor de uma rede de consultores
voltada à estratégia, ao marketing, à inovação e à
aprendizagem organizacional. Professor da área de
Marketing da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e
coordenador do Marketing Lab, um espaço de inovação
para o desenvolvimento de projetos experienciais
com base em uma metodologia de educação
empreendedora denominada Teamacademy. Autor de
livros e artigos acadêmicos nas áreas de estratégia e
de marketing.
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SUMÁRIO
1 Fundamentos da estratégia  9
1.1 Estratégia e sua história   10
1.2 Conceitos estratégicos   23
1.3 Desenhando a estratégia empresarial  29

2 Diagnóstico estratégico: objetivos e propósito empresarial  37


2.1 Diagnóstico estratégico   37
2.2 O ambiente externo   39
2.3 O ambiente interno   47
2.4 Propósito organizacional e objetivos estratégicos   54

3 Posicionamento e valor sustentável  65


3.1 Estratégias competitivas genéricas   66
3.2 Estratégias de negócios   72
3.3 Geração de valor e vantagem competitiva sustentável   84

4 Planejamento estratégico e governança  91


4.1 Os planejamentos estratégico, tático e operacional   91
4.2 Governança corporativa   98

5 Ética, responsabilidade social corporativa e sustentabilidade  112


5.1 Ética e gestão estratégica   113
5.2 Responsabilidade social corporativa e estratégia   118
5.3 Sustentabilidade   123

6 Estratégia aplicada a produtos e serviços  130


6.1 Estratégia de produtos e serviços   131
6.2 Desenvolvimento de novos produtos e serviços   142
6.3 Inovação estratégica   147
Vídeo
APRESENTAÇÃO
Embora se reconheça que a estratégia empresarial é um
meio que contribui para que as organizações atinjam seus
objetivos, esse não é um conceito tão simples de ser aplicado
no dia a dia das empresas. Considerando que toda organização
está inserida em um contexto que é composto de uma série de
desafios e oportunidades, o primeiro passo para desenvolver
uma estratégia empresarial de sucesso é conhecer esse
contexto e avaliar se a organização está preparada para atuar
e competir nele.
Não há uma estratégia empresarial melhor ou pior. O que
pode ser argumentado é que existe um alinhamento estratégico
mais ou menos adequado ao contexto empresarial. Portanto,
o objetivo deste livro é apresentar a você, leitor, uma maneira
holística de como as empresas podem interpretar o ambiente
em que estão inseridas e, com isso, estabelecer uma dinâmica
interna de atuação.
Desse modo, esta obra foi organizada em capítulos que
estabelecem um passo a passo de como definir e propor ações
estratégicas efetivas. Começamos nossa jornada com uma
evolução histórica e conceitual para posicionar o leitor a respeito
do que existe de mais contemporâneo na área da estratégia.
Em seguida, estabelecemos parâmetros e técnicas de
como fazer um diagnóstico estratégico do ambiente externo
e interno. Com o diagnóstico em mãos, uma organização
poderá determinar seus objetivos e uma posição desejada no
ambiente empresarial. Depois, o foco está em como desenhar
e implementar um plano para atingir os objetivos estratégicos e
desenvolver a vantagem competitiva.
Esse processo de planejamento e implementação requer
que ações definidas sejam colocadas em prática. Assim
abordaremos, em primeiro lugar, como estabelecer um sistema
de governança dessas ações. Em seguida, propomos uma
discussão sobre ética, sustentabilidade e responsabilidade
social em torno das ações estratégicas. Para finalizar, analisamos
a prática de todo processo estratégico por meio dos produtos e serviços
oferecidos pela empresa.
Em suma, esta obra traz as informações básicas para a compreensão
geral sobre estratégia empresarial e destina-se tanto a estudantes quanto a
pessoas que querem colocar em prática mudanças em suas vidas.
Bons estudos!

8 Estratégia Empresarial
1
Fundamentos da estratégia
Podemos definir estratégia genericamente como o conjunto de
ações adotadas por um indivíduo ou uma organização para criar
uma relação dinâmica com o ambiente onde está inserido(a). Por
exemplo, ao pensar em fazer uma viagem de aventura pelo Caminho
de Santiago de Compostela, na Espanha, você deve primeiramente
olhar para si, analisar sua forma física, seus recursos financeiros,
seu tempo e seu estado de espírito. Tendo isso em vista, você deve
estudar o ambiente externo, ou seja, para onde vai, a geografia, a
topografia, o clima e a cultura do local. Com esses dados, você pode
começar a traçar um plano com base em ideias e ações que o levem
ao seu objetivo final.
Uma organização, de modo semelhante, ao planejar o lançamento
de um novo produto ao mercado, também deve olhar para si e
para seus recursos humanos, financeiros, estruturais, tecnológicos
e organizacionais e, após essa análise interna, deve considerar seu
entorno, isto é, seu ambiente externo, composto de consumidores,
concorrentes, governo, economia e sociedade em geral. Por meio
dessas informações internas e externas, a organização propõe um
conjunto de ações que a levem ao melhor alinhamento entre o novo
produto a ser lançado e o contexto do lançamento.
Assim, um bom estrategista é curioso, está sempre buscando
dados e informações sobre sua organização e seu ambiente externo,
não é necessariamente o mais analítico ou o mais criativo, mas é
quem consegue, coletivamente, absorver, disseminar e usar as
informações para promover o melhor encaixe entre a organização
e seu ecossistema. Desse modo, para que você esteja habilitado
a desenvolver estratégias de sucesso pessoal ou organizacional, é
fundamental conhecer os principais conceitos da estratégia, sua
história e suas etapas de aplicação.

Fundamentos da estratégia 9
1.1 Estratégia e sua história
Vídeo
Como vivemos em um ambiente muito dinâmico, agitado e competitivo,
os gestores estão estrategicamente focados no presente, que, obviamen-
te, oferece lições importantes. No entanto, para desenhar e desenvolver
a estratégia de maneira sustentável e colocá-la em prática por meio de
etapas intelectual e pragmaticamente concebidas, é essencial que você
conheça a história do pensamento estratégico e seu efeito nos principais
conceitos sobre esse tema.

Ignorar as lições históricas pode levar a erros estratégicos que pode-


riam ter sido facilmente evitados. A história da gestão estratégica remonta
há milhares de anos e, entendendo o passado, um gestor pode adquirir
grande conhecimento acerca da estratégia. Assim, primeiramente, vamos
voltar a duas fontes de sabedoria estratégicas: estratégia nos tempos an-
tigos e estratégia militar.

De acordo com Gavetti e Rivkin (2007), a estratégia, definida nos dias


de hoje, teve origem na China antiga, com o estrategista e filósofo Sun Tzu,
em seu livro A arte da guerra, escrito entre os anos 320 a 400 a.C. Tzu (2015)
enfatizou os aspectos criativos e conceituais da estratégia, dos quais des-
tacamos quatro e refletimos sobre sua contemporaneidade:

Lyudmyla Kharlamova/Shutterstock
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de serem previstas ou
imitadas.

10 Estratégia Empresarial
Podemos perceber a influência desses ensinamentos até os dias
atuais. A afirmação de Tzu (2015) sobre conhecer o inimigo está rela-
cionada a compreender o ambiente externo no qual a organização está
inserida. Por meio desse conhecimento, a organização elabora sua es-
tratégia, que deriva de táticas de atuação. Segundo o autor, não há pos-
sibilidade de uma tática apresentar resultado sem uma estratégia bem
definida. Ainda, ao elaborar sua estratégia, uma organização fará uma
combinação múltipla de seus recursos para atingi-la.

Com base nos ensinamentos de Tzu (2015), conflitos e eventos mi-


litares moldaram o entendimento conceitual da estratégia que, por
sinal, tem sua raiz etimológica na guerra. O verbo grego strategós signi-
fica líder do exército e o termo estratego significa derrotar um inimigo
+ Saiba mais
usando os recursos eficaz e eficientemente (GAVETTI; RIVKIN, 2007).
Segundo a mitologia grega,
Entre os exemplos mais famosos de estratégia nos tempos antigos durante a Guerra de Tróia, os
estão a história do cavalo de Troia e a obra O Príncipe, escrita há quase soldados gregos construíram
um cavalo gigante de madeira,
500 anos por Nicolau Maquiavel e considerada por muitos um marco dentro do qual se esconderam,
no conceito de estratégia por basicamente oferecer, para políticos, re- e o deram como forma de
presente aos troianos, que o re-
ceitas inteligentes fundadas em desonestidade e manipulação, tanto
ceberam para dentro da cidade
que a palavra maquiavélico é usada hoje para se referir a atos de enga- de Troia. No entanto, quando
no e manipulação. a noite chegou, os soldados
gregos saíram de dentro do
A estratégia não é manipulação, mas é importante para o estrate- cavalo e abriram os portões para
gista perceber se o ambiente onde está inserido é formado por atores seu exército, vencendo, assim,
facilmente a batalha.
que distorcem a informação e a realidade, levando-o a tomar decisões
estratégicas equivocadas (BRACKER, 1980).

Segundo Bracker (1980), a figura militar com maior impacto na es-


tratégia foi Carl von Clausewitz (1780-1831), um general prussiano cujo
trabalho intitulado Da guerra (1984) focou dois aspectos estratégicos: “o
que é guerra?” e “para que ela serve?”. Kornberger e Engberg-Pedersen
(2019) afirmam que Clausewitz via a guerra como um duelo entre duas
mentes independentes. A chave da estratégia de Clausewitz era sem-
pre ser forte, primeiro no geral e, depois, no ponto decisivo. Enquanto a
filosofia chinesa orientava o uso da força mínima, com mais ênfase nos
truques, Clausewitz recomendava o uso da força máxima sempre que
possível. Kornberger e Engberg-Pedersen (2019) destacam dois ensina-
mentos de Clausewitz para reflexão:

Fundamentos da estratégia 11
Lyudmyla Kharlamova/Shutterstock
o se
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Planejamento e A co e há
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Segundo Kornberger (2013), esses conceitos representam a con-


temporaneidade do pensamento de Clausewitz. Uma organização que
Glossário tem uma estratégia bem desenvolvida consegue, por meio de suas
stakeholders: partes interes- ações, demonstrar para todos os stakeholders os seus princípios, valo-
sadas por qualquer decisão ou res e propósitos. Kornberger e Engberg-Pedersen (2019) enfatizam que
atividade de uma organização,
o pensamento de Clausewitz tem a guerra como contexto, no qual há o
por exemplo: fornecedores,
colaboradores, clientes ou argumento de que uma organização, ao colocar em prática seu plano,
investidores. irá se deparar com um ambiente mutável e não estático. Desse modo,
será fundamental que a sua estratégia seja implementada por meio de
um processo ágil e empreendedor.

Embora a gestão estratégica seja uma arte, não podemos deixar de


argumentar que também é uma ciência (TZU, 2015). A partir da Revo-
lução Industrial, com o surgimento das primeiras fábricas, a principal
preocupação da ciência da administração era melhorar os processos
de produção e a estrutura organizacional, visando maior eficiência.
Diante dessa necessidade, o conceito de estratégia evoluiu da área mili-
tar para um sentido organizacional amplo em diversas fases históricas,
representadas na linha do tempo e descritas a seguir.

12 Estratégia Empresarial
Figura 1
Linha do tempo da evolução conceitual da estratégia

FASE 1 (1950-1960)
Planejamento e metas

FASE 2 (1960-1970)
Planejamento estratégico

FASE 3 (1970-1975)
Estratégia corporativa

FASE 4 (1975-1985)
Estratégia competitiva

FASE 5 (1985-1995)
Recursos, capacidades e competências

FASE 6 (1995-2000)
Implementação estratégica e inovação

FASE 7 (2000-2010)
Novos modelos de negócios

FASE 8 (2010-)
Releitura da vantagem competitiva

Fonte: Elaborada pelo autor.

Fase 1: Planejamento e metas (1950-1960)

Um dos primeiros indivíduos responsáveis ​​pelo desenvolvimento


e pela implementação da estratégia no cenário dos negócios foi Al-
fred Sloan (1875-1966), executivo da General Motors de 1923 a 1955,

Fundamentos da estratégia 13
que, com Peter Drucker, chegou à conclusão de que as empresas mais
bem-sucedidas eram centralizadas e boas devido ao estabelecimento
de metas. Assim, evoluíram o conceito de estratégia para um planeja-
mento com base em metas que devem ser controladas. Com o con-
trole das metas, é possível ajustar as ações de maneira estratégica
(MILLER; DESS, 1996).

Essa fase é importante para o conceito atual da estratégia empre-


sarial porque estabelece um elemento fundamental: a necessidade de
metas, que são objetivos mensuráveis. Por exemplo, você pode ter o ob-
jetivo de emagrecer. Uma meta derivada desse objetivo seria emagrecer
dez quilos até o final do ano. Assim, ao final do prazo estabelecido, você
pode medir se atingiu a meta e, caso não a tenha atingido, analisar os
motivos do fracasso e planejar novamente com base neles.

Fase 2: Planejamento estratégico (1960-1970)

Os anos 1960 representam a entrada da estratégia na comunidade


acadêmica e empresarial. Alfred Chandler Jr. (1918-2007) foi o primeiro
pesquisador acadêmico de estratégia de negócios e publicou, em 1962,
um trabalho de referência intitulado Strategy and structure, no qual ana-
lisou o comportamento histórico das grandes empresas americanas e
descobriu que a estrutura segue a estratégia.

Para Chandler Jr. (1962), que oferece uma das primeiras definições
de estratégia no contexto de negócios, estratégia é determinar objeti-
vos e metas de longo prazo e alocar recursos necessários para atingi-las
por meio de um conjunto de ações. A popularidade do planejamento
corporativo nos anos 1960 gerou departamentos de planejamento en-
carregados de previsão, tomada de decisões de investimento e criação
de planos de longo prazo (cinco a dez anos).

Em 1965, Igor Ansoff (1918-2002) escreveu o primeiro livro especí-


fico sobre estratégia de negócios, denominado Estratégia corporativa.
Ansoff (1965) demandava que o processo estratégico fosse formalizado
por meio de procedimentos detalhados, incluindo o uso de listas de
verificação de objetivos e avaliação de alocação de recursos.

Essa fase é importante para os conceitos atuais porque introduz


algumas ferramentas de diagnóstico estratégico, como a matriz Swot
(strengths, weaknesses, opportunities e threats), que identifica as forças,
fraquezas, oportunidades e ameaças no planejamento estratégico; e a
análise Pestel, que estuda os fatores políticos, econômicos, sociais, tec-

14 Estratégia Empresarial
nológicos, ecológicos e legais do ambiente onde a organização está in-
serida. Com base no diagnóstico, conforme Ansoff (1965), cenários são
criados, a estrutura organizacional é avaliada e o planejamento estra-
tégico é desenvolvido. Por exemplo, se você administra uma empresa
de software, deve analisar a evolução tecnológica do setor, a legislação
atual e as tendências sociais e políticas para criar um cenário futuro.
Com o cenário criado e os recursos disponíveis, você poderá definir a
estratégia para sua empresa, ou seja, em qual mercado irá atuar, quais
tipos de software irá desenvolver e para quem irá vender.

Fase 3: Estratégia corporativa (1970-1975)

Bruce Henderson (1915-1992) fundou, em 1963, a empresa de con-


sultoria de gestão Boston Consulting Group (BCG). Uma das contribui-
ções dessa empresa é a Matriz BCG, uma matriz de crescimento versus
mercado, que avalia a taxa de crescimento deste em relação à partici-
pação de mercado dos produtos da empresa. Essa abordagem levou
as organizações a adotarem o planejamento de portfólio, em que a
empresa literalmente insere seus produtos e/ou unidades de negócios
nessas matrizes BCG para avaliar suas respectivas contribuições (HAM-
BRICK; MACMILLAN; DAY, 1982).

A contribuição dessa fase para a evolução do pensamento estra-


tégico foi a consideração das unidades de negócios e seus produtos
de maneira independente, mas conectados por uma estratégia – um
guarda-chuva – que considera a atuação isolada de cada iniciativa e
contribui para os resultados de uma estratégia superior, chamada de
estratégia corporativa. Nesse nível estratégico, a organização faz esco-
lhas dentre seus negócios e produtos para alocar ou desinvestir seus
recursos. Por exemplo, uma corporação com três unidades de negó-
cios pode atribuir ênfase ao crescimento de um deles usando os outros
dois para sustentá-lo.

Fase 4: Estratégia competitiva (1975-1985)

Essa fase do desenvolvimento está atrelada à perspectiva da econo-


mia industrial, introduzida ao contexto empresarial por Michael Porter
(1947-). De acordo com Porter (2004), a estrutura dos setores em que
a empresa compete e a sua posição competitiva dentro desses setores
são as principais determinantes de desempenho. Dessa maneira, o au-
tor foca a análise da indústria (conjunto de empresas em um mesmo
setor econômico, como a indústria hoteleira) e a concorrência. As em-

Fundamentos da estratégia 15
presas começaram a examinar mais de perto suas opções dentro do
seu setor, mercados, segmentos e posicionamento dentro desses seg-
mentos. O trabalho de Porter (2004) impulsionou a análise da indústria
e da concorrência por meio de um modelo denominado As cinco forças
competitivas, que avalia uma empresa com base em sua posição em
relação a cinco fatores:

1 Entrantes potenciais no mercado, isto é, empresas que


podem se tornar concorrentes a qualquer momento.
2 Ameaça de produtos ou serviços substitutos que podem ser
usados ​​no lugar dos serviços que a empresa oferta.
3 Poder de barganha dos compradores (clientes), ou seja, a sua
força de negociação na relação.
4 Poder de barganha dos fornecedores.
5 Concorrência atual do setor, como a rivalidade entre
empresas existentes.

Ao observarmos a posição de nossa empresa dentro de um grupo es-


pecífico de concorrentes e do ambiente externo, podemos analisar com
mais exatidão as informações e definir o conjunto focado de ações estra-
tégicas em busca de uma posição específica. Desse modo, a contribuição
dessa fase decorre do entendimento da dinâmica competitiva, não do
mercado em geral, mas de um contexto mais íntimo que tem impacto
direto em nossa organização.

Por um lado, os meios de comunicação estão sempre tratando de


tendências econômicas positivas ou negativas que moldam o otimismo
dos empresários como se fosse algo genérico. Porter (2004), por outro,
afirma que a tendência positiva ou negativa é relativa. Para o autor, o
significado é diferente para cada setor, assim, um empresário não deve
moldar sua estratégia com base em uma informação genérica, mas na
dinâmica competitiva, considerando o ponto de vista dos seus consu-
midores, fornecedores, concorrentes, novos entrantes e substitutos. A
Kodak, por exemplo, foi uma das maiores empresas do mundo e tinha a
base de sua atuação centrada na produção de filmes para máquinas fo-
tográficas. Essa empresa quase faliu porque não percebeu que substitu-
tos como as máquinas digitais, primeiramente, e depois os smartphones,
tornaram seu principal produto obsoleto.

16 Estratégia Empresarial
Fase 5: Recursos e competências (1985-1995)

A busca de vantagem competitiva sai de uma referência externa para


dentro da empresa. Prahalad e Hamel (1994) introduziram o termo com-
petências essenciais para representar as fontes de vantagem competiti-
va inerentes à empresa. Eles definem competências essenciais como um
conjunto de habilidades que permitem à empresa fornecer um benefício
específico aos seus clientes. O fornecimento de vantagens competitivas
de dentro da empresa para fora segue a Visão Baseada em Recursos
(VBR), que se concentra na capacidade de diferenciação proporcionada
pelos ativos e aptidões da empresa. Barney (1991) argumenta que, para
serem transformados em vantagens competitivas sustentáveis, os recur-
sos devem ser de grande valor, escassos e difíceis de copiar e substituir.

A visão proporcionada por esse pensamento estratégico é completa-


mente diferente do que a história tinha nos revelado até o momento. Em
todas as fases anteriores, a dinâmica estratégica era de fora para dentro,
ou seja, o ambiente competitivo nos impõe uma série de circunstâncias
que nos leva a avaliar nossas alternativas. Nessa escola do pensamento
(VBR), o essencial é olhar para dentro e desenvolver recursos e capaci-
dades especiais para proporcionar posições competitivas vantajosas no
ambiente. Uma pequena empresa, por exemplo, molda sua estratégia
por meio dos recursos que tem disponíveis. Provavelmente, ela não con-
seguirá executar uma estratégia de marketing digital abrangente e global,
mas poderá, com seu conhecimento e recurso financeiro limitado, de-
senvolver uma estratégia de marketing digital apoiada em um relaciona-
mento direto com seu público por meio de suas mídias sociais.

Fase 6: Implementação estratégica e inovação (1995-2000)

A importância da inovação estratégica aparece em um contexto de


aplicação da tecnologia ao processo estratégico. As empresas começa-
ram a perceber que garantir uma vantagem competitiva sustentável
é impossível. O objetivo se torna, então, explorar fontes dinâmicas de
vantagem competitiva que possam financiar a próxima “onda de inova-
ção”. Nesse contexto, Teece, Pisano e Shuen (1997, p. 516) argumentam
que uma organização necessita de capacidades dinâmicas para compe-
tir, com “capacidade de integrar, construir e reconfigurar competências
internas e externas para lidar com ambientes em rápida mudança”.

O conceito de Teece, Pisano e Shuen (1997) surge de uma falha


da VBR, que ignora fatores em torno dos recursos. Segundo os auto-

Fundamentos da estratégia 17
res, os recursos são desenvolvidos, integrados à empresa e usados
de uma maneira diferente. As capacidades dinâmicas adotam uma
abordagem processual – um elo dinâmico entre os recursos da em-
presa e o ambiente de negócios. Elas ajustam constantemente o mix
de recursos da empresa e, assim, mantêm a sustentabilidade da van-
tagem competitiva.

Outro aspecto da estratégia de negócios que recebeu importante


atenção nessa época foi o processo de implementação da estratégia,
visto que, mesmo que bem concebida, se não for implementada, ela
é irrelevante.

Uma ferramenta de implementação, o Balanced Scorecard (BSC),


foi introduzida por Kaplan e Norton (1997), dois professores de
Harvard que acreditam que a estratégia deve ser medida por meio
de indicadores que orientam o seu ajuste no decorrer do tempo. É
uma ferramenta de equilíbrio estratégico, pois fornece uma estrutura
para avaliar o potencial de criação de valor da estratégia sob quatro
perspectivas diferentes:

1 Financeiro: estratégia de crescimento, rentabilidade e risco


pela perspectiva do acionista.
2 Cliente: estratégia de criação de valor e diferenciação pela
perspectiva do cliente.
3 Processos internos: prioridades estratégicas para os
processos internos da empresa que criam a satisfação do
cliente e do acionista.
4 Aprendizado e crescimento: prioridades para criar um clima
entre os colaboradores a fim de apoiar a organização na
mudança, na inovação e no crescimento.

Desse modo, entendemos que o aprendizado durante o proces-


so é muito importante para ajustar a estratégia constantemente. Por
exemplo, os aplicativos de transporte pessoal revolucionaram a mo-
bilidade urbana, mas quando começaram a ser utilizados no Brasil
só aceitavam cartão de crédito, o que limitou muito sua atuação. Os

18 Estratégia Empresarial
executivos dessas empresas mediram o potencial do mercado brasi-
leiro e realizaram uma série de pesquisas para entender o que não
estava funcionando. Quando perceberam que era necessário aceitar
pagamentos em dinheiro, mudaram rapidamente sua estratégia e se
tornaram líderes de mercado. O interessante é que esse aprendizado
no Brasil os levou a adotar a mesma estratégia na Índia, que resultou
em sucesso expressivo.

Fase 7: Novos modelos de negócios (2000-2010)

Para Christensen et al. (2016), o foco dessa fase é a estratégia de de-


senvolvimento de novos produtos em ambiente empresarial, que cria,
customiza e desenvolve produtos constantemente. Moore (1991 apud
WANI; ALI, 2015) estabeleceu uma regra de adoção de novos produtos,
fundamentada em grupos de usuários e o estágio de adoção da tecno-
logia. Segundo ele, há cinco grupos:
•• Entusiastas: são considerados apaixonados por tecnologia e no-
vidades, assim, são os primeiros que adotam a novidade.
•• Visionários: percebem a tecnologia com uma oportunidade para
obter ganhos competitivos.
•• Pragmáticos: adotam a tecnologia quando se sentem seguros,
com base em um processo de validação dela.
•• Conservadores: duvidam das vantagens trazidas pela nova tec-
nologia e não gostam de algo que lhes dê trabalho.
•• Céticos: não acreditam nas novas tecnologias e são saudosistas
– apegados ao passado.

Independentemente da etapa, uma empresa deve ter a preocupa-


ção em desenvolver novos produtos o tempo todo para que atendam
aos diferentes usuários.

A figura a seguir demonstra visualmente o processo estabelecido


por Moore (1991).

Fundamentos da estratégia 19
Figura 2
Ciclo de adoção de novos produtos pelos consumidores
Mercado Inicial Mercado Principal
Receita

O Abismo
13,5% (the chasm) 34% 34% 16%
2,5%

Entusiastas Visionários Pragmáticos Conservadores Céticos


A maioria inicial A maioria tardia Os retardatários
Os que adotam no inicio (early adopters)

Tempo
Fonte: Adaptada de Moore, 1991.

Conforme observamos na Figura 2, uma empresa só terá sucesso


com seu produto no momento em que conseguir “pular” o abismo e ter
os pragmáticos adotando sua oferta.

Para lidar com esse novo ambiente agitado e dinâmico, apenas a ino-
vação de produto não é suficiente. Muitas organizações dispendem uma
enorme quantidade de recursos em P&D (Pesquisa e Desenvolvimento),
que, muitas vezes, não resultam em produtos e serviços rentáveis. Um
dos motivos desse tipo de fracasso é a organização ser muito fechada e
não olhar para fora nem entender o ecossistema em que está inserida.

Assim, ao operar nesse ambiente de negócios, volátil e instável, é


importante contar com a ajuda de parceiros para inovar. Chesbrough,
Vanhaverbeke e West (2006) propõem um modelo de inovação aberta,
no qual a empresa está disponível a colaborar com outras instituições
e organizações externas durante seu processo estratégico. Um mode-
lo concebido dessa maneira torna a organização menos suscetível ao
fracasso, uma vez que é mais orgânico e menos prescritivo. Segundo
Taleb (2007), eventos importantes e altamente improváveis fazem com
que as organizações devam se concentrar nas consequências da sua
tomada de decisão em vez da probabilidade de algo acontecer.

A agilidade e a inserção orgânica da organização no ecossistema em-


presarial dependem de um modelo de negócios que possa ter um efeito

20 Estratégia Empresarial
rápido e contínuo, ou seja, não se trata mais de analisar o cenário em
detalhes e investir muitos recursos para ter uma “certeza” de sucesso. O
ambiente atual requer que organizações operem por meio de ensaio e
1
erro com protótipos , que gerem aprendizagem antes de uma decisão 1
mais definitiva. Dessa forma, Osterwalder e Pigneur (2010) criaram o Protótipo é uma versão inicial de
Business Model Canvas, uma ferramenta visual para o desenvolvimento um produto criado para testar
um conceito ou processo. Assim,
e a avaliação de como a empresa deseja criar valor para seus clientes. antes de fazer um investimento
enorme em algo, você terá
Por exemplo, você não fará um plano de negócios ou planejamento
resultados preliminares que
estratégico formal, pois isso levará muito tempo, consumirá muitos re- guiarão suas decisões com mais
cursos e, provavelmente, quando você colocá-lo em prática, o mercado assertividade.
já terá mudado. Logo, você deverá visual e rapidamente montar um pla-
no que identifique fontes de receita, mostre a base de clientes-alvo, os
produtos e como gostaria de se relacionar com eles. Se você pensa em
cervejaria artesanal, comece montando um esquema rápido de como
seria diferente e lucraria com isso. Você perceberá que é um ambiente
muito concorrido e com pouca chance de fazer algo diferente, assim, tal-
vez, seu modelo esteja na distribuição de cervejas artesanais para bares
e restaurantes. Porém, antes de fazer uma megaoperação, monte um
protótipo com um ou dois clientes e teste para ver se dá certo. Com base
nos dados do seu protótipo, reconfigure seu negócio.

Fase 8: Releitura da vantagem competitiva (2010-)

McGrath (2013) argumenta que os conceitos tradicionais de estra-


tégia precisam de atualização, pois a vantagem competitiva agora é a
exceção, não a norma. Segundo a autora, a vantagem transitória é a
nova norma, como podemos analisar na Figura 3.

Figura 3
Vantagem competitiva transitória

Retorno

Lançamento Crescimento Exploração Reconfiguração


Desengajamento

Fonte: Adaptada de McGrath, 2013.

Fundamentos da estratégia 21
Conforme observamos na Figura 3, sua estratégia, se bem-sucedida,
lhe proporcionará um crescimento alto em um primeiro momento e
um retorno consistente em uma segunda fase, que é a sua vantagem
competitiva temporária. Desse modo, você deve aproveitar essa fase
para planejar a reconfiguração da estratégia. Se o processo de reconfi-
guração for bem realizado, você terá um novo lançamento e uma nova
fase de crescimento.

A estratégia, tradicionalmente, como vimos desde os primórdios


até a Fase 6, busca vantagem competitiva, seja por meio de uma boa
análise de cenários ou da manutenção e desenvolvimento de uma
boa base de recursos. À medida que as ações fossem tomando efei-
to no ambiente, a organização naturalmente iria ter vantagens oriun-
das de sua estratégia sobre seus concorrentes por um bom tempo.
McGrath (2013) afirma que o retorno oriundo da vantagem conse-
guida por um período de tempo não é mais sustentável. Segundo a
autora, rapidamente os concorrentes adquirem recursos similares ou
melhores que o seu e começam a oferecer soluções melhores e mais
baratas que a sua. Assim, o essencial para a estratégia da Fase 8 é a
capacidade de reconfiguração apoiada no ganho temporário que uma
organização pode vir a ter.

O maior desafio que os líderes empresariais enfrentam hoje é per-


manecer competitivo em meio a constantes turbulências e disrupção
(KOTTER, 2014). Uma empresa que passa pelo estágio inicial do seu
ciclo de vida é geralmente otimizada em termos de eficiência, mas não
em agilidade estratégica, ou seja, na capacidade de capitalizar opor-
tunidades e evitar ameaças com rapidez e segurança. Ao se otimizar
para eficiência operacional, uma empresa geralmente constrói estru-
turas hierárquicas e processos organizacionais que não conseguem
lidar com o mundo em movimento. Com isso, segundo Kotter (2014),
é necessário que as estratégias atuais possam identificar riscos e opor-
tunidades com antecedência e formular iniciativas estratégicas criati-
vas com agilidade, implementando-as rapidamente. Para tanto, o autor
sugere um sistema operacional, dedicado ao design e à implementação
da estratégia, que usa uma estrutura ágil e avalia continuamente os
negócios, o setor e a organização, reagindo com maior agilidade, velo-
cidade e criatividade do que o existente.

Na atualidade, existem dois fenômenos destinados a transformar


as organizações: globalização de mercados e digitalização de ativida-

22 Estratégia Empresarial
des. Ambos estão tendo grande impacto nas empresas e gerando um
grande número de teorias e modelos estratégicos. Contudo, ainda não
é possível saber quais desses modelos são modismos e quais serão
capazes de resistir ao tempo em sua utilidade estratégica.

1.2 Conceitos estratégicos


Vídeo Com base na construção histórica apresentada anteriormente, en-
tendemos que, embora seja um conceito amplo e complexo, a estraté-
gia pode ser genericamente definida como um conjunto de decisões
tomadas para atender aos objetivos da organização. Em outras pala-
vras, é um plano mestre abrangente que indica como a organização
cumprirá sua missão e atingirá seus objetivos.

Mintzberg (1987) identificou os 5 Ps da estratégia. Ela pode ser


uma perspectiva, um plano, um padrão, uma posição ou uma mano-
bra (ploy):
1 Estratégia como perspectiva é um conceito genérico e abrangente.
Está relacionado com o propósito da organização, ou seja, é uma
direção, uma noção do que a organização quer ser. Esse conceito
abrange a visão, a missão e os valores de uma empresa. Por
exemplo, uma empresa que existe para promover o bem social
para comunidades carentes pode ter como seu objetivo genérico
ser a maior organização não governamental do Brasil respeitando
seus valores de reciprocidade, amor e atenção.
2 Estratégia como posição está na decisão da empresa de oferecer
determinados produtos ou serviços em mercados específicos.
Em outras palavras, significa encontrar uma posição no ambiente
que resulte em algum tipo de vantagem perante os concorrentes.
A título de exemplo, percebemos que várias pessoas abrem
um negócio olhando para o sucesso dos concorrentes, assim
tendem a copiar o que acreditam ser a fonte de resultados
positivos deles. Ao fazer essa cópia do modelo de quem deu
certo, o empreendedor não está buscando uma posição para seu
negócio. Entender estratégia como posição é ocupar um espaço
não explorado por seus concorrentes. Você quer ser o que tem o
preço mais baixo? A melhor qualidade? A entrega mais rápida? O
melhor atendimento? Enfim, se posicionar é abrir mão de algumas

Fundamentos da estratégia 23
coisas e se colocar no mercado melhor que seus concorrentes
com relação a algumas características.
3 Estratégia como padrão é a forma que as ações são tomadas
consistentemente ao longo do tempo pela organização. Nesse
caso, a compreensão da estratégia e de sua forma ocorre com
base no olhar para o passado e a definição futura, com base
nesse olhar. Por exemplo, uma empresa baixa os preços de seus
produtos no fim do mês para girar seu estoque e percebe que
suas vendas aumentam consideravelmente nos cinco últimos
dias do mês. Assim, todo fim de mês baixa seus preços, gira o
estoque e melhora seu fluxo de caixa. A repetição dessa ação
acaba se tornando um padrão e vira uma estratégia da empresa.
Depois de um tempo, essa prática é incorporada sem uma
reflexão constante, o que a torna parte da estratégia.
4 Estratégia como plano é a determinação de um conjunto específico
de ações com base na concepção de um diagnóstico. Elaborar a
estratégia como plano é definir um conjunto de ações (o quê?)
que serão realizadas por alguém (quem?) em determinado prazo
(quando?) e espaço (onde?) de uma maneira particular (como?)
por algum motivo (por quê?). Por exemplo, se você quiser
começar a fazer vendas on-line de seu produto, responda: O quê?
Construir um site. Onde? Em uma plataforma on-line. Por quê?
Porque o custo de varejo físico é muito alto. Quem? Contratar
Glossário uma empresa terceirizada. Quando? Até o fim de dezembro.
marketplace: palavra Como? Contratar uma empresa terceirizada para desenvolver o
originada dos termos em inglês site e expor os produtos em uma plataforma de marketplace.
market (mercado) e place
(lugar), que significa local – 5 Estratégia como manobra (ploy) tem como objetivo estabelecer
físico ou virtual – onde se faz manobras astuciosamente elaboradas para confundir o
comércio.
concorrente e superá-lo ao longo do tempo. Por exemplo, você
pode anunciar a entrada de um novo produto no mercado sem
que ele esteja finalizado para verificar se seus concorrentes têm
produtos similares.

Para fazermos uma reflexão e aplicação desses cinco conceitos, va-


mos observar o Estudo de caso a seguir.

24 Estratégia Empresarial
Estudo de caso
Vídeo
Você e sua família são proprietários de um restaurante que serve refeições por quilo em sua cidade há mais de dez
anos. É um negócio lucrativo que proporciona a vocês uma renda para viverem bem. Você abriu esse restaurante No vídeo Como grandes
líderes inspiram ação,
porque havia poucas opções de refeições rápidas e saudáveis na sua cidade e porque, desde criança, sempre teve
publicado pelo canal
vontade de empreender. Negócios familiares, pelo menos em seus estágios iniciais, se confundem muito com
TED, Simon Sinek, um
os princípios e valores familiares. Para você e sua família, a liberdade de escolha é muito importante para uma consultor de negócios
vida saudável e feliz. Com base nessa simples descrição, podemos dizer que sua estratégia como perspectiva é que se tornou conhecido
proporcionar à cidade uma escolha gastronômica simples, familiar, saudável e livre. Assim, todas as suas decisões e pelo público por meio
seus futuros empreendimentos giram e girarão em torno dessa perspectiva. de um dos dez vídeos
É claro que quando você abriu seu restaurante, fez uma análise da concorrência e dos hábitos alimentares dos mais vistos na plataforma
TED Talk, explica o seu
consumidores locais. Na época, e ainda hoje, você ocupa uma posição diferente dos outros com um foco em
modelo de negócios
alimentação saudável e caseira (ou familiar). Hoje em dia, existem outros restaurantes que prestam um serviço pa-
chamado Círculo de ouro.
recido com o seu, mas você conseguiu, nesses dez anos de atuação, manter sua posição com escolhas consistentes Vale assistir a esse vídeo
apoiadas em sua proposta inicial. e perceber que o seu
Essa consciência para manter sua posição competitiva e seus valores proporcionaram um padrão de decisões para propósito deve ser a es-
seu negócio. Por exemplo, você faz compras semanais de fornecedores que garantam a qualidade dos insumos com sência da sua estratégia.
um preço médio de mercado. Dessa forma, comprar produtos de qualidade com um preço de mercado garantindo Disponível em: https://www.you-
um estoque semanal faz parte do seu padrão estratégico. A soma dos padrões de decisão e atuação do seu tube.com/watch?v=qp0HIF3SfI4.
negócio se formaram com base na sua perspectiva para manter sua posição competitiva. Acesso em: 13 abr. 2019.
Quando você decidiu abrir o restaurante você precisou de crédito e, por isso, montou um plano de negócios e foi
até ao banco. O gerente do banco, analisando suas intenções e ações planejadas, viu potencial no empreendimento
e lhe concedeu o crédito necessário. Ao abrir o restaurante, você seguiu esse plano e, todos os anos, com sua Livro
família, revisa, adapta e incrementa ele para que, no ano seguinte, haja um crescimento por meio da sua posição. No livro Comece pelo por-
Muitos outros empreendedores, ao analisarem o sucesso de seu restaurante, tentam entrar no mercado para ocupar quê: como grandes líderes
sua posição. Os concorrentes locais também ajustam suas estratégias para “copiar” algumas coisas que você faz inspiram pessoas e equipes
bem. Você evita que seus concorrentes ou entrantes consigam oferecer uma solução igual a sua, ou muito parecida, a agir, o autor defende
com um custo mais baixo para os consumidores por meio de uma manobra de precificação dinâmica. Você que as organizações
iniciem sua comunicação
não tem um preço fixo por quilo, mas faz seu preço variar de acordo com a oferta do dia, a fidelidade do cliente,
com o “por quê?”, seguido
campanhas promocionais e parcerias locais. Dessa maneira, você observa os concorrentes e os leva a fazer ofertas
de “como?” e, finalmen-
com preço mais baixo, mas, talvez, insustentáveis para eles. Portanto, os afasta de sua posição. te, “o quê?”. A razão de
ser de uma empresa,
seu “por quê?” orienta
Com base no exemplo do restaurante, podemos concluir que a es- e inspira sua atividade
estratégica.
tratégia tem como referência uma rede complexa de pensamentos,
SINEK, Simon. Rio de Janeiro:
ideias, experiências, objetivos, conhecimentos, memórias, percepções
Sextante, 2018.
e expectativas, que fornecem orientações gerais para ações específicas
com o intuito de chegar a objetivos particulares.

