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INTRODUÇÃO

O presente pré-projecto tem como objectivo garantir a materialização do trabalho de


fim de curso para a obtenção do grau de licenciado em Direito. Pretende-se com este trabalho,
debruçar-se sobre um tema bastante relevante relacionada à matéria de Direito Penal:
Criminalização do aborto: Problema ou solução.

Ao longo da história, vários foram os povos que estudaram e discutiram a


problemática do aborto, tais como os Israelitas, Gregos, Romanos etc. Sendo o relato mais
antigo sobre a prática referida a de um texto médico entre 2737 e 2696 A.C pelo Imperador
chinês Shen Nung.

Embora se afirme ser impossível determinar o número de abortos provocados no


mundo a cada ano, estima-se que 25 milhões de abortos não seguros foram realizados em todo
mundo entre 2010 e 2014, totalizando 45% de todos os abortos, sendo que 97% deles
ocorreram em países em desenvolvimento na África, Asia e América Latina. Na mesma
esteira, de acordo a Associação para o desenvolvimento da família (2017), a cada 9 minutos
morre uma mulher em consequência de complicações de um aborto clandestino.

O tema em questão tem marcado a história, pois gravita em seu torno questões tanto
sociais quanto políticas. O debate em torno da criminalização do aborto arrasta com ele
opiniões divergentes, sejam elas de natureza culturais, religiosas, emocionais, científicas ou
até mesmo costumeiras. Destarte, autores, como Santos (2020), apontam a criminalização do
aborto como parte integrante da história penal de diversos países ao redor do mundo.

O debate mais conhecido nesta matéria é indubitavelmente o travado nos Estados


Unidos da América. Não relacionado directamente a sua constituição, mas sim ao caso Roe
VS Wade. Julgado pela suprema corte em 1973. A criminalização do aborto divide as
opiniões em dois grandes grupos. De um lado, um grupo que defende o direito a escolha da
mulher e por outro lado os defensores do direito a vida do nascituro.

Neste sentido é necessário realçar que Angola como estado democrático de direito,
considera a vida o bem fundamental mais precioso. Tendo consagração constitucional. De
acordo a constituição no seu artigo 30º a vida é inviolável. Concernentemente ao aborto, o
Código penal de 1886, não mais em uso, penalizava toda e qualquer conduta que por meio de

1
violência, bebida, fármacos, com ou sem consentimento da mulher, fosse abreviar a vida do
nascituro. Sem excepções nenhuma (artigo 358º).

No entanto, a Lei n.º 38/20 que revoga o código Penal de 1886 apresenta um código
penal, que corresponde a uma reforma profunda no ordenamento jurídico-penal Angolano.
Uma das alterações trazidas pelo Código penal vigente fora o abandono do termo “Aborto”.
Lê-se no artigo 154º “Interrupção de gravidez”. Entretanto a mudança não se cingiu somente
na alteração nominal; a previsão da extinção da responsabilidade e atenuação especial da
pena, nos casos em que a Interrupção da gravidez seja o único meio de remover qualquer tipo
de perigo para a gestante; que o feto, provado por laudo médico, seja inviável ou resultar de
crime contra a liberdade e autodeterminação sexual, são outras alterações relativas a norma
que criminaliza o aborto.

É crucial ressaltar que o que se pretende com o presente estudo não é classificar ou
categorizar como boa ou má a norma que criminaliza o aborto, mas entender como a
sociedade angolana encara a criminalização do aborto.

Para um melhor entendimento, o trabalho dividiu-se em três capítulos. No capítulo I


tratou-se do referencial teórico, onde os temas abordados dizem respeitos aos aspectos sociais
e históricos-jurídicos relacionados ao aborto. No capítulo II descreveu-se o processo
metodológico para a colecta de dados. No capítulo III fez-se a apresentação dos dados, sua
análise e discussão dos resultados.

Diante do exposto, a presente pesquisa alvitra responder a seguinte questão:

Qual é a posição da Sociedade Angolana sobre a criminalização do Aborto?

Objectivos do estudo

GERAL

 Analisar o nível de aceitação da sociedade Angolana em relação a


criminalização do aborto.

2
ESPECÍFICOS

 Verificar o nível de conhecimento da Sociedade Angolana em relação a


Interrupção Voluntaria da Gravidez;
 Compreender os aspectos legais e sociais que gravitam em torno do aborto e
sua criminalização;
 Entender os motivos subjacentes a Criminalização do Aborto.

JUSTIFICATIVA

O interesse pelo tema surge da necessidade de se compreender o que a população


pensa sobre a criminalização ou descriminalização do aborto. O trabalho é socialmente
relevante porque acresce conteúdo ao pouco que já foi escrito sobre o tema, de acordo a
realidade socio-jurídica angolana. Ademais, versa sobre uma questão actual.
Academicamente, este trabalho é pertinente, pois serve como manual de consulta para a
continuidade dos estudos relacionados a criminalização do aborto e seus “Porquês”

3
CAPÍTULO I – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

1.1. ASPECTOS SOCIAIS

O aborto é um tema debatido muitas vezes e em todas as sociedades. Registos revelam


não se tratar de uma práctica recente. Tendo em conta que os primeiros relatos relativamente
ao aborto surgiram na antiga china. E demais registos apontam para o Egipto, Grécia. Os
antigos gregos acreditavam que os fetos não possuíam alma, logo não os consideravam como
seres vivo. 1 O aborto, independentemente do tempo, permanece como um assunto polémico.
As questões atinentes ao aborto englobam duas grandes perspectivas; de um lado, a social
compreendendo as consequências da práctica; o aborto como problema de saúde pública,
possíveis causas do aborto. E o aborto sob o prisma religioso. E por outro lado, a jurídica.
Embora de lados opostos, ambas perspectivas partilham um laço estreito de conexão.

Ao redor do mundo discute-se de forma acesa matéria relacionadas ao início da vida.


É desse jeito um dos temas, tal como alude Martins e Nunes (2010), bioéticos mais cruciais,
controversos e desafiadores até ao momento. E a interrupção da gravidez é um dos temas mais
debatidos nos últimos anos. Segundo os autores supracitados, a interrupção da gravidez nos
remete as questões como “Quando começa a vida humana?”, “O embrião/feto tem direito a
vida?”. No Brasil, decorre ser uma questão de nível complexo no âmbito doutrinário, não
encontrando consenso sobre o facto. Por outras palavras, o país em questão escolhe todas as
doutrinas que versam sobre o assunto, e de forma paradoxal, nenhuma delas. Sobre o início da
vida, a doutrina identifica, quatro teorias que versam sobre o assunto:2

 Teoria Concepcionista
 Teoria da Nidação:
 Teoria do Sistema nervoso central:
 Teoria da Pessoa humana em potencial ou pessoa humana tout court:
 Teoria Natalista

1
Cfr. Almeida, Aborto induzido como problema de saúde no Huambo e uma estratégia para a sua
redução, p.21; Cohen, Questões éticas sobre do aborto e incesto, p. 1
2
Vd. Novelino, Direito Constitucional, p.388-389, apud Santos, Direito à vida: Considerações acerca do
aborto e da eutanásia, p. 29-30
4
Segundo a teoria da concepção, o início da vida começa com a fecundação do óvulo
pelo espermatozoide. A segunda teoria, referente a Nidação, estipula que a vida começa a
partir do momento da fixação do zigoto do útero materno. A terceira teoria, busca seu apoio
ao funcionamento do Sistema nervoso central, esta, declara que a vida do feto inicia-se
somente com o desenvolvimento neurológico. A teoria da Pessoa humana em potencial ou
pessoa humana Tour court, adotada pelo comité de ética da França, afirma que o início da
vida começa-se a contar a partir da 24ª a 26ª semanas, sendo este o período em que o bebê
tem maior possibilidade de vida extrauterina, permitindo até antes do tempo referido a
gestante abortar. Para a teoria Natalista, a vida começa a partir do nascimento e desta feita,
sua protecção só justifica-se depois de ocorrer seu nascimento.3

Para quem defende a descriminalização do aborto, existe uma diferença entre o feto e
a pessoa já nascida. Explicam estes, que a segunda é titular de direitos, estando protegida pelo
art.º 30º da Constituição da República de Angola (doravante, CRA) e o primeiro, ainda não o
é. Para estes, o direito que é garantido pelo artigo referido não se estende aos fetos. Algumas
das opiniões feministas giram em torno da liberdade de escolha da mulher. Sustentando seus
argumentos em como a constituição assegura à mulher, liberdade. Concluindo que, se a
mulher é livre então ela pode fazer o que quiser com seu corpo, sendo assim, tendo em conta
que o feto é parte integrante da mesma, por lógica, a mulher devia ter a liberdade de decidir o
que fazer.4 Alega-se que com a descriminalização do aborto haverá uma clara redução nos
números referentes a práctica do aborto clandestino, e consequentemente uma redução nos
riscos inerentes a mesma.

Do lado oposto da moeda, existe aqueles para quem a criminalização do aborto deve
permanecer. Para estes últimos, a criminalização do aborto encontra sua justificativa no facto
de que logo de início a pessoa é criada com a fusão do óvulo com o espermatozoide. Para
estes, é aí que se forma a pessoa uma vez que é nesse momento que os genes irrepetíveis de
cada pessoa estão reunidos. A conclusão a que se chega é que o desenvolvimento do embrião
inicia-se logo desde a fertilização. E consequentemente, o bem jurídico assegurado e
protegido pela norma do art.º 30º da CRA, se estende ao feto.5

3
Vd. Fernandes. Curso de Direito Constitucional, p. 362, Novelino, Direito Constitucional, p.388-389,
apud Santos, Ob. Cit. P. 29-30
4
Vd. Reis, Lopes, Franco e Vilela, Direito, Religião, Direito à vida e o Aborto, p.14
5
Idem, p.14
5
Segundo Reis et. al. (2015), para quem defende a criminalização do aborto “o feto é
um ser separado da mãe, apesar de depender dela não se pode confundir com ela, tal como
acontece com os recém-nascidos, que são inteiramente dependentes de terceiros mas não é por
isso que se confundem com eles”.

O autor supramencionado, continua dizendo, que ao contrário do que os pró-aborto


afirmam, o aborto clandestino continuará a existir, visto que a sua descriminalização é
condicionada a um determinado período de tempo. Relativamente aos que afirmam que a
frequente prática do aborto demonstra que este deveria ser permitido, os contra o aborto,
contra-argumentam que existem alguns crimes, como o roubo, são praticados e isso não é
motivo suficiente para os descriminalizar.

