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Coaching e

Mentoring

4ª edição

Rio de Janeiro
UVA
2016
Wagner Salles

Coaching e
Mentoring

4ª edição

Rio de Janeiro
UVA
2016
Copyright © UVA 2014
Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida por qualquer
meio sem a prévia autorização desta instituição.

Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico


da Língua Portuguesa.

ISBN 978-85-65812-26-9

Autoria do Conteúdo
Wagner Salles

Design Instrucional
Diana Ferreira de Melo

Projeto Gráfico
UVA

Diagramação
Raphaela Saules

Revisão
Tássia Braga
Janaina Vieira

S168c Salles, Wagner


Coaching e mentoring [livro eletrônico] / Wagner
Salles. – 4. ed. – Rio de Janeiro : UVA, 2016.

574 KB.
ISBN 978-85-65812-26-9
Disponível também impresso.

1. Assessoria empresarial. 2. Pessoal - Treinamento


I. Universidade Veiga de Almeida. II. Título.

CDD – 658.3124

Ficha Catalográfica elaborada pelo Sistema de Bibliotecas da UVA.


Biblioteca Maria Anunciação Almeida de Carvalho.
SUMÁRIO
Apresentação.................................................................................................................7
Sobre o autor................................................................................................................8

Capítulo 1 - O que é um processo de coaching.........9


Conceitos e aplicações do coaching.................................................10
O coaching no ambiente corporativo...............................................24
O que faz do coaching um processo relevante..........................41
Referências.....................................................................................................55

Capítulo 2 - A formação de um coach........................57


Estratrégias corporativas para formação de coaches....................58
As habilidades do coach............................................................................71
Os papéis do coach...................................................................................87
Referências....................................................................................................102

Capítulo 3 - O coaching na prática.............................105


Enfoques de atuação do coaching...................................................106
A expansão do coaching pela gestão.............................................121
Planejando a prática do coaching..................................................134
Referências....................................................................................................145

Capítulo 4 - O que é mentoring...................................149


As implicações do mentoring.........................................................150
A formação de um mentor................................................................163
Aplicando o coaching e o mentoring................................................175
Referências....................................................................................................192

Considerações finais.....................................................194
7

APRESENTAÇÃO

Este livro trata de conceitos, aplicações e reflexões sobre Coaching e


mentoring. O coaching é um processo de condução a objetivos pre-
determinados, que enfatiza potencialidades por meio de melhorias de
desempenho em curto prazo. Já o mentoring é um processo de orien-
tação e desenvolvimento de competências que serão empreendidas em
médio e longo prazo, enfatizando um ideal de vida mais amplo, em
perspectiva futura.

Sendo assim, a partir da leitura deste livro vamos compreender quais


são os principais significados de coaching, suas aplicações e seus per-
fis quanto ao contexto corporativo, bem como aprender sobre o sig-
nificado de mentoring, seu processo de formação e suas associações
com o coaching.

Desejamos que você aproveite ao máximo esta experiência e que a lei-


tura desta obra promova uma oportunidade de reflexão sobre os conte-
údos abordados, contribuindo efetivamente para o seu enriquecimento
cultural e acadêmico.
8

SOBRE O AUTOR
Wagner Salles é mestre em Administração pela Universidade Federal
Fluminense - UFF, especialista em Administração de Empresas pela
Fundação Getúlio Vargas - FGV e graduado em Administração pelo Cen-
tro Universitário Celso Lisboa - CEUCEL. Professor presencial e tutor
de EaD nos cursos de graduação em Administração e tecnólogos em
Gestão em diferentes IES. No campo corporativo, atuou recentemente
como analista de recursos e prevenção jurídica, e dirigiu a área de Co-
municação de uma organização do terceiro setor.

.........................................................................................................
Conceitos e aplicações do coaching 9

CAPÍTULO 1
O QUE É UM PROCESSO DE
COACHING

Este capítulo trata dos conceitos e aplicações do coaching,


enfatizando o ambiente corporativo e compreendendo os
principais aspectos que fazem deste um processo neces-
sário nas organizações atuais. Por isso, leia com atenção
e tente contextualizar suas experiências pessoais e profis-
sionais com os tópicos apresentados.

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10 O que é um processo de coaching

CONCEITOS E APLICAÇÕES DO COACHING

Em um cenário global, em que as mudanças ocorrem de


maneira cada vez mais acelerada e radical, faz-se neces-
sário que a gestão desenvolva competências que atendam
às questões de transformação da organização no que se
refere ao enfrentamento dessas mudanças.

Uma empresa que está preparada para passar por proces-


sos de transformação (muitas vezes sofrendo mudanças
profundas) possui maiores possibilidades de não apenas se
manter, mas de avançar no contexto em que está inserida.
Nesse sentido, a gestão tem à sua frente desafios de caráter
instrumental e seminal, isto é, que vão demandar o uso de
ferramentas, técnicas e estratégias para se chegar a um ob-
jetivo predeterminado e outros desafios que estão voltados
para esse objetivo, quanto ao significado que ele possui.

Em outras palavras, a gestão terá em suas mãos a respon-


sabilidade de administrar a complexidade dos recursos,
procedimentos e tecnologia que estão à disposição em um
aspecto mais estrutural e também a responsabilidade de
administrar a mudança, e esta por meio das pessoas, que
devem ser consideradas como o caráter vivo do trabalho.

Portanto, a partir de um cenário em que a organização está


vulnerável aos impactos das mudanças no ambiente (interno
e externo), cabe à gestão dispor de ferramentas e de trabalho
vivo para enfrentar uma nova realidade que se apresenta,

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Conceitos e aplicações do coaching 11

muitas vezes não sendo possível de ser tratada a partir de


prescrições que visam a uma solução predefinida, pronta.
Constantemente, o enfrentamento da realidade ocorrerá a
partir de novas construções, novas proposições, novas solu-
ções, que serão constituídas, em parte, pelas técnicas e fer-
ramentas já disponíveis, embora nunca estejam completas.

É, então, que nasce a percepção de que muitas soluções para


as organizações atuais vão emergir a partir de um deter-
minado contexto, que envolve determinadas pessoas e de-
terminados recursos, nem sempre sendo possível replicar
essas soluções em novas ocasiões, já que o contexto será
outro. Ora, uma vez o contexto sendo determinante para
que emerja uma solução que visará a enfrentar uma realida-
de, pensamos que é necessário abrir espaço para a capacita-
ção de pessoas em uma perspectiva constante, não pontual.
Nasce, então, o sentido de que a gestão pode fornecer alter-
nativas de desenvolvimento a um trabalhador, de forma que
ele construa, a partir de sua capacitação, seu desempenho
na realidade do trabalho e uma nova solução para enfrentar
mudanças que se apresentam o tempo todo.

É importante notar que, ao se falar de capacitação, não se


está falando de “robotização” do trabalhador, mas sim de
incentivo ao empreendedorismo por meio de técnicas e fer-
ramentas, que, se preciso for, deverão ser por ele critica-
das e alteradas. Essa capacitação proporciona à gestão de
pessoas a perspectiva de um ambiente de aprendizagem
contínua, em que, para ser enfrentado, o contexto muda e
demanda novas propostas.

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12 O que é um processo de coaching

Nesse ambiente de aprendizagem, é possível listar diver-


sos processos, constituídos de ferramentas e de técnicas,
que facilitarão a dinâmica de capacitação. Entre esses pro-
cessos podemos destacar o coaching e suas aplicações.

O que é coaching?

O coaching, nesse contexto, portanto, toma a forma de um


processo de aprendizagem que busca a capacitação de pes-
soas, articulando procedimentos individuais e coletivos,
na busca de soluções que visam a alcançar os objetivos
da organização, ao mesmo tempo em que proporciona o
desenvolvimento pessoal dos envolvidos. É um processo
de facilitação em gestão de pessoas.

De maneira mais “formal”, para se definir o que é um pro-


cesso de coaching, vamos recorrer a algumas definições
de instituições internacionais especializadas nesta área. A
saber:

Coaching é uma relação permanentemente focada


no cliente e na sua tomada de medidas no sentido
da realização dos seus sonhos, metas ou desejos.
Este processo utiliza um processo de inquérito e de
descoberta pessoal, por forma a construir no cliente
um nível de consciência e de responsabilidade e pro-
porciona-lhe uma estrutura de apoio e de feedback.
O processo de coaching ajuda o cliente a definir e
atingir os seus objetivos pessoais e profissionais de
uma forma mais rápida, e com uma facilidade que
seria impossível de outra forma.
(ICF – International Coach Federation –
www.icfportugal.com)

Nas suas várias formas, o coaching é um poderoso


processo de desenvolvimento pessoal e profissional,
que consiste na cocriação de novas possibilidades.
(YouUp – The Coaching Company – www.youup.pt)

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Conceitos e aplicações do coaching 13

O coaching é um processo de transformação, tendo


em vista a consciencialização, descoberta e cresci-
mento pessoal e profissional. O coaching ajuda o
cliente a identificar e a construir as relações, as fer-
ramentas, os sistemas e as estruturas de que neces-
sita, para evoluir de forma sustentada.
(IAC – International Association of Coaching –
www.certifiedcoach.org)

Coaching é uma relação entre o coach e o cliente


(coachee), com o objetivo de promover a eficácia
do cliente. Assenta em metas definidas por ele pró-
prio (cliente). Através do processo de coaching, as
respectivas competências e ações individuais são
potencializadas, de forma a produzirem resultados
relevantes.
(The Teacher Support Network –
teachersupport.info)

O coaching é a arte de trabalhar com os outros, para


que eles obtenham resultados fora do comum e me-
lhorem a sua atuação. É a atividade que gera novas
possibilidades para a ação e que permite resultados
extraordinários no desempenho.
(ASESCO – Asociación Española de Coaching –
www.asescoaching.org)

Essas e outras definições podem ser encontradas no livro


Ferramentas de Coaching (CATALÃO; PENIN, 2009), bem
como nas referências ao final de cada capítulo deste livro.

A partir dessas definições, é possível perceber alguns fato-


res que constituem o processo de coaching. A saber:

O coach é a pessoa responsável por conduzir o


processo de coaching; é um facilitador do processo
que favorece uma transformação pessoal e profis-
sional no coachee.

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14 O que é um processo de coaching

O coachee, também chamado de “cliente”, é a pes-


soa que busca se aperfeiçoar por meio das orien-
tações do coach; é o aprendiz que define seus
próprios objetivos e traça suas próprias metas de
forma a alcançar determinados resultados sob a
orientação do coach.

Definição de objetivos: não é o coach quem define os ob-


jetivos a serem alcançados e nem as metas a serem cum-
pridas. Este é o papel do coachee. O coach apenas facilita o
caminho a ser seguido, buscando eficiência e eficácia, sem
caráter avaliativo do que pode ser bom ou ruim.

Interatividade: como um processo de transformação, o


coaching demanda uma relação de interação entre o coach
e o coachee para que haja a possibilidade de análise dos
caminhos que estão sendo tomados, uma reflexão críti-
ca sobre os desafios e oportunidades, forças e fraquezas
envolvidas no processo, de forma que a operação tome o
rumo de uma investida bem-sucedida.

Para se compreender melhor o processo de coaching, con-


vém destacarmos, ainda, aquilo que não é coaching.

Apesar de a tradução literal da palavra coach ser “treina-


dor”, o processo de coaching não pode ser considerado
um treinamento. Isso porque um processo de treinamento
denota o desenvolvimento de características, habilidades
ou competências predeterminadas em um indivíduo por

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Conceitos e aplicações do coaching 15

meio de um momento também predeterminado e pontual.


Já o processo de coaching busca explorar e/ou desenvol-
ver características, habilidades ou competências que não
fazem parte de uma “lista” predeterminada, ou seja, que
são inerentes ao indivíduo e que podem ser trabalhadas de
maneira favorável ao alcance de seus objetivos, até que o
indivíduo de fato os alcance.

O coaching também não pode ser confundido com um pro-


cesso de terapia, que focaliza os problemas, obstáculos.
Uma terapia está mais voltada para uma proposta de cura
de um problema, de um desvio de comportamento, de sub-
versões, de identificação dos obstáculos a serem supera-
dos. Seu terreno está mais sobre as emoções; busca atender
a um distúrbio já existente, algo que não está adequado.
Na terapia, o terapeuta propõe escolhas a serem feitas pelo
paciente. No processo de coaching, a preocupação não se
refere aos obstáculos ou aos problemas, mas às perspec-
tivas de condução a uma solução, aos possíveis caminhos
que favoreçam resultados positivos e desejados; o foco está
nas potencialidades, e não nas deficiências.

O coaching também não deve ser considerado um simples


procedimento gerencial, no sentido de administrar recur-
sos para alcançar um objetivo. O gerenciamento se ocupa
de uma perspectiva de otimização, de alocação de recursos
para que determinado procedimento seja bem-sucedido. O
coaching não decide onde, como e quando utilizar recur-
sos. Esse é o papel do coachee mediante suas próprias de-
finições de metas.

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16 O que é um processo de coaching

Outro equívoco que se precisa evitar é quanto à associação


do coaching à consultoria. Esta é um processo de diagnós-
tico e intervenção, de aconselhamento sobre determinada
especificidade de uma área de conhecimento de domínio
do consultor. Além disso, a figura do consultor é sempre a
de alguém externo à organização, contratado pontualmen-
te para diagnosticar e resolver um problema emergente,
que geralmente é perceptível pela diminuição nos níveis de
produção. O coaching, apesar de ser acionado para facilitar
algo que ainda não é de total domínio do coachee e que
interfere em seu desempenho, é um processo que não pro-
põe soluções ou intervenções, além de ter a possibilidade
de ser executado por pessoas de dentro da organização.

Por fim, o último destaque a ser feito quanto aos cuidados


sobre o que não é coaching está voltado para a liderança.
E aqui é preciso ser mais atento: apesar de o coaching ser
um processo considerado como possibilidade de estraté-
gia de liderança, convém separar ambos os conceitos. A
liderança possui um caráter mais próximo com o lidera-
do, de acompanhamento e aconselhamento, de incentivos,
de influências, de mobilizações. Já o coaching, apesar de
proporcionar caminhos semelhantes, possui um caráter
mais imparcial, em que a construção coletiva é limitada,
diferentemente da liderança. Especificamente sobre essas
abordagens, os desdobramentos que diferenciam ambos
os conceitos ficarão mais claros com a leitura dos próxi-
mos tópicos.

De maneira geral, podemos dizer o que é coaching por


meio daquilo que não é coaching:

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Conceitos e aplicações do coaching 17

O que não é coaching? Por que não é coaching?


Define e desenvolve competên-
Treinamento cias específicas e pontuais para
realizar determinadas tarefas.
Focaliza os problemas e
obstáculos que devem ser
Terapia
tratados para se alcançar
determinada superação.
Detém-se na otimização
e realocação de recursos
Gerenciamento
para se chegar a um de-
terminado objetivo.
Busca um diagnóstico e
propõe alguma intervenção
Consultoria
de acordo com uma área
específica do conhecimento.
Sugere um relacionamento
mais próximo, de constru-
ção conjunta, de influência
Liderança
empreendida sobre determi-
nada pessoa para se chegar
a um objetivo comum.

Sinteticamente, podemos compreender, então, que o coa-


ching é um processo no qual o coachee define seus pró-
prios objetivos e busca uma condução do coach de manei-
ra a facilitar seu caminho para a obtenção dos resultados
desejados. O coach terá o papel de potencializar as compe-
tências do coachee sem juízo de valores, sem julgamentos,
visando a uma atuação que favoreça o desenvolvimento
pessoal e profissional do coachee.

Aplicações do coaching
A partir da compreensão do que é o processo de coaching,
podemos perceber que o principal enfoque está ligado
ao processo de aprendizagem pessoal, cujo empenho é o
compromisso da realização bem-sucedida de um empre-

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18 O que é um processo de coaching

endimento que, para tanto, precisa que sejam identifica-


dos os pontos fortes e fracos a fim de que os caminhos
tomados sejam os melhores possíveis. Nesse processo de
aprendizagem, surgem as figuras do coach e do coachee,
que, em uma relação de interação, executam medidas que
conduzem à conquista dos objetivos desejados.

Nesse sentido, é possível depreender que o coaching é apli-


cado em qualquer área de atuação em que o desenvolvi-
mento individual seja necessário, proporcionando melho-
rias no desempenho. Isso denota a visão de que o coaching
não possui limitação de áreas, de posições ou de funções.

O objetivo da aplicação de um processo de coaching repou-


sa sobre o foco na identificação e dissolução do distúrbio
estrutural presente no processo de decisão quando se pla-
neja sair de um ponto e se chegar a outro, isto é, empreen-
der uma transformação que potencialize as competências
do indivíduo em busca de um nível mais elevado, novos
resultados, novo aprendizado, novo contexto.

Nesse sentido, pode-se assumir que o coaching possui duas


áreas essenciais de aplicação: o coaching pessoal, ligado
a um aspecto mais íntimo do coachee, como objetivos de
carreira, objetivos financeiros etc; e o coaching profissio-
nal, ligado a um aspecto mais organizacional, corporativo,
como objetivos individuais e/ou grupais que convergirão
em um melhor desempenho para o alcance de resultados
organizacionais.

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Conceitos e aplicações do coaching 19

Em relação ao aspecto profissional, o coaching pode ser


aplicado em diversas áreas e funções, como comentamos.
Desde um nível operacional até um nível estratégico, o pro-
cesso de coaching busca favorecer a gestão de pessoas no
que se refere à facilitação dos fatores que envolvem a ca-
pacitação e o desenvolvimento pessoal.

Como exemplos, podemos aplicar o coaching em funções


operacionais para aperfeiçoar as formas de trabalho e os
procedimentos de produção técnica; podemos aplicar o
coaching em funções administrativas para aperfeiçoar a
dinâmica do trabalho em equipe, desde o desenvolvimen-
to de competências funcionais até o desenvolvimento de
competências gerenciais e estratégicas; podemos, ainda,
aplicar o coaching em funções que envolvam gestão de
conhecimento, capacidade de relacionamento e gestão de
conflitos, para aperfeiçoar comportamentos, habilidades e
potencialidades que corroborarão determinada cultura or-
ganizacional, uma melhor administração do ambiente em
que o conhecimento é gerado e aplicado, bem como favo-
recer um clima organizacional que possibilite maior nível
de produtividade e satisfação.

Cabe, ainda, destacar que nas aplicações do coaching é in-


teressante observar as possibilidades de um processo que
explora os benefícios de um coach interno ou de um coach
externo.

O coach interno nada mais é do que um funcionário da


organização, com vínculo empregatício, cujo papel refere-
-se diretamente à responsabilidade de conduzir os progra-
mas de coaching. Já o coach externo é alguém chamado

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20 O que é um processo de coaching

para executar determinado(s) programa(s) de coaching,


sem, portanto, vínculo empregatício.

Seguem algumas diferenças essenciais:

Aplicação do Aplicação do
coaching externo coaching interno
Cúpula da empresa/
Gerência média/
Contexto Alta gerência/Can-
Supervisores
didatos a promoção
No aperfeiçoamento
Na melhoria do
dos executivos e
desempenho e dos
na maximização do
resultados do seu
uso do seu po-
Foco trabalho, tendo em
tencial. Orientado
vista as necessida-
para as necessida-
des e expectativas
des do executivo
da organização
e da empresa
Performance do exe-
Desempenho indi-
cutivo com reflexos
Efeitos esperados vidual e da equipe
diretos nos resulta-
à qual pertence
dos da organização
O executivo e A empresa e o
Cliente
a empresa funcionário
Em geral, do
Da empresa que
próprio executivo
Iniciativa oferece/propõe/
ou por sugestão
indica o coaching
do setor de RH
Decidida pela
Decidida pelo
Seleção do coach empresa dentre os
executivo
coaches internos
A chefia imediata,
O próprio executivo
juntamente com
em conjunto com
o setor de RH. Em
Quem avalia os o coach (em alguns
alguns casos, é feita
resultados casos inclui-se um
em conjunto, coach,
representante da
coachee, RH e/ou
organização)
chefia imediata
Fonte: KRAUSZ, 2007, p. 45.

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Conceitos e aplicações do coaching 21

Sendo assim, nas aplicações do coaching, é relevante con-


siderar as vantagens de um coach externo e de um coach
interno. A saber:

Coach externo Coach interno


Conhece o sistema e a
Neutralidade
cultura organizacional
Liberdade de ação Custo
Não faz parte da estrutura Conhece as demandas do
de poder da organização coachee e da organização
Conhece diferentes realidades e Oportunidade de valorizar os
a diversidade das organizações recursos e talentos internos
Tende a gerar menor defen- Conhece as regras dos jogos
sividade/Menor resistência de poder da organização
Maior autonomia no tra-
Dissemina a “cultura de
balho pela ausência de
coaching” na organização
vínculo empregatício
Permite estabelecer uma Indicado para o nível
relação de confiança da média gerência
Possibilidade de acom-
Visão de conjunto de
panhar os resultados do
alguém de fora
processo de coaching
Clareza do seu pa- Disponibilidade/Aces-
pel na organização sibilidade do coach
Facilita o diálogo fran-
Conhece o dia a dia do coachee
co e aberto
Papel definido contratualmente
Aporte de um olhar neu-
tro sobre a organização
Liberdade para falar so-
bre o “indizível”
Oferece um número am-
pliado de opções
Mais eficaz para os altos
executivos da organização
Possibilidade de escolha tanto
do coach como do coachee

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22 O que é um processo de coaching

Coach externo Coach interno

Menor risco
Credibilidade/Profissio-
nalismo especializado
Pode ser selecionado por meio
de referências, contatos etc.
O coachee sente-se mais seguro
Total de vantagens Total de vantagens
indicadas: 20 indicadas: 10
Fonte: KRAUSZ, 2007, p. 42.

É possível observar claramente que a relação de vantagens


da aplicação de um coach externo é maior do que a de um
coach interno. No entanto, cabe ressaltar que isso não se
configura na afirmação de que um é melhor do que o ou-
tro, uma vez que as aplicações de um processo de coaching
dependem de fatores referentes a itens como contexto,
foco, efeitos esperados, cliente, iniciativa, seleção do coach
e avaliação dos resultados. Em síntese, as vantagens sobre
a opção de aplicação de um coach externo recaem sobre
os aspectos práticos da experiência, diversidade, custo e
neutralidade.

Como vimos anteriormente, em um cenário global em constantes


mudanças, as organizações precisam estar atentas para lidar com
as alterações no contexto em que estão inseridas com o objeti-
vo de não apenas manter o equilíbrio dos processos de negócio,
mas também avançar e conquistar novos espaços e oportunida-
des que se apresentarem.

Para tanto, é preciso assumir como desafio para a gestão a neces-


sidade de investir na capacitação das equipes de trabalho para
lidarem com novos ambientes, novas realidades de trabalho. Esse
desafio recai sobre a administração da complexidade de proce-

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Conceitos e aplicações do coaching 23

dimentos, normas, processos e recursos e também recai sobre a


administração da mudança, empreendida por meio das pessoas
envolvidas.

Nesse sentido, um dos processos capazes de auxiliar nessa capaci-


tação é o coaching, em que o coachee define seus próprios objeti-
vos e busca uma condução do coach de maneira a facilitar seu ca-
minho aos resultados desejados, uma vez que o coach terá o papel
de potencializar as competências do coachee sem juízo de valor,
sem julgamentos, visando a uma atuação que favoreça o desenvol-
vimento pessoal e profissional do coachee.

Em suas aplicações, o coaching pode ser planejado e executado


em quaisquer áreas e funções, buscando o desenvolvimento tan-
to pessoal quanto profissional, quando serão consideradas as al-
ternativas que ponderam um coach interno ou um coach externo
de acordo com os fatores envolvidos no processo.

No entanto, cabe ressaltar um ponto crítico de reflexão. Como em


tudo que envolve pessoas, é necessário compreender a perspec-
tiva de que não é o objetivo do coaching robotizar o indivíduo
em relação aos caminhos que deve empreender para melhorar
seu desempenho. Além disso, deve-se considerar que o coaching,
sozinho, pode não ser eficaz quando outros fatores associados ao
indivíduo e à organização do trabalho contribuem para uma alie-
nação e um desprovimento de sentido na realização da atividade
laboral.

A experiência do coachee e suas expectativas com o trabalho afe-


tam diretamente o sucesso do processo, uma vez que está sobre
o coachee a responsabilidade de desejar ser auxiliado de alguma
forma para alcançar melhorias em seu desempenho. Nesse sen-
tido, tanto um processo de coaching interno quanto um externo
podem não surtir o efeito desejado, sendo ainda mais danoso se
isso se transformar em um agravante sobre o comportamento,
cultura e clima organizacional, na medida em que o coachee se
sentir controlado e forçado a atingir um patamar sem sentido, na
sua própria perspectiva, ou, ainda, se sentir seduzido ou engana-
do pela proposta do processo de coaching.

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24 O que é um processo de coaching

O COACHING NO AMBIENTE
CORPORATIVO

Uma vez já esclarecido o que é o coaching e as suas prin-


cipais aplicações, entramos agora em uma dimensão espe-
cífica desse processo, que está voltada para os interesses
gerais e resultados planejados de uma empresa, ou, como
preferem alguns, de uma organização ou corporação.

Sendo assim, antes de ingressar no aspecto estrito desse


processo, é preciso compreender e definir qual o sentido
adotado para o termo “corporativo”, que pode ser asso-
ciado aos termos “empresarial” e “organizacional”, dada a
aplicação aqui proposta.

O termo “corporativo” está ligado a um aspecto político, de


compartilhamento de regras, normas, diretrizes, cujo foco
transacional está nas funções econômicas compartilha-
das. Isto é, “corporativo” refere-se, no âmbito comercial,
ao conjunto de interesses comuns entre os envolvidos, em
diversos ramos e setores de atividades, com vistas ao al-
cance de resultados financeiros favoráveis.

Convém destacar o âmbito comercial porque o sentido


lato do termo “corporação”, por si só, não necessariamen-
te visa à obtenção de lucros financeiros, contudo, objeti-
va resultados positivos, favoráveis. Nesse sentido, uma
“corporação”, além de uma empresa, pode ser entendida
como uma associação, uma sociedade, uma instituição,
uma fundação etc.

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O coaching no ambiente corporativo 25

A etimologia da palavra “corporação” remete aos conceitos


de “corpo” e “ação”, isto é, sugere a representação de um
determinado grupo de pessoas agindo como um só corpo,
com vistas aos objetivos comuns dos envolvidos, estando,
para isso, submetidas às mesmas regras, normas, diretri-
zes. Portanto, ao nos referirmos ao termo “corporativo”,
estamos enfatizando o aspecto de ação das pessoas envol-
vidas, que se relacionam entre si e formam partes de um
mesmo corpo, regido por normas gerais de conduta. Apli-
cando essa perspectiva no âmbito comercial, complemen-
ta-se o objetivo comum de ganhos econômico-financeiros.

Convém, ainda, compreendermos as diferenças básicas


entre os desdobramentos associativos ao termo “corpo-
ração” para se ter em mente as principais aplicações no
campo da gestão.

Um termo recorrente é “empresarial”, referente à “empre-


sa”. Aqui, o intuito é destacar o empreendimento em si, em
sua forma de atuação peculiar, sua atividade econômica,
que objetiva retornos financeiros.

Já o termo “organizacional” está ligado à “organização”,


etimologicamente referindo-se a “organismo”.

Não há um consenso sobre a definição do termo “orga-


nização”, mas existe a afirmação de que é um sistema
sociotécnico, isto é, um conjunto de componentes que in-
teragem entre si, envolvendo aspectos sociais e técnicos,
com vistas a alcançar objetivos predefinidos.

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26 O que é um processo de coaching

A associação a um “organismo” tem origem no comporta-


mento estrutural em que diversas partes trabalham con-
juntamente, de forma interdependente, ao mesmo tempo
em que são influenciadas pelo ambiente externo, como
ocorre com o organismo humano.

Morgan (1996) traz algumas interpretações das organiza-


ções por meio de metáforas, nas quais as compara a má-
quinas, cérebros, prisões psíquicas, culturas, organismos
etc. Essas interpretações dão à organização uma imagem
específica para cada contexto na qual é percebida.

Sendo assim, sinteticamente, as abordagens que tratam


dos termos “corporativo”, “organizacional” e “empresa-
rial” se cruzam na medida em que exploram o mesmo ob-
jeto essencial, ou seja, se referem ao conjunto estruturado
de componentes de cunho social e técnico, voltado para
o alcance de objetivos econômicos comuns por meio das
relações em que os envolvidos se comportam como um
corpo, todos pertencentes ao mesmo organismo interde-
pendente.

E é esse o contexto em que o processo de coaching tem


sido explorado em nosso conteúdo, especificamente nos
apoiando, neste momento, sobre o termo “corporativo”,
por se tratar do foco nas ações das pessoas envolvidas,
que se relacionam entre si e fazem parte do mesmo corpo,
buscando os resultados comuns que estão orientados sob
as mesmas normativas.

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O coaching no ambiente corporativo 27

O coaching corporativo
Falar em coaching corporativo é o mesmo que falar em
ações interventoras cujo foco principal está relacionado
aos resultados no contexto do trabalho.

Se entendermos que a corporação denota as ações das pes-


soas que formam um corpo, podemos observar que o foco
estará na forma de gerir o ambiente de trabalho de manei-
ra que seja propulsor de aprendizagens, de capacitações, a
fim de que as ações das pessoas envolvidas estejam sendo
tratadas para enfrentar desafios futuros.

Portanto, de forma subjacente, falar em coaching corpora-


tivo é tocar em aspectos que envolvam mudança organiza-
cional; que deem o movimento necessário ao contexto do
trabalho rumo aos objetivos predefinidos.

Esse processo corporativo, uma vez envolvendo todo as-


pecto humano, abrange funções diversas, como gestão,
liderança e aprendizagem. E os motivos que levam um tra-
balhador a recorrer ao coaching dentro do contexto corpo-
rativo são diversos.

Dentre esses motivos, podemos destacar, primeiramente, a


deficiência ou insuficiência de desempenho, que é o mais
recorrente e que estimula a busca pelo coaching. Uma vez
sendo percebido, esse motivo provoca um empenho, um
interesse no desenvolvimento individual na superação do
problema identificado com vistas ao melhor caminho para
se chegar ao resultado da ação. Porém, o problema iden-
tificado, isto é, a limitação em si, nunca será o foco do
processo.

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28 O que é um processo de coaching

Outra razão relevante está relacionada a um aspecto mais


inclinado ao campo comportamental: quando o indivíduo
recorre ao processo de coaching dentro do ambiente de
trabalho por se sentir inapto, incapaz ou limitado a de-
sempenhar determinada função, tarefa ou atividade. Esse
sentimento pode ter como causa diversos fatores, desde
técnicos até sociais. O que se destaca, no entanto, é a pro-
cura pelo coaching para superar essa sensação de inapti-
dão e favorecer uma oportunidade de auxílio, de busca por
um apoio em uma figura reconhecidamente mais segura
e que pode proporcionar uma experiência de melhoria no
desempenho de quem necessita.

Há outros motivos que são passíveis de serem identifi-


cados dentro do ambiente corporativo e que provocam
a necessidade de execução de um processo de coaching,
geralmente (e comumente) ocasionados por eventos como
mudanças de função ou até mesmo questões ligadas ao
desenvolvimento de carreira.

De forma geral, as contribuições que um processo de


coaching corporativo pode proporcionar são destacadas
por diversos estudos e autores em termos de aumento nos
lucros, novas perspectivas de carreiras, incremento em pro-
dutividade, aumento nas vendas, favorecimento na relação
com clientes e fornecedores, novas perspectivas quanto ao
sentido do trabalho dos colaboradores, entre outros.

A tônica que prevalece, portanto, ao se falar em coaching


corporativo coloca em evidência os principais impactos
que esse processo pode proporcionar no aspecto humano
dentro do contexto do trabalho, de maneira que os objeti-
vos organizacionais sejam alcançados por meio da possibi-
lidade de mudança e de melhoria.