O ambiente atual é muito dinâmico e incerto, o que dificulta a ope-


ração de qualquer empresa, mesmo a do nosso simples restaurante
familiar. Assim, para sobreviver, as organizações devem fazer a melhor
gestão possível, de maneira estratégica, para explorar as oportunida-
des possíveis e, ao mesmo tempo, alcançar um nível ótimo de eficiência,
minimizando as ameaças esperadas. Mas como fazer isso na prática?
Ao analisarmos a Figura 4, percebemos que a estratégia é o que ajusta
o ambiente interno ao externo, ou seja, o conjunto de ações que faz um

Fundamentos da estratégia 25
encaixe entre esses dois ambientes. Atualmente, conforme já mencio-
nado, o ambiente externo é um espaço temporal de mudança e trans-
formação constante, assim o conjunto de ações de uma organização é
profundamente dinâmico. Antigamente, em ambientes mais estáveis,
era possível se planejar estrategicamente para daqui dez anos. Hoje
em dia, mesmo o planejamento estratégico sendo algo de longo prazo,
isto é, cinco anos em média, é quase impossível que o plano inicial não
seja constantemente revisitado e ajustado.

Observe a figura a seguir, que apresenta como você pode alinhar


seu ambiente interno com o que acontece fora da organização por
meio da sua estratégia.

Figura 4
O alinhamento estratégico

Ambiente Interno Ambiente Externo


(Recursos)
• Sociedade
• Humanos
• Economia
• Materiais
Estratégia

• Governo
• Financeiros
• Consumidores
• Tecnológicos
• Fornecedores
• Conhecimento
• Concorrentes
• Estrutura
• Tecnologia
• Legislação

Fonte: Elaborada pelo autor.

Conforme a figura anterior, a estratégia está entre o ambiente inter-


no, que apresenta recursos, como a quantidade de caixa que sua em-
presa possui e/ou a qualificação de seus colaboradores, e o ambiente
Atividade 1
externo, que é composto de todos os elementos fora das fronteiras
Uma boa estratégia depende organizacionais, como os consumidores ou a política governamental.
de um bom entendimento do
ambiente em que a organização Você pode estar se perguntando: “Mas eu planejo a minha rotina
está inserida. Se você fosse pessoal e os meus sonhos, desenho as atividades do meu departamen-
chamado para participar do
processo de planejamento da to com meus colegas de trabalho, controlo se as ações estão apresen-
sua empresa, quais elementos tando resultado. Isso não é estratégia?” De maneira abrangente, sim!
você destacaria no ambiente
Mas, para analisarmos como isso acontece, precisamos entender que
externo?
há níveis estratégicos dentro de uma organização. Você pode perceber

26 Estratégia Empresarial
isso visualmente observando a Figura 5, que reflete um exemplo com-
pleto dos níveis em uma grande empresa com negócios diversificados.

Figura 5
Conceitos e níveis estratégicos
Níveis Estratégicos

Estratégia Corporativa
Responsabilidade dos gestores corporativos.

Estratégia Empresarial
Responsabilidade dos gestores da unidade de negócios.

Estratégia Tático-Funcional
Responsabilidade dos gerentes médios.

Estratégia Operacional
Responsabilidade dos coordenadores da operação.

Fonte: Elaborada pelo autor.

Portanto, nesse modelo, podemos observar quatro níveis estratégicos:


1 Estratégia corporativa

Descreve a direção geral de uma empresa para gerenciar seu mix de


negócios e linhas de produtos. O gestor aqui não está preocupado com
as ações da prática do negócio em si, mas em como alocar recursos e
gerar crescimento para seu negócio como um todo. Voltando ao exem-
plo do restaurante, se sua família, além do restaurante, adquirir um
outro negócio, como uma padaria, a gestão seria feita de maneira sepa-
rada. Contudo, os investimentos poderiam sair de um e ir para o outro
para gerar sinergia ou crescimento, pois, em certos momentos, o ne-
gócio da padaria pode estar indo melhor do que o restaurante. Talvez,
no futuro, você queira vender o restaurante e entrar em outro negócio.
Esse tipo de ação é considerado uma ação estratégica corporativa.

A Coca-Cola, por exemplo, segue uma estratégia de crescimento por


aquisição. Uma prática comum dessa empresa é adquirir unidades de
engarrafamento locais para dominar o mercado.
2 Estratégia empresarial

Geralmente, ocorre no nível da unidade de negócios ou do produto,


enfatizando a melhoria da posição competitiva em um setor ou seg-
mento de mercado atendido pela unidade de negócios. Usando nosso

Fundamentos da estratégia 27
exemplo do restaurante, locar o imóvel do lado para expandir suas ati-
vidades é uma ação estratégica empresarial ou, para muitos autores,
uma estratégia de negócios.

Por exemplo, a Apple usa uma estratégia competitiva de diferencia-


ção que enfatiza produtos inovadores com design criativo. Em contras-
te, outros fabricantes de computadores pessoais optaram por preço
baixo e vendas por meio do varejo eletrônico.
3 Estratégia tático-funcional

É a abordagem adotada por uma área funcional para atingir os ob-


jetivos das estratégias empresariais, maximizando a produtividade dos
recursos. Esse nível estratégico se confunde com as funções dentro de
uma empresa, por exemplo: estratégia de recursos humanos, estratégia
Livro
de marketing, estratégia financeira etc. Assim, quando, no restaurante,
Renée Mauborgne e W.
Chan Kim escreveram um você usa as redes sociais para atrair clientes trata-se de uma estratégia
livro, em 2005, chamado
de marketing apoiada na estratégia empresarial que você adotou.
Estratégia do Oceano Azul:
como criar mais mercado
Um outro exemplo é a estratégia agressiva da Procter and Gamble,
e tornar a concorrência
irrelevante. O argumento que investe grandes quantias em publicidade para criar demanda dos
dos autores é que você
seus produtos (Pampers, Ariel, Gillette, entre outras marcas).
deve trabalhar como o
conceito de estratégia 4 Estratégia operacional
não para obter melhores
resultados do que os Trata-se de como as partes componentes de uma organização en-
seus concorrentes atuais,
mas, sim, para criar um tregam efetivamente as estratégias corporativas, de negócios e de
espaço de mercado – o nível funcional em termos de recursos, processos e pessoas. Elas es-
que eles chamam de
oceano azul – tornando os tão no nível departamental e estabelecem metas periódicas de curto
concorrentes irrelevan- prazo para a realização. Por exemplo, ao definir uma estratégia de
tes. A ideia é evitar a luta
nos oceanos vermelhos marketing fundamentada em ações digitais, você precisa decidir quais
manchados pela briga mídias irá utilizar e o conteúdo para elas. Após essa decisão, você
entre os concorrentes e
se concentrar em desco- precisará elaborar um plano que projetará a frequência de postagem
brir novos oceanos azuis, e o valor do investimento mensal. Esse tipo de planejamento é o que
ou seja, um novo espaço
para competir. chamamos de estratégia operacional.
KIM, W. C.; MAUBORGNE, R. Rio de Desse modo, podemos definir a estratégia empresarial agora como
Janeiro: Sextante, 2007.
o conjunto de ações voltadas ao crescimento sustentável da organi-
zação com base em seu posicionamento estratégico, sustentado pelo
contínuo desenvolvimento de recursos e capacidades organizacionais
que proporcionem o alinhamento constante com um ambiente externo
em transformação permanente.

28 Estratégia Empresarial
Logo, compreendemos a importância dos conceitos estratégi-
cos primeiramente reconhecendo que estratégia não tem um úni-
co significado e que, para agir estrategicamente, devemos levar em
consideração suas múltiplas definições e hierarquia. A estratégia
empresarial tem um conceito particular relacionado com um conjun-
to de ações específico para determinado negócio da organização. É
uma maneira ampla de como o negócio se posicionará no ambiente
externo e, para ser implementada, dependerá das ações táticas e
operacionais definidas pela empresa.

1.3 Desenhando a estratégia empresarial


Vídeo Conforme estudamos na seção anterior, a estratégia deve permitir
a uma empresa que crie uma conexão, por meio de seus recursos e ca-
pacidades, com as demandas do ambiente externo. Assim, o desenho
da estratégia é uma visão geral de como o processo de planejamento,
implementação e ajuste estratégico ocorre na organização.

Um ponto importante é que esses elementos dependem um do


outro, ou seja, ao formular uma estratégia, uma organização também
deve considerar como ela será implementada e revisitada. A falta de
consideração sobre essas questões em conjunto reduzirá a probabili-
dade de sucesso. A Figura 6 ilustra que cada parte do desenho estra-
tégico é interdependente. Diagnóstico, formulação, implementação e
controle precisam ser considerados para que a estratégia da organiza-
ção atenda às demandas do ambiente de maneira eficaz.

Figura 6
Desenho estratégico

Diagnóstico Formulação Implementação Controle


estratégico estratégica estratégica estratégico
Fonte: Elaborada pelo autor.
1 Diagnóstico estratégico

O diagnóstico estratégico é o monitoramento, a avaliação e a dis-


seminação de informações dos ambientes externo e interno para to-

Fundamentos da estratégia 29
dos os envolvidos no desenho da estratégia. O objetivo é identificar
fatores críticos de sucesso internos e externos que afetam ou podem
vir a afetar o futuro da organização. O ambiente externo é composto
de inúmeras variáveis, como política, economia, sociedade, tecnologia,
concorrentes e fornecedores. O intuito do diagnóstico é identificar o
que nesse ambiente externo, ou seja, fora da organização e fora do seu
controle, representa uma oportunidade ou uma ameaça. A combinação
dessas variáveis externas forma o contexto competitivo da empresa.

O ambiente interno da empresa é composto do conjunto de re-


cursos e capacidades que estão sob o controle dela. Por exemplo, os
recursos humanos, a capacidade de compreender as demandas dos
consumidores, os recursos financeiros e a capacidade de proporcionar
respostas rápidas às demandas do ambiente externo. Um levantamen-
to dos recursos e capacidades tem por objetivo classificá-los em pon-
tos fortes ou fracos. A maneira mais simples de realizar o diagnóstico
estratégico é por meio de uma análise de forças, fraquezas, oportuni-
dades e ameaças, chamada análise Swot. Como veremos na figura a
seguir, ela é um cruzamento de todos os dados que você encontrou na
sua análise para verificar a posição da organização no ambiente, como
você pode observar no nosso exemplo do restaurante.

Figura 7
Modelo de análise Swot para um restaurante

Forças (Strengths) Fraquezas (Weaknesses)


• Qualidade da comida • Falta de capital de giro
• Atendimento • Falta de treinamento
• Localização
• Relacionamento com os fornecedores • Rotatividade dos funcionários
• Tradição

Oportunidades (Opportunities) Ameaças (Threats)


• Crescimento da cidade • Novos restaurantes
• Preocupação das pessoas com alimentação • Crise econômica
• Delivery • Novo modelo de tributação

Fonte: Elaborada pelo autor.

Com base na figura anterior, seu restaurante tem como força a qua-
lidade da comida, o atendimento, a localização, o bom relacionamento

30 Estratégia Empresarial
com os fornecedores e a tradição representada pela marca. Com essas
forças, você poderá aproveitar uma série de oportunidades, por exem-
plo, hoje em dia, as pessoas estão cada vez mais preocupadas com a
qualidade de sua alimentação e, ao mesmo tempo, gostam de ficar
em casa. Sendo assim, aderindo ao delivery, por exemplo, sua marca e
qualidade das refeições conseguirão fazer com que seu restaurante se
conecte a um maior número de pessoas. Também, você estará mais pre-
parado para lidar com um grande número de concorrentes. Agora, como
a maior parte de suas fraquezas estão relacionadas com a gestão dos
funcionários, novos restaurantes que entram no mercado terão a opor-
tunidade de contratar seus funcionários que parecem estar insatisfeitos.
2 Formulação estratégica

Uma análise cuidadosa do ambiente interno da empresa e das ne-


cessidades do ambiente externo permitirá à organização que avalie
onde pode obter melhor ajuste estratégico entre os dois. A formulação
estratégica inclui a definição da visão, da missão, dos objetivos e do de-
senvolvimento de ações estratégicas e o estabelecimento de diretrizes
de políticas. De acordo com Mintzberg (1994), a formulação da estraté-
gia é um ato criativo. Ela começa na análise, mas é necessário o insight
criativo, conforme mostra a figura a seguir.

Figura 8
Processo de formulação e planejamento estratégico

Visão Missão Objetivos Políticas e Ações


planos estratégicas

Fonte: Elaborada pelo autor.

Com base na Figura 8, o processo começa com a visão e a missão


da empresa, que, muitas vezes, se confundem com a do empreende-
dor. Após isso, os objetivos são determinados. Com eles em mãos,
você poderá traçar seus planos e suas políticas definidas por meio
de ações.

Fundamentos da estratégia 31
3 Implementação estratégica

A implementação é o processo pelo qual estratégias e políticas são


colocadas em ação por meio do desenvolvimento de projetos, progra-
mas, orçamentos e procedimentos. Geralmente, ela é realizada pelos
gerentes de nível médio (tático-funcionais) atrelada ao planejamento
Atividade 2 operacional, que se refere a decisões diárias para alocar recursos e de-
Quais elementos internos senvolver atividades. Uma estratégia pode ser muito bem formulada,
em uma organização podem
mas não terá valor se for mal comunicada e incorretamente implemen-
dificultar a implementação
estratégica? tada. Portanto, estratégias planejadas precisam ser transmitidas, com-
preendidas e coordenadas adequadamente com as partes interessadas,
dentro e fora da organização. Um exemplo de implementação pode ser
observado na Figura 9.

Figura 9
Exemplo de implementação estratégica

Fase 2 Fase 3 Fase 4 Fase 5


Fase 1

Gerente de Gerente de Equipe desenvolve Equipe desenvolve Gerente de


marketing analisa o marketing comunica plano de ação para campanha para marketing analisa
objetivo. o objetivo para sua mídias sociais. Facebook e se a empresa
equipe. Instagram. aumentou sua
visibilidade digital.

Fonte: Elaborada pelo autor.

Conforme a figura anterior, um dos objetivos da empresa é ter


visibilidade digital. Com base nisso, o gerente de marketing procura
transformar esse objetivo genérico em objetivos específicos, como au-
mentar o número de seguidores das mídias sociais em 15%. Com essa
transformação, o gerente reúne-se com sua equipe e desenvolve um
plano de ação específico com base em uma campanha para o Facebook
e Instagram para atingir o objetivo de marketing. Ao final do período
preestabelecido, há uma avaliação para verificar se o número de se-
guidores aumentou em 15%. Todos os planos são avaliados e a soma
deles recai no objetivo estratégico ter visibilidade digital.

32 Estratégia Empresarial
4 Controle estratégico

O controle é o processo pelo qual as atividades oriundas do plane-


jamento estratégico e os resultados de desempenho são monitorados
para que o desempenho final possa ser comparado àquele previsto. Os
gerentes usam as informações dos indicadores de desempenho para
executar ações corretivas e resolver problemas. Embora o controle seja
o principal elemento final do desenho estratégico, ele é um instrumen-
to de aprendizagem para identificar pontos de melhoria no plano estra-
tégico implementado e, assim, estimular um novo processo.

Figura 10
Ciclo de controle estratégico

1 2

1 2
Diagnóstico Planejamento e
estratégico formulação

Controle
4 3 3

Implementação

Fonte: Elaborada pelo autor. Atividade 3


Conforme observamos na Figura 10, a empresa implementa seu O controle estratégico pode
plano estratégico com base em um diagnóstico, essa avaliação contro- ser algo negativo no processo
estratégico? Explique.
lada leva o processo para um novo diagnóstico e assim por diante. Per-
cebemos, dessa forma, que o desenho estratégico trata-se de um ciclo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O fundamental para a compreensão da estratégia e sua efetiva aplica-
ção prática é entender os dois elementos essenciais de seu processo, ou
seja, o ambiente interno e externo. Atualmente, isso é um grande desafio
porque o ambiente externo é mutável, assim a organização precisa ser
mutável e adaptável. Uma organização flexível, conectada com seu ecos-
sistema, será sustentável, mas esse processo adaptativo depende do cor-

Fundamentos da estratégia 33
reto entendimento e desenvolvimento da estratégia e de processos de
aprendizagem que a incrementam constantemente.
Diante disso, uma organização deve sempre focar em desenvolver re-
cursos e capacidades que a habilitem para competir na sua área de atua-
ção e que proporcionem oportunidades de crescimento e diversificação
em vários mercados de maneira sinérgica e simultânea.
Ainda, a necessidade do desenvolvimento de ações e práticas diversas
pode levar à falta de foco e ao desperdício de energia e recursos. Dessa
forma, é muito importante que o propósito e o conjunto de valores da
organização a guiem em suas escolhas e decisões. Com isso, a empresa
poderá ter uma atuação representativa e marcante no ambiente, expon-
do seus diferenciais e inovando sempre.

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abr. 2019.

GABARITO
1. Há muitas variáveis no ambiente externo que devem ser observadas, principalmente
fatores políticos, econômicos, sociais, tecnológicos, legais e, ambientais, mas
também, de uma maneira mais próxima e, talvez, mais importante, os consumidores,
concorrentes e fornecedores.

Fundamentos da estratégia 35
2. A falta de comunicação para toda organização do que foi planejado é um fator que
dificulta a implementação. Além disso, podemos destacar a cultura e a estrutura
das organizações. Se ambas não estiverem alinhadas ao processo estratégico, a
implementação será falha e difícil.

3. O controle estratégico não é algo negativo no processo de planejamento estratégico,


visto que ele é a maneira que a organização tem de verificar, ao longo do processo,
por meio de indicadores, que a estratégia está sendo realizada.

36 Estratégia Empresarial
2
Diagnóstico estratégico:
objetivos e propósito
empresarial
Independentemente da área em que pretendemos atuar, é im-
portante, antes de qualquer coisa, fazermos um diagnóstico inicial
da situação para não desperdiçarmos recursos nem energia. O
diagnóstico é um ponto de partida para toda inciativa, seja pessoal,
seja organizacional. Por exemplo, não adianta você querer perder
peso ou ter uma vida saudável sem fazer uma análise inicial de sua
condição física, seu peso e sua saúde em geral.
Neste capítulo, aprenderemos a fazer o diagnóstico estratégico
de empresas, começando com o ambiente externo, ou seja, ma-
peando tudo o que está fora da organização e afeta criticamente o
sucesso das ações. Para tanto, analisaremos elementos estruturais
do ambiente competitivo. Em seguida, por meio de uma ferramen-
ta denominada cinco forças de Porter, faremos uma varredura nos
fatores externos mais próximos, como consumidores e concorren-
tes. Por fim, estudaremos os fatores internos, isto é, nossos recur-
sos e capacidades, que são a base para estabelecermos objetivos
e ações estratégicos no ambiente externo, tudo isso guiado por
nossos propósitos empresariais.

2.1 Diagnóstico estratégico


Vídeo O diagnóstico estratégico envolve interpretar o que está aconte-
cendo no ambiente onde sua empresa está inserida, por exemplo, as
tendências na área da economia, política, sociedade e tecnologia. En-
tendendo o que está à sua volta, você poderá analisar dois elementos
específicos e mais impactantes com mais assertividade: os seus consu-
midores e os concorrentes.

Diagnóstico estratégico: objetivos e propósito empresarial 37


Com um diagnóstico bem feito, você estará pronto para traçar seus
objetivos estratégicos, ou seja, o que vai dar direcionamento para suas
ações e garantir que você chegue aonde quer. Em outras palavras, você
estará preparado para realizar grandes coisas na sua vida, como
ser um empreendedor de sucesso.

Mas, antes, como todo futuro empreendedor,


você deve fazer uma autoanálise e entender por que
quer empreender (seu propósito), o que quer fazer
(sua visão) e como vai promover uma mudança so-
cial e empresarial para si e todos à sua volta (sua mis-
são). Depois de estabelecer seu propósito, sua visão e
sua missão, você deverá transformar esses conceitos
abstratos em objetivos concretos, que servirão de
rota para sua jornada estratégica, estabelecida criati-
Jane Kelly/Shutterstock
vamente em seu plano de sucesso estratégico.

Historicamente, as organizações foram evoluindo e aprimorando


seus sistemas de gestão, bem como a maneira de gerenciar mudanças
e se adaptar às alterações ambientais. O ambiente da organização in-
clui um conjunto de atores e grupos de interesse representados por
proprietários, gerentes, clientes, fornecedores etc. (conhecidos na lite-
ratura como stakeholders), que são afetados direta ou indiretamente
pelas ações da companhia e que reagem de acordo
Livro com seus interesses. Nessas condições, é necessário
No livro A meta, apresen- que uma organização alcance a harmonia entre o seu
ta-se a Teoria das Res-
trições, uma filosofia de
ambiente externo (econômico, político, social, tecno-
negócios que tem como lógico, legal, de consumidores, fornecedores, concor-
base o fato de as em-
presas terem, dentro de
rentes, entre outros) e interno (recursos, estrutura,
sua operação, gargalos e cultura organizacional, estilo de liderança, sistema de
desperdícios, que o autor
chama de restrições e que
poder etc.).
prejudicam a capacidade
Conforme você percebeu, uma organização faz
operacional e levam a
resultados não satisfa- seu diagnóstico com base nas análises de seus am-
tórios. Assim, é preciso
bientes externo e interno. Assim, vamos aprender
identificar o funcionamento de cada estrutura da
organização para criar ações de melhoria. O autor como eles são construídos para que possamos in-
questiona as razões para as empresas funcionarem
terpretá-los e, com isso, definirmos as estratégias
de uma maneira não otimizada e abre possibilida-
des de transformação. para as empresas. Para tanto, estudaremos algu-
GOLDRATT, E. M.; COX, J. São Paulo: Nobel, 2002. mas ferramentas estratégicas que irão facilitar nos-
sas análises.

38 Estratégia Empresarial
2.2 O ambiente externo
Vídeo O ambiente externo é composto do macro e do microambiente. De
uma maneira bem simples, podemos definir o macroambiente pelo
conjunto de fatores mais distantes da organização, por exemplo, a
economia ou a sociedade em geral. Esses elementos têm um impacto
indireto na vida e nas atividades diárias das empresas. Já o microam-
biente é formado pelas relações e intersecções de elementos mais
próximos à empresa, como concorrentes ou consumidores. Os atores
do microambiente têm uma capacidade direta de influenciar a estra-
tégia e o dia a dia da organização. Podemos visualizar essa relação na
figura a seguir.

Figura 1
O ambiente externo de uma empresa

acroambiente
M
oambien
icr t
M

Empresa

Fonte: Elaborada pelo autor.

Na Figura 1, você e sua empresa são o centro, o ponto de partida e a


referência de toda a análise estratégica. Com base nesse ponto de vista
central, você irá identificar o que mais lhe afeta, indireta (macroam-
biente) e diretamente (microambiente).

Diagnóstico estratégico: objetivos e propósito empresarial 39


Figura 2 2.2.1 Macroambiente
Análise Pestel
A ferramenta de análise do macroambiente externo mais
usada pelos estrategistas é a Análise Pestel (NARAYANAN;
FAHEY, 1994), que trata de importantes fatores, conforme
apresenta a Figura 2.

Fatores políticos

Estão relacionados à maneira e ao grau da in-


terferência do governo na economia ou em deter-
minado setor produtivo. Basicamente, podemos
classificá-los como todas as influências que um
governo exerce sobre seus negócios, o que pode
incluir política governamental, estabilidade ou insta-
bilidade política, corrupção, política de comércio exterior,
política tributária, restrições comerciais, legislação trabalhista
e ambiental (SILVA, 2019) e demais fatores que precisam ser consi-
derados ao avaliar a atratividade de um mercado específico.

A estratégia da empresa deve levar em conta o plano de go-


verno e a ideologia dos políticos eleitos para ter em mente uma
tendência política genérica e como ela pode afetar sua estratégia.
Fonte: Adaptada de Prizma/Shutterstock.
Os governos são cíclicos e dialéticos, ou seja, em uma sociedade
democrática, a população escolhe seus governantes de tempos em
tempos, por exemplo, no Brasil, de quatro em quatro anos. Quando a
Desafio
oposição ao atual governo é levada ao poder, uma empresa provavel-
Considere analisar o contexto
mente deve ajustar sua estratégia a um novo ciclo de tendências, que
político no qual a sua empresa
está situada e suponha que o pode ser ideologicamente contrário ao anterior.
atual presidente do Brasil já
está planejando uma reeleição.
Você acredita que essa situação Fatores econômicos
é viável para continuar ou não
com sua estratégia empresarial?
São derivados da política econômica do governo, que tem um im-
pacto significativo nas atividades e na rentabilidade de uma empresa.
Os fatores econômicos incluem o crescimento econômico, as taxas de
juros, o câmbio, a inflação, a renda média dos consumidores, a lucrati-
vidade média das empresas e as taxas de desemprego, os quais podem
ser divididos em macro e microeconômicos. Fatores macroeconômicos
estão relacionados com a política governamental que afeta a demanda

40 Estratégia Empresarial
em qualquer economia, como o controle das taxas de juros e os gastos
públicos do próprio governo. Já os fatores microeconômicos são aque-
les que afetam a maneira como as pessoas gastam sua renda (HITT;
IRELAND; HOSKISSON, 2011).

Por exemplo, para o crescimento da sua empresa, você precisa de


recursos financeiros, e uma maneira de obtê-los é por meio da con-
cessão de crédito disponível no sistema financeiro. Se a taxa básica de
juros do país estiver muito alta, você terá muita dificuldade para reali-
zar seu crescimento de maneira sustentável com recursos de terceiros.

Fatores socioculturais

Referem-se às características demográficas, às normas, aos cos-


tumes e aos valores da população inserida no ambiente onde a or-
ganização opera. A compreensão desses fatores é essencial para os
profissionais da área de marketing porque são a base da segmentação,
do entendimento do comportamento de compra e da demanda.

Além disso, é importante conhecer a história, as tradições e as in-


fluências religiosas e socioculturais (moda, mídia, meios de comunica-
ção etc.) de um povo. Essa compreensão mais abrangente permite à
empresa refinar sua análise das necessidades e dos desejos específicos
dos indivíduos para desenvolver produtos e serviços que atendam me-
lhor à demanda. Além da área de marketing, esses fatores, quando bem
interpretados, auxiliam os profissionais da área de gestão de pessoas
em suas políticas porque também dizem algo sobre as tendências do
comportamento da força de trabalho (CRAVENS; PIERCY, 2007).

Desse modo, as ofertas que você faz para os seus consumidores


devem estar alinhadas às tendências sociais. Por exemplo, hoje em dia,
as sociedades mundiais buscam respeitar a diversidade da população,
assim seus produtos e serviços devem ser percebidos como parte des-
se respeito para que tenham apelo comercial.

Fatores tecnológicos

Dizem respeito às inovações tecnológicas que podem afetar as ope-


rações do setor em que você opera e do mercado de modo favorável
ou desfavorável. O cenário tecnológico muda rápida e constantemen-
te, o que afeta o nosso dia a dia e as nossas práticas organizacionais.

Diagnóstico estratégico: objetivos e propósito empresarial 41


1 Basicamente, a tecnologia afeta nossas empresas de três maneiras dis-
Sites responsivos são aqueles tintas: a) novas formas de produzir bens e serviços; b) novas formas de
que adequam a aparência distribuição de bens e serviços; e c) novas formas de comunicação com
ou a disposição do conteúdo
mercados-alvo (CRAVENS; PIERCY, 2007).
de acordo com o tamanho
da tela em que são exibidos, Por exemplo, atualmente, carregamos um mundo de soluções em
adaptando-se a telas de
tablets, celulares etc. nossos celulares, assim as ofertas de uma empresa devem interagir por
1
meio mobile, seja por meio de aplicativo, seja de um site responsivo .

Fatores ecológicos

Antes deixados em segundo plano, eles requerem muita atenção dos


gestores na atualidade. No passado, os recursos naturais, como matéria-
-prima, eram abundantes, mas hoje são escassos e sua extração e seu uso
são muito regulamentados pelos governos em todo o mundo.

Além disso, a sociedade percebe como a depredação do meio am-


biente e as mudanças climáticas nos últimos anos afetam o dia a dia e a
vida no planeta. Não ter consciência ambiental é ruim para os negócios.
Desse modo, ao insistir na depredação ecológica, muito em breve, as
empresas podem perder sua arena de prática estratégica e seus con-
sumidores. Empresas conscientes, além de contribuírem para a susten-
tabilidade, têm um apelo social maior e são mais lucrativas. Portanto,
práticas mais conscientes e responsáveis são vantajosas.

Por exemplo, se você tem um programa de reciclagem de lixo em


sua empresa, além de criar consciência ecológica com seus colabora-
dores, seus consumidores terão uma percepção mais positiva de sua
marca e de seus produtos.

Fatores legais

Embora sobreponham alguns fatores políticos, é importante não só


observar o regimento legal no qual você e sua empresa estão inseridos,
mas também o ordenamento legal específico que determina a dinâmi-
ca competitiva da empresa. Assim, especial atenção deve ser destinada
para as leis trabalhistas, societárias, tributárias, de proteção ao consu-
midor, da propriedade intelectual, de saúde e para as que regulam o
comércio em geral.

42 Estratégia Empresarial
As empresas globais têm um esforço extra porque cada país tem
seu conjunto próprio de leis, regras e regulamentos que ordenam as
práticas empresariais. Além de conhecer as leis, uma organização deve
monitorar as tendências legislativas, uma vez que a sociedade é dinâ-
mica e precisa de constantes ajustes na sua estrutura legal. Quando
uma empresa se antecipa às exigências legais, podemos dizer que ela
sai na frente das outras e, por algum tempo, terá uma vantagem com-
petitiva oriunda do seu bom monitoramento legal.

Um empreendedor pode ter uma ideia disruptiva (inovadora) e mo-


delá-la por meio de uma startup, mas nem sempre haverá um conjunto
de leis e regras específicas para regular seu modelo de negócios. Essa
regulamentação geralmente vem depois que a ideia é colocada em prá-
tica, e a maneira com que o Estado entende a regulamentação pode
inviabilizar o modelo de negócios criado.

Por exemplo, em muitas cidades, o aluguel de patinetes motoriza-


dos por minuto é uma “febre”, mas só depois que começaram a ser
usados é que os governos locais criaram um conjunto de regras de
como, onde e quem pode usar esses patinetes. Caso a empresa não te-
nha feito uma previsão da tendência de como iriam ser regulados, pro-
vavelmente terá muita dificuldade de adaptar seu modelo de negócios.

2.2.2 Microambiente
O microambiente afeta diretamente os negócios da empresa – o
ambiente operacional. Esse ambiente está dentro do setor específi-
co onde a empresa opera e pode afetar todos os processos do ne-
gócio. Em outras palavras, é constituído de todos os fatores que têm
um efeito direto e particular sobre a empresa ou, ainda, de todas as
forças próximas a ela que afetam seu desempenho e sua operação,
por exemplo, fornecedores, concorrentes e consumidores. É impor-
tante destacar que esses fatores não afetam todas as empresas do
mesmo setor da mesma maneira e com a mesma intensidade. Cada
empresa reage de modo diferente à pressão que esses fatores exer-
cem sobre ela, pois elas têm tamanho, capacidades, recursos e es-
tratégias diferentes.

Uma ferramenta muito popular para analisar o microambiente foi


desenvolvida por Michael Porter, em 1979. Denominada análise da in-
dústria ou análise das cinco forças de Porter, ela avalia e analisa o ambien-

Diagnóstico estratégico: objetivos e propósito empresarial 43


te competitivo da organização. Segundo Porter (1986), para determinar
a intensidade competitiva de um setor, a empresa deve analisar aspec-
tos múltiplos e simultâneos, além dos concorrentes e consumidores.
De acordo com o autor, as forças que devemos levar em consideração
são: o poder de barganha dos compradores (abaixo da empresa), ou seja,
a demanda, os produtos e os serviços processados pela empresa; o poder
de barganha dos fornecedores (acima da empresa), isto é, a oferta de in-
sumos para o processamento dos produtos e serviços; a ameaça de novos
entrantes; a ameaça de produtos substitutos; e o grau de rivalidade entre
os concorrentes, como podemos observar na Figura 3. A ideia é examinar
cada um desses fatores e determinar em que grau eles aumentam ou di-
minuem a concorrência no setor.

Figura 3
As cinco forças competitivas de Porter

Ameaça
de novos
entrantes

Poder de Poder de
Rivalidade
barganha dos barganha dos
entre os
fornecedores clientes
concorrentes

Ameaça de
produtos
ou serviços
substitutos

Fonte: Adaptada de Nattee Sriyant/Shutterstock.

As forças de Porter determinam o grau de atratividade de um setor


do ponto de vista de uma empresa que está inserida nele. Elas propor-
cionam um método de consideração de um setor antes da entrada ou
de ajuste da estratégia quando a empresa já estiver inserida. Um setor
atraente é aquele com potencial de lucratividade acima do de outros
setores.

44 Estratégia Empresarial
Rivalidade entre os concorrentes

É uma análise do número de concorrentes, produtos, marcas, pon-


tos fortes e fracos, estratégias e participação de mercado em relação
aos concorrentes diretos. A concorrência determina a atratividade
de um setor, visto que as empresas lutam para manter sua posição
competitiva. A competição se transforma à medida que mudanças vão
ocorrendo no setor, na diversidade e nas barreiras de entrada criadas.

Ameaça de novos entrantes

É do interesse de uma empresa, às vezes com seus concorrentes,


criar barreiras para impedir que novos concorrentes entrem no merca-
do. Os entrantes são empresas novas ou já estabelecidas que preten-
dem diversificar sua atuação em novos setores. Essas barreiras podem
ser legais (como regulamentações de patentes) ou setoriais (como pro-
dutos ou marcas únicas). A chegada de novos participantes também
depende do tamanho do mercado, da reputação de uma empresa já
estabelecida, do custo de entrada, do acesso a matérias-primas, dos
padrões técnicos, das barreiras culturais, entre outros.

Ameaça de produtos ou serviços substitutos

Pode ser considerada uma alternativa em comparação com a oferta


atual no mercado. Os substitutos aparecem quando o estado atual da
tecnologia ou inovação evolui e abre uma oportunidade para a oferta
de novas soluções. Estas costumam ter uma melhor relação entre pre-
ço e qualidade e provêm de setores mais atraentes, ou seja, com nível
de lucratividade maior. Os substitutos representam uma ameaça se a
empresa não se antecipar a essa nova possibilidade.

Poder de barganha dos fornecedores

Por um lado, um mercado com poucos fornecedores os torna pode-


rosos e faz com que imponham condições em termos de preço, prazo,
qualidade e quantidade. Assim, se as condições impostas à sua empre-
sa forem piores do que as dos concorrentes, você estará em desvanta-
gem competitiva. Por outro, se existem muitos fornecedores, o poder

Diagnóstico estratégico: objetivos e propósito empresarial 45


de imposição das condições é menor, o que os torna mais fracos. Uma
análise do poder de barganha dos fornecedores, além do número deles,
passa pela análise do número de pedidos realizados, do custo de troca
de fornecedor, da existência de matérias-primas e assim por diante.

