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TEORIA GERAL DA EXECUÇÃO – parte 1

CÂMARA, Alexandre Freitas. O Novo Processo Civil Brasileiro. São Paulo: Atlas, 2018.

Partes no Procedimento Executivo


O procedimento executivo terá um (ou mais de um) sujeito a ocupar posição ativa e, de outro lado, um (ou mais
de um) sujeito a ocupar posição passiva. A quem ocupa posição ativa dá-se o nome de exequente. Quem ocupa
posição passiva é chamado de executado.
Tem legitimidade ativa para a execução aquele a quem a lei confere título executivo (art. 778). Assim, aquele
que a sentença reconhece como credor, o credor apontado no cheque ou na nota promissória, aquele em favor de
quem se confessa um crédito, entre outros, são legitimados ativos para a execução. E sua legitimidade ativa é
originária.
o
Outro legitimado ativo originário é o Ministério Público (art. 778, § 1 , I), nos casos previstos em lei. É o que se
dá, por exemplo, com o reconhecimento de legitimidade ativa executiva do Ministério Público para a execução de
sentença proferida em “ação civil pública” (art. 97 do CDC).
Há, ainda, legitimados secundários (ou supervenientes): o espólio, os herdeiros ou sucessores do credor,
o
sempre que, por morte deste, lhes for transmitido o direito reconhecido no título executivo (art. 778, § 1 , II); o
cessionário, quando o direito reconhecido no título executivo lhe tiver sido transferido por ato inter vivos (art. 778, §
o
1 , III; arts. 286 a 298 do CC); o sub-rogado, nos casos de sub-rogação legal ou convencional (arts. 346 e 347 do
CC). Todos estes podem não só instaurar a execução, mas nela prosseguir em caso de morte do exequente original,
o
não dependendo a sucessão processual de consentimento do executado (art. 778, § 2 ).
Já a legitimidade passiva originária é do “devedor, reconhecido como tal no título executivo” (art. 779, I). Não é
apenas o caso daquele que o título judicial condena ao cumprimento da obrigação, mas também o emitente do
cheque ou da nota promissória, o sacado na letra de câmbio, entre outros.
Também têm legitimidade passiva (secundária ou superveniente): o espólio ou os sucessores do devedor
original (art. 779, II); o novo devedor que assumiu, com o consentimento do credor, a obrigação resultante do título
executivo (art. 779, III; art. 299 do CC); o fiador do débito constante de título executivo extrajudicial (art. 779, IV), mas
não o fiador de débito representado por título judicial, salvo se tiver participado do processo de conhecimento (art.
o
513, § 5 ); o responsável titular do bem vinculado por garantia real (hipoteca, penhor, anticrese) ao pagamento do
débito (art. 779, V); ou o responsável tributário, assim definido em lei (art. 779, VI; art. 121, parágrafo único, II, do
CTN). Contra todos eles pode a execução instaurar-se ou passar a se desenvolver (ingressando o legitimado
secundário no processo por sucessão processual).