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O coaching no ambiente corporativo 29

O papel do coaching corporativo no aspecto


humano do trabalho
Convém, inicialmente, ampliarmos um pouco o entendi-
mento sobre os fatores que envolvem o aspecto huma-
no no trabalho a fim de que se possa compreender as
contribuições e limitações do processo de coaching nessa Teoria das
temática. Relações Humanas
Teve sua origem em
uma experiência
chamada de
Desde a Teoria das Relações Humanas, o fator humano no
Hawthorne, que
trabalho passou a ser observado para além da esfera pro- levou o nome
do bairro onde
dutiva, implicando estudos e descobertas sobre o campo foi realizada, em
psicológico e das relações sociais. Chicago, EUA. O
médico e sociólogo
Elton Mayo
A relação entre os objetivos organizacionais e objetivos pesquisava fatores
ambientais que
pessoais dos trabalhadores passou a ser melhor analisada influenciavam a
produção, positiva
para que produção e realização fossem dois eixos possí-
ou negativamente.
veis de serem convergidos. Nesse sentido, pode-se afirmar No primeiro
momento, a
que o ser humano possui expectativas pessoais sobre o
experiência buscava
contexto do trabalho que tratam, por exemplo, do cresci- medir a influência
da iluminação
mento pessoal e profissional, da promoção de sentido, da
do local sobre a
relação positiva com outros colegas, de possibilidade de produção, mas o
resultado apontou
autonomia, entre outros.
para outro fator: o
psicológico. Assim,
a experiência de
O aspecto humano no trabalho passa a ser compreendido Hawthorne deu
como um ator na relação entre a tarefa determinada pela origem a uma
nova visão da
organização (fator que carrega consigo as expectativas da administração sobre
organização) e a atividade que o indivíduo encontra ao rea- o aspecto humano
no trabalho,
lizar a sua função (fator que carrega consigo as expectati- compreendendo
vas e a percepção pessoal). Isto é, o trabalho pode ser com- que a produtividade
não depende
preendido em suas diferentes perspectivas, e entre elas apenas dos fatores
consideram-se as dimensões do trabalho prescrito (aquele físicos do ambiente,
mas também dos
desenhado pela organização) e o trabalho real (aquele ex- fatores psicológicos
e sociais dos
perimentado na prática pelo trabalhador).
trabalhadores.

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30 O que é um processo de coaching

O aspecto do trabalho prescrito tem sua fundamentação


nos estudos tayloristas, em que o trabalhador é tido como
um mero executor de tarefas previamente descritas, de
forma que se proceda com um único modo de trabalho, o
“melhor” modo. Os elementos característicos do trabalho
prescrito fazem ligação direta com as atividades a serem
desenvolvidas, ou seja, esses aspectos do trabalho não são
diretamente contrários, mas se relacionam entre si. Nesse
ponto, cabe ainda destacar que há uma potencial descrição
do trabalho subjetivo, no que se refere aos saberes e técni-
cas incorporados à tarefa.

Em princípio, a diferenciação básica entre o real e o pres-


crito se deve à intervenção do trabalhador para corrigir
os desvios e imprevistos no cotidiano. Essa intervenção, a
priori, considera que a prescrição da tarefa não é suficien-
te para atingir o objetivo do trabalho, uma vez que é uma
perspectiva estática, enquanto que a atividade no real do
trabalho é uma perspectiva dinâmica, flexível, instável, e
demanda capacidade de um “ator” para providenciar os
ajustes necessários e preencher as lacunas, de forma a ob-
ter o êxito. Este “ator” é, então, assumido pelo trabalhador.

A diferença entre o prescrito e o real sempre existirá, dada


a dinâmica e a instabilidade do contexto organizacional.
Essa instabilidade pode ser observada sob diferentes pon-
tos de vista. Conforme destaca Brito (2008), as oscilações
no contexto organizacional podem ocorrer, sob uma das
várias perspectivas, a partir das variações produtivas,
como quantidades produzidas/demandadas, interferên-
cias no fornecimento de matéria-prima, ou, ainda, a par-
tir das variações tecnológicas e estruturais, como falhas
de maquinário, depreciação das instalações ou problemas
técnicos.

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O coaching no ambiente corporativo 31

Ora, se o indivíduo torna-se o ator no processo de ajuste


entre o prescrito e o real, as instabilidades no contexto orga-
nizacional podem não possuir apenas origens processuais,
externas ou ambientais, mas também podem ocorrer devido
ao próprio caráter subjetivo da pessoa e de sua formação,
como a sua qualificação de acordo com o processo educa-
cional e seu estado interior, como a forma com que ela (pes-
soa) compreende, julga e reage à realidade do trabalho.

Em outras palavras, o caráter real do trabalho (atividade)


contempla não apenas as lacunas existentes entre os pro-
cessos prescritos e o cotidiano imprevisto do trabalho,
mas também o caráter humano do trabalhador quando
confrontado com essas lacunas.

É nesse cenário que se destacam os elementos humanos


frente aos desafios que as organizações têm para conquistar
objetivos associados aos aspectos de tecnologia, gestão da
qualidade, produtividade, redução de custos, incentivo à cria-
tividade, gestão de pessoas, gestão ambiental, entre outros.

Por isso, o papel do processo de coaching está associado


ao aspecto humano do trabalho, uma vez que lida com
os fatores subjetivos do trabalhador e com os fatores na
lacuna entre o trabalho prescrito e o trabalho real.

Diante deste contexto de desafios que envolvem o ser hu-


mano no ambiente de trabalho, o coaching representa um
processo facilitador na gestão de pessoas, cujo papel se tor-
na um apoio à busca de resultados esperados, tanto para a
organização quanto para o coachee. É importante destacar
que o coaching não é um solucionador dessas questões, mas
sim uma estratégia que busca favorecer os caminhos que
visam a melhorias no desempenho.

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32 O que é um processo de coaching

De acordo com Carvalho (2011), o coaching está relacio-


nado a alguns fatores internos em relação aos indivíduos,
tais como: capacidade de aprendizagem, motivação, per-
cepção do ambiente interno e externo, atitudes e emoções,
valores e educação.

Esses fatores podem ser compreendidos de acordo com o


quadro a seguir:

O coaching deve considerar


esta questão, entendendo e
definindo parâmetros que pos-
Capacidade de aprendizagem
sibilitem a aprendizagem dos
indivíduos, independentemen-
te de sua característica pessoal.

Um trabalho de coaching irá


detectar rapidamente o nível
de entrosamento do indivíduo
com suas funções e o seu com-
prometimento com a organi-
Motivação
zação. Um indivíduo motivado
torna muito mais fácil o traba-
lho de coaching, pois aceitará
as recomendações, orientações
e informações recebidas.

A relação do indivíduo com


sua área de trabalho, com sua
organização, com seus clientes,
fornecedores, comunidade etc.
apresenta variáveis imprevisí-
Percepção do ambien- veis. O coach deve permanecer
te interno e externo atento a essa questão, analisan-
do e apresentando recomenda-
ções coerentes com a situação
constatada, para a devida
orientação ou aconselhamen-
to do profissional indicado.

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O coaching no ambiente corporativo 33

As atividades de coaching tam-


bém devem considerar as ques-
tões atitudinais e emocionais.
Será necessário analisar, perceber
e chegar a conclusões sobre
Atitudes e emoções
esses procedimentos para depois
apresentar recomendações
que contribuam para o devido
enquadramento do indivíduo em
seu ambiente organizacional.
Muito se discute sobre os
valores éticos e morais. O
trabalho de coaching deve
ser firme e forte neste item,
posicionando e conduzindo o
Valores
profissional para a obrigato-
riedade de observação cor-
reta e adequada das normas
e procedimentos e demais
práticas empresariais vigentes.
Cabe ao trabalho de coaching a
devida recomendação para que o
profissional continue ou retome
Educação
seus estudos em busca de habi-
lidades imprescindíveis para o
desempenho de suas atribuições.
Fonte: CARVALHO P. C. in: PÉRCIA, André; SITA, Maurício, 2011, p. 89.

Por meio dessas relações, o coaching pode auxiliar a ges-


tão de pessoas não somente quanto ao equilíbrio entre as
metas organizacionais e pessoais, mas também quanto às
possibilidades de realização e promoção de sentido no tra-
balho, por meio de seu papel no desenvolvimento pessoal
do trabalhador, que pode favorecer a edificação de novas
competências por meio da melhoria no desempenho pes-
soal e profissional.

Assim, podemos compreender melhor diversas ênfases que o


processo de coaching pode assumir no ambiente corporativo.

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34 O que é um processo de coaching

Ênfases do coaching no ambiente corporativo


A partir do entendimento sobre as definições do processo
de coaching, bem como suas aplicações e o seu papel no
contexto corporativo, podemos perceber que as três per-
sonagens que mais estão envolvidas nesse processo são o
coach, o coachee e a organização.

Nessa perspectiva, as frentes de trabalho de um processo


de coaching podem variar de acordo com a abordagem e
com a ênfase necessárias a cada contexto.

Como esses contextos são variados, diversos fatores in-


fluenciam a ênfase dada ao coaching em determinada or-
ganização. Contudo, as pesquisas e estudos que exploram
as aplicações do coaching no ambiente corporativo dão in-
dícios de que há certa similaridade nessas aplicações, que
é a preparação de futuros líderes. Ou seja, das diversas
frentes de trabalho que o coaching pode assumir no am-
biente corporativo, as ênfases convergem para que novos
líderes possam surgir. Todavia, cabe ressaltar: o uso do
termo “líderes” basicamente reflete uma função gerencial,
sem, necessariamente, tratarmos do conceito de liderança
propriamente dito, embora esse conceito deva estar ine-
rente a essas funções gerenciais. Mais adiante, falaremos
um pouco sobre essa relação entre o coach e o líder.

Vejamos, portanto, algumas das principais ênfases que as


pesquisas descrevem a partir da aplicação do coaching no
ambiente corporativo:

Ênfase no suprimento de deficiências de desempenho


Inicialmente, há uma ênfase no propósito de suprir defi-

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O coaching no ambiente corporativo 35

ciências de desempenho. O coaching é, então, uma ferra-


menta para auxiliar na solução de situações nas quais o
desempenho mostra-se deficiente ou limitado, a fim de que
o resultado seja alcançado apesar dessas limitações.

Observa-se com razoável relevância que o coaching não é


voltado para resolver as deficiências, mas, uma vez iden-
tificando-as, contorna esses obstáculos rumo ao objetivo
predeterminado.

Para isso, sugerem-se dois momentos nesse processo:

1. É realizada uma análise detalhada dos fatores


que influenciam o desempenho deficiente, quando
é constatado o nível de potencialidade do coachee.
Aqui surge a possibilidade de identificar as lacunas
que interferem no desempenho, dando a noção mais
exata da dimensão do problema enfrentado, a fim de
que seja possível compreender onde estão localiza-
dos os empecilhos para um melhor desempenho e se
o comportamento do coachee assegura uma poten-
cial evolução para superar as lacunas identificadas.

2. O coach e o coachee discutem conjuntamente os


passos para que as limitações sejam contornadas.
Aqui deve haver um entendimento mútuo sobre o
diagnóstico realizado e um acordo sobre os passos
a serem seguidos, sempre tendo em mente a neces-
sidade de acompanhar o desenvolvimento mediante
as alternativas propostas e promover um reconhe-
cimento quando esse desenvolvimento é percebido
como satisfatório.

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36 O que é um processo de coaching

Ênfase na capacidade de realização


Outra ênfase do processo de coaching corporativo, que de
certa forma aproxima-se da ênfase destacada anteriormen-
te, mas contém uma particularidade essencial: está no pro-
pósito de melhoria na capacidade de realização.

Enquanto uma ênfase busca melhorar o desempenho me-


diante a identificação e o suprimento de deficiências, a ên-
fase na realização está voltada para a melhoria baseada nas
expectativas, isto é, em aperfeiçoar ações e potencializar pon-
tos fortes a fim de que novas realizações sejam possíveis.

Esta é uma ênfase cujo foco repousa sobre as necessidades


específicas individuais, quando o coachee deseja um apoio
crítico sobre seu desempenho para alcançar a realização
das expectativas de melhoria que possui.

Algumas etapas são relevantes nessa ênfase:

1. É preciso definir o que o coachee possui e enten-


de como expectativas e em que momento ele deseja
alcançá-las.

2. É preciso observar como o coachee se comporta


mediante sua própria capacidade atual em busca
dessas expectativas que deseja alcançar. É neste mo-
mento que o coach pode proceder aos devidos ajus-
tes para melhoria no desempenho.

3. O coach e o coachee discutem os rumos e ajustes


propostos, avaliando se as realizações conquistadas
foram ao encontro das expectativas empreendidas.
Caso sim, o coachee conseguiu sua evolução desejada
para alcançar o que havia definido como expectativas.

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O coaching no ambiente corporativo 37

Ênfase na liderança
Esta ênfase é comumente aplicada com certa distorção, o
que faz com que haja muitas interpretações que associem
o processo de coaching ao fenômeno característico da lide-
rança, igualando os dois conceitos. Isso deve ser evitado.

Ser coach não é o mesmo que ser líder, apesar de ser pos-
sível a convergência de ambos os perfis. Contudo, no que
se refere ao processo de coaching com ênfase na liderança,
podemos afirmar tratar-se de um processo de facilitação
do desenvolvimento de determinadas competências que
visam à mobilização de pessoas. Ou seja, a ênfase na lide-
rança está sobre aquilo que não é ainda adequado e que
pode ser melhorado para que o coachee desenvolva sua
capacidade de mobilização de pessoas.

Como a liderança é inerente ao contexto em que emerge,


para que essa ênfase no processo de coaching tenha uma
execução adequada é necessário conhecer as demandas
peculiares da organização, bem como a influência que o
coachee possui nesse contexto, a fim de que sejam conhe-
cidos os principais aspectos a serem enfrentados e em que
o coachee pode ser capaz de influenciar.

Os momentos que possivelmente podem ocorrer nesta ên-


fase:

1. Primeiramente, é preciso conhecer bem o ambien-


te e o perfil do coachee, não apenas em relação aos
resultados esperados, mas principalmente quanto à
sua intervenção e potencial impacto sobre terceiros
envolvidos no processo.

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38 O que é um processo de coaching

2. É preciso que haja acordo entre o coach e o co-


achee quanto às competências já desenvolvidas e
quanto a outras que precisam de desenvolvimento,
combinando, ainda, quais as melhores formas de se
obter o devido retorno sobre o que precisa ser me-
lhorado no decorrer do processo.

3. Por fim, nesta ênfase, é preciso atentar para o


momento de desenvolvimento crítico, quando se-
rão apontados os principais aspectos que não estão
caminhando no sentido da mobilização de pessoas,
isto é, quais os fatores que estão influenciando ne-
gativamente o desenvolvimento de competências
em liderança, lembrando sempre que esses fatores
podem ter origem externa, no ambiente, uma vez
que as competências em liderança não são fixas ao
perfil do indivíduo.

Ênfase na mudança
A última ênfase a ser destacada está voltada para um as-
pecto mais generalista, que busca uma alteração de padrão
geral no perfil do coachee, de ordem mais subjetiva do que
as demais ênfases propostas.

A ênfase na mudança foca as implicações internas de for-


ma que haja uma melhoria perceptível no contexto geral
da organização, em termos de clima, cultura, valores etc.

No aspecto mais pessoal do coachee, a ênfase na mudança


vai buscar melhorias em dimensões como hábitos, valores
pessoais, comportamentos, atitudes, relacionamentos e
disponibilidade para reconhecer necessidades de aperfei-
çoamento constante.

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O coaching no ambiente corporativo 39

Esta ênfase é executada basicamente mediante encontros


pessoais de discussão e crítica sobre o perfil do coachee e
sobre o ambiente em que ele está inserido.

As mudanças serão empreendidas e percebidas por meio de


provocações que podem surgir a partir de perguntas e res-
postas nos momentos de discussão entre o coach e o coachee.

Como visto, de forma sintética, o coaching corporativo in-


cide sobre as ações daqueles que atuam no cenário orga-
nizacional, isto é, sobre o aspecto humano do trabalho. E
compreendendo a complexidade e a subjetividade desse
aspecto no cenário organizacional, o coaching corporativo
propõe algumas ênfases que vão desde o aspecto interiori-
zado do coachee, passando por sua capacidade de realiza-
ção e identificação de limitações, até o desenvolvimento de
sua capacidade de mobilizar outras pessoas. Isso dá a esse
processo a potencialidade de favorecer um novo ambiente
profissional em que seja possível empreender novos ru-
mos estratégicos e de humanização do trabalho.

Como destacamos em alguns momentos, a gestão precisa de um


olhar mais crítico sobre a organização do trabalho para observar
que o aspecto humano demanda ações que não tentem roboti-
zar o comportamento das pessoas.

Embora o processo de coaching corporativo proponha uma sé-


rie de passos para potencializar o desempenho das pessoas no
ambiente de trabalho, convém ressaltar que as etapas observa-
das não significam uma “receita de bolo” a ser seguida, isto é, es-
sas etapas não asseguram o pleno sucesso para o aumento de
produtividade e de satisfação no ambiente organizacional. E por
quê? Porque estamos lidando com pessoas.

Até mesmo quando tentamos fazer um bolo e usamos a receita


detalhada para alcançarmos uma boa fornada, há certos momen-

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40 O que é um processo de coaching

tos em que o bolo não sai como esperávamos, mesmo tendo


seguido o passo a passo da receita. Isto se deve, muitas vezes,
à qualidade dos utensílios utilizados, à temperatura ambiente,
ao clima etc.

Na gestão, essa possibilidade também existe. E, ao trabalharmos


o processo de coaching corporativo, estamos seguros de que
nem sempre as etapas cumpridas conseguirão dar conta da rea-
lidade que se apresenta. Muitas vezes, a ordem das alternativas
e ações pode ser diferente, assim como as necessidades envolvi-
das e o ambiente em que estaremos inseridos.

Portanto, o que se deve guardar a respeito do coaching corpo-


rativo está relacionado às possibilidades de facilitar o caminho
para melhorias, e não de emoldurar os passos a serem seguidos
para que as perspectivas futuras sejam alcançadas.

Observe o papel do coaching corporativo e suas ênfases recor-


rentes. A partir daí, novas possibilidades surgirão para que o as-
pecto humano no trabalho seja valorizado e investido, em vez
de simplesmente ser cercado por técnicas, normas e procedi-
mentos padronizados que cerceiam as capacidades individuais
e alienam o pensar dos indivíduos. Pense nisso.

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O que faz do coaching um processo relevante 41

O QUE FAZ DO COACHING UM PROCESSO


RELEVANTE

Os desafios de competitividade que incidem sobre as or-


ganizações atuais demandam determinados padrões sobre
as ações que possibilitem fazer mais por menos. As pre-
missas tayloristas enfatizam uma organização prescritiva
do trabalho, concedendo a cada trabalhador uma tarefa,
atribuição e privilégios limitados. É a chamada operação-
-padrão de Taylor que, se levada ao aspecto literal, com-
promete a produtividade pelo aspecto da capacidade emol-
durada pela regra.

Ferreira e Mendes (2012) enfatizam que a ação de trabalhar


pode ser compreendida como uma oportunidade de desen-
volver as capacidades humanas, proporcionando acesso à
autonomia e à construção de sentido, tanto para o sujeito
quanto para a sociedade. Para tanto, o trabalho não deve
estar submetido a situações que fragmentem as capacida-
des individuais e coletivas, muito menos que anulem o as-
pecto da singularidade.

Trabalhar não é somente produzir. É a possibilidade


para o sujeito se constituir e, ao fazê-lo, transfor-
mar a si mesmo. O trabalho é parte fundamental
para afirmar a subjetividade, para o processo de
enunciação do sujeito e construção da saúde. (FER-
REIRA e MENDES, 2012, p. 144)

A partir desse introito, podemos observar que o coaching


passa a ser um processo relevante, que facilita os cami-

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42 O que é um processo de coaching

nhos para uma organização do trabalho na qual o indiví-


duo pode transformar a si mesmo.

Este é um possível caminho que faz do coaching um pro-


pulsor de novas criações para o cotidiano laboral, que re-
sultam em benefícios em diversas dimensões, como vere-
mos a seguir.

O coaching como facilitador na construção


de sentido
Um dos aspectos que torna o coaching necessário é a sua
condução para a perspectiva de solução, em vez de focar
apenas o problema que impede determinado avanço.

Grande parte das pessoas inseridas no contexto organi-


zacional passa por dificuldades que, em certa medida já
explicadas nos capítulos anteriores, têm origem na lacuna
entre as atribuições da tarefa e aquilo que é experimentado
na prática.

Nesse momento, muitos passam a atribuir a si mesmos a in-


capacidade de avançar, de executar um bom desempenho,
de desenvolver determinadas competências, de produzir,
de alcançar as metas estabelecidas pelo nível estratégico
etc. E esse autojulgamento acaba por proporcionar a visão
de que dentro de si só há problemas a serem resolvidos e
nada de potencialidades a serem exploradas.

A ótica exploradora do trabalho distorce a capacidade que


cada indivíduo tem de empreender soluções criativas, que
dão rumo ao trabalho. Nesse momento, o coach pode inter-
vir proporcionando uma nova visão não mais em relação
aos problemas, mas, sim, em relação às possíveis soluções.

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O que faz do coaching um processo relevante 43

A partir do momento em que um coachee passa a vislum-


brar alternativas não antes percebidas, ele experimenta
um momento de encontro consigo mesmo, com sua real
situação, com pontos fracos, mas também com pontos for-
tes; com deficiências, mas também com qualidades. E essa
nova visão traz em si a possibilidade de sair de um estado
atual em direção a um novo estado, um novo local, um
novo imaginário revitalizador.

Uma vez o trabalhador se confrontando consigo mesmo,


ele tende a encontrar outras vias para ir além de onde
antes pensava em chegar. É o encontro consigo mesmo
que irá proporcionar a devida identificação de potencia-
lidades e de limitações, buscando explorar seus pontos
fortes e minimizar seus pontos fracos em busca de seus
objetivos, o que favorece um estado de determinação,
foco e disciplina.

Na perspectiva desse novo estado, o coachee tem a oportu-


nidade de recorrer à sua experiência de vida, à sua história
singular, buscando reproduzir os fatores que empreende-
ram ações bem-sucedidas no passado e corrigir possíveis
rotas que foram tomadas e que não produziram bons re-
tornos.

Esse outro aspecto da necessidade do coaching, a partir do


uso da experiência própria do coachee, favorece um espaço
de autonomia no trabalho. Isso não significa que as atri-
buições do cargo e as tarefas predeterminadas sejam to-
talmente desprezíveis ou perversas. Se a realidade, porém,
é mutável, se o ambiente organizacional está em plena e
contínua mudança, é de se esperar que haja um espaço
de autonomia para que o indivíduo no trabalho possa em-

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44 O que é um processo de coaching

preender parte de sua própria capacidade e experiência na


busca por novas construções que irão favorecer soluções
para o enfrentamento de uma nova realidade.

O coaching como facilitador no incremento


de produtividade
Outra dimensão que tornou o coaching necessário está vol-
tada aos mecanismos que proporcionam incrementos na
produtividade. E, ao se falar em produtividade, estamos
considerando a relação entre aquilo que se produz e os
meios que levaram à produção.

Sob esta ótica, o coaching encontra demanda na relação com


o processo de transformação, isto é, nas atividades de pro-
cessamento que irão resultar no produto/serviço final e que,
consequentemente, serão afetados de acordo com a forma
com que esse processamento, essa transformação é gerida.

Alguns aspectos que estão ligados à necessidade de coa-


ching podem se relacionar, por exemplo, com a melhoria
contínua de processos. Nesse aspecto, o fator humano in-
terfere tanto na forma de pensar os processos quanto na
de executá-los. Para ambas as formas, o fator humano é
desafiado a minimizar erros, prever contingências, atingir
metas, elaborar estratégias, entre outros. Para tanto, o pro-
cesso de coaching contribui proporcionando alternativas
que vão sempre convergir para um melhor desempenho,
um melhor compromisso com os objetivos organizacio-
nais e pessoais.

Ainda em relação à necessidade de melhoria contínua de


processos, convém destacar que a tônica da melhoria não

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O que faz do coaching um processo relevante 45

se refere apenas às formas de pensar e executar os pro-


cessos, uma vez que a melhoria também depende, em boa
medida, da gestão do capital intelectual das pessoas. Aliás,
é conveniente destacar que o capital intelectual em si tal-
vez não possa ser gerido, mas certamente pode-se gerir o
ambiente e as circunstâncias em que ele se manifesta.

Este destaque nos remete à visão de que a produtividade


é dependente da forma como o capital intelectual é gerido,
concebido. Daí a relação direta com a produção de sentido
que o coaching também corrobora, uma vez que a inventivi-
dade é a mola mestra de novas formas do saber-fazer.

Um conceito que se relaciona diretamente às melhorias de


processo e à gestão do capital intelectual é o de gestão par-
ticipativa. E, nesse aspecto, o coaching também encontra
sua demanda bem identificada.

Uma gestão participativa bem implementada é aquela que


enfatiza (1) as condições de diversidade na equipe de tra-
balho e (2) as informações sobre a condição emocional da
equipe de trabalho.

Em relação à administração da diversidade, ao recorrermos


ao campo do comportamento organizacional é possível ca-
racterizarmos a diversidade em dois níveis: superficial e
profundo. A diversidade superficial refere-se aos aspectos
claros, nítidos, perceptíveis no primeiro momento e que
diferenciam as pessoas umas das outras, como a cor da
pele, o sotaque, as características fisiológicas etc. Já a di-
versidade profunda refere-se aos aspectos mais internos,
que não são facilmente perceptíveis e que só podem ser

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46 O que é um processo de coaching

identificados mediante a interação com a pessoa, sendo


possível, a partir de então, diferenciá-la das demais, como
personalidade, valores, comportamentos, vícios etc.

Uma necessidade, portanto, que demanda a intervenção


do processo de coaching pode ser identificada a partir do
momento em que é preciso administrá-la “individualmen-
te”, isto é, fazer a gestão considerar a diversidade da força
de trabalho para que as potencialidades sejam exploradas,
levando a uma participação conjunta na elaboração dos
processos, o que vai ao encontro de um incentivo à pro-
dutividade.

Já quanto aos aspectos emocionais, a gestão participati-


va recorre aos pressupostos da inteligência emocional,
cujo desafio está em identificar e administrar as emoções,
tanto em si mesmo quanto em outros. Para o gestor, isso
significa que seu desafio está em caracterizar a causa do
comportamento das pessoas associando fatores de origem
emocional e/ou sentimental. Tal separação se dá na medi-
da em que o sentimento está ligado a aspectos sem causa
definida, que não são expressos de forma facial e são du-
radouros, enquanto que a emoção possui causa definida, é
expressa de forma facial e é momentânea.

Logo, outra justificativa que se apresenta para a execução


de um processo de coaching está ligada à gestão participa-
tiva, uma vez que ele representa uma ferramenta que faci-
litará o caminho para lidar com as diversidades da equipe
de trabalho, criando alternativas para administrar o rumo
das decisões que ela pode tomar.

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O que faz do coaching um processo relevante 47

Outro aspecto em que o coaching pode significar um faci-


litador de incremento na produtividade refere-se à adapta-
bilidade ao contexto. Como vem sendo destacado, as mu-
danças que ocorrem no ambiente externo proporcionam
interferência no ambiente interno das organizações e, por
isso, demandam novas posturas, pensamentos e compor-
tamentos das pessoas a fim de que respondam satisfato-
riamente a tudo que vem se transformando.

Sendo assim, um dos principais aspectos que faz do


coaching um processo necessário é o ajuste mútuo entre
a organização e o ambiente em que ela está inserida. A
resultante desse ajuste está diretamente associada à maior
produtividade.

Ao se falar em adaptação ao contexto, porém, estamos li-


dando com fatores profundos e complexos, tanto em nú-
mero quanto em significado. Não é possível desconsiderar,
por exemplo, aspectos ligados ao campo sociológico, técni-
co, cultural, econômico, entre outros.

O processo de coaching pode, assim, servir como facilitador


da mudança que é preciso empreender para considerar uma
nova realidade, acompanhando as alterações no ambiente.

Uma vez que a organização seja capaz de acompanhar e de


se adaptar às mudanças por meio — também — da execu-
ção do processo de coaching, observa-se que há razoável
tendência a implementar práticas sustentáveis. E isso signi-
fica que o incremento na produtividade se dará por meio de
práticas que vão cumprir objetivos não apenas produtivos,
mas que vão corroborar ações voltadas ao campo social,

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48 O que é um processo de coaching

ambiental e econômico, visando à exploração consciente de


recursos e ampliando os impactos benéficos da produção.

O coaching como facilitador no


desenvolvimento de competências gerenciais
Muito se discute em termos teóricos sobre o que significa
“competência”. Não é nosso objetivo aqui discorrer sobre
alguma definição do termo, mas é oportuno nos inclinar-
mos para a perspectiva francesa, que considera o contexto
como um aspecto importante para o desenvolvimento de
competências.

Como visto, o processo de coaching assume algumas ênfa-


ses quanto à sua aplicação. Dentre elas, encontramos a re-
lação com a função gerencial, na medida em que membros
de equipes são capacitados para assumir cargos gerenciais,
assim como gestores também são capacitados para alcan-
çar (ou desenvolver) melhorias em seus desempenhos.

Não obstante uma ou outra dimensão, o coaching oferece


alternativas concretas que colaboram para que as compe-
tências gerenciais sejam desenvolvidas na medida em que
as competências emergem a partir da melhoria no desem-
penho.

Esta é uma necessidade latente no campo organizacional


se considerarmos, por exemplo, a incessante busca por so-
luções já prontas.

No meio empresarial, é muito comum que os gestores re-


produzam técnicas e ferramentas desenvolvidas em ou-
tros países e, consequentemente, outros contextos (no
aspecto macro), sem a devida consideração das particu-

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O que faz do coaching um processo relevante 49

laridades que a organização possui no ambiente em que


está inserida.

São ações que geralmente são fomentadas por baixo in-


vestimento na produção de conhecimento nacional e pela
pressa em obter propostas de solução prontas, que sejam
apenas aplicáveis, sem necessidade de gastos financeiros e
de tempo no desenvolvimento estratégico.

O resultado disso é que muitas empresas têm enfrentado


sérias dificuldades estratégicas, produtivas e econômicas
ao tentarem simplesmente executar padrões instrumentais
em suas respectivas realidades, sem atentar para as carac-
terísticas do setor, do público-alvo, da estrutura organiza-
cional, da cultura local e empresarial, entre outras.

É aí que nasce a necessidade de adotar uma postura ge-


rencial crítica, a partir da qual as potencialidades da força
de trabalho serão fundamentais para enfrentar os desafios
do contexto. Em outras palavras, surge a necessidade de
identificar outros caminhos para se chegar a um objetivo.
Ao trabalhar o aspecto humano na função gerencial, o
coaching vai considerar não apenas o que é feito, mas
como é feito e, principalmente, como poderia ser feito.
Cabe ressaltar, mais uma vez, que as competências não se
referem a um padrão a ser seguido. Ao contrário, signifi-
cam uma amostra de ações que podem emergir a partir do
desempenho de determinados gestores, em determinados
contextos, com determinadas equipes de trabalho. O coa-
ching interage nesse processo ofertando caminhos alterna-
tivos para que a melhoria no desempenho seja alcançada
de forma eficiente.

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50 O que é um processo de coaching

O coaching como facilitador na relação de


interação do grupo
Como vimos anteriormente, um aspecto comum entre as
ênfases que o coaching assume no ambiente corporativo
refere-se à preparação ou à capacitação para assumir car-
gos gerenciais, ou, em outra perspectiva, à capacitação em
liderança.

Esta é uma demanda que também dá indícios da impor-


tância do processo de coaching e o faz tão necessário no
empreendimento de melhorias de desempenho: o impacto
sobre a interação, sobre a relação operacional do grupo.

