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Psicopatologia da Criança e do Adolescente 2022/2023

Avaliação Tipo II – Trabalho de Grupo

Caso Clínico C - David

David tem 17 anos, reside numa cidade no interior do Alto Alentejo e encontra-se a frequentar o 12° ano
na área de Línguas e Humanidades. Neste momento vive com a mãe (Madalena) e o pai (Mário). Tem também uma
irmã (Diana), seis anos mais velha.

O primeiro contacto é feito pela mãe, Madalena, via email. Escreve, muito sucintamente, que pretende
agendar uma consulta de Psicologia para o filho, por sugestão da actual Directora de Turma do mesmo, e pergunta
se terá de estar presente. No segundo email, quando questionada sobre o motivo subjacente a este contacto,
afirma que David "deve ter algum problema porque anda sempre triste e calado na escola".
Na primeira consulta, Madalena entra no gabinete antes de David, faz os cumprimentos essenciais e
comunica que tem "alguns recados para tratar". Pergunta a que horas terminará a consulta e afirma que virá cinco
minutos antes, "para falar um pouco e ver se está tudo bem". Depois da saída da mãe, David senta-se e pergunta
se pode começar a falar. Embora visivelmente nervoso e com uma postura contida, inicia um discurso claro e
organizado.

De acordo com David, "sempre teve problemas, mas os últimos tempos foram muito difíceis". Fala
principalmente sobre o seu mais recente relacionamento romântico com uma colega de escola, que terminou há
três meses, após quase um ano de instabilidade emocional. Afirma que se afastaram durante as férias de Verão,
apesar da sua insistência para que mantivessem a proximidade e que, ao retomarem as aulas, a ex-namorada quis
terminar a relação por considerar que são pessoas demasiado diferentes. Para David, esta decisão da ex-namorada
foi sentida também como a quebra do laço social que o ligava ao seu grupo de amigos: "agora que já não andamos
já não consigo sequer olhar para eles, é como se ela os tivesse virado contra mim". Revela dificuldade em realizar
o luto desta relação, sublinhando que se sente preso num padrão de perda e rejeição em todos os âmbitos
interpessoais.

Pelo final da consulta, Madalena regressa e fica acordado que estará presente na próxima sessão, a fim de
contribuir para a compreensão dos factores que poderão estar a interferir no bem-estar do filho.

Na segunda consulta, David aparece sozinho e afirma que a mãe teve um imprevisto laboral que a impediu
de vir. Embora mantendo a postura colaborante, apresenta-se zangado, com um discurso exaltado e por vezes
agressivo.
Começa por dizer que não quer falar sobre a ausência da mãe e que tem outros assuntos que gostaria de
abordar em consulta, nomeadamente o que denomina de “actos auto-destrutivos”. Quando questionado sobre
estes comportamentos e o contexto em que aconteceram, inicia uma retrospectiva cronológica sobre a sua vida
familiar, que ocupa toda a sessão.

A infância de David foi marcada por conflitos entre a mãe e o pai, que começaram quando Madalena
descobriu que Mário tinha um relacionamento extraconjugal. A partir desta descoberta (por volta dos cinco anos
de David), foi a irmã, Diana, que passou a ter um papel preponderante na sua educação, tornando-se também na
sua figura afectiva de referência.
Mário saiu de casa dois anos depois, iniciando-se um processo de divórcio que acabou por não se
concretizar. De acordo com a descrição de David, esta ruptura familiar fez com que ambos os pais se tornassem
ausentes, uma vez que o pai foi morar para longe e que a mãe passou a estar muito pouco tempo em casa devido
às horas extraordinárias que fazia no trabalho a fim de reequilibrar a economia doméstica.
Algum tempo depois, quando David tinha 14 anos, Madalena e Mário reconciliaram-se e decidiram comprar
uma casa para a família como símbolo deste entendimento, para onde os três foram morar. Diana, a irmã, recusou
partilhar casa com o pai e foi viver com o namorado. Esta transição marca o início do que David define como sendo
a “sua pior fase”, uma vez que teve de mudar de escola e foi obrigado a conviver novamente com o pai, que para
ele “era um estranho”.
Também por esta idade começou a realizar comportamentos auto-lesivos que mantém até à data,
cortando-se e queimando-se. Refere que estes comportamentos são esporádicos e que lhe permitem controlar as
suas emoções sem depender de ninguém. Paradoxalmente, reconhece que são “actos pouco saudáveis” mas que
precisa dos mesmos para se “manter são”.
David relata ainda uma tentativa de suícidio, aos 15 anos, através de enforcamento. Quando questionado sobre
este evento, afirma que ainda não está preparado para abordar o assunto e altera subitamente o rumo da conversa.
Diz que acredita ter problemas de ansiedade e que gostava de tomar medicação, passando a descrever o que
considera um ataque de pânico ocorrido depois de uma discussão com a mãe.

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