Competência
Há, no sistema processual civil brasileiro, dois diferentes regimes de regulamentação da competência em sede
executiva: o primeiro diz respeito às execuções fundadas em títulos executivos judiciais (“cumprimento de sentença”);
o segundo incide nas execuções fundadas em títulos executivos extrajudiciais (“processo de execução”).
Inicia-se, então, o exame da matéria pela competência para o cumprimento da sentença.
Quando o processo de conhecimento for de competência originária de tribunal (como se dá, por exemplo,
quando proposta “ação rescisória”), será competente (por aplicação do critério funcional de fixação da competência
interna) para a execução o próprio tribunal (art. 516, I). Esta é regra aplicável a todos os tribunais, inclusive aos
Tribunais Superiores e ao Supremo Tribunal Federal, nos casos de sua competência originária. Pois nessas
hipóteses será preciso verificar, no Regimento Interno do Tribunal, a quem compete atuar como juiz da execução.
Assim, por exemplo, no Supremo Tribunal Federal, a competência executiva é sempre do relator do processo de
conhecimento (arts. 21, II, e 341 do RISTF). Já no Superior Tribunal de Justiça, a competência executiva é do
Presidente da Corte quando é sua a decisão exequenda, e também quando tal decisão for do Plenário ou da Corte
Especial (art. 301, I e II, do RISTJ); do Presidente do órgão fracionário (Seção ou Turma), quanto às suas decisões
monocráticas ou às decisões dos órgãos que presidem (art. 302, I e II, do RISTJ); ou do relator, quanto às suas
decisões acautelatórias ou de instrução e direção do processo (art. 302, III, do RISTJ).
Nos casos em que o processo de conhecimento (rectius, fase cognitiva do processo sincrético) tiver tramitado
originariamente perante juízo de primeira instância, será do mesmo órgão jurisdicional a competência funcional para
a execução (art. 516, II). Poderá, porém, o exequente promover uma cisão de competência funcional, optando por
promover a execução no foro do atual domicílio do executado, no foro onde se encontrem bens sujeitos à execução,
ou no foro onde deva ser cumprida a obrigação de fazer ou não fazer. Para manifestar essa opção, deverá o
exequente requerer ao juízo original do processo a remessa dos autos ao foro onde a execução tramitará (art. 516,
parágrafo único).
Por fim, nos casos de execução de sentença penal condenatória, de sentença arbitral ou de sentença
estrangeira homologada pelo STJ, a competência será fixada pelas regras gerais de determinação da competência
interna (art. 516, III, e arts. 42 a 66). Vale aqui recordar que, no caso específico de execução de sentença estrangeira
homologada, a competência é da Justiça Federal (art. 109, X, da Constituição da República).
Nestes três últimos casos (sentença penal condenatória, sentença arbitral e sentença estrangeira homologada),
também poderá o exequente optar por promover execução, além dos foros que seriam competentes por força das
regras gerais acima referidas, no foro do domicílio atual do executado, no do lugar onde se encontrem os bens
sujeitos à execução ou no do lugar onde deve ser cumprida a obrigação de fazer ou não fazer (art. 516, parágrafo
único), sendo todos esses foros concorrentemente competentes com aqueles que já seriam competentes por força
das disposições gerais sobre competência interna.
Não se pode, aqui, deixar de fazer uma observação: há, no texto do art. 516, III, uma referência à competência
para execução fundada em acórdão proferido pelo Tribunal Marítimo. Trata-se, porém, de disposição ineficaz, já que
o dispositivo legal que atribuía aos acórdãos do Tribunal Marítimo eficácia de titulo executivo judicial (art. 515, X) foi
vetado, não integrando o Código de Processo Civil.
Já no que diz respeito à competência para a execução fundada em título extrajudicial, o regime é distinto. A
regra geral é a da fixação da competência pelos critérios gerais de determinação da competência interna (art.
781, caput), o que remete para os arts. 42 a 66 o trato da matéria. Sempre se observará, todavia, o seguinte: a
execução poderá ser proposta no foro do domicílio do executado, de eleição constante do título ou, ainda, do lugar
onde situados os bens a ela sujeitos (art. 781, I); tendo mais de um domicílio o executado, poderá a execução
instaurar-se em qualquer deles (art. 781, II); sendo incerto ou desconhecido o domicílio do executado, a execução
poderá ser proposta no lugar onde for encontrado ou no foro do domicílio do exequente (art. 781, III); havendo mais
de um executado, com domicílios diferentes, a execução poderá ser proposta em qualquer desses foros, por opção
do exequente (art. 781, IV); a execução poderá sempre ser proposta no foro onde se praticou ou ato ou em que
ocorreu o fato que deu origem ao título, mesmo que nele não resida o executado (art. 781, V).