1.1.1. O ABORTO COMO PROBLEMA DE SAÚDE PÚBLICA MUNDIAL

A Organização Mundial de Saúde (doravante, OMS) estima que globalmente, cerca de


68 mil mulheres morram a cada ano em consequência do aborto inseguro e clandestinos, e
cerca de cinco milhões sofrem danos temporários ou permanentes (Canário, 2009, citado em
por Etapechusk & Costa, 2016, p.5).

Segundo um estudo realizado pela Dra. Almeida (2020), a taxa de mortalidade nos
países desenvolvidos na sequência do aborto é de 1 por 100 000 nados-vivos, muito inferior à
taxa de 680 por 100 000 observada na Africa subsariana. A autora, ressalta o facto de que em
2008, a gravidez não planeada no mundo menos desenvolvido foi um terço mais alta que no
mundo desenvolvido. Sendo que metade dessas “gravidezes” não planeadas acabaram em
abortos.

A mesma autora refere que segundo a OMS a gravidez indesejada causa


aproximadamente 45 milhões de abortos por ano em todo o mundo. Em 2009, a organização
acima mencionada, divulgou dados alarmantes sobre a prática. Estimando a ocorrência de 42
milhões de abortos por ano, 20 milhões dos quais inseguros, causando 70.000 mortes
maternas e 5 milhões de mulheres incapacidade temporal ou permanente.6

6
Almeida, Aborto induzido como problema de saúde no Huambo e uma estratégia para a sua redução,
p.22;
6
Para Almeida (2020), os dados dos países em desenvolvimento são tidos apenas como
a ponta do iceberg. Estima-se que o número deve ser bem mais elevado do que os registos
apontam. Isto, porque acredita-se que embora as instituições públicas registem, existe um
número elevado de abortos pertencentes as cifras negras, ou seja, não registados.

Em países como Angola, tal como a Dra. Almeida (2020), refere,

os métodos farmacológicos do tipo das prostaglandinas (misoprostol) têm


sido cada vez mais usados para indução do aborto, há dificuldade na
identificação do aborto provocado. Deste modo, a incidência real do aborto
provocado é desconhecida, sendo a grande maioria dos abortos considerados
espontâneos.

Sobre a temática abordada neste estudo, um relatório feito em 2019 pela Comissão
Intersectorial para a Elaboração dos Relatórios Nacionais de Direitos Humanos, em Angola,
revelou estar preocupado com a criminalização do aborto no recém-adoptado código penal.
Declarando que os procedimentos necessários para se ter acesso ao aborto legal, mostram-se
demasiados complexos, induzindo assim as mulheres a procurarem abortos clandestinos
inseguros que ponham em riscos as suas vidas e saúde. O comité mostrou-se também
preocupado com o estigma social associado às pessoas que procuram informações sobre
serviços de aborto seguro, e sobre a alta taxa de gravidez na adolescência e o acesso limitado
a serviços de saúde sexual e reprodutiva.7

1.1.2. A RELIGIÃO E O ABORTO

Para Geertz (citado em Coutinho, 2012, p.178) a religião é um sistema de símbolos


que estabelece sentimentos e motivações poderosas, penetrantes e duradouros, pela
formulação de concepções de uma ordem geral de existência e pelo seu revestimento com
uma tal de aura de factualidade que tornam os sentimentos e as motivações unicamente
realísticos.

7
Vd. Comissão Intersectorial para a Elaboração dos Relatórios Nacionais de Direitos Humanos, Angola
na Implementação dos Direitos Civis e Políticos, p.29-30
7
De uma outra forma, olha-se para a religião como a crença na existência de forças
sobre-humanas, criadoras do universo. Sendo que cada um dos sistemas organizados que se
baseiam nessa crença possuem rituais e doutrinas próprias.8

Apesar de a religião não ser o cerne da pesquisa, reconhece-se a influência social e


moral que a mesma exerce sobre a sociedade, e por essa razão é necessário assinalar o que
algumas delas ensinam em sua doutrina a respeito do tema. Procurou-se buscar as religiões
mais conhecidas e difundidas ao redor do mundo.

Vale ressaltar, nas palavras de Santos (2012), que a religião, de forma geral, não
comanda o que o Direito vai decidir a respeito, mas acaba influenciando, já que quem faz o
Direito são as pessoas, e cada uma possui um posicionamento pessoal que acaba interferindo.

1.1.2.1. CATOLICISMO

Relativamente a Católica, alguns estudos apontam que a igreja católica sempre


posicionou-se do lado oposto da descriminalização do aborto. Tendo sempre considerado o
aborto um crime contra a vida. 9 No entanto, registos históricos sugerem o contrário. De
acordo Cavalcante e Xavier (2006), na idade média não se passava desse modo. Sendo que
para Tomás de Aquino a humanização somente começava 40 dias depois da concepção.

Na mesma esteira, Rosendo e Gonçalves (2015), realçam o facto de que para o


cristianismo, a defesa da vida do feto, é relativamente recente. Destacam, também, que nos
primeiros seis séculos o motivo subjacente a punição do aborto centrava-se na honra e não
relacionada a um crime contra a vida. Para estes autores, nesse período, o aborto não era
considerado propriamente um pecado, mas apenas uma “falta grave” que ocultaria o
verdadeiro pecado, no caso, o adultério. Foi somente a partir do século XIX, em um contexto
de secularização e de separação entre Estados nacionais e religião, é que a defesa da vida
começara a surgir de forma mais consistente no discurso religioso em favor do feto como bem
absoluto e a ideia de aborto como um pecado em si começou a se difundir.

Para Ribeiro (2007), a doutrina da igreja católica não se manteve durante a história
constante. Por sinal, segundo a autora supracitada, foi por volta do século IV que São Basílio
trouxe a teoria que a igreja adoptou até agora, denominando-a de “Animação imediata”.
8
Cfr. Ximenes, Minidicionário de Língua Portuguesa, Apud Ribeiro, A posição de algumas Religiões e
Questões Polêmicas acerca do Aborto, p.8
9
Vd. Santos, Direito à vida: Considerações acerca do aborto e da Eutanásia, p, 40
8
A autora referida faz menção de que esse entendimento não se manteve durante muito
tempo, sendo que durante o século VI o código Justiniano trouxe o entendimento de que o
feto somente adquiria alma a partir do momento em que tomasse forma humana, permitindo o
aborto antes que essa fase ocorresse; no século XVI o concilio de Trento entendeu,
doutrinariamente, que o feto passava a ter alma quando apresentasse seus primeiros
movimentos ainda no interior do útero, chamando de a “A teoria do movimento”. Mais tarde o
Pio IX reestabeleceu a teoria da animação imediata.

Em Angola os bispos católicos decidiram mostrar o seu ponto de vista através de uma
carta que dirigiram à sociedade angolana dado o retomar da discussão sobre a despenalização
do aborto. Nesta carta, e em cinco alíneas, defendem a vida. Explicam que “o aborto é contra
a Lei Divina”, ninguém pode suprir a vida de outrem e defendem que realizá-lo é ir contra a
identidade cultural, revelando “desprezo pelos valores fundamentais da sociedade angolana”.
Defendem ainda que não faz sentido a constituição angolana ter abolido a pena de morte e
agora atentarem para a “morte de inocentes”.10

Para Rosendo e Gonçalves (2015),

Sociedades fortemente marcadas por uma tradição católica são conformadas


por um imaginário social em que a maternidade não se coloca como uma
escolha, mas como uma obrigação que se impõe duplamente, como uma
realização e como uma “punição” para as mulheres, que, caso tenham
relações sexuais fora do escopo do casamento, devem arcar sozinhas com o
ônus dessa escolha.

1.1.2.2. PROTESTANTISMO

Os estudos mostram que o Protestantismo, em uma base comparativa entre estes e a


católica, são de forma geral bem mais flexíveis. Sob o prisma dessa organização religiosa, o
aborto é visto de forma mais amena, dando uma maior relevância a vida materna,
reconhecendo o facto de que é esta quem passa por todos os sabores e dissabores da gravidez
desde a fecundação ao nascimento.11 Ribeiro (2007), ressalta outra diferença entre os
protestantes e os católicos, cingindo-se no momento em que a vida começa.

Reis, et al. Direito, Religião, Direito à vida e Aborto, p. 20


10
11
Vd. Ribeiro, A posição de algumas religiões e questões polémicas acerca do aborto, p. 45; Santos,
Direito a vida: Considerações acerca do aborto e da eutanásia, p. 41
9
1.1.2.3. ISLAMISMO

Os islâmicos, de forma geral não são a favor do aborto. A diferença reside na questão
de se saber quando o feto ou embrião é considerado ser humano. Segundo Santos (2012), o
nascituro passa por diversos estágios até que se torne humano. E enquanto não possuir alma,
enquanto não estiver revestido em carne e osso, não é humano, portanto, pode ser abortado.

A maioria dos estudiosos islâmicos considera que a alma é adquirida aos 4 meses (120
dias). Após este momento o aborto apenas pode ser realizado em situações muito excecionais,
nomeadamente quando existe perigo de vida para a mãe, em virtude do princípio da shariah
de escolha do “menor de dois males”. A morte da mãe é mais prejudicial do que a do feto,
porque possui responsabilidades e constitui um pilar da família., durante os quais o embrião
ou feto ainda não é um ser humano.12

Se o aborto ocorrer antes de o feto se tornar “humano”, então a indenização a ser paga
é leve. Mas se ocorrer após o feto se tornar um ser animado, o aborto é punido com o
assassinato do que o causou. O Corão condena qualquer acto de matar, mas em caso de risco à
vida da mãe, ela é a detentora da vida principal, e deve ser mantida.13

1.1.2.4. JUDAÍSMO

Para o judaísmo, o aborto em caso de risco para a saúde da mãe, este é permitido, e
não é posto em comparação com o crime de homicídio. Esta religião considera o feto que
oferece risco à sua genitora, um “rodef” (agressor).14 Para esta religião, o feto faz parte do
corpo da mãe e que prevalece é a saúde da mulher, dentro do seu equilíbrio psíquico e físico e
assegura-se ainda que com relação a encarnação, se o feto não chegar a nascer, seu espírito
retorna à Deus.15 Relativamente ao momento do início da vida, O judaísmo considera que o
feto só pode ser considerado como ser humano, um mês logo após o seu nascimento.

