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AUTOR:
WILSON MUCAPOLA2
DOCENTE DA FDULAN
ADVOGADO
Dundo, 22.04.2023
1
MUCAPOLA, Wilson. Subordinação da Administração ao Procedimento, Administração: Desafios para
concretização e Implementação, 1º Congresso Angolano de Direito Administrativo, FDUAN, 2023.
2
WILOSN MUCAPOLA, Docente da FDULAN, Advogado. Emial: wilsonmucapola@gmail.com
1
ÍNDICE
Resumo………………………………………………………………………....…….… 3
Abstract …………………………………………………………………………….…. 4
Introdução…………….………………………………………………………………... 5
2
Resumo
3
Abstract
For today, the administration must be bound by law and subject to mandatory and
public legal norms, which have as addressses both the organs and agentes of the
administration as well as individuals, citizens in general. This article addresses issues
related to administrative law, with the aim of analyzing and contributing to the ongoing
reforms, whose urgency is evidente on a daily basis, in the relationships that citizens
establish with public administration, in the perspective of seeing an administration
subordinated to the administrative procedureion, this constitutes one of the great
challenges for its realization and implementation, in the current angolan
macro.administrative structure.
4
Introdução
Daí que grande parte da doutrina francesa, ainda hoje, tenda a ignorar a autonomia
dos fenómenos do procedimento confundindo-o com a forma dos actos administrativos
ou, pelo menos, a considerar a desnecessidade da sua regulação, dado que isso poderia
constituir um obstáculo à actuação da jurisprudência do Conselho de Estado”. Precisamos
conhecer a história do reconhecimento do procedimento administrativo se quisermos tomar uma
posição em relação à sua denominação.4
3
LOPES, Moreira, procedimento Administrativo, na perspectiva Garantistica, p. 2. Lisboa, 2018,
4
Idem
5
A actividade administrativa não se esgota na simples tomada de decisões, sem que
antes haja actos preparatórios a praticar, estudos a efectuar, averiguações a fazer, exames
a realizar, informações e pareceres a colher. Sempre que é tomada uma decisão, cabe a
administração registar, efectuar controles do comprimento da decisão, emitir vistos,
publicar a decisão tomada, sob pena de ineficácia e, finalmente cabe, ainda a
administração notificar aos interessados para que estes tomem conhecimento da conduta
da administração.5
Em nosso entender um dos vários factor que certamente terá contribuído para a
ineficácia da subordinação da administração ao procedimento, prende-se pelo decreto lei
16-A/95, trazer uma abordagem, do Procedimento que no entendimento desta legislação
já revogada, conceptualiza como sendo “a sucessão ordenada de actos e formalidades com
vista a formação e manifestação da vontade dos Órgãos de Administração Pública”.6
Note que, este conceito era bastante limitado, na medida em que não respeitava
nem fazia menção do respeito pelos direitos subjectivos e interesses legalmente protegido
dos particulares e das pessoas colectivas. Facilmente percebia-se que, a administração
pública podia mediante o uso dos poderes do seu privilegio de execução prévia que a
própria lei lhe confere, impor a sua vontade, sem ter em atenção as garantias jurídicas das
pessoas com as quais se relacione, que acorrem em busca dos serviços públicos.
O novo CPA, vem legitimar e clarificar, que por mais que os órgãos da
Administração Pública, prossigam os interesses da colectvidade, devem observar o
respeito pelos direitos e as garantias jurídica dos particulares, num acto qualquer que se
queira praticar, sob pena deste ver a sua esfera jurídica desrespeitada e esmagada. Dai
que se pede uma ponderação e equilíbrio na busca da satisfação da prossecução dos
interesses públicos e os interesses legalmente protegidos.
