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Agentes Públicos e as responsabilidades dos servidores públicos

As pessoas que atuam como agentes públicos são imprescindíveis para a


materialização do Estado e da Administração Pública, uma vez que ambos se tratam de
ficções jurídicas, sem poder de realização na ausência desses indivíduos.

É importante compreender que o termo agente público é amplo e usado para


designar qualquer pessoa que desempenhe funções estatais, mesmo que
transitoriamente. Assim, duas caraterísticas definem esses sujeitos: a atividade
exercida deve ser eminentemente estatal e deve haver um ato administrativo (tema
do próximo módulo) que formalize esse vínculo, ou seja, é necessário um ato de
investidura da pessoa como agente público.

Quando esse vínculo não é formalizado, mas a pessoa ainda sim atua na função
estatal, levando o usuário do serviço público ao erro, ocorre o fenômeno do “agente
de fato”. Nesses casos, os direitos do usuário devem ser preservados, dentro do
possível. Um exemplo seria se um professor voluntário começasse a ministrar aulas
antes da formalização do contrato nos termos da Resolução 26/1999 – CONSUNI, e sua
prestação de serviço não fosse aprovada pelo Conselho Departamental do Centro de
Ensino. Nesse caso, até o momento, o professor atuou como um agente de fato, ou
seja, os alunos acreditavam que ele trabalhava com o aval da Universidade. Se for
comprovado que esse professor conseguiu ministrar as aulas nos termos esperados
para a disciplina, esse período deve ser considerado, a fim de não prejudicar os alunos,
que estavam de boa-fé na situação.

Dentro do gênero ‘agente público’, existem algumas categorias. O que as une é o fato
que todos os sujeitos que atuam em nome da Administração Pública devem observar
regras básicas para o desenvolvimento de suas atividades, especialmente seus
princípios (aqueles que comentamos no último módulo). Observem o caput do artigo
37 da Constituição Federal mais uma vez:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer


dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios obedecerá aos princípios de legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e,
também, ao seguinte: (...)
A norma é clara em expor que toda a Administração Pública deve observar aos
princípios dispostos, ou seja, qualquer um que atue em seu nome, e não apenas
aqueles que possuem vínculo trabalhista com o Estado.

Vamos às categorias, então:

Agentes políticos: são aqueles que ocupam cargos políticos, que por vezes são
mandatos eletivos, como o objetivo de tomar decisões estratégicas para a
administração do país, do estado federado ou do município. Eles são, portanto, os
prefeitos, vereadores e secretários na esfera municipal; os governadores, deputados e
secretários na esfera estadual; e o Presidente da República, seus ministros de Estado,
deputados e senadores, na esfera da União.

Uma forte característica desse grupo é que seu vínculo com o trabalho exercido não é
de natureza profissional ou contratual, mas sim, de natureza política, no sentido de
que a gestão do Estado deve incluir seus cidadãos.

Agentes particulares colaboradores: São pessoas que também não possuem vínculo
trabalhista com o Estado, mas atuam em função pública, mesmo que em situações
excepcionais. São exemplos os jurados e os mesários que prestam serviços eleitorais.
Além deles, também estão nessa categoria os concessionários e os permissionários de
serviços públicos. Desse modo, empresas como a RODOSOL, que receberam a
concessão do Espírito Santo para explorar a gestão de rodovia, são considerados
agentes colaboradores.

Com o processo de terceirização de serviços públicos, também observamos situação


que se enquadra nessa hipótese, uma vez que vínculo do trabalhador é com a empresa
particular contratada pela Administração Pública, mas sua atuação perante os usuários
do serviço público é de representante do Estado.

Funcionários públicos: são aquelas pessoas que possuem um vínculo trabalhista com o
Estado, ou seja, vendem sua força de trabalho diretamente para Administração
pública, e estão submetidos às mesmas leis dos trabalhadores da iniciativa privada,
que é a Consolidação de Leis Trabalhista (CLT). Normalmente são os funcionários de
empresas públicas. Apesar de se sujeitarem às normas gerais da Administração
Pública, suas demandas de classe ou individuais são tratadas pela Justiça do Trabalho.
O ingresso nesses empregos ocorrerá obrigatoriamente por concurso público,
conforme dispõe o inciso II do artigo 37 da Constituição Federal. Observem:

“ II -  a investidura em cargo ou emprego público depende de


aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas
e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo
ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as
nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre
nomeação e exoneração; (...)”

