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ÉTICA E LEGISLAÇÃO ODONTOLÓGICA

UNIDADE I
ÉTICA EM ODONTOLOGIA
Atualização
Carlla Sloane Alberton

Elaboração
Ana Lúcia Franco Micheloni

Carlla Alberton

Produção
Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração
SUMÁRIO

UNIDADE I
ÉTICA EM ODONTOLOGIA................................................................................................................................................................. 5

CAPÍTULO 1
CONCEITOS DE ÉTICA ................................................................................................................................................................. 5

CAPÍTULO 2
ÉTICA – ODONTOLOGIA E PRÁTICA CLÍNICA..................................................................................................................... 7

CAPÍTULO 3
EXERCÍCIO DA ODONTOLOGIA E RESPONSABILIDADE CIVIL.................................................................................. 11

CAPÍTULO 4
SIGILO PROFISSIONAL.............................................................................................................................................................. 16

REFERÊNCIAS................................................................................................................................................18
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ÉTICA EM ODONTOLOGIA UNIDADE I

CAPÍTULO 1
CONCEITOS DE ÉTICA

Introdução
A palavra Ética deriva do grego éthos, que significava “bom costume”, “costume
superior” ou “portador de caráter (ÉTICA, 2014; KOERICH; MACHADO; COSTA,
2005). Segundo o dicionário, é definida como o “estudo dos juízos de apreciação
referentes à conduta humana suscetível de qualificação do ponto de vista do bem
e do mal, seja relativamente a determinada sociedade, seja de modo absoluto”
(FERREIRA, 1988).

Segundo Tangwa, a “Ética” é o ramo da filosofia que lida com a moralidade das
ações e dos comportamentos humanos (TANGWA, 2009). Para Segre, Cohen
(2002), a Ética se fundamenta em três princípios básicos que, abordados de
maneira mais dinâmica e abrangente, consistem em: 1. percepção e consciência
dos conflitos; 2. autonomia ativa de posicionamento entre a razão e a emoção; e
3. coerência. Portanto, a eticidade, que é a aptidão de exercer a função ética, está
centrada na percepção dos conflitos da vida psíquica entre a razão e a emoção e
na condição de posicionarmos coerentemente em face desses conflitos (SEGRE;
COHEN, 2002). Esse conceito ético significa permitir que cada ser humano se
posicione individualmente de maneira racional com relação às mais variadas
situações passíveis de estudo ético (como, por exemplo, a pena de morte, o
aborto, a engenharia genética, entre outros). A “Ética” se contrapõe ao conceito
de “Moral”, que é resultante de juízos de valores impostos pela sociedade e que
exclui a autonomia crítica do indivíduo (SEGRE; COHEN, 2002), regulando o
comportamento social no intuito de garantir a ordem (CARNEIRO; PORTO;
DUARTE; CHAVEIRO; BARBOSA, 2010). Assim, podemos entender “Ética”
como a ciência que estuda a conduta humana e “Moral” como a qualidade dessa

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conduta julgada do ponto de vista do “bem” e do “mal” (“ÉTICA” 2014; KOERICH


et al., 2005).

Aristóteles, Kant, Hume e Bentham foram pensadores que edificaram teorias


sobre a Ética clássica, as quais evoluíram e se transformaram segundo valores
estabelecidos pelas sociedades (VALLADARES-NETO, 2005). Uma das
exigências contemporâneas é a incorporação da Ética à pesquisa científica,
uma vez que o uso experimental de seres humanos em seu próprio benefício é
inevitável. Infelizmente, a história da Medicina e da Odontologia foi marcada
por um somatório de experimentos nos quais vários princípios éticos foram
negligenciados (VALLADARES-NETO, 2005).

“Bioética”, por sua vez, é um neologismo construído a partir das palavras gregas
bios (vida) e ethikós (relativo à ética) (BIOÉTICA 2014; VALLADARES-NETO,
2005), sendo, portanto, uma nova ciência, parte da Ética, que enfoca questões
referentes à vida humana. A origem desse termo está intimamente ligada com
o progresso científico dos séculos XIX e XX em relação às ciências da vida. É
certo que as novas evidências científicas requerem novas prioridades éticas,
assim como modificações e melhoramentos nas atitudes profissionais e pessoais
(KOERICH et al., 2005; SASS, 2008; VALLADARES-NETO, 2005).