Ao assumirmos esse termo de relação operacional, esta-


mos, na verdade, considerando um aspecto que pode até
ser classificado como reducionista, no sentido de que po-
deria minimizar a importância do coaching em relação a
outros aspectos para os quais ele pode contribuir. Porém,
o intuito não é reduzir, e sim destacar (ou demarcar) um
fator no qual observamos a necessidade de busca desse
processo de coaching.

Todo indivíduo possui anseios, expectativas, desejos de


suprir suas necessidades. E para que cada um de nós possa
supri-las, é preciso recorrer a determinadas fontes de re-
cursos que, por si mesmas, podem passar a ser entendidas
também como necessidades, na medida em que se tornam
fundamentais para que alcancemos nossos objetivos.

Em outras palavras, os caminhos que nos levam a suprir


nossas necessidades podem também tornar-se fontes de
necessidades. É uma relação cíclica: preciso de recursos

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O que faz do coaching um processo relevante 51

para suprir necessidades pessoais; logo, esses recursos


também se transformam em outro nível de necessidade,
sem os quais não consigo suprir minhas necessidades es-
senciais.

Ora, se cada indivíduo possui necessidades seminais e ins-


trumentais, então nos lançamos a construir relações com
outros indivíduos a fim de que possamos obter os devidos
recursos que vão suprir nossas necessidades. Isto é, nos-
sa relação uns com os outros, em certa medida, pode ser
compreendida como uma relação instrumental, por meio
da qual buscamos um relacionamento tão somente com
o objetivo de suprir determinadas necessidades pessoais.

Esta é uma visão que pode ser traduzida da seguinte forma:

Eu não tenho condições de suprir, sozinho, minhas


próprias necessidades, assim como não possuo to-
dos os meios para alcançar esse suprimento. Mas
outra(s) pessoa(s) possui(em) meios pelos quais eu
posso suprir minhas necessidades. Logo, é este o
elo que me faz criar uma relação entre mim e esta
pessoa.

Em um primeiro momento, essa perspectiva pode parecer


um tanto perversa, exploradora, mas, se observarmos o
nosso dia a dia, vamos compreender que isso se dá de ma-
neira muito natural.

Por que vamos ao mercado? Porque não temos condições


de produzir nossos próprios alimentos para suprir nossa
necessidade de nos alimentar.

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52 O que é um processo de coaching

Por que vamos ao shopping? Porque não temos condições


de produzir nossas próprias roupas ou calçados para su-
prir nossa necessidade de vestuário.

E assim por diante em relação ao médico, à escola, ao lazer


etc.

Essa relação, no entanto, não deve ser observada apenas


como se cada um de nós devesse estar submetido às pos-
sibilidades de outros. O caminho inverso também ocorre,
isto é, cada um de nós possui determinados recursos que
vão auxiliar outras pessoas a suprirem suas necessidades
pessoais. Por isso, essa relação se dá de maneira interacio-
nal e operacional, pois todos nós detemos certos recursos
e temos determinadas necessidades. Por meio da intera-
ção, há uma troca de suprimento de necessidades uns dos
outros.

Não é muito difícil imaginarmos, então, que aquele que


detém maiores possibilidades de recursos em relação aos
outros também detém certo poder sobre os demais, uma
vez que está nele a fonte de suprimento; é dele que os de-
mais dependem; sem ele, os demais não podem alcançar
facilmente os objetivos que desejam. E é aí que nasce uma
das perspectivas da relação poder-autoridade e de onde
surgem algumas das teorias sobre liderança (KNICKERBO-
CKER, 1961, vol. 1, n. 2, p. 137-16).

Portanto, podemos compreender uma das perspectivas de


onde surge o desejo por melhorar o próprio desempenho.
Nesse raciocínio, cada um de nós deseja não depender
tanto de fatores externos para alcançar nossos objetivos,
mas, sim, cada um de nós busca melhorar seu desempenho

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O que faz do coaching um processo relevante 53

para aperfeiçoar seus próprios recursos de alcançar seus


objetivos. Assim, cada um de nós também possibilita su-
prir as necessidades de outras pessoas, na medida em que
ampliamos nossas capacidades e desenvolvemos nossos
recursos próprios.

Esta é uma dimensão do aspecto humano presente nas


organizações atuais em que o coaching também assume
um papel importante, na medida em que cada um busca
desenvolver a si próprio para trocar de lado na interação
em grupo.

Vimos alguns aspectos que fazem do coaching um processo ne-


cessário, mas isso não significa que ele se torna uma ferramenta
mais importante ou menos do que outras no campo da gestão.

O coaching não pode ser subestimado, mas também não deve


ser superestimado. Ele não é uma “fórmula mágica” ou uma “espa-
da da justiça” que dará poderes ilimitados sobre as necessidades
emergentes do contexto organizacional, sobre o que envolve o
aspecto humano. Da mesma forma, ele não é somente “mais um”
processo, pois possui contribuições muito peculiares e assertivas
em gestão de pessoas.

Destacar alguns dos motivos que fazem do coaching um processo


necessário significa colocar em evidência algumas das questões
inerentes ao contexto em que a organização está inserida e, des-
sa forma, proporcionar uma visão holística sobre as demandas
que se fazem presentes na gestão de pessoas e que irão impactar
nos resultados empresariais.

Portanto, falar dos motivos que fazem o coaching tão necessário,


em verdade, não coloca em evidência o coaching em si, mas as
necessidades que o circundam. Daí, sim, podemos compreender
onde o coaching pode intervir de maneira a proporcionar solu-
ções favoráveis a essas realidades tão diversas e complexas.

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54 O que é um processo de coaching

Pode haver, ainda, eventos e ocasiões nos quais o coaching, so-


zinho, não trará os resultados suficientes, quando deve ser as-
sociado a outros processos e ferramentas que vão corroborar os
objetivos.

Assim, alguns desses aspectos destacados que fazem do coa-


ching um processo tão necessário apresentam ao gestor um
universo de potencialidades que precisam ser trabalhadas, que
se associam à dinâmica da organização, que são inerentes ao
aspecto humano do trabalho, que não podem ser anuladas ou
desconsideradas da organização do trabalho e que podem ser
matéria-prima de processos de melhoria de desempenho, como
o coaching, que farão com que haja maior probabilidade de en-
frentar esse cenário complexo e mutável.

Neste capítulo, vimos a definição de coaching e suas apli-


cações nas empresas.

Entendemos que o coaching é um processo que não se


preocupa com as limitações ou problemas, mas sim com
as potencialidades por meio das quais pode-se conduzir
uma pessoa a alcançar um melhor desempenho, de manei-
ra que atinja seus objetivos.

Pudemos perceber que o coaching pode ser tratado como


um processo de desenvolvimento humano, cujas ênfases
podem assumir diversas formas a fim de alcançar os dife-
rentes objetivos que se fazem necessários.

Por fim, vimos também que esse processo de coaching as-


sume um papel facilitador em diversas demandas, sempre
associadas às necessidades de desenvolvimento do aspec-
to humano no trabalho.

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55

REFERÊNCIAS

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Rio de Janeiro: Fiocruz, 2008.

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J. C. F. (Orgs.). Dicionário da educação profissional em
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2012.

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56 O que é um processo de coaching

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tudo com base na psicodinâmica do trabalho de criação li-
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NEVES, Darlene da G. Coaching como fator de diferen-


ciação nas organizações. Monografia. Mindelo: Instituto
Superior de Ciências Econômicas e Empresariais, 2011.

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Estratégias corporativas para formação de coaches 57

CAPÍTULO 2
A FORMAÇÃO DE UM COACH

Este capítulo trata da forma com que as empresas inves-


tem na formação de coaches, enfatizando as habilidades
que são necessárias ao coach e compreendendo os prin-
cipais aspectos de seu papel no contexto organizacional.
Assim, leia com atenção e tente contextualizar suas expe-
riências pessoais e profissionais com os tópicos apresen-
tados.

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58 A formação de um coach

ESTRATÉGIAS CORPORATIVAS PARA


FORMAÇÃO DE COACHES

Talvez um dos maiores desafios em gestão de pessoas seja


implementar ações que resultem em compartilhamento de
poder e tomada de decisão.

Uma das fontes de demanda que faz do coaching um pro-


cesso necessário é a facilitação no incremento de produtivi-
dade, na qual a gestão participativa é fator preponderante.

Para que uma organização mantenha-se firme e atuante no


mercado e no ambiente em que está inserida, a sua adap-
tabilidade às mudanças é um fator essencial, como visto
anteriormente. E para que ela se adapte de formas cada
vez mais adequadas e eficazes, é preciso converter o olhar
sobre as pessoas de modo que sejam alinhados os obje-
tivos organizacionais com os pessoais. Uma maneira de
valorizar o aspecto humano é reconhecer a sua capacida-
de de criação, desenvolvimento e autonomia no trabalho.
Contudo, para isso, é necessário que haja uma condução
que potencialize o desempenho de cada pessoa, a fim de
que esses objetivos sejam alcançados.

Entramos, então, na relação entre a necessidade de um


coach e o que as empresas têm concebido como estraté-
gias para que coaches sejam desenvolvidos e atuantes, de
maneira que o desempenho pessoal repercuta no desem-
penho organizacional.

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Estratégias corporativas para formação de coaches 59

Neste tópico, o enfoque será no desenvolvimento de


coaches, destacando neste primeiro momento o que as
empresas têm buscado para formar e/ou desenvolvê-los.
E é aqui que entra a reflexão sobre a descentralização e os
desafios que ela traz em si, em meio à proposta de uma
gestão mais participativa.

Em um breve apanhado histórico, ao falarmos em des-


centralização na gestão, nos remetemos aos princípios da
Escola Neoclássica da Administração, que apresentou pre-
missas enfatizando uma prática administrativa mais efi-
ciente e eficaz.

Dentre os principais aspectos que visam a uma melhor


prática, está a descentralização, que pode ser caracteriza-
da como uma pulverização das decisões aos níveis mais Cabendo aqui uma
janela, quando
baixos da organização. destacamos o
termo “baixos”,
não estamos
Em outras palavras, a descentralização pode ser compre- propondo um
sentido pejorativo,
endida como a distribuição da autoridade ao nível mais mas, sim, uma
próximo possível da ação a ser tomada. Assim, o poder de visão hierárquica
da estrutura
decisão na organização não fica apenas concentrado nas organizacional,
mentes daqueles que concebem a estratégia, mas flui até a na qual os níveis
que possuem
ponta dos dedos daqueles que executam as ações. menor poder de
decisão e maior
responsabilidade
Uma das formas, portanto, que as empresas têm buscado operacional
encontram-se,
para propiciar uma organização do trabalho que desenvol- estruturalmente, na
região de base (ou
va competências e abra espaço para a formação de coaches baixa).
é a descentralização. Com isso, as decisões são tomadas
de maneira mais próxima da região onde os problemas
podem surgir, facilitando, assim, novos caminhos de cor-
reção, o que leva a um estado satisfatório de eficiência e
motivação no trabalho.

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60 A formação de um coach

Todavia, um cuidado que as empresas têm considerado


ao tratar da descentralização está relacionado à falta de
uniformização ou padronização nas ações, o que pode vir
a provocar problemas de comunicação e de competitivi-
dade interna, por exemplo.

No entanto, é possível manter a estabilidade organizacio-


nal enquanto se compartilha o poder de decisão. Ou seja,
é possível manter a ordem e a coesão, mesmo distribuin-
do autoridade aos níveis mais baixos.

Uma forma que as empresas buscam para isso está as-


sociada ao conceito de empowerment, que, traduzido do
inglês, pode ser compreendido como “empoderamento”.
Observe a seguinte metáfora, apresentada por Ulrich:

Se você estivesse saindo para um passeio e um


mosquito pousasse em seu braço, o que você fa-
ria? A abordagem de cima para baixo para garan-
tir que mosquitos não atacassem seria estabelecer
um programa de governo para instruir as pessoas
a evitarem áreas infestadas por mosquitos, usarem
mangas compridas e pesquisar as causas do pro-
blema dos mosquitos. A abordagem do processo
seria reinventar e formular as campanhas de dre-
nagem de áreas alagadas, pulverização e preven-
ção de ataques de mosquitos. A abordagem do
empowerment seria matar o mosquito quando ele
pousasse em seu braço. (ULRICH, 2003)

Essa metáfora apresenta de forma muito prática o concei-


to de empowerment que pode ser aplicado à gestão. Em
vez de estruturar decisões sempre de forma concentra-
da, de cima para baixo, seguindo fluxos robustos, rígidos,
formais, entre outras características, a solução pode vir
exatamente de quem está de frente para a ação e para o

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Estratégias corporativas para formação de coaches 61

problema que se apresenta, de forma livre, direta, eficien-


te e eficaz.

Falar em empoderamento para proporcionar um ambiente


de autonomia é falar em uma ação que prepare a empresa
para desenvolver as potencialidades das pessoas por meio
da distribuição de poder, da delegação da autoridade, do
compartilhamento da responsabilidade, de maneira que
haja uma relação mútua de confiança entre as equipes e os
departamentos.

Uma consequência da aplicação do empowerment é


a mobilização das pessoas para que elas atuem com
mais autonomia, autoridade e responsabilidade,
utilizando suas habilidades e seus conhecimentos.
Além disso, é uma mudança na própria forma pela
qual o indivíduo se relaciona com o trabalho, auxi-
liando-o no seu desenvolvimento e amadurecimen-
to para com a tomada de decisão e preparando-o
para decisões futuras que envolvam maior nível de
risco. (OLIVEIRA e RODRIGUEZ Y RODRIGUEZ, 2004,
p. 3827)

Assim, podemos compreender os primeiros passos que


as empresas dão rumo ao desenvolvimento de pessoas, o
que facilita em muito o ambiente organizacional para que
sejam implementados programas e ações de formação de
coaches, justamente para atender à demanda.

Vejamos, ainda, outras formas que as empresas adotam


para preparar seus coaches, a partir da uma gestão descen-
tralizada e do empowerment.

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62 A formação de um coach

A empresa e a formação da cultura


do aprendizado
Para que uma organização adote ações de forma coerente
e abrangente, é preciso que haja um pensamento coletivo
único, que perpasse todas as áreas e crie uma única identi-
dade empresarial, não importando a área de conhecimen-
to, o tamanho setorial ou o nível hierárquico.

A existência desse pensamento único tem sua origem no


sistema de valores que é compartilhado por cada membro
da empresa. Tais valores significam os princípios de ação
que são compartilhados por cada pessoa na organização,
isto é, os pilares que fazem uma pessoa decidir por deter-
minada atitude.

Quando os valores essenciais das pessoas encontram re-


percussão umas nas outras, pode-se dizer que há uma
identificação conjunta sobre a forma de pensar e agir, for-
mando-se, assim, a cultura organizacional.

E para que uma empresa invista em uma maneira única


de pensar e agir quanto ao desenvolvimento das pessoas,
ao espaço de autonomia e compartilhamento de decisão, é
preciso que um dos valores essenciais seja o aprendizado.
Pessoas que reconhecem em si a necessidade de buscar
constante aperfeiçoamento e desenvolvimento são capa-
zes de buscar melhorias de forma instintiva, o que, uma
vez sendo compartilhado, faz desse pensamento uma cul-
tura organizacional que preza pela busca de formações,
desenvolvimento, aperfeiçoamento.

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Estratégias corporativas para formação de coaches 63

Para compreendermos melhor as características de uma


cultura organizacional, vamos recorrer às observações
apontadas por Robbins (2012) a partir deste ponto, enten-
dendo que servirão de subsídios para uma adequada visão
sobre o que as empresas empreendem quanto à formação
de sua cultura.

Caracterizando a essência de uma cultura organizacional,


é importante que a empresa invista no aspecto da inova-
ção, aumentando o grau de estímulo aos funcionários no
que se refere ao espaço de criação e assunção de riscos.
Até mesmo como consequência dessa inovação, é possível
caracterizar a essência da atenção aos detalhes, proporcio-
nando às pessoas a devida expectativa quanto à precisão
nas análises e detalhamento das ações. Por fim, um último
destaque que caracteriza a essência de uma cultura refere-
-se ao foco nas pessoas, quando a organização como um
todo, na figura dos gestores, considera o aspecto humano
no momento de tomar decisões e implementar soluções
de ordem processual, levando em conta quais os impactos
que elas podem gerar naqueles que as envolvem.

Há algumas formas pelas quais uma cultura do aprendiza-


do pode ser disseminada e desenvolvida em uma organi-
zação de maneira ética. Vejamos três dos princípios mais
comuns:

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64 A formação de um coach

Princípio Descrição
Os funcionários observam
o comportamento dos ges-
Modelo de compor-
tores como um ponto de
tamento visível
referência para o seu pró-
prio comportamento.
A conduta e as formas de agir
devem conter os valores essen-
Comunicação de expectativas ciais da organização, deixando
claros os limites de respeito
mútuo entre as pessoas.
Ações por meio da organiza-
ção de seminários, workshops,
Treinamento e outros modelos que pos-
sam fortalecer os padrões
de conduta desejáveis.
Fonte: ROBBINS, S. P.; SOBRAL, F., 2012, p. 515.

Esses princípios éticos podem ser diretamente aplicados


à formação de uma cultura do aprendizado, apresentan-
do modelos de comportamento que podem ser seguidos,
comunicando as expectativas gerais e proporcionando for-
mas de ensaio de ações.

Ainda quanto à formação de uma cultura de aprendizado,


convém destacar que as empresas adotam estratégias que
podem favorecer um clima positivo, incentivador, a partir
de premissas como estas a seguir:

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Estratégias corporativas para formação de coaches 65

Premissa Descrição
Muitas práticas do compor-
tamento organizacional e de
gestão estão preocupadas em
como resolver os problemas
Considerar o potencial do do funcionário. Embora uma
funcionário como base cultura organizacional positiva
não ignore os problemas, ela na
verdade enfatiza que se mostre
aos trabalhadores como eles
podem explorar seu potencial.
Embora a maioria das organi-
zações esteja suficientemente
focada em recompensas extrín-
Recompensar mais secas, como a remuneração e
do que punir as promoções, elas frequente-
mente se esquecem do poder
das recompensas menores (e
mais baratas), como o elogio.
Uma cultura organizacional
positiva não enfatiza apenas a
eficácia organizacional, mas o
Privilegiar a vitalida-
crescimento individual tam-
de e o crescimento
bém. Os funcionários não po-
dem se perceber como meras
ferramentas para a organização.
Fonte: ROBBINS, S. P.; SOBRAL, F., 2012, p. 515-516.

Assim, portanto, com as contribuições de Robbins (2012),


compreendemos como as empresas estão agindo para in-
centivar, desenvolver e manter uma cultura que vise ao
compartilhamento de valores como o aprendizado, na bus-
ca por melhoria contínua de desempenho.

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66 A formação de um coach

A empresa e a visão de pessoas como talentos


Outra forma com que as empresas buscam proporcionar
um ambiente propício para a formação de coaches está as-
sociada ao conceito de retenção de talentos.

Antes, porém, de tratarmos diretamente da retenção de


talentos, convém buscarmos o entendimento sobre como
as empresas veem (ou deveriam ver) as pessoas, se como
pessoas ou como recursos.

Não vamos tratar este ponto de maneira romântica ou in-


gênua, enfatizando que as organizações adotam a perspec-
tiva de que as pessoas não são recursos, pois a realidade
corporativa rema muitas vezes contra esta maré. O obje-
tivo aqui é colocar em evidência a necessidade de pensar-
mos uma gestão que efetivamente leve em conta a diferen-
ça entre pessoas e recursos. Neste ponto, cabe até mesmo
trazer uma reflexão crítica comum entre acadêmicos, ao
citarmos o termo “recursos humanos”: pessoas são pesso-
as ou recursos?

Obviamente não é nosso intuito responder diretamente


a esta questão, até porque não se trata simplesmente de
uma visão A ou B, mas sim de uma crítica sobre todo um
sistema de relações e interações que proporcionam a pers-
pectiva sobre pessoas e sobre recursos, ou sobre ambos.
Esta, no entanto, é uma reflexão que, minimamente, provo-
ca pensamentos relevantes a respeito da forma com que a
gestão é praticada e seus respectivos impactos e conside-
rações em relação ao aspecto humano do trabalho, que já
foi suficientemente tratado anteriormente.

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Estratégias corporativas para formação de coaches 67

De fato, o que importa neste momento é evidenciarmos a


diferença de visão quando nos referimos às pessoas den-
tro das organizações. Ao considerar pessoas como pessoas
ou como recursos, a empresa adota posturas estratégicas
bem distintas e que levarão, consequentemente, a resul-
tados também distintos — e muitas vezes não desejados.

Um relevante apontamento que convém fazer: quando a


organização adota a perspectiva de pessoas como recur-
sos, refere-se ao caráter da institucionalização de regras
e procedimentos, fazendo com que a empresa ganhe uma
personificação de suas próprias normativas, não impor-
tando a mutabilidade do ambiente e quem o compõe.

Nesse sentido, as pessoas são vistas meramente como re-


cursos, como números, que são exploráveis e substituíveis,
sem considerações peculiares e sem restrições quanto à
forma de tratamento. Afinal, recursos não sentem, não
pensam, não opinam, não se prejudicam. Eles são apenas
passíveis de uso e de substituição sempre que houver ne-
cessidade. Recursos possuem capacidades limitadas e pre-
visíveis.

Porém, quando há uma conversão da visão de pessoas


como recursos para a visão de pessoas como efetivamente
pessoas, a postura estratégica muda e em vez da institu-
cionalização há a presença da realização, isto é, da depen-
dência de diversos aspectos mutáveis e inerentes ao ser
humano para se alcançar a efetivação dos procedimentos
e normas pensados.

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68 A formação de um coach

Em outras palavras, quando a organização passa a adotar


a perspectiva de pessoas como pessoas, ela considera que
as pessoas sentem, pensam, opinam, interagem, são im-
previsíveis em grande parte de sua constituição e, devido a
essas características, podem mudar a realização dos resul-
tados. Pessoas, portanto, possuem potencialidades.

Por isso, elas são partes do ativo das organizações que pre-
cisam ser retidas e bem trabalhadas, consideradas em seu
estado in natura, o que torna o desafio maior do que apa-
renta. Daí surge a necessidade de pensarmos o conceito de
retenção de talentos, para que a empresa tenha condições
de prosseguir com suas ações de formação de coaches.

Mas como trabalhar com a qualificação de


pessoas e fazer com que elas permaneçam na
organização? A resposta é simples, mas não
tanto a sua execução: tratando-as como pessoas.

A partir do que foi visto como descentralização e empode-


ramento, trabalhar a retenção de talentos dentro das orga-
nizações significa atribuir aos gestores de cada área da em-
presa a responsabilidade de desenvolver a expectativa de
permanência e de utilidade das pessoas em suas equipes.

Além disso, é preciso investir em planos de carreira e mé-


todos de identificação e desenvolvimento de competências
de maneira a proporcionar um ambiente que seja um ce-
leiro de profissionais e que desperte em cada um deles a
expectativa de crescimento e autoconstituição.

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Estratégias corporativas para formação de coaches 69

Reter talentos, acima de tudo, significa organizar o traba-


lho de forma que haja harmonia entre o que se chama de
vida pessoal e vida profissional.

Lombardo (2013) destaca alguns dos principais fatores


de desmotivação em ambientes que não administram de
maneira adequada os elementos de retenção de talentos e
desenvolvimento de pessoas. A saber:

De forma geral, a desmotivação nas organizações


é causada por cinco fatores comuns, cujos efeitos
podem se somar, acelerando a perda ou fuga de ta-
lentos: (1) esforços desconectados – gerados pela
inapropriada definição e distribuição de cargos e
tarefas, ou pela falta de clareza nas regras funcio-
nais; (2) perversidade do sistema – que se manifesta
de maneira evidente quando o sofrimento no traba-
lho causado por superiores hierárquicos e/ou co-
legas é gerador de doenças físicas ou psicológicas;
(3) falhas na comunicação – que ocorrem quando
os profissionais não se comunicam com clareza ou
presteza; (4) centralização das tarefas – que gera
sobrecarga de trabalho para alguns, favorecendo
atitudes de inércia e preguiça por parte de outros;
(5) injustiça nos procedimentos – que se manifesta
ao adotar um tratamento diferenciado, injusto, an-
tiético ou manipulador, que afeta a transparência
e eficiência das regras ou políticas institucionais.
(LOMBARDO, 2013, p. 20-21)

Nessa ótica, a formação de coaches terá grandes potenciali-


dades na medida em que a organização criar um ambiente
favorável não apenas ao aprendizado, mas também à va-
lorização das qualidades individuais de cada trabalhador,
que terá condições de desenvolver a si mesmo e, conse-
quentemente, à própria organização.

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70 A formação de um coach

Já tocamos, anteriormente, em aspectos que envolviam a compre-


ensão do intuito da gestão no que se refere à gestão de pessoas.

Trazendo, mais uma vez, uma perspectiva crítica, convém evi-


denciar que é preciso enxergar algumas práticas de gestão como
possíveis ações instrumentais ou essenciais.

As ações instrumentais nos dão a compreensão de que todo o


esforço é parte de um caminho para se alcançar um objetivo; um
instrumento para conquistar o que se deseja de fato. Já as ações
essenciais nos dão a compreensão de que todo o esforço significa
a finalidade, o objetivo central, a razão de se fazer.

Ambos os sentidos têm origem qualitativa, ou seja, não se pode


determinar se a gestão praticada possui um caráter instrumen-
tal ou essencial apenas pela forma de fazer. Contudo, pode haver
indícios de uma gestão que procura valorizar as pessoas apenas
como um instrumento de sedução ou, ao contrário, daquela que,
de fato, valorize as pessoas porque faz disso um mote.

Em síntese, sobre o que as empresas fazem para preparar a for-


mação de coaches, é preciso ter em mente que essas ações po-
dem significar uma prática instrumental, não genuína, apenas até
o limite do alcance dos resultados. E, quiçá, tenhamos o privilégio
de testemunhar ações que de fato signifiquem a valorização das
pessoas de forma constante e perseverante, colhendo os frutos
deste intuito como consequência de uma gestão humanizada.

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Habilidades de coach 71

HABILIDADES DE COACH

Etimologicamente, o termo “habilidade” tem sua origem no


latim habilitate, que significa a capacidade e/ou disposição
que uma pessoa tem para realizar algo. A habilidade está
ligada à destreza, facilidade, perícia, aptidão, capacidade
técnica em desenvolver determinado feito.

Outras implicações do termo “habilidade” o relacionam ao


grau de competência ao realizar uma atividade. Quanto a
esta visão, entretanto, cabe-nos ponderar uma crítica, uma
vez que associar habilidade a competência significa dizer
que são semelhantes. Contudo, como vimos anteriormen-
te, a habilidade compõe a competência, logo, não podem
ser associadas diretamente ao mesmo significado.

Nosso enfoque se dará na compreensão de determinadas


características que devem compor o quadro de capacida-
des de realização de um coach, isto é, o quadro de habili-
dades.

E, para falarmos em habilidades, precisamos compreender


ainda que cada pessoa possui uma determinada forma de
apreender e empreender atitudes. Ou seja, cada pessoa
possui uma determinada forma de inteligência. E a inteli-
gência aqui não é simplesmente a capacidade cognitiva de
raciocinar, mas está ligada ao modo com que uma pessoa
percebe o mundo, apreende e processa informações e exe-
cuta suas ações.

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72 A formação de um coach

Para exemplificarmos, vamos recorrer aos estudos tradi-


cionais da Psicologia sobre a inteligência para apresentar
os sete principais tipos, que foram estudados e apresenta-
dos pelo psicólogo Howard Gardner. A saber:

Inteligência linguística: pessoas que possuem maior facili-


dade de se expressar, tanto na forma oral quanto na forma
escrita. Como característica principal, possuem maior grau
de atenção e sensibilidade de compreensão sobre pontos
de vista diversos.

Inteligência lógica: pessoas que possuem maior facilidade


de memorizar e realizar ações matemáticas, ou facilidade
de lidar com números e eventos exatos. Como característi-
ca principal, possuem maior grau de detalhamento de pro-
blemas a ponto de conseguir resolvê-los aos poucos e com
profundidade.

Inteligência motora: pessoas que possuem maior facili-


dade de se expressar corporalmente e com alto grau de
noção de distância, espaço e profundidade. Como carac-
terística principal, possuem maior grau de controle sobre
o corpo e são capazes de realizar movimentos complexos
com precisão e facilidade.

Inteligência espacial: pessoas que possuem maior facili-


dade de criar, desenhar e imaginar. Como característica
principal, possuem maior grau de criação em geral, com
sensibilidade suficiente para desenvolver trabalhos que
envolvem criatividade, como as artes gráficas.

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Habilidades de coach 73

Inteligência musical: pessoas que possuem maior facili-


dade de perceber diferentes sons e identificar diferentes
padrões por meio da audição. Como característica princi-
pal, possuem maior grau de harmonização e de percepção
sonora, sendo capazes de enxergar novas possibilidades
pela captação de frequências.

Inteligência interpessoal: pessoas que possuem maior fa-


cilidade de se relacionar com outras pessoas e de mobili-
zá-las. Como característica principal, possuem maior grau
de praticidade, atividade e admiração, sendo capazes de
assumir a liderança em grupos justamente pela admiração
que causam e pela facilidade de comunicação.

Inteligência intrapessoal: pessoas que possuem maior fa-


cilidade de compreender como as pessoas pensam, sentem
e desejam. Como característica principal, possuem maior
grau de concentração e discrição, causando admiração pela
sabedoria aparente e pela capacidade de domínio próprio.

A partir da compreensão desses diversos tipos de inteligên-


cia, é possível observar que todos nós podemos ter algumas
de suas características, ou até mesmo todas elas, no entan-
to, sendo um dos tipos o mais latente em determinadas
situações. Isso nos diz muito sobre as formas com que re-
alizamos nossas atividades e, consequentemente, quais as
tendências de desenvolvermos determinadas habilidades.

Para um coach, algumas habilidades são necessárias na


medida em que a sua função demanda determinados per-
fis de ação. Porém, cada situação demandará determinadas
habilidades, pois, como vimos, o contexto muda, as pesso-
as mudam, logo, as habilidades também poderão mudar.

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74 A formação de um coach

Para Chiavenato (2002), as habilidades necessárias a um


coach podem ser divididas em um modelo de habilidades
pessoais e em um modelo de habilidades interpessoais. Ve-
jamos as respectivas descrições:

Habilidades pessoais
Tipo de habilidade Descrição
Integridade, autoconheci-
Habilidades de caráter mento, sensitividade, equi-
líbrio pessoal, valores.
Interconexão com as pesso-
as, diálogo, inclusão social,
Habilidades relacionais
consenso, solução colabo-
rativa, busca de acordos.
Transformação de conflitos em
oportunidades de honestidade
Habilidades de mediação
e empatia, valorização da diver-
sidade, inteligência emocional.
Compreensão, imagina-
ção, intuição, julgamento,
Habilidades de sabedoria inovação, raciocínio crítico,
resolução de problemas,
planejamento estratégico.
Motivação a agir, envolvi-
mento de outras pessoas,
Habilidades conclusivas construção de coalizões,
inspiração de paixão, atribui-
ção de empoderamento.
Dedicação, responsabilidade,
autocorreção, preocupação
Habilidades de ação
com a qualidade, compro-
misso, perseverança.

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Habilidades de coach 75

Habilidades interpessoais
Tipo de habilidade Descrição
Necessidade de ganhar po-
der e influência para atribuir
Ganhar poder e influência
empoderamento a outras
pessoas sob sua orientação.
Necessidade de saber ouvir
as pessoas, facilitar a co-
Comunicar para pro-
municação e entender seus
porcionar apoio
problemas e pontos de vista a
fim de orientar e aconselhar.
Necessidade de diagnosticar
o desempenho das pessoas,
Motivar as pessoas criar um ambiente agradável
e motivador e recompen-
sar o bom desempenho.
Necessidade de identificar
causas e origens de possíveis
conflitos na equipe, escolher
Administrar conflitos
estratégias adequadas para
resolvê-los e administrar
possíveis confrontações.
Fonte: CHIAVENATO, 2002, p. 93-96.

