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Procedimentos Administrativos e

Extrajudiciais
Introdução
Sejam todos muito bem-vindos e bem-vindas ao Curso de Procedimentos
Administrativos e Extrajudiciais!

A proposta, aqui apresentada, é a compreensão de procedimentos administrativos


e extrajudiciais: inquérito civil, notícia de fato, procedimento preparatório, procedimento
investigatório criminal, procedimento administrativo e procedimento de gestão
administrativa.

Não cuida o curso de analisar o fluxo do processo dentro do Sistema Único, mas
de dar conhecimento ao procedimento em si, quais suas finalidades, qual o seu
andamento, qual seu objeto, seu prazo e o resultado esperado com o processamento do
feito.

O escopo é permitir que servidores, mesmo que não tenham formação jurídica,
possam compreender suas atribuições no contexto em que são realizadas, ou seja, ter a
compreensão de porque aqueles atos e providências estão sendo tomadas e quais são o
direcionamento e as próximas etapas daquele procedimento em curso.

Isso permite que o servidor não tome decisões apenas por uma compreensão
mecânica de qual é o processamento do feito, dentro do Sistema Único, mas que possa
entender que aquelas ações vão gerar consequências positivas para a sociedade. O risco
de erros diminui significativamente com a efetiva compreensão das razões das
providências adotadas dentro do procedimento, tornando mais eficiente e efetivo o
trabalho realizado.

Vamos estudar, portanto, os procedimentos em curso no Ministério Público


Federal.

Procedimento "significa sucessão encadeada de atos" 1, "é o conjunto de


formalidades que devem ser observadas para a prática de certos atos administrativos;
equivale a rito, forma de proceder; o procedimento se desenvolve dentro de um processo
1 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 9.ed. rev. e atual. São Paulo: Ed. Revista dos
Tribunais, 2005. p. 189
administrativo."2"Processo, por outro lado, implica, além do vínculo entre atos, vínculos
jurídicos entre os sujeitos, englobando direitos, deveres, poderes, faculdades, na relação
processual3.

É importante saber que os procedimentos são instrumentos para a concretização


de um resultado futuro positivo. O processo judicial e os procedimentos extrajudiciais têm,
portanto, uma finalidade social, vinculada intrinsecamente ao direito que se quer alcançar
e à justiça4. Veja que somente tramita um procedimento investigatório criminal porque se
quer colher provas para atingir um objetivo específico: o ajuizamento de uma ação penal,
voltada para a punição daquele que o Ministério Público tem certeza que cometeu um
crime.

É esse o objeto do nosso estudo. Vamos conversar sobre qual é a finalidade que
cada um desses procedimentos persegue e qual o resultado final que se espera.

2 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito administrativo. 14.ed. São Paulo: Atlas, 2002. p. 506.
3 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 9.ed. rev. e atual. São Paulo: Ed. Revista dos
Tribunais, 2005. p. 189
4 CALAMANDREI, Piero (tradução de Luiz Abezia e Sandra Drina Fernandes Barbery). Processo e
justiça. In: Direito processual civil. Vol. III. São Paulo: Bookseller, 1999
MÓDULO I

PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS E CÍVEIS

1.1 Procedimento de Gestão Administrativa

A prática de atos administrativos, procedimentais e processuais e o registro, a


distribuição, a tramitação, a instrução e o controle de expedientes no Ministério Público
Federal dar-se-ão por intermédio do Sistema Único, conforme dispõe o art. 16 da Portaria
PGR nº 350 de 28 de abril de 2017. 5

Dentre esses atos de natureza administrativa encontra-se o procedimento de


gestão administrativa. É um expediente destinado a realizar as funções atípicas
(atividade-meio) do Ministério Público Federal.

Esse procedimento deve ser instaurado toda vez que houver necessidade de
acompanhamento de alguma função desenvolvida pela área administrativa do Ministério
Público Federal, como, por exemplo, o acompanhamento de ofícios que estão no
processo de certificação de ofícios ou a tramitação de um processo licitatório.

Em todos eles serão juntados documentos, expedidos ofícios, tomadas decisões,


que ficarão armazenados e vinculados, dentro de um único procedimento. Além disso,
estarão juntados e documentados os atos que precisam ser produzidos, em ordem
cronológica e com a devida publicidade.

Isso garante uma organização no trabalho: todos os envolvidos têm conhecimento


integral de tudo o que foi feito, durante a tramitação do procedimento; não há risco de se
perder qualquer documento; é possível compreender a cronologia dos fatos. Fica tudo
num único lugar.

5 BRASIL.Portaria PGR/MPF nº 350 de 28 de abril de 2017. Brasília, DF: Ministério Público Federal.
[2017]. Disponível em: http://bibliotecadigital.mpf.mp.br/bdmpf/handle/11549/104394. Acesso em 18 aug.
2022.
Os procedimentos de gestão administrativa são instrumentos de gestão, para
organizar a atividade desenvolvida dentro da atividade-meio.

Não existe uma formalidade específica. Na verdade, todos os procedimentos


administrativos possuem um formalismo moderado:

A Administração Pública deve pautar-se pelo princípio do formalismo


moderado, que prescreve a adoção de formas simples e suficientes para
propiciar adequado grau de certeza, segurança e respeito aos direitos dos
administrados, promovendo, assim, a prevalência do conteúdo sobre o
formalismo extremo, respeitadas, ainda, as praxes essenciais à proteção
das prerrogativas dos administrados.6

Para os procedimentos de gestão administrativa, não existe um regramento


específico dizendo em qual ordem devem ser produzidos os atos, ou qual é a estrutura
básica do procedimento. O que se exige é que os atos, dentro do procedimento de gestão
administrativa, tenham possibilidade de atender seus objetivos. Se atendidos, está
perfeito o ato administrativo.

Assim, esse é um procedimento destinado a organizar e acompanhar os atos


praticados no âmbito da atividade administrativa do Ministério Público Federal, no âmbito
do Sistema Único.

1.2 Procedimento Administrativo

Este é um procedimento extrajudicial utilizado para acompanhamento de


demandas específicas, vindas de decisões em procedimentos investigatórios, como, por
exemplo, o acompanhamento do cumprimento das recomendações expedidas num termo
de ajustamento de conduta.
6 BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão 357/2015-Plenário. REPRESENTAÇÃO, COM
PEDIDO DE MEDIDA CAUTELAR. SUPOSTAS IRREGULARIDADES OCORRIDAS EM PROCEDIMENTO
LICITATÓRIO, RELACIONADAS À DESCLASSIFICAÇÃO INDEVIDA DE LICITANTE COM PROPOSTA
MAIS VANTAJOSA. VÍCIO INSANÁVEL NO MOTIVO DETERMINANTE DO ATO DE DESCLASSIFICAÇÃO.
NULIDADE. DETERMINAÇÃO. CIÊNCIA. 1. O intuito basilar dos regramentos que orientam as aquisições
pela Administração Pública é a contratação da proposta que lhe seja mais vantajosa, obedecidos os
princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da
probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes
são correlatos. 2. No curso de procedimentos licitatórios, a Administração Pública deve pautar-se pelo
princípio do formalismo moderado, que prescreve a adoção de formas simples e suficientes para propiciar
adequado grau de certeza, segurança e respeito aos direitos dos administrados, promovendo, assim, a
prevalência do conteúdo sobre o formalismo extremo, respeitadas, ainda, as praxes essenciais à proteção
das prerrogativas dos administrados. Publicado em 04/03/2015. Disponível em:
https://www.lexml.gov.br/urn/urn:lex:br:tribunal.contas.uniao;plenario:acordao:2015-03-04;357. Acesso em 18 aug.
2022.
Não é uma investigação, como são os demais procedimentos estudados, mas um
instrumento para que sejam acompanhadas questões que já foram decididas, mas que
precisam reunir informações ou documentos depois de concluída a investigação.

Será o procedimento administrativo instaurado por portaria, conforme o exemplo:

Figura1 – Portaria de Instauração

Fonte: Print screen de documento cadastrado no Sistema Único. Adaptado pela autora a fim
de exemplificar o assunto estudado e preservar dados que possam ser sigilosos.

O procedimento administrativo serve para:

• Acompanhar o cumprimento de cláusulas de termo de ajustamento de


conduta celebrado;
• Acompanhar e fiscalizar, de forma continuada, políticas públicas ou
instituições;
• Apurar fato que enseje a tutela de interesses individuais indisponíveis;

• Embasar outras atividades não sujeitas a inquérito civil.

Veja que não há nenhuma ação de investigação.

O procedimento administrativo vai juntar os documentos que as partes vão


produzir para cumprir o termo de ajustamento de conduta.

O termo de ajustamento de condutas é o contrato firmado entre diversas partes,


destinado a corrigir alguma situação danosa ao patrimônio público e social, ao meio
ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à ordem urbanística, à honra e dignidade
de grupos raciais, étnicos ou religiosos 7.

É um documento que obriga as partes a cumprir o que foi contratado. Se não


forem cumpridas as condições, basta a apresentação desse documento ao Poder
Judiciário, sem a necessidade de nenhuma ação judicial prévia para comprovar a
obrigação ou o dever de fazer o que estava no contrato, que o juiz determinará o
cumprimento das penalidades que estão no termo de ajustamento de condutas.

Vamos estudar melhor o termo de ajustamento de condutas quando tratarmos do


inquérito civil.

O procedimento de acompanhamento vai funcionar assim: depois do processo de


investigação, será assinado um termo de ajustamento de conduta, no qual são
estabelecidas diversas providências que as partes devem tomar. Para verificar se as
partes estão ou não cumprindo o que prometeram, é no PA que se vão juntar todos os
documentos e acompanhar os prazos para cumprimento.

No caso de descumprimento, será ajuizada a ação de execução, com aqueles


documentos que foram juntados a esse procedimento.

A mesma coisa acontece com relação às políticas públicas.

O Ministério Público tem por dever constitucional “zelar pelo efetivo respeito dos
Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta
Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia” (art. 129, II, da
Constituição Federal).

Daí, ele precisa acompanhar se prefeitos, governadores e até o Presidente da


República estão, de fato, cumprindo as políticas públicas que estão em execução, ou
deveriam estar.

Como não se trata de uma investigação, mas apenas de um acompanhamento, é


o procedimento administrativo o instrumento correto a ser utilizado. E dele podem surgir
outros procedimentos, mas só em caso de ser necessário mais do que só acompanhar a
política pública.

7 BRASIL. Lei nº 7347, de 24 de julho de 1985. Disponível em:


http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7347orig.htm. Acesso em 18 aug. 2022.
A tutela de direitos individuais indisponíveis, quando precisa ser apenas
acompanhada e não é necessário investigar eventual descumprimento de deveres,
poderá ser feita por meio de procedimento administrativo.

Segundo o Dicionário Michaelis, tutela significa “ação de


proteger, vigiar ou defender alguém ou algo mais fraco ou
frágil”8.

Os direitos individuais indisponíveis são os direitos dos quais a pessoa não pode
abrir mão, como o direito à vida, à liberdade, à saúde e à dignidade.

E serão objeto de proteção pelo Ministério Público, quando seus titulares são
pessoas indeterminadas; ou o objeto do direito (bem jurídico) é indivisível” 9.

O direito será indivisível quando uma única ofensa atinge todas as pessoas que
teriam aquele direito; e o contrário, a satisfação do direito beneficia a todos os titulares ao
mesmo tempo, independentemente se conhecidos ou não.

Por exemplo:

• os compradores de carros de um lote com o mesmo defeito de


fabricação: não se sabe, exatamente quem são, mas todos os compradores
e todos os usuários do carro estão sujeitos a risco, inclusive de vida, se o
fabricante não trocar a peça defeituosa;

• os danos provocados por companhia telefônica que oferece sinal de


internet em velocidade menor do que a que foi contratada. Todos os que
usam aquela internet, ainda que não signatários do contrato de prestação de
serviço, serão prejudicados;

• os danos sofridos em razão de desastres naturais de grandes


proporções, como aconteceram em Mariana e Brumadinho, Minas Gerais.
Há um número grande de pessoas prejudicadas por um fato comum: o
acidente ambiental.

8 TUTELA. Michaelis Dicionário Brasileiro da Lìngua Portuguesa. Dicionário online: Editora


Melhoramentos, 2015. Disponível em: http://michaelis.uol.com.br/busca?r=0&f=0&t=0&palavra=tutela .
Acesso em 20 set. 2022

9 DINAMARCO, Pedro da Silva. Ação civil pública. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 26
No procedimento administrativo não vai acontecer a investigação sobre quem é
responsável pelo dano, nem de que forma será feita a reparação. Contudo, para que se
possa acompanhar as diversas ações que estão sendo tomadas para a solução do
problema causado, é este procedimento extrajudicial que deve ser usado.