A lei judaica é mais permissiva no que respeita a abortos nos primeiros 40 dias de
gravidez, já que considera o feto como sendo de relativo pouco valor durante este período.
Abortos devido a defeitos do feto ou para proteger a saúde mental da mãe são proibidos por
certas escolas do judaísmo e permitidos por outras em circunstâncias diversas.16
12
Reis, et al. Direito, Religião, Direito à vida e Aborto, p.9
13
Santos, Ob. Cit. p. 41
14
Santos, Ob. Cit. p. 42
15
Ribeiro, Ob. cit. p. 47
16
Reis, et al. Ob. cit, p.10
10
1.2. POSSÍVEIS CAUSAS DO ABORTO

Muitas pesquisas revelam que este fenómeno afecta intensamente a existência da


mulher e sua vivência.17 Para Pattis (citado em Borsari, 2012, p.21), o aborto é considerado
como tabu, na medida que se afasta da esfera cotidiana apresentando significado
extraordinário e mostrando-se como uma fronteira entre a vida e a morte; na verdade, um
lugar de transcendência.

Muitos estudos, de acordo a autora referida, revelam que os principais motivos que
levam a mulher a praticar o aborto consubstanciam-se na ausência de condições financeiras,
falta de apoio do pai e relacionamentos instáveis. 18 Na mesma esteira, Cavalcante e Xavier
(citado em Etapechusk & Costa, 2016, p.4) acrescem aos motivos para abortar, priorização da
vida profissional e o facto das mulheres em causa serem muito jovens.

Diniz (citado em Etapechusk & Costa, 2016, p.4) “acrescenta que a gestação não
planejada e os abortos induzidos são atribuídos em grande parte, ao uso inadequado de
métodos anticoncepcionais, a falta de educação sexual, ao problema da gravidez na
adolescência, ao atraso cultural, e a paternidade irresponsável.”

1.3. CONSEQUÊNCIAS DO ABORTO

A literatura que versa sobre as consequências do aborto, do prisma social, tem


centrado no aspecto psicológico. No que tange as consequências físicas, Etapechusk e Costa
(2016), mencionam que a mortalidade é uma pequena amostra da problemática. Durante o
processo do “pós-aborto”, é comum a mulher passar por um processo de culpabilização em
decorrência dos valores culturais impostos pela sociedade, enquanto a figura paterna não é
incluída de maneira intensa no que se refere ao assunto.19

Segundo Borges (citado em Etapechusk & Costa, 2016, p.7)

a mulher que realiza o aborto pode vir a experienciar sentimentos de culpa,


impulsos suicidas, pesar, abandono, perda da fé, baixa estima pessoal,
preocupação com a morte, hostilidade, raiva, desespero, desamparo, desejo
de lembrar a data de nascimento, alto interesse em bebês, frustração do

17
Borsari, Aborto provocado: Vivência e significado: Um estudo fundamentado na fenomenologia, p.21
18
Vd. Borsari, Ob. cit., p.25
19
Silva e Silva, As consequências jurídicas e psicológicas diante do aborto induzido no Brasil, p.256
11
instinto maternal, mágoa e sentimentos ruins em relação as pessoas ligadas a
situação, assim como desejo de terminar o relacionamento com o parceiro,
perda da libido, frigidez, incapacidade de se auto perdoar, irritabilidade,
pesadelos, tonturas, tremores e sentimento de estar sendo explorada.

De forma sucinta, os estudos revelam que o aborto provoca um luto em razão da


ocorrência de uma morte real. No caso do aborto induzido, ele é considerado como um não
evento, pois não houve uma morte convencional. No entanto, para a mulher isso se torna
opressivo, visto que ela não pode vivenciar o luto de forma exposta, ou seja, um “luto não
autorizado”, já que muitas delas omitem o facto, não se orgulham de tal atitude, e não irão se
sentir socialmente acolhidas.20

1.4. ASPECTOS JURÍDICOS

A questão jurídica concernente ao aborto, não só em Angola, mas no resto do mundo


desperta acirradas discussões. Comumente, o que se discute é a autonomia da mulher (direito
de escolha) VS direito a vida dos nascituros (vida intrauterina).

Desde a década de 60 do século passado, o mundo assiste um fenómeno de


liberalização da legislação sobre o aborto. Em harmonia com os novos valores sociais e
revelando uma crescente sensibilidade diante dos direitos fundamentais das mulheres,
legisladores, ou tribunais constitucionais de incontáveis países como, Estados Unidos,
Alemanha, França, Inglaterra, Itália, Espanha, Canadá etc. Esses países promoveram
significativas modificações em suas ordens jurídicas, legalizando a interrupção voluntária da
gravidez, desde que feita dentro de determinados prazos ou sob determinadas indicações. 21
Segue abaixo alguns países e seu posicionamento sobre o aborto:

Figura 1- Aborto e
Legislações.

20
Ibidem, p.257
21
Sarmento, Legalização do aborto e constituição, 46
12
Fonte: Center for reproductiveRights, New York EUA, 2009

Para Sarmento (2005)

A criminalização do aborto tem como cerne, de forma justa e legitima,


a vida do embrião. Embora haja ampla discordância sobre como
qualificar a situação jurídica e moral do nascituro, é indiscutível que
não se deve desconsiderar este importantíssimo elemento no
equacionamento do tratamento legal a ser dado para o caso.

O autor supramencionado afirma que não se pretende ignorar os direitos da mulher,


mas que no entanto o entendimento que vem prevalecendo nas decisões dos tribunais
constitucionais de todo mundo, é o de que a vida do nascituro é protegida pela constituição,
não com a mesma intensidade com que se tutela o direito à vida das pessoas humanas já
nascidas. E por ordem biológica, social, moral, tem-se considerado também que o grau de
protecção constitucional conferido à vida intrauterina vai aumentando na medida em que
avança o período da gestação.22

Porém, para quem defende a descriminalização do aborto, o direito a vida é conditio


sine qua non para todos os outros direitos fundamentais. Estendendo-se a existência do ser
humano, não só no âmbito físico mas como também no âmbito jurídico. Com efeito, para
quem é pró-aborto, se o ser humano não é vivo, este não é titular de direitos.23

No entanto, Diniz (citado em Rosendo & Gonçalves, 2015, p.309) afirma que “se as
normas o protegem é porque tem personalidade jurídica”. Neste ponto, tal como explicam as
autoras Rosendo e Gonçalves (2015) Diniz, justifica o direito do nascituro como algo
absoluto, todavia, o Dr. Bobbio (citado em por Rosendo & Gonçalves, 2015, p.310)
22
Cfr. Sarnento, Legalização do aborto e constituição, p.46
23
Rosa, et al. Aborto e Direito à vida: (Não) recepção do aborto em caso do estupro, p.1347.
13
esclarecera que os direitos não são absolutos, mas construídos historicamente formando uma
classe variável. Acresce, o autor, de que é inconcebível atribuir fundamento absoluto a
direitos historicamente relativos.

Para Tiburi (citada em Rosendo & Gonçalves, 2015, p.310), o argumento de Diniz,
reflete um posicionamento machista, cujo discurso revela outro tipo de aborto: não mais do
feto, mas o das próprias mulheres.

A discussão jurídica em torno do aborto — sua criminalização ou descriminalização


— giram em torno de dois princípios; o argumento principal dos defensores da legislação ou
descriminação do aborto é do respeito a autonomia reprodutiva da mulher, tendo como base a
liberdade individual. Do outro lado, os oponentes do aborto defendem a ideia de que a vida
humana é sagrada, por princípio. Por um lado os proponentes da legislação do aborto
encontram abrigo no princípio da autonomia reprodutiva e, por outro, os oponentes no
princípio da heteronomia da vida humana.24

1.4.1. ASPECTOS HISTÓRICOS-JURÍDICO

ESTADOS UNIDOS

O debate mais conhecido nesta matéria é indubitavelmente o travado nos Estados


Unidos da América. Não relacionado directamente a sua constituição, mas sim ao caso Roe V.
Wade. Julgado pela suprema corte em 1973.25

Os críticos mais implacáveis da sentença Roe dizem que o tribunal autorizou o


homicídio. Para eles, o feto é uma pessoa a partir do momento da concepção e seu direito à
vida é mais importante do que qualquer razão que uma mulher possa ter para matá-lo. 26
Contudo, críticos mais sofisticados, adoptam outro ponto de vista. Segundo esses, a decisão
do tribunal no caso Roe contra Wade não teve argumento jurídico que o justificasse, mas foi,
no sentido pejorativo do termo, uma decisão política que o tribunal não tinha o direito de
tomar.27

Dworkin (2003) afirma então, que poucas pessoas entendem as questões


constitucionais levantadas pelo caso. Para este autor, o Caso Roe, sustentou de forma geral
24
Vd. Mato, O aborto, p. 6
25
Idem
26
Dworkin, Domínio da vida: Aborto, eutanásia e liberdades individuais, p. 140
27
Idem, p.142
14
que os Estados não podem de modo algum proibir o aborto antes do quarto mês de gravidez, e
que também não pode proibir antes do sétimo mês a não ser nos raros casos em que passa a
pôr em risco a saúde da mãe.

Para o autor referido, os argumentos levantados na época ganham suporte jurídico,


pois, as leis que proíbem o aborto (…) privam as mulheres grávidas de uma liberdade ou
oportunidade que é crucial para muitas delas; uma mulher forçada a ter uma criança que não
deseja porque não pode fazer um aborto seguro pouco depois de ter engravidado não é dona
do seu corpo, pois a lei impõe-lhe uma espécie de escravidão; para muitas mulheres, ter filhos
indesejados significa a destruição de suas próprias vidas porque elas próprias não deixaram de
ser crianças, porque não mais poderão trabalhar, estudar ou viver de acordo com o que
consideram importante ou porque não têm condições financeiras de manter os filhos.28

A sentença do juiz Blackmun declara Dworkin (2003), no caso Roe VS Wade


demonstrou que uma mulher grávida tem um direito constitucional específico à privacidade
em questões de procriação e que esse direito geral inclui o direito ao aborto, desde que ela e
seu médico optem por fazê-lo. Blackmun (citado em Dworkin, 2003, p.48) acrescentou que as
razões de um estado par anular esse direito, fazendo do aborto um crime, não eram
inexoráveis até o sexto mês de gravidez.29

FRANÇA

Diferente dos Estados Unidos, a iniciativa de legalizar o aborto partiu do legislador e


não do judiciário. Segundo Sarmento (2005), em 1975 foi aprovada a Lei nº 75-17 30 que teria
vigência temporária por 5 anos, permitindo a realização, por médico da interrupção voluntária
da gravidez nas dez primeiras semanas de gestação a pedido da gestante quando alegue que a
gravidez lhe causa angustia ou em qualquer época, quando haja risco à sua vida ou saúde, ou
exista forte probabilidade de que o feto gestado venha a sofrer, após o nascimento de doença
particularmente grave reconhecida como incurável no momento do diagnóstico.