Servidores públicos: São todos aqueles que mantém vínculo profissional e não
eventual com a Administração Pública direta e com as pessoas jurídicas de Direito
Público da Administração Pública indireta, que é o caso da UFES, como já vimos no
primeiro módulo. Ocupam cargos públicos, que obrigatoriamente devem ser criados e
extintos por lei e suas atividades são regulamentadas por leis próprias, e não pela CLT.
Por essa razão, são informalmente denominados de estatutários e suas demandas
trabalhistas individuais ou de classe devem ser dirimidas pela justiça comum (Federal
ou Estadual, a depender da esfera de atuação do servidor – no nosso caso, a
competência é da Justiça Federal), uma vez que o Direito em questão é de natureza
administrativa.

O ingresso nesses cargos também ocorrerá obrigatoriamente por concurso público,


conforme o supracitado inciso II do artigo 37 da Constituição Federal.

Sobre as carreiras, todas possuem regulamentação própria, que é a lei que descreve a
atuação do cargo, os padrões de vencimento e os níveis de progressão funcional. No
caso da UFES, temos os servidores técnico-administrativos, regidos pela lei
11.091/2005, e os servidores de magistério federal, que se dividem entre a carreira de
magistério superior (ocupada por quase todos os professores da UFES) e magistério do
ensino básico, técnico e tecnológico (que em nossa instituição, estão lotados na
CRIARTE – a escola de educação infantil), ambas regulamentadas pela lei 12.772/2012.

No entanto, no âmbito federal, há também uma lei que expõe diretrizes para todas as
carreiras civis (que se distinguem das carreiras militares), a lei 8.112/1990, conhecida
com Regime Jurídico Único (RJU). Assim, apesar das leis específicas, todos devemos
observância a essa lei.
A lei 8.112/1990 é bastante extensa, uma vez que trata de toda a vida funcional de um
servidor público, desde as formas de provimento até a aposentadoria. Vejam alguns
pontos que se distinguem da CLT:

1. Enquanto os trabalhadores regidos pela CLT recebem salário em retorno pela


força de seu trabalho, a nomenclatura adotada pela lei 8.112 é o vencimento
ou subsídio.
2. A fim de proteger a autonomia dos servidores públicos, o artigo 41 da
Constituição Federal e o artigo 21 da lei 8.112 estabelecem a estabilidade do
servidor após três anos de atividade no mesmo cargo (apesar da lei 8.112
propor um estágio probatório de dois anos, a Constituição Federal é
hierarquicamente superior a ela, fazendo com que prevaleça a regra dos três
anos).
3. Enquanto a CLT prevê a demissão como o fim do vínculo de trabalho, que pode
ocorrer por solicitação do empregado ou do empregador, com ou sem justa
causa, na Lei 8.112, o termo demissão representa uma penalidade
administrativa. Ou seja, só é demitido quem descumpre regras administrativas.
Se o servidor decidir deixar seu vínculo trabalhista espontaneamente, é uma
hipótese de exoneração.

Ainda sobre as infrações e penalidades administrativas, esse é um ponto a ser


destacado. Assim como a CLT, a lei 8.112 dispõe essas situações de forma expressa.
Vamos analisar essas questões.