Por fim, para qualquer demanda que exija o acompanhamento extrajudicial dos
membros do Ministério Público Federal e que não exija investigação, mas mero
acompanhamento, deve ser utilizado o procedimento administrativo.

O processo deve ser finalizado em até 12 meses, mas pode ser prorrogado por
tantas vezes quanto necessário à continuidade do acompanhamento. E, caso alguma
demanda passe a exigir alguma investigação, o procedimento administrativo, ou parte
dele, deve ser convertido no procedimento adequado.

Por exemplo, se no curso do acompanhamento de uma política pública se


constatar a prática do crime de corrupção, a investigação deverá ser feita num
procedimento de investigação criminal. O procedimento administrativo continuará em
tramitação, acompanhando a política pública e a parte do procedimento que descobriu o
crime vai ser convertida em procedimento de investigação criminal, porque é neste último
procedimento que são feitas as investigações necessárias para ajuizar a devida ação
penal.

Findo o acompanhamento do procedimento administrativo, esse deve ser


arquivado no próprio órgão, sem necessidade de homologação pelas Câmaras de
Coordenação e Revisão – CCRs - ou pela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão -
PFDC.

Além disso, tratando-se de acompanhamento relativo a direitos individuais


indisponíveis, o noticiante precisa ser informado da decisão de arquivamento, salvo se
instaurado em razão de dever de ofício.
1.3 Procedimento Preparatório

O procedimento preparatório é instaurado para apurar notícias de irregularidades


quando os fatos ou a autoria não estão claros ou quando não é evidente que a atribuição
de investigação é do Ministério Público Federal. Depois de reunidas mais informações, o
procedimento preparatório pode se transformar em inquérito civil ou mesmo redundar
diretamente na propositura de uma ação, caso os fatos e autores fiquem bem definidos
durante seu trâmite.

Destaque-se que o procedimento preparatório se presta a analisar questões


envolvendo a tutela coletiva, ou seja, a esfera cível da atuação do Ministério Público
Federal. Caso existam questões de natureza criminal, deve ser autuado procedimento
próprio para essa apuração com eventual distribuição do feito, se o procurador titular do
Procedimento Preparatório (PP) não tiver atribuição para atuar na área penal.

Qualquer pessoa pode apresentar ao Ministério Público Federal informações que


poderão gerar a sua atuação. São notícias sobre irregularidades orçamentárias e fiscais,
prática de crimes, violação a direitos e interesses coletivos, como danos ao patrimônio
ambiental e cultural, etc.

Ao apresentar essas informações, o cidadão não precisa juntar documentos que


comprovem a integralidade do que está suscitando, deve ele trazer apenas documentos
que representem indícios de que aquele fato está acontecendo.

Se o membro do Ministério Público Federal entender que aquela informação é


séria e que devem ser tomadas medidas para evitar um prejuízo para a sociedade, é para
essa situação que se deve instaurar o procedimento preparatório.

Nele serão reunidas as informações preliminares que justificarão, ou não, o início


de uma investigação mais detalhada. No Procedimento Preparatório (PP) serão
investigados os possíveis autores do fato ilícito, a extensão do dano, a abrangência da
irregularidade. Tudo para formar a convicção do procurador da República acerca do início
das investigações.

Por exemplo, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão – PFDC - enviou


ofício circular para os membros do Ministério Público Federal, com atribuição vinculada às
suas atuações, sugerindo um acompanhamento mais próximo da observância do piso
salarial para professores das redes públicas de ensino estadual e municipal:

Figura 2 – Pedido de Acompanhamento

Fonte: Print screen de documento cadastrado no Sistema Único. Adaptado pela autora a fim
de exemplificar o assunto estudado e preservar dados que possam ser sigilosos.

Não se trata de uma irregularidade que demande uma ação reparadora do


Ministério Público Federal, mas, verificado que o piso salarial não vem sendo observado,
deverá o Procurador da República certificar-se dos motivos e de quem é o responsável
pelo ilícito.

Daí a necessidade de um procedimento preparatório para delinear as situações


que mereceriam, ou não, uma atuação repressiva, podendo, inclusive, culminar com o
ajuizamento de uma ação civil pública.

Todavia, se todas as secretarias de educação estaduais e municipais estiverem


observando o piso salarial, não há nada o que ser feito, a fiscalização dos serviços
públicos foi realizada e constatou-se a sua correção.

Outro exemplo foi a comunicação, por uma cidadã, de uma obra que poderia ter
impacto ambiental:

Figura 3 – Comunicação

Print screen de documento cadastrado no Sistema Único. Adaptado pela autora a fim de
exemplificar o assunto estudado e preservar dados que possam ser sigilosos.
A narrativa é de uma cidadã com informações muito simples sobre o que vem
ocorrendo. Todavia, com a notícia de que havia uma obra muito próxima ao rio Paraíba do
Sul, com o desvio da água da chuva, o procurador da República decidiu reunir mais
informações para tomar uma decisão sobre qual seria a melhor abordagem.

Veja que a notícia apresentada pela cidadã traz poucos elementos, nada além de
algumas fotos. Além da apuração, que se iniciou no Ministério Público estadual,
precisariam ser analisadas as repercussões federais.

A informação que chegou no Ministério Público Federal, portanto, ainda precisa


reunir provas mínimas, para que se possa decidir por se iniciar uma investigação mais
detalhada.

O procedimento preparatório, pois, é o instrumento para especificar esses


elementos que sustentarão uma investigação.

O PP terá início com a publicação de portaria de instauração.

No curso do procedimento preparatório, então, serão produzidas provas daqueles


fatos que precisam ser clarificados. O(a) procurador(a) da República poderá se valer de
todos os tipos de prova que entender pertinentes à investigação. Poderá: ouvir
testemunhas, solicitar documentos, ir ao local onde o dano supostamente está
acontecendo, dentre várias outras.

As provas vão sendo juntadas cronologicamente, à medida que vão sendo


concluídas, formando um caderno com todas as informações obtidas pelo Ministério
Público Federal.

Neste procedimento há a possibilidade de expedição de recomendações ou de


assinatura de termo de ajustamento de conduta (elementos mais bem estudados no
capítulo que versa sobre o inquérito civil).

Nos termos do § 6° do art. 2°, da Resolução nº 23, de 17 de setembro de2007 do


Conselho Nacional do Ministério Público 10, “o procedimento preparatório deverá ser
concluído no prazo de 90 (noventa) dias, prorrogável por igual prazo, uma única vez, em
caso de motivo justificável”.

10 BRASIL. Resolução CNMP nº 23, de 23 de setembro de 2007. Brasília, DF: Conselho Nacional do
Ministério Pùblico. [2007]. Disponível em:
https://www.cnmp.mp.br/portal/images/Normas/Resolucoes/Resoluo-0232.pdf. Acesso em 18 aug. 2022
Concluído o PP, há duas opções: ou o(a) membro(a) do Ministério Público Federal
ajuíza, de pronto, a ação civil pública pertinente, quando satisfeito com as provas colhidas
ou o procedimento preparatório é convertido em inquérito civil, para as investigações mais
robustas.
1.4 Inquérito Civil

O inquérito civil é um procedimento preparatório para a tutela de direitos ou


interesses que são da atribuição do Ministério Público. Conforme o art. 1° da Resolução
nº 231, de 08 de junho de 2021, do Conselho Nacional do Ministério Público 11, o
"inquérito civil, de natureza unilateral e facultativa, será instaurado para apurar fato que
possa autorizar a tutela dos interesses ou direitos a cargo do Ministério Público nos
termos da legislação aplicável, servindo como preparação para o exercício das atribuições
inerentes às suas funções institucionais".

Assim como no inquérito penal, o inquérito civil será instaurado para investigar a
existência, ou não, de um fato que possa demandar a atuação do Ministério Público. Ou
seja, o procedimento vai juntar provas, documentos, testemunhos e tudo o mais que for
necessário para verificar se algum direito ou interesse – de responsabilidade do Ministério
Público Federal– está sendo violado.

Mas ele não é um fim em si mesmo. Tudo o que é produzido no inquérito civil,
caso se entenda violado algum direito ou interesse público, justificará uma atuação do MP
para sanar a irregularidade. Ou seja, os documentos e provas que vão compondo o
inquérito civil vão ser utilizados para que o Ministério Público Federal tenha condições de
tomar decisões sobre como deve agir para garantir os direitos da sociedade que foram
violados.

O inquérito civil vai reunir, portanto, todas as provas de que o Ministério Público
Federal precisa ou para tomar uma providência administrativa, como é o compromisso de
ajustamento de conduta, ou, ainda, ajuizar uma ação específica, na qual se requererá ao
Poder Judiciário alguma medida que obrigue a parte a fazer alguma coisa para reparar o
direito ou interesse violado.

É importante destacar que, sendo um procedimento preparatório, ele não é


obrigatório para a atuação do Ministério Público. Se o(a) membro(a) do Ministério Público

11 BRASIL. Resolução nº 231 de 8 de junho de 2021. Brasília, DF: Conselho Nacional do Ministério
Público. [2021] Disponível em: https://www.cnmp.mp.br/portal/images/Resolucoes/2021/Resoluo-n-231-
2021.pdf. Acesso em 18 aug. 2022
já possui todas informações e provas de que necessita para o ajuizamento de ações
judiciais ou demais medidas de sua própria atribuição, pode, desde logo, realizá-las.

Não será preciso instaurar um inquérito civil, juntar todas as provas que já estão
produzidas, para só depois ajuizar a ação. Isso seria contraproducente e apenas uma
burocracia sem sentido. Se o(a) procurador(a) da República entender que os documentos
e as provas já são suficientes, basta tomar as providências que ele entender que
resolverão o problema.

Não há nenhum problema em tomar outras providências sem a instauração do


inquérito civil, mas ele será importante para a colheita de provas e informações mais
detalhadas quando o(a) membro(a) do Ministério Público Federal ainda não tiver certeza
de que aconteceu um ato danoso.
1.4.1 Instauração
O inquérito civil é instaurado mediante uma portaria, cujo teor tem, geralmente, o
seguinte texto:

Figura 04 – Portaria

Fonte: Print screen de documento cadastrado no Sistema Único. Adaptado pela autora a fim
de exemplificar o assunto estudado e preservar dados que possam ser sigilosos.
Quem pode pedir a instauração do inquérito civil?

O inquérito civil vai ser instaurado de ofício, pelo(a) próprio(a) Membro(a) do


Ministério Público Federal quando ele(ela) descobrir algum fato que potencialmente viole
interesse ou direito sujeito à tutela do Ministério Público. Implica dizer que o(a)
procurador(a) da República, sem necessidade de provocação, poderá determinar a
instauração do inquérito civil.

Nesse caso, se não for da atribuição do Ministério Público Federal, o(a)


procurador(a) da República deverá encaminhar comunicação para o Ministério Público
com atribuição para investigar. Por exemplo, se o membro do Ministério Público Federal
passa, no caminho de casa, por um outdoor que divulga propaganda que atenta contra o
consumidor, não será de atribuição do MP Federal, então, deve ser remetida a informação
para o Ministério Público Estadual.

Outra hipótese de instauração de inquérito civil é por ordem do(a) Procurador(a)-


Geral da República ou do Conselho Superior do Ministério Público Federal, Câmaras de
Coordenação e Revisão e demais órgãos superiores da instituição.

Também poderá ser instaurado em razão de representação formulada por


qualquer pessoa, física ou jurídica, já que é o Ministério Público o responsável por zelar
pelos direitos coletivos.

Ainda pode ser instaurado o inquérito civil em face de comunicação do Ministério


Público dos estados, dos demais ramos do Ministério Público da União (Ministério Público
do Trabalho, Ministério Público Militar ou Ministério Público do Distrito Federal e
Territórios), ou de qualquer outra autoridade pública ou organização civil.

Todavia, não basta a comunicação pelas pessoas listadas acima para que o
Inquérito Civil seja instaurado. A instauração não é automática.

Recebida a comunicação – vinda de qualquer fonte – o(a) membro(a) do


Ministério Público Federal vai analisar se a representação contém informações mínimas
essenciais sobre o fato, bem como sobre quem provavelmente o praticou, ou está
praticando, com uma indicação, ainda que não precisa, de onde seria possível localizar o
autor do ato irregular.
Veja que não é exigida a apresentação de todos os documentos comprobatórios
do ato danoso ou sua autoria, mas apenas informações iniciais, que possam convencer
o(a) membro(a) do Ministério Público Federal de que existem razões fortes para começar
uma investigação.

