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SOFT SKILLS

Gerenciamento
de decisão
Pablo Rodrigo Bes

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

>> Descrever modelos teóricos para a tomada de decisão.


>> Relacionar a informação orgânica com a tomada de decisão.
>> Mapear capacidades para gerenciar decisões na prática profissional
contemporânea.

Introdução
Diariamente, os gestores organizacionais precisam realizar escolhas sobre
quais caminhos, ações e estratégias que serão implementados pelos grupos e
equipes que conduzem, a fim de alcançarem os objetivos da empresa de modo
ampliado. Nesse processo de tomada de decisão, associam-se tanto questões
racionais quanto comportamentais, que envolvem um conjunto de capacidades
específicas que esses líderes devem desenvolver para que suas decisões pro-
duzam os resultados esperados. Da mesma forma, as informações produzidas
no âmbito das organizações, bem como aquelas que compõem o segmento de
mercado no qual a empresa atua, são fundamentais para o processo decisório.
Neste capítulo, você vai estudar os modelos teóricos de tomada de decisão,
vendo seus pressupostos e a relação da informação orgânica com o processo
decisório. Também vai ver as capacidades que contribuem para o gerenciamento
de decisões contemporâneo.
2 Gerenciamento de decisão

Tomada de decisão: modelos teóricos


Ao longo das últimas décadas, as organizações têm procurado focalizar em
como melhor conduzir o desempenho de seus colaboradores, procurando
ajustar essa performance com aquilo que é exigido pelos seus clientes, usuários
de seus serviços e pelo mercado em geral. A partir da globalização na década
de 1990, o mercado se tornou mais competitivo, dinâmico e instável, exigindo
dos gestores das organizações novas capacidades sociais e comportamentais,
que pudessem materializar em resultados os objetivos estratégicos organi-
zacionais. Nesse contexto, a capacidade de tomada de decisão por parte dos
líderes organizacionais assume uma importância central entre os atributos
que podem conduzir a eficácia almejada, uma vez que, cotidianamente, es-
colhas precisam ser realizadas entre alternativas a seguir, que podem ser
mais estruturadas e planejadas ou ainda mais contingenciais e inusitadas.
Em um primeiro momento, os modelos de tomada de decisão foram desen-
volvidos com foco em seu aspecto racional, aliado às capacidades intelectuais
e técnicas dos líderes, que fundamentariam as escolhas a serem realizadas.
Posteriormente, esse foco se deslocou para o envolvimento também dos
aspectos emocionais, psicológicos, que contribuem igualmente para o alcance
de resultados. Contemporaneamente, a partir dos estudos das neurociências
e da psicologia positiva, os modelos de tomada de decisão têm procurado
envolver outras capacidades sociais e comportamentais que contribuem para
que os líderes estruturem seus processos de planejamento e tomem suas
decisões com maior eficiência.
O modelo racional de tomada de decisão costuma se basear nos aspectos
apresentados na Figura 1.

3. Atribuir pesos
1. Definir o 2. Identificar os 4. Desenvolver
específicos a cada
problema critérios para a alternativas
um desses
decisão
critérios

6. Escolher a
5. Avaliar
melhor
alternativas
alternativa

Figura 1. Passos do modelo racional de tomada de decisão.


Fonte: Adaptado de Robbins, Judge e Sobral (2010, p. 168).
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Analisando as etapas que costumam compor os modelos de tomada de