A partir desses destaques, é possível ter uma noção do per-


fil de ação necessário ao coach, de forma que seja possível
lidar com diversas demandas em diferentes situações que
se apresentarem na organização.

De forma geral, podemos evidenciar alguns aspectos que


são necessários ao coach para que seja bem-sucedido em
um processo de coaching, que lhe darão a possibilidade de
desenvolver habilidades afins, de acordo com cada situa-
ção. Vamos destacar mais profundamente cada um deles,
sem uma ordem de hierarquia nas abordagens.

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76 A formação de um coach

O aspecto da persuasão
Pode-se entender por persuasão a capacidade de uma
pessoa mudar ou reforçar opiniões, atitudes ou compor-
tamentos de outros. Esta é uma habilidade fundamental
no que se refere a qualquer tipo de relacionamento. Não
significa, contudo, uma manipulação, apesar de haver uma
linha tênue que separa os dois conceitos. A persuasão é
um processo de reforço para conduzir determinadas situa-
ções a resultados favoráveis para todos os envolvidos, sem
partidarismos.

Para que a persuasão seja adequadamente praticada, al-


guns fatores precisam de destaque: a credibilidade, o de-
nominador comum, as informações de suporte e o profun-
do entendimento das emoções.

Sobre a credibilidade, pode-se dizer que está relacionada


à capacidade que o coach tem de inspirar confiança e de-
monstrar experiência de causa. Isto é, para que a credibi-
lidade se efetive, o coach precisa se comportar de forma
sincera, cumprindo as responsabilidades assumidas, enco-
rajando o diálogo e a construção de novas ideias, priori-
zando o interesse de outras pessoas e sendo honesto, ao
assumir suas próprias falhas. Além disso, é importante
também que endosse sua experiência por meio de ideias
seguras e confiáveis, partindo de pressupostos firmes e
prováveis, que podem vir tanto de experiências vividas
quanto de resultados de pesquisas.

Quanto ao denominador comum, convém que o coach ela-


bore seus objetivos com base em benefícios que serão al-
cançados por todos os envolvidos e não somente por uma

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Habilidades de coach 77

das partes. Para que isso aconteça, é importante que o


coach identifique a situação a ser tratada e conduza aos ca-
minhos de solução de maneira convincente, apresentando
as implicações de todos os lados e os impactos que as ações
a serem tomadas possam proporcionar. Enfatizar a forma
com que os possíveis efeitos negativos podem ser minimi-
zados é um bom caminho para se chegar a um denominador
comum, principalmente ao se motivar o empreendimento
na ação a fim de que seja uma conquista mútua.

Para que a persuasão tenha êxito, é preciso também apre-


sentar evidências de que o caminho tomado possui relevân-
cia e reconhecimento externo. Isto é, fornecer informações
de suporte significa que o coach não apresenta propostas
sem base e desacreditadas, oriundas de pura intuição ou
sensação. É preciso que os caminhos tomados sejam eviden-
ciados por testemunhos ou exemplos de outras pessoas que
tomaram as mesmas ações, assim como apresentar resulta-
dos estatísticos que comprovem a efetividade e a eficácia
das escolhas feitas em outras situações semelhantes.

Por fim, é importante para o coach desenvolver habilida-


des, em termos de persuasão, que tenham um profundo
entendimento sobre as emoções das pessoas. É importante
que, antes de tudo, saiba administrar suas próprias emo-
ções para que tenha condições de administrar as informa-
ções sobre as emoções de outras pessoas. Em sua ação,
lidar com as emoções é saber utilizar descrições vívidas
em sua fala, histórias reais e que sejam exemplos de si-
tuações bem-sucedidas. Uma abordagem que considera o
entendimento sobre as emoções usa linguagem afirmativa,
incentivadora, um discurso afetivo, otimista e íntegro.

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78 A formação de um coach

O aspecto da afetividade
Para desenvolver habilidades que envolvem o lado subje-
tivo, psicológico, emocional, o coach precisa considerar o
aspecto da afetividade em sua relação de coaching.

Falar em afetividade é o mesmo que falar em uma dimen-


são que envolve sentimentos e emoções, em uma relação
dialógica entre estes conceitos. A afetividade parte, então,
da percepção das sensações experimentadas por uma pes-
soa, seja por meio dos sentimentos ou das emoções.

E qual a diferença entre emoções e sentimentos? De acordo


com as teorias do comportamento organizacional, pode-
mos definir a emoção como uma expressão intensa que
é direcionada a algo ou a alguém, cuja causa é atribuída
a um evento específico, pontual, de curta duração, geral-
mente percebida por expressões faciais. Já o sentimento
possui elementos contrários, menos intensos e sem causa
definida, mais abrangentes e de longa duração, geralmente
não sendo possível sua percepção por expressões faciais.

Ao considerar o aspecto da afetividade, o coach passa a de-


senvolver habilidades que identificam a origem das emo-
ções e do estado emocional de seu coachee.

Como fontes de influência nas emoções, podemos citar


algumas, como por exemplo:

Tendência de experimentar
sentimentos e emoções com
mais frequência do que ou-
Personalidade
tras pessoas, diferenciando
também quanto à intensidade
com que experimentam.

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Habilidades de coach 79

Tendência a agir e reagir


de acordo com o período
Dia da semana e hora do dia do dia ou da semana, cuja
origem se dá por questões
fisiológicas ou culturais.
Apesar de estudos científicos
concluírem que o clima tem
baixa influência sobre o estado
emocional das pessoas, a justi-
Clima
ficativa encontrada refere-se à
associação das pessoas sobre
seu estado de humor mediante
o clima experimentado no dia.
Os efeitos do estresse aumen-
tam com o passar do tempo,
Estresse o que faz com que o nível de
tensão e intolerância impacte
negativamente as emoções.
Atividades ligadas ao compor-
tamento físico ou a relações
sociais informais influenciam
Atividades sociais
mais fortemente as emoções de
maneira positiva do que ativi-
dades formais e programadas.
Atributos como idade e gênero
também influenciam de ma-
neira significativa as emoções,
Perfis demográficos
devido às características
peculiares associadas às fases
do ciclo de vida de uma pessoa.
Fonte: ROBBINS, S. P.; SOBRAL, F., 2012, p. 97-99.

A partir dessas evidências, fica mais clara a demanda em


um coach por habilidades que envolvem o aspecto da afeti-
vidade, assim como os benefícios que trabalhar este aspec-
to pode proporcionar no processo de coaching.

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80 A formação de um coach

O aspecto da comunicação
Este aspecto não é um privilégio das habilidades necessá-
rias a um coach, pois está presente com plena necessidade
em qualquer área na qual se efetive o relacionamento in-
terpessoal e trata exatamente da transferência e da com-
preensão de significados entre os envolvidos.

Neste processo de comunicação, é importante destacar


que uma de suas funções, de acordo com as teorias do
comportamento organizacional, está relacionada ao con-
trole do comportamento, de formas múltiplas. Ou seja,
uma função da comunicação é fazer com que as pessoas
ajam conforme devem agir, mediante o significado trans-
mitido por este processo. Aqui, encontramos o elo que nos
une ao processo de coaching e faz com que este aspecto se
apresente como uma necessidade de desenvolvimento de
habilidades do coach.

De forma tradicional, devemos considerar no processo de


comunicação as figuras do emissor e do receptor da mensa-
gem, bem como o canal de comunicação, a codificação e de-
codificação do conteúdo da mensagem, o canal de retorno
sobre a compreensão da mensagem e os ruídos que podem
existir durante o processo. Nesse sentido, a comunicação
pode assumir vias formais, institucionalizadas e regidas por
normativas, ou informais, mais livres e espontâneas.

Além de habilidades que tratem bem dos cuidados no pro-


cesso de comunicação quanto à forma oral, escrita ou físi-
ca, o coaching também precisa tratar bem das barreiras que
podem surgir para que uma boa comunicação se efetive.

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Habilidades de coach 81

Uma dessas barreiras que vale a pena enfatizar é o medo de


se comunicar. Muitas pessoas têm verdadeiro pânico de se
expressar oralmente, por diversos motivos. O que convém
observar é que elas experimentam uma dificuldade muito
grande em verbalizar seus estados emocionais ou suas in-
tenções, o que pode, por exemplo, atrapalhar as oportuni-
dades de comunicação ou distorcer o processo de comuni-
cação quando ele é efetivado. A habilidade de se comunicar
considera esse tipo de obstáculo, buscando compreender
sua origem e lidar com ele de maneira que não cause novos
distúrbios ou traumas, principalmente no que se refere ao
julgamento das ações e falas do coachee, que podem estar
distorcidas por tal barreira.

Por fim, outro entrave conveniente de se destacar é a per-


cepção seletiva. Sempre que há a decodificação de uma
mensagem, o receptor lança expectativas e julgamentos
sobre ela, confrontando essa percepção com suas histórias
passadas, suas motivações e interesses. Se a mensagem de-
codificada provocar uma interpretação que vá contra os in-
teresses pessoais do receptor, há determinadas situações
em que pode ocorrer audição seletiva, isto é, ignorar o que
foi comunicado. Essa barreira demanda uma habilidade no
coach de diferenciar aquilo que não foi entendido daquilo
que foi ignorado, sabendo lidar e tratar cada diagnóstico
de maneira própria e particular. Um coachee que tem re-
sistência em ouvir possui motivos que o fazem agir dessa
forma, muitas vezes representando limitações ainda não
identificadas pelo coach e que devem ser incorporadas no
processo de coaching, buscando alternativas por meio das
potencialidades do coachee.

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82 A formação de um coach

O aspecto da gestão de conflitos


Há ao menos duas formas de se considerar o termo “confli-
to”: uma atribui a ele um significado prejudicial, que deve
ser evitado e eliminado a todo custo devido ao seu caráter
disfuncional; e outra, um significado de oportunidade, que
é inerente ao convívio e necessário para que as potenciali-
dades sejam trabalhadas.

Para o nosso enfoque, vamos assumir a segunda perspec-


tiva: o conflito é algo que pode trazer benefícios, quando
bem trabalhado. Cabe aqui, então, uma janela para dife-
renciarmos conceitualmente um conflito de um confron-
to. O primeiro é algo inerente a um evento no qual o re-
lacionamento visa à construção de caminhos e alcance de
objetivos mútuos, enquanto o segundo é algo prejudicial,
intencional, no qual há o desejo de aniquilação de uma das
partes a fim de que apenas uma delas prevaleça quanto aos
seus interesses, meios e objetivos.

Nessa ótica, ao tratarmos do aspecto da gestão de conflitos


como um fator de habilidade necessária ao coach, estamos
falando de algo que precisa ser compreendido como be-
néfico e de edificação de soluções, potencialização de for-
ças e exploração de oportunidades de melhoria. É preciso,
portanto, que o coach saiba diferenciar uma situação de
conflito de uma de confronto.

Quanto à gestão de conflitos, cabe enfatizar alguns cami-


nhos para trabalhar com este aspecto. O primeiro destaque
é a tática da meta interdependente. Ou seja, a meta estabe-
lecida não pode ser alcançada senão com interação e coo-
peração de ambas as partes envolvidas. Isso promove uma

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Habilidades de coach 83

esfera de interdependência e de superação de diferenças,


transformando-as em oportunidades de complemento de
forças, quando as potencialidades serão mais demandadas
do que em outras situações de equidade.

Outro destaque é a tática quanto à concessão. Ou seja,


cada uma das partes precisa trabalhar a renúncia de de-
terminados elementos que são considerados importantes
a fim de que o objetivo seja alcançado. Com o caminho
da concessão, os envolvidos são obrigados a realizar uma
análise crítica e criteriosa sobre as características que real-
mente poderão colaborar para que o objetivo seja alcança-
do, abrindo mão daquelas que poderão se transformar em
impedimentos ou deficiências.

Por fim, o último destaque quanto às habilidades para se


trabalhar conflitos refere-se à expansão do recurso não
compartilhado. Esse elemento não é tão simples de ser tra-
balhado, pois necessita de uma abordagem mais sociológi-
ca em termos de poder. Muitas situações em que surge um
conflito têm origem na escassez de determinado recurso,
seja ele de qualquer espécie. Aquela parte que não detém o
recurso costuma agir de forma mais arrojada para superar
essa carência. Portanto, compartilhar um recurso que é ne-
cessário para ambas as partes fará com que o conflito seja
transformado em uma oportunidade de construção coleti-
va, de compartilhamento e interdependência, habilidades
estas imprescindíveis durante o processo de coaching.

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84 A formação de um coach

O aspecto da tomada de decisão


Um último aspecto a ser abordado que constitui os ele-
mentos necessários para o desenvolvimento de habilida-
des de um coach refere-se à forma com que ele — coach
— toma decisões.

Para discutirmos este aspecto, vamos “beber as águas” das


teorias do comportamento organizacional mais uma vez,
de forma que seja possível a melhor compreensão e apre-
ensão dos conceitos articulados.

Antes de tudo, toda decisão é baseada em uma percepção,


que está diretamente associada ao processo de comunica-
ção. Portanto, para edificar uma legítima percepção, é pre-
ciso considerar os aspectos citados anteriormente quanto
ao processo de comunicação.

A partir da percepção, é construído um cenário de julga-


mento, pelo qual o tomador de decisão irá empreender
ações de acordo com o que foi percebido. Nesse sentido,
pode-se afirmar que a tomada de decisão leva em conta a
teoria da atribuição, que busca determinar se o comporta-
mento de determinada pessoa possui causa interna ou ex-
terna, isto é, se o comportamento de alguém foi praticado
por intenções ou influência externa.

A partir da atribuição de causa dada a determinado com-


portamento, o processo de decisão tem seu início influen-
ciado pelo julgamento dado à situação. Essa dinâmica é im-
portante de ser compreendida porque as habilidades que
envolvem decisões precisam ser assertivas em seu nível
máximo. Do contrário, as decisões podem gerar grandes
problemas ou agravar uma situação ou característica que
já era deficiente.

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Habilidades de coach 85

Um cuidado que se faz necessário atentar quanto à toma-


da de decisão refere-se à racionalidade limitada, isto é, a
tomada de decisão praticada mediante a simplificação de
informações de suporte, sem o devido aprofundamento
e expansão de outros elementos que podem interferir no
diagnóstico da causa.

Em outras palavras, um dos principais cuidados que o


coach precisa ter ao desenvolver suas habilidades referen-
tes à tomada de decisão refere-se ao processamento de
informações necessárias para compreender e assimilar a
situação. É preciso habilidade para comprovar a percep-
ção, para atribuir adequadamente a causa da situação
apresentada, para aprofundar o conhecimento sobre tudo
o que envolve a situação, a fim de que a decisão possa ir ao
encontro daquilo que realmente se tem como expectativa.

Com esses aspectos de persuasão, afetividade, comunica-


ção, gestão de conflitos e tomada de decisão em mente, o
coach pode buscar o desenvolvimento de habilidades que
certamente poderão trazer benefícios para a execução de
um bom processo de coaching.

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86 A formação de um coach

Quando falamos em demandas de habilidades de um


coach, estamos lidando com características de uma pessoa que
é mutável e instável, que vai se relacionar com outra pessoa mu-
tável e instável, ambas inseridas em uma organização mutável e
instável, que pode apresentar diversos contextos mutáveis e ins-
táveis.

Em outras palavras, falar em traçar um perfil de habilidades de


um coach é o mesmo que recomendar fazer um móvel apenas
com um martelo nas mãos.

Como já abordamos antes, a realidade muda, assim como as pes-


soas. Logo, não é possível atribuir um perfil estático de habilida-
des ou relacionar um número ou estilos de comportamentos para
que um coach se torne um coach.

Todos os aspectos tratados neste tópico se constituem em pos-


sibilidades, em terrenos onde o coach pode se preparar para de-
senvolver habilidades próprias, que serão edificadas à medida
que ele se confronta com a realidade. E a cada nova situação, es-
tas habilidades serão reconsideradas, nestes e em outros aspec-
tos, pois a verdadeira necessidade só será conhecida a partir do
contato com o contexto e com o uso das experiências já adquiri-
das; tudo isso associado à capacidade de lidar com o novo, com o
imprevisto, com o inédito.

Portanto, não é recomendável que as habilidades de um coach


sejam como uma receita de bolo. Pode ser que, mesmo com a
receita nas mãos, o bolo venha a solar.

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Papéis de coach 87

PAPÉIS DE COACH

De forma geral, após os entendimentos sobre as habilida-


des demandadas de um coach, definir o seu papel pode se
tornar um processo dedutivo. Contudo, cabe refletirmos
claramente sobre a diferença entre a habilidade e o papel
de coach.

Como visto antes, a habilidade está ligada à destreza, faci-


lidade, perícia, aptidão, capacidade prática de desenvolver
determinado feito. Já quando falamos em “papel”, estamos
nos referindo a um conjunto de comportamentos espera-
dos atribuído à determinada função.

Em outras palavras, falar em “papel” é pensar naquilo que


se espera de alguém como sua responsabilidade, sua atri-
buição; falar em “habilidade” é pensar na capacidade de
alguém realizar a sua responsabilidade, sua atribuição...
seu papel. Logo, o papel do coach está associado ao seu
objetivo como função, enquanto a habilidade está associa-
da à sua capacidade de cumprir o seu papel.

Para esclarecer ainda mais esta perspectiva, pense na figu-


ra de um homem e seus diversos papéis na vida, como pai,
esposo, filho, irmão, profissional, amigo... Para cada papel
há uma expectativa de comportamento de acordo com sua
posição, função e contexto. Da mesma forma, há determi-
nadas expectativas do coach a partir de sua função dentro
das organizações. E é sobre este papel que vamos nos de-
bruçar a partir de agora.

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88 A formação de um coach

Porém, antes de nos aprofundarmos no papel do coach,


cabem alguns destaques introdutórios.

Em primeiro lugar, é preciso enfatizar que o coach, assim


como qualquer outro trabalhador, continua sendo um ser
humano. Nesse sentido, seu papel de coach é exigido ape-
nas enquanto representante desta função, o que faz dele
uma pessoa que assume outros papéis em outras áreas da
vida, como vimos no parágrafo anterior. Esses diversos pa-
péis podem ocorrer ao mesmo tempo, uma vez que a nossa
vida é única, contudo, com ênfases comportamentais em
momentos diferentes.

A vivência de diversos papéis faz do coach uma pessoa


que pode experimentar conflitos entre seus papéis, pois
os seus valores como pai, por exemplo, podem influenciar
seus valores como esposo, amigo, profissional... como coa-
ch. Portanto, a manifestação de nosso comportamento está
diretamente associada ao papel que desempenhamos no
contexto em que estamos inseridos e que, de fato, pode
expressar conflito. Isto explica, por exemplo, uma situa-
ção em que olhamos para alguém, um colega de trabalho e
dizemos: “Nossa, mas você parecia tão sério... Nunca ima-
ginei que você fosse brincalhão assim.” Isso nada mais é
do que a constatação de comportamento ligados ao papel
profissional e ao papel de amigo, por exemplo. Podemos
observar também o conflito de papéis quando, por exem-
plo, alguém faz brincadeiras em um momento inadequado
de sua vida profissional, ou ainda adota comportamento
rígido e autoritário com a família ou amigos.

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Papéis de coach 89

Este destaque é importante para compreendermos que o


papel do coach é um comportamento esperado enquanto
a pessoa está representando esta função e que não neces-
sariamente ela deva assumir este papel para outros aspec-
tos de sua vida, praticando-os em todo lugar e a qualquer
momento.

Em segundo lugar, e por último, convém enfatizar introdu-


toriamente que o papel é um comportamento esperado na
medida em que ele é percebido. Isto é, aquilo que entende-
mos como sendo nosso papel nada mais é do que a pura
expectativa de percepção de outras pessoas.

Esse destaque é importante para refletirmos que o papel


não significa a autointerpretação, mas, sim, a interpreta-
ção de terceiros. Em outras palavras, o papel do coach não
se resume àquilo que ele mesmo percebe sobre si, mas ao
que outras pessoas esperam e percebem dele.

Portanto, em síntese, o que vamos ressaltar a partir de ago-


ra são determinados comportamentos que a organização
espera de uma pessoa em sua atribuição como coach. E
isso significa que os papéis aqui destacados não se tradu-
zem em um padrão de comportamento pessoal, mas, sim,
de comportamento funcional, considerando todas as pon-
derações que vimos nesta introdução.

Em linhas gerais, podemos evidenciar o papel do coach sob


três dimensões: social, técnica e estratégica.

A dimensão social refere-se ao comportamento esperado


do coach no que tange ao seu relacionamento com outras
pessoas, principalmente com o coachee. Nessa dimensão,

..........................................................................................................
90 A formação de um coach

espera-se que o coach, em sua função, promova o estímulo


e a valorização das capacidades e potencialidades de seu
coachee como pessoa no trabalho.

A dimensão técnica refere-se ao comportamento esperado


do coach no que tange ao seu domínio e habilidade sobre
a área de conhecimento envolvida no processo. Nessa di-
mensão, espera-se que o coach, em sua função, promova
a inovação e a capacitação de seu coachee em relação ao
conteúdo da atividade.

Por fim, a dimensão estratégica refere-se ao comporta-


mento esperado do coach no que tange à sua capacida-
de analítica e de ação. Nessa dimensão, espera-se que o
coach, em sua função, seja capaz de desenvolver um ade-
quado mapeamento da situação, criando mecanismos de
facilitação para que a ação seja empreendida de maneira
bem-sucedida.

Vejamos separadamente cada aspecto desses papéis:

O estímulo como papel social do coach


Entre as décadas de 1920 e 1930, um pesquisador chama-
do Elton Mayo realizou uma experiência em uma fábrica: a
Western Electric Company, que era localizada no bairro de
Hawthorne, em Chicago.

O objetivo de Mayo era pesquisar alguns elementos físicos


que interferiam na produtividade dos trabalhadores. Mayo
empreendeu sua pesquisa especificamente analisando a
influência da luminosidade no ambiente de trabalho, de-
fendendo a tese de que quanto maior a intensidade da luz,

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Papéis de coach 91

maior a capacidade produtiva. O efeito contrário também


seria esperado.

O perfil da fábrica era de produção de componentes telefô-


nicos, e seu objetivo era manter o bem-estar dos trabalha-
dores por meio de recompensas como bons salários e um
ambiente de trabalho satisfatório, em termos físicos. Mas
era necessário conhecer mais sobre como os trabalhadores
produziam e o que os influenciava a entregar mais ou me-
nos. Foi quando surgiu o projeto de pesquisa para medir a
interferência da condição física do ambiente na produção.

A experiência foi realizada em dois grupos de moças que


fabricavam relés. Ambos os grupos foram submetidos às
mesmas condições, em salas separadas. Em um grupo, a
intensidade da luz foi variada no decorrer do processo, en-
quanto no outro a intensidade se mantinha normal. Curio-
samente, em ambos os grupos registrou-se um aumento
na produtividade. Para confirmação, em uma das salas, a
iluminação foi reduzida, mas a produtividade aumentou.
Logo percebeu-se que o fator iluminação não produzia ne-
nhum efeito direto sobre a produtividade, mas sim o fator
psicológico de quem estava trabalhando.

Após algumas fases da pesquisa, em que houve mudanças


no ambiente, na forma de pagamento, no período de des-
canso, entre outras, percebeu-se que o fator de relação so-
cial entre as trabalhadoras influenciava mais na produção
do que as condições físicas a que eram submetidas.

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92 A formação de um coach

Portanto, o que esta experiência apresentou como resulta-


do foi que o estímulo dado ao relacionamento e à capacida-
de individual foi determinante para impactar os resultados
do trabalho.

A partir desse pressuposto, que passou a compor os prin-


cípios da chamada Escola das Relações Humanas, fica claro
que todo trabalhador, quando estimulado psicologicamen-
te quanto ao seu relacionamento e à sua capacidade de
realização individual, tende a render mais no trabalho e a
alcançar melhorias de desempenho.

Este aspecto do papel social tem sua importância a partir


do momento em que o coach assume sua responsabilidade
não apenas em atentar para as ações processuais do coa-
chee, mas em considerar que merecem atenção os elemen-
tos emocionais não planejados e irracionais do comporta-
mento humano.

O coachee dará mais importância ao conteúdo de sua tarefa


do que à realização normativa em si, isto é, do que é obriga-
do a cumprir. Para tanto, ele precisa ser estimulado a inte-
ragir e a investir sua capacidade própria em direção ao con-
teúdo do que ele está realizando, em vez de simplesmente
cumprir ordens e determinações que lhe são impostas.

Neste aspecto do papel social, o coach precisa assumir a


compreensão de que o estímulo sobre o aspecto humano
do coachee proporciona melhores resultados e favorece a
criação de um ambiente de trabalho no qual ele é encora-
jado a agir e a se entregar de forma mais livre, espontânea
e sadia.

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Papéis de coach 93

A valorização como papel social do coach


Outro aspecto do papel social do coach envolve sua valori-
zação e seu reconhecimento. E este aspecto não é apenas
uma ferramenta de estímulo. Mais que isso, trata-se de um
aspecto que favorece o sentido do trabalho, que proporcio-
na a experiência de se sentir útil e integrado, de se sentir
parte de um todo, e não um mero recurso, um apêndice.

As ações de valorização do trabalhador são proposições


que existem desde a Escola das Relações Humanas e vêm
tomando cada vez mais articulações com a organização do
trabalho, principalmente no que se refere ao campo da ges-
tão de pessoas.

Isso porque o trabalho, em essência, sempre foi alvo de


estudos devido à sua importância não apenas para quem o
realiza, mas como um elo fundamental nas questões eco-
nômicas e sociais. Logo, o trabalhador passa a ser uma cha-
ve a partir do momento em que é considerado o principal
ator do trabalho, o agente da mudança.

Valorizar, como parte do papel do coach, significa propor-


cionar uma visão no coachee de que o trabalho não é apenas
uma questão de sobrevivência; não é simplesmente mais um
ato, ou um compromisso penoso. Ao contrário, é proporcio-
nar a visão de que o trabalho é parte constituinte do ser.

Em meio ao papel social, o coach tem o desafio de conside-


rar a relação entre as pessoas como parte preponderante
do processo de melhoria, uma vez que as ações do coachee
e seu sentido de trabalho vão depender de uma validação
social sobre aquilo que ele realiza.

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94 A formação de um coach

Para o coach, a valorização precisa ser um aspecto com-


preendido não somente quanto à materialização de uma
recompensa, mas também como uma simbologia, uma ati-
tude de ordem subjetiva. Nesse sentido, as premissas da
Proposta pelo Psicodinâmica do Trabalho oferecem importantes contri-
psicanalista
buições para se compreender as dimensões da valorização
Christophe Dejours,
é uma disciplina ou reconhecimento.
clínica que busca
compreender a
relação entre o
trabalho e a saúde
Primeiramente, valorizar pode significar constatação, isto
mental e física dos é, atestar que o esforço e o avanço do coachee são fatores
trabalhadores.
de contribuição para a organização. Uma das dificuldades
inerentes às práticas de muitas empresas e gestores está
na implicação de que, uma vez reconhecendo a contribui-
ção do trabalhador para a organização, automaticamente
se está afirmando que há lacunas na organização do tra-
balho, pois a intervenção do trabalhador foi satisfatória.
Por isso, há resistências em determinados contextos em
reconhecer ou valorizar o trabalhador pelo esforço e pela
melhoria alcançada.

Uma segunda dimensão no ato de valorizar pode significar


gratidão, isto é, uma manifestação na qual se coloca em
evidência aquilo que o trabalhador realizou como sendo
digno de mérito.

Por fim, o coach precisa ter em mente que valorizar as ati-


tudes de seu coachee significa realçar o trabalho realizado,
dando-lhe a percepção de utilidade, isto é, uma validação
por terceiros de que suas atitudes possuem relevância e
contribuições efetivas.

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Papéis de coach 95

A inovação como papel técnico do coach


Como o conceito de inovação é bem diverso, dependendo
de sua aplicação, ao tratarmos dele como um aspecto do
papel técnico, estamos, na verdade, enfatizando a respon-
sabilidade do coach em conduzir novas ideias ao coachee.

Nesse caso, a condução do coach no processo de melho-


ria de desempenho do coachee tem a responsabilidade de
favorecer a criação de ideias e soluções ainda não desen-
volvidas.

Como o coach possui pleno conhecimento e domínio amplo


de determinado campo, ele é capaz de reconhecer os cami-
nhos ainda não explorados pelo coachee, que, por meio de
suas potencialidades, descobrirá estes novos caminhos e
experimentará um novo nível em seu desempenho, alcan-
çando, assim, os objetivos predeterminados.

Portanto, quando citamos a inovação como um aspecto do


papel técnico do coach, estamos colocando em evidência a
atribuição que ele tem de causar um profundo impacto de
geração de novos caminhos, novas ideias, novas possibilida-
des por meio de determinada área do conhecimento. Toma-
mos, então, emprestado do campo técnico da inovação as
modalidades de soluções que este conceito pode implicar.

Primeiramente, aplicamos a modalidade da inovação incre-


mental ao sinalizarmos que o coach pode conduzir peque-
nas melhorias no desempenho do coachee. São pequenos
avanços percebidos na maneira de realizar as coisas e que
não alteram de modo significativo o perfil do coachee em
relação à sua forma de atuação.

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96 A formação de um coach

Já a segunda modalidade refere-se à inovação radical, isto é,


quando a condução do coach promove mudanças profundas
e drásticas na maneira do coachee desempenhar suas ações,
construindo, geralmente, um novo paradigma de atuação.

Portanto, neste aspecto do papel técnico do coach, gerar


novas possibilidades é fundamental e desejado, a fim de
que a melhoria efetivamente se manifeste durante o pro-
cesso de coaching. Afinal, toda melhoria de desempenho é
associada ao investimento de capacidade técnica.

A capacitação como papel técnico do coach


Um fator de certa forma decorrente da inovação é a capa-
citação, ou seja, a ação de capacitar.

A cada oportunidade em que o coach conduz a pequenas


melhorias no desempenho do coachee, a pequenas criações
de ideias e soluções, nasce a atribuição de capacitação, que
nada mais é do que favorecer a oportunidade e a condição
contínuas para que o coachee invista em novos aprendi-
zados e, assim, aumente seu grau de capacidade de fazer.

Com o papel da capacitação, o coach tem em suas mãos a


chance de tratar um dos maiores medos de um coachee,
que é a insegurança. Um coachee mais seguro é uma pes-
soa disposta a arriscar mais, a empreender novidades, a
gerenciar a própria carreira.

Dessa forma, a capacitação transforma o desempenho do


coachee em pequenos projetos, isto é, em uma sucessão
de objetivos definidos que terão prazos para ser atingidos,
um após o outro. E a cada conquista de melhoria, o coachee

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Papéis de coach 97

adquire competência para empreender novos projetos, no-


vas melhorias.

A capacitação como papel do coach significa dar ao


coachee uma consciência crítica sobre sucesso e fracasso,
com aprendizados constantes sobre os fatores que favore-
cem um ou outro resultado.

Por meio da capacitação, o coach desenvolve no coachee


algumas dimensões importantes da tomada de decisão e
do incremento de desempenho. E isto é possível tanto pela
experiência quanto pelo aprendizado técnico, em termos
de formação pessoal, proporcionada pela relação com a ca-
pacidade técnica do coach.

Como exemplo, mediante a capacitação, é possível desen-


volver uma rigorosa avaliação de necessidades, a partir da
qual o coachee se vê qualificado a criticar diferentes pers-
pectivas de desempenho e a buscar a identificação daquilo
que realmente é necessário realizar ou alterar.

Pela capacitação também é possível dar à organização a


oportunidade de encontrar quem está disponível, isto é,
transformar o desempenho de um coachee em um ativo
valioso para o alcance dos resultados empresariais.