Com essas informações preliminares, o(a) procurador(a) da República, julgando


que são indícios suficientes para dar início a uma investigação, determina que o inquérito
civil seja instaurado, para que possam ser produzidas tantas provas quanto for necessário
para justificar qualquer ação do Ministério Público.

1.4.2 Arquivamento
Caso se entenda que os dados contidos na representação não apontam para uma
violação de direitos ou interesses tutelados pelo Ministério Público Federal, ou não seja
possível concluir a respeito de quem praticou o ato ilícito, ou o(a) procurador(a) da
República entenda que não há motivos para dar continuidade à investigação, o inquérito
civil será arquivado logo de pronto, nos termos do que prevê o art. 10 da Resolução do
Conselho Nacional do Ministério Público, nº 231/2021 12.

O arquivamento pode acontecer, também, depois de realizada toda a investigação


e o(a) membro(a) do Ministério Público Federal concluir que inexistem fundamentos para
propor a ação civil pública, daí promoverá, fundamentadamente, o arquivamento do
inquérito civil.

Da decisão de arquivamento, o(a) representante deve ser intimado(a), ainda na


primeira instância, para tomar conhecimento dos motivos pelos quais a investigação
pedida não justificou nenhuma ação extra ou judicial do Ministério Público Federal.

Uma vez intimado, ele(ela) poderá recorrer da decisão, solicitando que a


investigação tenha continuidade, porque convencido de que há uma violação de direitos
que deve ser resolvida pelo Ministério Público Federal.

O recurso vai ser protocolado no órgão que indeferiu o pedido, para dar a
oportunidade de reconsideração da decisão. Pode ser que os fundamentos apresentados
no recurso levem o(a) procurador(a) da República a olhar para a situação de outra forma
e, por isso, decida retomar a investigação no inquérito civil.

12 Idem
Contudo, se não reconsiderar sua decisão, deverá encaminhar o recurso, no
prazo de 3 dias, para a Câmara de Coordenação e Revisão ou para o Conselho Superior
do Ministério Público Federal.

Observe que, quando o inquérito civil foi instaurado para apurar uma questão que
é de atribuição do(a) Procurador(a)-Geral da República, não há órgão que lhe seja
superior, então não cabe um recurso propriamente dito.

Se o(a) representante não concordar com o arquivamento, ele(ela) poderá


apresentar um pedido de reconsideração, que será apreciado pelo próprio(a)
Procurador(a)-Geral da República, que decidirá se vai, ou não, voltar a investigar a
questão.

Quando as Câmaras de Coordenação e Revisão ou o Conselho Superior do


Ministério Público Federal receberem o recurso, deverão intimar todos os(as)
interessados(as) para que tomem conhecimento de que houve um recurso contra o
arquivamento do inquérito civil e para lhes dar oportunidade de se defender, pedindo a
manutenção da decisão que arquivou o feito 13.

Por outro lado, se o(a) representante nada falar, depois de intimado da decisão de
arquivamento, o inquérito civil deve ser arquivado definitivamente na própria origem. E se
encerra o procedimento de forma definitiva.

Depois de comunicado o(a) representante, a decisão de arquivamento deve ser


homologada pela Câmara de Coordenação e Revisão correspondente, exceto quando
fundado em orientação da CCR ou jurisprudência consolidada.

A Câmara de Coordenação e Revisão analisará a decisão de arquivamento,


podendo com ela concordar, o que levará ao arquivamento definitivo do inquérito civil.
Nesse caso, o inquérito somente poderá ser desarquivado se surgirem novas provas.

Há situações nas quais o pedido de homologação do arquivamento chega à


Câmara de Coordenação e Revisão e se entende que há fatos que não estão
devidamente claros. Neste caso, a Câmara de Coordenação e Revisão poderá converter
o julgamento em diligência, ou seja, vai aguardar para tomar sua decisão depois que
alguns fatos forem melhor esclarecidos. A câmara vai determinar que novas provas sejam
produzidas, como documentos, oitivas, declarações, recibos, quaisquer coisas que
13 Idem
possam esclarecer mais os fatos apurados. E com base nos esclarecimentos adicionais é
que a câmara vai tomar sua decisão.

As novas provas, ou seja, as explicações mais detalhadas dos fatos, que a


Câmara de Coordenação e Revisão solicitou, serão solicitadas ao(à) mesmo(a)
procurador(a) da República que investigou a questão, na primeira instância e decidiu pelo
arquivamento o inquérito civil. A Câmara de Coordenação e Revisão vai pedir que ele se
aprofunde mais na observação de uma ou outra questão pertinente ao processo.

Após realizadas as diligências solicitadas, o procedimento vai ser, novamente,


remetido à CCR, que apreciará a decisão de arquivamento.

É possível, contudo, que o(a) membro(a) que determinou o arquivamento do


inquérito civil IC se recuse a proceder novas diligências. Nesse caso, a Câmara de
Coordenação e Revisão vai designar outro(a) membro(a) do Ministério Público Federal
para realizá-las14.

Com as diligências complementares realizadas, a Câmara de Coordenação e


Revisão pode concordar ou discordar com o arquivamento do inquérito civil.

Havendo a discordância, a decisão da câmara será pela continuidade das


investigações no inquérito civil. Essa decisão será tomada em uma sessão pública e
precisa ser devidamente fundamentada.

Nesse caso, o órgão responsável pela promoção de arquivamento não


homologada pela Câmara de Coordenação e Revisão não poderá mais oficiar no
procedimento. Há necessidade, portanto, de ser providenciada a designação de outro
membro do Ministério Público Federal para prosseguir com as investigações no inquérito
civil.

1.4.3 Instrução

Não sendo caso de arquivamento, ou seja, se o(a) procurador(a) da República


entender que há indícios fortes de que um direito coletivo, um direito social ou individual
indisponível (relativo a meio ambiente, saúde, patrimônio público, por exemplo) foi lesado

14 Idem
ou sofre risco de lesão, podendo o fato narrado ensejar futura propositura de ação civil
pública, será dado início ao processamento do inquérito civil.

Os atos que se seguem serão, portanto, os de investigação, ou seja, o de


produção de provas e documentos para fundamentar as decisões futuras do Ministério
Público Federal.

Instruir é o ato de juntar provas, de incluir no processo todos os documentos que


serão necessários para uma análise da questão. Até porque o verbo “instruir” significa
“Dar ou receber informação ou orientação sobre algo” 15.

Na lição de Didier Júnior, Braga e Oliveira, “instrução probatória” tem sentido


restrito de “instrução da causa”: é o preparo dos elementos necessários para que uma
decisão seja promovida. Consiste, pois, na colheita e na produção de provas dos fatos
inicialmente deduzidos pelos requerentes 16.

Segundo Hélio Márcio Campo, o vocábulo prova “deriva do verbo latino probare
(demonstrar, reconhecer) e vem da palavra ‘proba’, cujos significados são diversos:
argumento, razão, confirmação”. Assim, a prova consiste num conjunto de atos praticados
pelo Ministério Público, com solicitações de dados e informações a diversos órgãos e
pessoas, cujo intento é proporcionar a certeza de que os fatos em apuração, de fato,
ocorreram e quem foram seus autores 17.

A instrução, portanto, é a reunião das provas que fundamentarão a decisão do(a)


membro(a) do Ministério Público Federal pelo ajuizamento da ação civil pública, seja por
ações internas ao Ministério Público Federal, seja pelo arquivamento do inquérito civil.
Decisão, esta, que deve ser calcada em uma certeza advinda de todas as provas que
foram produzidas. É essa certeza que permitirá ações justas em prol da sociedade.

Assim como no inquérito policial é o(a) delegado(a) quem coordena a produção


das provas, no inquérito civil, é o(a) membro(a) do Ministério Público Federal quem vai
presidir a instrução. Significa dizer que é o(a) procurador(a) da República quem vai tomar

15 INSTRUIR. Michaelis Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa. Dicionário online: Editora


Melhoramentos, 2015. Disponível em: http://michaelis.uol.com.br/busca?r=0&f=0&t=0&palavra=instruir.
Acesso em 9 set. 2022
16 DIDIER JÚNIOR, Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de Direito Processual
Civil: teoria da prova, direito probatório, teoria do precedente, decisão judicial, coisa julgada e antecipação
dos efeitos da tutela. 7a ed. Salvador: JusPodivm, 2012, v. 2, p. 102
17 CAMPO, Hélio Márcio. O princípio dispositivo em direito probatório. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 1994, pp. 17-18
as decisões como a quem pedir informações, quem deve ser ouvido, que dados devem
ser recolhidos.

O(a) Procurador(a) poderá contar com o apoio de servidor(a), especialmente


designado para secretariar o inquérito, bem como toda a estrutura administrativa da
unidade. Além disso, poderá ele(ela) pedir para que outros órgãos públicos executem
diretamente a diligência necessária.

Por exemplo, se há necessidade de reunir um número grande de guias de


controle ambiental numa investigação de transporte clandestino de madeira, poderá o(a)
procurador(a) da República requisitar ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis que junte esses documentos e depois remeta para o
Ministério Público Federal. Seria contraproducente, pois, que o(a) próprio(a) procurador(a)
fosse até o órgão ambiental e procurasse a documentação, não é?

Esses pedidos, contudo, devem sempre estar fundamentados, explicando


exatamente para que aquelas provas devem ser produzidas. Além disso, é preciso juntar
cópia da portaria que instaurou o inquérito civil.

Que provas podem ser produzidas?

A resposta é todas. Tudo o que for possível trazer ao procedimento, para dar
clareza ao que está sendo apurado, deve ser trazido. A ideia, aqui, é ter o máximo de
certeza de como tudo transcorreu, daí, não há nenhuma limitação para quais provas
podem ser juntadas.

Podem fazer parte dos autos reportagens de televisão, depoimento de


testemunhas, vídeos de segurança, bilhetes, mensagens de aplicativos e tudo mais que
possa comprovar algum dos fatos relacionados à investigação.

Vale dizer, por outro lado, que não basta que essas provas existam, elas devem
ser juntadas no inquérito civil, em ordem cronológica. Para os documentos não há como
ter muitas dúvidas, basta fazer a juntada, mas os demais atos, se não puderem ser
juntados, devem ser reduzidos a termo ou mediante auto circunstanciado.

Reduzir a termo significa que o(a) servidor(a), com a fé pública que tem, irá
transcrever para o papel as declarações, os depoimentos e tudo mais que as pessoas
ouvidas estão informando. Essas declarações devem ser assinadas por todos os
presentes, o(a) procurador(a) da República, o(a) servidor(a) responsável, a pessoa ouvida
e eventuais testemunhas do que está sendo dito. Caso a pessoa ouvida se recuse a
assinar, o documento vai ser assinado por duas testemunhas que ouviram o que foi dito.

Já o conceito de auto circunstanciado está no Código de Processo Civil:

Art. 484. Concluída a diligência, o juiz mandará lavrar auto circunstanciado,


mencionando nele tudo quanto for útil ao julgamento da causa.
Parágrafo único. O auto poderá ser instruído com desenho, gráfico ou
fotografia18.

Veja que o auto circunstanciado, então, é uma certidão contando tudo o que
aconteceu em uma diligência realizada. Por exemplo, numa investigação de um dano
ambiental, se o(a) procurador(a) decidir ir até o local para verificar, essa visita deve estar
detalhadamente descrita no inquérito civil. Tudo o que foi feito, todas as pessoas que
foram ouvidas, a descrição do local, todas as impressões que se teve com a visita e tudo
mais que foi constatado devem estar incluídos no procedimento. O nome dessa descrição
é auto circunstanciado.

Então, documentos, depoimentos reduzidos a termo e autos circunstanciados,


são todos instrumentos para que provas passem a fazer parte da investigação em curso
no inquérito civil.

É importante dizer que se algum cidadão tiver informações e decidir comunicar ao


Ministério Público Federal, essas informações são muito bem-vindas. Qualquer um pode
trazer dados que ajudem o procurador a elucidar as questões investigadas.

Como fica o(a) representado(a)?

Quem está sendo investigado no inquérito civil tem direito a saber o que está
sendo apurado. Daí, tudo o que é feito nos autos do inquérito civil é público e pode ser
acessado tanto pelo(a) investigado(a), como por qualquer outra pessoa.