A Bioética, tendo a vida como objeto de estudo, é o campo de ação e de interação


de profissionais estudiosos das mais diversas áreas do conhecimento humano,
tais como médicos, biólogos, psicólogos, psicanalistas, cientistas sociais,
filósofos, religiosos, juristas e enfermeiros. Ao discutir a vida e a saúde humanas,
todo o conhecimento desses profissionais é necessário, devendo ser o leque de
participações nas discussões o mais aberto possível (SEGRE; COHEN, 2002). A
bioética rege as diferentes tentativas de se humanizar a abordagem científica, a
prática dos profissionais de saúde e o respeito aos direitos humanos na economia,
na política e na pesquisa social (LOLAS, 2008). Por esse motivo, a “Bioética”
alicerça-se na valorização e inoculação dos princípios éticos aplicados à pesquisa
científica, impondo limites à ciência e tecnologia (VALLADARES-NETO, 2005).
Portanto, pode-se dividir a Bioética em duas, a Bioética Fundamental, que estuda
as teorias éticas, e a Bioética Aplicada, que discute aspectos éticos dos dilemas
atuais (GALVÃO et al., 2010).

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CAPÍTULO 2
ÉTICA – ODONTOLOGIA E PRÁTICA CLÍNICA

A ética e os cursos de odontologia no Brasil


Nos dias atuais, o profissional da área odontológica é obrigado a lidar com a ética
profissional, e, dado o seu enfoque trans e multidisciplinar, é imprescindível
sua discussão na área da saúde como também em outras áreas do conhecimento
(CARNEIRO et al., 2010). É grande o número de ações judiciais por atitudes
adversas às leis da ética, dado que reflete o desconhecimento dos profissionais, o
desinteresse enquanto graduando ou egresso e também a falta de universidades
abordando o tema com devida significância (GALVÃO et al., 2010). O grande
número de faculdades, a valorização da técnica e o distanciamento dos cursos da
realidade social também são alguns dos precursores da formação de profissionais
com visões ético-humanistas limitadas (AMORIM; SOUZA, 2010; OLIVEIRA
et al., 2008). Além disso, o conhecimento odontológico fragmentado em disciplinas
(especialidades) dificulta a percepção da integralidade do ser humano, que requer
que o biológico, o psicológico, o cultural e o social estejam unidos em um só tempo
(AMORIM; SOUZA, 2010).

Apesar disso, a maioria das faculdades reconhece a necessidade da formação de


um profissional sensível às reflexões éticas na relação com o paciente (MUSSE
et al., 2007). Muito se discute sobre as estratégias de inserção de tais conteúdos
no ensino de graduação e de pós-graduação, e há consenso sobre a relevância e
importância deste (GALVÃO et al., 2010). Conforme sugerido por Musse et al.
(2007), o ideal seria a inclusão de um curso teórico de introdução à Ética ainda no
ciclo básico de formação de nível superior, o que está em dissonância ao verificado
nas faculdades de Odontologia do Brasil. Verificou-se que, nas universidades de
pesquisas, a disciplina é oferecida no fim do curso, ou seja, no momento em que
esses conhecimentos já deveriam estar enraizados, uma vez que influenciarão a
conduta dos futuros profissionais ao longo de sua carreira por toda a sua vida
(MUSSE et al., 2007).

Formar profissionais éticos e cidadãos responsáveis por suas ações, ou seja, dotados
de visão crítica da realidade e suficientemente competentes para atuar de forma
responsável, autônoma e comprometida, ainda é um grande desafio para o ensino
(AMORIM; SOUZA, 2010). Assim, há a necessidade de se incrementar a carga
horária, de modo a capacitar os alunos a refletir autonomamente e tomar decisões
pautados em princípios éticos coerentes (MUSSE et al., 2007). Atualmente tem sido

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proposto um modelo de ética chamado de deliberativo, que tem caráter dialógico,


ou seja, tem a intenção de provocar discussão e debate. Portanto, há necessidade
do aumento da intersecção entre educação e ética, uma vez que a possibilidade de
discutir o tema pode ajudar no preparo do estudante para a atuação profissional mais
responsável e humanizada. Além disso, sugere-se que a formação e as atitudes do
docente na área sejam essenciais no processo de aprendizagem (CARNEIRO et al.,
2010).

Seguem alguns questionamentos e reflexões propostas por Koerich et al., 2005


(KOERICH et al., 2005).