5
FEIJÓ, Carlos. PACA, Cremildo, Direito Administrativo 5ª edição, Mayamba Direito. 2016, p.253
6
Nos termos do artigo 1.º do Decreto Lei 16-A/95 de 15 de Dezembro
6
referência aos particulares, ou seja, para a definição o procedimento esta apenas ao
serviço dos interesses da administração, o que de certo modo até então tem permitido de
forma legitima a exteriorização da sua vontade. Não faz quais menção sobre as garantias
jurídicas dos particulares.
Hoje, cada vez mais, verifica-se uma tendência acentuada para ritualização do
procedimento administrativo. Assim sendo, é curial salientar que a procedimentalização
da actividade administrativa impõe a ponderação de múltiplos interesses contraditórios
relevantes no processo de formação da decisão, surgindo assim, como uma alternativa à
predefinição rigorosa dos interesses públicos a prosseguir, e assegurando, deste modo,
uma relativa legitimação da decisão.7
7
FEIJÓ, Carlos. PACA, Cremildo, Direito Administrativo 5ª edição, Mayamba Direito. 2016, p.254
8
Idem
9
Ibidem
7
jurisdicionais, tendo sempre como limite o respeito pelos direitos subjectivos e interesses
legalmente protegido dos particulares e das pessoas colectivas públicas.”10
Como resulta do acima exposto, não faltam razões para que se comece hoje um
caminho rumo à descoberta da nova forma do princípio da legalidade, pelo que, por forma
a evidenciar a sua importância e descobrir se efectivamente representa uma alternativa
viável ao princípio da subordinação da administração ao procedimento. A primeira grande
referência quando se começa a falar da juridicidade, resulta do conteúdo do princípio do
10
Nos termos do artigo 2.º da lei 31/22 de 30 de Agosto, regula o código do procedimento
administrativo
11
FEIJÓ, Carlos. PACA, Cremildo, Direito Administrativo 5ª edição, Mayamba Direito. 2016, p.255
8
Estado democrático e de direito, que orienta e determina como padrão para a prática de
qualquer acto público, o Direito.
Com isso, mais uma vez a Administração Pública deve alterar os seus padrões, de
modo a adaptar-se aos novos desafios. Os traços mais evidentes destas alterações devem
estar associados ao surgimento de outras formas de administração para além das clássicas.
Nesta fase a Administração deve socorrer-se em instrumentos normativos e não só, cuja
aplicação não deve restringir-se ao caso concreto, mas à uma generalidade de indivíduos,
donde pontificam sem sombra de dúvidas a clara iniciativa do princípio do participativo.
12
LOPES, Moreira, Dissertação do Mestrado, in Procedimento Administrativo angolano, na perspectiva
Garantística. Lisboa 2017. P.18
13
Sobre o Estado Social de Direito e suas implicações para o povo, dentre outros veja, Paulo Otero,
Vinculação e liberdade de conformação jurídica do sector empresarial do Estado, Coimbra editora 1998
p 14 ss.
14
Para maior desenvolvimento desta ideia vide Vasco Pereira da Silva ob cit.. p129.
15
Paulo Otero, Manual ob cit… p 287.
9
A existência de uma administração neoliberal, suscitando claro divórcio entre
textos constitucionais oficialmente definidores de modelos interventivos, à luz de
postulados de bem-estar e níveis óptimos de satisfação de necessidades colectivas
próprias de um Estado social, e a carência de meios financeiros suficientes para continuar
a realizar uma Administração prestadora, num claro propósito político de se repensar a
dimensão do Estado Social, não se trata, porém, de um problema de memória história,
aqui reside uma temática de última hora, reconduzível a um possível efeito permanente
de um estado de emergência financeira que reflecte a tragédia do Estado, passível de
ilustrar o desenvolvimento de uma normatividade não oficial16.”
Pode-se igualmente compreender que este percurso nem sempre foi fácil,
porquanto a ideia de aproximação administração-cidadão ainda é aceite com alguma
resistência17.
16
Paulo Otero, Manual ob cit.. p 292.