Isso obriga que tudo o que for feito no procedimento esteja acessível a quem
quiser consultar: ao(à) representante, ao(à) investigado(a), aos órgãos de controle, às
organizações civis, à imprensa. Isso se dá por meio das publicações oficiais, como é caso

18 BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em 18 aug. 2022.
do Diário Oficial, por respostas diretas a questionamentos formulados, bem como pelo
Portal da Transparência.

Figura 05 – Portal da transparência

Fonte: Print screen de documento cadastrado no Sistema Único. Adaptado pela autora a fim de exemplificar
o assunto estudado e preservar dados que possam ser sigilosos.

No Portal da Transparência do Ministério Público Federal há uma opção


especialmente desenhada para que o cidadão tenha acesso à tramitação dos inquéritos
civis:
Figura 06 – Portal da Transparência – inquéritos civis

Fonte: Print screen de documento cadastrado no Sistema Único. Adaptado pela autora a fim de
exemplificar o assunto estudado e preservar dados que possam ser sigilosos.

Lá as informações são detalhadas. Assim, é possível consultar um inquérito civil


específico ou visualizar toda a atuação do Ministério Público, como, por exemplo, no
mapa da atuação, por matéria e por cidade.
Figura 07 – Portal da Transparência – Mapa de atuação

Fonte: Print screen de documento cadastrado no Sistema Único. Adaptado pela autora a fim de exemplificar
o assunto estudado e preservar dados que possam ser sigilosos..

Veja que qualquer pessoa pode visualizar como o Ministério Público Federal está
atuando nas investigações de “indícios fortes de que um direito coletivo, um direito social
ou individual indisponível (relativo a meio ambiente, saúde, patrimônio público, por
exemplo) foi lesado ou sofre risco de lesão, podendo o fato narrado ensejar futura
propositura de ação civil pública”19.

A publicidade tem duas vantagens: a primeira é permitir que a sociedade fiscalize


a atuação do Ministério Público, para que desenvolva cada vez melhor suas funções
institucionais; e a segunda é permitir que as partes envolvidas (representante e
representado(a)) também tenham ciência, online, de tudo o que está acontecendo na
investigação em curso.

A Resolução Conselho Nacional do Ministério Público 23/2007 explicita quais atos


devem ser realizados para que a publicidade seja plenamente atendida:

19 BRASIL. Portal da Transparência. Ministério Público Federal. Disponível em:


http://www.transparencia.Ministério Público Federal.mp.br/conteudo/atividade-fim/inqueritos-civis ,
Acesso em 10 set. 2022
• divulgação oficial, com o exclusivo fim de conhecimento público mediante
publicação de extratos na imprensa oficial;

• divulgação em meios cibernéticos ou eletrônicos, dela devendo constar as


portarias de instauração e extratos dos atos de conclusão;

• expedição de certidão e extração de cópias sobre os fatos investigados,


mediante requerimento fundamentado e por deferimento do presidente do inquérito
civil;

• prestação de informações ao público em geral, a critério do presidente do


inquérito civil.

Tem-se que, se as informações constantes no Portal da Transparência ou no


Diário Oficial ainda não forem suficientes, ainda se permite que o(a) representante ou
representado(a), ou mesmo qualquer cidadão, possa pedir, diretamente ao(à)
procurador(a) responsável pelo inquérito, mais informações.

A publicidade fica excepcionada, contudo, se alguma das ações tomadas no


âmbito do inquérito civil estiver sujeita ao sigilo legal.

Isso ocorrerá quando existirem razões para proteger os(as) interessados(as),


como no caso de investigação que envolva crianças; ou quando eventual publicidade
poderá prejudicar a investigação, como, por exemplo, quando a ciência de uma
investigação em curso faça com que os(as) investigados(as) destruam provas.

São inúmeras as situações que podem justificar o sigilo da investigação civil.


Dessa forma, como será necessário analisar caso a caso, o sigilo não é automático, ele
será sempre atribuído por uma decisão. O(a) procurador(a) da República, portanto,
quando receber a representação, antes de qualquer outra ação, analisará se é o caso de
atribuir sigilo à investigação ou, ao menos, a parte da investigação.

Vale dizer que “A restrição à publicidade deverá ser decretada em decisão


motivada, para fins do interesse público, e poderá ser, conforme o caso, limitada a
determinadas pessoas, provas, informações, dados, períodos ou fases, cessando quando
extinta a causa que a motivou”20.

20 BRASIL. Resolução nº 23, de 17 de setembro de 2007. Brasília, DF: Conselho Nacional do Ministério
Público. Disponível em: https://www.cnmp.mp.br/portal/images/Normas/Resolucao-
Conjunta/Resoluao_23.odt#:~:text=%C2%A74%C2%BA%20A%20restri%C3%A7%C3%A3o%20%C3%A0,a
%20causa%20que%20a%20motivou, . Acesso em 18 aug. 2022
Para aquele que está sendo investigado no inquérito civil, há que se fazer
algumas observações.

Primeiramente, o(a) investigado(a) não é processado, pois ainda não está sendo
acusado de nada. O caso ainda está na fase de apuração para conferir se o fato danoso
ocorreu e, ainda, se é o(a) investigado(a) quem deve ser responsabilizado(a).

Contudo, há uma investigação contra ele(ela), o que o coloca numa situação


peculiar. Daí se possibilitar que o(a) investigado(a) possa participar de todos os atos
realizados no procedimento, acompanhado de advogado(a) constituído(a).

Havendo a indicação de um(a) advogado(a), inclusive, será considerada nulidade


absoluta – que invalida todos os atos do procedimento – a realização de qualquer ato,
sem a sua presença, isso inclui o depoimento pessoal do(a) investigado(a). Uma vez que
o(a) investigado(a) informou que será assistido por um(a) advogado(a), todos os atos que
se seguem devem permitir a presença do defensor(a).

O(a) advogado(a) poderá, inclusive, examinar autos de investigação já


encerrados ou em andamento e tirar cópias de documentos, no todo ou em parte, mesmo
que não tenha procuração nos autos. Até porque, a qualquer cidadão seria possível fazê-
lo, quiçá o(a) advogado(a) que está ali para defender os interesses do(a) investigado(a).

Todavia, para que o(a) advogado(a) tenha acesso a provas e documentos


sigilosos, a procuração será exigida. Nas partes do inquérito civil que estão resguardadas
pelo sigilo, “o presidente do inquérito civil poderá delimitar, de modo fundamentado, o
acesso do defensor à identificação do(s) representante(s) e aos elementos de prova
relacionados a diligências em andamento e ainda não documentados nos autos, quando
houver risco de comprometimento da eficiência, da eficácia ou da finalidade das
diligências” 21).

1.4.4 Do prazo

O inquérito civil deverá ser concluído no prazo de um ano, prorrogável pelo


mesmo prazo e quantas vezes forem necessárias, por decisão fundamentada de seu
presidente, à vista da imprescindibilidade da realização ou conclusão de diligências,

21 BRASIL. Resolução nº 23, de 17 de setembro de 2007. Brasília, DF: Conselho Nacional do Ministério
Público. [2007]. Disponível em: https://www.cnmp.mp.br/portal/images/Normas/Resolucoes/Resoluo-
0232.pdf, Acesso em 18 aug. 2022
dando-se ciência ao Conselho Superior do Ministério Público, à Câmara de Coordenação
e Revisão ou à Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão.

A Portaria 291, de 27 de novembro de 2017, da 22 Corregedoria Nacional -


Conselho Nacional do Ministério Público - estabelece que a duração razoável dos
procedimentos administrativos de natureza investigatória, como é o inquérito civil, é de até
3 anos.

Contudo, há situações excepcionais que justificam a continuidade da investigação


mesmo por período superior a esse prazo. Veja-se, por exemplo, a investigação sobre um
garimpo clandestino dentro de uma reserva indígena. Essa investigação, certamente,
levará muito mais tempo que aquele prazo inicialmente firmado, dada a tramitação mais
complexa das questões indígenas e ambientais.

Não haverá irregularidade, pois, se o inquérito civil permanecer em andamento


após o prazo de 3 anos. Contudo, para fins de correição, será necessário justificar a não
conclusão da investigação.

1.4.5 Das providências passíveis de serem adotadas pelo próprio Ministério


Público Federal

No curso das investigações, no inquérito civil, é possível que o(a) procurador(a)


da República entenda ser o caso de tomar algumas providências que possam solucionar
a questão, mesmo sem o ajuizamento da ação civil pública. Ou seja, o próprio Ministério
Público Federal poderia, extrajudicialmente, resolver a controvérsia, sem a necessidade
de levar a questão para o Poder Judiciário.

As recomendações são documentos emitidos pelos(as) membros(as) do


Ministério Público Federal a órgãos públicos, para que cumpram determinados
dispositivos constitucionais ou legais. As recomendações são expedidas para orientar
sobre a necessidade de observar as normas e visam à adoção de medidas práticas para
sanar questões pelo órgão competente. A adoção da recomendação pelo seu destinatário
pode evitar que ele seja acionado judicialmente.

22 BRASIL. Portaria 291, de 27 de novembro de 2017. Brasília, DF: Corregedoria Nacional do CNMP.
Disponível em:
https://www.cnmp.mp.br/portal/images/Corregedoria/Portarias_2017/Portaria_CN_n_291_-
_parmetros.pdf. Acesso em 18 aug. 2022
A Resolução nº 164, de 28 de março de 2017, do Conselho Nacional do Ministério
Público, conceitua recomendação como "instrumento de atuação extrajudicial do
Ministério Público por intermédio do qual este expõe, em ato formal, razões fáticas e
jurídicas sobre determinada questão, com o objetivo de persuadir o destinatário a praticar
ou deixar de praticar determinados atos em benefício da melhoria dos serviços públicos e
de relevância pública ou do respeito aos interesses, direitos e bens defendidos pela
instituição, atuando, assim, como instrumento de prevenção de responsabilidades ou
correção de condutas."23 Essa é uma iniciativa que permite uma atuação mais resolutiva
do Ministério Público Federal, pondo fim ao conflito mais rapidamente que por meio da
tramitação judicial da questão.

Pode-se expedir recomendações devidamente fundamentadas, visando à


melhoria dos serviços públicos e de relevância pública, bem como aos demais interesses,
direitos e bens cuja defesa lhe caiba promover.

Existindo indícios fortes de que um direito coletivo, um direito social ou individual


indisponível foi lesado ou sofre risco de lesão, poderá ser recomendada a adoção de uma
série de medidas para evitar que o dano ocorra ou continue a ocorrer.

Mesmo que não haja reconhecimento da prática do ato danoso, aquele(a) que
está sendo investigado(a) no inquérito civil pode, desde logo, adotar as medidas
recomendadas pelo Ministério Público e sanar a questão investigada. Isso vai levar ao
arquivamento do IC e à solução da controvérsia que justificou sua autuação.

Segue um exemplo de recomendação, que foi expedida na própria portaria que


instaurou o inquérito civil:

23 BRASIL. Resolução 164, de 28 de março de 2017. Brasília, DF: Conselho Nacional do Ministério Público.
Disponível em: https://www.cnmp.mp.br/portal/images/Corregedoria/Portarias_2017/Portaria_CN_n_291_-
_parmetros.pdf. Acesso em 18 aug. 2022
Figura 08 – Recomendação

Fonte: Print screen de documento cadastrado no Sistema Único. Adaptado pela autora a fim de
exemplificar o assunto estudado e preservar dados que possam ser sigilosos..

Veja que não se tratam, nesse caso, de medidas equiparadas à sanção


pretendida com futura ação civil pública, mas ações que resolverão o problema de modo
preliminar, sem a necessidade de prosseguimento da investigação. Confira-se o parágrafo
único do art. 1° da Resolução 164/ 2017 do Conselho Nacional do Ministério Público 24.

A recomendação no exemplo apresentado manda que uma empresa que,


potencialmente, está praticando um ilícito ambiental apresente um plano de recuperação
da área degradada. Não se trata, exatamente, de uma punição, mas de uma anotação de
que o Ministério Público está acompanhando a degradação da área e orientando a
empresa a apresentar um plano de recuperação.

Uma vez atendida essa recomendação, o inquérito civil é arquivado, porque os


motivos pelos quais foi instaurado já não existem mais, visto que a área degradada está
sendo recuperada.

24 idem
Segue outro exemplo de recomendação:

Figura 09– Recomendação

Fonte: Print screen de documento cadastrado no Sistema Único. Adaptado pela autora a fim de
exemplificar o assunto estudado e preservar dados que possam ser sigilosos..