Como está o ensino da bioética no Brasil? Como as escolas estão


preparando os profissionais de saúde para os impasses éticos
do dia a dia? As decisões são orientadas para que o mundo se
torne mais humano? Como buscar equidade na assistência com
respostas morais adequadas à realidade em que se apresenta
nosso mundo de trabalho?

A ética e a prática clínica odontológica


Voltada para o atendimento clínico, a ética sempre visou o enfoque da relação
médico-paciente. Portanto, cabe a nós odontólogos transferir, adaptar e aprimorar
tais conceitos para o nosso cotidiano clínico (GARBIN et al., 2006).

Na prática clínica odontológica, os princípios éticos devem ser usados como


referência para nossas dúvidas, mas enfocando a particularidade específica de
cada paciente. Por exemplo, o paciente poderá exercer autonomia quando expuser
seus desejos e expectativas ao profissional diante do tratamento odontológico
ao qual se submeterá e quando optar por uma modalidade terapêutica em vez
de outra, baseando-se nas suas crenças e valores, depois de estar devidamente
esclarecido sobre estas dentro dos padrões de compreensão compatíveis ao
seu entendimento (AMORIM; SOUZA, 2010; GARBIN et al., 2006). Conforme
comentado anteriormente, essas ações se concretizam por meio da assinatura
do TCLE, que deverá ser obtida antes da realização dos tratamentos, quando
se tratar de pacientes com autonomia plena, ou pela assinatura do responsável
legal, quando se tratar de pessoas que não tenham tal capacidade (GARBIN
et al., 2006). É importante ressaltar que há grande diferença entre um TCLE e um
contrato de prestação de serviços, sendo que o primeiro traduz a anuência para
o tratamento, tendo sido esclarecidas as opções possíveis e suas características,
e o segundo estabelece os direitos e deveres entre as partes de maneira jurídica

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ética em Odontologia | UNIDADE i

(GALVÃO et al., 2010). Algumas críticas à prática do princípio de autonomia


baseiam-se na “incapacidade técnica” do paciente em optar por este ou aquele
tratamento. Por isso, com base no Código de Ética Odontológica, o profissional
tem obrigação de expor todas as alternativas de tratamento, bem como riscos e
benefícios (GARBIN et al., 2006).

Além disso, a luta por uma melhor remuneração parece levar profissionais a
realizarem procedimentos sem a devida capacitação técnico-científica. Isso
reflete a falta de compromisso e de responsabilidade do profissional com o
paciente, resultando em iatrogenias que ferem o princípio da não maleficência
(AMORIM; SOUZA, 2010). O princípio de beneficência também é uma exigência
para práticas clínicas odontológicas eticamente sadias, uma vez que é um
princípio que nos leva a agir segundo o melhor interesse do outro (AMORIM;
SOUZA, 2010).

A Ética, portanto, veio aprimorar a relação profissional/paciente, abolindo o papel


paternalista do cirurgião-dentista e de outros profissionais da saúde (GARBIN et al.,
2006; PORTER e GREY, 2002). Atualmente temos um novo compromisso, como
colaboradores e corresponsáveis pela saúde dos nossos pacientes, e cabe a eles,
reciprocamente, serem participantes ativos em seu tratamento (GARBIN et al.,
2006).

Conflitos éticos enfrentados por profissionais odontológicos no


Brasil

A rotina da prática odontológica é marcada por conflitos éticos que são trazidos
por questões como o comércio de dentes humanos, as pesquisas que desenvolvem
novas técnicas e materiais, os paradoxos entre as políticas públicas de saúde
e justiça social e a constante busca de humanização da odontologia na relação
profissional/paciente (INEZ; VERDI, 2007). Os dentistas têm, nitidamente, dois
papéis distintos: como profissionais da saúde e como gestores de um pequeno
negócio, sendo que cada uma dessas posições se apresentam com demandas éticas
distintas e muitas vezes conflitantes (PORTER; GREY, 2002).

O respeito aos pacientes e às atitudes éticas deve ser o pilar do exercício


profissional. Mas, infelizmente, o excesso de profissionais odontológicos no
mercado de trabalho gera uma concorrência desenfreada e, na disputa por
pacientes, a dimensão da ética profissional pode ser desconsiderada (AMORIM;
SOUZA, 2010; PORTER; GREY, 2002). Além disso, os recursos direcionados

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pelo governo ao longo dos anos para a assistência pública em saúde bucal têm
sido feitos de forma insuficiente e ineficiente, restando à população que procura
esses serviços um enfoque predominantemente cirúrgico-mutilador (AMORIM;
SOUZA, 2010).