Por último, outro fator importante é que a capacitação in-


fluencia na atitude do coachee, uma vez que ele se sente
mais seguro e confiante em situações inéditas, se lançando
a uma iniciativa para trabalhar com suas habilidades reco-
nhecidas a fim de sempre buscar o aperfeiçoamento neces-
sário para alcançar resultados desejados, próprios e organi-
zacionais.

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98 A formação de um coach

O mapeamento como papel estratégico do coach


Entrando na última dimensão a ser destacada dos papéis
do coach, trataremos, primeiramente, do aspecto analíti-
co do mapeamento. Este aspecto é de fundamental impor-
tância dentre os papéis do coach por promover uma visão
holística tão apurada quanto seja possível, o que faz dele
um profissional de ampla extensão, com raciocínio abran-
gente, rápido e eficaz.

De fato, o mapeamento significa parte de um papel es-


tratégico no qual a identificação de fatores e elementos
essenciais é determinante para uma análise sistêmica das
situações. Isto é, o mapeamento é como um registro men-
tal dos detalhes de cada parte que envolve os processos
organizacionais, em que são encaixadas as potencialidades
do coachee a fim de transformá-las em propulsores de me-
lhoria e de mudança.

Para um mapeamento adequado, é necessário que o coach


conheça os fluxos de processos envolvidos no relaciona-
mento com seu coachee e associados aos seus objetivos. A
partir do conhecimento destes fluxos, o coach passa a ter o
domínio sobre a sequência e a relação entre as diversas ati-
vidades organizacionais, sendo possível conduzir o coachee
a explorar aquelas que trarão resultados mais satisfatórios.

Para tanto, é preciso que neste mapeamento o coach saiba


mensurar o período de realização das etapas do processo
de coaching, a fim de prever os ciclos de condução e de
possíveis imprevistos que possam ocorrer no decorrer do
processo, que poderão afetar dados e informações relevan-
tes às pessoas envolvidas, alterando, assim, a relação e a
dependência de elementos externos ao processo.

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Papéis de coach 99

Em resumo, o mapeamento como papel do coach implica


um conhecimento geral e detalhado do contexto do pro-
cesso de coaching, principalmente no que se refere ao coa-
chee e seu perfil de atuação, para que haja eficácia no fim
do processo.

Em linhas gerais, alguns critérios se fazem necessários


para que o coach desenvolva bem o papel estratégico por
meio do aspecto de mapeamento.

Critério Descrição
Refere-se à leitura de tudo aquilo
que deve ser registrado e con-
Escopo e elementos siderado, bem como ao grau de
detalhamento exigido para que
os objetivos sejam alcançados.
Refere-se à clareza e à inteligibili-
dade com que as informações são
obtidas e trabalhadas, proporcio-
Compreensibilidade nando melhor capacidade analítica,
tanto na elaboração estratégica
quando na execução das ações
durante o processo de coaching.
Refere-se ao modo de esquema-
tizar e organizar as informações
obtidas a fim de que, no mo-
Modelo de representação mento da análise estratégica, o
mapa mental dos processos e
dos perfis comportamentais seja
acessado com maior facilidade.
Refere-se ao modo de manter ou
de dar continuidade ao processo
Continuidade analítico em meio às etapas do
processo de coaching, a fim de não
investir em caminhos equivocados.
Refere-se à consideração de
dimensões subjetivas que interfe-
rem tanto na análise das situações
Intangibilidade
quanto na execução da alterna-
tiva estratégica e que podem
alterar o resultado das ações.

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100 A formação de um coach

Por fim, o que se espera do conjunto de comportamen-


tos de um coach está relacionado a cada dimensão que foi
destacada, como a social, referindo-se ao comportamento
esperado do coach sobre seu relacionamento com outras
pessoas; a técnica, referindo-se ao comportamento espe-
rado do coach quanto ao seu domínio e habilidade sobre
a área de conhecimento envolvida no processo, e a estra-
tégica, referindo-se ao comportamento esperado do coach
sobre a sua capacidade analítica e de ação.

Muitas vezes, a assunção de um papel nas organizações traz de-


safios muito grandes em termos de subjetividade. Um deles é
não incorporar a responsabilidade por fracassos como se hou-
vesse apenas uma fonte de incapacidade, isto é, si mesmo.

O fracasso faz parte da caminhada, pois a formação da compe-


tência precisa de ensaios e erros até que o desempenho seja
adequadamente desenvolvido no nível esperado. E parte do in-
sucesso vem justamente da organização do trabalho e suas exi-
gências sobre-humanas.

Assim, convém entender que o papel do coach não depende


cem por cento dele mesmo, pois há uma corresponsabilidade
da organização no processo, sem citar ainda a participação do
próprio coachee.

Por isso, importa que o coach entenda o seu papel não como
uma lista de atributos heroicos a serem adquiridos a qualquer
custo, mas, sim, com a noção de responsabilidade de seu ofício
que deve ser assumido com genuína segurança de sentido.

Assumir o papel do coach deve ser um ato de prazer e racionali-


dade, tendo em vista as limitações e oportunidades que a orga-
nização do trabalho possui. Para tanto, usando uma expressão
comum em gestão, o papel do coach deve ser assumido não
como um sacrifício, mas como um empreendimento de ofício.

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Papéis de coach 101

Neste capítulo, vimos as principais estratégias que as em-


presas adotam para desenvolver e formar coaches, apro-
fundando sua compreensão sobre as demandas existentes
para o desenvolvimento de habilidades e do seu papel no
contexto corporativo.

Entendemos que as habilidades necessárias para que al-


guém se torne um coach partem da forma com que uma
pessoa é capaz de apreender e agir, isto é, do tipo de sua
inteligência, passando por formas pessoais e interpes-
soais de realizar determinadas ações. A partir daí, as habi-
lidades podem ser desenvolvidas visando aos papéis que
o coach assume na organização, sempre adotando uma
postura propulsora de melhoria de desempenho e de su-
peração de expectativas.

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102 A formação de um coach

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nistração: clássicas e modernas. São Paulo: Futura, 2003.

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para a redução dos custos e aumento da eficiência ope-
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ching. São Paulo: Ser Mais, 2011.

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belecer e alcançar resultados extraordinários na sua vida
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nal. 14. ed. São Paulo: Prentice-Hall, 2012.

ULRICH, Dave. Os campeões de recursos humanos: ino-


vando para obter os melhores resultados. 8.ed. São Paulo:
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WUNDERLICH, Marcos; SITA, Maurício. Coaching e mento-


ring: foco na excelência. São Paulo: Ser Mais, 2013

..........................................................................................................
104

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Enfoques da atuação do coaching 105

CAPÍTULO 3
O COACHING NA PRÁTICA

Este capítulo trata dos principais aspectos que são neces-


sários à prática do coaching, enfatizando os focos que este
processo pode assumir, bem como as possibilidades de ex-
pansão nas organizações por meio da gestão, até apontar
alguns passos e ferramentas importantes para sua aplica-
ção. Assim, leia com atenção e tente contextualizar suas
experiências pessoais e profissionais com os tópicos apre-
sentados.

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106 O coaching na prática

ENFOQUES DA ATUAÇÃO DO COACHING

Os diferentes tipos e modelos de coaching possuem di-


versas ênfases e expectativas ao serem elaborados e es-
colhidos para determinada aplicação. Isso ocorre porque
o coaching é um processo dependente de objetivos pre-
determinados. Portanto, serão destacados os focos que o
coaching pode assumir e que trarão diferentes resultados,
dadas as suas particularidades.

Cabe ressaltar, primeiramente, que o coaching pode assu-


mir aplicações tanto abrangentes como profundas, sem-
pre dependendo do objetivo que se deseja alcançar. Ape-
sar deste processo se configurar em um relacionamento
coach-coachee, o foco pode extrapolar os objetivos indivi-
duais do coachee, até chegar à organização, por exemplo,
como foi visto detalhadamente nos capítulos anteriores.

Sobre essas possibilidades de abrangência e profundidade,


Chiavenato (2012) apresenta sete possíveis focalizações do
coaching, de acordo com a especificidade de cada abordagem:

Foco Abordagem
Em pessoas Humana e pessoal
Na aprendizagem Educacional e pedagógica
Nas competências Enriquecedora
No desempenho Construtiva
Nos resultados Estratégica
No futuro Proativa e antecipatória
Na liderança renovadora Impulsionadora e energizadora

Fonte: CHIAVENATO, 2012, p. 149.

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Enfoques da atuação do coaching 107

Apesar dessas sete focalizações propostas por Chiavenato


oferecerem boas perspectivas em relação às aplicações do
coaching, a escolha do foco ou perspectiva adotada levará
sempre em consideração alguns elementos, como aprendi-
zagem, competências, desempenho, entre outros. Isso sig-
nifica que, ao falar na focalização do coaching, é necessário
mais do que enfatizar os elementos constituintes do pro-
cesso, mas ter em mente qual segmento se deseja atingir,
isto é, qual o nicho.

Torii (2013) destaca que os nichos mais conhecidos e tra-


balhados em coaching são, por exemplo, coaching de vida,
o coaching executivo, o líder coach, o coaching de carreira,
o coaching organizacional e o coaching de finanças.

Esses tipos de coaching têm origem em algumas demandas


de mercado, como cita a mesma autora (TORII, 2013, p. 93):

• Estudantes que ainda não sabem que faculdade


ou profissão seguir.

• Profissionais liberais que querem alavancar seus


negócios.

• Pessoas que necessitam desenvolver habilidades


e competências.

• Pessoas que necessitam fazer planejamentos para


atingir metas pessoais e profissionais.

• Pessoas que querem aumentar seus rendimentos.

Essas oportunidades esclarecem tanto o possível mercado


no qual o coach pretende atuar como também apresentam

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108 O coaching na prática

enfoques que o coaching pode assumir em suas aplicações.


Portanto, quando falamos na focalização do coaching, esta-
mos indo além de citar os possíveis modelos a serem execu-
tados; estamos evidenciando as dimensões que traduzem
os objetivos a serem alcançados com este processo. Nesse
sentido, vamos adotar aqui três dimensões básicas da foca-
lização do coaching: a pessoal, a social e a ambiental.

Quanto à dimensão pessoal, o coaching é implementado


para atender ao desenvolvimento do coachee em si, sem
considerar de forma direta as relações que ele construirá
e o ambiente em que estará inserido. Os objetivos deste
foco estão no próprio coachee, na melhoria de desempe-
nho para atender expectativas próprias.

Quanto à dimensão social, o coaching é implementado


para atender ao desenvolvimento do coachee com vistas à
sua construção de relacionamentos, não considerando de
forma direta o ambiente em que está inserido. Os objetivos
deste foco estão na relação social que o coachee deseja
efetivar a partir de suas potencialidades, seja visando aos
resultados pessoais ou aos profissionais.

Já quanto à dimensão ambiental, o coaching é implementa-


do para atender ao desenvolvimento do coachee aplicado
ao ambiente em que está inserido, de maneira a alterar di-
retamente o ambiente de acordo com suas potencialidades.
Os objetivos deste foco estão na mudança do ambiente no
qual o coachee está inserido, que será implementada a par-
tir do desenvolvimento próprio aliado à sua capacidade de
relação social.

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Enfoques da atuação do coaching 109

Em síntese, a focalização do coaching possui vínculos espi-


rais, isto é, começando com o foco na melhoria individual,
que pode se estender às melhorias nas relações sociais até
extrapolar no foco da mudança ambiental, mediante as
melhorias implementadas no indivíduo e em suas relações
sociais.

PESSOAL

SOCIAL

AMBIENTAL

A dimensão pessoal como foco do coaching


A primeira dimensão na qual o coaching pode focar refere-
-se às expectativas individuais que o coachee assume me-
diante a visão de si mesmo. E este é um primeiro elemento
essencial: ter visão.

Como o coach é demandado pelo coachee, o processo só


terá sucesso mediante a visão que este coachee tem de si
mesmo e do novo patamar ao qual deseja chegar. Logo, o
essencial quando o foco é adotado é que o coachee tenha
em mente os objetivos e metas que deseja alcançar.

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110 O coaching na prática

Cabe ressaltar que diferem-se aqui os conceitos de “objeti-


vo” e “meta” na seguinte perspectiva:

• Objetivo: é um resultado esperado no aspecto


qualitativo.

• Meta: é um resultado esperado no aspecto


quantitativo.

Como exemplo, um coachee pode estabelecer para si o obje-


tivo de ser mais organizado, o que pode ser considerado um
objetivo. Porém, estabelecer ser mais organizado dentro de
um mês, pode ser considerado uma meta.

De maneira geral, o coaching é baseado em metas, dado que é


um processo planejado e consciente. Os objetivos são o norte
para a definição das respectivas metas a serem alcançadas
em conjunto pelo coach e pelo coachee.

A dimensão pessoal do foco em coaching, então, refere-se aos


objetivos e metas que o coachee estabelece para si mesmo,
buscando melhorias de desempenho em determinadas áre-
as de sua vida pessoal. Alguns tipos de coaching podem ser
executados para atender a demandas como esta, ainda que
sejam propostas dentro do ambiente corporativo. De acor-
do com o raciocínio que estamos desenvolvendo, o foco na
dimensão pessoal busca resultados sobre a própria pessoa.

Como já vimos, o primeiro passo para se trabalhar um pro-


cesso de coaching na dimensão pessoal é explorar a visão
do coachee sobre si mesmo. É de extrema importância que
o coachee esteja disposto a sair de sua zona de conforto,

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Enfoques da atuação do coaching 111

de se autocriticar e de se lançar ao empreendimento de


uma nova perspectiva, sem receio de fracassar ou errar,
mas disposto a tomar a iniciativa de buscar um novo “eu”
que foi projetado para um momento futuro.

Nessa dimensão, uma das principais considerações deve


referir-se às ações limitantes, isto é, aos paradigmas que
foram formados com o passar do tempo e que delimitam
o avanço em áreas diversas da vida do coachee. Tais ações
limitantes podem, muitas vezes, manifestar-se como rea-
ções defensivas a um momento novo, apoiando-se em pre-
conceitos ou julgamentos procedidos por outras pessoas,
caindo-se na armadilha da generalização. Ou seja, traba-
lhar a dimensão pessoal parte do fato de que o coachee
não é simplesmente mais um, mas alguém com potencial
para avançar em aspectos da vida em que deseja ter me-
lhor performance.

Um exemplo de processo de coaching focalizado na dimen-


são pessoal é o coaching de carreira. Contudo, pode surgir
a seguinte dúvida: uma vez falando em carreira, a dimen-
são continua sendo pessoal? Isto não envolve a empresa?

A resposta é sim e não. Apesar de o coaching de carreira


ser direcionado a um lado da vida que envolve resultados
na empresa, ele continua tendo um foco pessoal. Isto é, o
coaching de carreira é um processo na dimensão pessoal
porque trabalha objetivos e metas da pessoa que deseja
melhorar seu desempenho profissional, com vistas a resul-
tados essencialmente pessoais e não organizacionais.

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112 O coaching na prática

Para tanto, Mastropascha (2013), destacando alguns ele-


mentos do que é conhecido por “carreira inteligente”, co-
menta sobre três questões básicas que um coachee deve
considerar ao empreender um coaching de carreira:

1. Por que você trabalha? A resposta deve basear-se


em sua identificação com o que faz e em seu grau de
motivação para realizar as atividades.

2. Como você trabalha? Aqui entra a análise de suas


experiências e de seus conhecimentos técnicos em re-
lação ao desempenho de suas atividades profissionais.

3. Com quem você trabalha? Considere seus colegas


e as outras pessoas que compõem sua rede de rela-
cionamentos (MASTROPASCHA, 2013, p. 141).

A mesma autora enfatiza ainda que, para empreender um


processo de coaching focalizado na dimensão pessoal,
como a carreira, por exemplo, é necessário trabalhar no
coachee alguns princípios como:
• O entendimento de seus valores: trabalhar satis-
fazendo valores importantes nos traz motivação, re-
sultando em sucesso no trabalho e na vida pessoal.

• Avaliar competências, experiências profissionais


e a necessidade de aumentar e diversificar seus co-
nhecimentos: todo profissional que deseja ter uma
carreira inteligente tem que se desenvolver conti-
nuamente, estar atualizado para realizar suas ativi-
dades, mantendo seu nível de empregabilidade com
o passar dos anos.

• Espera-se do profissional: versatilidade, flexibi-


lidade, iniciativa e adaptabilidade. Habilidade para

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Enfoques da atuação do coaching 113

planejar a carreira com visão de futuro, sabendo o


momento certo de mudar o rumo quando o traba-
lho não mais satisfizer seus objetivos profissionais
e pessoais (MASTROPASCHA, 2013, p. 142)

Há diversos outros tipos de coaching que podem exempli-


ficar a focalização na dimensão pessoal. Como exemplo,
há o coaching financeiro, que conduz os objetivos pesso-
ais do coachee a uma melhoria quanto à administração da
área financeira de sua vida, propondo meios para diagnos-
ticar os gastos, sonhar realizações, orçar os gastos futuros
e poupar os recebimentos para alcançar o sonho. Outro
exemplo que pode parecer até curioso para alguns é o coa-
ching de emagrecimento, que conduz o coachee a alcançar
resultados de diminuição progressiva do sobrepeso, com
vistas a uma melhor qualidade de vida, melhor rendimento
profissional e pessoal nas atividades cotidianas, bem como
melhoria na disposição e autoestima.

Todos esses exemplos são focos na dimensão pessoal, que


busca determinados resultados voltados especificamente
para o sujeito que os idealiza, sem envolver diretamente o
relacionamento com outras pessoas e com o ambiente em
que está inserido.

A dimensão social como foco do coaching


A partir das proposições dos tipos de coaching que traba-
lham as expectativas essencialmente individuais, há outra
dimensão que focaliza as melhorias de desempenho não
apenas para o indivíduo em si, mas para as relações que ele
firma com outras pessoas. Trata-se do foco na dimensão
social.

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114 O coaching na prática

Falar sobre esse foco é o mesmo que falar de melhorias


de desempenho no que se refere ao padrão de compor-
tamento que o coachee pode assumir com base em seus
relacionamentos e interações com outras pessoas, tanto no
ambiente corporativo como fora dele.

Nessa dimensão, o coaching busca desenvolver o coachee


em termos de maior responsabilidade e compromisso no
convívio com outras pessoas, geralmente com ênfase nas
relações de trabalho, mas não exclusivamente.

Há de se destacar que, nessa dimensão, o trabalho pelo


coaching proporciona o desenvolvimento do coachee em
si mesmo e em um nível histórico-social, isto é, suas no-
ções de civilidade e respeito alheio são tratadas desde as
características mais particulares até as normas de convívio
estabelecidas ao longo da história e a cultura do local onde
ele está inserido.

Nessa dimensão é comum haver determinadas reflexões


críticas quanto a algumas práticas que eram adotadas des-
de a infância e que ajudaram a construir o pensamento
e a conduta na vida adulta. Da mesma forma com que se
deve considerar a mudança no ambiente global em relação
ao modo de proceder da empresa, o processo de coaching
proporciona uma mudança no modo de agir do coachee de
acordo com as transformações na própria sociedade.

Quanto ao modo de proceder em relação às outras pes-


soas, Assis (2013) enfatiza a relação do coachee consigo
mesmo antes de investir em qualquer melhoria de desem-
penho que envolva outras pessoas. Isso corrobora o nosso

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Enfoques da atuação do coaching 115

destaque feito anteriormente, no aspecto das dimensões


seguirem um sentido espiral. Destaca Assis que:

O indivíduo para ser conhecedor dos seus limites,


saber até onde pode ir e atuar no cenário que parti-
cipa, é imprescindível que conheça o seu “eu”, sua
identidade, que deve ser clara para si. Para alcan-
çar este entendimento é necessário que sejam re-
alizados alguns procedimentos de autopercepção.
Um deles é a utilização de questionamentos, cujas
respostas, primordialmente, devem ser objetivas
para não gerar instabilidade conceitual e conseguir
se posicionar, em saber quem é, qual o motivo de
sua existência, o que quer, qual o seu sonho, quais
seus objetivos e quais são seus valores. As respos-
tas servirão como instrumentos balizadores, dando
clareza a respeito do ser, tornando a interação com
o ambiente mais segura para si. (ASSIS, 2013, p. 45)

A partir desse processo de autopercepção, o autor avança


em seu pensamento sobre os primeiros passos para a me-
lhoria de desempenho no que se refere ao envolvimento de
uma vida coletiva.

Ser conhecedor de seus limites, por si, não agrega


valor, mas, se somado ao “ter”, gera a combustão ne-
cessária para o “fazer”. Neste contexto, o “ter” está
relacionado com a disciplina de “ter conhecimento”
e disciplina de “ter ordem”, ambos necessários para
a realização de um ato. E, ao considerar que o conhe-
cimento está para estratégia, assim como a ordem
está para planejamento, objetivamente, a estraté-
gia traduz “o que fazer” e o planejamento “como e
quando fazer”. Logo, a utilização desta combinação
trará clareza quanto ao uso necessária do tempo e
ao do menor custo com maior aproveitamento em
fazer o que, consequentemente, trará ao conjunto
de atos o melhor resultado. (ASSIS, 2013, p. 45-46)

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116 O coaching na prática

Um exemplo que pode ser destacado como foco na dimen-


são social é o coaching para a juventude. Esse tipo repre-
senta um processo focalizado em pessoas que estão na
fase de saída da adolescência até o período de constituição
da independência, geralmente ocorrendo até os 30 anos
de idade.

Esse tipo de coaching baseia-se em questionamentos ao


coachee de forma a fazê-lo refletir sobre si mesmo e re-
pensar sobre o comportamento que precisa ser assumido
nessa fase da vida em que as mudanças, de maneira geral,
ocorrem radicalmente, inclusive quanto às escolhas e rela-
ções profissionais.

Nogueira (2013) propõe para aqueles que optam por me-


lhorias nessa dimensão: “respondam aos questionamen-
tos, repassem para as pessoas com as quais convivem,
juntem-se para desenvolver planos para atingir as metas
que definirem, estipulem prazos” (NOGUEIRA, 2013, p. 37).
A autora sugere ainda algumas atitudes para iniciar esse
processo de maneira que resulte em melhorias no relacio-
namento do coachee com outras pessoas, proporcionando,
por consequência, melhorias em outras esferas.

• ESCREVA as perguntas, respondendo-as e depois


as leia em dias e humores diferentes. O VIVER não é
fixo, estático, igual. Varia, oscila, pode se modificar
a qualquer momento.

• Registre as coisas que mais gosta de fazer. Per-


gunte-se “o quê”? “Como?” Quando?” “Com quem
prefiro fazê-las?” Monte um álbum ou cartaz colan-
do imagens, fotos ou frases que o inspire. Cole em
local onde ficará visível o máximo de vezes possível.

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Enfoques da atuação do coaching 117

• PESQUISE e questione sobre TUDO, antes de to-


mar suas decisões: rótulos que lhe foram impostos,
o passado e histórias daqueles que o orientam ou
rotulam, sua história genética, frases feitas, concei-
tos, diagnósticos, regras sociais, profissões, cargos,
qualidade de vida, sentimentos, crenças, rituais e
amores. (NOGUEIRA, 2013, p. 37)

Outros tipos de coaching que também se aplicam ao foco


na dimensão social são, por exemplo, o coaching de exce-
lência, que busca melhorias de comportamento ao consi-
derar os recursos disponíveis (como objetos de apoio, pes-
soas de confiança, administração do tempo de dedicação,
exemplos a serem seguidos e investimento nas qualidades
pessoais), e o coaching de afetividade, que busca desenvol-
ver o comportamento especificamente para pessoas soltei-
ras, casadas ou que já passaram por algum relacionamento
conturbado.

Todos esses exemplos são focos na dimensão social, que


busca determinados resultados voltados para as relações
e convívios, envolvendo diretamente o contato com outras
pessoas, contudo, não extrapolando diretamente para ob-
jetivos que envolvam o ambiente.

A dimensão ambiental como foco do coaching


Por fim, o último destaque em relação ao foco que o coa-
ching pode assumir repousa sobre a dimensão ambiental.
Aqui, os objetivos do processo referem-se aos impactos
ambientais que as melhorias de desempenho do coachee
podem proporcionar.

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118 O coaching na prática

Quando tratamos do termo “ambiental”, não devemos nos


limitar à perspectiva ecológica, mas sim de ambiente. Ou
seja, na dimensão ambiental, o coaching focaliza um avan-
ço de nível, um novo patamar de desempenho no ambiente
como um todo onde o coachee está inserido.

Para tanto, seguindo o sentido espiral que comentamos, o


coach precisa partir de aspectos individuais do coachee,
passando por suas relações com outras pessoas, até che-
gar ao objetivo desejado no qual essas melhorias impac-
tam o ambiente.

Como já tratamos das mudanças ambientais, não há neces-


sidade de regressarmos a todo o raciocínio que descreve o
que é o ambiente e como as mudanças planejadas podem
ocorrer. Sendo assim, passaremos diretamente às implica-
ções que esse foco pode assumir quando o coaching é exe-
cutado com esses objetivos.

Um tipo de processo que pode exemplificar o foco na di-


mensão ambiental é o coaching em unidades de saúde,
com vistas, por exemplo, à gestão de leitos. Este tipo de
coaching busca um melhor desempenho em relação à es-
trutura dos serviços de saúde, promovendo melhor quali-
dade nos atendimentos e melhor gestão dos recursos. Para
tanto, é necessário trabalhar o profissional de saúde — o
coachee — em relação às suas próprias potencialidades,
aliado a um melhor relacionamento social, a fim de que
essas melhorias impactem nos serviços de saúde, que são
o foco do processo.

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Enfoques da atuação do coaching 119

Silva (2013) destaca que esse foco por meio do processo


de coaching traz benefícios para o ambiente no que se re-
fere à maior rotatividade de leitos ocupados, aumento na
qualidade durante a permanência do paciente no leito, me-
lhoria na imagem da gestão e aumento na satisfação com
o trabalho.

A autora destaca, ainda, que:

Devido aos resultados desejados na gestão de lei-


tos, a cultura coaching é aplicada no desenvolver
das intervenções no dia a dia, individualmente ou
nos grupos, por meio de perguntas que conduzam
a equipe a movimentar-se e atingir seus resultados.
Gerenciamento de leitos significa buscar a utiliza-
ção dos leitos disponíveis em sua capacidade má-
xima, dentro dos critérios técnicos, visando a di-
minuição da espera no tempo para a internação e
transferências externas.

Frente à média de permanência alta é fundamental


intensificar o trabalho de desospitalização. Para que
seja atingida essa meta, é necessário que as pessoas
sejam bem trabalhadas e os processos estejam ali-
nhados e embasados em uma visão sistêmica. (SIL-
VA, 2013, p. 56)

Esse exemplo pode representar claramente quando o foco


do coaching está relacionado a mudanças no ambien-
te. Pode, ainda, apresentar o sentido espiral do processo
quando começa nas mudanças com o profissional (dimen-
são pessoal), passando pelas mudanças na equipe (dimen-
são social), até se chegar ao objetivo de melhoria de de-
sempenho no ambiente (dimensão ambiental).

Outros tipos de coaching também podem ser enfatizados,


como o coaching de negócios, que busca melhorias no de-

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120 O coaching na prática

sempenho geral da empresa a partir da condução de gesto-


res, e o coaching de vendas, que busca melhorias no desem-
penho de vendas de uma empresa a partir da condução da
melhoria de desempenho do gestor e entre ele e sua equipe.

Com isso, pudemos observar que o foco do coaching não


está apenas nos elementos que o constituem. Independen-
temente da focalização, o processo continua considerando
elementos de desempenho, aprendizagem, competência,
resultados etc. Contudo, o que faz o processo abranger
mais ou menos, assim como aprofundar mais ou menos,
é o foco nas delimitações dos objetivos, que podem ser
pessoais, sociais ou ambientais.

Quando falamos no termo “foco”, nosso imaginário é levado a pensar


em um foco de luz apontado para determinado ponto. Aproprian-
do-nos desse imaginário, é possível descrever o foco da seguinte
maneira: um facho de luz apontado para determinado ponto, no
qual é possível perceber suas delimitações, quando a borda de luz
faz fronteira com os espaços escuros que cercam o foco.

Contudo, apesar de ser nítida a delimitação entre o foco e o en-


torno escuro, quanto mais perto se chega do foco, mais se perce-
be que essa delimitação não é tão nítida assim, pois os fachos de
luz nas bordas vão enfraquecendo à medida que se espalham,
até perderem-se na escuridão do entorno.

Assim também deve ser considerada a focalização no coaching.


Apesar de haver dimensões “nítidas” entre os focos, o processo
nunca deixa de repercutir em outros aspectos, por menor que
seja a interferência.

Em outras palavras, ainda que o foco seja pessoal, o coaching


nunca deixará de repercutir na dimensão social e ambiental, por
menores que sejam os desdobramentos, pois, assim como o fa-
cho de luz, o foco pode existir, mas não é possível medir exa-
tamente onde a limitação da borda se dá. Sabe-se que ela até
existe, mas nunca se sabe exatamente como e onde.

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A expansão do coaching pela gestão 121

A EXPANSÃO DO COACHING PELA GESTÃO

Uma coisa é considerar o processo de coaching como uma


ferramenta pontual, capaz de auxiliar na solução de con-
tingências que surgem no desenrolar das atividades or-
ganizacionais. Outra coisa é considerá-lo como uma peça
agregada, que faz parte dos procedimentos e que auxilia
no desempenho contínuo da organização, em todas as
áreas de atuação.

Ambas as perspectivas são possíveis e legítimas. Porém,


quando se fala de ampliar o contexto de coaching, significa
que ele deixa de ser uma ferramenta para assumir o papel
de uma peça. Nesse caso, o coaching passa a ser um pro-
cesso inerente à estrutura e pode ser considerado como
uma competência organizacional.

Essa ampliação do contexto do coaching é possível a partir


do momento em que a organização adota uma perspectiva
sistêmica de empreendedorismo, ou seja, passa a ir atrás
de oportunidades não exploradas, em uma perspectiva fu-
tura e de longo prazo. Nessa ótica, o coaching passa a ser
um processo que necessita constantemente ser executado
e ampliado a todos os níveis gerenciais, a fim de que todos
estejam frequentemente buscando melhorias de desempe-
nho e propondo novos objetivos.

Para tanto, é necessário que a ampliação do contexto do


coaching tenha origem de cima para baixo, isto é, a par-

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122 O coaching na prática

tir do gestor principal da organização. Nesse sentido, as


premissas para que o contexto de coaching seja ampliado
inspiram-se nos pressupostos de uma das escolas estraté-
gicas, chamada de Escola Empreendedora.

Para compreender, portanto, a estratégia de ampliação do


contexto de coaching, vamos verificar, primeiramente, quais
são os pressupostos da Escola Empreendedora, a fim de ex-
trairmos as principais contribuições que ela pode propor-
cionar à ampliação em destaque neste assunto do capítulo.

A partir dos ponderamentos feitos por Mintzberg (2000),


a Escola Empreendedora inicia uma série sobre a perspec-
tiva descritiva, que considera a formulação da estratégia à
medida que ela se desdobra. Possui uma posição interme-
diária entre prescrição e descrição, com uma principal pre-
missa semelhante à Escola do Design: a de que considera o
executivo principal como o único estrategista. No entanto,
a Escola Empreendedora vai além da simples liderança for-
mal, considerando ainda alguns atributos intangíveis do
líder, como intuição, julgamento, sabedoria, experiência e
critério.

O conceito central dessa escola é a visão criada e expressa


na cabeça do líder principal da organização — estratégia
como perspectiva. Esse processo de formulação estratégica
passa a tomar, assim, um modelo deliberado — no sentido
das linhas gerais — e emergente — no sentido dos detalhes.