Cuida-se de recomendação para que gestora de hospital apresente documentos


aptos a demonstrar o gasto dos recursos públicos que são repassados à entidade
privada. Uma vez que esteja cumprida a recomendação e que todos os dados estejam de
acordo com a legalidade, é o caso de arquivamento do inquérito civil. Em oposição, não
atendida, seguirá a investigação e suas decorrências lógicas.

Outra ferramenta, antes da judicialização da questão é o compromisso de


ajustamento de conduta, ou termo de ajustamento de conduta.

Esse é um instrumento muito importante na atuação do Ministério Público Federal


e ressalta suas funções institucionais.
O termo de ajustamento de conduta é um acordo que o Ministério Público celebra
com o(a) violador(a) de determinado direito coletivo. Esse instrumento tem a finalidade de
impedir a continuidade da situação de ilegalidade, reparar o dano ao direito coletivo e
evitar a ação judicial.

O termo de ajustamento de conduta está previsto no art. 5º, § 6º, da Lei n.


7.347/8525. É uma espécie de contrato firmado pelo Ministério Público, como legitimado
para a propositura da ação civil pública ou coletiva e pessoa causadora de dano a
interesses transindividuais (meio ambiente, consumidor, patrimônio cultural, ordem
urbanística etc.). Nesse contrato, o(a) investigado(a) se obriga a adequar sua conduta às
exigências da lei, sob pena das punições previstas no próprio termo de ajustamento de
condutas.

25 BRASIL. Lei nº 7347, de 24 de julho de 1985. Brasília, DF: Presidência da República [1985]. Disponível
em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7347orig.htm. Acesso em 18 aug. 2022.
Figura 10 – Termo de compromisso de termo de ajustamento de condutas

Fonte: Print screen de documento cadastrado no Sistema Único. Adaptado pela autora a fim de
exemplificar o assunto estudado e preservar dados que possam ser sigilosos.

E, ao final, já estabelece quais são as formas de punição pelo descumprimento do


acordo:
Figura 11 – Cláusula de inadimplemento

Fonte: Print screen de documento cadastrado no Sistema Único. Adaptado pela autora a fim de
exemplificar o assunto estudado e preservar dados que possam ser sigilosos..

A anotação que precisa ser feita é que esse compromisso é um título executivo
extrajudicial. O que quer dizer isso? É um documento que, por si só, já autoriza a
execução da sanção ali estabelecida. Não será necessário, como acontece com os
demais contratos, que o Poder Judiciário, antes de aplicar as punições, reconheça a
validade do documento e discuta quem tem a responsabilidade de pagar.

Estando firmado o termo de ajustamento de condutas e demonstrado o seu


descumprimento, o juiz apenas vai determinar que a parte cumpra aquelas sanções
estabelecidas pelo descumprimento.

1.5 Ação Civil Pública

Finalizada a investigação no inquérito civil, há duas opções: a) o arquivamento, se


o procurador da República se convencer que não há dano ao patrimônio público e
interesses coletivos; ou b) o ajuizamento de ação civil pública.
A ação civil pública está prevista na Lei 7.347/85 26 e consiste num procedimento
judicial destinado a promover a tutela de direito coletivo, direito social ou individual
indisponível (relativo a meio ambiente, saúde, patrimônio público, por exemplo). Ou seja,
é o meio adequado para provocar o Poder Judiciário a preservar os direitos fundamentais
garantidos pela Constituição.

A questão vai passar a ser discutida, portanto, no Poder Judiciário, onde o(a)
investigado(a) – agora réu – vai poder se defender e, ao final, haverá uma sentença
condenando-o(a), ou não, à reparação do dano que justificou a ação.

26 BRASIL. Lei nº 7347, de 24 de julho de 1985. Disponível em:


http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7347orig.htm. Acesso em 18 aug. 2022.
MÓDULO II - PROCEDIMENTOS CRIMINAIS

2.1 Notícia de Fato


Notícia de fato “é qualquer demanda dirigida aos órgãos da atividade-fim do
Ministério Público, submetida à apreciação das Procuradorias e Promotorias de Justiça,
conforme as atribuições das respectivas áreas de atuação, podendo ser formulada
presencialmente ou não, entendendo-se como tal a realização de atendimentos, bem
como a entrada de notícias, documentos, requerimentos ou representações” 27).

Ou seja, é um documento, uma carta, um e-mail, uma fala que informa o


Ministério Público Federal sobre algo que não está certo e pede sua atuação para
resolver a questão.

As notícias de fato têm natureza criminal, quando informam a prática de um crime,


e estão previstas no Código de Processo Penal:

Art. 27. Qualquer pessoa do povo poderá provocar a iniciativa do Ministério


Público, nos casos em que caiba a ação pública, fornecendo-lhe, por
escrito, informações sobre o fato e a autoria e indicando o tempo, o lugar e
os elementos de convicção.

Assim, como as notícias de fato podem noticiar um dano ao patrimônio da União


ou a um interesse coletivo ou uma violação a direitos fundamentais e sociais, tudo isso vai
demandar uma ação cível do procurador. A regra está prevista na Lei da Ação Civil
Pública:

Art. 6º Qualquer pessoa poderá, e o servidor público deverá provocar a


iniciativa do Ministério Público, ministrando-lhe informações sobre fatos
que constituam objeto da ação civil e indicando-lhe os elementos de
convicção.

27 BRASIL. Resolução nº 174, de 04 de julho de 2017. Brasília, DF: Conselho Nacional do Ministério
Público. [2017]. Disponível em https://www.cnmp.mp.br/portal/atos-e-normas/norma/5192. Acesso em 18
aug. 2022
As informações prestadas podem levar o Ministério Público Federal a uma
atuação efetiva, como, por exemplo, para denunciar a prática de um crime ou evitar um
desmatamento de uma área florestal ou, ainda, combater o trabalho escravo ou tráfico de
pessoas.

Então, em resumo, a notícia de fato é só uma comunicação de um acontecimento,


que poderá provocar uma atuação do Ministério Público.

E a forma como se deve fazer para processar a notícia de fato está na Resolução
do Conselho Nacional do Ministério Público, nº 174/2017 28.

Qualquer pessoa, física ou jurídica, associação civil, instituição pública poderá vir
até o Ministério Público para narrar uma situação que, no seu entender, necessitaria da
atuação do órgão.

A) O(a) cidadão(ã) pode ir até a sede do Ministério Público Federal e entregar,


pessoalmente, os documentos sobre um fato que ele entende que o Ministério Público
Federal precisa agir. Ou se não puder, ou não souber escrever, poderá comunicar a
situação para um(a) servidor(a), que reduzirá a fala a termo, ou seja, escreverá, pelo(a)
cidadão(ã) a notícia que ele está apresentando. Em ambas as situações a petição e os
documentos entregues deverão ser digitalizados e incluídos, por quem recebeu, no
Sistema Único;

B) Se o(a) cidadão(ã) não quiser – ou não puder – ir até a sede do Ministério


Público Federal, poderá fazer registro eletrônico da notícia de fato e da documentação
pela sala de atendimento ao cidadão (https://www.mpf.mp.br/servicos/sac)

28 Idem
Figura 12 – Sala de Atendimento ao Cidadão

Fonte: print screen da Sala de Atendimento ao Cidadão.

C) Se for uma pessoa jurídica, ela vai precisar fazer a notícia do fato,
obrigatoriamente, por meio do protocolo eletrônico
(https://apps.mpf.mp.br/ouvidoria/app/protocolo/) (:

Figura 13 – Protocolo Eletrônico do MPF

Fonte: print screen do Protocolo Eletrônico do MPF.


Uma notícia de fato pode ser apresentada por um(a) juiz(a), de maneira bastante
simples, apenas encaminhando documentos e perguntando se o Ministério Público
Federal entende tratar-se de crime.

No exemplo a seguir, o juiz provoca o Ministério Público Federal para que


verifique se houve, ou não, o crime de desobediência, pelo descumprimento de ordem por
ele proferida. O documento é bastante simples, apenas encaminha os documentos do
processo:

Figura 14 – Notícia de Fato

Fonte: Print screen de documento cadastrado no Sistema Único. Adaptado pela autora a fim de
exemplificar o assunto estudado e preservar dados que possam ser sigilosos..

A notícia de fato também pode vir de um órgão de governo e narrar uma prática
irregular, não necessariamente um crime, mas que vai demandar uma atuação efetiva do
Ministério Público Federal.

No exemplo a seguir, a Agência Nacional de Mineração está informando ao


Ministério Público que há uma situação de extração de areia, sem a devida autorização:
Figura 15 - Ofício

Fonte: Print screen de documento cadastrado no Sistema Único. Adaptado pela autora a fim de
exemplificar o assunto estudado e preservar dados que possam ser sigilosos..

Uma notícia de fato também pode vir de um(a) cidadão(ã), como no exemplo a
seguir, em que foram narrados fatos supostamente criminosos, por meio da Sala de
Atendimento ao Cidadão:
Figura 16– Manifestação Sala de Atendimento ao Cidadão

Fonte: Print screen de documento cadastrado no Sistema Único. Adaptado pela autora a fim de
exemplificar o assunto estudado e preservar dados que possam ser sigilosos.

O documento, com a narrativa e as provas do que foi informado, será aleatória e


eletronicamente distribuído entre os(as) membros(as) da unidade onde foi apresentada.

E quando o fato corresponder a procedimento em curso, a distribuição será feita


por prevenção. Ou seja, se a notícia de fato contiver informações que já estão sendo
investigadas, o(a) mesmo(a) procurador(a) irá tomar conhecimento daqueles novos fatos
e continuará a investigação em curso.

O(a) procurador(a) que recebeu a notícia de fato pode entender que a atribuição
para apreciar aquele pedido é de outro órgão do Ministério Público Federal ou do
Ministério Público estadual, daí basta fazer o declínio de sua atribuição e a remessa para
o órgão que ele entende ter a atribuição para tomar alguma atitude em relação aos fatos
noticiados.

Essa remessa não precisa de homologação do Conselho Superior do Ministério


Público Federal ou da Câmara a que o ofício está vinculado, em duas hipóteses:

a) quando não houver nenhuma dúvida de que a atribuição para apreciar a notícia
de fato for daquele que a recebeu em primeiro lugar; ou

b) a remessa estiver fundamentada em orientação, regulamento ou jurisprudência


já pacificada no conselho ou nas Câmaras de Coordenação e Revisão.

Nos demais casos, o declínio de atribuição depende do aval das Câmaras de


Coordenação e Revisão.

Se for reconhecida a atribuição daquela unidade do Ministério Público Federal,


ainda não é necessário a autuação de um procedimento. O(a) procurador(a) poderá
promover o arquivamento de plano, ou seja, o próprio documento que foi apresentado
poderá ser arquivado, sem precisar de autuação.

Isso ocorre quando o fato é inverossímil, como por exemplo, o(a) cidadão(ã) pedir
providências porque foi abduzido por extraterrestres; ou quando o que está sendo
informado não se refere a nenhuma das atribuições do Ministério Público, como uma briga
de vizinhos ou a guarda compartilhada de animais de estimação.

Nessas situações, sendo flagrantemente impossível qualquer ação positiva do


MP, a norma autoriza que o expediente apresentado seja arquivado, sem mesmo precisar
ser autuado como notícia de fato.

A Resolução do Conselho Nacional do Ministério Público, nº 174/2017 é que


fundamenta esse arquivamento, autorizando-o nas seguintes hipóteses:

A) quando o fato narrado não configurar lesão ou ameaça de lesão aos interesses
ou direitos tutelados pelo Ministério Público; ou

B) o que está comunicado for incompreensível.


Se não for o caso de arquivamento de plano, a notícia de fato deve ser autuada,
tornando-se um procedimento. A partir daí, começam a ser juntadas provas e
informações, para que o procurador vá formando seu convencimento.

Isso vale tanto para a matéria cível, quanto criminal.

Veja que esse é um procedimento preliminar, no qual o(a) procurador(a) da


República fará uma análise inicial do que lhe está sendo narrado. A partir dessas
informações, poderá tomar inúmeras providências, como o ajuizamento de ações, ou a
propositura de termos de ajustamento de conduta.

O(a) membro(a) do Ministério Público Federal precisará apreciar a notícia de fato


em até 30 dias, prorrogáveis por mais 90 dias – totalizando 120 dias. Se esse prazo
expirar, a investigação deverá ser convertida no processo próprio: inquérito civil ou
procedimento de investigação criminal 29.

Analisando tudo o que foi produzido nos autos, ou seja, todas as provas e
documentos que foram juntadas no processo, o procurador vai decidir quais serão os
próximos passos.