Primeiramente, vamos observar o artigo 116 da lei 8.112, que trata dos deveres do
servidor público:

Art. 116.  São deveres do servidor:


I - exercer com zelo e dedicação as atribuições do cargo;
II - ser leal às instituições a que servir;
III - observar as normas legais e regulamentares;
IV - cumprir as ordens superiores, exceto quando
manifestamente ilegais;
V - atender com presteza:
a) ao público em geral, prestando as informações requeridas,
ressalvadas as protegidas por sigilo;
b) à expedição de certidões requeridas para defesa de direito
ou esclarecimento de situações de interesse pessoal;
c) às requisições para a defesa da Fazenda Pública.
VI - levar as irregularidades de que tiver ciência em razão do
cargo ao conhecimento da autoridade superior ou, quando
houver suspeita de envolvimento desta, ao conhecimento de
outra autoridade competente para apuração;                  
VII - zelar pela economia do material e a conservação do
patrimônio público;
VIII - guardar sigilo sobre assunto da repartição;
IX - manter conduta compatível com a moralidade
administrativa;
X - ser assíduo e pontual ao serviço;
XI - tratar com urbanidade as pessoas;
XII - representar contra ilegalidade, omissão ou abuso de
poder.
Parágrafo único.  A representação de que trata o inciso XII será
encaminhada pela via hierárquica e apreciada pela autoridade
superior àquela contra a qual é formulada, assegurando-se ao
representando ampla defesa.

Observem, que de modo geral, os deveres descritos pelo artigo estão dentro das
expectativas previstas para um trabalhador. Destaco, no entanto, o inciso VI, que
impõe que o servidor público reporte as infrações com que se deparar. Desse modo,
sua omissão é considerada violação de suas atividades.

A lei 8.112 também expõe quais são os atos proibidos aos servidores públicos, em seu
artigo 117:

Art. 117.  Ao servidor é proibido


I - ausentar-se do serviço durante o expediente, sem prévia
autorização do chefe imediato;
II - retirar, sem prévia anuência da autoridade competente,
qualquer documento ou objeto da repartição;
III - recusar fé a documentos públicos;
IV - opor resistência injustificada ao andamento de
documento e processo ou execução de serviço;
V - promover manifestação de apreço ou desapreço no recinto
da repartição;
VI - cometer a pessoa estranha à repartição, fora dos casos
previstos em lei, o desempenho de atribuição que seja de sua
responsabilidade ou de seu subordinado;
VII - coagir ou aliciar subordinados no sentido de filiarem-se a
associação profissional ou sindical, ou a partido político;
VIII - manter sob sua chefia imediata, em cargo ou função de
confiança, cônjuge, companheiro ou parente até o segundo
grau civil;
IX - valer-se do cargo para lograr proveito pessoal ou de
outrem, em detrimento da dignidade da função pública;
X - participar de gerência ou administração de sociedade
privada, personificada ou não personificada, exercer o
comércio, exceto na qualidade de acionista, cotista ou
comanditário;                      
XI - atuar, como procurador ou intermediário, junto a
repartições públicas, salvo quando se tratar de benefícios
previdenciários ou assistenciais de parentes até o segundo
grau, e de cônjuge ou companheiro;
XII - receber propina, comissão, presente ou vantagem de
qualquer espécie, em razão de suas atribuições;
XIII - aceitar comissão, emprego ou pensão de estado
estrangeiro;
XIV - praticar usura sob qualquer de suas formas;
XV - proceder de forma desidiosa;
XVI - utilizar pessoal ou recursos materiais da repartição em
serviços ou atividades particulares;
XVII - cometer a outro servidor atribuições estranhas ao
cargo que ocupa, exceto em situações de emergência e
transitórias;
XVIII - exercer quaisquer atividades que sejam incompatíveis
com o exercício do cargo ou função e com o horário de
trabalho;
XIX - recusar-se a atualizar seus dados cadastrais quando
solicitado.                   
Parágrafo único.  A vedação de que trata o inciso X do caput
deste artigo não se aplica nos seguintes casos:                  
I - participação nos conselhos de administração e fiscal de
empresas ou entidades em que a União detenha, direta ou
indiretamente, participação no capital social ou em sociedade
cooperativa constituída para prestar serviços a seus membros;
e    
II - gozo de licença para o trato de interesses particulares, na
forma do art. 91 desta Lei, observada a legislação sobre
conflito de interesses.  