28
Idem, p.143
29
Cfr. Dworkin, Domínio da Vida: Aborto, eutanásia e liberdades individuais, p. 145; Sarnento,
Legalização do aborto e constituição, p.47; Santos, Criminalização do aborto: Propósitos legais e
repercussões fáticas, p. 48
30
A lei de 17 de janeiro de 1975 conhecida como a lei do Véu, uma lei que regia a descriminalização do
aborto na França. Elaborada por Simone Veil Ministra da saúde sob presidência de Valery Giscard
d’Estaing
15
Depois de os parlamentares tentarem declarar a inconstitucionalidade da lei, de acordo
com Louis Favoreau e Laic Philip o Conselho de Estado, na referida decisão, partiu do
princípio de que “a vida e a pessoa existem antes do nascimento, mas que o direito
correlactivo que o garante não deve ser considerado como absoluto”31

As normas da lei francesa de 1975 foram tornadas definitivas; em 1982 foi editada
uma lei prevendo a obrigação da seguridade social francesa de arcar com 70% dos gastos
médicos e hospitalares decorrentes da interrupção voluntária da gravidez; o conselho
constitucional reafirmou a constitucionalidade da norma na sua decisão n. 2001- 446.

RÚSSIA

Segundo Félix (2018), a Rússia, estado sucessor da URSS, fora o primeiro país do
mundo a legalizar o aborto, em 1920, após revolução russa. Como forma gratuita nos
hospitais. No entanto, no governo de Stalin, o aborto tornou a ser um acto proibido, de 1936 a
1935, salvo nos casos de risco de vida ou sinais de grave problemas genéticos.

A autora supracitada refere que a quantidade de abortos na Rússia aumentara a 8.


000%, logo após sua legalização pela primeira vez. Estimara-se que cerca de 10 mil abortos
na Rússia feitos em 1921; em 1931. Foram 370 mil em 1936, 803 mil, quando então
proibidos. Em 1940 o número caíra para 500 mil. No ano de volta a sua liberalização, em
1955 estimaram-se 800 mil abortos que teriam triplicados no ano seguinte, para 2,4 milhões.
A mesma autora assegura que durante três décadas os registos mostram somas estratosféricas:
3.401.398, em 1957; 5.463.300, em 1965 (máxima histórica); 4.670. 700, em 1975; 4. 552.
443, 3m 1985. Com a decadência da URSS e o fim do regime comunista no país, notara-se
registos de números abaixo de 4 milhões: em 1991, foram 3. 608.421; em 2000, 2.138.750;
em 2010, 1.186.1108. Alguns registos mais recentes constataram em 2015 um número abaixo
de 1 milhão: 848.180 abortos.

A Rússia mesmo tendo uma história voltada para extrema liberalização da práctica,
nos últimos anos, o governo tem adoptado políticas mais conservadoras e a legislação acerca

31
Vd. Decisão reproduzida em FAVOREAU, Louis (…) Les Grandes Décisions du conseil
Constituttionnel, pp. 317-318, Apud, Aguiar, Os direitos da personalidade da mulher e do nascituro, p.
61
16
do aborto se tem tornado mais rigorosa. Em 2011, mudanças legislativas passaram a exigir
explicações detalhadas sobre os riscos do aborto à saúde da mulher.32

MOÇAMBIQUE

Segundo a Presidente da Associação Moçambicana de Obstetras e Ginecologistas, em


Moçambique mais de 400 mulheres perdem a vida por 100 mil nascimentos vivos, sendo 11%
destes relacionados com abortos feitos fora do hospital. As principais vítimas são na sua
maioria raparigas das zonas rurais, com poucos rendimentos e ignorantes quanto à existência
de métodos contraceptivos modernos.33

Em 1989, o Ministro da Saúde da época instaurou um regulamento que autorizava a


prestação de serviços de interrupção da gravidez a mulheres que o solicitassem. Uma medida
que começou por salvar inúmeras vidas perdera eficácia dado que a norma não é respeitada no
país, por muitos defenderem ir contra o disposto no Código Penal.34

Em Julho de 2011, o governo moçambicano aprovou uma legislação que considera


crime a interrupção voluntária da gravidez quando ultrapassadas as doze semanas de gestação.
Caso tal ocorra a pena de prisão prevista corresponde entre dois a oito anos de prisão,
podendo chegar aos doze anos de prisão em casos em que tenha havido indução.35

ANGOLA

É necessário realçar que Angola como estado democrático de direito considera a vida
o bem fundamental mais precioso. Tendo consagração constitucional. De acordo a
constituição no seu artigo 30º a vida é inviolável. 36 Concernentemente ao aborto, o Código
penal de 1886, não mais em uso, penalizava toda e qualquer conduta que por meio de
violência, bebida, fármacos, com ou sem consentimento da mulher, fosse abreviar a vida do
nascituro. Sem excepções nenhuma (artigo 358º).

32
Félix, O debate sobre a (des) criminalização do aborto e suas implicações para a saúde pública no
Brasil, p.118
33
Reis, et. al. Direito, religião, Direito a vida e aborto, p. 18.
34
Idem, p. 18
35
Reis, et, al. Ob. cit. p. 18
36
Cfr. Constituição da República de Angola.
17
No entanto, a Lei n.º 38/20 que revoga o código Penal de 1886 apresenta um código
penal, que corresponde a uma reforma profunda no ordenamento jurídico-penal Angolano.
Uma das alterações trazidas pelo Código penal vigente fora o abandono do termo “Aborto”.
Lê-se no artigo 154º “Interrupção de gravidez”. Entretanto a mudança não prendera-se
somente na alteração nominal. Outrossim, é a previsão da extinção da responsabilidade e
atenuação especial da pena, nos casos em que a interrupção da gravidez seja o único meio de
remover qualquer tipo de perigo para a gestante; que o feto, provado por laudo médico, seja
inviável ou resultar de crime contra a liberdade e autodeterminação sexual.

Segundo o Diário da Noticia (2017), a questão sobre a interrupção voluntária da


gravidez (IVG) mereceu um maior número de intervenções, aquando da discussão na
Assembleia Nacional. De acordo a esta fonte de informação, a deputada da Unita Weba,
referiu que tratava-se de uma questão não muito importante para o estado, de modos, que o
melhor seria “entregar” a questão ao povo angolano em forma de referendo para que cada
cidadão, no pleno exercício da sua cidadania, decidisse de facto se o aborto devesse ser ou
não ser permitido. A actual moldura penal para a prática do aborto não permitida vai de quatro
a dez anos de prisão.

CAPÍTULO II - METODOLOGIA

2.1. POPULAÇÃO E AMOSTRA.

Miaoulis e Michener (conforme citado por Ribeiro, 2010, p.41) chamam de população
ou universo “a totalidade das observações pertinentes que podem ser feitas num dado
problema”, Norusis (conforme citado por Ribeiro, 2010, p.41) entende como população: o
conjunto de pessoas ou objectos com que se pretendem originar resultados.

Continuando, Miaoulis e Michener (conforme citados por Ribeiro, 2010, p.41)


definem amostra como “um subconjunto da população (ou universo) seleccionado para obter
18
informações relactivas às características dessa população. Sendo assim, a população do
trabalho em questão abarca toda a população Angolana, estimada pelo Instituto Nacional de
Angola em 33 097 671 habitantes (conforme citado por Cristóvão, 2022, p.1), contudo, a
amostra contou somente com a participação voluntária de 176 pessoas. A amostra fora
dividida em dois grupos de acordo ao género.

Critérios de Inclusão: Viver dentro do território nacional e ser maior de idade.

Critérios de exclusão: Viver no estrangeiro, ser menor de idade, não responder de forma
completa e devida as questões.

2.1.1.TÉCNICA E INSTRUMENTO

Com base nos conhecimentos obtidos na pesquisa bibliográfica, e tendo em conta o


objectivo do estudo, para a recolha de dados, se optou pela aplicação de um questionário
online, de modos que os limites fronteiriços entre as províncias não se tornassem um
obstáculo. O desenho dos questionários foi baseado nos modelos de questionários elaborados
por Almeida et. al (2020) no estudo sobre o Aborto Induzido como Problema de Saúde no
Huambo e uma estratégia para a sua redução. O estudo, resultados e questionários usados pela
referida autora, foram publicados pelo Jornal Internacional de pesquisa Ambiental e saúde
Publica em 17 de Dezembro de 2019. Com a devida autorização da autora, adaptamos o
questionário para a materialização da nossa pesquisa. Assim sendo, nosso questionário foi
estruturado contendo perguntas tanto de múltiplas escolhas quanto de perguntas abertas e
perguntas fechadas. Nas questões abertas, os respondentes ficaram livres para responder com
suas próprias palavras, sem terem que se limitar a sua escolha a um conjunto de alternativas.
Nos casos de múltipla escolha, os respondentes optaram por uma das alternativas. E nas
questões fechadas os respondentes ficaram limitados a uma ou outra opção.

Para Jacobsen (2016), nos casos de múltipla escolha, os respondentes optarão por uma
das alternativas, ou por determinado número permitido de opções. Ao elaborar perguntas de
respostas múltiplas, o pesquisador se depara com dois aspectos essenciais: o número de
alternativas oferecidas e os vieses de posição.

O questionário foi dividido em duas versões: uma versão para homens e outra versão
para mulheres. Para a versão do género masculino elaborou-se 11 assim como para o género
feminino, elaborou-se. Os questionários foram criados em 22 de Dezembro de 2021. A
19
colecta de dados terminara em 22 de Outubro de 2022. Foram feitas perguntas comuns para
ambos géneros da nossa amostragem. Essas perguntas visaram a colecta de dados
sociodemográficos (tais como nome, idade, sexo, província onde vive, grau académico,
orientação religiosa). Também se elaborou questões cuja pretensão se prendia em analisar o
conhecimento dos participantes relativamente ao tema e todas as questões que gravitam em
torno dele. Não obstante, também foram elaboradas questões cujo intuito fora analisar os
factores que poderiam estar subjacentes a prática da interrupção voluntária da gravidez, tanto
como da sua criminalização e sua aceitação por parte do nosso objecto de estudo. Ambos
questionários tiveram como tempo de resposta 10 min e 9 s.

2.1.2. TIPOS E MODELOS DE PESQUISA

Este trabalho foi realizado de acordo com os princípios de classificação de Prodanov e


Freitas (2013), quanto aos objectivos e abordagem.