17
“Ao mesmo tempo, e ainda quanto ao tardio reconhecimento do procedimento administrativo,
não é também só a natureza ensimesmada da administração liberal que justifica o desconhecimento
o iter que antecede as decisões administrativas. Durante o século XIX, a actividade administrativa
estava sujeita a um núcleo restrito de regras, tanto no capítulo organizatório, como no que diz
respeito ao seu
10
é evidenciar ao nível do nosso país, a importância do procedimento administrativo para
melhoria do trabalho da administração em ordem a satisfazer o bem comum que por força
de vários factores, têm sido ignoradas. Portanto, muitas questões ao nível do
procedimento devem merecer a nossa atenção, a título de exemplo, um aspecto que tem
sido amplamente discutido em relação à matéria, tem a ver com a denominação,
procedimento.
18
“O Procedimento é uma categoria chave para a compreensão do pensamento contemporâneo.
Incluindo já no rol dos termos-fetiche, aparece inserido em jogos de linguagem tão diversos com a
Filosofia Política, a Ética, a Teoria da Argumentação, o Direito Público e mesmo o Direito Privado. A
euforia procedimental, criticada por Ossenbuh há uma década como moda e como tal condenada à
efemeridade, continua desmentindo a morte anunciada. É inegável que numa época de pensamento
débil pósmetafísico (Habermas) e pós-moderno (Lyotard), o procedimento vai assumindo novos
contornos, não escapando ao espírito do tempo. Uma perspectiva de abordagem do procedimento
que suscita crescentes apoios tem sido desenvolvida no quadro da Ciência da Administração. Sem
prejuízo de uma ulterior consideração, no âmbito das funções do procedimento, interessa sublinhar
que a Ciência da Administração parte da existência de um procedimento fáctico, ou seja, do
reconhecimento que uma decisão se produz através de um determinado proceder empírico. Este
procedimento fáctico não é monopólio dos poderes de Estado, mas verifica-se ao nível das próprias
empresas. A ideia de que toda a actividade administrativa é ordenada em fluxos, de que não há one
shot decisions serve de ponto de partida a este olhar, mediante uma grelha destinada a captar o
decision-making process . Assim, a noção de procedimento da Ciência da Administração é mais ampla
que a adoptada pela Ciência do Direito”. João Carlos Simões Gonçalves Loureiro, O Procedimento
Administrativo entre a eficiência e a garantia dos particulares Boletim da Faculdade de Direito da
Universidade de Coimbra, Coimbra editora 1995 p 17-24.
11
satisfazer as necessidades dos cidadãos existirá indubitavelmente um itinerário a ser
seguido.
a) Nos termos deste princípio consagrado no artigo 26º da Lei n.º 31/22 de 30 de
agosto, “qualquer actividade administrativa susceptível de lesar posições
subjectivas de particulares deve ser precedida de procedimento adjacente e justo”
Este princípio é uma linha orientadora daquilo que deve ser a actuação dos órgãos
da administração pública, em matérias procedimentais, sobretudo em questões que tem
que ver com matérias contratuais, que se pretende celebrar entre os organismos públicos
e os particulares, é necessário que se observe um conjunto de formalidades tendes a
prática do acto, sob pena do acto correr fortes riscos de ser impugnado. Ainda na senda
deste princípio faz alusão sobre adequação do procedimento de forma justa.
19
Nos termos do artigo 26.º da n.º lei 31/22 de 30 de Agosto, regula a procedimentalização administrativa
12
Neste princípio as entidades públicas administrativas, devem sempre assegurar
que sejam previamente ouvidos os interessados, antes da tomada de qualquer
decisão final.
Importa que os entes públicos percebam, que as formalidades para que se pratique um
acto administrativo, são dispensáveis de qualquer despesa ao cidadão, em situações
20
Op. Cit. Artigo 27.º
13
devidamente tipificadas pela legislação especial, numa situação especial em concreto
pode se taxar ou pagar algum emolumento pela tramitação da actividade procedimental.