Poder de barganha dos clientes (compradores)


2
O Tinder é um aplicativo de Os clientes podem impor suas exigências em termos de preço, pra-
relacionamento entre pessoas zo, serviço, qualidade etc. quando o número de concorrentes é baixo.
de acordo com a geolocalização.
Sua interface tem como base Uma empresa deve evitar ficar em uma situação de dependência de
perfis de usuários que demons- certos clientes. O nível de concentração dos clientes atribui a eles mais
tram interesse uns nos outros
ou menos poder de exigência. Geralmente, o poder de negociação dos
tendo em vista suas descrições
pessoais e fotos. Quando há clientes tende a ser inversamente proporcional ao dos fornecedores.
interesse mútuo (um match)
entre dois usuários, eles são
Agora, vamos aplicar as cinco forças competitivas de Porter em um
2
informados pela plataforma e Estudo de caso envolvendo o Tinder .
podem começar uma conversa.
Estudo de caso
Rivalidade entre os concorrentes
A intensidade da participação de mercado dos concorrentes não pode ser subestimada, assim o Tinder deve apoiar
o crescimento de sua base de membros investindo fortemente em marketing para lidar com o avanço da sua
concorrência direta. A rivalidade aumentou devido aos diferentes tipos de concorrentes que surgiram com novos
produtos voltados para nichos de mercado específicos.
Ameaça de novos entrantes
O Tinder, até pouco tempo atrás, operava em um ambiente único e, por isso, houve a ameaça de novos entrantes.
Por mais que o Tinder ainda seja o maior no mercado brasileiro, outras empresas começam a entrar com novos pro-
dutos projetados especificamente para diferentes segmentos do mercado. Para lidar com essa força, é importante
que o Tinder invista, cada vez mais, em marketing para manter o relacionamento com sua base de usuários e tentar
captar novos antes que eles procurem outras opções.
Ameaça de produtos ou serviços substitutos
Glossário O setor de relacionamentos on-line sempre mudou com base nas novas necessidades e preferências dos clientes.
sites de nicho: sites que Isso significa que a ameaça de produtos alternativos está sempre presente. O Tinder deve lidar com novos produtos
atendem à demanda específica e serviços, como sites pagos, sites gratuitos, sites de nicho e redes sociais on-line. A preferência e os gostos dos
de um grupo de consumidores. consumidores estão sempre mudando, e é por isso que esses sites criaram novos produtos para desafiar o mercado
do Tinder. A maioria desses sites se concentra no segmento de mercado que não é coberto pelo Tinder, como
relacionamentos apenas entre pessoas do mesmo sexo ou interesses profissionais.

46 Estratégia Empresarial
Poder de barganha dos fornecedores
O Tinder teve que investir para continuar sendo relevante. Isso significa que o poder de barganha dos fornecedores
também aumentou com o passar do tempo. Os fornecedores que mais aumentaram seu poder de negociação
foram os profissionais de marketing e as empresas de tecnologia que dão suporte à plataforma. Assim como
os clientes, o acesso a informações permitiu aos fornecedores conhecer os diferentes aspectos do mercado e as
necessidades do Tinder, aumentando assim seu poder de barganha.
Poder de barganha dos clientes (compradores)
Com a crescente popularidade da internet, a maioria dos clientes consegue acessar informações e conhecer dife-
rentes aspectos e detalhes das ofertas semelhantes ao Tinder, podendo escolher sites que consideram adequados
às suas preferências. Os sites de nicho apareceram porque perceberam que havia uma lacuna não explorada pelo
Tinder. O Tinder investe muito em pesquisa e desenvolvimento para atender às novas necessidades dos clientes,
visando sempre a sustentabilidade a longo prazo.
Lições do estudo de caso Tinder
Podemos perceber a intensidade competitiva que há nesse setor, ou seja, nas plataformas de relacionamento entre
usuários, composta de elementos-chave, acesso à informação e ao conhecimento. Conforme analisamos neste
Estudo de caso, concorrentes, entrantes e substitutos identificaram que há necessidade de plataformas como a do
Tinder para segmentos de mercado específicos que possibilitam um “match” mais assertivo.
Talvez uma plataforma genérica como o Tinder não tenha mais espaço no futuro, cedendo lugar a soluções meno-
res, mais particulares e específicas. Porém, quem determinou essa dinâmica foram os consumidores que, munidos
de conhecimento e informação, estão moldando suas demandas e levando os fornecedores a desenvolverem
ferramentas e projetos de comunicação mais específicos. No entanto, não vamos nos esquecer de que o Tinder
também pode estar atento a essa análise e adaptando seus serviços e suas ofertas.

Desse modo, compreendemos que é essencial a análise do am-


biente externo de maneira genérica, por meio da análise Pestel, e de
maneira específica, por meio das cinco forças competitivas. Com esse
olhar de fora para dentro, você poderá, em primeiro lugar, observar o
ecossistema onde sua empresa foi e está sendo construída em suas va-
riáveis políticas, econômicas, sociais, tecnológicas, ecológicas e legais.
Com base nesse mapa, é possível entender o jogo estratégico que é
estabelecido, ou seja, como as forças operam e como você lida com o
impacto e as oportunidades proporcionadas pelas forças competitivas.

2.3 O ambiente interno


Vídeo O ambiente interno é a própria organização e envolve o conjunto
de recursos, capacidades e competências que, aos serem articulados
e utilizados, colocam em prática a estratégia da empresa. Para melhor
compreendermos essas três características relacionadas ao ambiente
interno, vamos analisar o Estudo de caso a seguir.

Diagnóstico estratégico: objetivos e propósito empresarial 47


Estudo de caso
A Amazon combinou vários recursos para prestar um serviço de vendas e distribuição de produtos. Ela começou
como uma livraria on-line, atendendo diretamente aos clientes. Ao crescer, ela estabeleceu uma rede de distribui-
ção capaz de enviar milhões de produtos próprios ou de terceiros para milhões de clientes ao redor do mundo.
As empresas tradicionais, que operam essencialmente com lojas físicas, perceberam a dificuldade em estabelecer
uma presença on-line e uma distribuição eficaz como a Amazon. Essa percepção as levou a desenvolver parcerias
com a Amazon, que começou a prestar o serviço de presença on-line, venda e transporte de mercadorias para essas
empresas, as quais puderam, assim, concentrar suas vendas em lojas físicas.
Conclusões
• A Amazon possui recursos tecnológicos (um banco de dados e um sistema de relacionamento com
clientes e fornecedores), físicos (lugares para armazenar os produtos) e humanos (pessoas para desen-
volver as atividades).
• A Amazon possui capacidades de marketing (faz a seleção de produtos para os consumidores), de
logística (faz a entregar ágil dos produtos) e financeira (faz a cobrança dos clientes e os pagamentos
para os fornecedores).
• A Amazon possui como competências essenciais sempre ter o produto disponível para os clientes,
fazer parcerias com empresas que não querem desenvolver um esquema próprio de e-commerce e ter
uma presença on-line superior.

Por meio desse Estudo de caso envolvendo a Amazon, podemos en-


tender que os recursos são a fonte das capacidades de uma empresa,
e as capacidades, por sua vez, são a fonte das competências essenciais,
que são a base da vantagem competitiva no mercado.

2.3.1 Recursos
Os recursos podem ser tangíveis ou intangíveis. Recursos tangíveis
são ativos que podem ser vistos, manipulados e quantificados, como
equipamentos, fábricas e pessoas. Já recursos intangíveis normalmente
incluem ativos profundamente enraizados na história e cultura da em-
presa, assim são mais difíceis de serem copiados pelos concorrentes,
como conhecimento, confiança, ideias, inovação e a marca (FELDMAN,
2000; KNOTT; MCKELVEY, 1999).

Os recursos geralmente são classificados como:


•• físicos: imóveis, equipamentos, máquinas e outros;
•• financeiros: caixa, compromissos orçamentários ou outros
meios de liquidez;
•• tecnológicos: computadores, softwares, redes, bancos de dados,
sistemas de comunicação, satélites, entre outros;
•• humanos: físicos, intelectuais e emocionais;

48 Estratégia Empresarial
•• sociais: relacionamentos, confiança, normas, amizades e
reputação;
•• organizacionais: informações, sistemas (formais e informais),
procedimentos, estruturas, conhecimento de gestão, cultura, re-
lações organizacionais (alianças, por exemplo) etc.

Os recursos estão intimamente relacionados com atividades espe-


cíficas. Ao pensar em saúde, por exemplo, você tem à sua disposição
várias academias, mas ter uma rotina de exercícios na academia é um
processo possibilitado apenas por uma série combinada de recursos,
como tempo, dinheiro e saúde física e mental.

2.3.2 Capacidades
As capacidades são a habilidade da empresa de explorar recursos
(HUNGER; WHEELEN, 2011). Estes não são produtivos por si próprios,
por exemplo, um cirurgião não tem utilidade sem um anestesista, en-
fermeiros, instrumentos cirúrgicos, equipamentos de imagem e um
conjunto de outros recursos. Para executar uma tarefa, uma empresa
precisa que uma série de recursos trabalhem em conjunto. Assim, po-
demos definir uma capacidade como sendo a habilidade de uma em-
presa em desenvolver atividades por meio de seus recursos.

Embora uma pessoa seja capaz de tocar violão, cantar bem e falar
uma língua estrangeira, não significa que ela será uma artista interna-
cional de sucesso. Da mesma forma, uma organização possuir recursos
para fabricar produtos e distribuí-los por todo o Brasil não garante a
ela uma posição competitiva superior, porque a vantagem competitiva
tem como base colocar em prática a combinação simultânea de todos
esses recursos.

Conforme Winter (1995), a capacidade organizacional é uma rotina


ou um conjunto de rotinas, que, com os recursos, possibilita ao gestor
uma série de opções estratégicas.

Os recursos modelados por rotinas coletivas têm propriedades es-


tabelecidas em uma hierarquia e que definem o potencial do sistema
(rotinas e recursos) para se reorganizar. Rotinas altamente codificadas
Glossário
usando recursos conhecidos e estabelecidos não têm essa capacidade
de auto-organização. Esses recursos estáticos permitem às organizações status quo: estado e práticas
atuais.
que operem com status quo bem estabelecido. Winter (2003) os chama

Diagnóstico estratégico: objetivos e propósito empresarial 49


de recursos de nível zero. Grant (1991, p. 120) observa que essas capaci-
dades estáticas podem ser identificadas “usando uma classificação fun-
cional padrão das atividades da empresa”.

Segundo Winter (2003) há dois tipos de capacidades: estáticas e di-


nâmicas, como vemos no Quadro 1.

Quadro 1
Capacidades estáticas e capacidades dinâmicas

Capacidades que têm como


Eficiência na entrega
Capacidades estáticas base rotinas e recursos esta-
de resultados.
belecidos.

Capacidades em detectar
necessidades e oportunida- Eficácia na execução
Capacidades dinâmicas des, selecionar opções e (re) e no alcance dos
configurar recursos e rotinas objetivos.
estáticas.

Fonte: Elaborado pelo autor com base em Winter, 2003.

As capacidades construídas com base em rotinas estáticas mantêm


o status quo, ou seja, o padrão funcional das atividades da empresa, por
exemplo, fazer o pagamento de contas, produção, vendas, transporte
de mercadorias. O outro nível de capacidades, as dinâmicas, giram em
torno da transformação dos recursos. Esse tipo de capacidade permi-
te à organização identificar novas oportunidades, fundamentadas em
conhecimento, e reconfigurar recursos para que sejam transformados
em rotinas dinâmicas (TEECE, 2007). A base dessas capacidades são a
formação de rotinas de acumulação e transferência de conhecimento,
experimentação e melhoria contínua das práticas empresariais. Capa-
cidades dinâmicas trazem padrões de aprendizado que abrangem di-
versidade, caminhos múltiplos e diferentes combinações de recursos
(LEI; HITT; BETTIS, 1996).

Um exemplo de capacidade dinâmica é a habilidade que uma em-


presa tem de perceber mudanças no ambiente e transformá-las ra-
pidamente em oportunidades, alterando suas rotinas internas e seu
modelo de negócios.

De acordo com Baden-Fuller e Teece (2019), a Nokia perdeu a re-


volução dos smartphones porque a empresa não conseguiu detectar,
especialmente comparada à Apple, o que estava acontecendo no am-
biente com relação à próxima geração de smartphones. Steve Jobs sen-

50 Estratégia Empresarial
tiu o que os clientes queriam e sabia o que o pessoal técnico estava
fazendo. Tendo isso em vista, ele construiu os recursos que a Apple
precisava para aproveitar essa oportunidade. Por exemplo, para fazer
o iPod funcionar, a Apple se concentrou em recursos para gerenciar
propriedade intelectual digital e para criar o design de aparelhos portá-
teis. Jobs e sua equipe aprenderam como fechar acordos com estúdios
e gravadoras e como reunir uma tecnologia intuitiva para o usuário
de modo muito atraente. A Nokia, que estava mais avançada do que
a Apple na tecnologia de smartphones, optou por se concentrar em
sua própria pesquisa e desenvolvimento interno. Ela aproveitou e se
fundamentou na ciência, mas perdeu a emoção, a intuição e o estado
de espírito.

2.3.3 Competências essenciais


Os objetivos são alcançados colocando-se os recursos e as capacida-
des em ação. Essa ação, no contexto da organização, sempre envolverá
interação com outras pessoas, a qual caracteriza uma competência or-
ganizacional. A ação individual, por definição, não é uma competência
organizacional. Certamente, haverá muitas ações individuais envolvi-
das na obtenção de resultados da empresa, mas estes não são resulta-
do da soma de ações individuais, mas de interações complexas entre
os indivíduos. As competências são sempre apoiadas em interações
coletivas, conforme vemos na Figura 4.

Figura 4
Os blocos de construção da operacionalização da estratégia

Recursos Capacidades Competências Objetivos


configuram geram atingem

Fonte: Elaborada pelo autor.

Diagnóstico estratégico: objetivos e propósito empresarial 51


As competências são atividades que a organização realiza com certa
maestria e, mais importante, repetidamente. Uma organização pode
demonstrar uma competência em um evento único, mas para tê-la à
disposição, deve ter a capacidade de repeti-la.

Um aspecto importante de uma competência é que ela é contextua-


lizada. As competências não existem nos manuais, nos diagramas de
Atividade 1 processo, nas mentes individuais ou nos sistemas de computador. Elas
Uma empresa que possui uma são construções de nível social e formam a base da vantagem competi-
enorme base de recursos será a
mais competitiva? tiva porque são difíceis de imitar, ou seja, não são facilmente transferí-
veis de uma organização para outra (PRAHALAD; HAMEL, 1990).

Uma organização, por maior e melhor que seja, pode não ser
competente. Assim, Prahalad e Hamel (1990) criaram o termo
competências essenciais como o processo de exploração da combi-
nação única de recursos e capacidades para cumprir uma estraté-
gia. Uma organização deve focar suas atividades estratégicas em
três ou quatro competências essenciais. Para isso, é fundamental
que as identifique usando três critérios específicos (HITT; IRELAND;
HOSKISSON, 2011), descritos a seguir.

I. Oferecer acesso potencial a uma ampla variedade de


mercados.

As competências essenciais devem permitir a criação de novos pro-


3 dutos e serviços. Exemplo: Por que o Sistema de Crédito Cooperativo
3

O Sistema de Crédito Coopera-


(Sicredi), originalmente com foco no fornecimento de crédito rural em
tivo (Sicredi) trata-se de uma
instituição financeira composta pequenas comunidades no interior do Brasil, estabeleceu uma lideran-
de pessoas que prestam ser- ça tão forte em serviços financeiros?
viços a quem se associa a ela,
oferecendo serviços como conta Competências essenciais que permitiram ao Sicredi entrar em mer-
corrente, aplicações financeiras, cados aparentemente diferentes:
cartão de crédito, empréstimos
e financiamentos. Os associados •• Proposta de marca distinta e clara: concentração em um grupo
são os donos da cooperativa, de clientes bem definido, aqueles que buscam soluções coletivas
logo podem votar para tomar
decisões em uma instituição que para seus serviços financeiros.
não visa aos lucros, e os seus •• Habilidades de marketing: gerenciamento de banco de dados; co-
direitos e deveres são iguais.
municação focada no conceito da marca; conversão de aberturas
de contas digitais.
•• Habilidades em gerenciamento de relacionamento com clientes:
atendimento personalizado e agilidade.

52 Estratégia Empresarial
II. Contribuir significativamente para os benefícios percebidos
pelo cliente do produto final.

As competências essenciais devem permitir à empresa que faça uma


oferta com base em benefícios que são percebidos como diferentes e
únicos pelos clientes. Para saber como funciona essa percepção singular,
você deve monitorar constantemente os clientes para entender por que
estão comprando seus produtos e/ou pagando a mais por eles.

Exemplo: Por que o Magazine Luiza teve tanto sucesso em capturar


a liderança do mercado de compras on-line? Por que os consumidores
preferem uma experiência on-line com o Magazine Luiza?

Competências essenciais do Magazine Luiza são:


•• Projeto e implementação de sistemas de suprimentos que efeti-
vamente vinculam lojas existentes ao site do Magazine Luiza.
•• Capacidade de projetar e fornecer uma interface com o cliente
que personaliza as compras on-line e as torna mais eficientes.
•• Infraestrutura de entrega confiável e eficiente (coleta, distribui-
ção, manuseio da satisfação do cliente).

III. Ser difícil de ser imitada pelos concorrentes.

Uma competência essencial deve ser a “competitivamente única”.


Em muitos setores, a maioria das habilidades pode ser considerada um
pré-requisito para a participação e não fornece diferenciação significa-
tiva dos concorrentes. Em geral, as competências essenciais surgem
de uma complexa orquestração de vários recursos, capacidades, méto-
dos e tecnologias que são difíceis de imitar porque foram construídos
na história e cultura da empresa e levaram anos para se materializem
como uma competência essencial.

Exemplo: Por que o Walmart tem uma posição tão forte no varejo
mundial?
Competências principais que são difíceis de a concorrência imitar:
•• Cliente sempre consegue comprar produtos mais baratos do que
em qualquer outro lugar.
•• Venda de todos os tipos de mercadorias usando o mesmo modelo. Glossário

•• Capacidade de escala com gerenciamento da cadeia de supri- capacidade de escala: venda


de volumes enormes de produ-
mentos, alta rotatividade de estoque e concentração das ativida- tos de maneira padronizada.
des de compra e relacionamento com os fornecedores.

Diagnóstico estratégico: objetivos e propósito empresarial 53


Nem toda competência organizacional é uma competência essen-
cial. Uma empresa pode ter um processo de fabricação bem estrutu-
rado, mas só isso não é capaz de diferenciá-la dos seus concorrentes
porque, provavelmente, eles também têm sistemas de produção bem
estruturados e, talvez, até melhores. Porém, essa empresa pode trans-
formar seu processo de fabricação em uma competência essencial se
inserir competência tecnológica, treinamento e informação para custo-
mizá-lo. Por exemplo, ela pode ter um sistema de monitoramento das
demandas dos consumidores, que são ajustadas por uma equipe de
pesquisa e desenvolvimento e implementadas na sua linha de monta-
gem para novos equipamentos e treinamentos.

Agora, vamos aplicar as competências essenciais envolvendo a Netflix.

Estudo de caso
Para os mais velhos, a Netflix era uma empresa de aluguel de DVDs por correio. Você assinava o site, navegava nos
filmes que desejava alugar e esperava um envelope vermelho chegar à sua casa com o filme. Você assistia ao filme
e depois o devolvia pelo correio ou em algum lugar de devolução, geralmente disponibilizado em supermercados.
Então, qual era a competência essencial da Netflix? Entrega de conteúdo em casa. O modelo de negócios original
era poupar a viagem a uma locadora de vídeos. Sua mudança no modelo de negócios de DVDs para streaming
refletiu essa competência. A entrega de conteúdo em casa permitiu a eles que superassem a Blockbuster e muitas
outras empresas nesse setor. Hoje, a Netflix é conhecida como um serviço de streaming de vídeo.
Considere o que a Netflix é hoje. Ela não apenas entrega conteúdo de modo conveniente para nossas casas, mas
agora também cria conteúdo original. Essa decisão de negócios mais recente quebra seu alinhamento com sua
competência principal? De modo nenhum. A criação de conteúdo original reduz seus custos de licenciamento,
e enquanto o conteúdo é o que os clientes desejam, eles ainda estão alinhados com sua competência essencial.
Enquanto eles continuarem a tomar decisões que entregam conteúdo convenientemente em nossas casas (ou
dispositivos, pelo menos), eles continuarão se saindo bem.

Desse modo, além de olhar para fora de sua empresa, é muito im-
portante que você faça uma análise do que tem ao seu dispor para
competir, ou seja, quais são seus recursos, suas capacidades e suas
competências essenciais. Com base na análise do ambiente interno,
você pode definir realisticamente as suas ações estratégicas.

2.4 Propósito organizacional e


objetivos estratégicos
Vídeo
Agora que já entendemos que precisamos, inicialmente, fazer uma
análise detalhada de nossa situação atual (Figura 5), vamos, nesta se-
ção, moldar o que queremos de nossa organização.

54 Estratégia Empresarial
Figura 5
Processo de diagnóstico estratégico

Pestel
Propósito organizacional

Análise do
ambiente
externo Cinco forças
de Porter Visão e Objetivos Estratégia
Análise do missão estratégicos empresarial
ambiente Recursos
interno
Capacidades

Competências

Fonte: Elaborada pelo autor.

Ouvimos frequentemente que as organizações devem ter um propó-


sito, mas o que isso significa? Existem muitos rótulos que descrevem a di-
reção da empresa organizacional, mas será que precisamos de mais um?
Sim. Mas, para entender melhor esse recorte e definir todos os termos
que temos à nossa disposição com relação ao direcionamento estraté-
gico de uma empresa, vamos por partes.

A visão organizacional detalha como a organização deseja ser daqui


a alguns anos. Além de refletir as atividades cotidianas de uma maneira
clara, ela deve ser memorável e inspiradora. Por exemplo, a empresa
sueca Ericsson (fornecedora global de equipamentos, software e servi-
ços de comunicação) define sua visão como sendo o principal impul-
sionador em um mundo em comunicação total. Observe, no quadro a
seguir, a visão de outras duas grandes empresas.

Quadro 2
Visão das empresas

Empresa Visão

Google Fornecer acesso às informações do mundo em um clique.

Uber Acender oportunidades ao colocar o mundo em movimento.

Fonte: Uber, 2020; Google, 2020.

Diagnóstico estratégico: objetivos e propósito empresarial 55


Há também a missão, que descreve em que negócio a organização
se encontra (e em qual não) agora e projetando no futuro. Seu objetivo
é fornecer foco para a gerência e a equipe. Uma empresa de consul-
toria pode definir sua missão pelo tipo de trabalho que realiza, pelos
clientes que atende e pelo nível de serviço que presta. Por exemplo,
uma empresa de consultoria, com base no serviço que oferece e nos ti-
pos de clientes que atende, poderia ter como missão: “Fornecemos, por
meio de serviços de consultoria e assessoria, assistência de alto padrão
para avaliação do desempenho de mercado de empresas pequenas e
médias do setor financeiro”. Observe, no quadro a seguir, a missão do
Google e da Uber.

Quadro 3
Missão das empresas

Empresa Missão

Organizar as informações e tornar o mundo universalmente


Google
acessível e útil.

Tornar o transporte tão confiável quanto água corrente, em qual-


Uber
quer lugar e para todos.

Fonte: Uber, 2020; Google, 2020.

Os valores descrevem a cultura desejada. Como a Coca-Cola colo-


ca, eles servem como uma bússola comportamental. Os valores dessa
empresa incluem ter a coragem de moldar um futuro melhor, ala-
vancar a genialidade coletiva e ser real, responsável e comprometido
(COCA-COLA, 2020).

Os principais valores da Uber compreendem: visão global com foco


local, preocupação constante com os clientes, respeito às diferenças,
ter uma postura empreendedora sempre, valorizar ideias acima da hie-
rarquia e ousadia. Os valores atribuíram para a Uber uma posição de
compartilhamento de transporte mais dinâmico, confiável e progressi-
vo (UBER, 2020).

Então, como o propósito difere de todos esses itens, que enfa-


tizam como a organização deve se ver e se comportar? Vamos usar
um exemplo para entender. Você decidiu abrir uma imobiliária em
sua cidade e fala para seus colegas e funcionários que o seu pro-
pósito é “tornar o processo imobiliário simples, eficiente e sem es-

56 Estratégia Empresarial
tresse para as pessoas que compram e vendem um imóvel”. Isso
traz o foco externo a um nível totalmente diferente, não apenas
enfatizando a importância de atender aos clientes ou entender suas
necessidades, mas também faz com que os gerentes e funcioná-
rios se coloquem no lugar deles. Você não está querendo apenas
lucrar, você está fazendo algo por outra pessoa, assim o lucro será
consequência disso. É uma mensagem motivacional, visto que se
conecta à emoção e à razão de todas as partes, é como se fosse um
batimento cardíaco filosófico. Vamos observar, no quadro a seguir,
alguns exemplos de propósito.

Quadro 4
Propósito das empresas

Empresa Propósito

A Uber é uma empresa estruturada como uma rede de transportes que funciona por
meio de um aplicativo, uma plataforma de conexão entre usuários e motoristas inde-
pendentes. Ela está em mais de 60 países com 100 milhões de usuários ativos. A Uber
é reconhecida no cenário mundial por meio de sua tecnologia disruptiva de mobilidade.
Uber
O propósito da Uber é democratizar e tornar a mobilidade urbana compartilhada e in-
dependente. Isso significa que a Uber não visa ao transporte de passageiros em si, mas
ao compartilhamento, à independência de escolha do usuário e a uma alternativa para
um problema urbano, a mobilidade.

A Body Shop é uma empresa de varejo de produtos de alta qualidade para cuidados
com a pele e o corpo. Hoje, a Body Shop opera em mais de duas mil lojas em 51 países.
The Body Shop Ela estabeleceu uma reputação de empresa social e ambientalmente responsável.
O propósito da Body Shop é “valorizar sem explorar”. Para eles, isso significa valorizar as
pessoas, o planeta e sua biodiversidade.

O Virgin Atlantic Group é uma empresa inglesa impulsionada inicialmente pela parti-
cipação em companhias aéreas. Ela é uma organização internacional com mais de 30
destinos mundiais. No entanto, hoje, a empresa possui negócios em vários setores, de
Virgin Atlantic
serviços financeiros a ferrovias, de refrigerantes a cosméticos.
Group
O propósito da Virgin é mudar os negócios para sempre por meio do bem, assim o
direcionamento das decisões na empresa é dado pelo impacto a longo prazo para os
clientes, as pessoas, as comunidades e o meio ambiente.

Fonte: Elaborado pelo autor com base em Uber, 2020; The Body Shop, 2019; Virgin Atlantic Group, 2019.

Diagnóstico estratégico: objetivos e propósito empresarial 57


Você deve estar se perguntando: toda empresa tem um propósito?
Não necessariamente. Se o único objetivo da empresa for gerar lucro e
ter o foco no retorno financeiro, não.

O propósito é ir além da visão, da missão, dos valores e dos ob-


jetivos. É saber responder por que você existe e, a partir da sua exis-
tência, fazer todos à sua volta quererem fazer parte do movimento
que você criou. Você deve inspirar os colaboradores e expressar o
impacto da organização na vida de clientes, da comunidade, dos for-
necedores e da sociedade em geral.

Agora que temos nosso propósito definido e nosso diagnóstico es-


Atividade 2
tratégico realizado, vamos aos nossos objetivos estratégicos. O primeiro
Por que o propósito move o passo é determinar a missão da organização, que é um objetivo geral ge-
processo estratégico?
nérico para a empresa. A declaração da missão é o primeiro passo para
definir a direção estratégica, e ela deve descrever o escopo de negócios
atual da empresa. Ela identifica “quem é você” e “o que você faz”, ou
seja, identifica os produtos e serviços oferecidos pela empresa, os tipos
de clientes que ela possui, seus negócios, capacidades e competências.
A missão é usada como base para decidir aonde a empresa quer ir no
futuro e incorpora os três elementos listados a seguir:
•• Necessidades dos clientes: o que está sendo satisfeito.
•• Grupos de clientes: quem está sendo satisfeito.
•• As atividades, capacidades e competências da empresa: como
a empresa está satisfazendo os desejos e as necessidades de
seus clientes.

Vamos construir, juntos, um Estudo de caso envolvendo um hotel, o


qual denominaremos Hotel Bela Vista.

Estudo de caso

Missão do Hotel Bela Vista


Nos dedicamos a fornecer o melhor atendimento e conforto para nossos clientes. Nós fornecemos as melhores
soluções em gastronomia e acomodação para nossos hóspedes. Todos os nossos quartos estão bem equipados
com tudo que nosso hóspede precisa e oferecem uma vista inspiradora da paisagem local. Nossos outros serviços
incluem eventos, loja de conveniência e passeios turísticos. Nossa excelente infraestrutura e nossos serviços de
classe mundial nos tornam um excelente local para casamentos, festas de aniversário, festas de formatura etc. Nós
nos esforçamos para atender até às necessidades e aos desejos não expressos por nossos hóspedes.

58 Estratégia Empresarial
Em seguida, precisamos definir a visão para a organização, que es-
sencialmente indica uma orientação de longo prazo para a empresa.
Uma declaração de visão normalmente considera a posição e a situa-
ção da empresa para os próximos cinco anos. Ela responde às seguin-
tes perguntas-chave:
•• Onde queremos estar daqui a cinco anos?
•• Que produtos e serviços novos devemos oferecer?
•• Que posição no nosso setor queremos ter?
•• Quais são as mudanças pelas quais nossos clientes-alvo estão
passando?
•• Quais novos grupos de clientes-alvo queremos servir?

A visão é um precursor dos objetivos e das metas. Ela molda a dire-


ção e o caminho dos negócios pelos próximos cinco anos e visa enten-
der as mudanças nos negócios atuais (NIVEN; LAMORTE, 2016).

Estudo de caso

Visão do Hotel Bela Vista


Queremos ser lembrados especialmente por nossa hospitalidade, saúde e bem-estar únicos e culinária deliciosa.
Queremos ser o melhor do setor, tanto nacional quanto internacionalmente. Para esse fim, nosso objetivo é adotar
práticas comerciais sustentáveis e ecológicas e proporcionar uma experiência saudável, confortável e segura,
fornecendo uma experiência incomparável ao usuário por meio de conectividade contínua e bom atendimento.

Uma vez definida a visão de negócios, o próximo passo é definir os


objetivos estratégicos. A definição desses objetivos transforma a visão
estratégica em metas de desempenho específicas para todos dentro da Figura 6
Framework da metodologia
empresa. Os objetivos demostram o comprometimento de todos com SMART
ações e resultados estratégicos.

Segundo Doran (1981),


para serem eficazes, os obje-
tivos devem atender aos crité-
rios SMART, apresentados na
Figura 6.

Fonte: Adaptada de RedlineVector/Shutterstock.

Diagnóstico estratégico: objetivos e propósito empresarial 59


S (Specific – Específico)

Você deve ser específico sobre o que deseja realizar. Essa não deve
ser uma lista detalhada de como você alcançará um objetivo, mas uma
reflexão levando em conta as respostas para as perguntas 6W:
•• Who (quem?): considere quem precisa ser envolvido e é respon-
sável pelos objetivos; isso é especialmente importante quando
você estiver trabalhando em um projeto de grupo.
•• What (o quê?): pense exatamente no que você está tentando
realizar; faça isso com detalhes.
•• When (quando?): defina um prazo para as ações a serem
realizadas.
•• Where (onde?): identifique, se houver, um local onde as ações
serão realizadas.
4 •• Which (quais?): determine quaisquer obstáculos ou requisitos
Por exemplo, se o objetivo é relacionados; essa questão ajudará você a decidir se seu objetivo
abrir uma pizzaria, mas você 4
é realista .
nunca cozinhou antes, isso pode
ser um problema. Assim, você •• Why (por quê?): estabeleça o motivo do objetivo; isso ajuda, espe-
poderá refinar as especificidades cialmente, os funcionários a atribuírem sentido para suas ações.
do objetivo, como “aprender
a fazer pizzas para abrir uma
pizzaria”. M (Measurable – Mensurável)

Quais métricas você usará para determinar se chegou aos seus ob-
jetivos? Assim, você torna um objetivo mais tangível porque fornece
uma maneira de medir seu progresso. Se é um projeto que vai demorar
alguns anos ou meses para concluir, defina alguns marcos intermediá-
rios, considerando tarefas específicas a serem realizadas. Os marcos
são uma série de etapas ao longo do caminho que, quando somadas,
resultarão na conclusão do seu objetivo principal.

A (Attainable – Alcançável)

O objetivo deve ser alcançável. Assim, a definição de objetivos requer


que você tenha feito um bom diagnóstico interno com uma avaliação cui-
dadosa e a compreensão das capacidades dos recursos organizacionais.

60 Estratégia Empresarial
Filme
R (Relevant – Relevante)

Para você estabelecer objetivos relevantes, tenha sempre em men-


te o propósito da organização e o vincule à visão e à missão gerais da
organização. Objetivos desalinhados com essas partes de uma empre-
sa resultarão apenas em confusão, desvio de direção e desperdício de
recursos organizacionais valiosos.
No filme À procura da felici-
dade, conta-se a história da
T (Time Bound – Temporal) vida real de Chris Gardner,
um pai solteiro que viveu
Você deve estabelecer prazos para os objetivos a serem realizados. nas ruas com seu filho até
ter sua própria corretora.
Isso é importante para avaliar se a organização obteve êxito em alcan- O filme é instigante e
çar seus objetivos. As restrições de tempo devem ser definidas levan- mostra algumas duras
realidades da vida. Você
do-se em consideração o ambiente em que você deseja implementar ficará encantado com a
as suas mudanças estratégicas. maneira como ele lida com
as dificuldades pelas quais
Agora que conhecemos os objetivos estratégicos, vamos analisá-los ele e seu filho passam e
terá ótimas sugestões para
no nosso Estudo de caso relacionado ao Hotel Bela Vista (Quadro 5). sua história estratégica.

Direção: Gabriele Muccino. EUA,


Quadro 5 2006.
Dez objetivos estratégicos para o Hotel Bela Vista

Objetivos para clientes


Manter um excelente atendimento ao cliente, de modo que as reclamações sejam próximas de zero
1
e o nível de satisfação seja de pelo menos 90% nos 12 primeiros meses de operação.
Oferecer para nossos clientes, nos primeiros cinco anos de operações, pelo menos, esportes de
2
aventura, como caminhadas em trilhas e mountain bike.

3 Atrair mais 25% de clientes internacionais nos primeiros dois anos de operações.

Objetivos operacionais
Implementar sistemas de informação, de modo que 90% a 100% das principais funções e dos servi-
4
ços sejam suportados por sistemas de informação nos primeiros 24 meses de operação.

5 Mapear os processos essenciais do negócio nos seis primeiros meses de operação.

6 Oferecer sistema de reserva on-line, de modo que represente 60% da receita total em até três anos.

Objetivos de recursos humanos


7 Obter certificações específicas para hotelaria dentro de três anos de operação.

Desenvolver forte reconhecimento da marca entre os clientes-alvo com base na excelência do aten-
8 dimento nos três primeiros anos de operação, de modo que 80% dos clientes-alvo estejam familiari-
zados com a marca do hotel.
(Continua)

Diagnóstico estratégico: objetivos e propósito empresarial 61


Objetivos financeiros
Obter um crescimento de 50% na receita bruta por meio de diferentes ofertas de produtos e serviços
9
até o final do terceiro ano de operação.

10 Reduzir as despesas em 5% e aumentar o lucro líquido em 10% anualmente.

Fonte: Elaborado pelo autor.

Se você retornar à missão e à visão do nosso estudo (Hotel Bela


Vista), você perceberá que há um alinhamento desses dez exemplos de
objetivos estratégicos. Em sua missão e visão, o hotel deixa claro que
quer ser internacional e ter sua marca reconhecida pela prestação de
serviços excelentes e diversificados. Então, em seus objetivos, pode-
mos perceber ações específicas para o processo de internacionaliza-
ção, diversificação de serviços, qualidade no atendimento e melhoria
na percepção de marca.
Atividade 3 Assim, compreendemos que antes de termos objetivos e metas es-
Qual é a real contribuição da tratégicos, pelos quais seremos cobrados, é importante que a organiza-
ferramenta SMART? ção faça uma reflexão e deixe claro para todos qual é o seu propósito,
sua visão, sua missão e seus valores. Dessa maneira, todos os envolvi-
dos estarão mais comprometidos em atingir as metas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Podemos juntos percorrer os estágios iniciais do processo estratégico,
ou seja, analisar onde estamos e projetar aonde queremos ir. Essa fase
inicial do trabalho, que envolve planejar e implementar a estratégia em-
presarial, é de suma importância porque, além de organizar as ações den-
tro da empresa, irá mostrar a todos os stakeholders, internos e externos,
sua posição e o que você pretende fazer. Assim, você e sua organização
terão comprometimento global para montar uma base de recursos sólida,
desenvolver capacidades e adquirir competências. Com isso, a empresa
terá mais alternativas para estabelecer e atingir seus objetivos.
No entanto, de nada adianta uma empresa ter realizado todo esse
processo de análise estratégica e ter estabelecido objetivos claros se
não há algo por trás disso tudo, uma inspiração, um propósito. Essa é
a verdadeira fonte da vantagem competitiva que nunca será perdida,
pois há uma alma que abrange e estimula a criatividade e aplicabilida-
de das ações.

62 Estratégia Empresarial
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GABARITO
1. Recursos são ativos de uma empresa; capacidades possibilitam aos recursos que se-
jam explorados; e competência é uma integração multifuncional e coordenação dos
recursos e das capacidades. A empresa com a maior base de recursos não necessa-
riamente será a mais competitiva, pois o que a torna competitiva é o uso do conjunto
de capacidades que ela desenvolveu e de competências que vai adquirindo à medida
que opera no ambiente.