Segundo uma pesquisa brasileira de Amorim e Souza (2010), na qual profissionais


clínicos de odontologia puderam identificar e relatar diversas situações de conflitos
éticos vivenciadas por eles, a maioria pode ser classificada, basicamente, em três
dimensões: 1. problemas éticos na prática dos colegas, tais como aliciamento
de pacientes, capacitação técnico-científica inadequada, realização de tratamento
desnecessário, comentários desfavoráveis sobre o trabalho de colegas, negligência
no cuidado de pacientes, omissão de informações técnicas necessárias à tomada
de decisão, falta de visão integral; 2. problemas éticos nas relações com os
usuários (pacientes), tais como desacordo com as escolhas de tratamento,
manter-se em sigilo frente iatrogenias realizadas por colegas; e 3. problemas éticos
identificados nas relações de trabalho e nos serviços de saúde, como submissão
a condições inadequadas de trabalho, impossibilidade de encaminhamento de
pacientes a serviços mais especializados, tempo reduzido de atendimento em
função do número de pacientes, desvalorização de ações preventivas e educativas,
concorrência profissional.

Uma das formas de treinar para garantir adequada compreensão e aptidão


para deliberar sobre os princípios éticos é por meio do estudo de casos
reais, aplicados a situações específicas.

Seguem abaixo uma situação reflexiva:

» Uma paciente menor de idade se dirige junto com seu responsável à


clínica odontológica para extrair um dente que apresenta condições
e indicação de tratamento, em atendimento à solicitação de seu
responsável pelo fato de não possuir recursos financeiros para arcar com
tal tratamento. (A) É ético extrair o dente permanente de tal paciente?
(B) Se, após adequado esclarecimento, o responsável consentir, o
profissional poderá estar legalmente respaldado? (C) Como ficaria a
questão ética se o menor se recusasse a se submeter a tal procedimento?
Justifique sua decisão (GALVÃO et al., 2010).

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CAPÍTULO 3
EXERCÍCIO DA ODONTOLOGIA E RESPONSABILIDADE CIVIL

Quando falamos em ética e exercício da Odontologia, existem três palavras de


suma importância que precisamos ter conhecimento e saber a diferença:

» Negligência: falta de cuidado e desleixo proposital em determinada situação.


Por ser caracterizada pela falta de ação de um indivíduo, a negligência
também carrega o significado de passividade e inércia, sendo uma omissão
aos deveres que variadas situações demandam.

Exemplo: abandonar um paciente, omitir tratamento, assim como esquecer


um corpo estranho dentro de um paciente pós-cirurgia.

» Imprudência: falta de reflexão ou precipitação em tomar atitudes diferentes


daquelas aprendidas ou esperadas. Desrespeitar uma conduta já aprendida
anteriormente e atuar sem precauções.

Exemplo: não utilizar de proteção individual (EPIs).

» Imperícia: falta de conhecimento ou habilidade específica para o


desenvolvimento de uma atividade ou técnica. Inaptidão, falta de qualificação.

Exemplo: realizar um procedimento sem conhecimento

Exercício lícito e ilícito da odontologia


Segundo nossa lei civil, é ato lícito aquele que se fundamenta no Direito, enquanto
os atos ilícitos são aqueles que contrariam um dispositivo legal. O art. 186 do
Código Civil enuncia: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência
ou imprudência violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente
moral, comete um ato ilícito”.

O ato ilícito contraria a lei, afronta o Direito, portanto foge de determinações


legais. Consequentemente, é um delito, um crime que pode ser de natureza
civil ou criminal, conforme a lei que venha a ser ofendida pelo comportamento
humano.

Segundo o civilista Prof. Washington de Barros Monteiro, “a violação de um direito


pode configurar ofensa à sociedade pelo dano pessoal e pelo dano material”.
No primeiro caso, existe o delito penal, o que induz responsabilidade penal; no
segundo caso, existe o delito civil, consistente na violação de um direito privado, o
que induz a responsabilidade civil.

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O exercício ilegal da Odontologia está disposto no Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de


dezembro de 1940, o Código Penal Brasileiro: Exercício Ilegal da Medicina, Arte
Dental ou Farmacêutica.