Quanto aos objectivos, o estudo presente enquadra-se à pesquisa descritiva. Este tipo
de pesquisa cinge-se na especificação de propriedades, características e rasgos importantes de
qualquer fenómeno que se análise. Descreve tendências de um grupo ou população; focam-se
no estudo do nível de atendimento dos órgãos públicos de uma comunidade, as condições de
habitação de seus moradores, o índice de criminalidade; têm por objectivo levantar opiniões,
atitudes, crenças de uma população, etc. uma das características mais significativas das
pesquisas descritivas é a utilização de técnicas padronizadas de colecta de dados, tais como o
questionário.

Em relação a abordagem, optou-se pela abordagem mista – qualitativa e quantitativa.


Shaffer e Serlin (citado em Morais e Neves, 2007, p.2) afirmam que os métodos qualitativos e
quantitativos são métodos para garantir a apresentação de uma amostra adequada. Ambas
constituem tentativas para projectar um conjunto finito de informação para uma população
mais ampla, uma população de indivíduos.

2.1.3. PROCEDIMENTOS

Para a colecta dos dados: inicialmente se redigiu um e-mail, pedindo autorização para
uso de modelo do questionário. O e-mail fora enviado ao 20 de Dezembro de 2021 e recebeu-
se a resposta ao 22 de Dezembro de 2021. Para o processamento de dados e criação do
questionário fora usado duas plataformas distintas: Surveymonkey e Drag´n Survey.
20
O Drag'n Survey é um software de questionário online gratuito. Fácil e simples de
usar, uma solução que garante um manuseio rápido e intuitivo. O software não exige
experiência prévia e é acessível a todos. A funcionalidade de arrastar e soltar minimiza a
quantidade de cliques necessários. Se tem acesso a uma ampla gama de perguntas para cada
tipo de resposta.

O SurveyMonkey é uma companhia de desenvolvimento de pesquisas online fundada


em 1999 por Ryan Finlay. O software provê pesquisas personalizáveis gratuitas, bem como
uma suíte de programas de back-end que inclui análise de dados, seleção de amostras,
eliminação de vises e ferramentas de representação de dados.

2.1.4. LIMITAÇÃO E DELIMITAÇÃO DA PESQUISA

a) Limitação

A limitação está relacionada aos problemas, obstáculos, dificuldades que se encontrou


durante a pesquisa. Devido a natureza sensível do tema, o levantamento de dados não foi o
mais fácil. Surgiram alguns obstáculos, como a falta de disponibilidade das pessoas em
responderem as questões, outrossim, muitos dos participantes recusaram-se a responder
determinadas questões dificultando a recolha, o tratamento e análise exacta dos dados,
limitando a pesquisa, outra dificuldade fora encontrar referencial teórico que correspondesse a
abordagem da nossa pesquisa, dentro do contexto nacional.

b) Delimitação

A delimitação faz alusão a divisão de dois (2) critérios fundamentais, que são: Critério
espacial e temporal, o primeiro refere ao “locus”, ou seja, o lugar onde se irá desenvolver o
presente estudo, neste contexto a pesquisa será realizada em Angola, num período
compreendido entre de 2021 a 2022, por ser um período actual.

2.1.5. ANGOLA, BREVE HISTORIAL

Angola situa-se entre os paralelos 4º 22 e 18º 02 e os meridianos 4º 05 e 11º 41 a este


de Greenwich, no Hemisfério Sul, na parte Ocidental da África Austral e ocupa uma área de
1.246. 700 km2. Etimologicamente Angola deriva de “Ngola” nome atribuído a uma dinastia

21
dos povos Ambundo, fixados no médio-kwanza. É limitada a norte pela República do Congo,
a leste, pela República da Zâmbia; a sul pela República da Namíbia e a oeste pelo Oceano
Atlântico. Angola representa uma costa marítima de 1650 km e as suas fronteiras terrestres
correspondem a um total de 4.873 km.37

É um país marcado por duas estações climáticas distintas: a das chuvas – húmida e
quente, que decorre de Setembro a Abril, pronunciando-se com alguma antecedência ou mais
tardiamente em algumas regiões – e a do cacimbo – seca e fria, que vai normalmente de maio
a Setembro. D um país pertencente ao continente africano, localizado na região austral deste,
banhado pelo oceano Atlântico e possui diversas formações vegetais, como florestas, savanas
e desertos. Marcada pela colonização portuguesa, em 11 de Novembro de 1975, proclamar-se
a independência em Angola. Tendo como forma de governo “Presidencialismo”.
Actualmente, de segundo o Instituto Nacional de Estatísticas, estima-se que haja 33 097 672
habitantes vivendo em Angola. Sendo que sua capital (Luanda) tem a maior concentração da
população.

CAPÍTULO III – ANÁLISE INTERPRETAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

3.1. CARACTERIZAÇÃO SOCIODEMOGRÁFICA DA AMOSTRA

Tabela 1 - Distribuição da Amostra por Género

GÉNERO Nº PERCENTAGENS
HOMENS 40 22%
MULHERES 136 77%
TOTAL 176 100%
Fonte: Dados da Pesquisa

Gráfico 1- Distribuição da
amostra por género.

37
Vd. Zau, Angola: Trilhos Homens:
para o desenvolvimento,
22% p. 32
22

Mulheres: 77%
Mulheres Homens

O gráfico referente a distribuição da nossa amostra por género, na qual é verificável


que há certa superioridade de participantes do sexo feminino (77%) em correspondência aos
do sexo masculino (22%).

Tabela 2- Distribuição da Amostra por Faixa Etária.

FAIXA ETÁRIA HOMENS PERCENTAGENS


60.00%
18
Gráfico 2 Distribuição da A 20 3 51.47% 7,5%
amostra por idade 21 A 25
50.00% 47.00%
16 40%
26 A 30 40.00% 19 47,5%
40.00%
31 Anos ou mais 2 5%
30.00% 26.47%
FAIXA ETÁRIA MULHERES PERCENTAGENS
18 A 20 anos
20.00% 36 26.47%
14.71%
21 A 25 anos
10.00% 7,5% 70 51.47%
7.35%
5.00%
26 A 30 anos 20 14.71%
0.00%
31 Anos ou mais Homens 10 Mulheres7.35%

FONTE: Dados da Pesquisa.


18 a 20 anos 21 a 25 anos 26 a 30 anos 31 anos ou mais

Concernentemente a distribuição da nossa amostra por idade, a amostra contou com um total
de 86 (48%) participantes na faixa etária dos 21 a 25 anos. Sendo a maioria da amostra
pertencentes ao género feminino 70 (51,47%) em correspondência aos do sexo masculino 16
(40%). A amostra contou com 39 (26,6%) participantes na faixa etária dos 26 a 30 anos.
Também aqui, houve uma predominância do género feminino em relação ao género
masculino. Sendo que houve 20 participantes do sexo feminino e somente 19 participantes
com as idades compreendidas entre os 26 aos 30 anos. Todavia, analisando de forma isolada,
comparando com o número total de participantes do género feminino depreende-se que é um
número relativamente baixo, em relação ao género masculino, cuja percentagem (47%) não é
baixa. A amostra contou com 22 participantes na faixa etária dos 18 a 20 anos. Sendo que a
maioria representada por 26,47% pertencem ao género feminino e uma minoria representada
23
por 7,5% pertencem ao género masculino. A amostra teve participantes com 31 anos ou mais.
De um lado, uma maioria representada por 7,35% pertencentes ao género feminino, e uma
minoria representada por 5%. Os números revelam uma predominância do sexo feminino,
neste estudo.

Tabela 3 — Distribuição da Amostra por orientação Religiosa

ORIENTAÇÃO RELIGIOSA HOMENS PERCENTAGENS


Católica 12 30%
Protestante 5 12,5%
Metodista 0 0%
Universal 3 7,5%
Outra 20 50%
ORIENTAÇÃO RELIGIOSA MULHERES PERCENTAGENS
Católica 45 33.3%
Metodista 4 2,9%
Universal 6 4,4%
Agnóstico/Ateu 1 0.7%
Testemunha de Jeová 17 12.5%
Outra 63 48.0%
Fonte: Dados da Pesquisa.

Em relação a distribuição da amostra pela orientação religiosa, a amostra contou com


um total de 57 participantes pertencentes a organização religiosa Católica. A maioria
representada por 78,94% pertencem ao género feminino e a minoria representada por 21%
pertencem ao género masculino. Analisados de forma separados e contrapondo o total de
números de participantes de cada género na amostra, temos 45 (33,3%) participantes do
género feminino dos 136 e 12 (30%) participantes do género masculino dos 40 participantes.
Somente 12,5% da amostra, do total dos participantes do género masculino, pertencem a
denominação religiosa Protestante. E somente 2,9%, do total da amostra do género feminino
pertencem a organização religiosa Metodista. Em relação a organização religiosa Universal,
do total da amostra do género masculino (22%), 7,5% pertencem a referida organização e do
total da amostra do género feminino 136 (77%), somente 4,4% pertencem a ela. Em relação a
organização religiosa Testemunha de Jeová, do total da amostra do género feminino, 12,5
pertencem a esta organização. Por somente contar com as orientações religiosas mais
difundidas no nosso território, tanto no inquérito dirigido ao género masculino quanto ao
inquérito dirigido ao género feminino, a opção “outra” que compreende todas orientações
religiosas ou crenças não incluídas no questionário foram predominantes. Do total da amostra
do género masculino 50% escolheram a opção “outra” e do total da amostra do género
feminino 48,0% também escolheram “outra”.
24
Tabela 4: Distribuição da Amostra por grau Académico

GRAU ACADÉMICO HOMENS PERCENTAGENS


Licenciados 13 32,5%
Frequência Universitária 20 50%
Mestrado 0 0%
Ensino Secundário 4 10%
Outro 3 7,5%
GRAU ACADÉMICO MULHERES PERCENTAGENS
Licenciado 44 32,3%
Frequência Universitária 55 40,4%
Mestrado 11 8,0%
Ensino Secundário 15 11,0%
Outro 11 8,0%
Fonte: Dados da Pesquisa.