Tal acontece sobretudo por alguma insuficiência económica das pessoas que vam em
busca dos serviços públicos, gozam do direito do apoio judiciário, deve administração
pública, isentar total ou parcialmente o interessado do pagamento das taxas, emolumentos
ou das despesas, a exemplo dos atestados que são emitidos pelas Administração Pública
que visam essencialmente atestar a incapacidade económica do cidadão, que vão em
busca de serviços a nível dos órgãos jurisdicionais, em plena harmonia com o preceito
constitucional, concretamente no artigo 29.º da Constituição da República de Angola,
abreviadamente designada por CRA, consagra à não denegação da justiça por
insuficiência económica.
21
Idem
22
FEIJÓ, Carlos. PACA, Cremildo, Direito Administrativo 6ª edição, Mayamba Direito. 2016, p.257
14
Nesta altura, de grosso modo, sem desprimorado das demais normas que regulam
o procedimento administrativo, temos a destacar a lei n.º 31/22 de 30 de agosto, que
aprova o código do procedimento administrativo, temos ainda a lei n.º 33/22 de 1 de
setembro, aprova o código de processo do contencioso administrativo, com respeito as
demais legislações não aqui, mencionadas.
23
Nos termos do artigo 91.º da lei n.º 31/22 de 30 de Agosto, regula a procedimentalização
administrativa
24
FEIJÓ, Carlos. PACA, Cremildo, Direito Administrativo 5ª edição, Mayamba Direito. 2016, p.260
15
Procedimento executivos, são aqueles que têm por finalidade de assegurar a
projecção dos efeitos de uma decisão administrativa.25 Ou seja, o seu objecto é
essencialmente, executar um acto da administração.
Procedimento do 1º. Grau, São aqueles que incidem pela primeira vez sobre uma
situação da vida e visam sobretudo, preparar a prática de um acto primário.26
Procedimento do 2º. grau, são aqueles que incidem sobre uma decisão
administrativa anteriormente tomada, isto é, versam sobre um acto secundário.27
Procedimento Comum, é aquele que não é regulado por legislação especial, mas
pelas próprias normas sobre procedimento administrativo e actividade administrativa.
E Procedimento especiais, aqueles que são regulados em leis especiais.
Neste tópico pretendemos trazer algumas reflexões sobre as duas mais importantes
garantias administrativas de natureza impugnatória, a reclamação e o recurso hierárquico,
porquanto são as que melhor evidenciam os aspectos subjectivos da relação cidadão e
administração e porque são as que estão em melhores condições, têm sido colocadas
várias objecções à real efectividade das garantias administrativas, na medida em que elas
nem sempre realizam as pretensões dos cidadãos, mesmo quando os elementos objectivos
e essenciais para a resolução do problema estejam a favor destes.
25
Idem
26
Ibidem
27
Op. cit
16
Para isso contribuem vários factores, desde logo porque em regra, o órgão
administrativo não revê a sua decisão28, julgamos que esta situação se deve ao facto de a
administração não pretender passar uma imagem de fragilidade e desconhecimento dos
seus instrumentos de trabalho.
Uma via para garantir algum equilíbrio e isenção na apreciação dos factos
administrativos, tal como assevera Moreira Lopes, é a que estabelece a criação de fiscais
da legalidade ao nível da administração pública angolana,29 entidades que ligadas à
administração independente terão a missão de fiscalizar os actos praticados pelos órgãos
administrativos, revogando-os desde que desajustados aos cânones jurídicos, ordenando
a suspensão de determinados actos com base na sua ilegalidade, ou seja, estamos a propor
a institucionalização de uma entidade sem poderes “decorativos”.30
Esse órgão com representação nos vários serviços, teria a missão de acompanhar
todos os procedimentos administrativos, apontando as ilegalidades ou irregularidades que
forem da sua competência, por se integrarem no seu âmbito de actuação, em nosso
entender não deva ser confundido com os órgãos da inspensão geral da administração do
Estado, abreviadamente designada por IGAE.