2. O propósito é a fonte de inspiração que conecta você e sua empresa ao ambiente em


que estão inseridos. Com um propósito verdadeiro, todos irão querer se conectar e
seguir sua organização. Se a estratégia é o processo adaptativo do ambiente interno
com o externo, o propósito é o que cria esse elo.

3. Todo mundo, empresas e indivíduos, cria objetivos para ter em mente aonde se quer
chegar. Porém, uma simples lista de coisas para fazer não fará com que você chegue
a lugar algum. Assim, a grande contribuição da técnica SMART é proporcionar a todos
os envolvidos uma visão genérica do que está sendo e o que será feito dentro da or-
ganização, comprometendo as pessoas e gerando formas alternativas e criativas para
se chegar a realizar sua visão.

64 Estratégia Empresarial
3
Posicionamento e
valor sustentável
Após aprender a fazer o diagnóstico estratégico, você estará
pronto para posicionar sua empresa no mercado. Um meio de
fazer isso é estabelecer diferenças entre sua empresa e seus con-
correntes para que, dessa forma, seus consumidores percebam os
benefícios de fazer negócios com você. A essência da estratégia é
fazer diferente e ganhar em cima das diferenças que você criativa-
mente desenvolve depois de entender bem como o mercado em
que você está funciona.
Ao posicionar sua empresa de modo assertivo, você tem vanta-
gens em relação aos seus concorrentes. Assim, é necessário que
você proteja e desenvolva sua posição sempre criando uma distân-
cia entre você e a concorrência. Quando você é percebido como
diferente e tem apelo de seu público-alvo, podemos dizer que está
bem posicionado.
Com base nisso, neste capítulo, primeiramente, você aprenderá
a se posicionar de modo estratégico. Em segundo lugar, observará
como traçar estratégias e atividades que possibilitem a você e à
sua empresa uma atuação dentro desse posicionamento, a qual
será pautada pelo crescimento, pela estabilidade ou pela análise
de continuar ou não em determinado mercado. Por fim, dentro de
uma posição e com um conjunto de atividades que o levarão a atin-
gir seus objetivos, você analisará quais atividades realmente geram
valor para sua empresa e garantem sua vantagem competitiva.

Posicionamento e valor sustentável 65


3.1 Estratégias competitivas genéricas
Vídeo
As estratégias genéricas foram apresentadas pela primeira vez em
1
dois livros de Michael Porter, que sugeriu que algumas das escolhas
mais básicas enfrentadas pelas empresas envolvem essencialmente a
escolha de seus mercados-alvo e a competição nesses mercados.

Estratégias competitivas genéricas concentram-se nas maneiras pe-


1 las quais uma empresa pode alcançar uma posição vantajosa em seu
As duas obras de Porter que setor (CARR; PEARSON, 1999). A vantagem na posição é o que gera ga-
abordam as estratégias genéricas
nho para uma empresa, que, na prática, é obtido por meio do lucro, isto
pela primeira vez são a intitulada
Competitive strategy: techniques é, pela diferença entre as receitas e os custos. Assim, podemos afirmar
for analysing industries and que é possível obter lucro de duas maneiras: com custos mais baixos
competitors, de 1980, e a deno-
ou com preços mais altos.
minada Competitive advantage:
creating and sustaining superior A base da vantagem competitiva está na venda de produtos e ser-
performance, de 1985.
viços diferentes por preços maiores ou na estrutura de custos baixos
(PORTER, 1985). Desse modo, você pode comercializar produtos dife-
rentes mais caros ou ter uma estrutura de custos mais baixos atuando
no mercado de modo abrangente ou mais restrito. A figura a seguir
mostra essa relação.

Figura 1
Variáveis da estratégia competitiva
Mercado amplo

Liderança
Diferenciação
de custo

Custo baixo Produtos / serviços


diferenciados

Nicho Nicho de
de custo diferenciação

Mercado restrito
Fonte: Elaborada pelo autor.

66 Estratégia Empresarial
Com base na Figura 1, você deve levar em conta quatro variáveis:
custo, diferenciação, mercado amplo e mercado restrito. Por exemplo,
suponha que você tem uma empresa de confecção de roupas, você
pode optar por: vender no mercado brasileiro geral com custo baixo;
vender suas peças com preço maior, tendo em vista uma marca co-
nhecida; atender a um mercado bem específico, como o de uniformes
escolares, com preço baixo; ou atender ao mercado restrito de roupas
de luxo, com preços mais altos. Não existe opção melhor ou pior, as
quatro podem levar ao mesmo nível de lucratividade. Veja como isso
ocorre de maneira específica:
•• Se vender 1 milhão de peças por mês para o Brasil todo e seu lucro
por peça for de R$ 1,00, no fim, seu lucro será de R$ 1.000.000,00.
•• Se vender 10 mil peças de roupa com base em sua marca no Bra-
sil e seu lucro por peça for de R$ 100,00, seu lucro, no fim, conti-
nuará sendo de R$ 1.000.000,00.
•• Se optar por vender uniformes escolares em sua cidade, fechar um
acordo com as escolas locais e vender 5 mil uniformes com o lucro
de R$ 200,00 por uniforme, você também obterá R$ 1.000.000,00.
•• Se escolher por trabalhar com produtos de luxo, você não preci-
sará vender muitas peças, por exemplo, mil peças a um lucro de
R$ 1.000,00 por peça geram um resultado de R$ 1.000.000,00.

Porter (1980) organizou esse raciocínio em três estratégias compe-


titivas genéricas: liderança de custo, liderança de diferenciação e lide-
rança de foco.

3.1.1 Liderança de custo


As organizações que tentam fabricar seus produtos com menor cus-
to em um setor específico utilizam a estratégia de liderança de custos
(PORTER, 1980). Uma empresa com custos mais baixos obtém seus lu-
cros quando os produtos concorrentes não possuem muitos diferen-
ciais e são vendidos a um preço de mercado padrão. As companhias
que seguem essa estratégia enfatizam a redução de custos em todas as
suas atividades (RUMELT, 2011).

É importante observar que uma empresa pode ser líder em custos,


mas isso não implica que seus produtos sejam necessariamente ven-
didos a um preço mais baixo ou que sejam produtos de qualidade in-
ferior. Em certas situações, a empresa pode, por exemplo, cobrar um

Posicionamento e valor sustentável 67


preço médio enquanto segue a estratégia de liderança de baixo cus-
to (LYNCH, 2003). Observe o Estudo de caso a seguir sobre a Ryanair,
uma companhia aérea irlandesa de baixo custo com sede em Dublin,
fundada em 1985, que opera 729 rotas pela Europa e norte da África
(DIACONU, 2012).

Estudo de caso

A Ryanair obteve grande sucesso nos últimos anos devido ao seu modelo de negócios
de baixo custo e se tornou a maior companhia aérea do mundo em termos de número
de passageiros internacionais. Levando em consideração as estratégias genéricas de ne-
gócios de Porter (1985), essa empresa opera uma estratégia de liderança de custos. O
objetivo da Ryanair é se estabelecer como a principal companhia aérea de passageiros
da Europa, por meio da oferta de tarifas baixas.
As tarifas baixas são projetadas para estimular a demanda, atraindo os viajantes que se
preocupam com a tarifa, os que usavam formas alternativas de transporte ou aqueles
que não tinham o hábito de viajar de avião. As passagens são vendidas quase que ex-
clusivamente em seu site, o que reduz os custos de vendas.
Os serviços a bordo das aeronaves são básicos. Isso significa que a tarifa inclui apenas
o voo, assim há algumas medidas diferentes diretamente relacionadas ao custo: o em-
barque é sem bilhete, os assentos não são marcados, há custo adicional de bagagem
para o passageiro e para o check-in antecipado, seguem uma política de não reembolso,
os assentos são básicos (para aumentar a capacidade da aeronave) e há cobrança por
qualquer serviço adicional. Tudo isso reduz significativamente os custos para a empresa.
A Ryanair voa para aeroportos secundários, onde pode negociar de modo extremamen-
te agressivo e exigir as mais baixas taxas de desembarque e operação em solo.
Essa organização compra aeronaves novas e padronizadas, o que lhes proporciona poder
de barganha na encomenda de várias das mesmas aeronaves. Além disso, aviões padro-
nizados proporcionam uma economia no treinamento de pessoal, como comissários,
pilotos e técnicos. Ao comprar aviões novos, a empresa possui mais segurança e econo-
miza no consumo de combustível e manutenção.
A política de recursos humanos também está diretamente relacionada à redução de
custos. Os funcionários devem pagar por seu próprio uniforme e equipamento. O treina-
mento ministrado é o mínimo exigido e a utilização da equipe está entre as mais altas
do setor aéreo. Muitos funcionários estão empregados em contratos de desempenho, e
aqueles que não atendem às expectativas são substituídos. Também, é esperado que
o pessoal assuma várias funções, por exemplo, o pessoal da cabine faz a limpeza da
aeronave antes do próximo voo e o pessoal do check-in ajuda no embarque na aeronave.

68 Estratégia Empresarial
Wilson e Gilligan (2012) observam que o risco de seguir a estratégia
de liderança de custos está no foco excessivo para redução de custos.
Muitas vezes, a busca obsessiva pelo custo mais baixo gera uma perda
de visão do porquê da escolha, além de fazer com que a empresa aban-
done qualquer nova oportunidade e se feche para inovações.

3.1.2 Liderança de diferenciação


Quando uma empresa diferencia seus produtos e serviços, geral-
mente é capaz de cobrar um preço premium por eles. Algumas manei-
ras genéricas de diferenciação incluem melhorias nos níveis de serviço,
no desempenho do produto, na imagem ou no atendimento em com-
paração com os concorrentes existentes (HENDERSON, 1981). A seguir,
observe o caso da Apple (BAROTO; ABDULLAH; WAN, 2012).

Estudo de caso

Antes conhecida apenas por seus computadores, a Apple tornou-se uma grande em-
presa de tecnologia que oferece de tudo, desde eletrônicos pessoais a streaming de
entretenimento. Por meio de seu modelo de negócios com base em inovação e design,
a Apple se estabeleceu como precursora em marketing, serviços diferenciados e ven-
das customizadas.
A Apple tem uma estratégia de diferenciação multifacetada, pois está continuamente
inovando e oferecendo novas linhas de produtos e serviços excelentes para o cliente. Ela
capitaliza sua diferenciação na própria marca, que se tornou parte da cultura por meio
de suas campanhas publicitárias e colocação de produtos.
Um dos fatores mais bem-sucedidos da estratégia da Apple é a criação de seu próprio
“ecossistema”. A linha de produtos Apple foi projetada para integrar e compartilhar
todo seu conteúdo e sua mídia em seus dispositivos. Esse ecossistema oferece aos
usuários a capacidade de compartilhar seus arquivos do iPad para o iPhone, para o
computador ou para a Apple TV. Sair do ecossistema não seria apenas caro para o
usuário, mas também seria complicado assimilar a mesma facilidade de uso nos dis-
positivos concorrentes.
Outro importante fator de sucesso é a inovação contínua com o lançamento constante de
novas ofertas. Assim, a Apple mantém sua posição como líder do mercado de tecnologia.

Posicionamento e valor sustentável 69


Porter (1980) argumenta que uma empresa que adota a estratégia
de diferenciação incorre em custos extras, que são compensados por
um preço mais alto. Podemos citar como exemplos desses custos um
gasto mais alto com publicidade para promover uma imagem de marca
Atenção diferenciada, um sistema de gestão e vendas mais moderno e customi-
Caso opte por adotar uma estra- zado e mais pessoas para prestar um melhor atendimento.
tégia de diferenciação, você não
pode considerar isso como custo, A diferenciação oferece muitas vantagens em termos de posiciona-
mas como um investimento. mento de mercado para a empresa, mas há uma dificuldade em esti-
mar se os custos extras envolvidos nessa estratégia podem realmente
ser recuperados por meio de preços premium para o cliente, ou seja,
não se sabe ao certo se o cliente irá ver vantagem em arcar com esse
preço maior.

Além disso, uma estratégia de diferenciação bem-sucedida geral-


mente atrai concorrentes para o segmento, que tendem a copiar a
oferta de produtos diferenciados similares com um preço mais baixo
(LYNCH, 2003).

3.1.3 Liderança de foco


Porter (1985) inicialmente apresenta o foco como uma estratégia
genérica independente, mas depois o identifica como um moderador
das duas estratégias principais: custo e diferenciação. As empresas em-
pregam a estratégia de foco concentrando-se nas áreas de um mercado
em que há menos concorrência (CARR; PEARSON, 1999). Elas também
podem se focar em um nicho específico do mercado e oferecer produtos
especializados para ele. É por isso que a estratégia de foco também é
chamada de estratégia de nicho (LYNCH, 2003).

Portanto, a vantagem competitiva pode ser alcançada apenas nos


segmentos-alvo bem restritos e bem definidos pela empresa, que pode
fazer uso da liderança de custo ou diferenciação em relação a um foco
no mercado.

Nesse sentido, a empresa que utiliza o foco em custo visa apenas


uma vantagem de custo em seu segmento-alvo. Paralelamente, se uma
empresa estiver usando a abordagem de foco de diferenciação, ela
agirá com ofertas diferenciadas apenas no segmento-alvo, e não no
mercado geral.

70 Estratégia Empresarial
Observe o caso Ferrari, a seguir, e sua estratégia de nicho de dife-
renciação (FERRARI, 2020).

Estudo de caso

A Ferrari fabrica carros esportivos e é conhecida por sua participação no automobilismo


mundial, especialmente na Fórmula 1. Além disso, essa empresa é reconhecida por seus
carros superluxuosos de alto desempenho, posicionando-se como uma fabricante arte-
sanal de carros em segmento de mercado exclusivo para quem busca alta performance.
A marca Ferrari é um símbolo de status, potência e design exclusivo.
Essa organização é voltada para um nicho de mercado muito específico porque pou-
quíssimas pessoas podem comprar seus carros, mesmo sendo, talvez, a marca de auto-
móveis mais desejada do mundo. Pessoas com renda muito alta e forte interesse em se
destacar por seu status, interessadas em carros esportivos de luxo, são seu público-alvo.
A maioria dos compradores, além da alta renda, tem entre 25 e 50 anos, pertencem
ao sexo masculino e usam a Ferrari como uma atividade de lazer. Seus compradores
não economizam nada em relação à Ferrari, pois, mais que um objeto de consumo, a
consideram um estilo de vida. Para os consumidores, a Ferrari é um símbolo de poder,
força, confiança, ousadia e velocidade.

2
Empresas que utilizam a estratégia de nicho, tanto de custo quanto As economias de escala estão
de diferenciação, têm uma pequena parcela do mercado total porque relacionadas às vantagens
obtidas quando a produção se
encontraram um segmento pequeno e focado, com poucos concorren- torna eficiente. As empresas
tes. Assim, uma possível desvantagem dessa estratégia é que o nicho obtêm economias de escala
aumentando a produção e redu-
escolhido talvez não seja significativo ou grande o suficiente para justi- zindo os custos. Quanto maior
ficar a atuação exclusiva da empresa. for a economia nos custos e na
produtividade, menor será o cus-
O foco nos custos pode ser difícil em setores nos quais as econo- to unitário dos produtos, o que
2 possibilita à empresa trabalhar
mias de escala desempenham um papel importante. Existe o perigo
com preços mais baixos.
evidente de que o nicho possa desaparecer à medida que o ambiente
de negócios e as preferências dos clientes mudem ao longo do tempo.
3
3
Agora, analise o caso de um motel dos Estados Unidos da América
Nos EUA, o conceito de motel
(EUA) e sua estratégia de nicho de custo (COLLINS; PARSA, 2006). significa hotéis geralmente em
estradas ou áreas mais distantes
do centro das cidades com pre-
ços baixos e com oferta restrita
de serviços como entretenimen-
to e restaurante. Esses motéis
servem essencialmente para os
hóspedes passarem a noite.

Posicionamento e valor sustentável 71


Estudo de caso

O Motel 6 é uma cadeia de hotéis nos EUA que opera com preços imbatíveis no setor
de hospitalidade desde 1962, sendo a maior cadeia de hotéis supereconômicos. Sua
diária média atualmente é de aproximadamente US$ 51,00, e a média nacional é de
US$ 150,00.
Ele se destaca como uma cadeia de acomodações básicas, com quartos com decoração
funcional, o que reduz o tempo para que sejam limpos, e não oferece refeições. A oferta
do Motel 6 vai para qualquer pessoa que se preocupa com a economia e bons serviços
hoteleiros: executivos, profissionais liberais, aposentados, famílias com crianças peque-
nas, estudantes ou estrangeiros que precisam de um quarto de uma semana a um mês.

Segundo Porter (1980), a empresa fracassa quando não consegue


fazer uma escolha entre liderança de custo e de diferenciação, ou seja,
ela fica presa entre uma estratégia e outra. De acordo com o autor, em
Atividade 1 casos assim, essa organização está em desvantagem competitiva e o
Suponha que você decidiu resultado geralmente é um fraco desempenho financeiro.
abrir um bar que possibilita às
pessoas criarem, produzirem e No entanto, há divergências sobre esse aspecto da análise. Kay
consumirem cervejas artesanais. (1993) e Miller (1992) citam como exemplos de empresas bem-sucedi-
Qual estratégia genérica você
adotaria? Por quê?
das a Toyota e a Benetton, que adotaram mais de uma estratégia gené-
rica, utilizando a de diferenciação e a de baixo custo simultaneamente,
o que contribuiu para o seu sucesso.

3.2 Estratégias de negócios


Vídeo Após ter decidido o posicionamento de sua empresa (sua estratégia
genérica), você precisa decidir como sua organização atuará para atin-
gir seus objetivos, cumprir sua missão e alcançar sua visão.

O senso comum dos negócios geralmente nos leva a acreditar que,


para termos vantagem competitiva, devemos sempre crescer, indepen-
dentemente da estratégia genérica adotada. Todavia, isso nem sempre
é verdade, visto que o crescimento pode ser prejudicial à sustentabili-
dade da empresa. Um crescimento desenfreado, não estratégico, pode
afetar a lucratividade e o posicionamento.

Por exemplo, se você tem um restaurante, que está em um nicho di-


ferenciado e serve 40 pessoas, e decide, sem analisar estrategicamen-
te a real demanda, alugar o imóvel ao lado do seu empreendimento
para crescer, você terá apenas uma certeza: seus custos irão aumentar

72 Estratégia Empresarial
Livro
muito. Além do custo do aluguel do novo imóvel, você terá de contratar Por meio da leitura do
mais pessoas para atuar na cozinha e servir, a fim de manter a qualida- livro Estratégia boa, estra-
tégia ruim: descubra suas
de da sua comida e do seu atendimento. Esse aumento nos custos só diferenças e importância,
compensará se você tiver uma demanda extra estimada de 20 pessoas, você pode ter acesso a
exemplos muito interes-
ou seja, um restaurante maior, que mantém o posicionamento e pas- santes sobre a estratégia
sa a servir 60 pessoas com a mesma qualidade e atendimento. Assim, adotada por organiza-
ções diferentes. Nessa
você deverá refletir se a melhor alternativa para seu restaurante é cres- obra, o autor argumenta
cer ou manter as coisas como estão. que uma estratégia boa
vem do insight sobre
Em termos práticos, uma decisão, como a apresentada nesse exem- a verdadeira natureza
da situação em que a
plo, faz parte do que denominamos estratégia empresarial ou estratégia empresa está. Ainda, o
de negócios – o que de fato você irá fazer, dentro destas amplas opções: insight pode ser cultivado
por uma variedade de
crescimento, estabilidade ou redução de suas atividades. ferramentas que dire-
cionam o pensamento

3.2.1 Estratégia de crescimento coletivo na empresa.

RUMELT, R. Rio de Janeiro: Elsevier,


2011.
Crescer significa melhorar alguma medida de desempenho da em-
presa, que pode ser o número de funcionários, a base de clientes, a
cobertura internacional, os lucros etc., mas o crescimento é de fato de-
terminado em termos de receita.

Existem diferentes maneiras de gerar o crescimento do negócio.


Ansoff, Declerck e Hayes (1981) identificam quatro estratégias de cres-
cimento e as resumem na denominada Matriz de Ansoff. Essas estra-
tégias são:

a. Penetração no mercado: consiste em vender mais dos atuais


produtos da empresa para mercados existentes. Para penetrar e
aumentar a base de clientes no mercado, uma empresa pode reduzir
preços, melhorar sua rede de distribuição, investir mais em marketing
e aumentar a capacidade de produção existente.
b. Desenvolvimento de mercado: consiste em vender os atuais
produtos da empresa para novos mercados. Essa estratégia objetiva
atingir novos segmentos de clientes ou expandir nacional ou
internacionalmente, visando novas áreas geográficas.
c. Desenvolvimento de produtos: consiste em desenvolver e vender
novos produtos para mercados que já existem, fazendo algumas
modificações nos produtos existentes para agregar valor aos clientes
por sua compra ou desenvolver e lançar novos produtos com ofertas
já existentes.

Posicionamento e valor sustentável 73


d. Diversificação: consiste em entrar em novos mercados com novos
produtos relacionados ou não à oferta existente da empresa. A
diversificação, por sua vez, pode ser classificada em dois tipos de
estratégias:

•• Diversificação relacionada: consiste em entrar em um novo


mercado com um novo produto que esteja um pouco relacionado
à oferta de produto existente de uma empresa.

•• Diversificação não relacionada: consiste em entrar em um


novo mercado com um novo produto que não tem relação
alguma com a oferta existente de uma empresa.

Figura 2
Matriz de produtos e mercados esquematizada
Produtos

Existentes Novos
Existentes

Penetração Desenvolvimento
de mercado de produtos
Mercados

Desenvolvimento
Diversificação
Novos

de mercado

Fonte: Adaptada de Ansoff, Declerck e Hayes, 1981.

Para melhor compreender essas quatro estratégias, vamos supor


que você tem uma padaria. Em geral, vamos à padaria para comprar
itens para nosso café da manhã, lanches ou conveniências. Quando
a sua padaria local resolve, por exemplo, baixar os preços dos doces
para vender mais, ela está adotando uma estratégia de penetração de
mercado. Agora, quando você resolve abrir uma nova unidade em um
bairro diferente, está desenvolvendo o mercado. Ao criar um serviço
de café colonial, ou seja, fazer um buffet de lanche da tarde no mesmo
local de sua padaria, você utiliza uma estratégia de desenvolvimento

74 Estratégia Empresarial
de produtos. Por fim, se, ao lado da padaria, você abre um restaurante,
é uma estratégia de diversificação relacionada porque você já trabalha
com gastronomia. No entanto, caso divida esse novo espaço entre o
restaurante e uma loja de roupas, você estará adotando uma estratégia
de diversificação não relacionada.

Além do crescimento interno com base na Matriz de Ansoff, uma


empresa pode crescer horizontal ou verticalmente.

3.2.1.1 Integração horizontal


Essa é uma estratégia de crescimento com base na incorporação
de negócios relacionados com a atividade principal da empresa. Por
exemplo, uma cadeia de restaurantes de fast-food utiliza a estratégia
de integração horizontal quando compra empresas semelhantes em
outro país para conquistar uma posição no mercado externo. A integra-
ção horizontal pode ocorrer de duas maneiras: fusões e/ou aquisições
4 4
(ANYANWU; AGWOR, 2015).
Fusões e aquisições acontecem
Figura 3 quando duas ou mais empresas
Ilustração das estratégias de fusão e aquisição de empresas se unem e formam uma única
Fusão entidade, cooperando sinergi-
camente para alcançar objetivos
comuns (BRUNER; PERELLA,
+ → → 2004). A fusão ocorre quando
duas entidades separadas
combinam forças para criar
uma organização. Já a aquisição
Aquisição
acontece quando uma empresa
adquire outra.

→ →

Fonte: Elaborada pelo autor com base em Anyanwu e Agwor, 2015.


Objetivamente, podemos destacar as seguintes vantagens para uma
união horizontal: juntas, as empresas têm a capacidade de produção
em larga escala, o que resulta em menor custo unitário do que quando
produzem seus produtos sozinhas, em menor escala; há eliminação da
concorrência e, consequentemente, o aumento nas vendas; ocorre a
possibilidade de uso de marcas diferentes no mercado; e elas dispõem
de mão de obra especializada para todas as funções importantes, o
que gera mais eficiência. Além disso, quando duas empresas se inte-

Posicionamento e valor sustentável 75


gram horizontalmente, assumem um tamanho que lhes proporciona a
oportunidade de diversificação, redução de risco e atuação estratégica
no mercado (GALPIN, 2014).

Estudo de caso

Uma aquisição horizontal bem-sucedida em todos os sentidos é o caso da Disney, que,


em 2006, adquiriu a Pixar por US$ 7,4 bilhões. Desde então, filmes como Procurando
Dory, Toy Story 3 e WALL-E geraram bilhões em receita. Três anos após a aquisição da
Pixar, a Disney decidiu adquirir a Marvel Entertainment por US$ 4 bilhões. A Disney fa-
turou mais de US$ 18 bilhões desde a aquisição da Marvel com a produção de 23 filmes.

Segundo Cartwright e Cooper (2012), apesar de serem estratégias


de crescimento eficazes, as fusões e aquisições horizontais podem ge-
rar dois problemas com os quais os gestores devem se preocupar: a)
excesso de mão de obra para algumas funções, resultando em demis-
são ou relocação de funcionários, o que pode gerar insatisfação e um
clima organizacional ruim; e b) variações nos sistemas contábeis, que
podem gerar falta de informação e conhecimento na reconciliação das
contas, deixando os gestores, por algum tempo, sem uma clara ideia do
que está acontecendo.

3.2.1.2 Integração vertical


Essa é uma estratégia usada por uma empresa para obter controle
sobre seus fornecedores ou distribuidores, a fim de aumentar seu poder
no mercado, reduzir custos de transação e garantir o fornecimento nos
seus canais de distribuição. Por exemplo: um supermercado que vende
e fabrica produtos com sua própria marca possui atividades de manufa-
tura, distribuição e varejo. Existem dois tipos de integração vertical nos
quais as empresas combinam pelo menos duas das fases da cadeia de
suprimentos. A diferença depende de onde a empresa se originou:
a. Integração vertical direta: ocorre quando uma empresa parte
do início da cadeia de suprimentos, ou seja, da produção inicial, e
vai verticalmente para baixo, controlando os estágios posteriores;
por exemplo: uma mineradora que monta ou adquire uma fábrica
de aço para comercializar o produto final.
b. Integração vertical indireta: ocorre quando uma organização
parte do fim da cadeia de suprimentos e realiza atividades
verticalmente para cima; por exemplo: uma distribuidora de
filmes, como a Netflix, também fabrica seu próprio conteúdo.

76 Estratégia Empresarial
Figura 4
Representação da integração vertical direta

Cadeia de valor Nível de integração vertical

Nenhum Parcial Total

Matéria-prima

1
Fornecedores

2
Manufatura

3
Distribuição

4
Varejo

5
Consumidor final

6
Fonte: Elaborada pelo autor.

A Figura 4 mostra uma cadeia de suprimentos genérica na qual ini-


cialmente a extração de matéria-prima (1) é processada por fornecedo-
res (2), que entregam seus produtos semiacabados para uma fábrica
desenvolver seu processo de manufatura (3) de produtos, que são dis-
tribuídos (4) para o varejo (5) vender ao consumidor final (6).

Quando as atividades não são integradas verticalmente, cada em-


presa, isoladamente, é responsável por cada atividade e tem seus ga-
nhos com base nessa atividade. Uma empresa pode ter um processo
de integração vertical quando realiza duas ou mais atividades da ca-
deia, por exemplo, quando fabrica e distribui produtos.

A integração vertical total ocorre quando a empresa desenvolve to-


das as atividades da cadeia de valor. Cabe destacar que, tanto na inte-

Posicionamento e valor sustentável 77


gração parcial quanto na total, as atividades de cadeia são realizadas por
5 empresas independentes que pertencem ao mesmo conglomerado
5

Um conglomerado é uma empresarial.


corporação composta de vários
negócios diferentes, aparente- Uma vantagem da integração vertical é que a empresa pode con-
mente não relacionados. Em um trolar seu próprio fornecimento, evitando interrupções e garantido o
conglomerado, uma empresa
possui uma participação de
custo e a qualidade dos produtos que serão processados por ela. Es-
controle em várias empresas sas garantias permitem à empresa planejar mais assertivamente seu
menores que realizam negócios processo produtivo e sua estrutura de custos internos, gerando efeti-
separadamente.
vidade e economia de escala. Ainda, quando controla todo processo,
a empresa se comunica e vende melhor para seus consumidores. Há
um alinhamento na criação de mensagens de marketing com base na
mesma marca de produção, distribuição e venda final.

Percebemos vantagens consideráveis no processo de integração


vertical, mas a maioria das empresas encontrará dificuldades para de-
senvolver uma estratégia vertical, pois seu custo é muito alto. Uma em-
presa terá que investir uma grande quantidade de capital para montar
ou comprar fábricas que devem estar sempre funcionando para man-
ter a eficiência, as margens de lucro e o fluxo da cadeia. Isso reduz a fle-
xibilidade, e a empresa fica presa à lucratividade e à eficiência de suas
operações. Por exemplo, os varejistas não podem seguir as tendências
de mercado ou preferências do consumidor, que são diferentes do que
é feito pela fábrica verticalmente integrada. Mas, o maior problema es-
tratégico é a perda de foco. Administrar um varejo de sucesso requer
um conjunto de habilidades muito diferentes de uma fábrica ou de um
atacado. Uma empresa desfocada tem dificuldades para criar uma cul-
tura comum que possa atrair e desenvolver colaboradores que agre-
guem valor a todas as atividades da empresa.

Analise o Estudo de caso a seguir de Dirceu e sua churrascaria.

Estudo de caso

Dirceu montou uma churrascaria-rodízio em sua cidade e logo foi reconhecido pela
qualidade das carnes e do buffet, além do preço baixo. Após um ano de operação, sua
churrascaria estava sempre lotada com uma espera média de 30 minutos nos dias de
semana e duas horas nos fins de semana.
Assim, conversou com sua família e resolveu abrir uma filial em outro bairro da cidade
e combinou com sua esposa para gerenciá-la. Como sua marca, Churrascaria Nova Lua,
ficou conhecida rapidamente, não demorou para que o sucesso chegasse a essa nova
filial. Novamente, conversou com sua família e acertou com seu filho para abrir e geren-
ciar a terceira filial. Em menos de seis meses, ela também estava “bombando”.

78 Estratégia Empresarial
Assim, podemos dizer que os negócios para Dirceu e sua família estavam Figura 5
indo muito bem, até que a prefeitura sancionou uma lei proibindo que Exemplo de estratégia de
restaurantes armazenassem alimentos congelados em seus estabeleci- integração vertical indireta
mentos. Dirceu ficou muito preocupado porque fazia a compra de carnes
Fazenda
de frigoríficos em grande volume e as congelava para abastecer seus
restaurantes.
Diante dessa ameaça, resolveu integrar verticalmente suas atividades de
maneira indireta, abrindo um frigorífico. Logo chegou à conclusão de que Postos Nasa
o frigorífico daria prejuízo se ele existisse com a única finalidade de fornecer
carnes para seus restaurantes. Assim, abriu o Frigorífico Lua Crescente para
vender carnes para outros restaurantes, açougues e pequenos mercados na Transportadora
cidade. Como a atividade de um frigorífico é diferente do que estava acostu- Constelação
mado a fazer em seus restaurantes, teve um pouco de dificuldade inicial em
montar seu modelo de negócios e operação. Após dois anos de atividade, Frigorífico
atingiu o ponto de equilíbrio com seu frigorífico e começou a lucrar com essa Lua Crescente
nova atividade. Enquanto isso, suas três churrascarias estavam muito bem
e a qualidade, com o novo esquema de distribuição, melhorou muito. Seus Churrascaria
clientes não cansavam de elogiar a experiência que tinham no almoço e jan- Nova Lua
tar, o que possibilitou a Dirceu aumentar os preços sem perder sua clientela.
Outro gargalo que Dirceu percebeu em sua cadeia de valor foi o transporte Fonte: Elaborada pelo autor.
que nem sempre era confiável: cargas eram roubadas, atrasos aconteciam
com frequência e a armazenagem dentro dos caminhões não era muito eficiente e organizada.
Assim, Dirceu resolveu comprar três caminhões, dois grandes e um pequeno, para fazer o transporte
de carnes para seu frigorífico e deste para seus restaurantes. Como já tinha a experiência da aber-
tura do frigorífico, resolveu abrir a Transportadora Constelação. Logo fechou um contrato para levar
insumos para fazendas onde buscava a carne para seu frigorífico, ou seja, seus caminhões levavam
produtos da cidade para as fazendas e voltavam com carne. À medida que sua transportadora foi
crescendo, percebeu que seus motoristas precisavam de lugares com condições adequadas para
descansar. Dirceu mapeou a rota de viagem de seus caminhões e percebeu que sempre havia duas
paradas na rota principal, assim resolveu comprar os dois postos de combustíveis na estrada e mon-
tou a Rede Nasa de Postos de Combustíveis.
Como todos sabem, postos de beira de estrada oferecem serviços de alimentação, geralmente uma
churrascaria, ou seja, mais uma oportunidade para a Churrascaria Nova Lua. Como Dirceu estava
cansado de tantos empreendimentos, resolveu comprar uma fazenda para descansar e, é claro, de-
senvolver a atividade pecuária, matéria-prima de sua cadeia de valor.

À primeira vista, a integração vertical pode parecer uma estratégia


muito interessante e lucrativa, mas nem sempre ela é a melhor escolha,
por conta da necessidade alta de recursos para executar a estratégia e
do risco que é se aventurar em um novo setor.

No entanto, há algumas alternativas para a integração vertical que


podem gerar o mesmo efeito com custo e risco menores. As alternati-

Posicionamento e valor sustentável 79


vas variam de acordo com a quantidade de investimentos necessários
e com o nível de integração. Na figura a seguir, você pode visualizar as
opções que genericamente variam de parcerias relacionais a transa-
ções únicas de curto ou longo prazo. São elas: joint venture, contratos
de longo prazo (licenciamento e franchising), contratos de curto prazo
e transações únicas.

Figura 6
Alternativas para a integração vertical
Mais integração

1 Joint venture

2 Contratos de longo prazo:


• Licenciamento
• Franchising

3 Contratos de curto prazo

4 Transações únicas

Saiba mais Menos integração


Um exemplo de joint venture Fonte: Elaborada pelo autor.
que atua no mercado brasileiro É importante salientar que essas alternativas valem tanto para a in-
é a Renault-Nissan, que
tegração vertical quanto para a horizontal.
compartilham a área de P&D
(Pesquisa e Desenvolvimento) 1. Joint venture: modelo no qual duas empresas firmam uma parceria
e produção, mas produzem e
comercial para realizar uma atividade específica, que pode ser
competem com carros diferentes.
Outros exemplos são: BMW e a um novo projeto ou qualquer outra atividade empresarial. Como
Toyota cooperam na pesquisa duas empresas se unem para formar uma terceira empresa, os
de células de hidrogênio para
lucros, as perdas e os custos são inerentes a essa nova atividade.
combustível e veículos elétricos;
e Google e NASA desenvolveram É importante destacar que o novo empreendimento terá sua
o Google Earth. própria personalidade jurídica, logo não integrará os outros
interesses comerciais dos participantes.

80 Estratégia Empresarial
2. Contratos de longo prazo:

•• Licenciamento: acordo por meio do qual uma empresa Saiba mais


concede permissão à outra para fabricar seus produtos Cerca de 90% das vendas da
mediante uma contrapartida financeira. Permite a uma Calvin Klein vêm do licencia-
mento do nome do designer
empresa que explore instantaneamente os sistemas de para fabricantes de roupas
produção, distribuição e marketing que a outra desenvolveu íntimas, jeans e perfumes. A
por muito tempo. Em troca, há a taxa de licenciamento que, única mercadoria que a empresa
produz, de fato, são as linhas de
em geral, representa uma pequena porcentagem do preço vestuário feminino.
de venda.
•• Franchising: relacionamento comercial no qual uma empresa
(franqueadora) concede ao franqueado o direito de operar Saiba mais
e fazer negócios em seu nome. O franqueado geralmente
O mercado de franquias do
paga uma taxa inicial e royalties contínuos a um franqueador; Brasil é mundialmente um dos
em troca, o franqueado obtém o direito de usar a marca maiores. Saiba mais em: https://
comercialmente, de ter suporte contínuo do franqueador e de www.franquiaz.com.br/blog/
mercado-de-franquias-no-bra-
se apropriar da maneira como o franqueador faz negócios e
sil/. Acesso em: 13 abr. 2020.
vende seus produtos ou serviços. A maior vantagem para o
franqueado é adquirir um sistema de negócios comprovado e
treinamento de como usá-lo, evitando, assim, muitos dos erros
que os empreendedores iniciantes normalmente cometem.
3. Contratos de curto prazo: quaisquer contratos que uma empresa
faz com outra para que esta desenvolva alguma atividade ou
produza algum item que dê vazão à sua cadeia de valor. Por
exemplo: você pode fazer um contrato com uma transportadora
para fazer a distribuição de seus produtos.
4. Transações únicas: quando uma empresa precisa adquirir um
produto ou serviço, ela estabelece uma relação de consumo
transacional com a empresa que oferecer as melhores condições
em termos de preço, entrega e qualidade. Por exemplo: em
vez de fazer um contrato com uma transportadora para várias
transações, a empresa contrata fretes unitários sempre que
precisar.