O estudo revelou uma grande disparidade entre os dois grupos de amostra


relativamente a distribuição por grau académico ou grau de escolaridade. Do total da amostra
do género masculino, uma maioria representada por 50% ainda frequenta o ensino superior;
32,5% têm o grau académico de Licenciados; 10% ainda estão a concluir o Ensino Secundário
e 7,5% escolheram “outro” que corresponde a todos os outros graus académicos não
mencionados. Em relação ao género feminino uma maioria representada por 40% ainda
frequenta o ensino superior, e 44% são licenciados. Diferente da amostra do género
masculino, 11 participantes que corresponde a 8,0% do total da amostra do género feminino,
são Mestres; 11,0% frequentam ainda o Ensino secundário e 8,0%, que representa a minoria
optou por “outro” referindo-se a todo e qualquer grau académico não mencionado no
inquérito.

PROVÍNCIA HOMENS PERCENTAGENS


LUANDA 39 92,5%
BENGUELA 1 2,5%
HUAMBO 0 0%
HUÍLA 0 0%
MALANJE 0 0%
PROVÍNCIA MULHERES PERCENTAGENS
LUANDA 96 70,5%
BENGUELA 1 0,7%
HUAMBO 1 0,7%
HUÍLA 37 27,2%
MALANJE 1 0,7%

25
Tabela 5 – Relação dos Participantes por Província

Gráfico 3 - Referente a Distribuição da Amostra por Província

Homem Mulher
Fo
nt e:
Malanje1

Huíla0 37

0
Huambo1

Benguela1
1

Luanda 39
96
0 20 40 60 80 100 120

Dados da Pesquisa.

Concernentemente a distribuição da Amostra por Província, o estudo contou com um


total de 135 (76,7%) participantes de Luanda. Dentre estes, 39 do género masculino e 96 do
género feminino. Em Benguela, houve a participação de duas pessoas – uma do género
feminino e outra do género masculino. Em relação a Província da Huíla houve somente
participantes do género feminino, assim como Huambo e Malange. Analisando cada amostra
de forma separada, do total de participantes do género feminino 136 (77%), tivemos uma
maioria representada por 70,5% de participantes somente em Luanda, 27,2% de participantes
na Huíla, 0,7% em Malanje, Huambo e Benguela. Nesta esteira, em relação a amostra que
corresponde ao género masculino houve maior predominância de participantes em Luanda
também, com uma percentagem de 92, 5% e 2,5% de participantes em Benguela.

3.1.1. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS QUANTITATIVOS POR AMOSTRA

Gráfico 4 - Amostra masculina (Sexo como tema de conversa entre pais e filhos)

45.00% 42.50%
40.00%
35.00% 0.325
30.00%
25.00% 0.2205
20.00%
15.00%
10.00%
5.00% 0.025
0
0.00% 26
SIM NÃO NUNCA ALGUMAS VEZES NUNCA TIVERAM
TEMPO

Série 1 Série 2 Série 3 Série 4 Série 5


Em relação a amostra masculina, quando questionados se conversam com seus pais
sobre relações sexuais ou não, uma maioria representada por 42,5% (17) respondera que não o
faziam indicando que não era um costume entre eles e seus pais; 22,05% (9) responderam que
conversavam com seus pais sobre sexo; 32,50% (13) afirmara que nunca haviam conversado
com seus pais sobre relações sexuais dando a entender que nem eles nem a autoridade
parental em suas casas haviam mostrado interesse no assunto. Uma minoria, representada por
2,50% (1) respondera que algumas vezes conversavam com seus pais sobre relações sexuais.

Gráfico 5 – Referente a Amostra Feminina (Sexo como tema de Conversa entre pais e filhos)

45.00%
41.17%
40.00%
35.00%
30.00%
25.00% 0.2205
0.1911
20.00%
0.147
15.00%
10.00%
5.00% 0.0294
0.00%
SIM NÃO NUNCA ALGUMAS VEZES NUNCA TIVERAM
TEMPO
Série 1 Série 2 Série 3 Série 4 série 5

Em relação a amostra feminina, uma maioria representada por 41,17% (56) respondera que
não falavam com seus pais sobre sexo, outrossim 19,11% (26) responderam que nunca
haviam falado com seus pais sobre sexo; 14, 70% (20) afirmara que a conversa surgia
algumas vezes, e a minoria representada por 2,94% (4) respondera que os pais nunca tiveram
tempo para abordar sobre o assunto. E somente 22,05% (30) responderam que falavam com
seus pais sobre sexo

De forma geral os dados da pesquisam revelam, de forma preocupante, que


actualmente os pais não têm dado tanta importância a educação sexual dos seus filhos.
Tratando esse tema talvez com certo tabu e daí a dificuldade de o abordar com os mesmos. No
entanto, a consequência verifica-se na visão distorcida de muitos jovens relativamente ao que
o sexo é, e como a vida sexual deve ser. Isto porque a visão que o jovem tem sobre a vida
sexual é adquirido por meio de filmes, músicas e outros. A falta de preparação para a vida

27
adulta, mais concretamente para a vida sexual adulta, tem como consequência na sociedade o
crescimento da taxa de gravidez em adolescentes, jovens e adultos; o crescimento da taxa de
doenças sexualmente transmissíveis entre adolescente, jovens e adultos. Assim como também
tudo isso acaba influenciando o número elevado de abortos clandestinos, visto que maior
parte dos jovens não estão preparados para a vinda de um filho. Como se pode notar, em
Cavalcante e Xavier (citados em Etapechusk & Costa, 2016, p.4) “os motivos para abortar,
devem-se muitas vezes a priorização da vida profissional e o facto das mulheres em causa
serem muito jovens.”

Diniz (citado em Etapechusk & Costa, 2016, p.4) “acrescenta que a gestação não
planejada e os abortos induzidos são atribuídos em grande parte, ao uso inadequado de
métodos anticoncepcionais, a falta de educação sexual, ao problema da gravidez na
adolescência, ao atraso cultural, e a paternidade irresponsável.”

Para o nosso estudo constatou-se de forma geral, que dos 176 participantes somente 39
representado por 22, 15% têm conversado com seus pais sobre a vida sexual, o que é
relativamente um número baixo. Sendo que 73 representados por uma percentagem de 41,
47% não abordam esse tema com seus pais, 39 dos participantes, que representam 22, 15%
afirmaram que nunca haviam falado com seus pais sobre este assunto, 21 pessoas, que
representam 11,93% dos participantes afirmaram que somente algumas vezes “tocavam” neste
assunto com seus pais e 4 dos participantes que representam 2,27% afirmaram que seus pais
estiveram sempre ocupados para falar sobre isso.

Gráfico 6 – Referente a Amostra Masculina (Sobre ter engravidado outrem)

53.00% 0.525
52.00%
51.00%
50.00%
49.00%
48.00% 47.50%
47.00%
46.00%
45.00%
44.00%
SIM NÃO

Série 1 Série 2

28
Quando questionados sobre já terem engravidado alguém, uma maioria da amostra
masculina, representada por 52,50% (21) respondera que sim e a minoria, representada por
47,50% (19) respondera que não.

Gráfico 7- Referente a Amostra masculina (sobre ter sugerido a interrupção


voluntária da gravidez)

80.00%
72.50%
70.00%

60.00%

50.00%

40.00%

30.00% 0.275

20.00%

10.00%

0.00%
SIM NÃO

Série 1 Série 2

Defrontados com a questão sobre se em algum momento já tiveram sugerido à alguém


interromper a gravidez, uma maioria, da amostra masculina, representada por 72,50% negou
ter feito, enquanto a percentagem restante 21, 50% afirmara que já o fizera. O que revela que
embora proibido, a interrupção voluntária do aborto ainda é tida e vista como uma alternativa.

Gráfico 8 – Referente a Amostra masculina (Aborto como práctica frequente)


90%
0.8
80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%
20%
10% 29
0%
SIM NÃO

Série 1 Série 2
Quando questionados se o aborto ou IVG era uma práctica frequente dentro do contexto
sociocultural em sua cidade, a maioria, representada por 80% respondera que sim e a minoria,
representada por 20%, respondera que não. Indicando mais uma vez que o aborto clandestino
é uma realidade embora de grande risco para quem o faz.

Gráfico 9 – Referente a Amostra Feminina (Sobre Conhecerem Pessoas que


Interromperam Voluntariamente a Gravidez)

100.00%
0.8824
90.00%
80.00%
70.00%
60.00%
50.00%
40.00%
30.00%
20.00% 11.76%
10.00%
0.00%
SIM NÃO

Série 1 Série 2

Relativamente a amostra feminina, quando foram questionados sobre conhecerem


alguém cujo interrompera voluntariamente sua gravidez, uma maioria representada por 88,
24% (120) respondera que sim, e a percentagem restante - 11,76% - respondera que não. Os
dados da pesquisa revelam que mesmo ilegal, o aborto clandestino é praticado. Não é somente
uma alternativa ilusória, uma opção que nunca se escolhe. O que pode revelar uma certa
ineficácia quanto ao fim de prevenção e intimidação das normas penais. Os dados deixam
claro, que entre o risco de morrer ou de cumprir uma pena, e ter um filho, as duas primeiras
opções continuam sendo escolhidas.

Gráfico 10 – Referente a Amostra feminina (O Aborto como práctica frequente)

30
90.00% 0.8455
80.00%

70.00%

60.00%

50.00%

40.00%

30.00%

20.00% 15.44%
10.00%

0.00%
SIM NÃO

Série 1 Série 2
Quando questionadas sobre o aborto como prática frequente, a maioria, representada
por 84,55% respondera que sim e a minoria, representada por 15, 44% respondera que não.
Dando, de certa forma sustentabilidade ao gráfico anterior; o que não se torna uma surpresa,
se em 136 pessoas, 120 conhecem alguém que interrompera voluntariamente a gravidez,
significando de forma lógica que existem 120 pessoas, que mesmo com o risco de morrer, ou
de cumprir uma pena preferiram interromper a gravidez, fora das excepções permitidas por
lei.

Gráfico 11 – Referente a Amostra Feminina (Sobre ter o bebê depois de um


crime sexual)

40.00%

35.00% 33.82%

30.00%

25.00% 22.05% 0.2426

20.00%

15.00% 0.125
10.00% 0.0735
5.00%

0.00%
SIM NÃO TALVEZ NÃO SEI Provavelmente Não

Série 1 Série 2 Série 3 Série 4

Relativamente a possibilidade de manter o bebê caso fossem vítimas de uma violação, as


opiniões ficaram divididas em “Não” (33,82%), “Sim” (22,05), “Não sei” (24,26%), “Talvez”

31
(7,35) e “Provavelmente Não” (12,50%). Revelando que a maioria não ficaria com a criança.
Deixando claro que para a amostra a excepção de interromper a gravidez quando ela é fruto
de um crime de natureza sexual, se justifica.