A notícia de fato vai ser arquivada, sem que seja tomada nenhuma providência,
quando:

A) o fato narrado já tiver sido objeto de investigação ou de ação judicial ou já se


encontrar solucionado. Não faria sentido ter uma nova investigação quando se percebe
que aqueles fatos já foram investigados e já se chegou a alguma solução, que pode ser o
arquivamento, uma denúncia criminal ou uma providência cível;

B) a lesão ao bem jurídico tutelado for manifestamente insignificante, nos termos


de jurisprudência consolidada ou orientação do Conselho Superior ou das Câmaras de
Coordenação e Revisão. Para o furto de uma caneta, de dentro de um órgão de um dos
três Poderes da União, não justifica movimentar toda a máquina pública, que é cara, para
a punição do seu autor;

Assim, se a questão for mesmo insignificante, não representar uma conduta que
represente uma afronta, de fato, à sociedade, não justifica a atuação do Ministério Público

29 BRASIL. Resolução nº 174 de 4 de julho de 2017. Brasília, DF: Conselho Nacional do Ministério Público.
[2017]. Disponível em https://www.cnmp.mp.br/portal/atos-e-normas/norma/5192. Acesso em 18 aug. 2022
Federal. Essas hipóteses vão se consolidando ao longo do tempo e se transformam em
orientações e enunciados das Câmaras de Coordenação e Revisão. Daí, com base
nessas orientações e enunciados, fica o procurador autorizado a arquivar a notícia de
fato.

C) for desprovida de elementos de prova ou de informação mínimos para o início


de uma apuração e o noticiante não atender à intimação para complementá-la.

A notícia de fato não precisa vir acompanhada de todas as provas necessárias


para a condenação criminal de uma pessoa ou para a sanção de alguém que está
violando direitos e interesses fundamentais coletivos. É a notícia de fato uma
comunicação que dará ensejo a uma atuação do Ministério Público, que poderá fazer
mais investigações, reunir mais provas, para só então tomar uma atitude.

Todavia, o(a) representante precisa apresentar um mínimo de provas. Se não


houver qualquer documento ou elemento que possa dar início a essa investigação, não há
como dar seguimento.

Veja exemplo de arquivamento de notícia de fato exatamente por esse


fundamento:
Figura 17 – Petição de arquivamento

Fonte: Print screen de documento cadastrado no Sistema Único. Adaptado pela autora a fim
de exemplificar o assunto estudado e preservar dados que possam ser sigilosos.

A notícia de fato também poderá ser arquivada quando seu objeto puder ser
solucionado em atuação mais ampla e mais resolutiva, mediante ações, projetos e
programas alinhados ao Planejamento Estratégico de cada ramo, com vistas à
concretização da unidade institucional.
Essa é a melhor maneira de solucionar a demanda que foi apresentada ao
Ministério Público Federal.

Se com a informação recebida, o(a) procurador(a) da República decidir que vai


tomar providências que melhorem a vida da comunidade, ainda que extrapolem o pedido
feito, isso será muito melhor do que propor uma ação judicial, porque é mais célere e
resolve a controvérsia, não apenas punindo o(a) agente acusado(a), mas proporcionando
uma efetiva reparação do dano.

Isso pode ser muito simples, como mandar um ofício para que um órgão público
pare de realizar determinada ação, de maneira que ele decida, por causa disso, modificar
seu fluxo de trabalho.

Ou pode ser mais complexo, como propor ao Poder Executivo toda uma política
pública ou um projeto de lei.

Mas, se essas ações resolverem a questão, especialmente sem precisar ir ao


Poder Judiciário, o Ministério Público Federal terá atendido aos anseios da sociedade de
uma forma muito mais eficiente e rápida.

Ainda que autorizado, pela norma regente e pelas Câmaras de Coordenação e


Revisão, a arquivar a notícia de fato, o(a) procurador(a) da República ao fazê-lo deve
comunicar sua decisão àquele(a) que apresentou a notícia de fato. O(a) noticiante precisa
ser informado(a) da decisão de arquivamento, para que tenha oportunidade de recorrer da
decisão do(a) Procurador(a) da República e pedir o andamento daquele pedido de
providências.

Esse recurso precisa ser interposto em até 10 dias, na secretaria da unidade onde
foi apresentada a notícia de fato, ou pelo peticionamento eletrônico
(www.peticionamento.Ministério Público Federal.mp.br ).

O(a) procurador(a) da República que havia arquivado a notícia de fato vai ler o
recurso e, caso se convença que o(a) cidadão(ã) tem razão, poderá proceder o
desarquivamento da notícia de fato e continuar a investigação. Contudo, se decidir manter
sua posição, o recurso deve ser encaminhado para a Câmara de Coordenação e Revisão
respectiva, que realizará o julgamento do recurso.
A notificação fica dispensada quando a notícia de fato vier de um órgão de
governo, que deveria mandar a informação ao MP. Por exemplo, a Receita Federal,
sempre que houver uma situação de sonegação fiscal, deve encaminhar a informação
para o Ministério Público Federal para que dê andamento à ação penal pelo crime de
sonegação.

Essa é uma notícia de um fato – sonegação fiscal – que vai justificar a ação do
Ministério Público Federal. Mas, como foi enviada notícia de fato, porque a lei determina
que a Receita Federal o faça, não há necessidade de notificá-la no caso de arquivamento.

Se não houver recurso do arquivamento, ela permanece arquivada na unidade do


Ministério Público Federal que recebeu a notícia de fato.

Concluído que não é caso de arquivamento, o(a) procurador(a) da República deve


dar prosseguimento à investigação. Se dentro do prazo da notícia de fato (30 dias,
prorrogáveis por mais 90), juntar todas as provas de que necessita e estiver convencido
da verdade do que foi noticiado, poderá, já, apresentar a denúncia criminal ou a ação civil
pública perante o Poder Judiciário. Não há necessidade de se autuar nenhum outro
procedimento, a própria notícia de fato já pode justificar uma ação judicial.

Se forem juntadas provas suficientes e convencerem o(a) procurador(a) de que


houve o crime, ou que há uma lesão ao patrimônio da União, e não há outro jeito de
solucionar a demanda, apresenta-se ao Poder Judiciário o pedido de condenação. E será
o Judiciário quem vai julgar o caso.

Pode acontecer de o prazo da notícia de fato esgotar e ainda ser necessário


tomar outras providências de investigação. Não há problema, basta converter a notícia de
fato em procedimento administrativo, procedimento preparatório, procedimento de
investigação criminal ou inquérito civil.

Esses dois processos têm natureza e objetivo próprios; já tratamos do inquérito


civil no primeiro módulo e a seguir falaremos do processo de investigação criminal.
2.2 Procedimento Investigatório Criminal

O procedimento investigatório criminal é instaurado por membro(a) do Ministério


Público e tem como finalidade apurar a ocorrência de infrações penais de natureza
pública, servindo como preparação e embasamento para o juízo de propositura, ou não,
da respectiva ação penal.

A Resolução do Conselho Nacional do Ministério Público nº 181, de 07 de agosto


de 201730, assim conceitua o Procedimento Investigatório Criminal:

Art. 1º O procedimento investigatório criminal é instrumento sumário e


desburocratizado de natureza administrativa e investigatória, instaurado e
presidido pelo membro do Ministério Público com atribuição criminal, e terá
como finalidade apurar a ocorrência de infrações penais de iniciativa
pública, servindo como preparação e embasamento para o juízo de
propositura, ou não, da respectiva ação penal.

No âmbito do Ministério Público Federal, a Resolução do Conselho Superior do


Ministério Público Federal nº 77, de 14 de setembro de 2004 conceitua o procedimento
investigatório criminal como " instrumento de coleta de dados, instaurado pelo Ministério
Público Federal, destinado a apurar a ocorrência de infrações penais de natureza pública,
servindo como preparação e embasamento para o juízo de propositura, ou não, da ação
penal respectiva"31.

Tanto a polícia quanto o Ministério Público têm legitimidade própria para dar início
à apuração da prática de crimes. O procedimento investigatório criminal é o instrumento
disponibilizado ao(à) procurador(a) da República para as investigações criminais, este de
sua própria iniciativa, cuja legitimidade está reafirmada na jurisprudência do Supremo
Tribunal Federal:

O Ministério Público dispõe de competência para promover, por autoridade


própria, e por prazo razoável, investigações de natureza penal, desde que
respeitados os direitos e garantias que assistem a qualquer indiciado ou a

30 BRASIL. Resolução nº 181, de 07 de agosto de 2017. Brasília, DF: Conselho Nacional do Ministério
Público. [2017]. Disponível em https://www.cnmp.mp.br/portal/atos-e-normas-busca/norma/5277.
Acesso em 18 aug. 2022

31BRASIL. Resolução nº 77 de 14 de setembro de 2004. Brasília, DF: Conselho Superior do Ministério


Público Federal. [2004]. Disponível emhttp://bibliotecadigital.mpf.mp.br/bdmpf/handle/11549/32567. Acesso
em 18 aug. 2022
qualquer pessoa sob investigação do Estado, observadas, sempre, por
seus agentes, as hipóteses de reserva constitucional de jurisdição e,
também, as prerrogativas profissionais de que se acham investidos, em
nosso País, os Advogados (Lei 8.906/94, artigo 7º, notadamente os incisos
I, II, III, XI, XIII, XIV e XIX), sem prejuízo da possibilidade – sempre
presente no Estado democrático de Direito – do permanente controle
jurisdicional dos atos, necessariamente documentados (Súmula Vinculante
14), praticados pelos membros dessa instituição32.

O procedimento investigatório não é um fim em si mesmo, ele é instrumento


preparatório para a propositura da ação penal, se o(a) membro(a) do Ministério Público
Federal se convencer que houve a prática de um crime.
32 BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Tribunal Pleno, Recurso Extraordinário 593727, Repercussão geral.
Recurso extraordinário representativo da controvérsia. Constitucional. Separação dos poderes. Penal e
processual penal. Poderes de investigação do Ministério Público. 2. Questão de ordem arguida pelo réu,
ora recorrente. Adiamento do julgamento para colheita de parecer do Procurador-Geral da República.
Substituição do parecer por sustentação oral, com a concordância do Ministério Público. Indeferimento.
Maioria. 3. Questão de ordem levantada pelo Procurador-Geral da República. Possibilidade de o
Ministério Público de estado-membro promover sustentação oral no Supremo. O Procurador-Geral da
República não dispõe de poder de ingerência na esfera orgânica do Parquet estadual, pois lhe incumbe,
unicamente, por expressa definição constitucional (art. 128, § 1º), a Chefia do Ministério Público da
União. O Ministério Público de estado-membro não está vinculado, nem subordinado, no plano
processual, administrativo e/ou institucional, à Chefia do Ministério Público da União, o que lhe confere
ampla possibilidade de postular, autonomamente, perante o Supremo Tribunal Federal, em recursos e
processos nos quais o próprio Ministério Público estadual seja um dos sujeitos da relação processual.
Questão de ordem resolvida no sentido de assegurar ao Ministério Público estadual a prerrogativa de
sustentar suas razões da tribuna. Maioria. 4. Questão constitucional com repercussão geral. Poderes de
investigação do Ministério Público. Os artigos 5º, incisos LIV e LV, 129, incisos III e VIII, e 144, inciso IV,
§ 4º, da Constituição Federal, não tornam a investigação criminal exclusividade da polícia, nem afastam
os poderes de investigação do Ministério Público. Fixada, em repercussão geral, tese assim sumulada:
“O Ministério Público dispõe de competência para promover, por autoridade própria, e por prazo
razoável, investigações de natureza penal, desde que respeitados os direitos e garantias que assistem a
qualquer indiciado ou a qualquer pessoa sob investigação do Estado, observadas, sempre, por seus
agentes, as hipóteses de reserva constitucional de jurisdição e, também, as prerrogativas profissionais
de que se acham investidos, em nosso País, os Advogados (Lei 8.906/94, artigo 7º, notadamente os
incisos I, II, III, XI, XIII, XIV e XIX), sem prejuízo da possibilidade – sempre presente no Estado
democrático de Direito – do permanente controle jurisdicional dos atos, necessariamente documentados
(Súmula Vinculante 14), praticados pelos membros dessa instituição”. Maioria. 5. Caso concreto. Crime
de responsabilidade de prefeito. Deixar de cumprir ordem judicial (art. 1º, inciso XIV, do Decreto-Lei nº
201/67). Procedimento instaurado pelo Ministério Público a partir de documentos oriundos de autos de
processo judicial e de precatório, para colher informações do próprio suspeito, eventualmente hábeis a
justificar e legitimar o fato imputado. Ausência de vício. Negado provimento ao recurso extraordinário.
Maioria. Relator Min. Cezar Peluso, Relator para o acórdão Min. Gilmar Mendes, j. 14/05/2015, p.
08/09/2015
Contudo, não há obrigatoriedade de instauração do procedimento investigatório
criminal como elemento prévio à denúncia (petição inicial da ação penal). Se o(a)
procurador(a) da República já dispuser de todas as informações de que necessita para o
ajuizamento da ação, poderá fazê-lo. Mas o procedimento investigatório criminal será
muito útil para a reunião de provas e documentos aptos a formar a convicção do(a)
procurador(a), e justificar, com justiça, a acusação.