3.2.2 Estratégias de estabilidade e de redução


A estratégia de estabilidade tem como foco manter a empresa con-
centrada na(s) linha(s) de negócios existente(s) e seu objetivo principal
é mantê-la(s). Há três cenários, independentemente do posicionamen-
to, para os quais a estratégia de estabilidade é indicada:

Posicionamento e valor sustentável 81


6 •• Evitar controle/penalidade governamental por monopólio
6

Um mercado caracterizado
O governo brasileiro, por meio do Conselho Administrativo de
por monopólio é composto de
apenas uma empresa que pode Defesa Econômica (CADE), regula a atuação das empresas com
oferecer os produtos e serviços. o objetivo de atender melhor ao cidadão. Em geral, segundo as
Um mercado monopolista é o
regras do CADE, a livre concorrência é afetada quando uma em-
oposto de um mercado com
concorrência perfeita, no qual há presa detém mais de 20% do mercado, assim o governo procura
um número infinito de empresas controlar e regulamentar o crescimento da participação de mer-
operando. Em um modelo pura-
cado das empresas.
mente monopolista, a empresa
monopolista pode restringir a Por exemplo, vamos pensar que, hipoteticamente, sua empresa
produção, aumentar preços e detém 50% do mercado e essa participação de mercado foi aceita
obter lucros acima do normal.
pelo CADE. Se você não pensar estrategicamente e quiser conti-
nuar a crescer, poderá estar sujeito a uma penalidade governa-
mental e, possivelmente, terá que dividir sua empresa em duas,
o que pode aumentar consideravelmente seus custos e diminuir
sua lucratividade.

•• O crescimento pode ser prejudicial para a lucratividade

Todo crescimento requer investimentos de recursos financeiros,


humanos, estruturais e tecnológicos. A conta deve ser simples: o
volume de investimentos, que inicialmente serão considerados
custos, deverá ser inferior à receita gerada pelo crescimento. Por
exemplo, se uma empresa que atua no Norte e Nordeste do Bra-
sil decidir ampliar suas atividades para o Centro-Oeste, deverá
fazer um investimento alto em estrutura e logística. Para que isso
7
valha a pena, o volume de vendas na nova área de atuação deve
O ponto de equilíbrio refere-se ser maior, no longo prazo, até chegar a um ponto de equilíbrio ,
7

às receitas necessárias para


cobrir o valor total das despesas que legitimará o investimento. Assim, a estabilidade é justificada
fixas e variáveis durante um quando não há uma perspectiva e uma intenção estratégica de
período especificado. incremento na lucratividade da empresa no longo prazo.

•• Mercado de baixo ou sem crescimento

O comportamento dos consumidores é o que determina a de-


manda em um setor econômico. Os últimos anos têm sido mar-
cados por mudanças comportamentais rápidas e coletivas, fruto
do compartilhamento social de informações, tendências e inte-
resses. Assim, você deve estar atento às transformações do seu
mercado e analisar se ele não está desaparecendo.
Nessa situação, o melhor é manter as atividades em um nível mí-
nimo e utilizar os recursos para investimentos em outros setores.

82 Estratégia Empresarial
Por exemplo, o mundo do acesso à informação mudou com-
pletamente. Imagine que você trabalha em um jornal impresso Atividade 2

tradicional da sua cidade. A maioria das pessoas hoje busca in- Suponha que você tem uma loja
de sapatos e achou interessante
formação em outros meios, como blogs e redes sociais, no tempo
a estratégia de integração ver-
delas. Além disso, quem determina a pauta é o leitor, não mais tical indireta, mas sua empresa
o meio de comunicação. Um jornal impresso não consegue fazer possui poucos recursos para
uma análise customizada e em tempo real dos acontecimentos. desenvolvê-la sozinha. O que
você poderia fazer?
Assim, em vez de investir mais em máquinas de impressão, por
exemplo, você deve manter sua operação estável e migrar sua
produção de conteúdo para um serviço on-line.

Muitas vezes, a estratégia de estabilidade não é suficiente para


manter a lucratividade e é preciso adotar a estratégia de redução. A
seguir, destacamos três estratégias de “encolhimento”.

1. Redução de despesas: quando uma empresa não está em


um estágio crítico, mas percebe que sua atuação não está
gerando mais lucro como no passado, ela deve estar atenta
para reduzir seus custos. Algumas coisas que ela pode fazer
é se livrar de produtos não lucrativos, reduzir a força de
trabalho, eliminar alguns canais de distribuição e procurar
formas de tornar a organização mais eficiente. Por exemplo:
pode deixar de operar em algumas regiões geográficas que
são muito caras e, ao mesmo tempo, automatizar a linha
de montagem diminuindo a necessidade de funcionários e
tornando a operação mais eficiente.
2. Desinvestimento: ao perceber que alguns de seus produtos
estão perdendo competitividade ou lucratividade, uma opção é
isolá-los em um negócio independente, parar de investir nesse
negócio e colocá-lo à venda. Por exemplo: se você tem uma
empresa que produz roupas masculinas e femininas, mas um
desses produtos não está indo bem, você pode transformar sua
empresa em duas, uma para roupas masculinas e outra para
roupas femininas, e vender para alguém que talvez vá melhor
do que você nesse mercado menos rentável. Com o recurso da
venda, você pode investir em alguma área de necessidade da
sua empresa.
3. Liquidação: essa é uma estratégia mais radical na qual você
decide encerrar suas atividades e, para tanto, vende seus ativos
e paga seu passivo ficando com a sobra desta equação.

Posicionamento e valor sustentável 83


Diante da diversidade de estratégias existentes, não há uma regra
que determine qual delas é melhor para o seu negócio. Desse modo,
você deve estudar os inúmeros fatores que envolvem sua empresa e,
então, buscar as estratégias que melhor atinjam seus objetivos, cum-
pram sua missão e alcancem a visão da sua organização.

3.3 Geração de valor e vantagem


competitiva sustentável
Vídeo Não há consenso sobre a definição de vantagem competitiva. Con-
forme Ghemawat e Rivkin (1998), a vantagem competitiva sustentável
é a capacidade de a empresa se destacar positivamente quando com-
parada aos concorrentes, na percepção do comprador, a longo prazo.

Para que isso ocorra e você consiga sair de um estágio comparativo


inferior para um novo estado mais forte, você precisa formular e imple-
mentar estratégias de negócios que lhe possibilitem ser mais competi-
tivo. As capacidades e competências que uma organização possui para
convencer um cliente a preferir seus produtos e serviços em detrimen-
to aos da concorrência são a essência da competitividade.

Para compreender seus recursos, suas competências e seu poten-


cial para oferecer vantagem competitiva, a organização não pode ser
vista como um todo, mas sim como uma coleção de atividades distintas,
que são executadas em alinhamento com as estratégias de negócios.

Porter (1985) projetou uma ferramenta denominada cadeia de valor


para dividir sistematicamente uma empresa em atividades estrategica-
mente relevantes. Essa ferramenta possibilita ao gestor que analise o
comportamento e a interação de cada atividade, determinando sua im-
portância na implementação de estratégias de negócios. O termo valor
é utilizado nesse contexto para expressar o potencial dessas atividades
na entrega da proposta de valor da empresa (KAPLAN; NORTON, 2000).

No modelo de Porter, representado na Figura 7, as atividades da


cadeia de valor podem ser divididas em duas categorias: primárias
e de suporte. As atividades primárias são aquelas relacionadas com
a criação e entrega do produto ou serviço ao cliente, enquanto as
atividades de suporte (ou secundárias) são relacionadas com a aqui-
sição e gerenciamento dos recursos necessários à operação das ati-
vidades primárias.

84 Estratégia Empresarial
Figura 7
Cadeia de valor

Infraestrutura
Atividades de suporte

Gestão de recursos humanos

Desenvolvimento tecnológico

Margens
Aquisições/compras

Logística de Operações Logística de Marketing e


Serviços
entrada saída vendas

Atividades primárias

Fonte: Adaptada de Porter, 1985.

Com base na classificação de Porter (1985), podemos descrever e


agrupar as atividades da seguinte maneira:
a. Atividades primárias: diretamente relacionadas à atividade
principal da empresa, da criação à entrega ao consumidor do
produto ou dos serviços.

•• Logística de entrada: atividades envolvidas no recebimen-


to, armazenamento da matéria-prima para a fabricação dos
produtos ou desenvolvimento dos serviços; a criação de valor
nesse bloco de atividades, essencialmente, depende do rela-
cionamento com os fornecedores.
•• Operações: atividades praticadas para transformar a maté-
ria-prima recebida nos produtos ou serviços entregues aos
clientes; os sistemas e a eficiência operacional são o que criam
valor nesse elemento da cadeia.
•• Logística de saída: atividades de armazenamento e distribui-
ção de produtos ou serviços ao cliente.
•• Marketing e vendas: processos de relacionamento, comuni-
cação e transações comerciais com os clientes, cujo objetivo
é mostrar o posicionamento da empresa, os diferenciais dos
produtos e serviços e, finalmente, fazer a entrega deles.
•• Serviços: atividades destinadas a manter o valor dos produ-
tos ou serviços para os clientes depois da venda; assumem

Posicionamento e valor sustentável 85


formas variadas, podendo ser serviços de garantia, seguro,
instalação, programas de relacionamento, manutenção, en-
tre outros.
Saiba mais b. Atividades de suporte: servem para dar suporte às atividades
Um exemplo de atividade de primárias.
suporte pode ser visualizado nas
atividades de aquisição, que ofe- •• Aquisições/compras: todas as atividades relacionadas à aqui-
recem suporte às atividades de sição de recursos para tornar a operação da empresa possí-
operações quando há a compra
do maquinário da produção, mas
vel; são atividades que vão desde a seleção de fornecedores
também oferecem suporte ao até a aquisição do insumo.
marketing e às vendas quando
•• Desenvolvimento tecnológico: atividades relacionadas com
há compra de mídias para
divulgação dos produtos. a base de conhecimento e informação necessária à empresa
para operar e se manter atualizada; são atividades desenvol-
vidas em termos de tecnologia da informação, processamento
e gerenciamento de dados.
•• Gestão de recursos humanos: as empresas são formadas
por pessoas, assim uma empresa precisa de programas que
visam recrutar, contratar, treinar, motivar e recompensar
seus colaboradores.
•• Infraestrutura: atividades que suprem as necessidades diá-
rias de funcionamento da empresa, conectando várias partes
isoladas por meio de funções como contabilidade, serviços
jurídico, finanças, planejamento, relações públicas, relações
Atividade 3 governamentais, qualidade e gestão em geral.
O que é mais importante para Segundo Porter (1985), as empresas organizam as suas atividades
gerar valor? Atividade primária
ou de suporte? em blocos de conteúdo para criar valor para seus produtos e serviços.
Para cada atividade principal, há uma série de subatividades que criam
valor específico.

Existem três categorias de subatividades: diretas, por exemplo, uma


Glossário
atividade principal de marketing e vendas é a venda on-line de produtos;
CRM: customer relationship indiretas, por exemplo, manter o CRM atualizado é uma subatividade
management – sistemas de ge-
renciamento do relacionamento indireta dentro da subatividade direta de vendas on-line; e de garantia
com o cliente. de qualidade, como analisar o desempenho dos anúncios de marketing
digital nas vendas on-line.

86 Estratégia Empresarial
Observe, a seguir, alguns passos para usar a cadeia de valor.
I. Identifique subatividades para cada atividade principal

Para cada atividade principal, liste e classifique todas as subativida-


des em diretas, indiretas ou de garantia de qualidade.
II. Identifique subatividades para cada atividade de suporte

Faça como no Passo I. Liste e classifique as subatividades em dire-


tas, indiretas ou de garantia de qualidade. Além disso, identifique a re-
lação das atividades de suporte com as principais, por exemplo, como
a gestão de recursos humanos cria valor para logística de entrada, ope-
rações, logística de saída, marketing e vendas e serviços.
III. Identifique os elos entre as atividades

Procure as conexões entre as atividades e subatividades. São esses


elos que criam valor para a empresa. Por exemplo, há relação direta
entre a venda de produtos on-line, CRM e gestão do time de vendas?
IV. Procure oportunidades dentro das atividades e subatividades
e nas suas relações

Procure identificar como uma modificação ou uma melhoria na


atividade ou subatividade pode maximizar o valor que você oferece
aos seus clientes.

A cadeia de valor de Porter é uma ferramenta que possibilita a vi-


sualização global e específica das atividades que são desenvolvidas
dentro da empresa e geram valor. Observe algumas dicas para você
usar essa ferramenta:
•• Dica 1: a cadeia de valor é um reflexo da estratégia empre-
sarial, assim todas as atividades devem refletir sua escolha
estratégica.
•• Dica 2: ao usar essa ferramenta, você perceberá que sempre há
espaço para melhoria, mas deve priorizar mudanças nas ativida-
des que garantam uma margem para empresa, ou seja, o ganho
com a mudança deverá superar o seu custo.
•• Dica 3: estabeleça um processo de análise sistemática para alte-
rar a configuração das atividades e as relações entre elas:

Posicionamento e valor sustentável 87


a. Analise a atividade: identifique as atividades que você realiza
para entregar seu produto ou serviço.
Site
b. Analise o valor: para cada atividade, pense no que você precisa
Para aplicar os conhecimen-
tos deste capítulo, acesse o fazer para adicionar mais valor para seu cliente.
site do Sebrae e confira os c. Avalie e planeje: avalie se vale a pena fazer alterações e, depois,
conteúdos sobre planejamento e
empreendedorismo, por meio de planeje as ações necessárias para cada alteração.
ferramentas disponibilizadas na
Por meio desse passo a passo, bem como das dicas, podemos com-
própria página.
SEBRAE. Página inicial. Dispo- preender que, para que nossa empresa ofereça vantagem competitiva,
nível em: www.sebrae.com.br. não podemos apenas olhá-la como um todo, mas também, como obser-
Acesso em: 13 abr. 2020. vamos nesta seção, como um conjunto de atividades distintas e interli-
gadas, que devem estar alinhadas com nossos objetivos empresariais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Agora, você já tem um roteiro genérico do que fazer depois do diagnóstico
estratégico. Assim, você pode ajudar sua organização a gerar valor com base
em posicionamento e atividades específicas para os negócios da empresa.
Uma conclusão importante a que chegamos é que não há estratégia
competitiva genérica melhor ou pior. Contudo, ao escolher um posiciona-
mento, você deve se manter fiel a ele, ou seja, tudo o que você fizer em
sua empresa deve ser pautado pelo posicionamento que você escolheu.
Quando nos preocupamos em manter nossa posição, proporciona-
mos à empresa e aos seus colaboradores consistência estratégica no de-
senvolvimento das atividades diárias e nos negócios. Com isso, decisões,
como crescer ou não, ficam mais claras e evidentes.
Ainda, ao tomar uma decisão, é importante que você observe cada
atividade estratégica em bloco e analise o efeito desse bloco na geração
de valor para a empresa. Ao ter um monitoramento constante do valor
gerado pelas atividades, você terá mais domínio de como melhorar cada
uma e possivelmente terá certeza de que, ao final de cada ciclo de análi-
se, suas ações estratégicas estão criando e mantendo o valor sustentável
para sua organização.

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Posicionamento e valor sustentável 89


GABARITO
1. A estratégia competitiva genérica indicada é a estratégia de nicho por diferenciação.
Cervejas artesanais são apreciadas por poucos consumidores, comparadas ao merca-
do global do consumo de cervejas, assim é uma estratégia de foco. Ainda, produzir e
consumir cervejas artesanais são atividades caras e, por isso, é necessário que prati-
quem um preço premium para esse restrito grupo de consumidores.

2. Como você é um varejista, está no final da cadeia de suprimentos. Assim, ao adotar a


integração vertical indireta, você deve subir a cadeia, ou seja, integrar uma operação
de atacado ou fábrica de sapatos. Como você não tem recursos para isso, uma suges-
tão é encontrar um parceiro que tenha esse mesmo objetivo, por exemplo, você pode
se associar a outra empresa varejista e montar um atacado que distribua produtos
para vocês e para outras empresas do setor.

3. Não há atividade mais ou menos importante na geração de valor. O valor é gerado


pela margem obtida entre o que custa a atividade e o ganho que ela gera. As ativida-
des primárias são aquelas essenciais para as relações transacionais do negócio, visto
que produzem, movem e vendem produtos. Porém, hoje em dia, esse processo é mui-
to parecido em todas as empresas, assim atividades de suporte podem gerar ganhos
se os serviços têm uma qualidade superior e custam menos do que os serviços dos
concorrentes. O mesmo pode acontecer para as atividades primárias.

90 Estratégia Empresarial
4
Planejamento estratégico
e governança
Diariamente, colocamos em prática, para nós, para nossa famí-
lia, para nossas organizações e para a comunidade à qual perten-
cemos, o que governamos. Suponha que você, estrategicamente,
planeja comprar um carro para atender às suas necessidades, por
um menor preço. Como, de fato, você faz isso?
Em primeiro lugar, taticamente, elenca todas as necessidades
relacionadas ao carro e, depois, analisa seu orçamento e como irá
executar esse objetivo, além de listar alguns modelos pelos quais
se interessa. Em seguida, operacionalmente, você faz pesquisas na
internet, visita lojas e concessionárias de veículos, conversa com
amigos e especialistas e, por fim, compra o automóvel e contrata
um financiamento e um seguro para seu mais novo bem.
Considerando todo esse processo, vamos analisar, neste ca-
pítulo, como ocorre o planejamento empresarial, dividindo-o em
três níveis: estratégico, tático e operacional. Esse processo, que
deve ser governado por princípios, é muito complexo, pois envol-
ve todos os elementos relacionados com a atuação da empresa,
sejam internos ou externos a ela. Além disso, vamos nos dedicar à
compreensão de como criar um sistema ético e transparente que
gerencie a implementação da estratégia por meio dos planejamen-
tos nos três níveis.

4.1 Os planejamentos estratégico,


Vídeo
tático e operacional
Para termos um processo estratégico em nossa empresa, e em
nossas vidas, precisamos, primeiramente, fazer um diagnóstico da si-
tuação atual e, com base nisso, estabelecer a estratégia genérica e os

Planejamento estratégico e governança 91


objetivos. Parece simples, não? Basta colocarmos em prática o que cria-
mos, certo?

Na verdade, não é tão simples assim. Um dos maiores problemas


enfrentados pelas empresas é a alta porcentagem de estratégias organi-
zacionais que simplesmente não são implementadas ou que fracassam
por falta de um sistema que as coloque em prática e governe o que foi
planejado. Segundo Kaplan e Norton (2001), cerca de 80% a 90% do que
se planeja não é implementado ou fracassa nos dois primeiros anos.

Uma implementação bem-sucedida, conforme afirma Miller (1997),


tem três características:

Lyudmyla Kharlamova/Shutterstock
Colocar em prática
lecer o
tudo o que se Estabe nho
pe
pretende fazer em desem ido.
d
um tempo esperado. preten

tar
Apresen de
odo
um mét o aceito
entaçã
implem da
r tod os dentro
po a.
empres

Um estudo de Booz Allen, de 1989 (apud ZAIRI, 1995), concluiu que


a maioria dos gerentes acredita que a dificuldade de implementar a
estratégia supera a de formulá-la. Isso ocorre porque ter ideias e sis-
tematizá-las pode ser fácil, mas colocá-las em prática requer disciplina,
constante adaptação e negociações internas com os colaboradores e
externas com os stakeholders.

Para implementar determinada estratégia, é necessária uma se-


quência hierárquica que envolve os planejamentos estratégico, tático e

92 Estratégia Empresarial
operacional, além de uma sequência que determina o comportamento
da empresa, como vemos na Figura 1.

Figura 1
Hierarquia e sequência comportamental do processo de planejamento

Planejamento estratégico
Abert/Shutterstock

Analisar o ambiente, determinar o


posicionamento da organização e explicitar a
visão, a missão e os objetivos genéricos.

Planejamento tático
Criar um mapa para integrar todas
as áreas da organização e atingir os
objetivos estratégicos.

Planejamento operacional
Colocar em prática as ações para
percorrer o caminho do mapa e
chegar aos objetivos.

Fonte: Elaborada pelo autor.

Com base na Figura 1, os diretores, que estão no topo da pirâmi-


de e representam uma menor quantidade, elaboram o planejamento
estratégico. Este é usado pelos gerentes médios, que estão no meio
da pirâmide e em quantidade razoável, para desenvolverem o planeja-
mento tático. Ao ser desenvolvido, esse planejamento é colocado em
prática no dia a dia pelo planejamento operacional, elaborado por uma
equipe maior, na base da pirâmide, representada pelos coordenadores
e supervisores.

Percebemos também, na Figura 1, que o processo estratégico, ba-


seado nos planejamentos estratégico, tático e operacional, tem uma
sequência hierárquica que, por meio de alguns objetivos, determina o
comportamento da empresa.

Para melhor entendermos essa pirâmide hierárquica, vamos tomar


como exemplo os executivos do alto escalão (presidente, vice e dire-
tores), responsáveis por definir uma estratégia genérica e de negócios
de acordo com um diagnóstico. Caso esses executivos optem por uma
estratégia de crescimento com produtos diferenciados, os gerentes

Planejamento estratégico e governança 93


médios, responsáveis pela tática, devem ter isso como base para seu
planejamento. Assim, o gerente de marketing, por exemplo, deverá ter
um plano tático de treinamento dos vendedores, visando o crescimen-
to e as diferenças dos produtos. Com esse plano de vendas tático, os
coordenadores e supervisores de vendas devem operacionalizar esse
plano de marketing em um plano operacional de vendas, definindo, por
exemplo, a área de atuação, a quantidade de vendedores, o discurso de
vendas e como fazer o faturamento e a entrega dos produtos.

Os problemas da não ou má implementação resultam da falta de co-


nexão entre o que foi concebido e estabelecido no processo de planeja-
mento estratégico e o que deve ser feito na prática. Por exemplo, o que
significa, no dia a dia, posicionar sua empresa por meio da estratégia
de liderança de custos? Como a área de recursos humanos implemen-
ta essa estratégia? Demitindo funcionários? Contratando funcionários
melhores e mais eficientes?

As respostas para essas questões devem estar no planejamento tá-


tico da área de gestão de pessoas. Mas, como e quando fazer isso? A
solução para essa pergunta é feita pelo planejamento operacional, que,
conforme observamos na Figura 1, coloca em prática as ações para per-
correr o caminho do mapa e chegar aos objetivos. Agora, vamos anali-
sar esses conceitos de planejamento de maneira mais pragmática.

Planejamento estratégico

Segundo Oliveira (2018), o planejamento estratégico é um processo


por meio do qual os líderes posicionam ou reposicionam a organização
no seu contexto, definindo seu propósito e suas prioridades, descre-
vendo a visão, a missão e os valores pelos quais opera e especificando
suas metas estratégicas para alinhar seus recursos e otimizar seu po-
tencial a longo prazo (de três a cinco anos).

No entanto, embora as declarações de missão, visão, valores e


objetivos estratégicos inspirem, estabeleçam direção, determinem
prioridades e declarem critérios de sucesso, são abstratas e, conse-
quentemente, não podem ser explicitamente medidas, podendo nunca
ser completamente cumpridas.

Desse modo, um documento formal, como uma espécie de guia, é


criado para orientar as ações da empresa. Esse documento deve des-

94 Estratégia Empresarial
crever especificamente todos os objetivos que foram traçados pela em-
presa e como será avaliado se foram atingidos ou não.

Planejamento tático

O planejamento tático é o processo por meio do qual os líderes e


membros de uma organização identificam os objetivos que devem ser
alcançados para cumprir os planos estratégicos da empresa. Ele envol-
ve a especificação de objetivos e planos de ação em prazos que cabem
dentro de um cronograma geral para realização das metas estratégicas
(OLIVEIRA, 2018).

Os objetivos táticos são escritos em linguagem clara e descrevem e


definem os resultados a serem alcançados, as condições sob as quais de-
vem ser atingidos (por exemplo, quem deve ser envolvido, quais recur-
sos serão usados, onde e quando os resultados devem ocorrer etc.) e os
critérios pelos quais o sucesso é determinado (datas de conclusão, quan-
tidades e/ou qualidades a serem alcançadas, requisitos, padrões etc.).

Segundo Fischmann e Almeida (2018), esse planejamento descreve


as táticas que a organização pretende usar para alcançar os objetivos
descritos no plano estratégico. É um projeto de médio prazo (de um a
dois anos) cujo objetivo é subdividir as declarações mais amplas – de
visão, missão e objetivos estratégicos – em partes menores e passíveis
de prática. O plano estratégico é uma resposta para “o quê?”; já o pla-
nejamento tático responde “como?”.

A criação de planos táticos geralmente é realizada pelos gerentes de


nível intermediário da organização dentro das cinco funções gerenciais
existentes, descritas a seguir.

Marketing e vendas

O planejamento dessa área visa gerar ganhos por meio da


compreensão de quem são os possíveis clientes (consumi-
dores), o que desejam e como se comportam. Com base
nisso, o gestor pode planejar seus produtos ou serviços e
comercializá-los.

(Continua)

Planejamento estratégico e governança 95


Finanças

Para serem executados, os planos precisam de financiamen-


to ou investimento, bem como de previsão e orçamento.
Como os recursos financeiros são essenciais para manter as
atividades de uma empresa, o gestor financeiro deve sempre
saber como está a saúde financeira de sua empresa por meio
de uma previsão realista do fluxo de caixa, projetando um
orçamento de despesas e receitas potenciais.

Recursos humanos

O gestor dessa área deve se preocupar com a capacidade de


contratar e se os contratados se encaixam nos papéis para
os quais são escolhidos. Ainda, deve ter planos de desenvol-
vimento de competências para os funcionários, entender o
que atrai pessoas qualificadas e fazer ofertas interessantes.
Hoje, os gerentes devem tratar os funcionários como clientes,
entendendo o que os motiva.

Tecnologia

Envolve não apenas o equipamento necessário para ope-


rar o negócio, mas as preocupações com a tecnologia de
comunicação para fins de marketing e vendas ou requisitos
de transporte e armazenagem de produtos. É importante
entender as necessidades e equilibrá-las diante de todas
as demandas de orçamento. O gestor dever ser criativo,
pois alguns equipamentos podem ser caros e ficar ociosos
a maior parte do tempo, considerando alugá-los ou fazer
parcerias, conforme necessário.

Operações

Na maioria das empresas, isso não envolve apenas equipa-


mentos, mas também processos. Essencialmente, as opera-
ções de negócios são aquelas que criam e entregam os pro-
dutos ou serviços aos clientes.

96 Estratégia Empresarial
De acordo com Fischmann e Almeida (2018), se pensarmos em um
documento, apesar de ser flexível, o plano tático deve conter:
•• Metas específicas com prazos fixos

Suponha que o objetivo da sua organização seja se tornar a maior


varejista de calçados da cidade. O plano tático dividirá essa ampla am-
bição em objetivos menores e práticos, como expandir para duas lojas
em três meses, crescer 25% por semestre ou aumentar a receita para
R$ 1.000.000,00 em seis meses, e assim por diante.
•• Recursos

O plano tático deve listar todos os recursos que você precisa reunir
para alcançar os objetivos. Isso deve incluir recursos humanos, finan-
ceiros, estruturais, físicos, de propriedade intelectual etc.
•• Orçamento

O plano tático deve listar os requisitos orçamentários para atingir


os objetivos especificados no plano estratégico, ou seja, o orçamento
para a contratação de pessoal, marketing, fornecimento, fabricação e
execução das operações da empresa.
•• Marketing e financiamento

Por fim, o plano tático deve listar as ações de marketing da orga-


nização, fornecimento, financiamento, fabricação, varejo e estratégia
de relações públicas. Seu escopo deve estar alinhado com os objetivos
descritos no plano estratégico.

Planejamento operacional

De acordo com Fischmann e Almeida (2018), o planejamento ope-


racional descreve o dia a dia da empresa. Esse plano traça um roteiro
para atingir as metas táticas dentro de um prazo realista, além de ser
altamente específico, com ênfase nos objetivos de curto prazo. “Au-
mentar as vendas para 150 unidades/dia” ou “Contratar 50 novos fun-
cionários” são exemplos de objetivos desse plano.

A criação do plano operacional é de responsabilidade dos gerentes,


coordenadores e supervisores do nível hierárquico mais baixo.

Planejamento estratégico e governança 97


Os planos operacionais podem ser de uso único ou de andamento:
•• Planos de uso único: são criados para eventos ou atividades com
uma única ocorrência e tendem a ser altamente específicos. Pode
ser um programa de vendas único, uma campanha de marketing
ou de recrutamento etc.
1 1
•• Planos de andamento : podem ser usados ​​em várias configura-
Os planos de andamento são ções continuamente, podendo ser de diferentes tipos:
criados ad-hoc (para uma finali-
dade específica), mas podem ser a. Política: documento geral que determina como os gerentes
repetidos e alterados conforme devem abordar um problema. Ele influencia a tomada de
necessário.
decisão no nível micro, como contratação de funcionários,
rescisão de contrato etc.
b. Regra: regulamento específico segundo o qual uma
organização funciona. As regras devem ser codificadas e
aplicadas rigorosamente, como “Não fumar nas dependências”
ou “Os funcionários devem se apresentar até às 9 h”.
c. Procedimento: descrição do passo a passo de um
processo para atingir um objetivo específico. A maioria das
organizações possui diretrizes detalhadas sobre a contratação
e o treinamento de funcionários ou o fornecimento de
Atividade 1 matérias-primas. Essas diretrizes podem ser chamadas de
É possível ter um planejamento procedimentos.
operacional sem ter um planeja-
mento estratégico? Assim, podemos entender que os planos operacionais alinham o
planejamento estratégico da empresa com o dia a dia real dela.

4.2 Governança corporativa


O processo empreendedor se funde com o processo estratégico
Vídeo
conforme a empresa cresce. O curso natural dos empreendimentos
faz com que a atividade empresarial, à medida que amadurece, fique
cada vez mais complexa. Por exemplo: uma pessoa resolve abrir um
pequeno comércio na cidade e, ao passo que o seu negócio vai crescen-
do, precisa ampliá-lo, contratando mais funcionários, vendendo novos
produtos ou abrindo novas filiais. Uma coisa é ter uma atuação tímida,
vendendo poucos produtos em uma pequena escala, outra coisa é ter
uma atuação mais abrangente, vendendo muitos produtos em uma lar-
ga escala.

Conforme o negócio cresce, muitas pessoas percebem que não


conseguem mais formular, implementar e administrar a estratégia

98 Estratégia Empresarial
com a mesma eficiência que faziam quando o negócio era menor. As-
sim, decidem contratar gestores profissionais com mais experiência
e conhecimento para administrar suas empresas. Quando isso ocor-
re, naturalmente, o empreendedor inicial perde o controle pessoal de
seu empreendimento, podendo sentir insegurança e, de certa forma,
desconfiança e desconforto por não poder mais fazer as coisas como
sempre fez. Nesse contexto, surgem o conceito e a prática da gover-
nança corporativa.

A governança corporativa pode ser definida como um sistema de


regras, práticas e processos pelo qual uma empresa é governada e
administrada (IBGC, 2015). Esse sistema garante a todos, em uma
organização, a existência de processos de tomada de decisão apro-
priados e transparentes, em que sejam protegidos os interesses dos
stakeholders, como acionistas, gerentes, funcionários, fornecedores
e clientes.
Leitura
O Código das melhores
práticas de governança
Na prática, o empreendedor inicial continua sendo o dono do ne- corporativa é o principal
documento do Instituto
gócio, mas a administração diária é feita por terceiros. No entanto, os Brasileiro de Governança
interesses do dono, muitas vezes, são conflituosos com os interesses Corporativa (IBGC) usado
como referência para a
dos gestores. Por exemplo, os proprietários querem maximizar o lu- implementação desse
cro e o gestor, por outro lado, independentemente do desempenho, tema em empresas
brasileiras. Esse código
quer maximizar sua renda, ocasionando, assim, um conflito natural. Se apresenta recomenda-
o dono do empreendimento aumentar a renda do gestor, seu lucro di- ções de boas práticas de
governança em lingua-
minuirá. Em contrapartida, se aumentar o seu lucro, a renda do gestor gem acessível e objetiva.
provavelmente cairá. IBGC. 5. ed. São Paulo: IBGC, 2015.
Disponível em: https://edisciplinas.
Garvey e Swan (1994, p. 39) afirmam que “a governança determina usp.br/pluginfile.php/4382648/
como os principais tomadores de decisão (executivos) da empresa de- mod_resource/content/1/Livro_
Codigo_Melhores_Praticas_GC.pdf.
vem administrar as empresas que os contrataram”. A Organização para Acesso em: 13 abr. 2020.
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE, 2004) definiu gover-
nança corporativa com um sistema pelo qual as empresas são dirigidas
e controladas. Para tanto, há um conjunto padrão de princípios gerais
que regem a governança corporativa: equidade (fairness), prestação de
contas (accountability), responsabilidade (responsability) e transparên-
cia (transparency). Esses princípios, que serão detalhados mais adiante,
têm como base cinco elementos: os direitos dos acionistas, o tratamen-

Planejamento estratégico e governança 99


to equitativo dos acionistas, o papel dos stakeholders na governança
2 corporativa, a divulgação e a transparência e as responsabilidades do
“O Conselho de Administração é 2
conselho de administração .
o órgão colegiado encarregado
do processo de decisão de uma Uma empresa, ao ter em mente os princípios da OCDE e adotar
organização em relação ao seu
boas práticas de governança corporativa, está preocupada em manter
direcionamento estratégico. Ele
exerce o papel de guardião dos o equilíbrio entre seus objetivos econômicos e sociais e os objetivos
princípios, valores, objeto social
individuais dos stakeholders e da comunidade.
e sistema de governança da
organização, sendo seu principal A estrutura de governança corporativa existe para incentivar o
componente” (IBGC, 2015, p. 13).
uso eficiente dos recursos e para exigir responsabilidade pela ad-
ministração deles. Enfim, o objetivo é alinhar, tanto quanto possível,
os interesses de indivíduos, empresas e sociedade. Contudo, além
dessa ideia abstrata de equilibrar o interesse dos stakeholders, qual é
a relação entre a estratégia empresarial de uma empresa e a gover-
nança corporativa?

Conforme estudamos, o sucesso da estratégia está vinculado ao


conhecimento profundo do ambiente onde a empresa opera. Parte
desse conhecimento é compreender e respeitar o interesse de todos
os stakeholders e, por meio desse entendimento, definir ações que são
controladas por uma estrutura de governança corporativa adequada.

A sociedade se tornou rigorosa com relação às empresas e suas prá-


ticas, assim a governança corporativa passou a ter um papel-chave na
relação de confiança entre a empresa e a sociedade. As instituições, de
modo geral, estão desacreditadas e a sociedade não tem convicção da
honestidade, integridade e sinceridade dessas organizações, principal-
mente empresariais.

As boas práticas de governança corporativa são necessárias para li-


dar com situações como as apresentadas nos estudos de caso a seguir,
que tratam de alguns escândalos corporativos que ocorreram com em-
presas bastante conhecidas mundialmente (HALL-SMITH, 2018).

100 Estratégia Empresarial


Estudo de caso

Enron
O caso envolvendo a Enron é um dos mais famosos escândalos corporativos de todos
os tempos. A situação começou no início de 2001, quando os analistas questionaram
as contas apresentadas no relatório anual da empresa. Essas contas usavam uma varie-
dade de procedimentos irregulares, o que dificultava descobrir como a empresa estava
ganhando dinheiro, apesar de ser uma das maiores organizações dos Estados Unidos da
América (EUA) nos setores de energia e telecomunicações. A Enron escondia seus pas-
sivos em outras empresas que controlava, o que lhe permitia parecer lucrativa, embora
estivesse realmente quebrada. O preço de suas ações caiu de US$ 90,56 para menos de
um dólar, assim a Enron foi forçada a pedir uma das maiores falências da história.
Facebook
O maior escândalo do Facebook ocorreu em março de 2018, quando o The Guardian e o
The New York Times relataram que uma empresa chamada Global Science Research ha-
via coletado dados de milhões de usuários do Facebook em 2013, sem o consentimento
explícito. Isso foi possível devido a uma versão anterior da política de privacidade do
Facebook que permitia a outros aplicativos acessar dados dos usuários. A Global Science
Research coletou informações de 87 milhões de usuários do Facebook, embora apenas
cerca de 30 mil pessoas a tenham realmente usado. Esses detalhes foram posteriormen-
te vendidos à Cambridge Analytica, que os usou para criar anúncios altamente segmen-
tados para incentivar os usuários a votarem em Trump e na saída da Inglaterra da União
Europeia. A exaltação em torno desse escândalo foi tão grave que Mark Zuckerberg foi
chamado para responder a perguntas diante do Congresso nos EUA.
Petrobras
A Petrobras tinha conquistado a reputação de ser uma das empresas de petróleo e gás
mais éticas do mundo. No entanto, a investigação da Lava Jato revelou o que foi con-
siderado o maior caso de corrupção na história do Brasil. O escândalo começou com o
pagamento de subornos de um suposto cartel de empreiteiros à Petrobras em troca de
grandes contratos de infraestrutura. A investigação revelou que as fraudes foram reali-
zadas ao longo de uma década. Dezenas de políticos e empresários em conluio (cumpli-
cidade) com gestores da Petrobras receberam pagamentos ilícitos e subornos. Os efeitos
do escândalo abalaram não só a empresa, mas o país social, econômica e politicamente.

