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A importância de uma nova visão do Fisco a respeito da inadimplência tributária

Maxwell Ladir Vieira1

Que a carga tributária brasileira é elevada e impõe um peso enorme aos ombros dos
contribuintes, isto não é nenhuma novidade, nem mesmo algo que não seja sentido por
todos.

Porém, este cenário não foi sempre assim, coincidindo o período de aumento de carga
tributária com a redemocratização que o país passou a partir das eleições diretas de
1.989. Neste ano, a carga tributária total brasileira, incluindo tributos federais, estaduais
e municipais era de 23,71%.

O então presidente Itamar, que assumiu em 1.992, já recebeu uma carga tributária de
24,96%, e entregou ao final de 1.994 com o impacto de 24,96%. O seu sucessor,
Fernando Henrique Cardoso, ao final de seus 8 anos de mandato, deixou o governo sob
uma carga tributária total de 32,35%, enquanto o próximo presidente, Lula, entregou seu
governo com o peso de 33,53% de tributação.

Atualmente, a carga tributária total chega a 36%, o que demonstra que, independente da
posição política e partido do chefe do Poder Executivo, a tendência é, desde 1.989, de
aumento da carga tributária. Aliás, um aumento oficial de algo em torno de 60% de
tributação desde 1.989, e sem os devidos retornos em investimentos públicos e políticas
que permitissem que isto fosse compensado pelo aumento da competitividade do país.

Aliada a isto, houve a elevação desmedida no número de obrigações acessórias, aquelas


que são voltadas à arrecadação e fiscalização dos tributos, como a Declaração de Ajuste
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MAXWELL LADIR VIEIRA, graduado em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia-MG.
Advogado sócio da Ladir & Franco Advogados e responsável pela área tributária, escritório membro
LEXNET sediado em Uberlândia-MG, parecerista e palestrante, pós-graduado em Direito Tributário pelo
Instituto de Brasileiro de Estudos Tributários – IBET e em Direito Processual Civil pela Universidade
Federal de Uberlândia-MG. Presidente do Instituto de Direito Eleitoral e Municipal do Triângulo Mineiro,
ex-presidente da Comissão de Direito Tributário da 13ª Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil –
Seção Minas Gerais, com enfoque de atuação em Direito Tributário, Processo Tributário e Tributação
Municipal. E-mail: maxwell.ladir@ladirfranco.com.br. Telefone celular: (34) 9979-3163
Anual de Imposto de Renda Pessoa Física, ou a emissão de uma nota fiscal, e que geram
pesados impactos também aos cidadãos e empresas que têm de se desdobrar e dispor de
alto custo (em torno de 1,5% do seu faturamento, no caso de empresas) apenas para
cumprir estas obrigações, que não são sequer os próprios tributos.

Se tal aumento de arrecadação tributária fosse acompanhado, em proporção direta, de


investimentos públicos e políticas de simplificação fiscal, provavelmente o sentimento
de “injustiça tributária” seria bem menor e o cenário econômico seria de um país melhor
preparado para um mercado cada vez mais global. Mas não é isto que se enxerga, com
este aumento suportando uma estrutura administrativa cada vez mais inchada e sem se
concretizar em investimentos públicos e estruturais para o crescimento do país.

Durante o período de expansão do PIB que se percebeu em anos anteriores, tal questão
tributária fugia da pauta central de discussões porque, mesmo com tal peso, os
contribuintes, em especial as empresas, conseguiam manter um ritmo aceitável de
crescimento e não percebiam o quão alta estava sua carga tributária. Pois bem, tal
modelo fiscal de aumento constante de arrecadação chegou ao seu limite, se exauriu, e
em uma paisagem de crise econômica mundial deve ser revisto para que não sufoque de
vez os contribuintes.

Uma das mudanças que deve ser pensada por todos os Fiscos, seja federal, estaduais ou
municipais, é não enxergar os contribuintes como sonegadores, mas sim como
inadimplentes. Há uma abissal diferença entre os conceitos, pois por sonegador
pressupõe-se aquele que, tendo condição de pagamento de um tributo, resolve não fazê-
lo, enquanto que o inadimplente é aquele que deixa de pagar o tributo por absoluta falta
de capacidade econômica.