Veja que a instauração do procedimento investigatório criminal é apenas uma das


possibilidades disponibilizadas aos(às) membros(as) do Ministério Público Federal. De
porte de informações sobre a possível prática de um ilícito, poderá o(a) procurador(a):

a) promover a ação penal cabível;

b) instaurar procedimento investigatório criminal;

c) encaminhar as peças para o Juizado Especial Criminal, caso a infração


seja de menor potencial ofensivo;

d) promover fundamentadamente o respectivo arquivamento;

e) requisitar a instauração de inquérito policial, indicando, sempre que


possível, as diligências necessárias à elucidação dos fatos, sem prejuízo
daquelas que vierem a ser realizadas por iniciativa da autoridade policial
competente.

A decisão por uma ou outra medida vai depender da estratégia de atuação do(a)
procurador(a), consistindo o procedimento investigatório criminal numa investigação
própria do Ministério Público.

Qualquer peça de informação pode justificar a instauração do procedimento


investigatório criminal. Ele pode ser originado de uma notícia de fato, de uma petição, de
um e-mail ou de um pedido formulado por qualquer pessoa, a pedido de autoridades do
Ministério Público Federal ou de outros órgãos de poder, e até mesmo de ofício, ou seja,
pelo próprio membro do Ministério Público Federal, sem qualquer provocação.

Não se exige qualquer formalidade para dar conhecimento ao Ministério Público


da prática de uma infração criminal. Basta que exista um meio eficiente de lhe trazer a
informação, que já há motivos para sua atuação. Repita-se, o procedimento investigatório
criminal é uma dessas formas de atuar.

Verificada a pertinência das informações trazidas, o procedimento investigatório


criminal será instaurado mediante portaria, conforme os exemplos:
Figura 18 - Ofício

Fonte: Print screen de documento cadastrado no Sistema Único. Adaptado pela autora a
fim de exemplificar o assunto estudado e preservar dados que possam ser sigilosos.
Figura 19 - Portaria

Fonte: Print screen de documento cadastrado no Sistema Único. Adaptado pela autora a
fim de exemplificar o assunto estudado e preservar dados que possam ser sigilosos.

A instauração dos dois procedimentos investigatórios criminais decorreu de uma


notícia de fato, a primeira, encaminhada pelo presidente de um processo licitatório,
constatando a fraude praticada por um dos participantes do certame; a segunda notícia de
fato foi encaminhada pelo Ministério Público do Trabalho e justificou a instauração do
procedimento investigatório criminal.

Veja que, nos dois casos, o Ministério Público Federal possuía indícios da prática
criminosa, mas precisava de mais elementos para a propositura da ação penal. Daí a
necessidade de instauração do procedimento, de modo a formar sua convicção e
apresentar ao Poder Judiciário provas robustas para justificar a condenação.

Instaurado o procedimento investigatório criminal, será iniciada a investigação


titularizada pelo Ministério Público, que tramitará via Sistema Único.

Se os fatos a serem investigados chegarem ao conhecimento do Ministério


Público Federal por meio de uma representação externa, a notícia será distribuída
aleatoriamente por sorteio eletrônico e entre todos os membros da unidade, nos termos
das regras de distribuição vigentes.

O que é importante frisar é que se a investigação tiver origem de ofício, isso não
vincula o(a) procurador(a) que tomou conhecimento dos fatos em primeiro lugar e decidiu
investigá-los.

Esse procedimento investigatório criminal deve ser distribuído aleatoriamente,


entre todos os(as) membros(as) daquela unidade com atribuição criminal. Implica dizer,
quando um(a) dos(as) membros(as) decide, por si, iniciar uma investigação, não poderá
esta ficar desde logo a ele vinculado, será necessário sortear quem vai dar continuidade
ao procedimento investigatório criminal.

É necessário sempre cuidar para que as atuações do Ministério Público não


sejam direcionadas ou tendenciosas e pareçam perseguição. O sorteio do procedimento
investigatório criminal vai permitir a transparência na escolha daquele(a) que vai conduzir
a investigação, permitindo que a sociedade perceba a idoneidade da atuação.

Sendo assim, mesmo que a instauração do procedimento investigatório criminal


seja de ofício, deverá ser ele distribuído aleatoriamente entre todos os(as)
procuradores(as) da unidade.

O procedimento investigatório criminal deve ser instaurado por portaria, na qual


deve constar a delimitação dos fatos apurados, contendo, se possível, nome e
qualificação do(a) autor(a) da representação, bem como as primeiras diligências a serem
tomadas.
Figura 20 – Instauração de PIC

Fonte: Print screen de documento cadastrado no Sistema Único. Adaptado pela autora a fim de
exemplificar o assunto estudado e preservar dados que possam ser sigilosos..

Nesse exemplo de portaria de instauração de procedimento investigatório


criminal, todos os requisitos estão atendidos: há a ordem de sua instauração, a orientação
para distribuição e justificativa para que não seja distribuída aleatoriamente, visto que já
há uma investigação vinculada anteriormente e a remessa do procedimento investigatório
criminal ao Núcleo de Combate à Corrupção, para que tome ciência e proceda as
providências de praxe.
As portarias de instauração, portanto, devem ter conteúdo semelhante e são o
ponto inicial das investigações.

É importante destacar que a delimitação dos fatos que serão investigados é


essencial para que o(a) investigado(a) saiba exatamente do que se defender.

Contudo, pode ser que, durante a investigação, novos fatos sejam descobertos e
também precisem ser apurados. Nesse caso, há duas opções possíveis: ou a portaria de
instauração será aditada, para acrescentar os novos fatos; ou serão extraídas cópias das
informações e instaurado novo procedimento investigatório criminal.

2.2.1 FORÇA TAREFA


É possível, e vem acontecendo com bastante frequência, que as investigações
criminais sejam tão extensas que um(a) único(a) procurador(a) não tenha condições,
sozinho de alcançar todos os fatos delituosos. Nesse caso, é possível a instauração
conjunta do procedimento investigatório criminal, no formato de uma força tarefa ou de um
grupo de atuação especial.

O procedimento investigatório, então, será instaurado por esse grupo de


procuradores(as) e a coordenação da investigação caberá àquele especialmente
designado na portaria de instituição. Com isso, será esse grupo de pessoas que vai dar
andamento ao procedimento investigatório criminal, produzindo as provas que forem
necessárias à elucidação dos fatos.

Este é o caso da Operação Lava Jato e da Operação Greenfield, em ambos os


casos o número de crimes e infrações a serem apuradas é muito grande, exigindo a
composição de várias pessoas para alcançar um resultado positivo. Daí foram montados
grupos de trabalho, formados por membros(as) do Ministério Público Federal e
servidores(as), que irão, conjuntamente, apurar os fatos.

Não se exige, por outro lado, que os grupos de trabalho sejam formados
exclusivamente por membros(as) do Ministério Público Federal. Ainda é possível constituir
um grupo entre membros(as) do Ministério Público Federal e de outros ramos do MPU
(Ministério Público Militar e Ministério Público do Trabalho), assim como membros(as) do
Ministério Público dos Estados e do Distrito Federal.

Por exemplo, se há necessidade de investigação de uma notícia de que tem


acontecido tráfico de pessoas para que trabalhem em condições análogas à de escravo,
em grandes confecções de roupas no Brasil, a investigação será mais efetiva se
envolvidos membros(as) do Ministério Público Federal e do Ministério Público do Trabalho

Se cada um dos ramos do Ministério Público conduzir investigações separadas,


corre-se o risco de ficarem incompletas e não atingirem todas as nuances que atingiriam
numa apuração conjunta. Além disso, é uma medida de eficiência, economicidade e mais
celeridade na condução dos trabalhos.

Ministérios Públicos de mais de um país também podem constituir um grupo de


trabalho para a apuração de crimes. Pense na hipótese de investigação de crimes de
evasão de divisas. Nesse caso, necessariamente, os crimes ocorrem em países
diferentes, daí a eficiência de uma investigação conjunta.

Outro exemplo seria a apuração de crimes de pedofilia na internet, quando o


servidor está num país, aquele que está enviando fotos pornográficas de crianças está
num outro país e aqueles que recebem e compartilham as fotos, num terceiro. Não haverá
punição efetiva se somente forem investigados os agentes localizados num único país. A
investigação conjunta vai permitir uma efetiva punição de todos os culpados.

Contudo, no caso de arquivamento, o controle e a revisão do ato ficará vinculado


apenas à esfera de atuação de cada um dos membros do Ministério Público, não haverá
controle da atividade de membros vinculados a outros Ministérios Públicos pelo Ministério
Público Federal.

2.2 Instrução

Instaurado o procedimento investigatório criminal, iniciam-se as investigações,


sob a presidência do membro do Ministério Público a quem foi distribuída. Ele deverá
produzir todas provas que forem necessárias para formar a convicção de que o crime
ocorreu e quem é seu autor.

A Resolução Conselho Nacional do Ministério Público 181/2017 lista algumas


possibilidades de provas:

a) notificar testemunhas e requisitar sua condução coercitiva, no caso de


ausência injustificada;

b) requisitar informações, exames, perícias e documentos de autoridades


da Administração Pública direta ou indireta;
c) requisitar da Administração Pública serviços temporários de seus
servidores e meios materiais necessários para a realização de atividades
específicas;

d) requisitar informações e documentos a entidades privadas;

e) realizar inspeções e diligências investigatórias;

f) ter livre acesso a qualquer local público ou privado, respeitadas as


normas constitucionais pertinentes à inviolabilidade do domicílio;

g) expedir notificações e intimações necessárias aos procedimentos e


inquéritos que instaurar;

h) ter acesso incondicional a qualquer banco de dados de caráter público


ou relativo a serviço de relevância pública;

i) requisitar o auxílio de força policial.33

O(a) procurador(a), portanto, poderá produzir provas de inúmeras formas. A lista


da lei complementar contém apenas exemplos dos instrumentos de que dispõe, se houver
outras provas possíveis, poderão também ser trazidas para o procedimento investigatório
criminal.

As autoridades públicas não podem se negar a enviar documentos e informações


solicitadas pelo Ministério Público, dentro de uma investigação criminal. Excepciona-se
essa regra, contudo, quando a informação é resguardada por sigilo, daí será necessária
uma ordem judicial para obter o dado.

As requisições têm prazo de cumprimento de 10 dias, mas esse prazo pode ser
prorrogado, se houver uma justificativa (art. 7°, § 5°, Lei Complementar 75/93 34). E, se o
pedido não for atendido, o servidor público está praticando o crime de desobediência (art.
330 do Código Penal), que impõe pena de detenção, de quinze dias a seis meses, mais
multa, para quem “desobedecer a ordem legal de funcionário público”.

É possível, também, que o(a) procurador(a) da República requisite que pessoas


compareçam à unidade do Ministério Público Federal para prestar alguns

33 BRASIL. Resolução nº 181, dede 07 de agosto de 2017. Brasília, DF: Conselho Nacional do Ministério
Público. [2017]. Disponível em https://www.cnmp.mp.br/portal/atos-e-normas-busca/norma/5277. Acesso
em 18 aug. 2022

34 BRASIL, Lei Complementar nº 75, de 20 de maio de 1993. Dispõe sobre a organização, as atribuições e
o estatuto do Ministério Público da União . Brasília, DF: Congresso Nacional, [1993]. Disponível em
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp75.htm. Acesso em 22 aug. 2022
esclarecimentos. Também essa requisição precisará ser atendida, nos mesmos moldes
que a requisição de documentos.

Deve-se observar uma antecedência mínima de 48 horas para que a pessoa


convocada possa se dirigir à unidade do Ministério Público Federal. Se não comparecer,
poderá o(a) procurador(a) da República solicitar apoio policial.