decisão racional, podemos verificar que começamos com a identificação do
problema a ser resolvido ou do objetivo a ser almejado com a ação individual,
do grupo ou da equipe. Partimos dessa definição para o estabelecimento de
critérios norteadores, que ajudarão a identificar as alternativas existentes.
A partir do estabelecimento de alternativas, existe o processo de avaliação e
escolha do caminho a seguir, que é a decisão em si. Griffin e Moorhead (2006,
p. 332) destacam a importância fundamental da informação ao longo dessas
etapas do processo decisório e comentam que “quem toma uma decisão tem
um objetivo, avalia as consequências das alternativas de ação relacionadas
ao objetivo e seleciona uma delas”.
Entretanto, existem muitos fatores que são subjetivos nesse processo que
pretende ser totalmente racional, afinal, as pessoas realizam seu julgamento e
suas avaliações a partir de modelos mentais, associados com o seu repertório
de experiências e emoções que as constituem, não é mesmo?
Ao analisarmos o processo decisório sob as lentes da psicologia positiva,
acompanhamos o entendimento de Pacico e Bastianello (2014, p. 17), de que
“[...] esta é um chamado para a psicologia se preocupar mais com as forças
humanas do que com as fraquezas, a ajudar a construir vidas melhores do
que reparar o que está ruim, enfim, centrar-se no que faz a vida valer a pena”,
A psicologia positiva, ao focalizar o processo decisório, irá além da consta-
tação dos fatores que causam falhas, ruídos ou inconsistências, tendo como
objetivo contribuir para o aprimoramento dos gestores a partir da busca pelo
aprimoramento de outras capacidades que os qualificam para a realização
dessas escolhas de forma eficiente e em tempo hábil.
Griffin e Moorhead (2006) irão apontar, ainda, outros aspectos que de-
vem ser considerados na contemporaneidade para que os líderes possam
tomar suas decisões, como as limitações da racionalidade, a intuição e as
várias diferenças individuais existentes, propondo que os modelos de tomada
de decisão utilizem também critérios comportamentais em seu processo.
A limitação da racionalidade citada pelos autores vai ao encontro da impossi-
bilidade de os gestores encontrarem as melhores soluções para os problemas,
“[…] uma vez que é muito difícil processar todas as informações relevantes e
pensar em todas as alternativas possíveis” (GRIFFIN; MOORHEAD, 2006, p. 339).
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Para solucionar essa limitação, caberia, então, desenvolver nesses líderes


algumas capacidades comportamentais específicas, que podem permitir
melhor percepção e uso das informações ao seu dispor. Essa é, justamente, a
ênfase da psicologia positiva: tornar ainda mais fortalecidas essas capacidades
dos gestores para que atuem de forma mais eficaz. Entre tais capacidades,
podemos citar a visão sistêmica e holística e as operações de pensamento de
ordem superior, que podem auxiliar em seus processos de análise e busca de
solução de problemas. Ao longo deste capítulo, vamos analisar as capacidades
que contribuem para o desenvolvimento dos líderes organizacionais e que
têm impacto em suas ações diretamente.
Podemos analisar as limitações do modelo de tomada de decisão somente
pelos aspectos racionais dos líderes também a partir de Pacico, Ferraz e Hutz
(2014), que destacam o conceito de autoeficácia, associando-o com a psicologia
positiva. Esse conceito se relaciona com a crença que os próprios sujeitos
têm sobre suas capacidades comportamentais, cognitivas e motivacionais
para a realização de algo.
Essa autoeficácia normalmente se associa com as experiências anteriores
que as pessoas vivenciaram e que passaram a incorporar em seus paradigmas
ou modelos mentais, pelos quais analisam a vida, seus fatos e fenômenos. Isso
compões o que chamamos, algumas vezes, de intuição. Nesse sentido, Fiorelli
(2006, p. 36) afirma que “[…] o conceito de mundo da pessoa determina o seu
comportamento”. Nesse caso, como dissociar os aspectos subjetivos quando
precisamos exercer o pensamento analítico sobre algo? Nossas percepções, por
exemplo, costumam estar associadas a fatores anteriores que vivenciamos e
que se encontram armazenados em nossas memórias; quando nos surge algo
a decidir, um dos primeiros movimentos que fazemos é procurar resgatar em
nossas memórias alguma situação anterior que nos forneça algum aspecto
de similaridade com o problema posto ou o objetivo atual que pretendemos
atingir, não é mesmo?
Dessa forma, pelo viés da psicologia organizacional e de seus esforços
para o desenvolvimento humano nas organizações, devemos considerar que a
organização é um organismo vivo, “[...] ao qual se aplica a concepção sistêmica
e holística: cada uma de suas partes contém propriedades representativas
de toda a Organização, ao mesmo tempo em que ela é algo mais complexo
do que a simples justaposição de suas diferentes áreas” (FIORELLI, 2006,
p. 36). Desenvolver a visão sistêmica e holística é uma das capacidades hoje
amplamente desejáveis e importantes para a atuação do gestor organizacional.
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A teoria geral dos sistemas (TGS), proposta por Ludwig von Bertalanffy
(1901–1972) ao longo de suas obras produzidas entre 1950 e 1968,
defende a ideia da necessária integração entre as ciências naturais e sociais,
buscando uma unidade da ciência. Com isso surge o conceito de sistema aberto,
em que suas partes são intercambiáveis entre si, com o ambiente e com outros
sistemas, contrapondo-se à visão reducionista cartesiana.
O holismo se refere à possibilidade de entendermos algo pelo seu aspecto
global, pelo inteiro, pelo todo, contrariando o reducionismo da ciência proposta
por Descartes, na qual existe a fragmentação das partes para o conhecimento
do todo. Assim, o homem não poderia ser visto de forma dissociada, separando
corpo, mente e alma.