Ainda que tal posição fiscal de preconceito àquele que não pagou o tributo seja velada e
não admitida expressamente, nota-se tal fato pela falta de programas públicos de
adimplência fiscal que realmente permitam que os inadimplentes, especialmente os
grandes devedores, tenham condição de retornar sua condição de adimplência fiscal e,
no caso de empresas, voltarem a cumprir sua função social, de gerar empregos, renda na
comunidade em que se insere e recursos aos cofres públicos através do pagamento de
tributos.
Um exemplo do que foi acima dito foi o parcelamento especial criado em 2.014 pelo
governo federal através da Lei 12.996/14, e que impunha uma entrada de 5% até 20%
do valor do débito para realizar o parcelamento em questão, conforme o percentual do
débito federal. É óbvio que tal percentual alto de entrada inviabilizou a adesão de
muitos contribuintes a tal parcelamento, sendo que o próprio governo noticiou que tal
parcelamento não atingiu as expectativas. Não houve falta de vontade de parcelar em
muitos casos, mas falta de capacidade dos sujeitos passivos.

O ajuste fiscal que atualmente é praticado, especialmente pelo governo federal, se


tornaria muito mais brando se as condições tributárias do país fossem mais favoráveis,
tanto para a recuperação de créditos tributários não pagos quanto para o recebimento
dos valores vincendos, ou seja, que surgirão a medida que os sujeitos passivos realizem
novos fatos geradores. Por exemplo, apenas os débitos de empresas optantes pelo
SIMPLES NACIONAL era, em 2014, de algo em torno de 14 bilhões de reais. A
recuperação destes valores ou parte considerável traria alento ao combalido caixa dos
entes públicos.

Uma possibilidade é trazer, por exemplo, para os devedores tributários privados


condições como as concedidas aos municípios, Estados e Distrito Federal, quando
devedores de tributos previdenciários federais, que tiveram na lei 12.810, de 15 de maio
de 2013, a permissão de pagamento destes débitos atrelado à sua receita corrente
líquida, o que equivale ao faturamento de uma empresa ou renda de uma pessoa física,
que se dava em até 240 meses limitado a 1% desta receita corrente líquida, o que for de
menor prestação. Em outras palavras, existe um prazo, que é bem mais extenso do que o
parcelamento ordinário, pois pode se concretizar em até 20 anos (240 meses), porém tal
prazo pode ser até superado pois a prestação máxima é de 1% da receita corrente
líquida, assim, se o débito for alto e tomando como limite este percentual, pode se ter
débitos pagos em até mais de 240 meses.

Outra perspectiva é atrelar a concessão de condições bem mais vantajosas de quitação


de débitos tributários já existentes, como maiores prazos ou limitação ao faturamento da
empresa, por exemplo, ao pagamentos dos tributos vincendos durante o período de
parcelamento. Desta forma, se o sujeito passivo levar 20 anos para pagar o tributo,
deverá manter sua regularidade fiscal dos débitos tributários que ainda vencerão quando
realizar fatos geradores de obrigações tributárias no futuro, e durante todo o período de
gozo das condições mais vantajosas, sob pena de perder tais condições e passar a de se
trazerem o saldo daquele débito anterior a valores presentes e com a aplicação das
respectivas multas, juros e demais consequências.

Tal mudança de postura do Fisco certamente trará novamente ao mercado contribuintes


que hoje estão em situação de inadimplência fiscal e que não tem, por isso, como
exercer na plenitude suas atividades, por terem restrições como não ter acesso a
certidões negativas de débito, tão importantes para a contratação com o Poder Público e
com grandes empresas e instituições financeiras. Significará também mais receita aos
cofres públicos e aumento de arrecadação, e com isso capacidade financeira que hoje os
entes políticos tanto precisam para realizar investimentos e manter o crescimento do
país.

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