Uma estratégia de sucesso é transparente e alinhada à visão, à mis-


são e aos objetivos estratégicos. Isso possibilita à organização deixar
claro suas intenções para todos os stakeholders e coordenar suas ações
estratégicas com os interesses deles. A governança corporativa garante
que o interesse dos executivos esteja ajustado aos interesses dos acio-
nistas, dos gerentes médios e do conselho de administração da empre-
sa (IBGC, 2015).

Planejamento estratégico e governança 101


No geral, a governança corporativa estrutura e promove a direção
estratégica por meio dos seus princípios, de ferramentas de contro-
le, de ética e de responsabilidade social e ambiental. Essa estrutura
força a organização a adotar boas práticas e transformá-las em ações
estratégicas que levarão a empresa a alcançar seus objetivos de ma-
neira sustentável.
3 3
Parece simples, não? Mas, segundo a Teoria da Agência , o conflito
De acordo com essa teoria, os entre acionistas e gerentes ou entre gerentes e funcionários faz com
stakeholders agem em causa
própria e colocam seus interesses que traçar e implementar planos estratégicos seja algo muito com-
pessoais em primeiro lugar, ou plicado. Por exemplo, um gerente compra de um fornecedor por um
seja, agem com base no “oportu-
nismo” (EISENHARDT, 1989). preço maior quando este lhe oferece um benefício, como uma viagem
de presente em troca da compra, ou pode decidir implementar um
recesso para toda a empresa na véspera do feriado porque quer viajar
com a família. Se o sistema de controle for fraco, segundo a Teoria da
Agência, o interesse particular do agente é maximizado em detrimento
do interesse da empresa e das outras partes e, desse modo, o gerente
poderá determinar o recesso e atender em primeiro lugar a seus inte-
resses pessoais.

Assim, vários mecanismos de controle, como códigos éticos, são


criados para resolver esse tipo de situação, em que o interesse das par-
tes se sobrepõe ao interesse coletivo da empresa. Diante disso, pode-
mos compreender que os mecanismos de governança corporativa são
uma forma de controlar e garantir que os objetivos estratégicos sejam
seguidos e atingidos. As deficiências nos mecanismos de governança
corporativa geram falhas no sistema de monitoramento e controle,
ocasionando riscos recorrentes à estratégia da empresa.

De maneira genérica, os gestores são responsáveis por criar estraté-


gias que permitam à organização gerar valor e manter suas vantagens
Para refletir competitivas. A criação de valor está intimamente relacionada à socie-

Na prática, como podemos ado- dade e ao meio ambiente em que a empresa opera. Hoje, as empresas
tar a boa governança corporativa são responsáveis por ambos, assim a governança corporativa é uma
para que nossa estratégia seja
mais sustentável? forma de garantir que a empresa se preocupe, além do lucro, com a
sociedade e com o meio ambiente.

102 Estratégia Empresarial


4
O relatório Cadbury , lançado no Reino Unido, destacou que as 4
organizações são dirigidas e controladas pelo sistema de governança O relatório Cadbury estabe-
corporativa (THE COMMITTEE..., 1992). lece recomendações sobre a
organização dos conselhos
de administração e sistemas
A boa governança corporativa é um fator-chave para sustentar a contábeis para diminuir as falhas
integridade e a eficiência de uma empresa. Já a má governança corpo- da governança corporativa. Esse
relatório foi publicado em 1992
rativa pode enfraquecer o potencial da organização e levá-la a dificul- pela primeira vez, e suas reco-
dades financeiras, causando danos à sua reputação. mendações são sempre revistas
e usadas em diferentes arenas
para estabelecer outros códigos
Assim, uma empresa deve aplicar os princípios fundamentais da ou documentos, como os da
OCDE e do Banco Mundial.
boa governança corporativa. Ao adotá-los, a empresa compete melhor
e supera o desempenho das concorrentes, atraindo mais investidores,
tendo a preferência do consumidor e fazendo parcerias com mais fa-
cilidade (WEIR; LAING, 2001). Observe, a seguir, quais são os princípios
de boa governança.

Equidade

Refere-se à igualdade de tratamento. Por exemplo, todos os acionis-


5
tas devem receber igual consideração, independente da sua participa-
5
ção societária . O Código Civil Brasileiro regula
isso protegendo o interesse dos
Além dos acionistas, deve haver justiça no tratamento de todas as sócios minoritários. Ainda assim,
algumas empresas estabelecem
partes interessadas, incluindo funcionários, fornecedores e comunida-
acordos de cotistas para deixar
de em geral. Quanto mais justa a entidade parecer para as partes in- a proteção minoritária mais
teressadas, maior será a probabilidade de sobreviver e lidar bem com explícita, extensa e eficaz.
suas pressões.

Prestação de contas

Refere-se à obrigação e à responsabilidade da empresa em fornecer


explicações ou motivos para suas ações e condutas.

A prestação de contas no modelo de governança segue um modelo


estruturado, que tem como base um Conselho de Administração. Os só-
cios e os acionistas são representados por um conselho, composto de
um grupo de sócios escolhidos perante o executivo principal (CEO) da
empresa, seus diretores e gerentes. Assim, o Conselho Administrativo,
junto à alta direção da empresa, estabelece as estratégias genéricas

Planejamento estratégico e governança 103


Saiba mais e empresariais para a organização. A alta direção desenha o planeja-
O Conselho Administrativo tem mento estratégico, tático e operacional com a gerência média. À medi-
a função de aprovar a prestação da que a estratégia vai sendo executada, o executivo principal precisa
de contas do gestor principal.
Ainda, ele tem o apoio do prestar contas ao Conselho Administrativo, que apresenta aos acionis-
Conselho Fiscal, um outro grupo tas como as coisas estão indo.
de acionistas escolhido para
analisar e controlar os aspectos Podemos observar, na Figura 2, como o sistema de governança fun-
financeiros das prestações. ciona na prática por meio do conselho de administração representan-
do os acionistas perante os gestores.

Figura 2
Estrutura de governança corporativa

GOVERNANÇA

ACIONISTAS

CONSELHO
TOMADA DE DECISÃO ADMINISTRATIVO FLUXO DE INFORMAÇÃO
E FISCAL

EXECUTIVO PRINCIPAL (CEO)

DIRETORIA GESTÃO

GERENTES

RESULTADOS
Fonte: Elaborada pelo autor.

Conforme podemos ver nessa figura, temos uma pirâmide inver-


sa que faz um fluxo de práticas para baixo e se funde com a pirâmi-
de apresentada na Figura 1, na qual a ação estratégica acontece. Os
acionistas pressionam, de acordo com seus interesses, os gestores a
desenvolverem planos e ações que atendam aos seus interesses. A re-
lação entre o CEO e o Conselho de Administração é o que dá ponto de
contato entre as duas estruturas.

104 Estratégia Empresarial


Ainda, uma empresa pode ter auditores e consultores internos Saiba mais
ou externos (independentes) para auxiliar o conselho e os gestores a Para contribuir efetivamente, um
analisarem as ações estratégicas, seus efeitos e resultados ao longo Conselho tem como responsa-
bilidades: avaliar com equilíbrio
do tempo. Instituições financeiras, por exemplo, segundo normativa a posição e as perspectivas estra-
do Banco Central, devem obrigatoriamente fazer auditoria externa de tégicas da empresa; determinar
suas contas para garantir a saúde financeira da instituição e a tranqui- os riscos que está disposto a
assumir; manter sistemas sólidos
lidade dos correntistas. de gerenciamento de riscos e
controle interno; estabelecer
Esse mecanismo de governança, que conta com a existência e par-
acordos formais e transparentes
ticipação de um Conselho de Administração e Fiscal, é muito interes- para relatórios corporativos e
sante porque auxilia os gestores a refletirem periodicamente sobre a gerenciamento de riscos e para
um relacionamento adequado
estratégia da empresa e o desempenho da organização.
com o auditor da empresa; e
comunicar-se com as partes
interessadas, em intervalos
Responsabilidade
regulares, avaliando como a
empresa está atingindo seu
objetivo comercial.
O Conselho de Administração tem autoridade para agir em nome
da empresa. Os conselhos devem, portanto, aceitar total responsabili-
dade pelos poderes que são dados e pela autoridade que exercem. O
Conselho de Administração é responsável por supervisionar a gestão
dos negócios da empresa, nomear o executivo principal e monitorar
o desempenho da empresa. Ao fazer isso, é necessário agir no melhor
interesse da empresa. A prestação de contas anda de mãos dadas com
a responsabilidade. O Conselho de Administração deve ser responsa-
bilizado perante os acionistas pela maneira como a empresa cumpriu
suas responsabilidades.

Transparência

Um princípio de boa governança é que as partes interessadas sejam


informadas sobre as atividades da empresa, o que ela planeja fazer no
futuro e quaisquer riscos envolvidos em suas estratégias de negócio.

Transparência significa abertura, uma disposição da empresa em


fornecer informações claras aos acionistas e a outras partes interessa-
das. Refere-se, por exemplo, à abertura e disposição de divulgar valo-
res de desempenho financeiro verdadeiros e precisos.

A divulgação de assuntos materiais relacionados ao desempenho e


às atividades da organização deve ser oportuna e precisa para garan-
tir que todos os investidores com acesso a informações factuais claras

Planejamento estratégico e governança 105


Atividade 2 reflitam com precisão sobre a posição financeira, social e ambiental da

De acordo com os princípios organização. As organizações devem esclarecer e divulgar publicamen-


da governança corporativa, te as funções e responsabilidades do conselho e da administração para
podemos afirmar que “os fins fornecer aos acionistas um certo nível de prestação de contas.
justificam os meios”?
A transparência garante que as partes interessadas possam ter
confiança nos processos de tomada de decisão e gerenciamento de
uma empresa.

Vamos, agora, observar algumas dicas práticas para acionarmos es-


ses quatro princípios da governança corporativa.
I. Seleção de um conselho competente e diversificado

As melhores práticas indicam que a empresa tenha não apenas


conselheiros qualificados e independentes, mas coletivamente
deve representar as diferenças dos acionistas para tomar me-
lhores decisões. Tradicionalmente, os conselheiros são escolhi-
dos por suas habilidades e sua experiência em governança, bem
como por seu conhecimento do setor.
Além disso, outros critérios são levados em consideração, como
experiência profissional no governo, políticas públicas e ambien-
tes internacionais ou altamente regulados. Nos últimos anos,
várias empresas têm incluído, nas suas fórmulas de escolha, o
gerenciamento de riscos e a experiência em tecnologia.
Fora a habilidade técnica dos conselheiros, um bom conselho
deve representar a diversidade e levar em conta outras variá-
veis além do gênero, como idade, etnia e tempo de atuação no
conselho. Após serem escolhidos, é necessário que esses conse-
lheiros se mantenham atualizados e competentes. Desse modo,
é importante que lhes sejam disponibilizados programas de for-
mação contínua para qualificar o grupo e gerar uma cultura de
aprendizagem.

II. Implementação de políticas e comportamento ético

Uma organização precisa de uma política institucional clara para


guiar a gestão de conflitos de interesses. Uma maneira comum
de aplicar essa política é por meio de um código de conduta, ou
código de ética institucional. Outra prática é disponibilizar um ca-
nal de comunicação de denúncias de irregularidades da empresa
e do conselho com políticas específicas.

106 Estratégia Empresarial


III. Definição de funções e responsabilidades

As melhores práticas de governança corporativa incluem a separa-


ção dos papéis e das funções dos conselheiros e gestores da em-
presa. Os conselheiros têm a obrigação de participar dos assuntos
de governança de uma empresa, mas se mantendo afastados da
administração da empresa. Eles devem desafiar as suposições
dos gestores, principalmente se as ações estão gerando os resul-
tados esperados. É recomendado que haja, em um documento,
descrições dos cargos associados às várias funções do conselho,
que pode ser o Estatuto Social ou o Regimento Interno: o próprio
conselho, seu presidente, vice-presidente, comitês e presidentes
de comitês. Esse documento deve descrever responsabilidades,
delegação e limitações de autoridade.

IV. Alinhamento de estratégias, objetivos e riscos

O alinhamento de estratégias com objetivos é outra prática re-


comendada para a empresa. Os conselheiros devem supervisio-
nar a estratégia e a execução das ações de curto, médio e longo
prazos, principalmente com relação ao risco. Como parte dessa
prática, recomenda-se ao conselho trabalhar com os gestores da
empresa para determinar a tolerância da organização a riscos.
Assim, acabam se envolvendo na supervisão rotineira do geren-
ciamento de riscos e no controle das atividades estratégicas.

V. Prestação de contas

Quando as funções e responsabilidades são claramente defini-


das, os conselheiros, os comitês e os gestores compreendem
suas responsabilidades. O conselho e a gerência concordaram 6
com as métricas quantificáveis ​​de desempenho, ou seja, com KPIs (Key Performance
6
os principais indicadores-chave de desempenho (KPIs ) e como Indicators), do português indi-
cadores-chave de desempenho,
devem ser relatados. Por exemplo, se a estratégia genérica da são os principais indicadores que
empresa for liderança de custo, provavelmente um dos KPIs será avaliam a implementação da
lucratividade. Agora, se a estratégia for de diferenciação, a satis- estratégia.
fação do cliente deve ser avaliada.
Além disso, a divulgação dos resultados é importante. Um conse- 7
lho deve ser transparente em suas comunicações, tanto interna O RAI é o documento que mostra
como externamente. Há requisitos legais com relação à presta- para todos os stakeholders tudo
ção de contas, como a necessidade do Relatório Anual de Infor- o que foi feito no ano e quais
7
foram os resultados.
mações (RAI ).

Planejamento estratégico e governança 107


Para refletir O termo governança corporativa não se refere especificamente a
O que a governança corporativa grandes empresas, que são obrigadas por lei a terem um conselho e
tem a ver com pequenas e
divulgarem seus resultados para a sociedade. Essencialmente, a gover-
médias empresas?
nança corporativa existe para garantir que as empresas operem de ma-
neira justa e equitativa e para beneficiar todas as partes interessadas,
e não apenas os donos.

Ter governança corporativa em sua empresa significa estabelecer


um conjunto de políticas, regras e procedimentos internos que abran-
ja os princípios da governança. Mais empresas preocupadas com boa
governança significa mercados mais estáveis, instituições mais fortes,
maior volume de investimento e menos corrupção (ABOR; ADJASI, 2007).

É verdade que a maioria das pequenas empresas está mais preocu-


pada com a sobrevivência de seus negócios do que com a corrupção.
Assim, mesmo não tendo um conselho de administração, elas têm in-
vestidores e múltiplos parceiros de negócios, com interesse no sucesso
e crescimento da empresa. Sendo assim, tratar de governança corpo-
Atividade 3
rativa em pequenas empresas faz sentido.
Você concorda com a afirmação
de que boas práticas de Seguindo as melhores práticas, pequenas empresas e startups po-
governança corporativa não in- dem estabelecer o caminho para operações mais transparentes e res-
fluenciam no crescimento de uma
pequena empresa? Justifique. ponsáveis. Além disso, é uma ótima maneira de definir precedentes para
futuros funcionários e investidores e se preparar para o crescimento.

Analise, a seguir, como algumas ações, segundo Audretsch e


Lehmann (2011), colocam em prática a boa governança corporativa,
alinhando-a à estratégia, independentemente do tamanho ou do tipo
de organização.

1. M
apeie a estrutura atual da sua empresa e visualize como ela vai
crescer. Essencialmente, crie um organograma que estabeleça uma
hierarquia e defina amplamente as responsabilidades. Em seguida,
desenvolva descrições de cargos e descreva as responsabilidades para
proprietários, parceiros, investidores e funcionários.
2. Estruture e formalize as políticas e os processos internos. Isso significa
olhar todos os aspectos do negócio e desenvolver um protocolo para
definir precedentes e agilizar as operações internas.

108 Estratégia Empresarial


3. Estabeleça um conselho consultivo. Pense nele como um conselho de
administração das grandes empresas. Comece com pessoas que você co-
nhece e confia, por exemplo, seus mentores, ex-colegas ou profissionais
de confiança com quem você tem um relacionamento. Deixe claro para a
equipe os objetivos da empresa e como eles devem se encaixar.
4. Crie um código de conduta. Códigos de conduta geralmente descrevem
comportamentos, responsabilidades, ações ou atitudes que os funcio-
nários devem ter em uma organização.
5. Planeje estrategicamente. O ponto focal da governança em pequenas
empresas é que todas precisam definir metas estratégicas, fornecer re-
cursos para colocá-las em prática e supervisionar as ações. Site
6. Desenvolva um relatório financeiro claro. Relatórios financeiros consis- O site do Instituto
tentes protegem o investimento financeiro da organização, monitoram Brasileiro de Governança
de perto quando, onde e como o dinheiro está sendo gasto ou alocado Corporativa (IBGC)
apresenta uma série de
e servem para criar responsabilidade da equipe por ações, promoven-
artigos sobre governan-
do transparência nas operações. ça corporativa e seu
relacionamento com
a estratégia, os quais
Desse modo, seja para uma empresa grande, média ou pequena, podem contribuir com o
que você estudou neste
conduzir os negócios de modo ético e transparente, seguindo as me- capítulo.
lhores práticas de governança corporativa, é como o planejamento es- Disponível em: https://www.ibgc.
tratégico deve ser colocado em prática para gerar melhores resultados. org.br/. Acesso em: 13 abr. 2020.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A implementação da estratégia não é algo simples. No entanto, se uma
empresa tiver convicção de que suas ações estratégicas lhe proporciona-
rão vantagem competitiva, é apenas uma questão de organização. Parece
estranho, mas, para implementar a estratégia, é necessário ter uma estra-
tégia de planejamento de como isso irá acontecer.
Além disso, quando uma empresa adota boas práticas de governança
corporativa, o planejamento da implementação ocorre de maneira automá-
tica porque há uma definição prévia do que pode ou deve ser feito versus
o que não pode ou não deve ser feito. Assim, todos na organização, enten-
dendo o que a empresa quer para ter sucesso sustentável, seguirão um
roteiro preestabelecido e monitorado pelas boas práticas de governança.
Dessa maneira, antes mesmo de fazer o diagnóstico, definir a missão,
a visão, os valores e a estratégia genérica dos negócios, é fundamental
que a empresa esteja preparada com uma boa definição da sua estrutu-
ra organizacional, papéis e responsabilidade e processo correntes. Com

Planejamento estratégico e governança 109


base nisso, a mudança estratégica pode começar a ser implementada por
meio de ações táticas e operacionais. Por fim, um bom mecanismo trans-
parente de controle garante que o que é implementado foi planejado,
fundamental para o sucesso da empresa.

REFERÊNCIAS
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net/publication/228447618_Corporate_Governance_and_the_Small_and_Medium_
Enterprises_Sector_Theory_and_Implications. Acesso em: 13 abr. 2020.
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ZAIRI, M. Strategic planning through quality policy deployment: a benchmarking approach.
In: Total Quality Management. Springer: Dordrecht, 1995. p. 207-215.

110 Estratégia Empresarial


GABARITO
1. Sim. É possível uma empresa ter um planejamento operacional sem ter o planeja-
mento estratégico, aliás, é isso que ocorre em boa parte das organizações. Geralmen-
te, uma lista de ações é feita com ou sem a alocação de recursos necessários para
as ações. Por exemplo, você pode trabalhar com vendas e montar um planejamento
operacional de vendas totalmente desconexo da visão, da missão e dos objetivos da
empresa. Os resultados serão atingidos? A melhor resposta para essa pergunta é que
resultados serão atingidos, mas não necessariamente os resultados estabelecidos
pela empresa.

2. Não, porque os princípios de governança corporativa estabelecem a maneira como


as ações devem ser realizadas e monitoradas dentro da organização, seguindo princí-
pios da ética e da transparência. Por exemplo, você tem a oportunidade de fazer uma
venda enorme para um cliente corporativo e sabe que ele pratica atividades ilegais
ou antiéticas. Mas, se o seu código de conduta faz referência a não transacionar com
fornecedores e clientes que desempenham atividades ilegais, você não poderá fazer a
venda, mesmo não cometendo qualquer ilícito.

3. A resposta é pessoal, mas espera-se que, com base na leitura deste capítulo, você res-
ponda que não concorda com a afirmação. Ao aplicar os princípios da boa governança
corporativa, você está preparando e consolidando seus negócios para atuar de manei-
ra ética, transparente, com a apresentação sistemática de resultados e avaliando se o
seu planeamento estratégico está gerando os resultados preestabelecidos. Assim, o
crescimento é pautado e facilitado pelas melhores práticas de governança corporativa.

Planejamento estratégico e governança 111


5
Ética, responsabilidade
social corporativa e
sustentabilidade
Você provavelmente já assistiu no noticiário a escândalos envol-
vendo grandes empresas que, geralmente, têm como única razão de
existir a busca incessante pelo lucro. Essas organizações não se preo-
cupam com a sociedade nem com o meio ambiente, não se importam
com os princípios éticos e, muitas vezes, não seguem as leis.
Não negamos que o lucro é, provavelmente, um dos elementos
mais importantes do sucesso empresarial. No entanto, ele deve ser
uma consequência de ações estratégicas que são balizadas pela
ética e pela lei. Essa postura ética-legal garante às empresas uma
atuação social consistente, que tem o potencial de gerar bem-estar
para todos os envolvidos em suas ações estratégicas.
Os desafios da ética e da responsabilidade social enfrentados
por empresas, em diferentes países e ambientes culturais, ressaltam
a crescente importância da inclusão de pontos de vista diferentes da
simples busca pelo lucro empresarial. Diante disso, atualmente, as
empresas estão sob crescentes pressões política, social e competiti-
va para desenvolverem estratégias que gerem valor alinhado a uma
base tripla, a qual envolve a busca simultânea por prosperidade eco-
nômica, qualidade ambiental e equidade social.
Além disso, a sustentabilidade tem emergido como uma megaten-
dência e, assim, muitos stakeholders têm exigido que as empresas te-
nham mais responsabilidades social e ambiental. Em resposta a isso,
diversas organizações estão desenvolvendo estratégias empresariais
sustentáveis, reforçando o importante papel dos gestores nesse sentido.
Assim, para que você possa adquirir as habilidades e o conheci-
mento necessários à construção e à implementação de estratégias
nesse novo contexto social, serão estudadas, neste capítulo, a ética,
a responsabilidade social corporativa e a sustentabilidade.

112 Estratégia Empresarial


5.1 Ética e gestão estratégica
As obrigações morais e a ética nos negócios são parte integrante e
Vídeo
importante do processo de gerenciamento estratégico (MCMANUS; WHI-
TE; BOTTEN, 2008). Escândalos corporativos, como o
1
do Banco Lehman Brothers , tiveram poucos efeitos 1
na melhoria da prática gerencial ética das empresas e A quebra do quarto maior banco
na percepção de confiança nos acionistas das pes- de investimentos norte-americano,
denominado Lehman Brothers,
soas com relação às empresas.
marcou a maior crise financeira
Barnard (1968), entre os primeiros estudiosos da internacional deste século. O
banco em questão fez operações
área da administração, destacou a necessidade de os
de crédito de alto risco vinculados
executivos terem senso de responsabilidade moral e a imóveis, de modo irracional,
estabeleceu alguns dos princípios fundamentais da durante décadas. Para saber mais,
gestão estratégica, entre eles, o gerenciamento dos confira em: https://g1.globo.com/
economia/noticia/2018/09/15/
objetivos individuais pessoais do executivo e os ob-
quebra-do-banco-lehman-
jetivos corporativos. Argumentou também que, além brothers-completa-10-anos-
de intelectual, a gestão de uma empresa é um proces- relembre-a-crise-de-2008.ghtml.
so moral, envolvendo senso de aptidão, adequação Acesso em: 13 abr. 2020.
e responsabilidade do gestor, no qual os executivos
têm responsabilidade moral para com quem servem
e a responsabilidade de inspirar por meio da liderança e criar confiança
por meio dos propósitos organizacionais.
Ansoff (1969) identificou a importância de se estabelecer um objeti-
vo ético, além dos objetivos estratégicos tradicionais, na formulação da
estratégia. No entanto, o campo da ética, como estudo separado, ainda
está evoluindo na literatura empresarial e, até o momento, parece não
ter sido incluído nas discussões da área da estratégia. As publicações
recentes na área da administração estratégica prestam pouca atenção à
ética e às obrigações morais da administração, porque sua preocupação
gira em torno do seu fim, ou seja, em atingir objetivos estratégicos, e não
em como eles são atingidos dentro de um contexto ético, social e moral.
Os executivos precisam aprender a construir estratégias com base
no raciocínio ético, em vez de considerarem a estratégia e a ética como
elementos separados (FREEMAN; GILBERT, 1988). O sucesso de uma or-
ganização não é apenas um fim em si, mas um meio de promoção dos
interesses dos outros stakeholders (WICKS; GILBERT; FREEMAN, 1994).

A discussão ética é o único meio de resolução de conflitos relacio-


nados aos valores e aos objetivos dos stakeholders, portanto é essencial
no processo de estratégia.

Ética, responsabilidade social corporativa e sustentabilidade 113


Desse modo, para evitarmos escândalos e falhas nos negócios,
como os comumente presentes nos noticiários, precisamos que a ética
esteja mais integrada à prática de gerenciamento estratégico. Sendo
assim, vamos discutir, primeiramente, a moralidade e os problemas
morais; em seguida, a análise ética; e, por fim, os princípios éticos e sua
Biografia
London Stereoscopic Company/
aplicação à estratégia.
Wikimedia Commons

5.1.1 Moralidade e problemas morais


A moralidade preocupa-se com as normas, os valores e as crenças
embutidos nos processos sociais que definem o certo e o errado para
uma comunidade composta de indivíduos. Todos os indivíduos têm
moralidade, ou seja, um senso básico de certo e errado em relação a
John Stuart Mill (1806-1873) é
considerado por muitos o maior uma atividade específica. O gerente como pessoa moral é caracteri-
filósofo inglês. Ele popularizou zado em termos de traços individuais; já como gerente moral é visto
as ideias da ética utilitária, que é
como transmissor de uma mensagem ética, percebida por outras pes-
referência para a discussão sobre
como as decisões estratégicas soas, por meio dos pontos de vista e comportamentos dele.
são tomadas.
Os problemas morais preocupam-se com os danos causados por ou-
tros e, principalmente, com aqueles causados ou provocados a outros. O
2 2
princípio do dano tem muitas fontes, entre elas o utilitarismo , de John
O utilitarismo é uma teoria moral Stuart Mill. Como utilitarista, Mill (1957) sustentou que as ações corretas
cuja ideia central é que o efeito de
eram aquelas que trariam o melhor em determinada situação.
uma ação é o que determina se
ela é certa ou errada, ou seja, se Desse ponto de vista moral, prejudicar os outros raramente pro-
produz bons ou maus resultados.
Um exemplo de utilitarismo foi move o melhor, e a prevenção dos danos é a promoção do bem.
a crença de que jogar a bomba Por exemplo, se uma empresa na Europa decidir mudar suas ope-
atômica no Japão durante a rações para a China para diminuir seus custos com mão de obra, a
Segunda Guerra foi moral porque,
potencialmente, mais vidas foram consequência será o desemprego de seus funcionários atuais. Já se
salvas do que perdidas. uma clínica optar por retirar os serviços do clínico geral nos fins de
semana para reduzir custos, a consequência será um número de
pessoas sem tratamento nesse período.

Os problemas morais associados à tomada de decisões estra-


tégicas são complexos, porque os danos a alguns estão previsi-
velmente associados a benefícios para outros. O movimento das
operações para uma economia de salários baixos, obviamente,
prejudica os trabalhadores na Europa, mas beneficia igualmente
os novos funcionários na China, os acionistas e outros stakeholders,

114 Estratégia Empresarial


como fornecedores e credores. A questão a ser considerada é se
essa transferência de operações é certa, justa e correta.

Hosmer (1994) sustenta, com base em uma perspectiva econômica,


que ações gerenciais devem ser implementadas, independentemente
dos danos a alguns, a fim de manter ou ampliar os benefícios de ou-
tros. Assim, mudar as operações da empresa para a China seria uma
ação moral, porque beneficiaria um maior número de stakeholders e
garantiria a sustentabilidade econômica da empresa.

5.1.2 Análise ética


A doutrina por trás da análise ética está ligada à visão de que prin-
cípios éticos não são medidas subjetivas que variam de acordo com as
condições culturais e econômicas, mas são regras básicas que garan-
tem a existência de uma sociedade de bem (RAWLS, 1971).

A discussão ética, recente no âmbito empresarial, afastou o debate


da ética normativa, em que, em vez de se verificar cada ação de acor-
do com seus resultados ou seus princípios subjacentes, o discurso e as
abordagens éticas pós-modernas olham para o caráter do tomador de
decisão (CRANE et al., 2008). Assim, a discussão ética atual tenta respon-
der à pergunta: “o que o tomador de decisão deve fazer?”.

Observe o Quadro 1, no qual tratamos de uma relação de princípios


éticos que servem de explicação e de debate para a atuação ética das
empresas e dos seus gestores.

Quadro 1
Aplicação dos princípios éticos

phipatbig/Shutterstock
Princípio Foco Descrição Exemplo de aplicação
Egoísmo
A sociedade como um todo será melhor,
Não tome decisões que não sejam
Interesses mais livre e produtiva se cuidarmos de nos-
de seu interesse pessoal e da orga-
individuais sos próprios interesses, sem interferir nos
nização em que trabalha.
direitos dos outros.

Utilitarismo
Uma ação é moralmente correta se resul- Não tome decisões que não resul-
Bem-estar
tar no bem maior, ou seja, da maior quan- tem em um bem maior para a socie-
coletivo
tidade de pessoas afetadas pela decisão. dade da qual você faz parte.

(Continua)

Ética, responsabilidade social corporativa e sustentabilidade 115


Princípio Foco Descrição Exemplo de aplicação
Ética dos As pessoas devem aplicar um conjunto de
deveres Deveres do leis morais preexistentes a todos os pro- Tomar uma decisão correta é o seu
homem como blemas éticos. Os seres humanos são ato- dever e dos outros em uma situação
um ser moral e res morais independentes, que tomam as similar, mas os indivíduos são livres
racional próprias decisões racionais sobre o que é para tomá-la ou não.
certo e errado.

Direitos
Direitos do Eticamente, os direitos geralmente resul- Nunca tome uma decisão que redu-
homem tam no dever dos outros em respeitá-los. za os direitos dos outros.

Justiça
Nunca tome uma decisão em que a
Preocupação com procedimentos e resul-
Justiça humana parte desfavorecida possa ser preju-
tados justos.
dicada.

Eficiência
econômica Atingir esse objetivo é otimizar a eficiência Sempre aja para maximizar os lu-
Supremacia dos do sistema econômico. Todos os sistemas cros, sujeito a restrições legais e de
acionistas econômicos são mecanismos para servir às mercado. Lucros representam um
necessidades da população. sistema de produção eficiente.

Não
igualitário O princípio baseia-se na premissa de que a
Nunca tome uma atitude que inter-
distribuição da riqueza na sociedade é jus-
Empoderamento fira no direito de autorrealização ou
ta, desde que sejam criadas condições para
de autodesenvolvimento dos outros.
trocas e transferências justas.

Fonte: Adaptado de McManus, 2011.


O Quadro 1 estabelece princípios éticos objetivos, não subjetivos,
e que não variam de acordo com a cultura, o país ou o tempo. Por
Atividade 1
exemplo, não prejudicar aqueles com menos educação, menor renda e
Suponha que você recebeu riqueza significa exatamente a mesma coisa em qualquer idioma. É ine-
uma proposta para vender sua
empresa por uma fortuna, mas gável que os padrões e valores morais diferem entre pessoas e grupos
sabe que o comprador irá fechar (MCMANUS, 2011), assim também devemos levar em consideração in-
sua fábrica, pois ele só tem fluências religiosas, culturais, econômicas e sociais em nosso processo
interesse em sua marca, o que
resultaria na demissão de todos de tomada de decisão estratégica.
os seus funcionários. O que você
Uma pesquisa, realizada por Kohlberg (1981), concluiu que a maio-
faria? Exponha as implicações
éticas de sua decisão. ria das pessoas pensa, conscientemente, de acordo com o que é espe-
rado pelos outros, ou seja, a maioria de nós decide o que é certo tendo
em vista o que percebemos que os outros acreditam e esperam de nós.
Desse modo, os princípios éticos são regras fundamentais que guiam
nosso comportamento e o que os outros esperam de nós.

116 Estratégia Empresarial


5.1.3 Princípios éticos e sua aplicação à estratégia
Se considerarmos que os princípios éticos são objetivos e contri-
buem coletivamente para decidirmos o que é certo e justo para as
nossas organizações, devemos buscar entender como eles podem ser
utilizados na estratégia empresarial, ou seja, como aplicá-los quando
determinamos metas, missão, visão, objetivos e posição em nossas
empresas. Os princípios éticos de análise descritos no Quadro 1 for-
necem diferentes perspectivas de olhar para o mundo e de como pro-
ceder ao tomar decisões estratégicas. A ideia, no entanto, é incorporar
tais princípios ao seu processo de tomada de decisão, equilibrando a
influência deles aos stakeholders. Vamos observar um exemplo de apli-
cação no Estudo de caso a seguir.

Estudo de caso

Juan foi contratado para ser presidente de uma empresa de autopeças que está pas-
sando por um momento muito ruim. Ela está prestes a perder seu principal contrato com
um fabricante de veículos, porque ele entendeu que a empresa não tem uma política de
gênero adequada e lhe deu 60 dias para encontrar uma solução.
O quadro que Juan se depara é o de uma organização muito eficiente, que produz e
entrega peças de qualidade com o menor preço do mercado, mas 90% dos seus funcio-
nários são homens e nenhuma mulher exerce um cargo de liderança. O que Juan deve
fazer? Mandar 40% dos homens embora e contratar mulheres para seus lugares? Juan
deve, então, tomar uma decisão baseada nos princípios éticos.
Pelo princípio do egoísmo, Juan deve atender à demanda do seu cliente (o fabricante
de autopeças), porque é do interesse da sua empresa manter o contrato. Além disso, pelo
princípio de eficiência econômica, mantendo o contrato, Juan continua maximizando 3
os lucros, mesmo incorrendo em custos trabalhistas e previdenciários ao dispensar 40%
O plano de demissão voluntária
dos homens. Em situações como essa, Juan pode, por exemplo, minimizar os custos crian- (PDV) é um instrumento legal
do um plano de demissão voluntária (PDV) 3 . para a redução do quadro de
De acordo com o princípio do utilitarismo, Juan também deve seguir com a demis- funcionários de uma empresa
que consiste em um acordo
são, porque os únicos prejudicados serão 40% dos homens demitidos e, além de atender às
mútuo entre a empresa e o
exigências do cliente, Juan criará um benefício social maior ao criar uma política de gestão funcionário, por meio do qual se
de pessoas que leva em consideração a igualdade de gênero. estabelece o fim de um contrato
No entanto, com base nos princípios da ética dos deveres, dos direitos e da de trabalho partindo de uma
“demissão espontânea”, gerando
justiça, Juan não estará agindo eticamente se apenas demitir os 40% e contratar as mu- vantagens para o empregado e
lheres para continuar com o contrato, pois não está sendo justo e não estará fazendo o que para o empregador.
deve ser feito. Assim, para que sua decisão seja ética, Juan deve criar uma compensação
extra para os homens demitidos, custeando, por exemplo, um programa de recolocação
para eles no mercado ou em outras empresas.
(Continua)

Ética, responsabilidade social corporativa e sustentabilidade 117


Filme
Já segundo o princípio não igualitário, apenas contratar as mulheres e colocá-las
O filme Fome de Poder
mostra a trajetória de Ray em cargos inferiores, simplesmente para cumprir a cota estabelecida pelo seu cliente,
Kroc, o vendedor de má- não é uma decisão ética. Juan precisa criar um projeto que dê condições para que essas
quinas de milk shake que mulheres possam se desenvolver como funcionárias e almejar cargos mais altos. Além
transformou o McDon-
ald’s no maior símbolo de
disso, Juan pode criar uma política permanente de gestão de pessoas para lidar com a
fast-food do mundo. Esse questão do gênero em sua empresa, que envolva recrutamento, seleção e treinamento
filme apresenta uma série levando em consideração o papel da mulher em sua empresa e na sociedade em geral.
de conflitos de interesse
e éticos que podem ser
relacionados ao conteúdo
Em resumo, a decisão estrategicamente ética apresentada no Estudo
deste capítulo.
de caso requer uma série de ações e projetos que, no curto prazo, incor-
Direção: John Lee Hancock. EUA:
Weinstein Company, 2017. rerá em diversos custos não previstos por Juan, mas sua decisão será sus-
tentável no longo prazo, fortalecendo a posição estratégica da empresa.

Diante de situações como essa, as discussões sobre ética e estraté-


gia empresarial estão cada vez mais presentes no dia a dia dos gesto-
res, e uma maneira de tornar esse debate mais abrangente é observar
e ter como base a responsabilidade social corporativa.

5.2 Responsabilidade social


corporativa e estratégia
Vídeo Responsabilidade social significa considerar o interesse público nas de-
cisões estratégicas, assim “é obrigação dos gestores tomarem ações que
protejam e melhorem o bem-estar da sociedade como um todo, junta-
mente com seus próprios interesses” (DAVIS; BLOMSTROM, 1966, p. 39).