Colocando a visão sistêmica e holística em funcionamento em algumas


práticas fundamentais das organizações contemporâneas, como o planeja-
mento estratégico, por exemplo — que remete ao estabelecimento de ações
a serem realizadas visando ao futuro que se pretende alcançar —, podemos
verificar como todos são corresponsáveis pela implementação das metas
rumo aos objetivos pretendidos. Considerando ainda a noção de estratégia,
percebemos que as informações geradas pelas organizações afetam direta-
mente a capacidade de decisão dos gestores e líderes organizacionais, que,
por sua vez, são constituídos por seus aspectos racionais e emocionais. Isto
é, cada colaborador contribui com uma parcela de seu desempenho para que
o resultado seja alcançado; nesse sentido, aumentar o desempenho passa,
necessariamente, por tornar os colaboradores mais capazes naquilo que
realizam, o que também inclui a qualidade das informações que são geradas
e a forma como interagem com as mesmas.
Vamos analisar, no próximo tópico, como a informação existente no am-
biente organizacional contribui para o processo de tomada de decisão.

Informação orgânica e tomada de decisão


Nossa sociedade vivenciou recentemente, a partir do impulso e popularização
das tecnologias de comunicação digitais, no final do século XX, uma profusão
de informações que invadem a nossa vida pessoal e profissional — fato que
passou a denominar a sociedade como sociedade da informação, inclusive.
Pela percepção de que as informações em quantidade nem sempre resultam
em algo útil e com qualidade, evoluímos para uma sociedade do conhecimento,
que seria fruto do tratamento dado às informações existentes. Atualmente, no
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âmbito da sociedade da aprendizagem, temos procurado desenvolver outros


