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Numa viagem de férias de final de ano, peguei para ler a revista da companhia
aérea que há algum tempo não circulava edições físicas. Apesar da consciência
ambiental, gosto do papel, do toque, do riscar com a lapiseira, do guardar para
ver depois. Pra mim, revistas precisam ser físicas para eu conseguir ler. Assim
como os livros, os jornais, os artigos científicos. Foi essa oportunidade de voltar
a folhear a revista que me levou a lê-la.
Nessa mesma reportagem que lia, há uma referência de que “o Brasil já foi
declarado o país mais ansioso do mundo, segundo estimativas da Organização
Mundial de Saúde: 68% de sua população entre 15 e 64 anos sofrem de algum
transtorno de ansiedade e depressão.”
Se formos nos apoiar nesses dados, somos um país doente, muito doente.
A partir dessa leitura, tenho 2 propostas a fazer para olharmos para a ansiedade
e pensarmos em como podemos interpreta-la.
Sentir-se ansioso, por muito tempo, pode querer dizer muitas coisas, inclusive a
necessidade de sair do lugar subjetivo onde se está, de se movimentar, de
construir um novo saber sobre si mesmo. É, claramente, uma manifestação
física e corporal - taquicardia, nó na garganta, pensamentos invasivos e
persecutórios, insônia… - de algo que precisa ser elaborado. O que acontece,
muitas vezes, é que, ao primeiro sinal de ansiedade, lá se vai ao médico
procurar o remédio para voltar ao estado inicial. Ansiedade controlada, o sujeito
volta ao seu estado conhecido, sejam horas conectado a mídias sociais, sejam
práticas de compulsão sexual ou alimentar, e por ai vai. Sustentar a ansiedade,
ao contrário, dá trabalho. Trabalho de olhar pra dentro, de se conhecer,
entendendo o que pode parecer que está fazendo bem, mas que, na realidade,
faz um mal danado. Isso exige ter que olhar pra si e se deparar com aquilo que
não é tão agradável. O fato é que não há uma resposta “one fits all”, que sirva
para todos. Isso é o que o remédio faz quando é usado isoladamente. Meses ou
anos mais tarde, a dose precisa ser revista, o medicamento alterado porque não
faz mais efeito.
A segunda proposta que tenho a fazer é que, a partir dos dados apresentados
que retratam uma situação tão grave quanto essa, possamos nos questionar,
individualmente, sobre o que interfere na nossa ansiedade e como podemos
tratá-la.
Sem querer generalizar o que deve ser tratado caso a caso, o que percebo nos
atendimentos individuais são manifestações de ansiedade provocados por:
⁃ uso descontrolado de mídias sociais e aplicativos de relacionamento;
⁃ situações profissionais em que houve abuso de qualquer natureza;
⁃ a necessidade de se sentir produtivo e com alta performance
permanentemente;
⁃ pressão descontrolada com relação a prazos que a natureza (inclusive do
próprio corpo) desconhece;
⁃ o medo de se tornar irrelevante profissionalmente (uma demissão, por
exemplo) ou pessoalmente (ex. a saída dos filhos de casa sem o planejamento
de como seria q vida sem eles para cuidar todos os dias);
⁃ e a lista continua…
O fato é que temos motivo de sobra para ficarmos ansiosos. E como discutido
anteriormente, nem toda ansiedade é maléfica. Muitas vezes é dela que
precisamos para o empurrãozinho necessário. Mas não é dessa que estamos
falando agora, mas da que paralisa, ataca, interfere negativamente na nossa
saúde, nas nossas relações, na nossa capacidade criativa ou na nossa relação
com a gente mesmo.
É aqui que entra o meio ambiente. A natureza é uma grande aliada da saúde.
Não só como fonte de matérias primas para os remédios que tomamos quando
estamos ansiosos ou de alimentação de qualidade, mas como ambiente que nos
recebe, nos acolhe, nos faz refletir, nos acalma, nos faz relativizar a nossa
importância e, portanto, o nosso sofrimento.
A ansiedade, por definição, pode ser entendida como uma relação desajustada
com o tempo. Sentimos ansiosos quando queremos diminuir, parar ou aumentar
a velocidade em que as coisas acontecem. E a natureza nos entrega,
gratuitamente, a oportunidade de ajustar essa relação.
Nada mais apropriado para isso que a natureza. Observar os ciclos de vida das
plantas e animais é se dar conta dos ciclos do próprio corpo. Respeitá-lo é um
primeiro passo para se perceber parte do meio ambiente e lidar com a
ansiedade que nos distancia dele. O respeito à natureza começa no respeito à
própria natureza.