A concepção da figura do empreendedor tem sua origem


na economia, a partir da qual o estereótipo possuía um
papel mais limitado, basicamente voltado para a definição

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A expansão do coaching pela gestão 123

de quantidades e de preços como vantagem competitiva,


que em sua concepção mais ampla ficava a cargo do mer-
cado. A partir de Schumpeter (economista natural da Re-
pública Tcheca, que foi precursor das teorias econômicas
contemporâneas que se integram com a Sociologia), o pa-
pel do empreendedor passa a ter uma visão de não mais
daquele que sabe investir o capital ou que inventa um novo
produto, mas sim daquele que possui a ideia do negócio,
empregando os meios de produção de maneira diferente,
apropriada, mas acima de tudo vantajosa.

Para essa escola, o espírito empreendedor é a grande fon-


te de formulação estratégica. O sucesso estratégico da
organização está diretamente ligado à personalidade em-
preendedora do líder principal, que está constantemente
sintonizado com as mudanças ambientais, em atenção a
uma oportunidade favorável. As principais abordagens da
personalidade empreendedora nessa escola são:

• No critério empreendedor: a geração de estraté-


gias é dominada pela busca ativa de novas oportu-
nidades.

• Na organização empreendedora: o poder é cen-


tralizado nas mãos do executivo principal.

• A geração de estratégias na empresa empreen-


dedora: é caracterizada por grandes saltos para a
frente, em face da incerteza.

• O crescimento é a grande meta dominante da or-


ganização empreendedora.

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124 O coaching na prática

À medida que as organizações vão se desenvolvendo, a fi-


gura do empreendedor vai se perdendo, o que o faz assu-
mir um novo papel: desenvolver e articular a visão para a
organização. Essa visão estará baseada em um senso de di-
reção de longo prazo, enraizada na experiência e intuição
do líder, que mantém todo o controle do processo fazendo
com que a estrutura, assim, demande flexibilidade.

É aí que nascem as principais críticas à Escola Empreende-


dora, uma vez que a concepção de líder visionário concede
um risco muito grande na dependência de um único indi-
víduo, bem como na sua substituição. Também há a crítica
sobre a dedicação tão intensa a uma visão individual, o
que pode enrijecer a organização na busca de um único
objetivo. Os atributos do empreendedor são muito subjeti-
vos para serem levados tão à risca, embora a contribuição
dessa escola gire em torno da exploração das oportunida-
des do mercado, típica da figura do estrategista, e que tira
a organização de uma posição demasiadamente defensiva
sobre as ameaças, transformando-a em uma organização
ativa em busca de oportunidades.

Assim, tendo postas as premissas da Escola Empreendedo-


ra, na perspectiva de suas contribuições e críticas, cabem
dois destaques sobre os quais o contexto do coaching pode
ser ampliado nas organizações:

1. O conceito de visão: na Escola Empreendedora,


proporciona uma contribuição significativa para a
ampliação do contexto do coaching. Ao se falar de
elaboração de estratégia, é comum considerar a vi-
são como “ver à frente”. No entanto, com base nas
premissas dessa escola, a ampliação do coaching na

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A expansão do coaching pela gestão 125

organização considera o conceito de que a visão não


pode referir-se apenas à visão de futuro. É preciso
“ver atrás” para compreender de maneira adequada
como a empresa rumou os últimos passos dados,
quais foram as falhas e, principalmente, quais são os
potenciais não explorados no passado e que podem
vir a ser trabalhados no futuro. Outra consideração
a respeito da visão é de que ela não deve ser conce-
bida apenas de cima para baixo, mas de baixo para
cima. Uma metáfora usada nessa escola e que traz
uma melhor compreensão é sobre a visão de uma
floresta, que, vista de cima, assemelha-se a um gran-
de tapete, formoso, harmônico e contínuo. Porém,
quando se olha a mesma floresta com a visão de
baixo para cima, do chão, não se tem a mesma per-
cepção e pode-se compreender melhor não apenas
como se constitui uma floresta, mas como se dá a di-
nâmica da vida dentro dela. Assim também deve ser
a visão para a ampliação do coaching, que considera
o passado e também a base, para que as demandas
sejam mais bem identificadas e as potencialidades
sejam assertivamente estimuladas.

2. A relação entre empreendedorismo e planeja-


mento: outra constatação comum ao se falar de
empreendedorismo é a relação inversa com o plane-
jamento. Diversas pesquisas já realizadas com em-
preendedores mostram que grande parte deles não
se preocupa com a elaboração de planos bem estru-
turados. E esta é uma característica até simples de
ser explicada: visionários tendem a arriscar, intuir,
perceber, e não a planejar e programar ações. No en-
tanto, quando se fala de ampliação do contexto de
coaching, essa relação precisa ser dialógica, isto é,

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126 O coaching na prática

empreendimento e planejamento precisam ser ele-


mentos agregados e que conversam entre si. Para
que o coaching seja considerado um processo-chave
na organização, ele não deve perder o seu caráter
consciente e planejado, ao mesmo tempo em que
deve ser um processo tipicamente visionário. Esse
equilíbrio proporciona um componente essencial
para que as metas planejadas sejam atingidas e para
que o desempenho da empresa se desenvolva de ma-
neira adequada, efetiva e eficaz.

Postas essas considerações introdutórias, vamos às ações


mais comuns para ampliar o contexto de coaching nas or-
ganizações, cujas bases seguem as premissas apresenta-
das sobre visão e planejamento.

A primeira dessas ações parte da visão e do planejamen-


to para a ampliação do coaching em uma direção de cima
para baixo na cadeia escalar da organização.

Coach de Coaches
Para que o coaching possa ser disseminado por toda a
empresa, é preciso que o gestor principal esteja dispos-
to a orientar os demais níveis hierárquicos a tornarem-se
coaches. A partir daí, com o coaching ampliado a cada
nível hierárquico, forma-se uma estrutura de coaches na
qual cada gestor pode ser o coach de outro gestor no nível
abaixo, isto é, coach de coaches, começando pelo gestor
principal.

Essa estratégia de ampliação do contexto do coaching é


fundamental para que em todas as áreas de atuação da
organização haja a filosofia de condução à melhoria de

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A expansão do coaching pela gestão 127

desempenho, sendo o gestor capacitado como coachee a


conduzir outras pessoas no papel de coach.

Em determinados momentos, é possível que a organiza-


ção recorra a um coach externo para orientar os primeiros
passos. Porém, a partir do momento em que a cultura de
ampliação esteja direcionada, o processo passará a ser dis-
seminado e tratado de maneira interna.

Krausz (2007) destaca alguns elementos que representam


indicadores de que a cultura de ampliação do coaching
está presente:

1. A cúpula e os níveis hierárquicos gerenciais pos-


suem uma clara noção do que seja coaching execu-
tivo e empresarial e estão familiarizados com seus
possíveis benefícios.

2. Os membros da cúpula vivenciaram o processo


de coaching e obtiveram um resultado considerado
satisfatório.

3. Os dirigentes e gestores utilizam essa experiência


de aprendizagem como forma de liderar sua equipe
e nos seus relacionamentos com pares, superiores,
fornecedores e clientes.

4. Os níveis gerenciais são estimulados a utilizar os


serviços de coaches externos para avançar na aquisi-
ção/aperfeiçoamento de suas competências de ges-
tão e liderança.

5. A participação num processo de coaching é vista


na organização como um privilégio e uma oportuni-
dade de desenvolvimento.

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128 O coaching na prática

6. A área de RH atua como facilitadora do proces-


so de coaching, fazendo uma rigorosa seleção de
coaches executivos e empresariais externos, de
modo a disponibilizar um pool de profissionais para
atender às demandas dos diferentes níveis da orga-
nização.

7. Os coaches têm a oportunidade de escolher o coa-


ch com o qual trabalharão e, além disso, contar com o
apoio da área de RH para obter informações sobre os
benefícios do coaching e qual sua função dentro da
organização. Esta desenvolve coaches internos para
atuarem junto aos gerentes e supervisores que so-
licitam esse tipo de serviço para si mesmos ou para
membros de suas equipes (KRAUSZ, 2007, p. 179).

Em termos de ação, o coach de coaches precisa conside-


rar determinados aspectos na ampliação do contexto do
coaching, a fim de que a efetivação e os benefícios desse
processo estejam presentes de forma sistêmica.

Essas ações, conforme destaca Chiavenato (2012), referem-


-se aos aspectos de ubiquidade (que significa a capacidade
de estar presente ao mesmo tempo em todos os lugares,
mesmo que seja por meio de representantes formais) e de
conectibilidade (que significa a capacidade de se aliar ou de
se ligar a outras pessoas; neste caso, aos demais coaches).

Para tanto, o autor propõe cinco configurações fundamen-


tais de habilidades necessárias para que essa ampliação do
contexto do coaching seja direcionada de maneira adequa-
da pelo coach de coaches:

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A expansão do coaching pela gestão 129

Habilidade Descrição
Liderar por valores significa
Relacionando integridade
dar força e poder às pesso-
com comportamento: são
as, promover autogestão
as habilidades de liderar
e encorajá-las a se expres-
em função de valores.
sar de várias maneiras.
Isso requer habilidades em
compreender quais necessi-
Ligando mudança com ideias:
dades precisam ser mudadas
são as habilidades em pen-
e como isso deve acontecer.
samento revolucionário.
É o que chamamos de pen-
samento revolucionário.
A inteligência emocional
precisa estar presente durante
crises, conflitos, negocia-
Ligando sentimentos com ções, competição etc., para
balanço: são as habilidades melhorar a capacidade de
em inteligência emocional. autocontrole, autoaprecia-
ção, autogestão, empatia,
relacionamento humano e
colaboração das pessoas.
Os relacionamentos na vida
das organizações colaborativas,
democráticas e autogerencia-
das impõem redes e canais
Ligando as pessoas com as de comunicação natural que
outras: são as habilidades em precisam ser incrementados
construir relacionamentos. para sustentar os processos de
trabalho, garantir unidade entre
as pessoas, refletir valores implí-
citos e explícitos e proporcionar
patamares para a colaboração.
O sucesso organizacional pode
Ligando intenção com re- ser aferido pelos resultados
sultados: são as habilidades que a organização produz e
em ação comprometida. a qualidade de vida no tra-
balho que ela fomenta.
Adaptado de: CHIAVENATO, 2012, p. 154-156.

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130 O coaching na prática

A partir dessas contribuições de Chiavenato, aliadas aos


demais destaques feitos nessa ação sobre o coach de coa-
ches, é possível perceber que há indícios de que a função
gerencial, quanto à ampliação do contexto de coaching,
assume três diferentes papéis que são desempenhados ao
mesmo tempo: gestor, líder e coach.

Gestor-líder-coach
Cada um desses papéis merece uma profunda discussão,
pois não são tão simples a ponto de serem esclarecidos
adequadamente em uma breve sessão. No entanto, para
compreendermos a ampliação do contexto do coaching na
organização, podemos destacar alguns fatores e elementos
que diferenciam essas funções, ao mesmo tempo em que
nos dão subsídios para aplicar os três papéis na função
gerencial.

Antes de tudo, é preciso conceituar cada papel. Como já é


de conhecimento o que significa ser um coach, vamos pon-
derar aqui os papéis de gestor e líder.

Para tanto, convém observar os destaques feitos por Or-


nellas (2013):

Gestão está ligada ao cargo que um profissional ocu-


pa dentro de um sistema. A organização outorga o
poder para um indivíduo realizar os objetivos e re-
sultados esperados. Cabe a ele planejar, organizar
e alocar as competências para esse fim. Os planos
e os controles dão a direção e o caminho da realiza-
ção. Gerenciar está ligado aos aspectos puramente
racionais e objetivos do trabalho. Já liderar está re-
lacionado ao poder outorgado pelo grupo, seja ele
gerente ou não. Líderes olham o subjetivo, o emocio-
nal, tomam decisões baseadas na intuição, feeling e

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A expansão do coaching pela gestão 131

percepções. Sua visão inspira e motiva a todos. Mui-


tas das vezes as pessoas ficam envolvidas, estimu-
lam-se e seguem seus líderes. Estes criam, empre-
endem, atuam em campos novos, por onde outros
nunca passaram. Eles motivam e apoiam o desen-
volvimento de pessoas. (Adaptado de: ORNELLAS,
2013, p. 255)

Mediante tais considerações, fica mais evidente a comple-


xidade da função gerencial ao observarmos os lados ob-
jetivo e subjetivo do trabalho que é preciso desenvolver.
Além disso, quando associamos a proposta de ampliar o
contexto do coaching, não basta ser gestor e líder, mas é
preciso também ser coach.

Entretanto, os papéis podem se tornar mais claros quan-


do direcionamos a cada um deles determinada ênfase, de
acordo com a responsabilidade que a função gerencial as-
sume no cotidiano.

Nesse cenário, é possível adotar um consenso de que o pa-


pel de gestor está mais voltado para o aspecto objetivo da
função, dando mais ênfase à administração dos recursos e
procedimentos com vistas ao alcance de metas; o papel de
líder está mais voltado para o aspecto subjetivo da função,
dando mais ênfase à administração das pessoas e suas re-
lações na organização com vistas a uma maneira adequada
de direcionar o trabalho ao alcance das metas; e o papel de
coach está entre a ênfase aos recursos e às pessoas, sen-
do o meio termo entre os papéis de gestor e líder, devido
ao seu caráter de melhoria de desempenho das pessoas,
contudo, não sendo possível desassociá-las dos recursos a
serem explorados para que essa melhoria se efetive.

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132 O coaching na prática

COACH

SUBJETIVO
OBJETIVO

LÍDER

GESTOR

Esquema dos papéis de Gestor-Líder-Coach (Fonte: elaboração própria).

Essa distribuição de papéis significa, então, que ser coach é


a junção do papel de gestor e do de líder? Não. São papéis
diferentes, aplicados a contextos e objetivos diferentes.

O que essa relação de gestor-líder-coach indica é que a ên-


fase dada entre os lados objetivo e subjetivo do trabalho
será diferente para cada papel exercido. Nesse sentido, as-
sumir o papel de coach para ampliar o contexto de coa-
ching na organização significa uma nova ênfase na função
gerencial, diversa àquela dada até então quanto aos papéis
de gestor e de líder.

Portanto, em síntese, ampliar o contexto de coaching na


organização significa considerar a visão como fator essen-
cial, quando não se deve desassociar o processo conscien-
te de planejamento da ação de empreender melhorias na
organização. E isso pode ser possível por meio de ações,
como por exemplo, a prática de coach de coaches, para am-

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A expansão do coaching pela gestão 133

pliar o coaching de maneira sistêmica às diferentes áreas


de atuação por meio da cadeia escalar, assim como assu-
mir na função gerencial o papel de coach junto aos papéis
de gestor e de líder, para que a ênfase nas melhorias pon-
dere equilibradamente pessoas e recursos.

Ampliar o contexto do coaching na organização não significa


que toda a empresa será um grande e único processo.

Quando citamos que o coaching pode ser uma ferramenta pon-


tual ou uma peça inerente à estrutura, estamos indicando que
o coaching pode ser ampliado como mais uma possibilidade de
melhoria de desempenho, de abrangência maior dentro da or-
ganização do que simplesmente em um momento único quan-
do pode ser aplicado.

O cuidado que se deve ter nessa perspectiva de ampliação é não


tratar o coaching como prioridade sobre outros procedimentos.
Ele é mais um processo facilitador que pode ser agregado a to-
das as áreas e que pode auxiliar no desenvolvimento de melho-
rias de desempenho em todas as esferas da organização.

Principalmente quando se torna mais um papel na função ge-


rencial, esta ampliação deve ser tratada com cautela para não
se tornar um processo rígido e compulsório, sendo institucio-
nalizada na estrutura. Ao contrário, a ampliação do coaching
deve representar uma filosofia que deve fazer parte do cabedal
de conhecimento de todos os gestores, se possível, a fim de ser
acionada sempre que necessário para proporcionar um avanço
no desempenho da organização em meio às instabilidades do
ambiente no qual ela está inserida, inspirando novas posturas de
aprendizado contínuo.

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134 O coaching na prática

PLANEJANDO A PRÁTICA DO COACHING

Para finalizar nossas discussões sobre o processo de


coaching, neste tópico, vamos relacionar alguns pontos im-
portantes para planejar sua saída da teoria para a prática.

Como o nosso enfoque aqui é basicamente descritivo, cabe


destacar, primeiramente, que vamos nos apropriar de cita-
ções de especialistas da área para compreendermos como
se dá a prática do coaching, isto é, a elaboração de uma
agenda, de um plano.

Esse destaque se dá na medida em que o assunto é aborda-


do por diversos profissionais da área de forma clara e ade-
quada, não sendo aqui o nosso objetivo nos apropriarmos
de maneira inconveniente de suas proposições. Ao contrá-
rio, justamente por serem recomendações e considerações
de especialistas, convém referenciarmos nossos destaques
de maneira justa e legítima, como base de nosso enten-
dimento sobre os passos para implementar e gerenciar o
processo de coaching nas organizações.

Uma segunda observação que convém fazer nesta introdu-


ção refere-se à generalização dos conceitos abordados aqui.
Uma vez que não estamos em um programa de formação de
coaches, todos os tópicos destacados representam direcio-
namentos para uma melhor compreensão sobre a prática do
coaching, que devem ser devidamente criticados de acordo
com o contexto e aprofundados em oportunidades futuras,
caso haja o objetivo de atuar nesta área.

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Planejando a prática do coaching 135

Nesse sentido, as considerações feitas não são por si só


plenamente suficientes para que o processo de coaching
seja implementado, mas oferecem base de conhecimento
aceitável para que esse processo seja administrado e consi-
derado dentro da gestão de pessoas.

Feitas as devidas ponderações iniciais, vamos a alguns as-


pectos relevantes quando colocamos o coaching em prática.

A importância de saber ouvir


Como o coaching é um processo que demanda primeira-
mente um conhecimento, tanto da situação como do coa-
chee e seus objetivos, um dos primeiros passos (senão o
primeiro) nesta prática é considerar a importância do ouvir
no dia a dia corporativo.

É comum encontrarmos diversos cursos e dicas sobre como


falar em público, como se comunicar, como persuadir etc.,
sempre na proposição da melhoria na capacidade de falar.
Contudo, pouco se vê quanto ao desenvolvimento da capa-
cidade de ouvir.

Um dos elementos mais presentes e que possui impacto


direto no ato de ouvir alguém está ligado ao quanto esta-
mos dispostos a considerar a visão e a sua opinião, isto é, o
quanto estamos dispostos a não julgar e não decidir super-
ficialmente, preferindo compreender o pensamento alheio.
Isso pode representar um problema até mesmo cultural, o
que não deixa de ser algo importante de ser corrigido.

O ouvir, portanto, está ligado também a um aspecto genuí-


no, e não instrumental. É preciso que o ato de ouvir seja
de fato um momento de atenção e de consideração àquilo

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136 O coaching na prática

que o outro está expondo, deixando de lado algumas inter-


rupções que podem distrair a nossa atenção e corromper o
processo de ouvir, transformando-o em um ato meramente
instrumental, de aparência, para dar ao outro a impressão
de que ele está sendo ouvido.

Ouvir também está ligado a um dos elementos do proces-


so de comunicação, chamado de decodificação, isto é, o
momento em que a mensagem transmitida pelo emissor
é assimilada a fim de que seja guardada da mesma forma
com que ele desejou que fosse transmitida e entendida.

Para um coach, ouvir significa ainda manter um equilíbrio


corporal. É possível que já seja conhecido o velho jargão
popular: “o corpo fala”. Isso quer dizer que ouvir alguém
significa investir todo o seu equilíbrio corporal para que
seu corpo confirme a atenção dada a quem está falando, ao
mesmo tempo em que este corpo se conecta e passa a per-
ceber detalhes corporais de quem está falando, de maneira
que a mensagem seja compreendida até mesmo por meio
de contradições, isto é, perceber pelo corpo aquilo que a
fala não consegue dizer.

É importante que o coach saiba ouvir para não cometer


uma falha muito comum, que é buscar terminar a fala da
pessoa ou interromper tentando adivinhar o que ela ainda
tem a dizer. Isso demonstra um pré-julgamento e não uma
atenção ao que está sendo dito.

Enfim, ouvir não se aprende na formação educacional e nem


surge com o crescimento. É uma habilidade que é apreen-
dida, vem mediante a prática e o investimento na ação. Por
isso, mais importante do que parecer ouvir é saber ouvir.

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Planejando a prática do coaching 137

A importância dos primeiros contatos


Uma das contribuições que o saber ouvir pode trazer para
a prática do coach está associada à inspiração de confian-
ça no coachee.

Toda pessoa que busca ajuda deseja se sentir confiante e


segura com quem representa o caminho para a solução.
Por isso, o ato de ouvir genuinamente também impacta
nas primeiras percepções entre o coach e o coachee, crian-
do um ambiente propício e adequado para que o processo
tenha um início efetivo e satisfatório, com reais possibili-
dades de sucesso.

De acordo com Gabriel e Pádua (2013), muitos erros são


cometidos por coaches logo nos primeiros contatos, o que
cria uma instabilidade na confiança do coachee e já com-
promete o desempenho do processo.

Para os autores, algumas falhas devem ser evitadas na


preparação do coach para os primeiros contatos. Vejamos
alguns destaques:

1. Chegar falando como se tivesse a obrigação de


ter todas as respostas. Temos que lembrar que o
coach é um profissional totalmente diferente do de
marketing, que pergunta antes e na hora apresenta
o produto. Já o coach pergunta o tempo todo.

2. Esquecer, na maioria das vezes, de perguntar o


que o cliente já conhece sobre o assunto e ir dizen-
do o que é coaching.

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138 O coaching na prática

3. Em vez de deixar o cliente dizer como e onde


acredita que o coaching pode ajudá-lo em suas ne-
cessidades, já vai dizendo como. Quem sabe se o
ouvisse primeiro, nesse momento, já conseguisse
identificar as reais necessidades do cliente, que
para ele talvez ainda sejam latentes. Além do que,
esse é um bom momento para saber as suas reais
expectativas com o resultado do processo.

4. O coach, muitas vezes, costuma dar direção para


o coachee como se já soubesse o que é melhor para
ele e se esquece de que nunca se pode dar direção
na vida dos outros quando atuando com o processo
de coaching. É o coachee que tem a total respon-
sabilidade sobre a trajetória a seguir até o destino
desejado. O papel do coach é fazer o coachee refle-
tir que há possibilidades de novas oportunidades,
ampliando sua visão, que podem levá-lo ao mesmo
destino, cortando atalhos para diminuir a distância
com a possibilidade de chegar mais rápido ao seu
estado desejado. (Adaptado de: GABRIEL; PÁDUA,
2013, p. 358-359)

Evitar essas falhas promove também outra dimensão dos


primeiros contatos, que é a formação da visão holística,
isto é, perceber aquilo que o coachee está dizendo dentro
de um todo que é maior do que ele.

Essa dimensão da prática do coaching é importante por-


que é por meio dela que o coach iniciará seu processo de
maneira correta ou não.

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Planejando a prática do coaching 139

Holos, que é a base etimológica grega da palavra “holísti-


ca”, significa “completo”, “inteiro”. Logo, ter visão holísti-
ca sobre o coachee é perceber que ele é uma parte de um
todo, ou seja, aquilo que o coachee é e o que ele deseja ser
representam parte de algo maior em que o coachee pode-
rá se encaixar. Esse é um dos maiores segredos da práti-
ca do coaching, que é conduzir o coachee a um patamar
onde seja encaixado da maneira mais adequada possível,
de acordo com os objetivos definidos e os diagnósticos
realizados.

As técnicas 3DR e IRPC

Ao longo do tempo, muitas técnicas foram elaboradas


para atender às aplicações específicas de determinados
tipos e modelos de coaching. Isso é natural na medida em
que cada necessidade possui demandas específicas e, com
o passar do tempo, surgem ferramentas e técnicas tam-
bém específicas para cada caso.

Algumas técnicas, no entanto, podem ser assumidas em


um caráter mais genérico e podem ser aplicadas pratica-
mente em qualquer início de processo de coaching. Duas
delas são as técnicas 3DR e IRPC, propostas e exploradas
pelo coach Felipe Gomes (2013, p. 209-215).

Primeiramente, a técnica 3DR significa os 3 Ds de “Dedi-


cação”, “Determinação” e “Disciplina” associados ao R de
“Resultados”.

É uma fórmula que pode ser compreendida por:

Dedicação + Determinação + Disciplina = Resultados

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140 O coaching na prática

Essa técnica busca auxiliar a identificação dos aspectos


a serem trabalhados para que o objetivo seja alcançado,
transformando cada dimensão em um elemento quanti-
tativo. Isto é, cada elemento dessa fórmula corresponde a
uma medida de 0% a 100%, demarcada pelo próprio coa-
chee, de forma que o resultado esteja mensurado entre 0%
e 300%, dando, assim, uma perspectiva sobre o quanto fal-
ta para que o objetivo seja atingido e segmentado a cada
elemento.

Quanto à dedicação, o coachee irá definir o quanto de es-


forço próprio estará sendo empreendido sobre aquilo que
ele deseja alcançar.

Quanto à determinação, o coachee irá definir o quão foca-


do ele estará para que seu objetivo seja alcançado.

E quanto à disciplina, o coachee irá definir o quão organi-


zado e fiel ele será para atingir o objetivo esperado.

Esses resultados somados darão uma indicação entre 0% e


300% da medida de probabilidade de alcance do objetivo.

Para compreendermos melhor, vamos recorrer à explica-


ção nas palavras do autor sobre um exemplo genérico:

Por exemplo, seu cliente busca, como meta pessoal,


adquirir um carro novo, então VOCÊ determinará
junto com ele o prazo para que esse objetivo seja
alcançado, utilizando a fórmula acima. VOCÊ pode-
rá usar o seguinte discurso:
Informe o número de 0% a 100% relacionado à sua
dedicação em adquirir esse carro novo;
Agora, informe o número de 0% a 100% relacionado

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Planejando a prática do coaching 141

à sua determinação em adquirir esse carro novo;


Agora, informe o número de 0% a 100% relacionado
à sua disciplina em adquirir esse carro novo.
Suponhamos que ele tenha respondido: 95%, 80%
e 30%, respectivamente. Então, temos 95% + 80% +
30% = 205%.
Veja que, na escala de 0% a 300% que ele poderia
alcançar, faltam 95% como objetivo, sendo 5% rela-
cionados à sua dedicação, 20% relacionados à sua
determinação e 70% relacionados à sua disciplina
em concluir a aquisição do carro novo. Sendo as-
sim, com esses números, nosso trabalho no papel
de coach fica mais claro e objetivo, já que iremos di-
recionar o cliente dentro das técnicas – aprendidas
no curso de formação em coaching – relacionadas a
cada ponto citado, além de auxiliá-lo a focar no que
precisa ser mais trabalhado para que ele alcance,
mais tranquilamente, seu objetivo de adquirir o car-
ro novo. (GOMES, 2013, p. 212-213)

Por fim, após o uso da técnica do 3DR, o planejamento da


prática do coaching precisa considerar também o contexto
que envolverá a condução deste processo, que irá determi-
nar como os próximos passos se darão.

Para tanto, o autor ainda propõe outra técnica chamada de


IRPC, que significa “Identificar”, “Respeitar”, “Preservar” e
“Concluir”. Ela auxilia o coach não apenas a dar seguimen-
to às etapas com o coachee, mas também a analisar outras
oportunidades em que o coaching pode representar um
processo necessário.

O IRPC assume o papel de uma técnica qualitativa, de con-


duta de pensamento, que vai ao encontro da visão holísti-
ca, comentada anteriormente.

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142 O coaching na prática

Nas palavras do autor, usar o IRPC significa:

Identificar as reais necessidades que trouxeram o


cliente até você, ou seja, os porquês e os “para quê”
dessa busca através de uma anamnese1 detalhada e
profunda;

Respeitar tudo o que foi citado de forma ética e


profissional, principalmente no quesito crença, ou
seja, aquilo que ele realmente acredita como verda-
de para si próprio, além de sua crença religiosa, que
acompanha um legado de informações culturais
importantíssimas para o direcionamento de todo o
processo;

Preservar todas as particularidades emocionais


para um melhor rendimento das atividades propos-
tas durante todo o processo;

Concluir – é de nossa responsabilidade como coach


auxiliar de forma íntegra, clara e objetiva o coachee
no processo de coaching, com veracidade nos fatos
abordados aliados à dedicação, à determinação e à
disciplina, apresentando sempre, a cada sessão [en-
contro], os resultados de forma palpável e mensurá-
vel para que o coachee veja sua gradação no passo
a passo, ou seja, sessão por sessão. (GOMES, 2013,
p. 214-215)

Além dessas técnicas, há diversas outras que podem auxi-


liar na iniciação da prática do coaching, tanto no ambiente
corporativo como fora dele.

Contudo, com essas orientações, já será possível passar o


coaching da teoria para a prática, por meio de um planeja-
mento adequado e coerente, que venha a se transformar de
fato em um processo de facilitação na gestão de pessoas.
1
Anamnese, aqui, representa uma conversa profunda e detalhada sobre
os motivos que levaram o coachee a buscar ajuda, não necessariamente
assumindo a formalidade de uma conversa clínica. (N. A.)

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Planejando a prática do coaching 143

Uma última reflexão crítica que merece ser destacada quanto ao


coaching refere-se à profissionalização desta prática.

É importante enfatizar que trabalhar com esse processo, na prá-


tica, significa lidar com uma questão muito séria, que é a mudan-
ça de comportamento das pessoas.

Assim como ocorre em muitas áreas do conhecimento e em di-


versas outras profissões, no campo da gestão, que é multi e inter-
disciplinar, há muitas instituições que prometem a formação e a
capacitação naquele processo. No entanto, há que se considerar
que nem toda formação, por si só, assegura uma competência
profissional efetiva.

O que é importante considerar nesta reflexão é que, para a atua-


ção no coaching, é imprescindível uma preparação consistente e
profunda, evitando o pensamento muito comum de que, a partir
da compreensão de aspectos gerais, como no caso dos aponta-
dos neste material, já é possível atuar plenamente na função.

Os conhecimentos aqui adquiridos e os apontamentos práticos


auxiliam a gestão de pessoas a administrar a organização do tra-
balho de maneira mais adequada, sabendo os caminhos possí-
veis a serem tomados e os impactos que eles podem proporcio-
nar. Contudo, é sempre oportuno agir com cautela ao se praticar
esse processo, para que os resultados não acabem por prejudicar
a vida de pessoas e o contexto do trabalho.

Assim como deve ocorrer em todas as áreas, a partir do conhe-


cimento adquirido nestes apontamentos, sempre é bom buscar
outras fontes de consulta e aprofundar o conhecimento, a fim de
construir uma sólida e reputável carreira profissional.

Neste capítulo, você conheceu os principais aspectos que


precisam ser considerados quando o coaching é aplicado
na prática. Primeiramente, é importante definir qual o
foco dado na aplicação, que pode assumir uma perspec-
tiva da dimensão pessoal, social ou ambiental. De acor-

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144 O coaching na prática

do com esse enfoque, as possibilidades de se expandir o


contexto desse processo por meio da gestão ficam mais
claras, quando se pode assumir estratégias como ser coa-
ch de coaches e agregar à função gerencial o papel de ges-
tor-líder-coach. Por fim, para tirar da teoria e colocar este
processo em prática, é importante considerar elementos
como o saber ouvir e as implicações dos primeiros conta-
tos, usando técnicas como o 3DR e o IRPC para conduzir o
processo de maneira adequada.

.........................................................................................................
145

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verdadeiro coach? In: WUNDERLICH, Marcos; SITA, Maurí-
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..........................................................................................................
148

.........................................................................................................
Implicações do mentoring 149

CAPÍTULO 4
O QUE É MENTORING

Este capítulo trata do conceito e das principais implicações


do processo de mentoring nas organizações, levantando
conceitos complementares que participam dos resultados
desse processo, bem como as principais características
peculiares à formação de um mentor e as aplicações do
papel de coach e de mentor nas empresas. Assim, leia com
atenção e tente contextualizar suas experiências pessoais
e profissionais com os tópicos apresentados.