Requisitos Necessários para Realizar Qualquer Execução


Aponta o CPC a existência de dois requisitos que qualifica como essenciais para que se realize qualquer
execução: o título executivo e a exigibilidade da obrigação. Sobre o título executivo se tratará adiante, em tópico
especialmente dedicado ao seu exame. Da exigibilidade da obrigação já é adequado falar.
Estabelece o art. 786 que “[a] execução pode ser instaurada caso o devedor não satisfaça a obrigação certa,
líquida e exigível consubstanciada em título executivo”. Em outros termos, o que se tem aí é a afirmação de que a
inexecução voluntária da prestação certa, líquida e exigível torna possível a execução forçada (desde que haja título
executivo).
Deve-se dizer, porém, e em primeiro lugar, que a verdadeira exigência para que se instaure e se desenvolva o
procedimento executivo não é a de que efetivamente exista uma obrigação não adimplida. Isto porque é
perfeitamente possível que o executado demonstre que a obrigação a rigor nem existe (e, claro, se não existe não
pode ser exigível). A verdadeira exigência é a de que o exequente, ao demandar a execução, afirme a existência de
obrigação certa, líquida e exigível representada por título executivo, sob pena de se considerar ausente o interesse
de agir in executivis.
Esclareça-se melhor este ponto: pode acontecer de o exequente afirmar, ao postular a execução, que é credor
de obrigação certa, líquida e exigível consubstanciada em título executivo. Isto é suficiente para permitir a
instauração do procedimento executivo. Posteriormente, pode ocorrer de o executado defender-se alegando,
precisamente, a inexistência da obrigação (ou a ausência de liquidez ou exigibilidade da prestação). Caso a defesa
seja acolhida, evidentemente, extinguir-se-á o procedimento executivo. Na hipótese, porém, de a defesa não ser
suscitada, pode até acontecer de executar-se dívida inexistente ou que não está revestida dos atributos da certeza,
liquidez e exigibilidade. Daí a razão para afirmar que o verdadeiro requisito para que se instaure e se desenvolva a
execução é a afirmação, feita pelo exequente, de que é credor de obrigação certa, líquida e exigível, representada
por título executivo.
A obrigação cuja execução se postula deve ser certa. Significa isto dizer que só se pode promover a execução
se todos os seus elementos constitutivos (credor, devedor e objeto) estiverem precisamente indicados.
Caso o bem jurídico que constitui o objeto da obrigação seja um bem fungível, que precisa ser quantificado,
será exigida não só a certeza, mas também a liquidez, ou seja, a precisa determinação da quantidade devida. Não se
considera ausente esta característica da obrigação exequenda, porém, se sua apuração depender apenas de simples
operações aritméticas (art. 786, parágrafo único).
Por fim, a obrigação exequenda deve ser exigível. A obrigação é exigível quando seu cumprimento não está
sujeito a termo, condição ou algum outro elemento que não lhe seja essencial (como, por exemplo, um encargo).
Caso especial é o das obrigações resultantes de contratos bilaterais, nos quais não é possível a um contratante,
antes de cumprir sua própria prestação, exigir o cumprimento da prestação do outro (art. 476 do CC). Neste caso,
então, incumbirá ao exequente comprovar que adimpliu sua prestação, sob pena de extinção do processo (art. 787).
Pode acontecer, porém, de o exequente ainda não ter cumprido sua prestação e isto passar despercebido pelo juiz,
que determina a citação do executado. Pois neste caso se admite que o executado deposite em juízo a prestação ou
coisa por ele devida, como forma de eximir-se de sua obrigação, não se permitindo, porém, ao exequente seu
levantamento enquanto não cumprir (ou demonstrar que já cumprira) a prestação que lhe toca (art. 787, parágrafo
único).