Art. 282. Exercer, ainda que a título gratuito, a profissão de médico,


dentista ou farmacêutico, sem autorização legal ou excedendo-lhe
os limites:

Pena – detenção, de seis meses a dois anos.

Parágrafo Único – Se o crime é praticado com o fim de lucro,


aplica-se também multa.

Entende-se exercer “sem autorização legal” quando um indivíduo pratica os atos de


odontologia sem estar graduado por faculdade de odontologia reconhecida.

É de conhecimento geral que o cirurgião-dentista, como profissional liberal, deve


obedecer a duas condições fundamentais:

» sua habilitação profissional deve estar comprovada pela posse do título


competente, isto é, diploma específico da profissão;

» seu diploma deve estar regularmente registrado nas repartições federais e


estaduais competentes.

Código de Defesa do Consumidor


O Código de Defesa do Consumidor (CDC) é o conjunto das normas que protegem
os consumidores brasileiros e tem como objetivo disciplinar relações entre
prestadores de serviço e consumidor final.

O cirurgião-dentista deve ter conhecimento sobre os direitos dos pacientes e


noção de seus deveres, pois, quanto menos direitos ele viola, mais ele aprimora
seu atendimento e menos lesões ele pratica. Pela lei, os prestadores de serviço são
obrigados a deixar em local visível e de fácil acesso ao público um exemplar do
Código de Defesa do Consumidor.

O dentista, como profissional liberal, é entendido por Gabriel Saab como “aquele
que sob remuneração se obriga a prestar determinado serviço para o qual
deve deter certas condições técnicas e científicas para atender ao consumidor
contratante, sem a subordinação própria das relações empregatícias”.

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ética em Odontologia | UNIDADE i

O Código de Defesa do Consumidor trouxe a definição de profissional liberal em


seu art. 14, parágrafo 4o, que diz: “A responsabilidade pessoal dos profissionais
liberais será apurada mediante a verificação de culpa”. Isto é, apenas cabe ao
consumidor provar que lhe foi causado um dano, e o ônus da prova é por parte do
fornecedor de serviços.

Temos que nos ater às excludentes de responsabilidade do profissional. Um


exemplo é a culpa exclusiva da vítima, quando o dentista indica um tratamento
para o paciente, e este não segue as recomendações do profissional. Outro exemplo
é a culpa concorrente, em que a responsabilidade é tanto do paciente como do
dentista; e o caso fortuito, quando ocorrer algo imprevisto superior à vontade do
homem, além da força maior, quando se sabe que vai acontecer o fato, mas não
pode evitá-lo.

Em suma, a responsabilidade existe tanto do profissional como do paciente. Para


a solução do conflito, deve-se analisar o caso concreto e seus fatos, e algumas
perguntas podem ser feitas:

» Foi aplicada a técnica adequada para o problema do paciente?

» O material utilizado foi de primeira qualidade?

» Existe total conhecimento do profissional para aquela atividade?

» O paciente tomou as devidas providências?

A partir disso, a solução do caso será o próximo passo do conflito.

Outras determinações legais que fundamentam o conceito de responsabilidade


civil e profissional estão representadas no Código Civil Brasileiro, Lei n.
10.046, de 10 de janeiro de 2002, art. 186: “Aquele que, por ação ou omissão
voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar danos a outrem,
ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”, art. 927: “Aquele que, por
ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo” e art. 951: “[...]
aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício
de atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia causar a
morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão ou inabilitá-lo para o
trabalho”.

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Responsabilidade Civil na Odontologia


Em alguns países, a Odontologia é considerada uma especialidade da medicina,
sendo compreensível, já que exige grande capacidade profissional e conhecimento
técnico, exigindo diagnósticos, tratamentos, prescrições e cirurgias.

Para isso, precisamos verificar em quais casos o dentista e seus auxiliares


responderão civilmente por eventuais danos causados a seus pacientes e por que,
em determinadas situações, o erro gera o dever de indenizar.

No Brasil, mesmo que a odontologia seja desvinculada da medicina, a


responsabilidade civil dos dentistas, na qualidade de profissional liberal, situa-se
no mesmo campo da responsabilidade civil dos médicos, que, nos termos do
Código de Defesa do Consumidor, é subjetiva e dependerá da comprovação de
culpa.

A responsabilidade dos dentistas também se encontra no Código Civil, o qual


dispõe sobre indenização em caso de lesão a terceiros no exercício profissional.