olhares e cuidados em relação às informações existentes, considerando que
elas costumam servir de base inicial, de suporte para os processos organi-
zacionais que serão desenvolvidos.
Ao buscar definir os papéis representados pelos gestores no cenário
contemporâneo, considerando o aspecto das informações, Griffin e Moorhead
(2006, p. 20) destacam os papéis de “monitor, propagador e porta-voz”. Assim,
os líderes organizacionais tanto são responsáveis pela procura de informações
externas consistentes, que se coadunem com os objetivos organizacionais,
quanto são responsáveis por propagá-las no ambiente interno e costumam
servir de porta-vozes da organização para veicular informações para o público
externo.
A informação passou a ser considerada um importante recurso organizacio-
nal, uma vez que se associa diretamente com os processos de planejamento,
gestão do conhecimento e estratégia que as organizações desenvolvem. Dessa
forma, a informação interna, gerada pela empresa a partir de seus processos
e práticas, denominada informação orgânica, será de grande valia para que
a tomada de decisão seja realizada de forma eficiente. Carvalho e Longo
(2002, p. 115) definem que as informações orgânicas “[…] são um conjunto de
informações sobre um determinado assunto, materializadas em documentos
arquivísticos que, por sua vez, mantêm relações orgânicas entre si e foram
produzidos no cumprimento das atividades e funções da organização”. Isto
é, as informações orgânicas são geradas todas as vezes que passam a ser
registradas, vindo a fazer parte dos arquivos disponíveis aos gestores para
fundamentar suas ações, sendo uma delas a tomada de decisão.
A partir da psicologia positiva, alguns autores, como Schaufeli e Taris
(2014) e Vazquez et al. (2019) têm procurado analisar o trabalho e seus im-
pactos na qualidade de vida e bem-estar dos trabalhadores pelo viés do job
demands-resources model (JDR model, modelo de demandas e recursos de
trabalho). Essa teoria enfatiza o desgaste de energia produzido pelo trabalho
aos trabalhadores, que poderia ser minimizado a partir dos recursos ofertados
pelas organizações.
Para compreender um pouco melhor o modelo JDR, acompanhe no Quadro 1
algumas das demandas e respectivos recursos costumeiramente exigidos
das organizações contemporâneas.
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Quadro 1. Demandas e recursos do trabalho das organizações contemporâneas

Job demands (demandas) Job resources (recursos)

Centralização Avanço/progresso

Demandas cognitivas Apreciação

Complexidade Autonomia

Problemas computacionais Cultura organizacional

Contatos exigentes dos clientes Recompensas financeiras

Downsizing Clareza dos objetivos

Demandas emocionais Informação

Dissonância emocional Clima de inovação

Conflitos interpessoais Desafios no trabalho

Insegurança no trabalho Conhecimento

Assédio moral Liderança

Demandas por desempenho Oportunidades para o


desenvolvimento pessoal

Demandas físicas Participação na tomada de decisão

Problemas de planejamento Feedback de desempenho

Remuneração Orgulho profissional

Responsabilidades Contatos positivos com clientes

Riscos e perigos existentes Qualidade do relacionamento com os


líderes

Ambiguidade e conflito de papéis Clima de segurança

Assédio sexual Clima organizacional satisfatório

Pressão do tempo Apoio social de colegas e líderes

Horário de trabalho desfavorável Utilização de capacidades

Condições de trabalho desfavoráveis Planejamento estratégico

Pressão do trabalho/tarefas Gestão coaching


(Continua)
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(Continuação)

Job demands (demandas) Job resources (recursos)

Conflitos entre trabalho e família Variação nas tarefas

Sobrecarga de trabalho Coesão, harmonia e confiança das


equipes

Fonte: Adaptado de Schaufeli e Taris (2014).

Vamos relacionar algumas das demandas e dos recursos apresentados


no Quadro 1, aquelas que estão em destaque, pois são complementares e
interdependentes aos aspectos que estamos estudando. A informação, aqui
considerando as de natureza orgânica, é essencial para os processos de
gestão do conhecimento que costumam fazer parte das políticas e práticas
de desenvolvimento de pessoas nas organizações. As lideranças devem
reconhecer o efeito positivo da participação dos colaboradores no processo
de tomada de decisões, que costuma basear-se, também, nas informações
orgânicas existentes, em consideração aos objetivos estratégicos traçados.
Logo, a qualidade do relacionamento interpessoal entre colegas e líderes
é fundamental para que as informações sejam devidamente utilizadas no
cotidiano organizacional, visando ao futuro que se almeja.
Ao analisar os resultados que podem ser produzidos a partir de diferentes
condições de informação existentes na organização, Griffin e Moorhead (2006,
p. 334) destacam os riscos envolvidos e que desafiam os gestores:

As decisões são tomadas para produzir os resultados desejados, mas a informação


disponível sobre tais resultados varia. O âmbito das informações disponíveis pode
ser considerado um conjunto contínuo cujas extremidades representam completa
certeza quando todos os resultados alternativos são conhecidos e completa in-
certeza quando os resultados alternativos são desconhecidos. Os pontos entre as
duas extremidades criam o risco: quem toma a decisão possui alguma informação
sobre os possíveis resultados e pode ser capaz de estimar a probabilidade de sua
ocorrência.