28
Revisão provocada pela impugnação por via de uma reclamação
29
LOPES, Moreira, Dissertação de Mestrado, 2017, lisboa. P. 241
30
Idem
17
Mias sim, um órgão que acompanharia o processo de tomada de decisão e uma
vez concretizada, teria o poder para expurgar esta decisão do ordenamento jurídico, caso
fosse exigido pelos elementos em sua posse. Temos de criar ao nível da nossa
administração algum equilíbrio, porquanto ela está essencialmente virada para o interesse
público e muitas vezes prossegue-o de maneira “cega” e em desrespeito total aos direitos
dos cidadãos.
31
José Lucas Cardoso, Autoridades Administrativas independentes e Constituição, Coimbra editora,
2002 p 413-414.
32
FEIJÓ, Carlos. PACA, Cremildo, Direito Administrativo 5ª edição, Mayamba Direito. 2016, p.262
18
provisórias que se mostrem necessárias, com fundamento em justo receio, sem tais
medidas, se produzir lesão grave ou de difícil reparação do interesse público em causa.
33
Nos termos do n.º 2 do artigo 125.º do CPA.
34
Nos termos do n.º 1 do artigo 126.º do CPA.
19
ao cidadão, pelo que ele tem de sujeitar-se à todas as orientações dela emanadas, muitas
das quais sem nenhum alinhamento com o Direito.
Os cidadãos cientes de que as coisas devem ser assim não reagem diante das
ilegalidades diárias. Deste modo, precisamos de discutir o verdadeiro papel do cidadão
na sua relação com a administração, lançando bases para que se melhore antes o regime
jurídico, e em consequência as relações entre ambos.35
Deste modo a evolução acima referida, passará a fazer mais sentido se abranger
igualmente o sistema administrativo, porquanto este serve de base para a resolução de
alguns problemas vividos no âmbito específico do Direito Tributário.
35
LOPES, Moreira, Um olhar sobre o procedimento Administrativo Angolano, na perspectiva
garantística, 2017. P. 228
36
Sobre as garantias administrativas tributárias no anterior regime, em que se exigia a precedência
obrigatória, Carlos Feijó, Caracterização geral da Justiça Tributária, Revista da Faculdade de Direito da
Universidade Lusíadas de Angola, 2005 p 24-28.
37
Sobre o Direito Tributário e seus contornos, inclusive a sua dimensão procedimental, Joaquim Freitas
da Rocha, Lições de Procedimento e Processo Tributário, 4º edição Coimbra editora, 2011, p 11ss.
38
Ibidem
39
Jónatas Machado, Paulo Nogueira da Costa e Osvaldo Lemos Macaia, Direito Fiscal Angolano, 2º
edição, Petrony, 2017, p 209
20
Para além disso, são consagrados vários direitos, desde a proibição da dupla
tributação jurídica, direito à fundamentação e notificação da liquidação, direito de
audição antes da decisão final do procedimento, direito a prestação de informações,
direito à informação vinculativa,40 que obriga a administração a manter os termos e
condições do que foi passado ao cidadão sobre uma questão tributária, de modo garantir
a sua segurança jurídica.