Art. 951. O disposto nos art. 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso
de indenização devida por aquele que, no exercício de atividade
profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar
a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou
inabilitá-lo para o trabalho.

Os artigos 948, 949 e 950 fazem referência, respectivamente, ao direito de


indenização nos casos de homicídio, nos casos de lesão ou outra ofensa à saúde
e, por fim, no caso de lesão que cause ofensa, defeito ou limite a capacidade de
trabalho do ofendido. Tais lesões devem ser decorrentes de erro no exercício de
atividade profissional.

A responsabilidade do cirurgião-dentista é de resultado, ou seja, é uma atividade


tipicamente contratual, se considerarmos os tratamentos de rotina, como
restaurações e outras atividades que previnem doenças dentárias, como profilaxia.

Porém, existem alguns procedimentos que constituem obrigações de meio, em


que o resultado não pode ser assegurado pelo profissional, como a endodontia, a
traumatologia, a periodontia, a ortodontia, entre outros.

Caso o procedimento não apresente o resultado adequado ou esperado, haverá


descumprimento contratual, que poderá configurar o dever de indenizar do
dentista, devendo os profissionais envolvidos serem responsabilizados civilmente

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ética em Odontologia | UNIDADE i

pelo ato ilícito praticado, a fim de reparar todos os danos sofridos pelo paciente,
sejam eles materiais, morais ou até mesmo estéticos.

Caberá ao dentista afastar sua responsabilidade contratual, provando que não agiu
com negligência, imprudência ou imperícia, ou que o insucesso se deu por culpa
exclusiva do paciente.

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CAPÍTULO 4
SIGILO PROFISSIONAL

Sigilo profissional
O sigilo profissional pode ser definido como um segredo que deve ser mantido na
relação paciente-dentista, sendo um dever ético que impede a revelação de assuntos
confidenciais ligados à profissão. É caracterizado como um direito-dever: direito do
paciente e um dever ético do profissional.

O sigilo abrange assuntos que dizem respeito à intimidade e privacidade do


paciente, tanto quanto sua saúde bucal, como geral, além de seus hábitos, costumes,
vida profissional, social, familiar e outros aspectos que configuram informações
pessoais.

É importante ressaltar que até mesmo seus dados cadastrais são sigilosos, e o
dever do sigilo profissional é tanto do dentista como de toda sua equipe.

No âmbito da saúde, uma relação de confiança e respeito dá ao paciente


segurança e tranquilidade para que ele revele situações que muitas vezes não
são ditas por medo, insegurança ou vergonha. Um exemplo é quando o paciente
omite, durante a anamnese, que tem alguma doença infectocontagiosa ou que
faz uso de substâncias químicas. Essas informações são de extrema importância
e devem ser ditas para que o profissional fique ciente e não exponha o paciente
a situações de risco.

A regra geral é não romper o sigilo, porém o Código de Ética Odontológica


estabelece em seu art. 14, parágrafo único, que existem situações consideradas
como justa causa para a quebra do sigilo: notificação compulsória de doença e
de agravos à saúde, colaboração com a justiça nos casos previstos em lei, perícia
odontológica nos seus exatos limites, estrita defesa de interesse legítimo dos
profissionais inscritos e revelação de fato sigiloso ao responsável pelo incapaz.

O cirurgião-dentista também pode quebrar o sigilo quando for o caso de cobrar


judicialmente a quitação de seus honorários profissionais.

A notificação compulsória de doença ou agravo à saúde é toda e qualquer


comunicação direcionada a autoridade sanitária com o objetivo de viabilizar
adoção de medidas de intervenção pertinentes. Serve como estratégia para
melhorar o comportamento de doenças na sociedade e agravos, como: lesões

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ética em Odontologia | UNIDADE i

decorrentes de violência, acidentes, envenenamento que podem envolver


menores de idade, cônjuges e idosos.

O art. 269 do Código Penal estabelece como crime a omissão de notificação de


doença. O art. 13 do Estatuto da Criança e Adolescente determina que casos
suspeitos ou confirmados de maus-tratos, bem como presenciar agressões
durante o atendimento, devem ser comunicados ao Conselho Tutelar da região.

Outro fator importante é em relação a atestados odontológicos, em que o


cirurgião-dentista não deve revelar ao empregador qualquer fato referente ao
tratamento odontológico em curso ou sobre o ato profissional realizado, quando
questionada em relação à emissão do atestado.

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REFERÊNCIAS

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