Assim, ao decidir, o líder organizacional tanto poderá buscar as informações


orgânicas de processos similares realizados anteriormente quanto poderá
se valer de sua autoeficácia e expertise adquiridas com o tempo de trabalho.
As informações orgânicas, pelo seu caráter objetivo, podem variar muito
em relação à qualidade e, por vezes, nem existir de forma satisfatória para
atender as demandas da tomada de decisão. O risco, nesse caso, associa-se
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diretamente com a existência e a qualidade da informação orgânica, registrada


nas práticas que a organização desempenha. Observe no exemplo a seguir
como isso ocorre no ambiente organizacional.

Um colaborador assumiu recentemente a gerência do departamento


comercial de sua empresa e, com esse novo cargo, vieram também
metas e objetivos estratégicos a serem perseguidos. Uma delas é positivar
um percentual da carteira de clientes da empresa que não comprou nada nos
últimos 12 meses.
Ao se deparar com as informações orgânicas do setor, esse gerente constatou
haver somente os dados cadastrais básicos desses clientes e seu histórico de
compras, sem nenhuma outra informação relevante sobre a relação deles com
a empresa, o que poderia facilitar muito a decisão sobre a melhor forma de
abordá-los nesse esforço de reaproximação. Sem informações suficientes, o
gerente optou por realizar uma ação ostensiva, visitando todos os clientes a
serem positivados junto com seus representantes regionais. Feito isso, criou uma
planilha de acompanhamento das visitas, na qual eram registrados os pontos
importantes, positivos e negativos, objeções e impressões dos clientes sobre a
empresa, para que as ações futuras pudessem ser estruturadas de forma mais
pontual e customizada para cada um deles.
Essa ação fez com que todos do setor tivessem maiores subsídios para
agir, possibilitando que as campanhas de marketing e vendas ampliassem a
comercialização do mix de produtos da organização.

A informação é diretamente proporcional ao sucesso da tomada de decisão.


Robbins, Judge e Sobral (2010) consideram entre as falhas mais comuns do
processo decisório associadas à informação a ancoragem, a evidência confir-
madora, o viés de disponibilidade e a escalada de comprometimento. Vejamos:

„„ Ancoragem: este erro é “[...] a tendência de nos fixarmos em uma in-


formação como ponto de partida e a dificuldade de nos ajustarmos
diante de informações posteriores” (ROBBINS; JUDGE; SOBRAL, 2010,
p. 172). Assim, pode existir uma ênfase desproporcional nas primeiras
informações com as quais o gestor teve contato, que o impede de
ampliar sua visão para outros pontos igualmente importantes que
ocorrem a partir daí.
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„„ Evidência confirmadora: este viés “[...] representa um tipo específico


de percepção seletiva: buscamos informações que corroborem nossas
escolhas anteriores e desprezamos aquelas que as contestam” (ROB-
BINS; JUDGE; SOBRAL, 2010, p. 172). Isso rompe com o entendimento do
processo racional da tomada de decisões, pois, em vez de buscarmos
objetividade e neutralidade a partir dos dados analisados, podemos
estar perseguindo a confirmação de nossas preferências e modelos
mentais, o que obstaculiza a percepção de novas ideias.
„„ Viés da disponibilidade: este viés “[...] é a tendência de as pessoas
julgarem as coisas com base nas informações mais disponíveis”
(ROBBINS; JUDGE; SOBRAL, 2010, p. 172). Normalmente, associam-se
a esta disponibilidade aqueles eventos nos quais tivemos um envol-
vimento emocional, que produziu significados em nossa vida e, por
isso, ficam em nossa memória. Muitas vezes, em uma organização, a
própria cultura organizacional está impregnada desses vieses, que se
constituíram pelo êxito de experiências passadas e que representam
desafios quando o foco é a mudança de comportamentos.
„„ Escalada de comprometimento: esta falha “[...] pode ser definida como
um apego a uma decisão anterior, mesmo quando fica claro que ela
foi um erro” (ROBBINS; JUDGE; SOBRAL, 2010, p. 173). Muitas vezes, por
orgulho, medo do julgamento ou falta de capacidade de liderança,
os gestores podem continuar afirmando seus posicionamentos equi-
vocados, fazendo com que sua postura e as informações que dela se
originam agravem ainda mais as implicações de seus erros. Melhor seria
para os resultados organizacionais que o líder admitisse sua falha e
planejasse como diminuir o impacto de sua decisão mal formulada.