Como vocês podem observar, as proibições variam e gravidade e se somam aos crimes
contra a Administração Pública na análise da responsabilidade do servidor. Destaco
para vocês o inciso XVII, que proíbe a chefia de designar atividades distintas ao cargo
do servidor. Caso o desvio de função for cotidiano para o servidor, ele pode pleitear
indenização à Administração Pública e o chefe que for conivente com a situação será
responsabilizado.

A lei 8.112 também dispõe das penalidades para essas infrações em seu artigo 127,
mas vamos analisá-lo no módulo sobre processo administrativo disciplinar, uma vez
que os procedimentos variam de acordo com a penalidade aplicada.

A Lei 8112/1990 ainda dispõe sobre a responsabilidade do servidor público perante


outros servidores, da própria Administração Pública ou usuários do serviço público.
Tais situações estão descritas nos artigos 121 a 126-A da lei 8.112. Vamos observá-los:

Art. 121.  O servidor responde civil, penal e


administrativamente pelo exercício irregular de suas
atribuições.
Art. 122.  A responsabilidade civil decorre de ato omissivo ou
comissivo, doloso ou culposo, que resulte em prejuízo ao
erário ou a terceiros.
§ 1o  A indenização de prejuízo dolosamente causado ao erário
somente será liquidada na forma prevista no art. 46, na falta
de outros bens que assegurem a execução do débito pela via
judicial.
§ 2o  Tratando-se de dano causado a terceiros, responderá o
servidor perante a Fazenda Pública, em ação regressiva.
§ 3o  A obrigação de reparar o dano estende-se aos sucessores
e contra eles será executada, até o limite do valor da herança
recebida.
Art. 123.  A responsabilidade penal abrange os crimes e
contravenções imputadas ao servidor, nessa qualidade.
Art. 124.  A responsabilidade civil-administrativa resulta de ato
omissivo ou comissivo praticado no desempenho do cargo ou
função.
Art. 125.  As sanções civis, penais e administrativas poderão
cumular-se, sendo independentes entre si.
Art. 126.  A responsabilidade administrativa do servidor será
afastada no caso de absolvição criminal que negue a existência
do fato ou sua autoria.
Art. 126-A. Nenhum servidor poderá ser responsabilizado civil,
penal ou administrativamente por dar ciência à autoridade
superior ou, quando houver suspeita de envolvimento desta, a
outra autoridade competente para apuração de informação
concernente à prática de crimes ou improbidade de que tenha
conhecimento, ainda que em decorrência do exercício de
cargo, emprego ou função pública.   

Como vocês podem observar no caput do artigo 121, o servidor público possui
responsabilidade civil, penal e administrativa.

A responsabilidade civil significa que se o servidor for responsável por estragar um


bem da Administração Pública, por exemplo, mesmo que sem a intenção, ele deverá
indenizar. Assim, se estou com um computador da UFES no meu carro e ele é furtado
porque deixei os vidros do carro abertos, eu devo restituir à UFES o valor do bem, já
que ele estava sob minha responsabilidade e eu agi com negligência quanto ao bem da
UFES.

Já a responsabilidade penal decorre da prática de um crime ou contravenção penal


durante o exercício das atividades do servidor público. Observamos a Administração
Pública deve informar ao Ministério Público sobre a investigação, para que seja
analisada a hipóteses de uma denúncia criminal perante o Poder Judiciário e a
sentença criminal terá efeitos na decisão administrativa. Analisaremos os possíveis
crimes praticados por servidores públicos em momento oportuno.
Por fim, a responsabilidade administrativa se relaciona com o descumprimento de
deveres ou prática de atos proibidos em lei de caráter administrativo e é apurada por
processo administrativo disciplinar, tema do nosso último módulo.

Ainda, o artigo 122, parágrafo 2º, prevê o direito de regresso da Administração Pública
quando o servidor agir ou for omisso, resultando em dano, seja ele culposo ou doloso,
isto é, com ou sem intenção de causar o prejuízo.
Referências:

BÛLOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. 13. ed. São Paulo: Saraiva,
2020.

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 34. ed. São
Paulo: Atlas, 2020.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 34. ed. São Paulo:
Malheiros, 2019.

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