Uma nota de realce tem que ver com a consagração da lesividade (nº1 do artigo 5º
do CGT) como critério para impugnação judicial dos actos em matéria tributária,
transformando as garantias administrativas, reclamação e recurso hierárquico, em
facultativas. Para além desta dimensão subjectiva, a legislação em causa, admite uma
perspectiva objectiva ao permitir que alguns actos sejam impugnados mesmo sem lesarem
direitos, tendo como referência a violação da Constitição da República de Angola, tal
conclusão resulta do disposto na al f) do artigo 14º do Diploma referido.41
Ainda assim nem tudo é perfeito neste domínio, porquanto em relação aos actos
internos, e actos confirmativos, continuamos insistentemente a acreditar que não ferem
direitos e interesses legalmente estabelecidos, pelo que não são recorríveis. O mesmo
tratamento concedeu-se aos actos preparatórios, cuja impugnação não deve ser feita de
forma autónoma, estando necessariamente colada à decisão e nesta o cidadão poderá
levantar aspectos relativos aos actos preparatórios.42
Feita esta pequena resenha, cabe agora tratarmos das questões referentes ao
posicionamento do cidadão nas relações que estabelece com a administração, onde
questiona-se, quem é o cidadão e que elementos fazem com que a sua classificação como
tal seja a mais acertada e adequada ao contexto em que ele se insere.
40
Sobre a informação vinculativa em Direito Fiscal, João Taborda Gama, Promessa…ob cit…p 215 ss.
41
Cremildo Félix Paca, Justiça Administrativa Fiscal e Aduaneira, Luanda 2017, p 24
42
Cremildo Félix Paca, Justiça…ob cti…p 246.
21
6.2. Particular ou Administrado. Entre a passividade e dinâmica.
Ora não nos é permitido optar por um outro caminho que não seja o de colocar o
cidadão no seu verdadeiro patamar, porquanto estamos impositivamente condicionados
pelo princípio da dignidade da pessoa humana, pela ideia da consagração de direitos
fundamentais e acima de tudo, pelo princípio do Estado democrático e de direito.
O cidadão deve ser entendido como o gestor maior, que em algumas circunstâncias
mandata outrem para gerir em seu nome, da mesma forma ele é o fiscal que vai garantir
que esta gestão seja fiel aos seus mais nobres propósitos, que estão na base do mandato
que ele conferiu.
Começa-se por reconhecer nele um papel interactivo e não apenas passivo de mero
“consumidor”, mesmo quando as acções sejam desenvolvidas em seu benefício ele terá
um pepel interventivo, extremamente forte, por outro lado, a actuação da administração
deverá ser diariamente fiscalizada de modo a avaliar se ela está alinhada ao interesse
público.
22
Este e outros papéis só serão exequíveis se ao cidadão for dado outro estatuto. Ele
detem por isso legitimidade de intervir com meios jurídicos para garantir uma actuação
da administração que esteja fora do exigível, se encaixe e se realinhe, contribuindo para
a erradicação da ideia da sua passividade ante a gestão administrativa.
44
Gianfranco Pasquino, Curso de Ciência Política, 2º edição revista e actualizada, Principia 2010 p 290-
295.
45
António Francisco de Sousa, Direito de reunião e de manifestação, Quid júris 2009 p 15.
23
desprotegidos podem manifestar as suas opiniões e serem ouvidos por quem gere, estando
directamente ligados ao processo de formação da decisão política.
46
Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional Tomo VII, Estrutura constitucional da Democracia,
Coimbra editora,2007 p 111
47
Sobre o conceito de particular em especial o que exerce funções públicas, João Miranda, A função
Pública Urbanística e o seu exercício por particulares, Coimbra editora 2012 p 269-274.
48
Posição diferente apresenta Marcy Lopes, O Princípio da tutela jurisdicional efectiva no Contencioso
Administrativo de mera legalidade, o caso angolano, nota de rodapé nº 132, Estudos de Direito Público,
Coimbra 2011 p 59.
49
Que pratica preços razoavelmente acessíveis, o que pode influenciar no poder de compra dos
cidadãos, contribuindo assim para a garantia do bem-estar da população.
24
Como resultado, a melhor alternativa, fundamentalmente porque estamos a discutir
assuntos colectivos de uma vida em comunidade onde todos são “irmãos”, é a expressão
cidadão, pois encerra em si todos os aspectos da vida em comunidade, os reflexos dos
actos dos indivíduos para a sociedade, e acima de tudo espelha a ideia de inclusão de
alguém que está comprometido com o interesse da comunidade, porque sabe que ele é
beneficiário dos vários esforços que a administração empreende, exercendo a
colectividade um papel determinante para a concretização daqueles.