Para que não haja dúvidas acerca dos motivos da convocação, “a notificação
deverá mencionar o fato investigado, salvo na hipótese de decretação de sigilo” (art. 8°, §
5°, Resolução Conselho Nacional do Ministério Público 181/17 35). E, sempre, o notificado
poderá comparecer ao Ministério Público Federal acompanhado de seu(sua)
advogado(a), mesmo que seja ouvido apenas na condição de testemunha ou informante.

O(a) advogado(a) pode, inclusive, mesmo sem procuração, examinar autos de


procedimento de investigação criminal, findos ou em andamento, ainda que conclusos
ao(à) presidente, podendo copiar peças e tomar apontamentos, em meio físico ou digital.
A procuração vai ser exigida apenas no caso de investigação sigilosa.

Como o(a) advogado(a) é responsável pela defesa do(a) investigado(a), a ele(ela)


deve ser dado acesso a todas as informações necessárias para que prepare a defesa da
forma mais ampla possível. Haveria justiça se a pessoa tivesse que se defender de fatos
que desconhece?

Uma observação sobre esse ponto é importante. É possível que existam algumas
provas em fase de produção, ou seja, que ainda não estão nos autos, uma vez que
precisam de sigilo para que possam surtir efeito, como, por exemplo, a preparação de
uma inspeção (quando o membro vai até o local do fato para sua própria análise da
situação). Nesse caso, se o(a) investigado(a), ou seu(sua) defensor(a), tiver ciência da
prova antes de sua realização ou conclusão, poderá haver prejuízo para a sua coleta: o(a)
agente, certamente, esconderia informações ou modificaria o local para evitar a produção
da prova. Nesse caso é possível postergar o acesso do(a) investigado(a) e do(a)
defensor(a) à prova, para depois de sua realização.

Por óbvio, se essas notificações, requisições e intimações se dirigirem a


autoridades hierarquicamente superiores ao(à) procurador(a) da República, deverão elas

35 BRASIL. Resolução nº 181, de 07 de agosto de 2017. Brasília, DF: Conselho Nacional do Ministério
Público. [2017]. Disponível em https://www.cnmp.mp.br/portal/atos-e-normas-busca/norma/5277. Acesso
em 18 aug. 2022
serem realizadas pelo(a) Procurador(a)-Geral da República. E, nesse caso, não será o
presidente do PIC quem vai designar a hora da oitiva, pois a própria autoridade poderá
dizer o dia e o horário em que poderá ser ouvida.

A oitiva de pessoas convocadas, no âmbito do procedimento investigatório


criminal, para cooperar com a investigação deve ser tomada, preferencialmente, por meio
de gravação em vídeo e não apenas redação de uma ata. Pode o(a) procurador(a) se
valer, inclusive, dos sistemas de videoconferência disponíveis. Isso vai permitir uma
percepção integral da fala da pessoa ouvida, mesmo por quem não estava presente no
ato. O registro da ata com o depoimento deve ser considerado excepcional, feito apenas
quando não houver outro meio de registro.

Ao final da oitiva, a pessoa ouvida deve ser informada que deve comunicar ao
Ministério Público eventual mudança de endereço, telefone ou e-mail.

Se forem colhidas provas não documentais, ou seja, aquelas de demandam uma


ação do(a) procurador(a) da República fora de seu gabinete, deverão estas ser
registradas por servidor(a) que o acompanha, com a descrição mais completa possível de
todas os fatos ocorridos.

Todas as provas colhidas, portanto, passarão a fazer parte do procedimento


investigatório criminal e servirão para uma futura ação penal, se o(a) procurador(a) se
convencer que houve um crime.

Vale destacar que, se o(a) membro(a) do Ministério Público fizer uso indevido das
informações e documentos que requisitar, inclusive nas hipóteses legais de sigilo e de
documentos assim classificados, responderá civil e criminalmente por seus atos.

O procedimento investigatório criminal deverá ser concluído no prazo de 90


(noventa) dias, permitidas, por igual período, prorrogações sucessivas, por decisão
fundamentada do(a) membro(a) do Ministério Público responsável pela sua condução 36.

Caso o procedimento investigatório criminal permaneça em tramitação por mais


de 3 anos, porque as investigações assim exigem (por exemplo, investigando a prática de
um crime de loteamento de terras indígenas ou de malversação de recursos públicos),
para fins de correição, deverá ser devidamente justificado.

36 Idem
Juntadas todas as provas, o(a) procurador(a) da República vai chegar a uma
conclusão: a) ou ele tem certeza de que existe um crime e sabe quem é seu autor e,
portanto, vai apresentar a denúncia ao Poder Judiciário; b) ou, ao contrário, ele verifica
que não há crime e deve arquivar o procedimento investigatório criminal.

Depois que o(a) membro(a) do Ministério Público se convencer de que, de fato,


houve crime e souber quem é seu(sua) autor(a), mesmo depois de ajuizada a ação penal,
a investigação pode continuar, agora para que se possa buscar a reparação do dano. A
apuração, agora, é onde estão os recursos que foram ilicitamente adquiridos pelo(a)
acusado(a). Com essas informações, será possível o ajuizamento de medidas cautelares
de confisco ou de repatriação de recursos, assim como a identificação de quem é o real
beneficiário econômico do crime.

Essa é uma ação que é paralela ao processo criminal, no Poder Judiciário. Trata
de investigar as questões exclusivamente patrimoniais, ou seja, o proveito que alguém
teve com o ilícito.

Em qualquer uma das hipóteses investigatórias, há que se dar publicidade às


provas, informações e dados colhidos, consistindo em:

I – na expedição de certidão, mediante requerimento do investigado, da


vítima ou seu representante legal, do Poder Judiciário, do Ministério
Público ou de terceiro diretamente interessado;

II – no deferimento de pedidos de extração de cópias, com atenção ao


disposto no § 1º do art. 3º desta Resolução e ao uso preferencial de meio
eletrônico, desde que realizados de forma fundamentada pelas pessoas
referidas no inciso I, pelos seus procuradores com poderes específicos ou
por advogado, independentemente de fundamentação, ressalvada a
limitação de acesso aos autos sigilosos a defensor que não possua
procuração ou não comprove atuar na defesa do investigado;

III – no deferimento de pedidos de vista, realizados de forma


fundamentada pelas pessoas referidas no inciso I ou pelo defensor do
investigado, pelo prazo de 5 (cinco) dias ou outro que assinalar
fundamentadamente o presidente do procedimento investigatório criminal,
com atenção à restrição de acesso às diligências cujo sigilo tenha sido
determinado na forma do § 4º do art. 9º desta Resolução;

IV – na prestação de informações ao público em geral, a critério do


presidente do procedimento investigatório criminal, observados o princípio
da presunção de inocência e as hipóteses legais de sigilo.
Por outro lado, o(a) presidente do procedimento investigatório criminal poderá
decretar o sigilo das investigações, no todo ou em parte, por decisão fundamentada,
quando a elucidação do fato ou interesse público exigir. E, mesmo quando sigilosa, o(a)
investigado(a) e seu(sua) advogado(a), com procuração, devem ter acesso ao
procedimento.

Na investigação criminal, deve o(a) procurador(a) da República dar especial


atenção às vítimas. Primeiramente, explicando quais são seus direitos e qual é a
extensão e o alcance do trabalho desenvolvido pelo Ministério Público Federal. A
denúncia será apresentada ao Poder Judiciário e o(a) procurador(a) vai se esforçar para
convencer o(a) juiz(a) da culpa do acusado.

A sentença, se condenatória, vai estipular um valor mínimo de indenização à


vítima pelo dano que sofreu com o crime (art. 387, IV, do Código de Processo Penal 37),
mas, se a vítima achar que deve ser indenizada com um valor maior, deverá ela, por si,
buscar esse valor, em uma ação própria. Não caberá mais ao Ministério Público atuar.

Mais do que isso, deve o(a) procurador(a) da República cuidar para resguardar a
segurança da vítima, promovendo ações concretas para que não sofra danos no curso da
investigação e até mesmo depois de proposta a ação, ou seja, depois que a investigação
passar para a titularidade do Poder Judiciário. Para isso pode, e deve, contar com o apoio
policial.

Um instrumento importante para uma atuação efetiva e eficiente do Ministério


Público, na persecução criminal, é o acordo de não-persecução penal.

O acordo é uma espécie de “contrato” firmado entre o(a) investigado(a) e o


Ministério Público, para que repare o dano ou restitua a coisa à vítima e renuncie,
voluntariamente aos bens e direitos produtos do crime, preste serviços comunitários,
pague uma prestação financeira às vítimas e cumpra as demais condições estipuladas
pelo Ministério Público Federal.

37 BRASIL. Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Brasília, DF:
Presidência da República, [1941]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-
lei/del3689compilado.htm. Acesso em 18 aug. 2022
Para que o investigado tenha direito ao acordo de não-persecução penal, precisa
atender aos seguintes requisitos (Orientação Conjunta 2a, 4a e 5 a Câmaras de
Coordenação e Revisão 03/20184 38):

a) pena mínima abstrata inferior a 4 anos. Para aferição da pena mínima


cominada ao delito, deverão ser levadas em consideração as causas de
aumento e diminuição aplicáveis ao caso concreto;

b) confissão formal e circunstanciada da infração penal, preferencialmente


em termo próprio;

c) não se tratar de crime cometido com violência ou grave ameaça;

d) não ser cabível a transação penal dos Juizados Especiais Criminais (art.
76 da Lei 9099/1996);

e) não ser o investigado reincidente ou não existirem elementos que


indiquem que ele tenha conduta criminal habitual, reiterada ou profissional,
salvo no caso de infrações penais pretéritas insignificantes;

f) não ter sido o investigado beneficiado, nos 5 (cinco) anos anteriores ao


cometimento da infração, por acordo de não persecução penal, transação
penal ou suspensão condicional do processo;

g) não se tratar de crime praticado no âmbito de violência doméstica ou


familiar, ou praticado contra a mulher por razões relacionadas à condição
de sexo feminino;

h) ser a celebração do acordo suficiente à reprovação e à prevenção do


crime, tendo em vista a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e
a personalidade do autor do fato, bem como os motivos e as circunstâncias
do crime (artigo 44, inciso III, do Código Penal).

O acordo deve estar no procedimento investigatório criminal, com a qualificação


completa do(a) investigado(a), as condições que deve cumprir, valores a serem restituídos
e as datas para cumprimento. O documento deve ser assinado pelo membro do Ministério
Público, pelo investigado e por seu(sua) advogado(a).

O acordo deve ser cadastrado no Sistema Único e submetido à homologação


do(a) juiz(a), com pedido de suspensão da tramitação do procedimento investigatório
criminal. O(a) juiz(a), se for o caso, agendará audiência com o(a) interessado(a) para

38 BRASIL. Orientação Conjunta 2a, 4a e 5 a Câmaras de Coordenação e Revisão nº 03, de 2018. Brasília,
DF: Ministério Púbico Federal. Disponível em https://www.mpf.mp.br/atuacao-
tematica/ccr2/orientacoes/documentos/orientacao-conjunta-no-3-2018-assinada-pgr-006676712018.pdf.
Acesso em 22 aug. 2022
verificar a voluntariedade em que está firmando o acordo. O cumprimento das condições
será acompanhado pelo Ministério Público e a vítima informada de sua assinatura.

Descumpridas quaisquer das condições estipuladas no acordo ou não observados


os deveres da parte, como informar qualquer mudança de endereço, telefone ou e-mail,
no prazo e nas condições estabelecidas, o(a) membro(a) do Ministério Público deverá, se
for o caso, imediatamente oferecer denúncia. O descumprimento do acordo de não
persecução penal pelo(a) investigado(a) também poderá ser utilizado pelo Ministério
Público como justificativa para o eventual não oferecimento de suspensão condicional do
processo.

Mas, se cumpridas integralmente as condições acordadas, será promovido o


arquivamento da investigação, com o pedido ao juiz de que decrete a extinção da
punibilidade.

2.3 Do arquivamento

Ao final da investigação, se as provas não convencerem o(a) procurador(a) da


República de que houve crime, deve ser arquivado, de forma fundamentada. Essa
fundamentação é importante, tanto para que o(a) investigado(a) não tenha contra si,
novamente, um PIC com idênticos fundamentos, como para que a vítima se convença da
impossibilidade da punição daquele inicialmente indicado como autor(a) do crime.

A ideia é que o crime não fique sem solução, havendo a possibilidade de o


procedimento investigatório criminal ser desarquivado se houver notícia da existência de
novos elementos de informação.

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