Gráfico 12 – Referente a Amostra masculina (Nível de Conhecimento sobre


o aborto)

45.00% 0.425
40.00%

35.00%
0.3
30.00% 27.50%
25.00%

20.00%

15.00%

10.00%

5.00%

0.00%
SIM NÃO TENHO UMA VAGA
IDEIA

Série 1 Série 2 Série 3

Concernentemente ao nível de conhecimento sobre o que é ou se trata o aborto, os


dados apontam para uma predominância, na amostra masculina, representada por 42,50% (17)
de certeza em relação ao assunto. Sendo que 27, 50% (11) afirmaram não saber do que se trata
e 30% (12), relataram ter “uma vaga ideia” do que é o aborto.
90.00%
80.00% 0.7647
Gráfico 13 – Referente a Amostra Feminina (Nível de Conhecimento sobre o Aborto)
70.00%
60.00%
50.00%
40.00%
30.00%
20.00% 0.1764

10.00% 5.88% 32
0.00%
SIM NÃO TENHO UMA VAGA IDEIA

Série 1 Série 2 Série 3


Em relação a amostra feminina, aqui também verificou-se uma clara predominância
referente ao conhecimento do que é ou se trata o aborto. Sendo que a maioria representada por
76,47% (104 participantes) afirmara saber o que é, 17, 64% declararam ter uma vaga ideia do
que se trata. Somente 5, 88% (8), que representa a minoria afirmara não saber do que se trata.

3.1.2. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS QUALITATIVOS

Terminado a recolha do material, fez-se o uso da aplicação de processos técnicos que


pudessem fazer emergir as suas significações. Segundo Guerra (2014) as técnicas para análise
de dados qualitativos passa por algumas etapas, tais como a transcrição de matérias gravados,
identificado o material com o nome do entrevistado, registo da pergunta feita, tópico, registar
o comentário do pesquisador, para depois organizar o essencial por tópicos ou categorias. A
autora referida realça que para o material já registado, seja em diários ou outros meios é
necessário organizar todo o material.

Destaca também a autora supramencionada alguns obstáculos na perspectiva de


Minayo (citada em Guerra, 2014, p. 37), tais como: a ilusão da transparência, pois os dados
colectados são sempre registros simbólicos e polissêmicos. Sugerindo, na perspectiva de
Minayo (citada em Guerra, 2014, p.38), três abordagens para interpretar ou analisar o
conteúdo qualitativo: Análise do Discurso, Análise do conteúdo e Análise Hermenêutica.

Para o presente estudo, usou-se a Análise do conteúdo. A análise de conteúdo oferece


a possibilidade de tratar de forma metódica informações e testemunhos que apresentem um
certo grau de profundidade e de complexidade (Quivy & Campenhoudt, 2008). Por outro
lado, “quanto ao âmbito de aplicação, a análise de conteúdo aplica-se a materiais de qualquer
natureza como escrita, oral (por exemplo, respostas abertas de questionários e entrevistas
clínicas gravadas), pictórica (da pintura a banda desenhada), audiovisual, radiofónica, de entre
outras” (Santo, 2010, p. 70).

33
Vala (citado em Nunes, 2009), com o objectivo de melhor elucidar este método, refere
que se trata da desmontagem de um discurso e da produção de um novo discurso através de
um processo de localização-atribuição de traços de significação, resultado de uma relação
dinâmica entre as condições de produção do discurso e as condições de produção da análise.

A produção de um novo discurso, isto é, a categorização dos dados, é o processo que


se circunscreve na operação de classificação de elementos constitutivos de um conjunto por
diferenciação, e seguidamente, por reagrupamento segundo o género (analogia), com os
critérios previamente definidos (Bardin, 1977). Por isso, “as categorias são rubricas ou
classes, as quais reúnem um grupo de elementos (unidades de registo, no caso da análise de
conteúdo) sob um título genérico, agrupamento esse efectuado em razão das características
comuns destes elementos” (Bardin, 2011, pp. 145-146).

Segundo Bardin (1977), a análise de conteúdo pode ser uma análise dos significados,
como é o caso do estudo: Análise temática. Para o referido autor, o papel do analista é duplo,
a leitura que o analista faz dos dados colectados, não é, ou não é unicamente uma leitura à
letra, mas antes o realçar de um sentido que se encontra em um segundo plano.

O tema é geralmente utilizado como unidade de registo para estudar motivações de


opiniões, de atitudes, de valores ou crenças. A análise de conteúdo é usado também para a
interpretação de respostas de questões abertas em questionários. Importa referir que varias das
respostas no questionário elaborado remete a diferentes temas como “Direito de escolha” e
“Protecção dos Direitos Fundamentais”.

Com os passos acima descritos, foi construída duas categorias através do qual,
respeitando os critérios de fidelidade e de validade, foram codificadas as unidades de
registo38. A codificação ou melhor os códigos, são sempre organizados numa categoria
quando eles estão descrevendo diferentes aspectos, similaridades ou diferenças de conteúdo
do texto que devam permanecer juntos (Erlingsson; Brysiewicz, 2017, citados em Sampaio &
Lycarião, 2021, p.46). Codificar significa organizar e agrupar dados em categorias ou famílias
pelo compartilhamento de suas características (Saldaña, 2012, citados em Sampaio &
Lycarião, 2021, p.46).É necessário ressaltar que as unidades de registo foram agrupadas de
acordo a expressividade, ou seja, tendo em conta o que o emissor quis dizer com sua resposta.

38
Unidade de registo são elementos concretos que se categorizam. Para selecionarmos estas unidades
determina-se as palavras, ou temas, Vd. Reis Metodologia de Investigação, p 205
34
Finalmente, realizamos a análise dos resultados, tendo em conta o número de ocorrências
registadas em cada categoria.

Tabela 6 - Distribuição das Unidades de Registo (U.R) pelas categorias

CATEGORIAS TOTAL
A DIREITO DE ESCOLHA 46
B PROTECÇÃO DOS DIREITOS 52
FUNDAMENTAIS
TOTAL 98

DIREITO DE ESCOLHA

Representada pela categoria A (46 u.r) codifica todas as informações relacionadas ao aborto
como um direito de escolha da mulher, dentro da esfera de liberdades que a lei garante. Como
também as possíveis razões do aborto ser feito como a ausência de educação sexual. Nas
respostas de cada participante, no tema Direito de escolha, outros assuntos emergiram, uns
mais expressivos que outros, caracterizando a norma penal que criminaliza o aborto como
errada ou patriarcal. Para os participantes, a criminalização do aborto não só afecta uma das
grandes liberdades da mulher (a autonomia sobre o seu corpo) como muitas vezes a obriga a
correr riscos de vida ou nos casos em que a mesma não consiga abortar, ter o bebê e a
abandoná-lo. Nas palavras de uma das participantes:

“… acredito que algumas manifestações sociais, políticas e religiosas condenam a legalização


do aborto, em nome da defesa da vida, mas parecem ignorar ou não dar o mesmo valor a vida
de crianças que nasceram indesejadas ou em famílias sem a menor condição de criá-las e que
andam por aí revirando lixo para se alimentar, expostas a todo o tipo de doença e violência
nas ruas”.

Para os participantes, assim como se encontra em Reis et. al (2015) “se a mulher é
livre então ela pode fazer o que quiser com seu corpo, sendo assim, tendo em conta que o feto
é parte integrante da mesma, por lógica, a mulher devia ter a liberdade de decidir o que fazer.”

Neste sentido, a descriminalização do aborto, para muitos dos participantes, reduziria


o número de mulheres interrompendo voluntariamente a gravidez de forma clandestina e
colocando suas vidas em risco.
35
De um outro ponto de vista, relevou-se muito a questão da educação sexual sendo que
na fala de uma das participantes “…por vezes isso só acontece por falta de diálogo sobre o
referido assunto. Na verdade é aconselhável sempre deixar o tabu de lado e tocar em assuntos
que infelizmente por vergonha deixamos de lado”.

Segundo Pattis (conforme citado por Borsari, 2012, p.21), o aborto é considerado
como tabu, na medida que se afasta da esfera cotidiana apresentando significado
extraordinário e mostrando-se como uma fronteira entre a vida e a morte; na verdade, um
lugar de transcendência.

Corroborando com esse argumento, Diniz (conforme citado por Etapechusk & Costa,
2016) acrescenta que a gestação não planejada e os abortos induzidos são atribuídos em
grande parte, ao uso inadequado de métodos anticoncepcionais, a falta de educação sexual…”

PROTECÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

No discurso dos entrevistados o tema mais prevalente, representado pela categoria


protecção dos direitos fundamentais (B = 56 u.r), na qual estão contidas todas as informações
que caracterizam a criminalização do aborto não como justa e também como fundamentada.
Para os participantes do estudo, a criminalização do aborto reduziria a taxa de abortos
clandestinos e consequentemente a taxa de mortalidade relativas a práctica.

Segundo os participantes interromper a gravidez é o equivalente ao assassinato, nas


palavras de uma de uma das participantes: “o aborto de facto é a interrupção da vida de um
ser sendo assim não é diferente de quando se interrompe ou tira-se a vida de qualquer outro
ser humano…”

Muitos dos participantes, em suas respostas deixaram claro, que a vida é um bem
divino e que ninguém por vontade própria a devia tirar. Apontando uma falta de
responsabilidade a interrupção voluntária da gravidez. Isto porque, de acordo a uma das
participantes:

“… ninguém tem o direito de tirar a vida de outrem, ainda mais de um ser inocente e
inofensivo”

Entende-se também a posição do Estado ao criminalizar o aborto, somente está a


proteger um bem maior, visto que sem a vida todas as outras garantias, liberdades ou direitos
36
não têm uma razão de existência. Para Sarmento (2005) a criminalização do aborto tem como
cerne, de forma justa e legitima, a vida do embrião. Embora haja ampla discordância sobre
como qualificar a situação jurídica e moral do nascituro, é indiscutível que não se deve
desconsiderar este importantíssimo elemento no equacionamento do tratamento legal a ser
dado para o caso

Dentro deste tema defendeu-se também que o aborto deve ser sim criminalizado no
entanto, obedecendo fases, como também deixando algumas excepções tais como nos casos
em que a gravidez resulte de um crime de natureza sexual.