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150 O que é mentoring

IMPLICAÇÕES DO MENTORING

Os diferentes tipos e modelos de coaching possuem di-


versas ênfases e expectativas ao serem escolhidos e ela-
borados para determinada aplicação. Essas expectativas
repousam muito mais sobre o campo dos resultados, da
melhoria de desempenho em termos de ação.

Porém, há outro processo que se torna mais abrangente,


com uma ênfase no “como” fazer e agir mais do que no
resultado da ação. E, por isso, esse processo se torna mais
profundo no que se refere ao vínculo entre os envolvidos.

Coaching e Mentoring podem, em um primeiro momento,


apresentarem-se muito semelhantes, mas o enfoque de
cada um deles é diferente. O coaching, visto detalhada-
mente nos temas anteriores, é mais específico em termos
de ação e de estratégia. É um processo de facilitação de to-
mada de decisão mediante uma condução estratégica, que
visa ao alcance de determinados objetivos predefinidos e
conhecidos.

Enquanto o coaching se configura como um processo de


condução, o mentoring é um processo de orientação, mas
ambos atendem a uma necessidade em comum: o apren-
dizado.

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Implicações do mentoring 151

Conforme descreve Nunes (2013), o mentoring:

Possui historicidade. Existe desde o início da huma-


nidade. Surge com o desenvolvimento da linguagem
e a necessidade de sobrevivência. Protagonizado
por pessoas experientes, dentro de um modelo for-
mal, ou informal por meio das práticas, nas culturas
e sociedades. A humanidade sobreviveu com o de-
senvolvimento da linguagem. Isso possibilitou a co-
municação e a transferência de conhecimento, por
meio do mentoring informal. (NUNES, 2013, p. 264)

É possível perceber pela fala da autora que o mentoring é


um processo pelo qual pessoas experientes orientam as
menos experientes sobre determinados modos de pensa-
mento e de inspiração de conduta, de saber fazer. Esse
processo pode ocorrer dentro de uma proposta formal,
isto é, conhecida, estruturada, acompanhada, avaliada, ou
por um meio informal, o que é mais natural de ocorrer na
sociedade em si, quando cada pessoa é inspirada por uma
personagem mais experiente que marcou sua vida a partir
de uma forma assumida (ou percebida) de orientação.

Em termos de terminologia, mentoring é uma palavra per-


tencente ao vocabulário inglês, que pode assumir diversas
interpretações. Dentre as mais comuns, podemos enten-
der mentoring como um processo de “tutoria”, “mentoria”,
“aconselhamento”.

Esse processo, aplicado ao campo profissional, significa


que uma pessoa que possui vasta experiência reconhecida
em alguma área do trabalho está disposta a orientar outra
menos experiente, geralmente mais jovem em idade e em
termos de carreira.

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152 O que é mentoring

O mentoring é um processo mais abrangente do que o co-


aching, pois não se volta somente para estratégias de me-
lhoria de desempenho, mas se preocupa com o desenvolvi-
mento geral da pessoa, não apenas em termos específicos
de ação. Para o mentoring, alguém que precisa aprender
necessita não apenas de habilidade e de condução de po-
tencialidades, mas também de amadurecimento, de sabe-
doria para tomar decisões e escolher caminhos. Por isso, o
processo de orientação não se prende apenas a questões
profissionais.

Em termos de fatores no processo, podemos destacar o


seguinte:

Mentor: é a pessoa responsável por orientar o processo


de mentoring; é um mediador do processo que favorece
uma transformação pessoal e profissional no aprendiz em
termos de desenvolvimento de experiências e de amadu-
recimento.

Mentoreado ou Aprendiz: também tratado em algumas


situações como “orientando”, é a pessoa que busca se de-
senvolver a partir das orientações do mentor; é o aprendiz
que se coloca à disposição para absorver os valores e as
experiências do mentor.

Vínculo interpessoal: para que o processo de mentoring se


efetive, naturalmente se faz necessário que haja um víncu-
lo mais forte entre o mentor e o aprendiz, uma vez que se
trata de um processo mais profundo e abrangente, de reco-
nhecimento de valores e de experiências no mentor e que
serão absorvidas com o passar do tempo pelo aprendiz.

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Implicações do mentoring 153

Nível de experiência: o mentoring se configura em um


processo de orientação essencialmente centrado na dife-
rença entre as experiências do mentor e as do aprendiz. A
transferência do conhecimento entre eles presume que o
primeiro possui um perfil pessoal robusto de bagagem de
conhecimentos e experiências, diferentemente do apren-
diz, que possui um perfil neófito.

Cautela: não relacionar diretamente experiência a idade,


pois muitas vezes a experiência transmitida por um men-
tor pode representar uma pessoa jovem orientando uma
de mais idade.

Geralmente, no campo corporativo, o mentoring assume


uma necessidade de aplicação mais voltada para momen-
tos em que um funcionário mais antigo esteja prestes a
deixar a organização e necessita transferir seus conheci-
mentos e experiências para alguém mais novo, que pode-
rá substituí-lo adequadamente. Em uma perspectiva ainda
mais detalhada, o mentoring pode ser mais percebido em
níveis gerenciais, nos quais a tomada de decisão requer
cautela, experiência e sabedoria. Não apenas quanto a um
evento de substituição, mas de assunção de responsabili-
dades, o mentoring pode encontrar espaços para ser exe-
cutado. Em linhas gerais, pode ser aplicado a eventos de
aperfeiçoamento de carreira.

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154 O que é mentoring

Como o mentor representa um ícone a ser reproduzido,


é comum que o processo de mentoring seja aplicado em
um contexto no qual as pessoas envolvidas façam parte do
mesmo ambiente, compartilhando e se identificando uns
com os outros em termos de competências e de contatos
com a mesma realidade.

Nesse sentido, podemos apontar como características e


benefícios do mentoring, de acordo com as indicações do
Escritório de Carreiras21da PUC-RS:

Características:
• Relacionamento one-to-one de longo prazo.
• Processo voluntário.
• Visão abrangente sobre a pessoa e sobre a carreira.
• Centrado nas necessidades do orientando.

Benefícios:
- Para o orientando:
• Melhoria da performance e da produtividade.
• Possibilidade de identificação de oportunidades
de crescimento.
• Desenvolvimento de habilidades e conhecimento.
• Aumento da autoconfiança e do bem-estar.

- Para o mentor:
• Aumento da satisfação e do autoconhecimento.
• Aquisição de novas habilidades.
2
Escritório de Carreiras da PUC-RS. Disponível em: <http://carreiraspu-
crs.com.br/empresas/mentoring/>. Acesso em 25 jun. 2014.

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Implicações do mentoring 155

• Desenvolvimento da capacidade de liderança.


• Fortalecimento de networking.

- Para a empresa:
• Desenvolvimento de seus recursos/líderes.
• Captação de talentos.
• Fortalecimento da marca.
• Delineamento de processos quanto ao Programa
de Mentoria.

Postas as considerações iniciais sobre o mentoring, vamos


nos debruçar mais detidamente sobre outras implicações
deste processo.

A sincronicidade e o mentoring
Como um processo de vínculo interpessoal mais profundo
e vívido, o mentoring assume implicações mais próximas
do lado subjetivo que fazem dele um processo mais efetivo
e produtivo.

Nessa ótica, Lima (2013) evidencia um conceito muito


interessante e apropriado para articular ao processo de
mentoring, que é o de sincronicidade. Ele foi inicialmente
desenvolvido por Carl Gustav Jung, um psiquiatra suíço,
que chegou a uma conclusão sobre a conexão entre acon-
tecimentos que não se explica pela causalidade, mas pela
relação de significados.

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156 O que é mentoring

Ou seja, para Jung, o que liga dois ou mais acontecimentos


pode não ter uma explicação de causa-efeito, geralmente
assumida na perspectiva física e/ou estatística, mas pode
ter uma explicação que foge à natureza exata, mais ligada
ao mesmo tipo de significado entre estes acontecimentos.
Assim, dois eventos podem ter sincronicidade, por exem-
plo, porque são coincidentes devido à forma que represen-
ta o mesmo significado para as pessoas que os vivencia-
ram em algum momento.

Lima (2013) chama a atenção neste ponto porque:

É importante destacar que a sincronicidade difere


da coincidência, uma vez que ela não implica so-
mente na aleatoriedade das circunstâncias, mas
também, e principalmente, num padrão subjacente
ou dinâmico que é expresso por meio de eventos ou
relações significativas. (LIMA, 2013, p. 225)

Em outras palavras, aquilo que é coincidente está relacio-


nado à forma aleatória e aparente dos eventos que estão
se relacionando. A sincronicidade vai além disso, pois está
relacionada ao que está por detrás do aparente, ligado aos
padrões de significados entre esses eventos.

Lima (2013) reproduz dois exemplos para esclarecer me-


lhor esse conceito, que são apresentados originalmente
pelo próprio Jung:

1 - Uma jovem paciente sonhou, em um momento


decisivo de seu tratamento, que lhe presenteavam
com um escaravelho de ouro. Enquanto ela me con-
tava sobre o sonho, eu estava sentado de costas
para a janela fechada. De repente, ouvi detrás de
mim um ruído como se algo golpeasse suavemente

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Implicações do mentoring 157

a janela. Dei meia volta e vi que foi um inseto voa-


dor que chocava contra ela. Abri-a e o apanhei. Era
a analogia mais próxima a um escaravelho de ouro
que se pode encontrar em nossas latitudes, a saber
[...], que, ao que parece, ao contrário de costumes
habituais, se via na necessidade de entrar em uma
sala escura precisamente naquele momento. Tenho
que dizer que não havia ocorrido algo semelhante
nem antes nem depois disso, e que o sonho daque-
la paciente segue sendo um caso único em minha
experiência.

2 - Na manhã do dia 1º de abril de 1949 eu trans-


crevera uma inscrição referente a uma figura que
era metade homem, metade peixe. Ao almoço houve
peixe. Alguém nos lembrou o costume do “Peixe em
Abril” (primeiro de Abril). De tarde, uma antiga pa-
ciente minha, que eu já não via por vários meses, me
mostrou algumas figuras impressionantes de peixe.
De noite, alguém me mostrou uma peça de bordado,
representando um monstro marinho. Na manhã se-
guinte, bem cedo, eu vi uma outra antiga paciente,
que veio me visitar pela primeira vez depois de dez
anos. Na noite anterior ela sonhara com um grande
peixe. Alguns meses depois, ao empregar esta série
em um trabalho maior, e tendo encerrado justamen-
te a sua redação, eu me dirigi a um local à beira
do lago, em frente à minha casa, onde já estivera
diversas vezes, naquela mesma manhã. Dessa vez,
encontrei um peixe morto, de mais ou menos um é
(30cm) de comprimento, sobre a amurada do lago.
Como ninguém pôde estar lá, não tenho ideia de
como o peixe foi parar ali. (LIMA, 2013, p. 225-226)

O que esses exemplos representam, em um primeiro mo-


mento, é uma ligação a respeito de uma justificativa (ou
apenas significado) sobrenatural, o que pode ou não ser re-
futado. No entanto, o que o conceito da sincronicidade traz
à tona é a relação mais do que aleatória entre os eventos,
mas de relação de significado. Os envolvidos reconhecem
uma ligação e uma proximidade com os acontecimentos de

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158 O que é mentoring

acordo com o reconhecimento do significado que eles têm


ou podem assumir.

Logo, o conceito de sincronicidade possui clara proposta


subjetiva ou até mesmo emocional, o que podemos tratar
como sendo afetiva.

A articulação entre este conceito de sincronicidade e o de


mentoring se dá na medida em que o mentor e o aprendiz
desenvolvem uma conexão não aleatória, mas que repro-
duz uma sucessão de experiências e eventos nos quais am-
bos se identificam e estabelecem significados em comum.

Ou seja, a sincronicidade encontra relações com o proces-


so de mentoring na medida em que as experiências que
o mentor detém possuem um significado subjacente para
o aprendiz, assim como a posição e a situação atual do
aprendiz representam um significado subjacente para o
mentor, que já esteve naquela posição e situação.

Essa conexão de significados entre o mentor e o aprendiz


estabelece uma relação na qual a transferência de conhe-
cimento entre um e outro promoverão uma redescoberta
para ambos, inclusive por meio da afetividade que se cons-
titui, o que terá repercussões no aperfeiçoamento, tanto
do aprendiz como do mentor.

Isso ajuda a explicar o nível de comprometimento mais


abrangente e mais profundo do processo de mentoring em
comparação ao processo de coaching. É a partir dessa cone-
xão que o mentor empreende sua disponibilidade e sua ca-
pacidade de orientar o aprendiz, ao mesmo tempo em que

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Implicações do mentoring 159

o aprendiz se doa e se compromete em absorver ao máxi-


mo tudo o que for possível na transferência com o mentor.

Como síntese:

O resultado da fusão pode ser dois: insights que


contribuem para o mentor e mentorado buscarem
as respostas de que precisam ou nenhum resultado,
uma vez que os insights podem não ocorrer. Isso
significa que a conexão entre mentor e mentorado,
uma vez percebida, pode trazer resultados instantâ-
neos como podem surgir horas, meses ou até anos
depois, não há um tempo previsto para isso. (LIMA,
2013, p. 228)

Percebe-se, então, que o conteúdo do mentoring é um co-


nhecimento que não está registrado sob nenhuma forma
e que precisa ser explicitado a ponto de ser transferido e
absorvido por outra pessoa.

A gestão do conhecimento tácito e o


mentoring
Outra implicação e importância que o mentoring assume
tem relação com a gestão do conhecimento tácito. E esta
relação não é muito fácil de ser trabalhada nas organiza-
ções, dada a sua complexidade.

Em termos teóricos que atendem ao nosso objetivo aqui, a


gestão do conhecimento possui duas vertentes: trabalhar o
conhecimento explícito (que é aquele registrado de alguma
forma por meio de canais verbais ou escritos) e o conheci-
mento tácito (que é aquele inerente à experiência de deter-
minada pessoa e que não está registrado em lugar algum).

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160 O que é mentoring

A partir dessas vertentes, é possível perceber que a gestão


do conhecimento tácito traz desafios maiores do que gerir
o conhecimento explícito. E é sobre o conhecimento tácito
que o mentoring trabalha essencialmente.

Para trabalhar a explicitação do conhecimento tácito, há


quatro formas básicas de conversão, propostas orginal-
mente por Nonaka e Takeuchi (1997) a partir do conceito
de espiral do conhecimento, as quais descreve sucintamen-
te Cassapo (2004):

A socialização é a transmissão imediata (no sen-


so próprio do termo: sem mídia) do conhecimento
tácito de um indivíduo para um outro indivíduo.
Fala-se muito neste processo em interação pesso-
al (face-2-face) e não se recomenda muito o uso de
tecnologias da informação, impessoais e pobres em
transmissão de contexto. Tipicamente, a socializa-
ção é o modo de transmissão de conhecimento na
convivência do aprendiz com o mestre.

A externalização é percebida como uma ação mais


formal e consciente de transformação do tácito
para o explícito, no sentido de “normalizar” o co-
nhecimento dentro de um padrão comum de mo-
delo mental entre o emissor e o receptor. Uma vez
externalizado (ou normalizado), o conhecimento
pode ser objeto de uma distribuição em massa a
partir de tecnologias de comunicação. Tipicamen-
te, a escritura de um “caso” dentro de um padrão
corporativo de distribuição, é uma passagem de
um conhecimento tácito (o fato de ter vivenciado o
caso) para um conhecimento explícito (o caso nor-
malizado dentro de um modelo mental particular,
entendido e compartilhado por todos, e simples de
ser transmitido).

A combinação é o processo de disseminação e sis-


tematização do conhecimento explícito. Uma vez
formalizado dentro de um determinado padrão co-
mum de entendimento (como uma teoria), o conhe-

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Implicações do mentoring 161

cimento explícito poderá ser combinado e compara-


do com outros conhecimentos explícitos, e também
ser disseminado em grande escala. Tipicamente a
confrontação de dois relatórios e sua disseminação
é um ato de combinação.

A internalização é a volta do explícito para o tácito,


entendida como a apropriação do conhecimento ex-
plícito por um indivíduo, e seu enquadramento (sua
compreensão) dentro dos modelos mentais parti-
culares deste indivíduo. Tipicamente, se trata, por
exemplo, de entender um relatório e formar uma
opinião a respeito. (CASSAPO, 2004, p. 2-3)

Essa espiral do conhecimento, que faz com o que o conhe-


cimento tácito transforme-se em conhecimento explícito e
vice-versa, propõe estratégias que facilitam o lidar cotidia-
no com o mentoring, apesar de não ser diretamente uma
ferramenta desse processo.

Espiral do conhecimento

Diálogo

Socialização Externalização
Dimensão Epistemológica

Conhecimento Explícito
Construção do Campo

Associação do

Internalização Combinação

Aprender fazendo

Dimensão Ontológica

Espiral do conhecimento. Adaptado de: NONAKA; TAKEUCHI, 1997.

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162 O que é mentoring

Assim, percebemos que tanto a gestão do conhecimento


quanto o mentoring adotam implicações significativas e
mutuamente complementares no que se refere ao trata-
mento do conhecimento que está dentro do ser humano, o
que indica uma das possibilidades de atuação e de contri-
buição conjuntas dentro do contexto organizacional.

Como o mentoring lida muito com o lado subjetivo, convém


adotar cautela para não se cair em armadilhas conceituais que
podem determinar distorções no processo, causando prejuízos
em vez de resultados esperados.

A primeira cautela refere-se a não assumir um extremismo psi-


cológico. Apesar de o mentoring assumir uma relação essencial-
mente afetiva, ele é acionado também por mecanismos objeti-
vos e de resultado, como, por exemplo, habilidades e atitudes
que são percebidas no dia a dia. Isso nos traz um entendimento
de que o mentoring não se refere exclusivamente ao tratamento
da psiquê tanto do mentor como do aprendiz, mas possui um
viés pragmático também, o que dá origem à busca pelo aprendi-
zado que envolve o conhecimento tácito do mentor.

Outro cuidado é não misturar o conceito de mentoring com ou-


tros, como a própria gestão do conhecimento. Há contribuições
entres as teorias, mas o foco de cada uma delas é bem definido. O
mentoring possui uma relação interpessoal determinada e pode
se valer de princípios da gestão do conhecimento para facilitar a
orientação entre o mentor e o aprendiz, o que não significa que a
empresa deve adotar o processo de mentoring na mesma forma
de aplicação de uma gestão do conhecimento, como se ambos
fossem correspondentes.

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A formação de um mentor 163

A FORMAÇÃO DE UM MENTOR

Tendo já a compreensão de que o mentor é a pessoa res-


ponsável por orientar o processo de mentoring, isto é, um
mediador do processo que favorece uma transformação
pessoal e profissional no aprendiz em termos de desen-
volvimento de experiências, de amadurecimento, a função
gerencial pode ainda assumir mais este papel.

As características de um mentor passam pela capacidade


de guiar alguém menos experiente em sua trajetória. Nesse
sentido, para o mentor, é importante não apenas a expe-
riência prática, mas também a formação teórica pela qual
tenha passado e adquirido conhecimento aprofundado.

Para esclarecer os principais aspectos que envolvem a for-


mação de um mentor, vamos recorrer às indicações de es-
pecialistas que já apontaram de maneira assertiva e estrei-
ta algumas considerações muito relevantes, e que estão
publicadas em obras reconhecidas.

A respeito da origem da palavra mentor, Botti e Rego


(2008) esclarecem que:

Mentor (do latim mentor, oris, do antropônimo


grego mentor) é aquele que serve como experiente
conselheiro, como guia e sábio. É aquele que esti-
mula, inspira, cria ou orienta ideias, ações, projetos
e realizações. A palavra é derivada (por metonímia)
de Mentor, personagem da Odisseia, poema escrito
por Homero no século VIII antes de Cristo. Esse po-

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164 O que é mentoring

ema conta a história do retorno do rei Ulisses (ou


Odisseu) a sua terra, Ítaca, após a vitória na guerra
de Troia. Mentor é amigo e conselheiro do rei. Quan-
do partiu para a guerra, Ulisses confiou sua mulher
Penélope e seu filho Telêmaco a Mentor. Passaram-
-se 20 anos; a família de Ulisses está humilhada e
cerceada pelos pretendentes ao trono de Ítaca. O
poema mostra o desenvolvimento de Telêmaco e a
importância de Mentor para o seu desenvolvimento.
Outro exemplo é encontrado na história do rei Ar-
tur, que foi educado por um mentor, Merlin. (BOTTI;
REGO, 2008, p. 368)

Continuando sobre o uso contemporâneo do termo, escla-


recem ainda os autores que:

O uso contemporâneo do termo mentor tem origem


nos Estados Unidos e foi motivado pelos empresá-
rios da década de 1970 pelo movimento feminista e
pelo desenvolvimento das escolas de negócios nas
universidades americanas. Nessa área de negócios
são escritos, então, vários artigos sobre a impor-
tância do mentor para o desenvolvimento especial-
mente da carreira de mulheres. Podemos questionar
se isso não seria uma discriminação, subestimando
o papel da mulher nesse meio. Depois o conceito
migrou também para a área de formação do profis-
sional de saúde, e a função tornou-se comum nas
décadas de 1980 e 1990. Aparece principalmente
em três áreas: no crescimento e desenvolvimento
de adultos-jovens, no mundo dos negócios e nos
cenários acadêmicos. Mas, devido à polissemia do
conceito de mentor, não podemos afirmar que os
autores querem dizer a mesma coisa quando usam
o termo. Também não foi possível estabelecer uma
unidade de pensamento que pudesse auxiliar no
processo de escolha de mentores, nem no desen-
volvimento de políticas para melhor organizar essa
atividade. Como o mentor aparece cada vez mais
como um integrante da formação profissional, é im-
portante esclarecer seu significado, suas funções e
o que se espera dele. (BOTTI; REGO, 2008, p. 368)

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A formação de um mentor 165

Com base nos destaques dos autores, já é possível esboçar


três dos principais aspectos que envolvem a formação de
um mentor, e que devem ser colocados em prática quando
de sua atuação. São eles:

Reciprocidade: envolve uma relação mútua, que flui de um


lado para o outro, de maneira circular. O pilar que sustenta
seu conceito está na conservação de normas sociais, isto
é, ela é imprescindível para uma relação e uma convivên-
cia sadias. Em termos semânticos, ao se falar em recipro-
cidade está se adotando uma definição que conjuga dois
termos antagônicos, mas que se relacionam e são interde-
pendentes, como, por exemplo, comprar e vender. Por isso,
representa um fluxo de mão dupla, no qual uma das partes
necessita e se liga à outra.

Bilateralidade: envolve a relação direta entre dois lados,


em um efeito complementar à reciprocidade. A bilatera-
lidade considera que em determinado evento há sempre
dois lados a serem considerados. Ora um lado possui di-
reitos e outros deveres, ora vice-versa. Esta é uma relação
dialética, que considera a contraposição e a contra-argu-
mentação de ideias para se chegar a um consenso.

Estímulo de autonomia: envolve uma ação de incentivo e


ampliação da autonomia por meio da promoção do desen-
volvimento próprio do aprendiz. Um mentor tem o seu pa-
pel orientador bem-sucedido a partir do momento em que
o aprendiz passa a tomar as decisões sozinho, avaliando as
circunstâncias com base naquilo que o mentor o inspirou
a realizar. Ao contrário do que se pode imaginar, o mentor
não deve cercear a autonomia por meio de suas orienta-

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166 O que é mentoring

ções, sob a alegação de falta de experiência do aprendiz. É


importante compreender que o desenvolvimento também
ocorre a partir da perspectiva de ensaio e erro.

Os aspectos de formação de um mentor não se esgotam


naqueles três destaques. A revista Exame, em 13/12/2010,
publicou uma matéria na qual destaca outras característi-
cas relevantes na formação de um mentor. São elas:

1. Desejo de ajudar

O mentor precisa ter interesse e disposição para aju-


dar outras pessoas.

2. Boas experiências

Quem já passou por experiências positivas, sejam


formais ou não, com um mentor tende a ser um bom
conselheiro também.

3. Reputação impecável

Precisa ser uma pessoa experiente que tenha um his-


tórico bom em ajudar as pessoas a desenvolver e a
aprimorar suas habilidades.

4. Tempo e energia

Esse ponto é essencial. Mais do que conhecimento,


o mentor doa tempo. Por isso, ele precisa ter horas
vagas e energia para se dedicar ao relacionamento
com o empreendedor.

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A formação de um mentor 167

5. Conhecimentos atualizados

As pessoas que mantêm seus conhecimentos e habi-


lidades tecnológicas atualizados têm mais chances
de serem mentores exemplares.

6. Capacidade para aprender

A pessoa precisa ser capaz de aprender e conseguir


enxergar os potenciais benefícios da relação de men-
toring.

7. Demonstrar habilidades efetivas

É muito importante que o escolhido tenha habilida-


des efetivas para aconselhar e também uma rede de
contatos relevante.

A formação de um mentor considera algumas estratégias a


fim de que a prática do mentoring seja estruturada nas or-
ganizações. Nesse sentido, contemplam-se algumas estra-
tégias organizacionais quando adotam-se medidas na figu-
ra da organização para a formação de mentores, e outras
individuais, quando adotam-se medidas de forma pessoal
para a formação de um mentor.

Para o nosso enfoque neste assunto, vamos adotar a pers-


pectiva das estratégias individuais que orientam uma for-
mação adequada para uma boa prática do mentoring nas or-
ganizações. Vamos às breves descrições de algumas delas:

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168 O que é mentoring

Estratégias Individuais para a prática do Mentoring


Estratégia Descrição
Bons mentores reconhecem
que o tempo e recursos que
Ser seletivo podem atribuir ao mentoring
são finitos e que devem limitar
o número de aprendizes.
Mentores eficazes definem
e esclarecem suas pró-
prias expectativas e as dos
Esclarecer as expectativas
aprendizes. Isso inclui uma
discussão das funções do
mentor que são esperadas.
Mentores devem saber
Considerar as necessida-
reconhecer que os aprendi-
des de desenvolvimen-
zes são geralmente ansiosos,
to dos aprendizes
inseguros e dependentes.
Mentores intencionais vão além
da modelagem circunstancial.
Estão sempre pedindo a seus
aprendizes para vê-los realizar
Envolver-se em mode-
tarefas específicas profissionais,
lagem intencional
incentivando-os a experimen-
tar outras atividades também,
em vez de apenas assumi-
rem uma posição passiva.
A maioria das posições em
escalões hierárquicos é
ocupada por homens, mas é
preciso considerar a diferen-
Considerar as ques- ça entre os gêneros sempre
tões de gênero que houver a necessidade
de orientação, pois cada um
possui tendências de pensa-
mento e de ação peculiares ao
seu gênero, em linhas gerais.

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A formação de um mentor 169

Estratégias Individuais para a prática do Mentoring


Aprendizes que são pertencen-
tes às chamadas minorias, em
determinadas sociedades, de-
vem receber atenção especial.
Considerar as questões
Não porque sejam incapazes,
de raça e cultura
mas porque o relacionamento
estará subordinado a diversos
valores e preconceitos sociais
que podem afetar a orientação.
Caracterizado por intimidade,
reciprocidade, e envolvendo
múltiplos contextos de inte-
ração e uma ampla gama de
papéis, processos de mento-
Evitar a exploração
ring podem, ocasionalmente,
levar à exploração, tanto do
mentor quanto do aprendiz.
A principal preocupação é
a exploração do aprendiz.
Adaptado de: BRAD, J.W., 2002, p.93-94.

Como a prática do mentoring é bem abrangente, muitos fo-


cos podem ser dados a este processo. Nas empresas, uma
das possibilidades de aplicação do mentoring está voltada
para a adaptação de novos empregados, buscando envol-
vê-los com funcionários mais experientes a fim de que co-
nheçam procedimentos e se integrem de maneira adaptati-
va à cultura organizacional.

Esses focos de aplicação do mentoring nas empresas conti-


nuam enfatizando um objetivo, tal qual o coaching: apren-
dizagem organizacional, desenvolvimento pessoal e orga-
nizacional, inovação.

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170 O que é mentoring

Quanto às contribuições da inovação, Chiavenato (2012)


evidencia algumas dimensões que devem ser reguladas —
cada qual na medida em que é necessária — enquanto se
trabalha o desenvolvimento de pessoas, seja de forma indi-
vidual ou coletiva.

Nesse sentido, a formação de mentores necessita conside-


rar dimensões que vão ao encontro de habilidades para li-
dar com:

Desafio e envolvimento: é o grau em que as pesso-


as são envolvidas na operação diária, nos objetivos
de longo termo e nas visões.
Conflitos: é a presença de tensões pessoais e emo-
cionais na organização (em contraste com a ideia de
tensão na dimensão de debates).
Debates: é a ocorrência de encontros e desacordos
entre pontos de vista, ideias e diferentes experiên-
cias e conhecimento.
Liberdade: a independência no comportamento
exercida pelas pessoas em uma organização.
Apoio às ideias: é a maneira pela qual as novas
ideias são tratadas na organização.
Tempo de ideias: é a quantidade de ideias que as
pessoas podem (ou fazem) usar para a elaboração
de novas ideias.
Informalidade e humor: é o caráter de espontanei-
dade e relacionamento alegre e agradável dentro do
local de trabalho.
Assunção de riscos: é a tolerância diante da incer-
teza e da ambiguidade exposta no local de trabalho.
Confiança e abertura: é a segurança emocional nos
relacionamentos dentro da organização. (CHIAVE-
NATO, 2012, p.199)

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A formação de um mentor 171

Como em um processo de mentoring o foco não é espe-


cífico, ao contrário, é um desenvolvimento tão abrangen-
te quanto possível, muitas técnicas podem ser utilizadas
para que o mentoring seja aplicado nas organizações.

Uma das técnicas mais conhecidas e aplicadas é o aconse-


lhamento. Ainda com base nas indicações de Chiavenato
(2012), o aconselhamento deve atender a alguns aspectos,
sempre que for colocado em prática por meio do mento-
ring nas organizações. Vejamos:

Aspecto Descrição
O mentor deve lembrar-se de
todos os comportamentos
específicos de desempenho
Anotar todos os aspec-
do aprendiz, seus pontos
tos de desempenho
fortes e fracos, qualidade
no trabalho, fatos, avalia-
ção de desempenho etc.
O mentor deve tratar o apren-
diz com atenção e polidez. Os
assuntos devem focalizar seu
Lidar com o aprendiz objetiva-
desempenho, comportamento,
mente e sem tendenciosidade
conhecimentos e competên-
cias atuais e requeridos para
seu progresso na carreira.
O mentor não é um psicana-
Focar somente os assuntos
lista. Deve focalizar apenas os
relacionados ao desem-
aspectos que se relacionam
penho atual e futuro
ao desempenho do aprendiz.
O mentor deve saber localizar
e identificar os pontos em que
Oferecer ajuda ao aprendiz
o aprendiz requer ajuda para
melhorar seu desempenho.

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172 O que é mentoring

Aspecto Descrição
O trabalho do mentor depende
da retroação oferecida pelo
aprendiz. Se essa retroação
for rápida, a melhoria será
veloz e a ascensão também.
Se a retroação for negativa ou
de resistência, o mentor deve
Esperar o retorno do aprendiz
saber corrigir a inabilidade do
aprendiz de maneira hábil, sem
ferir sua suscetibilidade. O men-
tor deve esperar tanto reações
construtivas quanto defensivas
por parte do aprendiz e saber
tirar proveito de todas elas.
O problema a ser resolvido não
é do mentor, mas do apren-
diz. O aprendiz deve assumir
total responsabilidade por
seu comportamento e por seu
Transferir todo proble-
direcionamento futuro. Deve
ma para o aprendiz
corrigir suas falhas pessoais e
profissionais. O mentor pode
ajudar o aprendiz, levando-o
a fazer parte da solução, e não
a ser parte do problema.
Como a responsabilidade pela
carreira é do aprendiz, o mentor
pode ajudá-lo a definir um
plano de ação desenhado para
dar impulso e maior velocidade
à formação de sua carreira. Esse
plano deve ser constantemente
Desenvolver um plano de ação
revisto e realinhado em função
do progresso desenvolvido
pelo aprendiz. Não deve fun-
cionar como uma linha rígida
e única, mas deve ter opções
variadas e flexíveis para apro-
veitar as futuras oportunidades.