Como pudemos explorar neste tópico, o processo de tomada de decisão


está fortemente associado com as informações existentes. Portanto, a qua-
lidade das informações orgânicas deve ser perseguida para dar suporte a
essa ação tão importante estrategicamente para as organizações. Vamos, no
próximo tópico, estudar algumas das capacidades que, quando desenvolvidas,
auxiliam os líderes organizacionais a tomar decisões bem-sucedidas.
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Capacidades necessárias ao gerenciamento


de decisões na contemporaneidade
Como estudamos até aqui, a tomada de decisões desafia os gestores con-
temporâneos a ampliarem os modelos racionais existentes, agregando a esse
processo também a qualidade das informações orgânicas e as capacidades
sociais que podem contribuir diretamente para que essa uma prática mais
eficiente. Assim, pelo viés da psicologia positiva, cabe a nós conhecer e poten-
cializar as capacidades sociais e comportamentais (soft skills) que contribuem
para a escolha mais oportuna e adequada, bem como reforçar as capacidades
técnicas (hard skills), igualmente importantes aos processos de gestão. Ao
se referir à atuação dos gestores contemporâneos, Griffin e Moorhead (2006)
abordam os quatro papéis decisórios que esses gestores assumem:

São quatro os papéis decisórios. O de empreendedor dá início voluntariamente a


uma mudança, a inovações e novas estratégias na organização. O de solucionador
de conflitos resolve desavenças entre pessoas, como as existentes entre gerentes e
subordinados. O gestor de recursos decide como os recursos da organização serão
distribuídos entre os funcionário e os grupos. O negociador representa a instituição
na discussão de acordos com outras organizações, como nas negociações salariais
com um sindicatos (GRIFFIN; MOORHEAD, 2006, p. 21).

A partir da colocação dos autores, percebemos como o processo decisório


faz parte, constantemente, das atribuições dos gestores na contemporanei-
dade, pois envolve questões estratégicas relacionadas à inovação e mudança
organizacional; gerenciamento de conflitos organizacionais; gestão dos re-
cursos existentes, procurando equilibrar a qualidade de vida no trabalho,
conforme vimos a partir do modelo JDR; negociação com outros órgãos ou
organizações externas, como sindicatos ou conselhos de classe, entre muitos
outros.
Fica evidente que os gestores precisam ter algumas capacidades fun-
damentais para que possam agir com eficiência e levar as organizações em
que atuam até os resultados que almejam. Vejamos, primeiramente, quais
são essas capacidades fundamentais para um gestor contemporâneo, apre-
sentadas na Figura 2.
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Capacidade Capacidade Capacidade Capacidade


técnica interpessoal conceitual analítica
• Necessária para • Muito utilizada para • É a aptidão do • Permite compreender
realizar tarefas a comunicação, gestor de raciocinar as relações de causa
específicas nas compreensão e por meios de e efeito e encontrar as
organizações. motivação de abstrações. melhores soluções
Aprendida pela pessoas, grupos e Capacidade de para mudanças e
educação formal e equipes. enxergar uma resoluções de
pela experiência. situação como problemas existentes.
um todo.

Figura 2. Capacidades fundamentais para a gestão na contemporaneidade.