A Comissão Europeia (2011, p. 6) define Responsabilidade Social


Corporativa (RSC) como “a responsabilidade da empresa por seus
impactos na sociedade”.

Em nossa sociedade contemporânea, há uma aceitação crescente


de que os negócios, além de cuidarem de seu próprio interesse econô-
mico, devem ajudar a resolver alguns dos problemas sociais e ambien-
tais (KRENG; HUANG, 2011).

A discussão sobre a RSC gira em torno de duas posições extremas:


uma orientação com fins lucrativos e outra com fins pró-sociais. Aque-
les que apoiam a primeira consideram a maximização do lucro como
o principal objetivo da empresa e um dever dos gestores (GASPARSKI;

118 Estratégia Empresarial


LEWICKA-STRZAŁECKA, 2012). Já a segunda orientação acredita que os
negócios podem e devem ter um melhor desempenho quando fazem
o bem (SPILLER, 2000).

Segundo Kaler (2003), uma maneira de incorporar a RSC à estratégia


dos negócios é aplicar a teoria dos stakeholders, a qual defende que o
objetivo final da organização não é apenas o lucro, mas, sim, servir a
todos os que são identificados como partes interessadas, que é um
conceito central da ética nos negócios.

Os gestores aplicam a responsabilidade social ao considerarem as


necessidades das partes interessadas (stakeholders), que podem ser
afetadas por suas decisões e ações estratégicas. Ao fazer isso, eles
olham além de seus próprios interesses pessoais e dos interesses eco-
nômicos e técnicos da empresa.

O conceito de stakeholders não é novo e, de acordo com antigas


tradições, entende a atividade empresarial como parte integrante
da sociedade e não à parte da sociedade com objetivos puramente
econômicos.

Diferentes grupos de partes interessadas exercem, direta e indireta-


mente, uma influência importante na estratégia da empresa, portanto
saber quais grupos e como eles influenciam os negócios é crucial para
a estratégia. Conforme Buysse e Verbeke (2003, p. 453) concluem, as
“estratégias sociais amplas e pró-ativas estão associadas a uma cober-
tura mais profunda e mais ampla das partes interessadas”, mas exigem
o uso de mais recursos em diferentes áreas, o que gera esforços e des-
pesas para a organização.

No entanto, segundo Porter e Kramer (2011), os gestores empre-


sariais, governos e organizações não governamentais devem mudar
a razão de ser da RSC, substituindo o que eles chamam de mentali-
dade de RSC por algo a ser chamado de integração social corporativa.
Todas essas partes interessadas devem começar a perceber “a res-
ponsabilidade social como construção de valor compartilhado, e não
como controle de danos, como uma campanha de relações públicas”
(PORTER; KRAMER, 2006, p. 92).

Observe o Estudo de caso envolvendo a TOMS Shoes, que, para


muitas pessoas, é um dos maiores exemplos de sucesso empresarial
atrelado à responsabilidade social corporativa.

Ética, responsabilidade social corporativa e sustentabilidade 119


Estudo de caso

A TOMS Shoes é um fabricante de sapatos que construiu uma imagem social baseada
no modelo comprar um/doar um. Seu fundador teve essa ideia quando visitou a Argentina
e viu muitas crianças descalças e, ao mesmo tempo, percebeu que muitos adultos usavam
um sapato muito simples e confortável – as tradicionais alpargatas (TOMS, 2020).
Assim, a TOMS Shoes começou a fabricar alpargatas em muitos estilos e cores e pro-
meteu aos clientes que, a cada par de sapatos que comprassem, outro par iria para as
pessoas necessitadas. Essa ideia decolou a empresa a tal ponto que a TOMS retirou o Shoes
de seu nome e construiu um império de produtos, expandindo-se para óculos de sol, café
(cuja compra fornece água para onde é necessário) e outros produtos.
O universo de doações da TOMS continua em expansão e agora inclui nutrição, saúde
e educação. A TOMS, seguindo a tendência emergente da RSC, iniciou uma onda de negó-
cios que faz o bem como parte de sua estratégia. Segundo seu gestor, o incentivo de seu
trabalho está no fato de todos saberem que todos os dias irão doar um par de sapatos para
cada um que venderem e, se não conseguirem fazer o negócio funcionar dessa maneira,
ele não existirá.

Por meio desse Estudo de caso, podemos perceber que a TOMS vai
além do que as outras empresas fazem, pois se baseia na premissa de
que as vendas são iguais ao bem feito. Esse efeito é gerado pela TOMS
porque ela desenvolveu sua estratégia com base em um projeto social,
fazendo com que a RSC esteja totalmente integrada à sua estratégia.

Todavia, como as empresas podem alcançar objetivos e metas de


RSC em sua estratégia? Começaremos procurando argumentos: qual é
o objetivo de incluir a RSC na estratégia empresarial e por que é neces-
sário fazer isso? As respostas são as seguintes:
•• Com a introdução de objetivos sociais na estratégia, pretende-
-se fazer bem (ter um desempenho superior) ao fazer o bem. As
empresas são instituições muito poderosas com recursos que
podem ser aplicados para solucionar problemas sociais e am-
bientais e, assim, também precisam assumir a responsabilidade
pela sociedade;
•• A estratégia de RSC reduz os custos de mão de obra, aumen-
ta a moral e a lealdade dos funcionários e a produtividade,
porque eles sentem que seu trabalho tem um objetivo maior.
Não podemos esquecer que muitas empresas são vistas como
uma das principais causas de problemas sociais, ambientais
e econômicos.

120 Estratégia Empresarial


Não existe uma solução universal para incluir objetivos sociais
na estratégia organizacional, mas existem vários possíveis, tantos
quanto organizações existentes e problemas não resolvidos. Burke e
Logsdon (1996) consideram que, para a RSC ser estratégica, deve ge-
rar resultados para a empresa por meio de atividades relacionadas às
suas atividades principais, gerando assim eficiência e cumprindo sua
missão. Para esses autores, quando uma empresa adota um progra-
ma social de trabalho voluntário, por exemplo, ela está sendo social-
mente responsável, mas não de uma maneira estratégica, pois, para
que isso ocorra, o trabalho voluntário deve estar atrelado à missão e
fazer parte do dia a dia da organização, principalmente conectado às
atividades regulares desempenhadas por ela.

A RSC pode ser vista como uma forma de obter diferenciação,


como um elemento de construção de reputação e como um meio
de ser mais transparente como resultado da publicidade gratuita ge-
rada, assim as organizações devem usar a mesma abordagem com
relação à RSC que usam para seus principais negócios. Além de ser
um custo, uma restrição ou uma instituição de caridade, ela pode
ser uma fonte de oportunidade, inovação e vantagem competitiva
(PORTER; KRAMER, 2006).
Glossário
Porter e Kramer (2011) chamam esse processo de inserção da RSC
valor compartilhado:
na estratégia de processo de criação de valor compartilhado, especi- benefícios em relação aos custos
ficamente, políticas e práticas operacionais que aumentam a competi- (PORTER; KRAMER, 2011).
tividade de uma empresa e, simultaneamente, avançam as condições
econômicas e sociais nas comunidades em que esta opera.

Diante desse conceito de valor social compartilhado e da teoria dos


stakeholders, para a RSC ser estratégica, é necessário identificarmos,
por meio das partes interessadas, áreas de ações estratégicas que ge-
rem valor social compartilhado.

Spiller (2000) apresenta uma lista de possíveis objetivos e metas so-


ciais e ambientais para as organizações escolherem e implementarem
em suas estratégias. Essa lista consiste em seis grandes partes interes-
sadas, com metas sociais e ambientais para cada uma delas, conforme
podemos observar a seguir.

Ética, responsabilidade social corporativa e sustentabilidade 121


Comunidade: doações financeiras; apoio a programas de educação; trei-
namento profissional; envolvimento direto em projetos e assuntos comu-
nitários; programas de voluntariado comunitário; apoio à economia local;
campanhas por mudanças ambientais e sociais; abordagem de filantropia
liderada por funcionários; atividade comunitária eficiente e eficaz; divulgação
ou desempenho ambiental e social.

Meio ambiente: políticas; organização e gerenciamento ambiental; políti-


ca de materiais de redução, reutilização e reciclagem; monitoramento, mini-
mização e responsabilização por lançamentos no ambiente; gerenciamento
de resíduos; conservação de energia; diálogo e divulgação pública; requisitos
ambientais para fornecedores; auditorias ambientais.

Empregados: remuneração justa; comunicação eficaz; oportunidades de


aprendizado e desenvolvimento; realização de trabalho; ambiente de trabalho
saudável e seguro; oportunidades iguais de emprego; segurança no emprego;
liderança competente; espírito comunitário; integração da missão social.

Clientes: programa de qualidade; valor ao dinheiro; propaganda verdadei-


ra; divulgação completa das características e efeitos do produto; liderança em
pesquisa e desenvolvimento; embalagem mínima; resposta rápida e respeito-
sa a comentários, críticas, reclamações e preocupações dos clientes; diálogo
com os clientes; produtos seguros; produção e composição ambientais e so-
cialmente responsáveis.

Fornecedores: desenvolvimento e mantimento de relações de compra a


longo prazo; expectativas claras; preços justos e faturas de acordo com os
termos acordados; tratamento justo e competente de conflitos e disputas; in-
centivo para fornecer sugestões inovadoras; ajuda aos fornecedores a melho-
rar seu desempenho ambiental e social; uso de fornecedores locais; busca de
fornecedores pertencentes a minorias; inclusão de um elemento ambiental e
social na seleção de fornecedores.

Acionistas: boa taxa ou retorno a longo prazo para os acionistas; disse-


minação de informações abrangentes e claras; desenvolvimento e construção
de relacionamentos com os acionistas; política clara de dividendos e paga-
mento de dividendos apropriados; questões de governança corporativa bem
gerenciadas; acesso para empresa aos diretores e gerentes seniores; relatório
e contas anuais fornecendo uma imagem abrangente do desempenho geral
da empresa; estratégia de negócios clara a longo prazo; comunicação aberta
com a comunidade financeira.

Atividade 2
Assim, ao incluir a identificação e análise dos interesses dos
Por que uma orientação para
stakeholders à estratégia da sua empresa, desenvolver ações de
a responsabilidade social
corporativa é considerada mais RSC alinhadas ao que você faz bem parece se tornar mais nítido e
estratégica? gera retornos pelos seus esforços.

122 Estratégia Empresarial


Empresas globais como a Xerox (2020) e a Patagonia (2020) atrela-
ram a RSC às suas estratégias. Observe esses exemplos nos estudos de
caso a seguir.

Estudo de caso
Xerox
A Xerox se envolve em inúmeras iniciativas de RSC, com destaque para o XEROX
Community Program (XCIP). O XCIP é o programa mais antigo da empresa e adota uma
abordagem “glocal” (global e local) para sua estratégia de RSC. Nesse programa, funcioná-
rios são financiados para atuar em projetos de sua escolha, em suas comunidades locais,
para fazer a diferença nos projetos. Desde 2012, eles patrocinam mais de 18 mil projetos
com mais de 400 mil participantes.
Patagonia
A Patagonia é uma empresa de roupas que se identifica com o ar livre e acredita em am-
biente saudável. Porém, o seu impacto ambiental aumenta à medida que a empresa cresce.
Assim, a Patagonia tem o desafio de aumentar sua produção e, ao mesmo tempo, reduzir
esse impacto. Para isso, a empresa é transparente e aborda diferentes questões ambientais
e sociais, por exemplo:
a. Fornecimento de materiais: usar algodão orgânico, desde 1994, e ter relações
profundas com os agricultores desse material para manter a qualidade de seu insumo.
b. Salário digno: garantir que seus funcionários não recebam apenas um salário
mínimo, mas, sim, um salário digno, admitindo que isso é algo difícil de alcançar
e que ainda não atingiram seu objetivo, mas que estão trabalhando nesse sentido.
c. Mudança climática: garantir que usem energia renovável e trabalhem em prédios
verdes, além de apoiar ambientalistas por meio de uma taxa criada por eles
mesmos, doando 1% de suas vendas para esforços de conservação ambiental.

Conforme podemos observar nos casos da Xerox e da Patagonia,


há a necessidade de se criar estratégias que alinhem o crescimento
dos negócios às práticas sociais e ambientais. Agora, vamos estudar
um conceito muito alinhado ao de RSC, o de sustentabilidade, e como
ser estratégico ao incorporar suas práticas às atividades empresariais.

5.3 Sustentabilidade
Vídeo De acordo com o relatório do Banco Mundial (2013), o número
de pessoas que vivem com menos de US$ 1,25 por dia diminuiu
consideravelmente nos últimos 30 anos, de 50% para 21%, mesmo
levando em consideração o aumento de 59% em população. Se-
gundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Eco-

Ética, responsabilidade social corporativa e sustentabilidade 123


nômico (OCDE, 2020), esse crescimento econômico tirou milhões
de indivíduos da pobreza e melhorou consideravelmente o padrão
de vida das pessoas. No entanto, houveram custos associados a
esse desenvolvimento, como: o aumento no número de desastres
naturais no mundo, que dobrou desde 1980; a desigualdade social;
o desemprego dos jovens; a renda média nos países desenvolvidos
estagnada desde 1989; e o salário das mulheres serem três vezes
menor por trabalho igual ao dos homens. Isso é uma indicação de
que o progresso alcançado não foi o desejado.

Hoje, as economias de todo o mundo enfrentam desafios sem pre-


cedentes, por exemplo, mudanças climáticas, desastres naturais, perda
de biodiversidade, fome e desnutrição, desigualdade econômica, inse-
gurança social e assim por diante (ELKINGTON, 2006).

Em 25 de setembro de 2015, a Assembleia Geral das Nações Unidas


adotou os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que lança-
ram uma nova agenda para acabar com a pobreza, garantir a prosperi-
dade mundial e proteger o planeta até 2030.

Figura 1
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS)

1. ERRADICAÇÃO 3. BOA SAÚDE E 4. EDUCAÇÃO 5. IGUALDADE 6. ÁGUA LIMPA

MintArt/Shutterstock
2. FOME ZERO
DA POBREZA BEM-ESTAR DE QUALIDADE DE GÊNERO E SANEAMENTO

7. ENERGIA 8. EMPREGO DIGNO 9. INDÚSTRIA, 10. REDUÇÃO DAS 11. CIDADES E 12. CONSUMO
ACESSÍVEL E LIMPA E CRESCIMENTO INOVAÇÃO E COMUNIDADES E PRODUÇÃO
INFRAESTRUTURA DESIGUALDADES
ECONÔMICO SUSTENTÁVEIS RESPONSÁVEIS

13. COMBATE 14. VIDA DEBAIXO 15. VIDA SOBRE 16. PAZ, JUSTIÇA Objetivos de
17. PARCERIAS EM
ÀS ALTERAÇÕES Desenvolvimento
D’ÁGUA A TERRA E INSTITUIÇÕES PROL DAS METAS
CLIMÁTICAS Sustentável
FORTES

Fonte: Organização das Nações Unidas (ONU), 2020.

124 Estratégia Empresarial


Conforme observamos na Figura 1, são 17 metas que estabele-
cem uma agenda para todas as organizações cujo objetivo é alcan-
çar um equilíbrio entre ações guiadas pelos aspectos econômicos,
sociais e ambientais do desenvolvimento da sustentabilidade. Mas
o que é sustentabilidade?
A sustentabilidade é uma abordagem abrangente, que conside-
ra as dimensões econômica, social e ambiental, reconhecendo que
todos devem ser considerados juntos para encontrar uma prospe-
ridade duradoura (Figura 2).
Figura 2
Os três pilares do desenvol-
vimento sustentável

Dimensão econômica Dimensão social

A capacidade da economia As necessidades


das nações deve suportar universais básicas e
indefinidamente determinado os direitos humanos
Igualdade
nível de produção econômica devem ser respeitados e
que permita o acesso disponibilizados a todas
das pessoas aos recursos as pessoas, garantindo
financeiros. segurança e bem-estar
social.
Sustentável

Viabilidade Aceitável

Dimensão ambiental

A integridade ecológica é mantida por


meio da capacidade de mantermos
ou renovarmos os recursos naturais
disponíveis nos ecossistemas sem
causar desequilíbrio à medida que os
consumimos.

Fonte: Elaborada pelo autor com base em Elkington, 2006.

As empresas são significativas e têm potencial para contribuir com


os objetivos do desenvolvimento sustentável, dados os recursos à sua
disposição e sua esfera de influência e oportunidades de negócios.
Hoje, elas devem, portanto, expandir seus objetivos, e não limitá-los
ao lucro (dimensão econômica ou financeira), para uma lógica triparti-
de, que incorpora os pontos de vista social e ambiental ao econômico.
(FISHER; LOVELL, 2009; ELKINGTON, 2006).

Ética, responsabilidade social corporativa e sustentabilidade 125


Assim, Elkington (1994) cunhou o que denomina triple bottom line
(resultado triplo) como sendo o tripé da sustentabilidade, que une pes-
soas, planeta e lucro, conforme descrito a seguir.

Pessoas

Nessa dimensão, consideramos os funcionários, todos os afetados


pelas atividades empresariais da organização, os fornecedores e a co-
munidade em geral onde uma corporação faz negócios. Uma empresa
que busca resultados triplos, por exemplo, paga salários justos e toma
medidas para garantir condições de trabalho humanizadas, além de
se esforçar para “retribuir” à comunidade. Por exemplo, uma empresa
pode financiar um projeto educacional para a comunidade onde está
instalada, a qual pode ser uma fonte futura de mão de obra qualificada,
beneficiando as pessoas ao seu redor.

Planeta

4 A parte planeta do resultado triplo indica que uma organização


4
tenta reduzir ao máximo sua Pegada Ecológica . Esses esforços
A Pegada Ecológica mede a
quantidade de recursos naturais podem incluir a redução do desperdício, o investimento em ener-
renováveis necessários para gia renovável, o gerenciamento dos recursos naturais com mais
manter as atividades da empresa.
eficiência e o melhoramento da logística. Por exemplo, a Apple
utiliza quase toda sua energia de fontes renováveis.
Site
Visite o site Pegada
Ecológica, que se trata
Lucro
de uma calculadora para
medir a quantidade de
Embora todas as empresas busquem rentabilidade financeira, as
recursos naturais reno-
váveis para manter nosso empresas com resultados triplos consideram isso apenas uma parte de
estilo de vida, e analise
sua estratégia. Lucro para empresas sustentáveis não é diametralmente
qual é o seu impacto no
meio ambiente. oposto aos elementos pessoas ou planeta. Por exemplo, a empresa sue-
Disponível em: http://www.pega- ca de móveis IKEA obtém lucro ao reciclar resíduos de alguns de seus
daecologica.org.br/2015/index.php. produtos mais vendidos porque, antes de ter uma estratégia para tanto,
Acesso em: 13 abr. 2020.
esse desperdício custava à empresa mais de US$ 1 milhão por ano.

Para Schroeder e Denoble (2014), um negócio de triple bottom line


é aquele que atende aos clientes com lucro razoável, não superior ao
necessário, e ajuda a proteger o meio ambiente. Assim, as empresas

126 Estratégia Empresarial


estão integrando as dimensões da sustentabilidade à sua estratégia e
ao seu processo de tomada de decisão.
Investimentos em sustentabilidade empresarial podem valer a pena.
Um estudo do Massachusetts Institute of Technology (MIT) constatou
que as empresas que tratavam seriamente a sustentabilidade lucravam
com suas atividades sustentáveis. O sucesso e a lucratividade das ini-
ciativas corporativas de sustentabilidade dependem de uma estratégia
implementada que consiga levar resultado triplo da teoria à realidade
(AMOS; UNIAMIKOGBO, 2016).
Observe o que algumas empresas planejaram em suas estratégias:
•• Unilever: reutilizar 100% das embalagens até 2025.
•• DHL: atingir zero emissão de carbono até 2050.
•• Coca-Cola: alcançar reciclagem total até 2030.

Uma estratégia voltada para a sustentabilidade, assim, requer que


a empresa, primeiramente, estabeleça objetivos estratégicos além do
lucro, baseados nos ODS, e, com base nesses objetivos, trace uma sé-
Atividade 3
rie de ações integradas, as quais possam ser medidas por indicadores
financeiros e não financeiros. Considerando que a sustentabilidade é Por que vale a pena ter uma abor-
dagem tripla para os negócios?
o futuro do sucesso empresarial, é necessário sermos criativos para
integrarmos as três dimensões do triple bottom line ao nosso processo
de planejamento e implementação estratégica.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conforme estudamos neste capítulo, as empresas e seus gerentes to-
mam decisões estratégicas constantes sobre alocações de recursos no
ambiente natural e acerca do uso sustentável dos recursos naturais, o tra-
tamento dos ecossistemas e seres humanos e não humanos. Assim, é im-
possível ignorar os fundamentos éticos de tais ações e suas consequências.
Além disso, estratégias orientadas para Responsabilidade Social Cor-
porativa (RSC) e a sustentabilidade são mais eficazes. No entanto, não
adianta abordar esses temas como um meio para um fim, pois sua estra-
tégia terá apenas um papel instrumental marginal. Desse modo, é neces-
sário incluir uma abordagem mais integrativa e intrínseca que veja a RSC
e a sustentabilidade como um fim e o processo estratégico como o meio
para tanto, visando a uma empresa verdadeiramente ética, responsável
e sustentável.

Ética, responsabilidade social corporativa e sustentabilidade 127


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www.researchgate.net/publication/269878965_A_Feminist_Reinterpretation_of_The_
Stakeholder_Concept. Acesso em: 13 abr. 2020.
XEROX CORPORATION. Xerox. Página inicial, 2020. Disponível em: https://www.xerox.
com/index/ptbr.html. Acesso em: 13 abr. 2020.

GABARITO
1. A reflexão ética depende da sua abordagem para a questão. Por exemplo, do seu
ponto de vista, vender a empresa é uma decisão ética, em princípio, porque atende
ao seu interesse. Mas, de uma maneira mais abrangente, a decisão ética seria vender
a empresa, comunicar os empregados e discutir com o comprador uma solução em
conjunto para o desemprego deles.

2. É mais estratégica porque, invariavelmente, levará em conta o interesse de um núme-


ro maior de stakeholders, fazendo com que mais deles queiram fazer negócios com ela,
pois a empresa terá uma percepção de ser mais integrada à sociedade.

3. Uma abordagem tripla faz com que sua estratégia seja mais abrangente, mais alinha-
da com o ambiente externo e mais criativa, porque faz com que você observe elemen-
tos não óbvios no contexto empresarial.

Ética, responsabilidade social corporativa e sustentabilidade 129


6
Estratégia aplicada a
produtos e serviços
Todo processo estratégico tem como objetivo fazer com que uma
organização realize integralmente seu propósito, que vai além do lucro.
O propósito de uma empresa é promover valor para os consumidores
– pessoas físicas ou jurídicas –, o qual é desenvolvido pela empresa e en-
tregue por meio de produtos e serviços, ou seja, eles são a embalagem
que armazena e entrega o processo estratégico.
Imagine que você e sua família são uma empresa e decidiram me-
lhorar as condições sociais do bairro onde moram e acreditam que o
relacionamento entre os vizinhos é o caminho para que isso aconteça.
Assim, os valores que vocês querem entregar aos outros é amizade e
cordialidade entre as pessoas no seu entorno. Porém, na prática, qual
serviço ou produto irá embalar amizade e cordialidade?
Em uma reunião familiar, vocês resolvem fazer um evento de con-
fraternização para celebrar a vida. O evento é o serviço que vocês irão
desenvolver e “vender” para a comunidade. O desenvolvimento desse
evento depende do que chamamos de estratégia de produtos ou serviços,
desde o estágio inicial, ou seja, a geração de ideias de como será esse
evento, até a sua entrega final. No entanto, isso não é suficiente para
você entregar o valor comunitário estabelecido pela estratégia da sua
família, porque uma estratégia de sucesso requer sustentabilidade ao
longo do tempo, assim vocês devem pensar em como manter esse even-
to vivo e constante. Portanto, além do desenvolvimento dessa ideia e sua
implementação, vocês precisão de um processo de inovação estratégica.
Dessa forma, inicialmente, este capítulo abordará os principais
conceitos e as práticas da estratégia para produtos e serviços, como
desenvolver novos produtos e serviços e como inovar constantemente
a sua oferta. Tudo isso para você e sua empresa entregarem valor que
seja percebido pelos seus consumidores.

130 Estratégia Empresarial


6.1 Estratégia de produtos e serviços
Vídeo O primeiro passo para entender a estratégia aplicada a produtos
e serviços é compreendermos o seu significado. Genericamente, esse
assunto trata das nossas ofertas que servem para satisfazer aos de-
sejos e às necessidades dos nossos consumidores. Essas ofertas são
feitas por meio de bens tangíveis, comumente classificados como
produtos (uma televisão, um livro e um carro, por exemplo), e bens
intangíveis, que significam serviços, como uma consultoria, um aten-
dimento médico ou os programas educacionais oferecidos por uma
instituição de ensino (LAMB; HAIR; MCDANIEL, 2011).

Especificamente, produtos são bens físicos que geram uma


demanda com base no direito de propriedade, que pode ser
transferido entre pessoas ou organizações mediante um sistema
de troca preestabelecido.

Por exemplo, ao comprar um carro (bem tangível), a sua propriedade


é transferida de uma concessionária de veículos para você em troca de
um valor monetário.

Hill (1999) resumiu as principais características dos produtos como


sendo algo que existe independentemente de seu proprietário e que
tem sua identidade preservada ao longo do tempo. Seguindo essa linha
de raciocínio, os produtos possuem as seguintes características:
•• são objetos físicos para os quais existe uma demanda;
•• possuem atributos físicos que são preservados ao longo do
tempo;
•• podem estabelecer direitos de propriedade;
•• existem independentemente de seus proprietários;
•• são permutáveis;
•• podem trocar seus direitos de propriedade en- Glossário
tre instituições;
permutável: algo que pode
•• podem ser negociados em mercados; ser trocado por outro.

•• são o resultado de todo trabalho e conheci-


mento da empresa;

Estratégia aplicada a produtos e serviços 131


•• refletem o conjunto de todas as partes do trabalho de uma orga-
1 1
nização .
Esse processo geralmente pode
ser visualizado em linhas de O serviço, por outro lado, não é algo físico, mas um ato ou
montagem. desempenho oferecido de uma parte à outra, resultando em
uma percepção (satisfação ou insatisfação) do consumidor
(LOVELOCK; WIRTZ; HEMZO, 2011).

Assim, o serviço é toda atividade ou benefício, essencialmente


intangível, que não resulta da propriedade ou da posse do bem
em si.

Saiba mais Podemos citar como exemplos de serviços: bancos, restauran-


tes, bares, hotéis, seguradoras, transportes de carga ou passageiros,
Você sabia que os
serviços correspondem assistência médica, educação, atacado e varejo, entre outros.
ao maior percentual da
economia? Leia mais Todas as economias mundiais são economias de serviços. Prova-
acessando o link a seguir.
velmente, você trabalha ou trabalhará em uma empresa que presta
AMORIM, D.; BATISTA, R.; NEDER, serviços. Vivemos em uma cultura de serviços, assim, mesmo que as
V. Com maior peso no PIB, setor de
serviços puxa avanço da economia. empresas façam suas ofertas com base em produtos, elas devem pen-
Estadão, 28 fev. 2019. Disponível sar que estão oferecendo serviços, pois o consumidor de hoje não está
em: https://economia.estadao.com.
br/noticias/geral,setor-de-servicos- tão focado na propriedade do bem, mas, sim, no benefício que ele
-com-maior-peso-no-pib-puxa-a- pode oferecer. Por exemplo, você não compra uma geladeira devido à
vanco-da-economia,70002739128.
Acesso em: 13 abr. 2020. satisfação de ser dono de um eletrodoméstico, mas porque você busca
um meio de armazenamento de produtos perecíveis.

Vargo e Lusch (2016) chamam isso de lógica dominante do serviço,


em que a sociedade e os consumidores atuais têm um comportamento
com base no serviço. Para os autores, essa lógica é constituída pelos
seguintes pilares:
•• Todas as economias são de serviços

Todas as empresas oferecem serviços, isto é, transações indiretas


de bens físicos, os quais mascaram a unidade fundamental de troca e
servem apenas como mecanismos de distribuição para a provisão de
serviços. Por exemplo, um dono de restaurante não oferece comida, ela
é o bem físico que mascara a verdadeira transação. Quando um con-
sumidor vai ao restaurante, o que ele busca? O serviço prestado pelo
restaurante pode ter várias facetas: a unidade de troca pode ser lazer,

132 Estratégia Empresarial


entretenimento, romance ou, se for um restaurante temático, como o
Hard Rock Café, se sentir no meio de uma viagem pelo rock n’ roll.
•• A empresa faz a proposição de valor e o consumidor o avalia

A empresa faz a proposição e o consumidor avalia se a aquisição


de determinado bem ou serviço gera valor para ele, ou seja, analisa os
benefícios produzidos pela oferta, determinando e quantificando esse
valor. Por exemplo, se você tem um restaurante, a sua oferta é feita por
meio dos pratos oferecidos, do ambiente estruturado e do atendimen-
to proporcionado. Essa oferta tem um preço que foi definido por você,
e o consumidor faz uma avaliação se esse custo mais o trabalho que
ele tem para frequentar o restaurante valem o conjunto de benefícios
oferecidos. Se o consumidor gostou da comida, do atendimento, da
estrutura física do seu restaurante e saiu com a percepção de que o
preço pago valeu a pena, podemos dizer que a sua proposição de valor
foi aceita por ele.
•• A visão centrada em serviço é orientada para o consumidor

Em outras palavras, você deve definir a composição da sua oferta


do ponto de vista do consumidor, ou seja, sempre se colocar no lugar
dos seus clientes. Ainda, você não pode pensar que essa troca é feita
uma única vez, mas deve ter uma lógica de relacionamento com eles.
Por exemplo, voltando ao nosso restaurante, o seu objetivo é que os
clientes voltem com frequência e gostem de estar no restaurante, ou
melhor, que sintam vontade de ter um relacionamento com você por
meio das suas ofertas.
•• O consumidor é sempre um coprodutor dos serviços

Você dever ter um relacionamento íntimo com seus consumidores


para sempre ajustar sua oferta ao que eles consideram valor. Assim,
você deve sistematicamente ouvi-los e perguntar-lhes suas opiniões
sobre tudo que você oferece. Além disso, hoje em dia, um ótimo meio
de coprodução de serviços é ter um relacionamento por meio das mí-
dias sociais, que possibilitam a vários consumidores a interação com
você e entre eles acerca das suas ofertas e novas oportunidades.
•• O serviço tem como base o conhecimento

Para gerar uma posição competitiva diferenciada, o serviço deve re-


presentar a aplicação de habilidades e conhecimentos especializados
integrados, o que, de fato, é a unidade fundamental de troca do serviço.

Estratégia aplicada a produtos e serviços 133


Considere todos esses pilares e analise o Estudo de caso a seguir,
que apresenta quantas coisas são necessárias para ter um restaurante
de sucesso.

Estudo de caso

Pedro decidiu abrir um restaurante italiano com a proposta de representar o conhecimento sobre
gastronomia e cultura italiana, para que o cliente realmente se sentisse jantando em uma cantina de
Roma. Assim, ele refletiu seu conhecimento sobre cultura e gastronomia italianas na estrutura física
do restaurante contratando um arquiteto que entendia de arquitetura e arte da Itália para desenhar o
projeto arquitetônico e comprar os móveis que compuseram a decoração do restaurante.
Porém, tendo em vista que um restaurante não é uma casa, Pedro levou em consideração que seu
layout permitisse o fluxo dos atendentes e dos clientes para que o atendimento fosse ágil e que o
cliente tivesse uma percepção agradável. Além disso, contratou um chefe que montasse um menu prá-
tico e diferenciado e que refletisse as tendências italianas de gastronomia. Fora isso, o chefe precisou
coordenar todo o trabalho na cozinha, conhecer as regulamentações de vigilância sanitária e fazer a
compra dos produtos para serem transformados nos pratos do menu.
Apesar disso, Pedro reconheceu que ainda não havia chegado na metade do conjunto de conhecimen-
tos e habilidades necessários para o restaurante italiano, que precisariam estar integrados e agrupados
para que o cliente conseguisse perceber, mesmo que indiretamente, tudo o que estava por trás do seu
pedido e atendimento. Esses conhecimentos e habilidades por parte de Pedro foram o que o diferen-
ciou de outros empreendedores na abertura de um restaurante de sucesso.

Ao analisar esse Estudo de caso, podemos entender o motivo de ver-


mos poucos restaurantes de sucesso sustentável ao longo do tempo e que
conseguem manter um relacionamento duradouro com seus clientes.

Com a proposição contemporânea da lógica dominante de serviços,


é muito importante que a sua empresa desenvolva estratégias para li-
dar com as particularidades de um serviço. Mesmo que você trabalhe
em uma empresa que fundamentalmente produz e comercializa pro-
dutos, serviços são uma maneira de a empresa se diferenciar dos seus
concorrentes. Por exemplo, se você vende televisores que são muito si-
milares aos produzidos por outros fabricantes, os serviços de garantia
ou instalação são formas de você se posicionar perante seus clientes e
obter vantagem competitiva em relação a eles.

Há diversos tipos de serviços que podem ser levados em considera-


ção, conforme podemos observar no Quadro 1.

134 Estratégia Empresarial


Quadro 1
Características dos serviços

Característica Descrição Exemplo

Os serviços são abstratos, ou seja,


Um banco presta um serviço abstrato de con-
não conseguimos tocá-los ou sen-
ceder crédito ou fazer investimentos, mas, para
ti-los como fazemos com os produ-
tornar a ideia concreta, presta esse serviço em
Intangibilidade tos. Empresas criam elementos de
uma agência bancária, dando a sensação de se-
tangibilização para gerar uma sen-
gurança, além de conceder cartões ou talões de
sação aos consumidores de que os
cheque, que representam o serviço que presta.
serviços são reais e concretos.
Uma empresa fabrica um carro e o transporta
Os processos de fabricação, com-
para a concessionária, que o armazena e usa para
pra e venda de produtos são feitos
Inseparabilidade fazer uma demonstração ao consumidor, antes
por etapas, já a prestação do servi-
(simultaneidade) que este faça a aquisição do bem. Já uma aula, que
ço ocorre à medida que este é pro-
é um serviço prestado por professores, é consu-
duzido.
mida à medida que os alunos a estão assistindo.
Quando um carro é fabricado, ele passa por um
Como a prestação do serviço é si- controle de qualidade que garante que todo lote
multânea ao seu consumo, é muito atende aos requisitos mínimos preestabelecidos.
Variabilidade difícil ter uma padronização dele e o Um médico, quando atende a um paciente, tem
que ocorre geralmente é uma cus- um protocolo com alguns requisitos, mas cada
tomização. consulta será diferente, algumas com mais outras
com menos qualidade.

Nos serviços de transporte aéreo, quando um


Diferentemente dos produtos, os
avião decola com os lugares vazios, estes não
serviços não podem ser estocados
Perecibilidade podem ser revendidos, ou seja, não podem ser
ou armazenados, pois são consumi-
acumulados em um estoque e serem vendidos
dos à medida que são produzidos.
posteriormente.

Fonte: Elaborado pelo autor com base em Lovelock, Wirtz e Hemzo, 2011.

A essência de uma estratégia de produtos ou serviços é encontrar


maneiras de diferenciá-los dos concorrentes. Você como consumi-
dor, no entanto, percebe que, hoje em dia, eles são muito simila-
res e há pouca variação nos preços. Em outras palavras, atualmente,
a maioria dos produtos e serviços comercializados perderam sua
singularidade.

Os consumidores atuais, geralmente, são muito críticos e conside-


ram todos os produtos ou serviços idênticos – sem diferenciais perce-
bidos. O discurso de vendas das empresas se tornou vazio porque as
diferenças entre o que é oferecido por elas não são significativamente
notadas. Dessa forma, há uma inversão na mesa de negociação, em
que o poder de barganha dos consumidores com relação aos preços
de produtos aumentou consideravelmente, fazendo com que grande

Estratégia aplicada a produtos e serviços 135


parte das empresas foque seu argumento de vendas em preços mais
baixos. Esse cenário da concorrência por preço resulta em um fenô-
meno chamado de comoditização dos produtos e serviços. Assim, os
Glossário produtos que foram desenvolvidos para agregar valor com base em
seus diferenciais se tornaram uma commodity.
commodity: bem básico;
mercadorias em geral sem O primeiro passo para lidar com a comoditização e estabelecer uma
diferenciação, uniforme entre os
produtores; geralmente é usada
estratégia de produtos efetiva é entender que um produto é muito
como insumo na produção de mais que um bem físico e que deve ser entendido como um aglome-
outros bens ou serviços. rado de benefícios percebidos pelo cliente. Por exemplo, não devemos
entender um carro como um bem físico, mas como um meio para mo-
bilidade. Kotler e Armstrong (2016) desenvolveram uma proposta in-
teressante para estabelecermos uma estratégia de produto com base
em potenciais diferenciações que uma empresa, por meio de seus pro-
dutos, pode oferecer aos seus consumidores. Para os autores, estamos
lidando com três produtos separados: o benefício principal, o produto
real e o produto aumentado. Juntos, eles dão origem aos três níveis de
produto/serviço (Figura 1).