CONCLUSÃO

O aborto, em quaisquer perspectivas: jurídica, filosófica, social, bioética, etc. continua


sendo um dos temas mais discutidos, no passado como agora devido a sua natureza sensível.
A criminalização ou descriminalização do aborto, quando discutida, outras perspectivas, que
não a jurídica são levadas em conta, fazendo muitas vezes surgir perguntas tais como:
“Quando a vida começa?”, “Quando a vida termina?”. Criminaliza-se o aborto em defesa da
vida, ou visão patriarcal da sociedade continua permitindo que a liberdade de escolha da
mulher seja limitada? O que tá em jogo: Direito a vida ou autonomia da Mulher?

Embora não fosse o intuito desse estudo responder tais questões, o presente trabalho,
permitiu percorrer entre os aspetos e fundamentos tanto sociais quanto jurídicos que giram em
torno do tema. Ademais, foi possível verificar as perspetivas religiosas em relação ao aborto.

Relativamente aos aspectos sociais e históricos do aborto registos revelam não se tratar
de uma práctica recente. Apontando para prácticas desde a antiga, china, passando para
egípcio e Grécia. Como aclarou-se durante o trabalho, a criminalização do aborto divide a
sociedade em duas partes: a social compreendendo as consequências da práctica; o aborto
como problema de saúde pública, possíveis causas do aborto. E o aborto sob o prisma
religioso. E por outro lado, a jurídica. S

Relativamente aos aspectos jurídicos, o debate divide-se em dois: o aborto como


direito de escolha da mulher e a vida intrauterina. Os principais fundamentos para quem
defende a descriminalização do aborto cingem-se na redução da taxa de mortalidade pela

37
interrupção voluntária da gravidez, feitas de forma clandestina; sendo que para Dworkin
(2003) uma mulher forçada a ter uma criança que não deseja porque não pode fazer um aborto
seguro pouco depois de ter engravidado não é dona do seu corpo,”

Para quem defende a criminalização do aborto encontra sua justificativa no facto de


que logo de início a pessoa é criada com a fusão do óvulo com o espermatozoide. O
desenvolvimento do embrião inicia-se logo desde a fertilização. E consequentemente, o bem
jurídico assegurado e protegido pela norma do art.º 30º da CRA, se estende ao feto. E assim
sendo, depreende-se ser este o motivo subjacente a criminalização do aborto.

Relativamente ao nível de conhecimento e a posição da sociedade angolana


concernente a criminalização do aborto, infere-se por meio dos dados colectados através da
amostra, que há uma clara aceitação por parte da sociedade. A análise de conteúdo dos dados
qualitativos revelou que a sociedade crê que a criminalização do aborto assenta na protecção
de um dos maiores bem fundamentais: vida. Neste sentido, existe uma validação da norma
que criminaliza o aborto. Entendem também que se deve deixar excepções, ou seja, que em
algumas circunstâncias o aborto deve ser permitido.

Concernentemente ao nível de conhecimento sobre o que é ou se trata o aborto, os


dados apontam para uma predominância, na amostra masculina, representada por 42,50% (17)
de certeza em relação ao assunto. Sendo que 27, 50% (11) afirmaram não saber do que se trata
e 30% (12), relataram ter “uma vaga ideia” do que é o aborto.

Em relação a amostra feminina, aqui também verificou-se uma clara predominância


referente ao conhecimento do que é ou se trata o aborto. Sendo que a maioria representada por
76,47% (104 participantes) afirmara saber o que é, 17, 64% declararam ter uma vaga ideia do
que se trata. Somente 5, 88% (8), que representa a minoria afirmara não saber do que se trata.

De forma sucinta, em uma análise geral dos dados, referentes ao nível de


conhecimento do que é ou se trata o aborto, dos 176 participantes 121 (68, 75%) afirmaram
saber o que era e do que se tratava o aborto. Sendo que 36 (20,45%9 afirmara ter uma vaga
ideia do que se tratava, e assim, uma minoria 19 (10, 79%) declarara não saber o que era.
Depreende-se dos dados, que a população esta informada sobre o que é o aborto e
provavelmente sobre os riscos atinentes a sua práctica.
38
Os dados também apontam, hodiernamente, que a educação sexual no seio familiar é
uma questão pouco tratada ou não discutida, o que pode levar muitas vezes a gravidez não
desejada e consequentemente a um aborto clandestino. Outrossim, embora se saiba que a
interrupção da gravidez fora das excepções que a lei permite, é crime, os dados apontam que é
uma práctica frequente, sendo que 27,50% da amostra masculina afirmara ter sugerido a
interrupção da gravidez e na amostra feminina 88,24% afirmara conhecerem pessoas que já
interromperam a gravidez, voluntariamente

Desta feita, sugerimos

 Mais estudos socioculturais, socioeconómicos e sociopolíticos no território nacional, de


modos a que se aclare quais os factores subjacentes ao aborto;

 Promoção de debates sobre as questões atinentes ao direito de liberdade de escolha da


mulher, o que envolve e quais são as suas limitações;

 Promoção da conversa no seio familiar e instituições de natureza académica sobre a


educação sexual.

39
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

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28. Santos, K. B. M. (2012). Direito a vida: Considerações acerca do aborto e da eutanásia


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32. Sousa, G. V. (2005), Metodologia da Investigação, Redacção e Apresentação de Trabalhos


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33. Universidade Aberta. (2020). Diretrizes para a realização de citações em texto e referências
bibliográficas: Publication Manual of the American Psychological Association (7th. ed.);

34. Zau, F. (2002). Angola: Trilhos para o desenvolvimento.

LEGISLAÇÕES

 CONSTITUIÇÃO

 CÓDIGO PENAL

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apresentado com o objectivo de obtenção do grau de Bacharel);

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Dilemas contemporâneos sobre os limites da vida. 18 [1]: 77-103

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apresentado com o objectivo de obtenção do grau de Bacharel);

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Científicos, Livraria Civilização Editora.

10. Universidade Aberta. (2020). Diretrizes para a realização de citações em texto e referências
bibliográficas: Publication Manual of the American Psychological Association (7th. ed.).

11. Vara, I. A. (2015). O aborto e a criação de uma Lei Internacional, (Dissertação de Mestrado).

43
ANEXOS

44
ANEXO A

MODELO DE QUESTIONÁRIO

45
DIREÇÃO PROVINCIAL DA EDUCAÇÃO

HOSPITAL CENTRAL DO HUAMBO

PESQUISA SOBRE SEXUALIDADE NAS ESCOLAS DO ENSINO


SECUNDÁRIO NO MUNICÍPIO DO HUAMBO.

Estimado estudante: O presente inquérito tem como objetivo recolher


informações relativas à sua sexualidade. O mesmo tem caráter voluntário e a
informação obtida será estritamente confidencial, servindo, exclusivamente, para
elaborar um programa educativo, por forma a melhorar os seus conhecimentos,
o que o ajudará a evitar problemas nesta esfera da sua vida.

Para que este estudo tenha valor e utilidade precisa-se da sua maior
sinceridade e veracidade na informação oferecida.

CÓDIGO DO ALUNO: ______________________

Data do inquérito: Dia______ Mês_______ Ano: ________

46
DADOS GERAIS: Sexo: MASCULINO Data de nascimento: Dia _
Mês__Ano__

Nome da escola: _________________Grau escolar: _____ Idade: ____


anos

Estado civil: ____. Casado. ____. Solteiro. ____. Marital.

Procedência: Município: ________________Bairro:


___________________

Além de estudar, tem outra ocupação?

_____ Não. _____ Sim.

Se respondeu sim, indique qual (ou quais).

_____ Funcionária privada.

_____ Funcionária pública.

_____ Conta própria.

_____ Outra. Qual?


________________________________________________________

Filiação:

Convive com o seu pai? _____ Sim. _____ Não.

Convive com a sua mãe? _____ Sim. _____ Não.

Escolaridade:

Pai: ____ não tem. ____ primária. ____ secundário. ____ ensino médio.
____ universidade.

47
____ pós-graduação.

Mãe: ____ não tem. ____ primária. ____ secundário. ____ ensino médio.
____

universidade. ____ pós-graduação.

Costuma conversar com os seus pais sobre questões relacionadas com


sexualidade? _____

Sim. _____ Não.

APÊNDICES

48
APÊNDICE A

QUESTIONÁRIOS

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QUESTIONÁRIO – V. MASCULINA

1- Qual é a sua idade?

18 a 20 anos ()

21 a 25 anos ()

26 a 30 anos ()

31 anos ou mais ()

2- Qual é a sua orientação Religiosa?

Católica ( )

Metodista universal ( )

Protestante ( )

Universal ( )

Outra ( )
50
3- Qual é o seu grau académico?

Lenciado ( )

Frequência universitária ( )

Mestrado ( )

Ensino secundário ( )

Outro ( )

4- Qual Província você vive?

R:

5- Costuma conversar com seus pais sobre relações sexuais?

Sim ( ) não ( ) nunca ( ) algumas vezes ( ) nunca tiveram tempo ( )

6- Já engravidou alguém?

Sim ( ) não ( )

7- Já sugeriu à alguém Abortar?

Sim ( ) não ()

8- Sabe o que é o ou do que trata o Aborto?

Sim ( ) Não () Tenho uma vaga ideia ( )

9- Dentro do contexto social e cultural da tua cidade, a interrupção voluntária da


gravidez é uma práctica recorrente?

Sim ( ) Não ()

10- O que pensa da criminalização do Aborto?

R:

51
11- Sabe o que é ou do que se trata o aborto?

R:

QUESTIONÁRIO V. FEMENINA

1- Qual é a sua idade?

18 a 20 anos ()

21 a25 anos ()

26 a 30 anos ()

31 nos ou mais ()
2- Qual é a sua orientação Religiosa?

Católica ( )

Metodista universal ( )

Protestante ( )

Universal ( )

Outra ( )

3- Qual é o seu grau académico?


52
Lenciado ( )

Frequência universitária ( )

Mestrado ( )

Ensino secundário ( )

Outro ( )

4- Qual Província você vive?

R:

5- Costuma conversar com seus pais sobre relações sexuais?

Sim ( ) Não ( ) Nunca ( ) Algumas vezes ( ) Nunca tiveram tempo ( )

6- Conhece alguém que já interrompeu voluntariamente a gravidez?

Sim () Não ()

7- Dentro do contexto social e cultural da tua cidade, a interrupção voluntária da


gravidez é uma práctica recorrente?

Sim ( ) não ()

8- O que pensa da criminalização do Aborto?

R:

9- Sabe o que é ou do que se trata o Aborto?


R:
10- Já esteve grávida alguma vez?

Sim () Não ()

11- Caso fosse vítima de uma violação, e desse acto acabasse grávida, ficaria coma criança?

Sim () Não () Talvez () Não sei () Provavelmente Não ()

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