O sentido que se elegeu aqui baseia-se apenas em critérios administrativos que têm
no centro, a satisfação das necessidades colectivas, sem se ater a outros domínios como
por exemplo a cidadania ligada à perspectiva constitucional. A satisfação das
necessidades não pode distinguir os indivíduos em função da sua nacionalidade.
50
Odete Meduar, Administração pública ainda sem democracia. Problemas Brasileiros, São Paulo, a. 23,
n. 256, p. 37-53., mar./abr. 1986, p 38
51
Odete Meduar,O direito administrativo em evolução. 2. ed. São Paulo: RT, 2003, p 230
52
Cândido de Oliveira, Democracia e Administração Pública, Scientia Iuridica – T XLVI 1992 nº 265/267, p
30.
25
Neste sentido a após várias discussões doutrinárias a respeito do assunto, hoje não
restam dúvidias acerca da existência de direitos subjectivos públicos,53 enquanto
categoria subjectiva suprema, que aglutinam os interesses legítimos dos cidadãos,
porquanto todos eles estão ao seu serviço e o legitimam a exigir da administração
determinado comportamento54 e que vai garantir a satisfação das suas necessidades.55
Nestes e demais termos fica claro que a expressão administrado não traduz
fielmente natureza dos poderes que o cidadão tem em face da sua relação com a
Administração Pública, em função do contexto ela se apresenta como mero “artifício
semântico”,59 que efectivamente não deve ser levado aos extremos ao ponto de deixarmos
de lado o papel heterogéneo, no que aos direitos e deveres se diz respeito, que o cidadão
exerce no âmbito das suas relações diárias com a Administração Pública.60 Enfim, o
estatuto do cidadão em face ao novo quadro jurídico-administrativo deve ser entendido
53
Sobre as várias teorias a respeito dos direitos subjectivos públicos e direitos e interesses legítimos,
Vasco Pereira da Silva, Para...ob cit…p 84 ss.
54
Neste sentido e sobre a participação, Luís Filipe Colaço Antnes, O Procedimento…ob cit…p 699.
55
Alexandra Leitão, A Protecção Judicial dos terceiros nos contratos da Administração Pública, Almedina
2001p 74.
56
Juarez Freitas, O poder de polícia Administrativa e o primado dos direitos fundamentais no sistema
brasileiro, Scientia Iuridica- Tomo LIV, 2005 nº 301, p 26.
57
Luís Filipe Colaço Antunes, A tutela…ob cit…p 92.
58
Luís Filipe Colaço Antunes, A tutela… ob cit…p 90.
59
Mário Aroso de Almeida, Os Direitos fundamentais dos administrados após revisão constitucional de
1989, Direito e Justiça, Revista da Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa, volume VI,
1992, p 288.
60
Mario Aroso, Direitos…ob cit…p 288.
26
em parte com o sentido de oposição, que alguns dos seus direitos ajudam a materializar
nomeadamente, os direitos de informação procedimental, o direito a tutela contenciosa, e
o direito de acesso à justiça administrativa.61
61
Mario Aroso, Direitos…ob cti…p 290.
27
Conclusões
Este paradigma tende a colocar no seu verdadeiro lugar, as formas pelas quais a
administração exerce a sua actividade, é preciso salvaguardar no exercício da função
administrativa, os direitos fundamentais dos cidadãos, sendo que estes constituem-se no
principal “obstáculo” para a administração na busca desenfreada pelo interesse público.
Deve a administração pública hoje subordinar-se ao procedimento administrativo na sua
mais ampla dimensão, ao invés da simples lei.
28
Bibliografia
29
BARBOSA Paula, Acção de condenação a prática de acto administrativo legalmente
devido, aafdl, Lisboa 2007.
30