Fonte: Adaptada de Griffin e Moorhead (2006, p. 21–22).

Fica explícito, a partir da Figura 2, o quanto se exige do gestor contem-


porâneo outras capacidades, que vão muito além da sua formação técnica,
obtida nas instituições de ensino onde adquiriu conhecimentos específicos,
e da sua experiência, colocando tais técnicas em prática. Essas capacidades
são importantes, porém, vivemos na época em que são enfatizadas outras
capacidades sociais e comportamentais que dão suporte, que estruturam as
demais capacidades fundamentais citadas.
Por exemplo, a capacidade interpessoal se associa diretamente com as
soft skills: relação interpessoal, inteligência emocional, liderança e comuni-
cação, entre outras. Ao pesquisarem sobre os processos demissionais nas
organizações contemporâneas, Stocker et al. (2018) encontraram a capacidade
de relacionamento interpessoal entre os critérios utilizados para a decisão
dos gestores, conforme comentam:

As relações interpessoais também estão listadas como um dos critérios relevantes


no processo de demissão. Em ambientes de trabalho onde o alto rendimento e o
trabalho em equipe são necessários, a colaboração de um indivíduo com o resto
do grupo é ainda mais evidente. Nesse sentido, as ‘habilidades sociais’ do indivíduo
são relevantes, pois refletem sua capacidade de se adaptar a diferentes situações
e demandas, além de influenciar o comportamento de outros e atuar de maneira
cooperativa. (STOCKER et al., 2018, documento on-line).

A capacidade conceitual, por sua vez, pode ser relacionada com a visão
sistêmica e integrada que o líder deve procurar desenvolver; caso o faça,
essa capacidade irá contribuir diretamente para a sua tomada de decisão.
Ao analisar essa capacidade como uma das disciplinas que devem ser do-
minadas pelos gestores do século XXI, Senge (2002, p. 99) a define como
“[…] uma disciplina para ver o todo. É um quadro referencial para ver inter-
Gerenciamento de decisão 13

-relacionamentos, ao invés de eventos, para ver os padrões de mudança […]


é um conjunto de princípios gerais”.

Imaginemos que o líder de uma equipe, ao tomar uma decisão impor-


tante sobre a continuidade ou mudança de uma prática, não tenha
essa capacidade de interação e engajamento com aqueles que lidera. Embora
sua decisão possa ser acertada, os resultados ficarão comprometidos pela falta
de confiança e sinergia de todos os envolvidos. Quando existe essa capacidade
social desenvolvida, o líder já conhece aqueles que lidera e sabe até mesmo
como se expressar de forma persuasiva e exercer sua influência a favor das
alternativas que serão implementadas. Da mesma forma, tendo desenvolvida
sua capacidade de inteligência emocional, esse líder saberá quais são os efeitos
que as decisões irão produzir nas emoções dos membros da equipe, podendo
direcionar as decisões para formatos mais aceitáveis e que não venham a causar
mal-estar e insatisfação.

Assim, o pensamento sistêmico assume um lugar muito importante para


que o gestor exerça suas atribuições, permitindo que visualize os impactos
de suas decisões tomadas, bem como as causas que contribuíram para a
existência de tal problema que precisa ser solucionado, fazendo frente às
múltiplas informações que ele tem. Senge (2002, p. 99) reforça ainda o seguinte:

[…] talvez, pela primeira vez na história, a humanidade tenha a capacidade de


gerar muito mais informações do que o homem pode absorver, de gerar uma in-
terdependência muito maior do que o homem pode administrar e de acelerar as
mudanças com uma velocidade muito maior do que o homem pode acompanhar.

