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Empatia, Compaixão, Bondade Amorosa e as Redes Sociais

“A questão mais importante que a humanidade enfrenta é tornar o universo um lugar amigável”
Albert Einstein

Alterar o nosso estado mental para um estado de compaixão é recompensado pelas substâncias
libertadas no cérebro que levam a alegria e a felicidade. Sentir a compaixão e a conexão é bom,
acalma os nossos medos e promove a alteração do “Eu” para o “Nós”.

Qual a diferença entre empatia e compaixão?

Empatia é quando sentimos ou experimentamos as emoções do outro. Por exemplo, quando


sentimos empatia por uma pessoa que está a sofrer, as pesquisas mostram que o “empatizador”
ativa no seu cérebro uma rede neuronal muito semelhante à da rede neuronal da dor real. É isso
que é a empatia na realidade, sentir a dor do outro, sentir experiencialmente as emoções do
outro. Temos em nós as mesmas sensações do outro. A pessoa empática vivencia em si própria
as emoções alheias.

A compaixão é totalmente diferente, a compaixão é sobre a disposição de aliviar o sofrimento


do outro. As “assinaturas” no cérebro são completamente distintas. As redes neuronais que são
ativadas na compaixão são as que estão ligadas às emoções positivas. Interessante é que são
ativadas redes neuronais que têm a ver com o movimento e com a ação. Quando uma pessoa
está a meditar sobre compaixão completamente imóvel, as redes cerebrais do movimento e da
ação ativam-se.1 A compaixão predispõe-nos para a ação, para agir assim que o sofrimento surja.
A prática da compaixão é uma espécie de treino, de um chamamento espontâneo para aliviar o
sofrimento.

A bondade amorosa é o desejo de que a outra pessoa seja feliz, e isto liberta no cérebro
substâncias que levam a alegria e a felicidade. E isso é também semelhante à compaixão, mas
de forma diferente, a compaixão é a disposição para aliviar o sofrimento do outro, há uma maior
probabilidade de ativar no cérebro zonas associadas a ação e ao movimento.

Empatia, compaixão e bondade amorosa, cada uma está associada a diferentes redes neuronais.

Os ocidentais (pessoas não treinadas) desviam o olhar perante acontecimentos traumáticos, as


pessoas treinadas na prática da compaixão podem olhar para um estímulo que retrata o
sofrimento humano pôr um longo período de tempo e não se afastam dele, enfrentam-no, não
se sentem sequestrados por essas emoções. Podemos a partir daqui aferir a importância do
treino (meditação) da compaixão, num mundo bombardeado com informação sobre o
sofrimento do outro, nos telejornais, nas revistas e nos media. Que, aliás, sobrevivem falando-
nos do que está fora de contexto, a notícia é o que está fora do contexto.

Estamos apenas preparados para lidar com a dor de 50 pessoas, as nossas limitações humanas
impõem-nos um limite de relações possíveis em torno das 150 pessoas, número de Dunbar, que

1
Davidson, R. J. (2012). The neurobiology of compassion. In C. K. Germer & R. D. Siegel (Eds.),
Wisdom and compassion in psychotherapy: Deepening mindfulness in clinical practice (pp.
111–118). The Guilford Press.
é o número de pessoas com que um individuo pode manter relações estáveis. Para além deste
número não há condições de absorção, há limitações cognitivas e biológicas, tem que ver com
o nosso desenvolvimento humano. As tribos de caçadores recolectores eram compostas por
sensivelmente esse número de indivíduos, a partir daí perde-se coesão. Os sistemas humanos
de grandes dimensões de indivíduos estão organizados em torno de unidades mais pequenas.
Veja-se os exércitos, as grandes empresas eficientes (unidades de comando em torno de 150
pessoas). Um estudo mostrou que os usuários do Twitter conseguem manter um máximo de
100-200 relacionamentos estáveis. Cameron Marlow, sociólogo do Facebook, reuniu dados da
rede social e concluiu que o número médio de amizades dos usuários é 120 e que as mulheres
possuem mais amizades que os homens geralmente. Também foi observado que quanto maior
o nível de intimidade social considerado, menor e mais estável era o conjunto de pessoas
pertencentes àquele nível de interação.

E o que acontece quando saltamos ecrã em ecrã - do tablet para o televisor, passando pelo
smartphone - de forma automática, ao longo de todo o dia? Pois esquecemo-nos do lugar onde
nos encontramos. ”Perdemos” o corpo ou a sensação de tê-lo. Estamos prisioneiros de uma rede
virtual que, longe de preencher-nos, a maioria das vezes reaviva-nos as carências e fragilidades
emocionais. Diante dos nossos olhos abertos de par em par desfilam sem filtros os horrores do
mundo. E nem as imagens de uma mãe acariciando o seu filho chegam para compensar a cara
ensanguentada de uma criança depois do bombardeamento na Ucrânia.

Assim, para muita gente a omnipresença dos ecrãs gera uma espécie de inquietude, de stress.
Não deixam de receber mensagens por correio eletrónico, Twitter, Instagram ou WhatsApp. E
para conservar a capa artificial construída na rede, o sentimento de pertença a um grupo ou a
ilusão de ser alguém especial, há que responder quase de imediato. Além disso, desde o ponto
de vista do funcionamento cerebral ordinário, a informação não tratada fica em “suspenso”,
provocando ruminações não solicitadas e narrativas enviesadas. É por isso que o treino em
mindfulness, nos aporta traços - estruturas mentais duradoras - capazes de nos fazer regressar
ao momento presente. Os reflexos que permitem o regresso ao momento presente, cultivados
ao longo do tempo através da prática, dão os seus frutos. E estes reflexos baseiam-se em
princípios fisiológicos muito simples, acessíveis e, sobretudo, gratuitos. Basta sentarmo-nos em
quietude e trazer a nossa mente para o momento presente, é tudo.

Francisco Vaz (mestre em mindfulness)

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