Título Executivo
Chama-se título executivo ao ato jurídico dotado de eficácia executiva. Trata-se, pois, de um ato jurídico com
aptidão para permitir a incidência da responsabilidade patrimonial (conceito de que se tratará com mais vagar
adiante, mas que agora precisa ser ao menos apresentado para que se possa compreender a definição de título
executivo).
Consiste a responsabilidade patrimonial (em uma definição que tão somente se propõe a uma primeira
apresentação do fenômeno) na possibilidade de sujeição de um patrimônio para viabilizar a realização de um crédito.
Assim, o título executivo é o ato jurídico capaz de legitimar a prática dos atos de agressão a serem praticados sobre
os bens que integram um dado patrimônio, de forma a tornar viável sua utilização na satisfação de um crédito.
A exigência de que exista um título executivo para que possa desenvolver-se a execução é um mecanismo de
proteção do demandado. Não existisse esta exigência e qualquer pessoa que se dissesse credora de outra poderia
demandar a execução forçada. Exigindo a lei, porém, que exista título executivo para que isto ocorra, protege-se o
devedor, que só poderá ter seu patrimônio agredido se o demandante apresentar um título executivo. Afinal, nunca é
o
demais recordar que ninguém será privado de seus bens sem o devido processo (art. 5 , LIV, da Constituição da
República), e só há devido processo executivo (ou seja, só há agressão patrimonial legítima) se o demandante tiver
um título executivo que a sustente.
A função do título executivo, em razão disso que acaba de ser dito, vincula-se a uma das “condições da ação”, o
interesse de agir. Aquele que, não dispondo de título executivo, demanda a execução forçada é “carecedor de ação”
por se ter valido de via processual inadequada para fazer valer em juízo sua pretensão. De outro lado, aquele que
tem título executivo extrajudicial pode abrir mão da eficácia executiva de seu título e optar pelo processo de
conhecimento (inclusive pelo procedimento monitório: FPPC, enunciado 446), a fim de obter título executivo judicial
(art. 785). Será, porém, adequada a utilização da via processual executiva por aquele que se apresente em juízo
como detentor de um título executivo (judicial ou extrajudicial).
O título executivo é, pois, o ato jurídico que faz da execução a via processual adequada para que se postule
tutela jurisdicional, assegurando o legítimo interesse de agir in executivis. Perceba-se que o título executivo é o ato
jurídico, e não o documento que o representa. Assim, por exemplo, a afirmação legal de que a sentença civil é título
executivo (art. 515, I) deve ser entendida no sentido de que o ato do juiz que impõe o cumprimento de um dever que
exige posterior execução forçada é título executivo, não sendo título o documento que lhe dá suporte. Deste modo,
se houver um acidente que destrua os autos (impressos ou eletrônicos) e, em razão disso, se impuser a restauração
de autos (arts. 712 a 718), formar-se-á um novo suporte, mas será o mesmo o ato (a sentença), que servirá de título
executivo, não tendo sido constituído um novo título.
Do mesmo modo, a afirmação legal de que o cheque é título executivo (art. 784, I) não pode levar o intérprete a
considerar que o título executivo é cada uma das folhas de um talão de cheques. Na verdade, o título executivo é
a ordem de pagamento à vista emitida sob a forma de cheque. E o mesmo raciocínio se aplica a todos os demais
títulos dotados de eficácia executiva.
Dividem-se os títulos executivos em dois grandes grupos. De um lado, os títulos executivos judiciais; do outro,
os títulos executivos extrajudiciais. São títulos judiciais aqueles que são formados através de um processo (isto é, de
um procedimento em contraditório), e extrajudiciais, os demais títulos executivos. A distinção é relevante por vários
fatores, já tendo sido um deles examinado: é que a execução dos títulos judiciais se submete ao regime daquilo que
ficou conhecido, na linguagem processual brasileira, como cumprimento da sentença, enquanto a execução dos
títulos extrajudiciais se faz através do que se convencionou chamar de processo de execução. A regulamentação do
cumprimento da sentença, como já se viu, consta do Livro I da Parte Especial do CPC, só se aplicando o regramento
do processo de execução em caráter subsidiário; a regulamentação do processo de execução está no Livro II da
Parte Especial do CPC, sendo-lhe aplicáveis, subsidiariamente, as disposições acerca do cumprimento de sentença.
Há outra diferença, porém: o meio de defesa do executado no cumprimento de sentença é a impugnação; no
processo de execução são os embargos do executado. Na impugnação há limitações cognitivas intensas, o que não
acontece nos embargos do executado.
Vale registrar, por fim, que nada impede a criação de título executivo extrajudicial por negócio processual (art.
190). Assim, por exemplo, admite-se que haja uma confissão de dívida por instrumento particular assinado pelo
devedor, mas sem qualquer testemunha (o que a lei exige como requisito do título executivo extrajudicial previsto no
art. 784, III), a que se atribua eficácia de título executivo por convenção das partes.

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