Se considerarmos as informações que são veiculadas diariamente pelos


canais de comunicação digitais, somadas às informações orgânicas produzi-
das pelas organizações, visualizamos como esses aspectos fazem com que
a complexidade se instaure, exigindo dos gestores que elevem seu nível de
competências na questão do pensamento sistêmico.
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Uma das formas de entendermos o pensamento sistêmico é a partir


da metáfora de enxergarmos a floresta que existe além das árvores
que nossa visão costuma focalizar. Nossa percepção tende a enxergar e manter
nossa visão para uma ou outra árvore que mais nos chamam a atenção, seja
pela sua estatura, seja pela cor de suas flores ou folhas, impedindo-nos de
observar muitos outros aspectos que compõem esse ecossistema em particular.
Precisamos então nos distanciar dessa percepção inicial, procurando realizar
conexões sobre a sua totalidade, sobre o seu funcionamento e as relações de
interdependência que ali estão ocorrendo. Fazendo isso, perceberemos detalhes
que antes não havíamos sequer imaginado que existiam.

A capacidade analítica do gestor se associa com a sua habilidade para


a resolução de problemas que surjam no gerenciamento de conflitos e nas
possibilidades de negociação, nos quais possam ser percebidas oportunidades
onde os outros costumam enxergar obstáculos ou problemas. Ser capaz de
analisar também remonta à capacidade de pensamento sistêmico que vimos
anteriormente e se relaciona com as possibilidades de comunicação para
produzir emoções positivas e fazer com que as equipes se engajem em busca
dos objetivos a atingir.
Turaga (2016), ao analisar a comunicação eficaz e sua contribuição para as
atividades de gerenciamento de equipes no cenário contemporâneo, apresenta
uma ferramenta interessante, que serve como um checklist para o ato comu-
nicativo que será realizado: o acrônimo Think. Ele é traduzido como “pensar”
e que é composto pelas seguinte combinação das iniciais das palavras:

„„ T: Is it true? (É verdade?)
„„ H: Is it helpful? (Vai ajudar?)
„„ I: Is it inspiring? (É inspirador?)
„„ N: Is it necessary? (É necessário?)
„„ K: Is it kind? (É educado?)

Podemos perceber que esses simples questionamentos propostos pela


ferramenta Think pode fazer toda a diferença quando nos relacionamos e
interagimos com as pessoas no ambiente de trabalho, não é mesmo? Afinal,
muitas vezes, a forma como nos comunicamos, a falta de empatia e a maior
reflexividade sobre os efeitos de nossas palavras no outro podem levar o
grupo ou a equipe a caminhos contrários ao que gostaríamos; logo, essa
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é uma capacidade social que se alia ao processo decisório, e que também


devemos desenvolver.
A partir do que vimos, constatamos que o gestor deve aperfeiçoar um rol
de soft skills para que possa cumprir bem o seu papel de tomador de deci-
sões. Tais habilidades envolvem interação, percepção, capacidade de análise
e julgamento, flexibilidade de raciocínio, inovação e criatividade, aspectos
internos e psicológicos que o constituem. Vemos que a racionalidade opera
de forma limitada neste caso, pois muitos dos pré-requisitos para a realização
de escolhas entre alternativas a seguir são de ordem comportamental.
Que possamos, caso queiramos atuar como gestores e líderes nas or-
ganizações das quais fazemos parte, desenvolver nossas capacidades de
relacionamento interpessoal e demais soft skills, focalizando na comunicação
e nos demais atributos de liderança, na inteligência emocional, no pensamento
sistêmico e analítico. Esses aspectos nos instrumentalizam para percebermos
e analisarmos os fatores contextuais e as possibilidades de ação que se
apresentam quando precisamos decidir algo. E que essas escolhas já sejam
realizadas considerando que precisaremos das pessoas que conosco traba-
lham para que as práticas que estão sendo propostas sejam implementadas.
Que possamos utilizar os modelos racionais existentes, porém sem deixar de
lado ou em segundo plano os aspectos emocionais e comportamentais que
constituem os sujeitos para que nossas ações sejam eficazes.

Referências
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Leitura recomendada
BANDURA, A. Self-efficacy: toward a unifying theory of behavioral change. Psychological
Review, v. 84, n. 2, p. 191–215, 1977.

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