I. Benefício central
O benefício central representa a necessidade fun-
Figura 1 damental do cliente que é satisfeita. É uma resposta
Os três níveis de produto/serviço
à seguinte pergunta: fundamentalmente, por que o
cliente está comprando determinado produto? Por
Produto
exemplo, o principal benefício de um smartphone é
aumentado
fornecer um mecanismo de comunicação, indepen-
dentemente de onde você estiver. Você já sabe que
Produto real
raramente conseguirá comercializar seus produtos
com base apenas no benefício central porque não
Benefício tem como foco a diferenciação, mas a funcionalida-
central de do mesmo. Seria muito estranho você fazer uma
campanha de comunicação para um smartphone com
base no seguinte slogan: “compre um smartphone para
mandar, receber mensagens e fazer ligações!”

II. Produto real


Fonte: Kotler; Armstrong, 2016. O produto real representa o design geral do
produto e seus atributos, isto é, as características
dos recursos. Por exemplo, vamos considerar o
smartphone novamente: ao descrever o produto real,

136 Estratégia Empresarial


você identificaria atributos do produto, como design, sistema operacio-
nal, tamanho, cor, embalagem, nome, marca, imagens etc. Nesse nível,
já é possível atribuirmos forma e foco a alguns diferenciais do produto,
assim sua campanha de comunicação pode ter como base o seguinte
conceito: “o menor smartphone do mercado”.

III. Produto aumentado

O produto aumentado é qualquer parte não física do produto.


Normalmente, inclui itens como garantia e atendimento ao cliente.
Ao analisar nosso exemplo do smartphone mais uma vez, ele pode ser
representado por sua garantia estendida ou seu seguro. O produto
aumentado é uma maneira de agregar valor ao produto e é muito co-
mum vermos campanhas de publicidade de produtos com foco nele.
Isso ocorre porque é uma área em que é possível ser diferente dos
concorrentes, o que ajuda você a se destacar no mercado.

Uma aplicação do modelo dos três níveis é o ponto de partida para


sua estratégia de produtos. Vamos analisar essa dinâmica com relação
a um produto específico, um notebook, detalhada a seguir.
Estudo de caso
Os benefícios centrais de um notebook são o processamento e o armazenamento de dados
e de informação. No entanto, quando aplicamos os conceitos de um produto real, podemos
definir o produto da seguinte maneira:
• Características: é um detalhamento de todas as partes do notebook, como memória
RAM, processador, bateria e tamanho da tela.
• Marca: você pode usar a marca do fabricante, por exemplo, um notebook Apple ou uma
marca específica como MacBook Pro.
• Qualidade 2 : é muito difícil expressar a qualidade de um produto sem que façamos uma
comparação com os concorrentes. Desse modo, para um notebook ser descrito em termos
de qualidade, é necessário que se tenha um efeito comparativo com os outros notebooks
no mercado. O conjunto de atributos do nosso notebook pode ser melhor do que os outros
em termos de durabilidade, velocidade ou resistência. 2
Geralmente, a qualidade se dá
• Design: é a expressão estética do produto que atende às necessidades de uso do consu-
pelas especificações técnicas,
midor. Por exemplo, a cor do notebook, os elementos ergonômicos do teclado, o layout do que variam na preferência de
conjunto tela, o teclado e os acessos do notebook. consumidor para consumidor.
• Embalagem e rotulagem: representa a maneira que o produto é armazenado para a
distribuição e venda. A rotulagem é a comunicação escrita, eletrônica ou gráfica na em-
balagem ou em um rótulo separado, mas associado. Em outras palavras, o notebook será
colocado em uma caixa, uma sacola ou terá um rótulo com a marca descrevendo suas
características?

Estratégia aplicada a produtos e serviços 137


Em seguida, o produto aumentado requer a inclusão de uma série de serviços, por exemplo:
• Entrega: se vendermos nosso notebook on-line, como queremos que ele seja en-
tregue? Qual é o prazo e qual é a garantia que chegará aos nossos consumidores
adequadamente?
• Financiamento: podemos ter uma linha de financiamento própria para vender nos-
sos notebooks, mas também podemos fazer parcerias com os varejistas ou instituições
financeiras para facilitar a aquisição dos nossos produtos.
• Garantia: uma estratégia interessante é dar uma garantia do nosso notebook por mais
tempo que os requisitos legais; algumas empresas oferecem serviços de garantia es-
tendida mediante o pagamento de uma taxa extra.
• Pós-venda: após o consumidor comprar nosso notebook, é importante entrarmos
em contato para verificarmos se o uso e a experiência com o produto foram positivos,
assim garantimos a satisfação do cliente e estabelecemos um relacionamento para o
fidelizarmos posteriormente.

Atividade 1 Além de desenvolver e estabelecer o conceito do seu produto em


Em sua opinião, é possível três níveis, parte da estratégia de produtos é identificar o ciclo de vida
competir estabelecendo dele. Todos os produtos e serviços possuem determinados ciclos de
diferenças no benefício central
vida, que abrangem o período desde o primeiro lançamento do produ-
dos produtos?
to no mercado até sua retirada final.

A compreensão do ciclo de vida de um produto pode ajudar uma


empresa a entender e perceber quando é hora de introduzir ou retirar
determinado produto do mercado, sua posição neste em comparação
com os concorrentes e o seu sucesso ou fracasso.

O ciclo de vida do produto é formado por quatro etapas (Figura 2),


após uma etapa inicial, chamada desenvolvimento de novos produtos (DNP).

Figura 2
Ciclo de vida do produto

$ Maturidade

Crescimento

Declínio

Introdução

tempo

Fonte: Adaptada de Levitt, 1965.

138 Estratégia Empresarial


A seguir, vamos compreender melhor cada etapa do ciclo de vida
de um produto.
•• Introdução

A introdução de um produto se refere ao lançamento dele. Esse


período consome muitos recursos financeiros e não gera lucros para
a empresa. Esta tem grandes gastos com promoção e publicidade,
e a operação, pela falta de experiência inicial com o produto, é uma
fase muito cara. Logo, é importante que a empresa esteja preparada
financeiramente.

Um elemento importante dessa etapa é ter o produto sempre dis-


ponível, uma vez que você fez um grande investimento com o intuito de
os consumidores o conhecerem e seria muito frustrante para eles não
encontrarem o que você está oferecendo.

O preço é outro elemento que uma empresa deve considerar du-


rante essa fase. Os primeiros clientes pagarão muito por algo novo e
isso ajudará um pouco a minimizar as despesas iniciais da introdução.
Posteriormente, a política de preços deve ser mais agressiva, ou seja,
preços abaixo dos que são praticados pelos concorrentes com o objeti-
vo de tornar o produto mais competitivo. Há empresas que optam por
uma estratégia de preço predefinido para maximizar as vendas desde
sua introdução no mercado. No entanto, essa estratégia só funciona
quando a empresa tem um bom conhecimento do mercado, levando
em consideração quanto um cliente estaria disposto a pagar por um
produto recém-lançado.

Geralmente, para se ter uma fase de introdução bem-sucedida, são


necessárias ações prévias relacionadas ao desenvolvimento do novo
produto em si.
•• Crescimento

O produto entra nessa fase quando começa a decolar no mercado.


Portanto, o foco é o aumento da sua participação de mercado, mos-
trando seus diferenciais. Mesmo crescendo e aumentando a participa-
ção de mercado, uma empresa não deve se acomodar. É o momento
de estabelecer um processo frequente de modificações e adaptações
do produto para controlar o ganho de participação de mercado dos
concorrentes que copiam ou oferecem produtos similares aos seus.

Estratégia aplicada a produtos e serviços 139


Nessa fase, a promoção e a publicidade continuam, mas não com a
mesma intensidade da fase da introdução. O objetivo aqui não é cha-
mar a atenção, mas, sim, criar uma consciência dos consumidores em
torno do seu produto. Esse é o momento de desenvolver eficiência e
melhorar a disponibilidade do produto no mercado. O equilíbrio dos
custos, o tempo de distribuição e a política de preços são importantes
fatores para ganhar confiança e fidelidade dos clientes.
•• Maturidade

Quando o mercado fica saturado com variações do produto básico


e vários concorrentes aparecem com produtos alternativos, chegamos
à fase da maturidade. Nessa etapa, o crescimento da participação de
mercado é feito às custas dos concorrentes, e não do crescimento do
mercado em si. Esse é o período de retornos mais altos para a empresa.
Durante esse momento, ela deve introduzir novas marcas ou versões
do produto, mesmo que haja concorrência entre si, pois é necessário
tentar prolongar a vida dos produtos tendo em vista alterações incre-
mentais com base em sua concepção de produto real e produto aumen-
tado. As políticas de preços e descontos devem ser frequentemente
alteradas em relação aos da concorrência, ou seja, os preços sobem e
descem de acordo com os concorrentes e com as vendas. A promoção
e a publicidade devem mudar seu escopo de obter novos clientes para
a diferenciação do produto em termos de qualidade e confiabilidade.
•• Declínio

A decisão de retirar um produto do mercado é uma tarefa complexa


e há muitas questões a serem resolvidas antes de tomar essa decisão.
Dilemas como manutenção, disponibilidade de peças sobressalentes,
reações dos consumidores e lacuna deixada no mercado são algumas
questões que requerem uma discussão minuciosa para tomar a deci-
são de retirar um produto do mercado.

Muitas vezes, as empresas mantêm uma política de preços altos


para produtos em declínio que aumentam a margem de lucro e desen-
corajam gradualmente poucos clientes fiéis restantes de comprá-los, o
que facilita a eventual saída.

Às vezes, é difícil para uma empresa identificar os sinais de declí-


nio de um produto. Geralmente, ele é acompanhado pela queda nas
vendas, mas departamentos de marketing podem ser otimistas com
relação a essa queda, devido ao sucesso do produto na maturidade,

140 Estratégia Empresarial


e podem acabar investindo muitos esforços que mantêm o nível de
vendas mascarando o declínio. Uma estratégia interessante é começar
a retirar do mercado variações do produto que tenham posições fra-
cas, não necessariamente aquelas versões que geram a menor receita,
porque a fraqueza da posição também é resultado da agressividade da
concorrência. Nessa fase, os preços devem ser mantidos competitivos
e os gastos com comunicação devem ser levados a um nível mínimo
que continue dando um pouco de visibilidade ao produto e, ao mesmo
tempo, consiga reter os poucos clientes fiéis que permanecem. A distri-
buição deve ser reduzida, mantendo apenas aquele canal básico mais
eficiente, assim canais alternativos devem ser abandonados.

Os modelos de negócios tradicionais se concentram em produtos e


serviços. Tradicionalmente, o primeiro passo da atividade empresarial
de vendas é o desenvolvimento e a fabricação de produtos. Em segui-
da, as empresas comunicam ao seu público-alvo os atributos e os be-
nefícios desses produtos e, por fim, realizam suas vendas. No entanto,
essa estratégia não funciona mais.

Os consumidores não querem simplesmente um produto ou um ser-


viço que satisfaça aos seus desejos, eles buscam experiências memorá-
veis de compra e querem se sentir bem e se relacionar com empresas
que são referências para eles. Por exemplo, um consumidor hoje em
dia não quer mais comprar um pacote de café ou tomar um cafezinho
na esquina, ele quer ir a uma cafeteria, experimentar novos sabores,
ser bem atendido, passar o tempo curtindo o ambiente e aprendendo
coisas novas sobre o café e seu consumo. Assim, podemos dizer que:

I. As pessoas fazem compras com base nos sentimentos

Noventa por cento (ou mais) das decisões de compra são


tomadas subconscientemente. Isso significa que não toma-
mos nossas decisões logicamente, mas emocionalmente.

II. As pessoas querem compartilhar suas experiências

A venda do seu produto geralmente inclui a referência aos


seus atributos. Por exemplo, os atributos de uma TV de tela
plana incluem tamanho, resolução e conexão Wi-Fi. É im-
portante saber todas essas informações, mas elas não são
atraentes. A experiência que você tem com a TV, por outro

Estratégia aplicada a produtos e serviços 141


lado, é mais interessante e é o que os consumidores com-
partilham. Você pode descrever a sensação, proporcionada
por sua TV, de se sentir dentro de um filme. Essa sensação
é o que dá vontade de contar e compartilhar uma história.
Histórias são sempre mais atraentes do que as listas de atri-
butos, pois elas ativam nosso cérebro de maneira mais in-
tensa do que uma simples lista de vantagens com base nas
características do produto.

III. As pessoas não querem acumular produtos, mas, sim,


aproveitar seu tempo experiencialmente

A sociedade está mudando. No passado, posses e símbolos


de status, como um carro de luxo, eram muito importantes,
mas agora as pessoas se satisfazem com os momentos. O
valor das experiências é tão poderoso e presente que novos
modelos de negócios, como a economia do compartilha-
mento (Uber e Airbnb, por exemplo) e os serviços de assi-
natura (como Netflix e Spotify), surgiram para proporcionar
experiências. Você pode obter tudo o que precisa e ficar ex-
tremamente satisfeito sem necessitar ter a posse de nada.

Os produtos e serviços ainda são importantes e são a base do sis-


tema de troca, mas precisamos dinamizar a forma com que os pro-
movemos. Os produtos não podem mais ficar sozinhos, devem ser
construídos em torno de uma experiência que faça com que as pessoas
se sintam empolgadas e motivadas a compartilhar, como em um story
do Instagram, por exemplo.

6.2 Desenvolvimento de novos


produtos e serviços
Vídeo Considerando que produtos e serviços têm determinado ciclo de
vida, uma empresa deve empenhar-se em sempre renovar suas ofer-
tas ao consumidor para não ficar em desvantagem competitiva quando
seus produtos entrarem na fase do declínio. O novo produto ou serviço
pode ser classificado em seis grupos (BOOZ, 1982). O “novo” é tudo
aquilo que é considerado relevante para os negócios e para o mercado,
assim podemos defini-lo da seguinte maneira:

142 Estratégia Empresarial


•• Avanços tecnológicos: esse grupo representa um produto úni-
co, por exemplo, uma vacina para a Covid-19 ou carros que voam.
Esses produtos são novas experiências para os clientes no momen-
to em que são lançados no mercado, ou seja, representam benefí-
cios totalmente diferentes aos consumidores. Eles são o resultado
de pesquisas contínuas sobre produtos, marketing e mercado.
•• Melhorias significativas: são melhorias consideráveis nos pro-
dutos existentes, aumentado significativamente seu valor per-
cebido pelos consumidores. Por exemplo, o café instantâneo
substitui o café comum, oferecendo facilidade e rapidez no pre-
paro e, muitas vezes, por um preço mais baixo.
•• Produtos modificados: esses produtos são criados com melhorias
insignificantes nos produtos existentes, como adicionar uma nova
fragrância ao detergente e aumentar ou diminuir tamanhos de pro-
dutos como bolachas, salgadinhos ou, até mesmo, smartphones.
O “novo” nessa categoria reflete a introdução de um atributo que
visa aprimorar a experiência do cliente com o produto.
•• Produtos novos para o negócio: são produtos imitados que já
são vendidos no mercado pelos concorrentes, mas a empresa
os produz pela primeira vez. As empresas usam o mercado que
já atendem, ou seja, os seus clientes atuais, para vender esses
novos produtos copiados ou imitados na tentativa de atrair os
clientes dos concorrentes.
•• Reposicionamento: são produtos já produzidos pela empresa e
vendidos em determinado mercado. Com base nessa experiência,
a empresa começa a comercializá-los em novos mercados. Por
exemplo, sua empresa fabrica televisores e os vende no Brasil; ao
comercializá-los em outros países ou para um público-alvo dife-
rente, ela adota o reposicionamento.
•• Redução de custos: as empresas relançam os mesmos produtos,
mas com preços menores para atender a mais consumidores.

Independentemente da estratégia relacionada ao novo produto,


uma empresa deve estar atenta ao processo de desenvolvimento des-
tes, que é subdividido em sete estágios, conforme vemos na Figura 3.

Estratégia aplicada a produtos e serviços 143


Figura 3
Processo de desenvolvimento de novos produtos (DNP)

Geração de Triagem e Teste de Análise de


novas ideias de avaliação de conceito marketing
produtos ideias

Introdução e Teste de Desenvolvimento


comercialização marketing do protótipo

Fonte: Adaptada de Gürbüz, 2018.

Agora, vamos analisar e ver como cada uma dessas etapas é desen-
volvida pelas empresas.

Etapa 1: Geração de novas ideias de produtos

Para iniciar o desenvolvimento de um novo produto, o primeiro


passo é ter uma ideia. O processo de geração de ideias advém de
fontes internas, como um departamento de Pesquisa e Desenvolvi-
mento (P&D) ou um banco de ideias, e/ou de fontes externas, como
clientes, concorrentes ou outras fontes – eventos, universidades ou
investidores, por exemplo. Uma pesquisa feita com 750 presidentes
de empresas globais mostrou que 41% das novas ideias de produtos
são geradas por funcionários, 36% por clientes e apenas 14% pelo
departamento de P&D (GÜRBÜZ, 2018).

Etapa 2: Triagem e avaliação de ideias

Nesse estágio, todas as ideias geradas na Etapa 1 são examinadas e


avaliadas para limitar as ideias a um número gerenciável. Em primeiro
lugar, todas as ideias são selecionadas e classificadas em ideias mais
úteis e menos úteis. Em segundo lugar, perguntas são aplicadas às
ideias selecionadas, as quais são definidas pelo acrônimo RVVP (real,
Glossário
valor, viável, posição). A triagem depende de uma reposta afirmativa a
valor: conjunto de benefícios quatro perguntas e de um detalhamento da resposta:
menos os custos. Tanto benefí-
cios quanto custos podem ser •• (R) A ideia é real? Qual necessidade do cliente que ela atende?
financeiros, sociais, psicológicos
e temporais. •• (V) A ideia gera valor para os consumidores e para a empresa?
Qual é o valor?

144 Estratégia Empresarial


•• (V) É viável? Temos recursos suficientes para colocar a ideia em
prática? Quais recursos necessitamos para colocar esse produto
no mercado com sucesso?
•• (P) Reflete nossa posição competitiva? É compatível com o que fa-
zemos? Como esse novo produto pode intensificar nossa posição
no mercado?

Etapa 3: Teste de conceito

Após a seleção das ideias, os conceitos dos produtos devem ser de-
senvolvidos, ou seja, as ideias selecionadas devem ser desenvolvidas
para serem apresentadas de maneira detalhada e significativa como
conceitos de produtos. O conceito é uma descrição do produto e de seu
funcionamento. Em seguida, esses conceitos são avaliados por meio de
um teste de conceito com grupos de clientes selecionados. Basicamen-
te, os conceitos são apresentados individualmente aos consumidores
por meio de entrevistas ou questionários, ou coletivamente por meio Glossário
de grupos focais. A apresentação é simples: o conceito é mostrado aos
grupo focal: conjunto de indi-
consumidores por meio de uma frase que descreve o conceito e o seu víduos reunidos com os objetivos
funcionamento. Algumas empresas usam um esboço gráfico ou visual de validação e identificação de
problemas.
para facilitar a interpretação pelos consumidores. Os conceitos mais
bem classificados nos testes são selecionados como produtos para se-
rem pré-desenvolvidos na fase seguinte.

Etapa 4: Análise de marketing

Nessa fase, uma análise mais abrangente é aplicada ao conceito


selecionado. Além da aceitação por parte dos consumidores, validada
na Etapa 3, a empresa deve fazer uma análise de como esse produto
se encaixa na estratégia empresarial geral da empresa. Isso é feito em
três etapas:
•• Identificar qual é mercado onde o novo conceito será vendido,
qual é a previsão de geração de lucro pelo novo conceito e qual é
a proposta de valor, projeção de vendas e participação de merca-
do nos primeiros anos. Além disso, é importante calcular o risco
estimando as vendas mínimas e máximas.
•• Projetar o preço pelo qual o produto será vendido, como será
distribuído no mercado, definir as melhores maneiras de esta-
belecer uma comunicação com os consumidores e qual é o orça-
mento para o primeiro ano.

Estratégia aplicada a produtos e serviços 145


•• Estimar todos os custos envolvidos no desenvolvimento do novo
Site
produto, como investimento, operação, marketing, custos de
As startups mudaram
P&D e lucros com a venda do novo produto. Esses cálculos são
a maneira com que as
empresas desenvolvem estimados em números que indicarão a atratividade financeira
novos produtos, pois en- do novo produto.
tendem que o processo
deve ser ágil e com base Se essas análises e projeções forem compatíveis com os objetivos
em ensaio e erro. Para
tanto, usam estratégias da empresa, ou seja, com sua estratégia empresarial, elas serão movi-
de design para criarem das para a próxima etapa.
protótipos rapidamente.
Uma ferramenta que Etapa 5: Desenvolvimento do protótipo
se tornou conhecida e
é adotada por muitas Amostras do novo produto devem ser criadas pela empresa. Em
empresas é o design
thinking. seguida, as amostras serão testadas para avaliar o conceito em si e
No site a seguir, você sua atratividade para os consumidores. Essas amostras devem ser pro-
pode fazer o download de
um manual de como usar tótipos produzidos com custo e tempo reduzidos e, com base nelas,
o design thinking para de- vários testes devem ser feitos para garantir a segurança, atratividade
senvolver novos produtos
e serviços. Ele foi desen- e eficácia. Portanto, o processo de teste pode demorar um pouco para
volvido para educadores, desenvolver a amostra mais adequada. As empresas podem fazer seus
mas você pode usar o
passo a passo do manual próprios testes ou podem contratar um serviço terceirizado.
em sua vida pessoal ou
profissional.
Etapa 6: Teste de marketing

DESIGN THINKING PARA EDUCADO- Nesse estágio, são feitos testes para identificar como a estratégia de
RES. Página inicial, 2020. Disponível
marketing do novo conceito de produto deve ser conduzida para obter
em: https://www.dtparaeduca-
dores.org.br/site/. Acesso em: 13 os melhores resultados antes de a empresa ter que lidar com custos de
abr. 2020.
estratégias inadequadas. Todos os elementos de marketing devem ser
desenvolvidos, ou seja, segmentação do mercado-alvo do novo concei-
to de produto, posição desejada no mercado, branding, publicidade e
propaganda, distribuição, venda e orçamento de marketing.

O teste de marketing fornece às empresas uma estrutura para o pla-


nejamento de marketing do novo conceito de produto que será comer-
cializado. Não passar por esse teste e ir direto à comercialização pode
levar a empresa a enfrentar custos acima do previsto, consumindo boa
parte do lucro esperado. Portanto, é crucial que as empresas realizem
esses testes antes de iniciar a comercialização.

Etapa 7: Introdução e comercialização


A primeira coisa a ser feita nessa fase é determinar o momento em
que o novo conceito de produto será introduzido e comercializado no
mercado. Em geral, se refere à escala (pequena, média ou grande) que o
novo produto deve ser introduzido no mercado. Geralmente, a maioria

146 Estratégia Empresarial


das empresas prefere introduzir novos produtos no mercado em pe-
quenas ou médias escalas e expandir processualmente, pois a introdu-
ção de novos produtos em grande escala requer mais capital, confiança
e capacidade, que apenas poucas empresas possuem. Tendo em vista
essa decisão, o ciclo de vida do produto é iniciado.

Se seguirmos esses sete passos, teremos sucesso com nossos no-


vos produtos? Não necessariamente, visto que há muitas coisas que só
saberemos após o produto entrar no mercado.

Segundo Kotler e Armstrong (2016), há várias situações, mesmo Atividade 2


com uma estratégia sólida de desenvolvimento de novos produtos, que
Como você encaixaria as sete
podem levar ao fracasso da estratégia. De acordo com os autores, por etapas do processo de desenvol-
exemplo, muitas empresas superestimam o tamanho do mercado, o vimento de novos produtos no
ciclo de vida dos produtos?
que leva a uma superprodução, resultando em perdas consideráveis na
lucratividade dele. Além disso, o design pode ser inadequado, mesmo
passando nos testes sugeridos, visto que o verdadeiro teste é quando Livro
muitos consumidores começam a usar o produto. Ainda, o segmento de Umas das maiores figuras
mercado identificado pode estar errado, por exemplo, vender um pro- empresariais que aliou o
desenvolvimento de no-
duto de luxo em uma região com dificuldades econômicas. Outro fator vos produtos e serviços
é que o momento de lançamento pode estar errado, como um produto foi Steve Jobs. Para saber
como ele fez isso, leia o
supérfluo no momento de uma crise de saúde – pandemia do coronaví- livro Steve Jobs: a biografia.
rus, por exemplo, quando as pessoas hesitam em gastar dinheiro com
ISAACSON, W. São Paulo: Compa-
produtos desnecessários. Por fim, o preço pode estar errado, muito caro nhia das Letras, 2011.
ou muito barato, o que levará à perda de lucro, ou, ainda, a publicidade e
propaganda podem não ser assertivas o suficiente e o novo produto não
ser conhecido pelos consumidores certos.

6.3 Inovação estratégica


Vídeo Atualmente, a inovação é uma necessidade, não apenas por meio
do desenvolvimento de novos produtos ou serviços, mas também da
descoberta de novos modelos de negócios (AFUAH, 2009). Ser diferente
e fazer a diferença são fatores-chave para o sucesso nos negócios, seja
desenvolvendo um novo produto ou serviço, criando um novo progra-
ma de recursos humanos, melhorando os procedimentos financeiros,
introduzindo uma nova campanha de captação de recursos ou inician-
do um novo negócio (KAPLAN, 2012). Nesse sentido mais amplo, con-

Estratégia aplicada a produtos e serviços 147


forme Govindarajan e Trimble (2005), a inovação estratégica começa a
fazer parte da estratégia empresarial das empresas.

Uma das questões fundamentais para entendermos a inovação es-


tratégica é sua amplitude conceitual, que, segundo o Manual de Oslo
(2005), trata-se da tomada de decisão referente ao desenvolvimento de
novos produtos, serviços e processos. Essas decisões devem equilibrar
a capacidade e as oportunidades das empresas no ambiente a fim de
projetar e alcançar objetivos a longo prazo. Atualmente, muitas empre-
sas acrescentaram a inovação como um dos valores fundamentais em
sua missão (JOHNSTON; BATE, 2013).

A inovação estratégica deve estar em sintonia com as estratégias


de tecnologia, marketing, produção e outras estratégias funcionais
da empresa. Ela tem como base o modelo de negócios e a tecnolo-
gia da empresa. Isso significa que as organizações bem-sucedidas
combinam mudança tecnológica com mudança do modelo de negó-
cios para a implementação de estratégias tendo em vista a inovação
(DAVILA; EPSTEIN; SHELTON, 2012). Além disso, representa uma abor-
dagem holística e sistemática, focada em gerar inovações incrementais
e disruptivas por meio de um processo intencional, repetível e contínuo
que visa criar diferenças significativas no valor entregue aos consumi-
dores, parceiros e outros stakeholders.

Portanto, pode-se dizer que a inovação estratégica é uma maneira


fundamentalmente diferente de competir em um negócio existente
(CHARITOU; MARKIDES, 2003). É criar algo ou fazer algo radicalmen-
te diferente que produza um avanço significativo para a frente, pois
não conseguiremos fazer coisas novas seguindo maneiras antigas de
atuar (KAPLAN, 2012).

Segundo Govindarajan e Gupta (2001), devemos fazer três pergun-


tas principais relacionadas à inovação estratégica, que podem ser vi-
sualizadas na Figura 4.

148 Estratégia Empresarial


Figura 4
Áreas de inovação estratégica

Cadeia de valor Entrega Valor

Desenho
Tecnologia Produção Marketing Distribuição Serviços Consumidor
de produtos

1. Como podemos tornar a


cadeia de valor muito mais
eficiente? 2. Como podemos transformar o valor
entregue aos consumidores?

3. Como expandimos o tamanho de


mercado/nossa base de clientes?

Fonte: Adptada de Govindarajan e Gupta, 2001.

De acordo com a Figura 4, uma empresa responde à Pergunta 1 ge-


Glossário
ralmente redesenhando a arquitetura da sua cadeia de valor para me-
cadeia de valor: conjunto de
lhorar sua eficiência, ou seja, desenvolvendo seus processos em menor
3
atividades realizadas para entre-
tempo com um custo mais baixo. Por exemplo, a IKEA usa a padroni- gar um produto ao mercado.
zação para criar tipos de produtos que facilitam o transporte eficiente.

A reinvenção do conceito de entrega de valor para o cliente, respos- 3


ta à Pergunta 2, está relacionada à alteração do valor que os clientes
A IKEA é uma empresa sueca es-
recebem. Em outras palavras, a empresa tenta proporcionar uma per- pecializada na produção e venda
cepção de novos benefícios com custos adequados. Por exemplo, além de móveis domésticos de baixo
custo e com ótima qualidade.
de vender hardware, a IBM passou a fornecer soluções comerciais.

Uma redefinição da base de clientes, resposta à Pergunta 3, está re-


lacionada à expansão do tamanho do mercado. Por exemplo, quando os
computadores eram usados ​​apenas em organizações, a Apple começou
a fabricar computadores pessoais para vender a pessoas físicas.

Portanto, um requisito necessário para se tornar um inovador es-


tratégico é identificar lacunas de mercado antes de seus concorrentes.
Essas lacunas podem ser encontradas em: a) segmentos de clientes
novos e emergentes ou segmentos de clientes existentes que outros
concorrentes negligenciaram; b) necessidades novas e emergentes do
cliente ou necessidades existentes do cliente não atendidas bem por ou-

Estratégia aplicada a produtos e serviços 149


tros concorrentes; e c) novas maneiras de produzir, entregar ou distri-
buir os produtos ou serviços existentes ou novos produtos ou serviços
para os segmentos de clientes novos ou existentes (MARKIDES, 1997).

Um fator muito importante para definir a estratégia de inovação são


os recursos, as capacidades e as competências da empresa. A estraté-
gia de inovação e a competência da empresa estão relacionadas na me-
dida em que a estratégia possibilita o desenvolvimento de um conjunto
de competências para inovar. Há duas linhas estratégicas relacionadas
com a inovação, a liderança ou o acompanhamento. As empresas que
escolhem a primeira estratégia desenvolvem principalmente a inova-
ção de produtos, enquanto as outras têm mais êxito na inovação de
seus processos.

A liderança em inovação requer uma postura mais radical, assim a


4
empresa investe em novas tecnologias ou modelos de negócios para
A inovação incremental reflete
as melhorias em produtos ou em
estar à frente dos concorrentes. A posição de liderança é alcançada
linhas de produtos. com base na repetição sistemática de diferentes tipos de inovação: in-
4 5
cremental ou radical . O iPhone é um exemplo de inovação radical,
visto que atribuiu uma nova definição do que o “telefone” poderia fa-
5 zer e reescreveu as regras para muitos mercados, incluindo fotografia,
A inovação radical pode ser comércio eletrônico, mapas e sistemas de navegação, televisão, filmes
definida como uma novidade e música. Um carro híbrido é um exemplo de inovação incremental,
que leva à criação de um novo
mercado. porque ele não altera a natureza ou a capacidade de um carro, apenas
adiciona uma segunda fonte de energia.

Nos casos em que o ambiente competitivo é muito incerto e exis-


tem altas restrições internas, as empresas optam pela estratégia do
acompanhamento, em que objetivo não é liderar o processo de ino-
vação do ambiente de negócios, mas, sim, acompanhar as principais
inovações mais lentamente, com menor risco, mas de modo mais efi-
ciente (DAVILA; EPISTEIN; SHELTON, 2009). São chamadas, conforme já
dito, de inovações focadas em processos que, normalmente, englobam
duas subcategorias: a tecnologia e a estrutura organizacional.

A distinção entre essas subcategorias se dá pelo fato de a inova-


ção de processos envolver apenas elementos tecnológicos ou estar
relacionada à coordenação de recursos ou outros sistemas organi-
zacionais (EDQUIST; HOMMEN; MCKELVEY, 2001). De acordo com

150 Estratégia Empresarial


Damanpour (1991), a inovação de processos tecnológicos assume
a forma de melhorias nos procedimentos operacionais. Ela consis-
te tanto no aprimoramento das operações de fabricação quanto na
melhoria dos serviços (DAMANPOUR; GOPALAKRISHNAN, 2001). Para
Ettlie (2007), alterações tecnológicas em produtos e operações podem
levar simultaneamente a outras mudanças nos processos organizacio-
nais com novos procedimentos administrativos e novas estruturas na
empresa, levando a transformações do formato organizacional e dos
processos gerenciais. Por exemplo, a automação do processo de fabri-
cação pela introdução de robôs na linha de montagem é uma inovação
tecnológica que necessitará de inovações na maneira com que a em-
presa gerencia outros processos, como seu estoque e sua distribuição.

É importante salientar que não existe um tipo de estratégia de ino-


vação de processos (liderança ou acompanhamento) melhor ou pior, o
que você terá que analisar é se a inovação proposta é aderente com a
estratégia genérica estabelecida pela sua organização.

Observe alguns exemplos de inovações radicais nos casos a seguir.

Estudo de caso
• Criptomoeda: pode mudar a maneira com que os serviços financeiros são oferecidos. Exemplos incluem
Bitcoin, Ethereum e BitGold. A tecnologia disruptiva sempre esteve presente no mundo financeiro; já avan-
çamos muito nos últimos anos com o banco on-line, PayPal, FinTechs e Crowdfunding.
• Comércio colaborativo: está interferindo no varejo e no comércio eletrônico. Por exemplo, a hospedagem
P2P (pessoa para pessoa) está desafiando a indústria hoteleira com resultados muito significativos. Um
excelente exemplo é a Airbnb, que entende o que os seus consumidores buscam no setor de hospitalidade,
ou seja, flexibilidade e simplicidade.
• Li-Fi: é uma alternativa 100 vezes mais rápida que o Wi-Fi e pode se colocar como uma tecnologia disrup-
tiva para mudar a maneira como nos conectamos e nos comunicamos. A ideia é transformar lâmpadas LED
domésticas em transmissores pela tecnologia Li-Fi, proporcionando aos usuários conexões com a internet
mais eficientes. Basicamente, o que precisa ser feito é ajustar um pequeno microchip a cada dispositivo
de iluminação que combinaria duas funcionalidades básicas: iluminação e transmissão de dados sem fio.

A inovação estratégica é o que proporciona a modernidade para


a empresa expressar sua capacidade de transformação. A estratégia
de produtos e serviços nunca pode parar de observar o mercado, se
apropriar de informação e conhecimento e gerar novas soluções que
atendam às demandas dos consumidores.

Estratégia aplicada a produtos e serviços 151


CONSIDERAÇÕES FINAIS
A estratégia é colocada em prática por meio da entrega de valor “em-
balado” pelos produtos e serviços de uma empresa. Toda organização só
existe se entregar algo para seus consumidores dentro do contexto em que
eles se encontram. Como o contexto é dinâmico, empresas devem sempre
atualizar os seus serviços e produtos, a maneira como são desenvolvidos e
entregues ao consumidor por um processo de inovação estratégica.
O ambiente impõe muitos desafios às organizações, que nunca podem
ficar acomodadas com o que estão fazendo, ou seja, elas sempre devem
ter uma mentalidade e ferramentas para mudar e constantemente se
adaptar. Essa é a dinâmica dos tempos em que vivemos. Se uma empresa
entender isso como uma oportunidade e inserir na sua rotina de negó-
cios, ela poderá aproveitar diversas oportunidades.

REFERÊNCIAS
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152 Estratégia Empresarial


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GABARITO
1. O benefício básico de um produto é o mesmo que uma commodity, isto é, um pro-
duto sem diferencial. A diferenciação dos novos produtos está no produto real e
no aumentado. A quantidade de ofertas similares no mercado força a empresa a
inserir elementos em cada nível de produto que gerem diferenças percebidas por
seus consumidores.

2. A relação entre as etapas no processo de desenvolvimento de novos produtos e do


ciclo de vida dos produtos acontece em razão de dois fatores: tempo e retorno finan-
ceiro. As etapas do desenvolvimento de novos produtos estão em uma etapa anterior
ao ciclo de vida de produtos. Essa fase anterior leva tempo e consome muitos recur-
sos financeiros. Ao iniciar o ciclo de vida, um produto continua consumindo recursos
financeiros que, ao longo do tempo, vão gerando retornos que se transformam em
lucro, o qual vai aumentando até a maturidade e diminuindo no declínio. Visualmente,
temos uma curva em forma de “u” para o desenvolvimento de novos produtos e uma
de “u” invertido para o ciclo de vida de novos produtos. Esse raciocínio pode ser mais
bem visualizado da seguinte maneira:

Estratégia aplicada a produtos e serviços 153


Ciclo de vida do produto

Retorno
Financeiro

Introdução
Geração de ideias

Teste do conceito

Introdução
Triagem e avaliação de ideias

Análise de marketing

Desenvolvimento do protótipo

Crescimento

Declínio
Teste de marketing

Maturidade
Tempo

Ciclo de desenvolvimento

3. Não é algo tão simples e fácil responder às três perguntas simultaneamente, mas
podemos orientar a nossa inovação estratégica pelos clientes, ou seja, pela Pergunta
3, que é determinar o tamanho do mercado e a nossa base de clientes. Com essas
informações, podemos definir melhor o valor que queremos entregar a eles e, interna-
mente, tornar nosso processo de desenvolvimento e fabricação mais eficiente.

154 Estratégia Empresarial


ESTRATÉGIA EMPRESARIAL
TOMAS S. MARTINS

Código Logístico Fundação Biblioteca Nacional


ISBN 978-85-387-6560-8

59046 9 788538 765608

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