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A formação de um mentor 173

Aspecto Descrição
O aprendiz deve saber an-
tecipar as consequências de
suas ações e comportamento,
ou seja, de seu desempenho.
Nada melhor do que definir
Identificar resultados a alcançar as metas e os resultados a
alcançar, identificar fatores
críticos de sucesso, estabelecer
indicadores de desempenho
e começar a medir e a avaliar
o progresso do aprendiz.
O mentor deve ajudar a
avaliar o que o aprendiz está
conseguindo fazer. Propor-
Monitorar o progresso
cionar constante feedback
e reforçar intensamente os
bons esforços e resultados.
Adaptado de: CHIAVENATO, 2012, p. 200-201.

Sendo assim, em síntese, a formação de um mentor é de-


senvolvida a partir de aspectos básicos, como reciprocida-
de, bilateralidade e estímulo de autonomia. Esses aspectos
carregam em si características gerais, necessárias a um
mentor, como desejo de ajudar, boas experiências, repu-
tação impecável, tempo e energia, conhecimentos atualiza-
dos, capacidade para aprender e demonstrar habilidades
efetivas.

Sendo assim, a formação de um mentor pode assumir tan-


to estratégias organizacionais quanto individuais, cada
qual sob dimensões específicas e que irão ao encontro da
promoção da inovação. Em linhas gerais e para essa fina-
lidade uma das técnicas mais usadas em mentoring é o
aconselhamento, que necessita de atenções especiais na
conduta do processo pelo mentor.

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174 O que é mentoring

Você deve ter observado que o mentoring, diferentemente do


coaching, traz propostas mais abertas, em uma ótica mais quali-
tativa, justamente por colocar o desempenho em segundo pla-
no, buscando desenvolver, em evidência, dimensões mais abran-
gentes da vida do aprendiz quanto à apreensão de experiências
e valores.

Uma cautela que precisa ser considerada nesse cenário do men-


toring é que isso pode representar, em determinadas situações,
a reprodução da identidade do mentor no aprendiz. Não é a pro-
posta do mentoring desenvolver “clones” de mentores, mas, sim,
utilizar a experiência de vida e profissional dessas pessoas como
referência para o desenvolvimento individual de outras, sempre
respeitando as individualidades e características próprias, dando
oportunidade à constituição do homem no trabalho.

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Aplicando o coaching e o mentoring 175

APLICANDO O COACHING E O MENTORING

Este último conteúdo irá destacar a consideração prática


de ambos os processos — coaching e mentoring — nas or-
ganizações, evidenciando as principais diferenças entre
eles, assim como as contribuições que podem trazer quan-
do praticados em conjunto.

Para alcançarmos esse objetivo, vamos recapitular e apre-


sentar uma síntese dos principais aspectos relacionados à
necessidade desses processos, bem como os conceitos com-
plementares que se envolvem nesses temas e que podem nos
ajudar a compreender melhor como direcionar essas práticas
nas organizações como facilitadoras da gestão de pessoas.

Primeiramente, cabe destacar as principais diferenças en-


tre ambos os processos:

Principais diferenças entre:


Coaching Mentoring
A potência do coaching repousa
A potência do mentoring repou-
na capacidade do coach de
sa no conhecimento específico
fazer questionamentos es-
e na sabedoria do mentor.
timuladores e relevantes.
Coaches empenham-se em am-
pliar o conhecimento, a visão
Mentores são uma espécie de
e os processos de pensamento
mestre, pessoas com ampla ex-
de outros. Criam à sua volta
periência em determinada área.
um ambiente de apoio e de
O conceito tradicional de men-
suporte ao desenvolvimento do
tor é alguém mais experiente na
pensamento crítico, de novas
empresa, com mais anos de casa,
ideias, perspectivas e opções
que demonstra interesse e dis-
de comportamento e ação.
posição para colaborar no avan-
Propiciam novas experiências e
ço da carreira de principiantes.
novas formas de relacionamen-
to profissional personalizado.

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176 O que é mentoring

Principais diferenças entre:


Coaching Mentoring
Focaliza as questões pro-
Focaliza a carreira, representa
fissionais, alinha valores
e transmite valores, visão e
pessoais e organizacionais,
padrões da empresa. Trata-
é uma atividade profissional
-se de uma função e não de
específica com programas
uma atividade profissional.
de formação e supervisão.
As técnicas por meio das quais
As técnicas pelas quais se
são sugeridas possibilidades
empodera um indivíduo
para uma pessoa mediante o
para descobrir o potencial
compartilhamento da expe-
e o conhecimento que ele
riência e do conhecimento de
já possui e para utilizá-lo
um determinado assunto para
para tornar-se mais eficaz.
descortinar novas perspectivas.
Enfatiza a análise dos va-
lores individuais e seu ali-
nhamento com os da orga- Tende a reproduzir os padrões,
nização, para estimular o valores e visão da organização.
avanço e o desenvolvimento
da pessoa e da empresa.
Adaptado de: KRAUSZ, 2007, p. 34-35.

Com base nesses aspectos diferenciais, que nos ajudam a


compreender em uma primeira visão quando é mais ade-
quado adotar uma ou outra prática, vale colocar em evi-
dência os principais conceitos que se articulam a essas
práticas, sejam justificando-as ou propondo contribuições
complementares a cada uma delas.

Vamos reproduzir nestes tópicos, então, aquilo que foi


destacado nas discussões anteriores.

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Aplicando o coaching e o mentoring 177

Coaching e mentoring: considerando a


necessidade de adaptação às mudanças
Uma organização que está preparada para percorrer pro-
cessos de mudança possui maiores possibilidades de não
somente se sustentar, mas de prosseguir no contexto em
que está inserida. Nesse sentido, a gestão tem à sua frente
desafios que demandarão o uso de ferramentas, técnicas
e estratégias para se chegar a um objetivo preconcebido
e outros desafios que estão voltados para este objetivo,
quanto ao significado que ele possui.

A gestão tem em suas mãos o dever de administrar a com-


plexidade dos recursos, procedimentos e tecnologia e tam-
bém a responsabilidade de administrar a mudança, e esta
por meio das pessoas, que devem ser consideradas como o
caráter vivo do trabalho.

Logo, a partir de um cenário em que a organização está


vulnerável aos impactos das mudanças no ambiente, cabe
à gestão dispor de ferramentas e de trabalho vivo para
enfrentar uma nova realidade, que se apresenta, muitas
vezes não sendo possível de ser tratada a partir de uma
solução pronta. Constantemente, o enfrentamento da rea-
lidade ocorrerá a partir de novas construções, que serão
constituídas, em parte, pelas técnicas e ferramentas já dis-
poníveis, embora nunca estejam completas.

É, então, que nasce a percepção de que muitas soluções para


as organizações atuais vão emergir a partir de um determi-
nado contexto, que envolve determinadas pessoas e determi-
nados recursos, nem sempre sendo possível replicar essas
soluções em novas ocasiões, já que o contexto será outro.

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178 O que é mentoring

Assim, uma vez o contexto sendo determinante para que


emerja uma solução que visará a enfrentar uma realidade,
pensamos que é necessário abrir espaço para a capacitação
de pessoas, em uma perspectiva constante, não pontual.
Nasce, então, o sentido de que a gestão pode fornecer al-
ternativas de desenvolvimento de um trabalhador, de for-
ma que ele construa, a partir de sua capacitação, de seu
desempenho na realidade do trabalho, uma nova solução
para enfrentar mudanças que se apresentam o tempo todo.

É importante notar que, ao se falar de capacitação, não se


está falando de “robotização” do trabalhador, mas sim do
incentivo ao empreendedorismo por meios de técnicas e
ferramentas, que deverão ser por ele criticadas e alteradas,
se preciso for. Esta capacitação proporciona à gestão de
pessoas a perspectiva de um ambiente de aprendizagem
contínua, em que o contexto muda e demanda novas pro-
postas para ser enfrentado.

Coaching e mentoring: considerando o aspecto


humano do trabalho
A partir das pesquisas de Hawthorne, o objetivo de Elton
Mayo era pesquisar alguns elementos físicos que interferiam
na produtividade dos trabalhadores. Mayo empreendeu sua
pesquisa especificamente analisando a influência da lumi-
nosidade no ambiente de trabalho, defendendo a tese de
que quanto maior a intensidade da luz, maior a capacidade
produtiva. O efeito contrário também seria esperado.

A experiência foi realizada em dois grupos de moças que


fabricavam relés. Ambos os grupos foram submetidos às
mesmas condições, em salas separadas. Em um grupo, a

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Aplicando o coaching e o mentoring 179

intensidade da luz foi variada no decorrer do processo, en-


quanto no outro a intensidade se mantinha normal. Curio-
samente, em ambos os grupos registrou-se um aumento
na produtividade. Para confirmação, em uma das salas, a
iluminação foi reduzida, mas a produtividade aumentou.
Logo percebeu-se que o fator da iluminação não produzia
nenhum efeito direto sobre a produtividade, mas, sim, o
fator psicológico de quem estava trabalhando.

Após algumas fases da pesquisa em que houve mudanças


no ambiente, na forma de pagamento, no período de des-
canso, entre outras, percebeu-se que o fator de relação so-
cial entre as trabalhadoras influenciava mais na produção
do que as condições físicas a que eram submetidas.

Portanto, o que essa experiência apresentou como resulta-


do foi que o estímulo dado ao relacionamento e à capaci-
dade individual no aspecto humano foi determinante para
impactar os resultados do trabalho.

O aspecto humano no trabalho passa a ser compreendido


como um ator na relação entre a tarefa determinada pela
organização (fator que carrega consigo as expectativas da
empresa) e a atividade que o indivíduo encontra ao reali-
zar sua função (fator que carrega consigo as expectativas
e a percepção pessoal). Isto é, o trabalho pode ser com-
preendido em suas diferentes perspectivas, e entre elas
consideram-se as dimensões do trabalho prescrito (aquele
desenhado pela organização) e o trabalho real (aquele ex-
perimentado na prática pelo trabalhador).

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180 O que é mentoring

Em princípio, a diferenciação básica entre o real e o pres-


crito se deve à intervenção do trabalhador para corrigir
os desvios e imprevistos no cotidiano. Essa intervenção, a
priori, considera que a prescrição da tarefa não é suficien-
te para atingir o objetivo do trabalho, uma vez que é uma
perspectiva estática, enquanto que a atividade no real do
trabalho é uma perspectiva dinâmica, flexível, instável, e
demanda capacidade de um “ator” para providenciar os
ajustes necessários e preencher as lacunas, de forma a ob-
ter o êxito. Este “ator” é, então, assumido pelo trabalhador.

Ora, se o indivíduo torna-se o ator no processo de ajuste


entre o prescrito e o real, as instabilidades no contexto
organizacional podem não possuir apenas origens proces-
suais, externas ou ambientais, mas também podem ocorrer
devido ao próprio caráter subjetivo da pessoa e de sua for-
mação, como, por exemplo, a sua qualificação de acordo
com o processo educacional e seu estado interior, como
a forma com que ela (pessoa) compreende, julga e reage à
realidade do trabalho.

Em outras palavras, o caráter real do trabalho (atividade)


contempla não apenas as lacunas existentes entre os pro-
cessos prescritos e seu cotidiano imprevisto, mas também
contempla o caráter humano do trabalhador quando con-
frontado com essas lacunas.

Coaching e mentoring: considerando a cultura


do aprendizado
Quando os valores essenciais das pessoas encontram re-
percussão umas nas outras, pode-se dizer que há uma
identificação conjunta sobre a forma de pensar e agir, for-
mando-se, assim, a cultura organizacional.

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Aplicando o coaching e o mentoring 181

E para que uma organização invista em uma maneira única


de pensar e agir quanto ao desenvolvimento das pessoas,
ao espaço de autonomia e compartilhamento de decisão, é
preciso que um dos valores essenciais seja o aprendizado.
Pessoas que reconhecem em si a necessidade de buscar
constante aperfeiçoamento e desenvolvimento são capa-
zes de buscar melhorias de forma instintiva, o que, uma
vez sendo compartilhado, faz desse pensamento uma cul-
tura organizacional que preza pela busca de formações,
desenvolvimento, aperfeiçoamento.

Caracterizando a essência de uma cultura organizacional,


é preciso que a empresa invista no aspecto da inovação,
aumentando o grau de estímulo aos funcionários no que
se refere ao espaço de criação e assunção de riscos. Até
mesmo como consequência da inovação, é possível carac-
terizar a essência da atenção aos detalhes, proporcionando
às pessoas a devida expectativa quanto à precisão nas aná-
lises e ao detalhamento das ações.

Por fim, um último destaque que caracteriza a essência de


uma cultura é quanto ao foco nas pessoas, quando a orga-
nização como um todo, na figura dos gestores, considera o
aspecto humano no momento de tomar decisões e imple-
mentar soluções de ordem processual, levando em conta
quais os impactos que suas decisões podem gerar nas pes-
soas que as envolvem.

Ao se falar em aprendizado, é indissociável relacionar o


aspecto humano do trabalho. É o ser humano o agente da
mudança que deve ocorrer na organização para que ela
tenha condições de enfrentar as transformações externas
que se manifestam sobre ela (ou apesar dela).

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182 O que é mentoring

Ao destacarmos mais uma vez o aspecto humano no tra-


balho, estamos considerando que os processos de facilita-
ção pelo coaching e mentoring se tornam necessários para
proporcionar à organização um caráter de diminuição das
tarefas alienantes em favor do aumento de tarefas que in-
centivem e demandem investimento de raciocínio e capa-
cidade crítica.

Para tanto, é importante ressaltar que as empresas que apren-


dem precisam rever procedimentos e processos de negócio
que emolduram determinadas ações, de forma a proporcio-
nar um ambiente mais produtivo, no sentido de que todo o
esforço empregado refira-se a ações produtivas, que gerem
resultados, que favoreçam avanços, e não o contrário. Não
há ambiente pior para o aprendizado do que aquele capaz de
gerar ações improdutivas, perda de energia, perda de tempo.

Se a organização do trabalho está projetada para estimular


as ações inventivas de seu pessoal, então uma organização
que aprende está disposta a usar os processos de coaching
e mentoring para fazer com que as pessoas usem suas po-
tencialidades, invistam suas qualidades nas tarefas que
precisam desempenhar, até mesmo chegando ao nível de
criar novos conhecimentos.

Coaching e mentoring: considerando as


diferentes formas de inteligência
Para trabalhar de maneira adequada uma filosofia de
aprendizado, tanto o coaching quanto o mentoring deman-
dam a capacidade de se identificar no coachee e no apren-
diz a(s) forma(s) com que eles percebem e apreendem a
realidade, lidando de determinadas maneiras específicas

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Aplicando o coaching e o mentoring 183

para assimilar as informações que recebem e planejar suas


ações pessoais.

Nesse sentido, é importante considerar em meio à aplica-


ção de ambos os processos os diferentes tipos de inteligên-
cia, como por exemplo:

Inteligência linguística: pessoas que possuem maior facili-


dade de se expressar, tanto de forma oral quanto de forma
escrita. Como característica principal, possuem maior grau
de atenção e sensibilidade de compreensão sobre pontos
de vista diversos.

Inteligência lógica: pessoas que possuem maior facilidade


em memorizar e realizar ações matemáticas, ou facilidade
de lidar com números e eventos exatos. Como característi-
ca principal, possuem maior grau de detalhamento de pro-
blemas a ponto de conseguirem resolvê-los aos poucos e
com profundidade.

Inteligência motora: pessoas que possuem maior facili-


dade de se expressar corporalmente e com alto grau de
noção de distância, espaço e profundidade. Como carac-
terística principal, possuem maior grau de controle sobre
o corpo e são capazes de realizar movimentos complexos
com precisão e facilidade.

Inteligência espacial: pessoas que possuem maior facili-


dade de criar, desenhar e imaginar. Como característica
principal, possuem maior grau de criação em geral, com
sensibilidade suficiente para desenvolver trabalhos que
envolvem criatividade, como as artes gráficas.

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184 O que é mentoring

Inteligência musical: pessoas que possuem maior facili-


dade de perceber diferentes sons e identificar diferentes
padrões por meio da audição. Como característica princi-
pal, possuem maior grau de harmonização e de percepção
sonora, sendo capazes de enxergar novas possibilidades
pela captação de frequências.

Inteligência interpessoal: pessoas que possuem maior fa-


cilidade de se relacionar com outras pessoas e de mobili-
zá-las. Como característica principal, possuem maior grau
de praticidade, atividade e admiração, sendo capazes de
assumir a liderança em grupos justamente pela admiração
que causam e pela facilidade de comunicação.

Inteligência intrapessoal: pessoas que possuem maior fa-


cilidade de compreender como as pessoas pensam, sentem
e desejam. Como característica principal, possuem maior
grau de concentração e discrição, causando admiração pela
sabedoria aparente e pela capacidade de domínio próprio.

A partir da compreensão desses diversos tipos de inte-


ligência, é possível observar que todos nós podemos ter
alguns deles, ou até todos eles; no entanto, sendo um dos
tipos o mais latente em determinadas situações. Isso nos
diz muito sobre as formas com que realizamos nossas
atividades e, consequentemente, quais as tendências de
desenvolvermos determinadas habilidades.

Coaching e mentoring: considerando as


articulações com a gestão e com a liderança
Como processos de facilitação na gestão de pessoas,
coaching e mentoring, no contexto organizacional, podem
convergir para outras duas funções que se relacionam com
posições estratégicas: gestão e liderança.

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Aplicando o coaching e o mentoring 185

Nesse sentido, a aplicação dos dois processos precisa levar


em conta os papéis do gestor, bem como algumas premis-
sas das teorias de liderança que podem tanto contribuir
para que estas práticas sejam implementadas, como tam-
bém podem proporcionar delimitações para que não haja
choque de atribuições ou conceitos.

Quanto aos papéis do gestor, coaching e mentoring devem


considerar:

Representatividade: o gestor age como representante da


organização em diversos momentos, como se a personifi-
casse em seu cargo. Os gestores são símbolos personifica-
dos, tanto para as pessoas na sua empresa quanto para ou-
tros envolvidos externos. Observar um gestor na atuação de
seu cargo significa o mesmo que observar os valores, a visão
e a missão da empresa por meio de suas atitudes e decisões.

Relacionamento: os gestores devem saber lidar com todas


as pessoas, dentro ou fora da empresa, para que possam
ajudá-los a atingir os objetivos organizacionais. Manter re-
lacionamento significa desenvolver redes de contatos com
outros gestores, construindo alianças ou coalizões. Gesto-
res se relacionam buscando, acima de tudo, obter apoio e
cooperação na realização de suas decisões.

Liderança: uma vez trabalhando com, pelas e por meio das


pessoas, os gestores são responsáveis não apenas por suas
próprias atitudes, mas também pelas de seus subordinados.
Os erros ou acertos de um funcionário são diretamente as-
sociados à capacidade de liderança de seu gestor. Além dis-
so, são responsáveis por levar os bons resultados a partir da
mobilização das pessoas para o trabalho.

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186 O que é mentoring

Monitoração: os gestores buscam coletar informações úteis


o tempo todo, seja dentro ou fora da organização. Eles co-
letam informações solicitadas e não solicitadas, geralmente
explorando sua rede de contatos e o papel do relacionamen-
to. Espera-se que, devido a este papel, os gestores compo-
nham o grupo de pessoas mais bem informadas na empresa.

Disseminação: não basta colher as informações, mas é pre-


ciso repassar aos subordinados as mais importantes e que
irão contribuir para o bom andamento do trabalho. É res-
ponsabilidade do gestor ter a certeza de que os subordina-
dos recebam a informação de que necessitam para realizar
suas atividades.

Porta-voz: além de colher as informações e fazer com que


elas sejam repassadas à equipe, os gestores também assu-
mem o papel de encaminhar, eles mesmos, as informações
para pessoas que não fazem parte de suas equipes. Esse
papel é muito percebido principalmente no que se refere a
reportar as informações para os níveis superiores.

Empreendedorismo: todo gestor tem a responsabilidade


de enxergar à frente dos demais e arriscar novas oportu-
nidades para fazer avançarem os resultados da empresa.
Gestores têm a responsabilidade de dar início a projetos
de desenvolvimento para promover novas oportunidades
e soluções. Esse papel pode proporcionar o cenário ideal
para mudanças a partir da iniciativa própria.

Provedor (solucionador de distúrbios “com as próprias


mãos”): como o ambiente em que opera a organização é
dinâmico e mutável o tempo todo, muitos problemas po-
dem surgir também a todo momento. Nesse papel, espera-

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Aplicando o coaching e o mentoring 187

-se que o gestor tenha a capacidade de resolver conflitos


com as “próprias mãos”, ser um solucionador de distúr-
bios (interpretação mais próxima do termo original em in-
glês, disturbance handler). A ideia aqui é de que o gestor
intervenha em situações problemáticas com capacidade de
análise, pensando nas implicações de uma decisão.

Realocação: todo gestor tem problemas e necessidades na


organização no que se refere à escassez de recursos, se-
jam humanos ou materiais. Como eles são limitados, cada
gestor deve alcançar um equilíbrio entre o uso e as necessi-
dades. Convém ao gestor agir de acordo com a prioridade,
de maneira que tudo que é mais importante seja atendido
imediatamente.

Negociação: neste papel é importante que o gestor domine


o processo pelo qual duas ou mais partes decidem como alo-
car recursos escassos. Muitos gestores exercem esse papel
apenas por questões de demanda e formalidade do cargo,
como a autoridade, mas algumas negociações extrapolam
a formalidade e dependem mais da desenvoltura do gestor
em encontrar situações que atendam a todas as partes.

Já quanto à liderança, as premissas que mais se aproximam


desses processos quando se fala em desenvolvimento de
pessoas referem-se à Teoria da Liderança Transformacional:

Influência idealizada (também chamada de carisma): o lí-


der assume determinados comportamentos que provocam
alterações emocionais efetivas nos liderados, os quais vão
inspirar confiança na figura do líder e uma profunda iden-
tificação com ele.

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188 O que é mentoring

Motivação inspiracional: o líder dissemina a sua visão por


meio de processos e mecanismos simbólicos, de maneira a
provocar o empenho dos liderados. Neste sentido, ele atua
como uma referência de comportamentos que serão repro-
duzidos pelos liderados.

Estimulação intelectual: o líder promove nos liderados o


processo de racionalidade em relação aos problemas en-
frentados, de maneira que eles encontrem em si mesmos
as fontes de ação, como valores e crenças individuais, vi-
sando a um resultado criativo e inventivo a partir do pro-
cesso intelectual.

Consideração individualizada: o líder atua individualmen-


te na medida em que isto é possível, de maneira que venha
a atender às necessidades de desenvolvimento de cada li-
derado, dando o devido apoio e incentivo e proporcionan-
do condições de capacitação para incrementar o desempe-
nho produtivo e comportamental.

Coaching e mentoring: colaborando com a


vantagem competitiva
Por fim, o último destaque a ser feito sobre as aplicações
do coaching e do mentoring está ligado às repercussões
destes processos nos aspectos de vantagem competitiva
das organizações.

Desenvolver pessoas sob todos os diferentes focos que


foram discutidos ao longo deste livro dá à organização a
possibilidade de se destacar frente à competição natural
do mercado. Isto porque, entendendo que desenvolvimen-
to pessoal gera desenvolvimento organizacional, desenvol-

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Aplicando o coaching e o mentoring 189

ver as potencialidades e competências de um trabalhador e


investir no seu desenvolvimento como pessoa no trabalho
faz com que a empresa assuma uma postura de vanguarda
no mercado, não somente pelos resultados apresentados,
mas por constituir-se uma empresa de saudável ambiente
para se trabalhar.

Nesse sentido, Naisbitt (1995, apud Chiavenato, 2012) des-


taca alguns pensamentos quanto à importância da vanta-
gem competitiva para as empresas e que dependem dire-
tamente do investimento no aspecto humano, a partir do
qual o coaching e o mentoring têm possibilidades diretas:

• As organizações que conseguirem criar um clima


favorável à realização pessoal poderão contar com
pessoas mais engajadas e mais bem-dotadas para as
competências necessárias ao negócio.

• O novo papel do dirigente será o de cultivar e


manter um ambiente propício ao desenvolvimento
das pessoas, inclusive ao seu próprio.

• Os sistemas de remuneração atuam como estímu-


los diferenciados ao recompensarem o desempenho
excelente e a inovação.

• O emprego permanente e o tempo integral per-


dem espaço para outras formas de relação de tra-
balho.

• O estilo de gestão autoritário sob o escalar de chi-


cotes e gritaria é substituído pela administração em
redes, liderança democrática e participativa.

• As organizações passam a ser verdadeiras fede-


rações de empreendedores internos, funcionando

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190 O que é mentoring

sob uma mesma razão social em sintonia com uma


comunidade de processos. Poucas regras, menos
controle, muita autonomia, muito incentivo e muito
entusiasmo.

• A qualidade passa a ser regra elementar para par-


ticipar do jogo.

• A importância dos valores organizacionais é cons-


tantemente revisitada, principalmente aqueles ine-
rentes às pequenas organizações.

• A intuição fundamentada no histórico das rela-


ções passadas assume papel cada vez mais relevan-
te. Emoção e intuição estão competindo em um pá-
reo formidável com a razão e a ordem.

• A organização passa a fazer parte de um núcleo


social mais abrangente, que inclui cada vez mais a
qualidade de vida das pessoas. O importante será
tornar-se um lugar agradável para trabalhar e rea-
lizar todas as potencialidades pessoais. (NAISBITT,
1995; apud CHIAVENATO, 2012, p. 230-231)

Com isso, podemos perceber como trabalhar com pessoas


é um grande desafio, mas possível de ser enfrentado, prin-
cipalmente no que se refere à consideração de uma orga-
nização do trabalho mais humanizada. Para alcançar bons
desempenhos e resultados, uma empresa não precisa ser
um calabouço, mas pode tornar-se um local de identifica-
ção para as pessoas desenvolverem suas próprias vidas
por meio de seus trabalhos.

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Aplicando o coaching e o mentoring 191

Como ponto final em nosso tema, depois dos conceitos discuti-


dos e das reflexões levantadas em todo o conteúdo, talvez a últi-
ma reflexão que se possa propor seja: vale a pena o investimento?

Com base no conhecimento construído, acreditamos que sim.


Vale a pena investir em um novo olhar da organização sobre o
trabalho, com a devida cautela para não fazer destes pontos te-
óricos mais uma ferramenta de robotização e prescrição, pois o
mundo dinâmico do trabalho é vivo demais para se tornar um
cenário de causa-efeito.

O trabalho é vivo porque as pessoas ainda estão vivas.

Neste capítulo, você conheceu os elementos que formam


o conceito de mentoring e quais as suas implicações nas
organizações, articulando os aspectos de sincronicidade e
de gestão do conhecimento tácito para compreender me-
lhor a dinâmica deste processo no ambiente corporativo.

A partir dessas implicações, foi possível observar os as-


pectos relevantes para a formação de um mentor, passan-
do pelos destaques desde as suas características até as
estratégias individuais para a prática deste processo.

Por fim, foi possível compreender os aspectos que dife-


renciam a aplicação do papel de coach e de mentor, res-
gatando os temas que fazem estas funções necessárias no
atual mundo dinâmico do trabalho.

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192 O que é mentoring

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194

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Durante a nossa jornada por entre os processos de coaching e


mentoring, foi possível perceber os principais elementos que
constituem esses processos como facilitadores na melhoria
de desempenho dentro do campo da gestão de pessoas.

Primeiramente, foi possível definir o coaching e suas apli-


cações nas empresas. Como um processo de facilitação, ele
não se preocupa com as limitações ou problemas, mas enfa-
tiza as potencialidades por meio das quais pode-se conduzir
uma pessoa a alcançar um melhor desempenho, de maneira
que ela que atinja seus objetivos. Nesse sentido, o coaching
pode ser tratado como um processo de desenvolvimento hu-
mano, cujas ênfases podem assumir diversas formas, a fim
de alcançar os diferentes objetivos almejados.

Ainda quanto ao coaching, percebemos as principais estra-


tégias que as empresas adotam para desenvolver e formar
coaches, aprofundando a compreensão sobre as demandas
existentes para o desenvolvimento de habilidades e do pa-
pel do coach no contexto corporativo. As habilidades ne-
cessárias para que alguém se torne coach partem da forma
com que uma pessoa é capaz de apreender e agir, isto é, do
tipo de sua inteligência, passando por formas pessoais e in-
terpessoais de realizar determinadas ações. A partir daí, as
habilidades podem ser desenvolvidas visando aos papéis
que o coach assume na organização, sempre adotando uma
postura propulsora de melhoria de desempenho e supera-
ção de expectativas.
195

Quanto à sua prática, é importante definir qual o foco


dado na aplicação do coaching, que pode assumir uma
perspectiva da dimensão pessoal, social ou ambiental. De
acordo com esse enfoque, as possibilidades de expandir
o contexto desse processo por meio da gestão ficam mais
claras, quando se pode assumir estratégias como ser coach
de coaches e agregar à função gerencial o papel de ges-
tor-líder-coach, além do uso de diversas ferramentas para
identificar fragilidades e incrementar desempenho.

Por fim, quanto ao mentoring, foi possível considerar os


elementos que formam esse conceito e quais as suas im-
plicações nas organizações, articulando os aspectos de
sincronicidade e gestão do conhecimento tácito para com-
preender melhor a dinâmica desse processo no ambiente
corporativo. A partir dessas implicações, foi possível ob-
servar, ainda, os aspectos relevantes para a formação de
um mentor, passando pelos destaques desde as suas ca-
racterísticas até as estratégias individuais para a prática
desse processo.

Evidentemente que coaching e mentoring, enquanto proces-


sos de facilitação em gestão de pessoas, possuem legiti-
midade e promovem melhorias de desempenho, conforme
discutido anteriormente.

Desde os seus marcos iniciais, esses processos se tradu-


zem como uma possibilidade efetiva de desenvolvimento
de competências e de estratégias para alcance de resulta-
dos, favorecendo um ambiente de inovação, de gestão de
circunstâncias para a construção do conhecimento e de de-
senvolvimento de talentos.
196

Organizacionalmente, os estudos demonstram que coaching


e mentoring têm sido utilizados para diversas finalidades,
principalmente sob três ênfases: (I) auxílio na solução de
situações nas quais o desempenho mostra-se deficiente ou
limitado, a fim de que o resultado seja alcançado apesar
dessas limitações; (II) melhoria baseada nas expectativas,
isto é, em aperfeiçoar ações e potencializar pontos fortes
a fim de que sejam possíveis novas realizações; e (III) faci-
litação no desenvolvimento de determinadas competências
que visam à mobilização de pessoas, mais comumente as-
sociado à liderança. Essas ênfases propõem que há espaço
para a consideração do desenvolvimento humano legítimo
no ambiente organizacional, em termos de sentido no traba-
lho, construção coletiva e relações sociais.

No entanto, cabe destacar uma atenção e uma cautela


quanto à possível e exagerada exaltação à perspectiva sub-
jetiva, que explora questões psicológicas, cognitivas e de
comportamento humano, que colocam coaching e mento-
ring em uma posição vulnerável, suscetível a uma prática
organizacional instrumental. As reflexões aqui apresenta-
das, bem como outras pesquisas científicas acerca desses
temas, descortinam vieses de sedução, imputando sobre
o indivíduo a total responsabilidade sobre seu sucesso
e, consequentemente sobre o sucesso organizacional, ao
mesmo tempo em que aliciam o indivíduo a um envolvi-
mento total e excessivo com os interesses corporativos.

Cabe ao gestor, portanto, lançar mão desses processos em


gestão de pessoas de maneira genuína, ética e humaniza-
da, corroborando uma organização do trabalho consciente,
sustentável e digna da construção da identidade do ser hu-
mano por meio de seu próprio espaço de trabalho.

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