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A estrutura da Mensagem: a simbologia dos números

Poeta-filósofo, Poeta-mágico e Poeta-alquimista, dá Fernando Pessoa à Mensagem uma estrutura


rigorosa em termos simbólicos.
5 O livro divide-se efetivamente em três Partes ou Três Épocas: Brasão, Mar Português e O Encoberto,
correspondentes, em termos lusíadas, às Idades do Pai (os fundadores da nação portuguesa), do Filho (os
que, recolhendo a herança, a dilataram pelos mares e continentes) e do Espírito (que ainda não veio,
embora tenha sido anunciada, do Espírito encoberto, que espera o Desejado).
Na parte I, Brasão, retrato heráldico da Pátria antiga, os Sete Castelos correspondem exatamente,
10 embora transpostos para uma história lusíada sacralizada, às Sete Idades […]. Ulisses, Viriato, o Conde D.
Henrique, D. Afonso Henriques, D. Tareja, D. Dinis e D. João I/D. Filipa seriam pois os castelos do brasão
português, os seus bastiões paradigmáticos, em número fixado a partir da dinastia de Avis no brasão
nacional.
Se os Castelos são 7, as Quinas ou as Chagas de um Portugal-Cristo, sacrificando-se a um destino
15 glorioso, porque da Ordem divina, são 5 correspondendo a 5 mártires da pátria. […]
Estranha, mas compreensível é a designação de Nun’Álvares, afinal de contas Condestável do Reino,
mas não o Rei, como o portador da coroa. É que […] Pessoa o vê como o arquétipo do herói-cavaleiro puro.
[…] É Nun’Álvares que coroa simbolicamente o fundador da dinastia de Avis, D. João I, com o qual se inicia a
sétima idade do Mundo. Nun’Álvares, o que ergue a luz da sua espada para a estrada se ver, é o antecessor
20 de D. Sebastião, que, esse sim, tal como Galaaz, na sua própria morte, revelará o Santo Graal. D. Sebastião,
o Galaaz com pátria, é o que toma a última Excalibur, a Excalibur do Fim, em jeito tal / Que a sua Luz ao
mundo dividido / Revele o Santo Graal. […]
O 7 com 5 dá 12, exatamente o número de poemas da Segunda Parte ou Época, Mar Português. É tão
rica a simbólica deste número que só podemos reter aqui algumas das suas significações: a de que era um
25 número de eleição, o número do povo de Deus, do povo eleito: os 12 filhos ou as 12 tribos de Israel, os 12
frutos da árvore da vida, os 12 discípulos de Cristo, as 12 portas da Jerusalém Celeste no Apocalipse de S.
João, os 12 fundamentos da Cidade do futuro, em ouro fino, o número da Igreja triunfante, o número do
ciclo completo, do cumprimento, que por isso é o número dos Cavaleiros do Rei Artur, que hão de
encontrar o Graal perdido. […]
30 O que se descreve em Mar Português é primeiro a epifania oceânica do novo povo eleito, depois a sua
perdição na noite e na tormenta, e enfim a sua prece a Deus, para o ressurgimento ou a reconquista da
Distância, símbolo que eleva desde o sentido literal, de distância geográfica para a Ásia e as Américas, até
ao sentido anagógico, de distância para o mistério do absoluto ou do divino.
Toda a terceira parte, O Encoberto, se baseia no 5 e no 3. Cinco símbolos, revelando os cinco grandes
35 mitos portugueses: o de D. Sebastião, que regressará numa manhã de nevoeiro; o do Quinto Império, em
que a terra será teatro / Do dia claro...; o do Desejado, que virá revelar o Santo Graal, o das Ilhas
Afortunadas, onde o rei aguarda e espera; e o do Encoberto, visto portuguesmente como o Messias — D.
Sebastião —, Pedra Filosofal, […] um Mestre, um Iluminado, um Guia, um Emissário, um Avatar do Cristo-
Espírito do Segundo Advento.
40 As Sete Idades podem resumir-se nos Cinco Impérios e estes essencializar-se nos Três Reinos de
Joaquim da Flora: Três são os Avisos (dos Profetas de Portugal, o Bandarra, o Vieira e Pessoa); e três são,
como vimos, a Cabeça e as duas Asas do Grifo).
E, por último, cinco tempos, culminando com o Quinto, por aqueles profetas vaticinado, o tempo do
Nevoeiro, o tempo do Encoberto, o tempo do Regresso ou da Hora, o tempo do Quinto Império, Império do
45 Espírito como Espírito da Verdade, em que se reunirão enfim o lado esquerdo e o lado direito da sabedoria,
a razão e a intuição, a ciência e a mística […].

António Quadros, «A Estrutura Simbólica da Mensagem», in Fernando Pessoa − Mensagem: Poemas Esotéricos
(Edição crítica de José Augusto Seabra), Porto, Fundação Engº António de Almeida, 1993, pp. 233-236 (texto com supressões).
5

Simbologia dos números

 Simboliza o Ser, a Revelação; concentra a harmonia entre o consciente e o inconsciente,


realizando a união dos contrários, pelo que se liga à Perfeição.
1
(um)  «Nun’Álvares Pereira»: o único poema que Pessoa inseriu sob o título «A Coroa»,
representa a unidade, o centro onde coexistem as forças antitéticas, de uma forma
harmónica, o que lhe confere uma dimensão sobre-humana.

 Símbolo da divisão (o criador, o ente criado), da dualidade (expressão de contrários ou de


complementaridade); resume o paradoxo da existência: a vida e a morte.
2  Na Mensagem, prende-se, essencialmente, com os princípios antagónicos passivo e ativo.
(dois) Os dois poemas que se inserem em «Os Campos»: «O dos Castelos» (Portugal aparece
como um campo pronto a ser fecundado) e «O das Quinas» (Cristo, símbolo do sofrimento e
da tormenta, é o exemplo das provações a passar, para se chegar ao princípio ativo).

 Número que expressa uma ordem intelectual e espiritual, uma união entre Deus, o Universo
e o Homem, representando a Perfeição, a Totalidade – Deus é uma de três pessoas: Pai,
3 Filho e Espírito Santo; as fases da existência: nascimento, vida e morte.
(três)
 A Mensagem liga-se, simbolicamente, ao ciclo da vida: «Brasão», «Mar Português», «O
Encoberto».

 Número do Centro, da Harmonia, do Equilíbrio, do Homem e também da Perfeição: o corpo


humano disposto em cruz (pernas, braços e cabeça, com o coração no centro); os cinco
sentidos; …
5  Na Mensagem, surge em três conjuntos de poemas: «As Quinas» (as cinco chagas de
(cinco) Cristo – o sofrimento para a salvação da Humanidade), «Os Símbolos» (os valores
simbólicos unificantes), «Os Tempos» (o fim de um ciclo e incitamento ao início de outro: um
tempo de harmonia, em que o Homem conhecerá a sua dimensão divina, num reino
espiritual).

 Simboliza o fim de um ciclo e a sua renovação, a totalidade das energias após a completude
7 de um ciclo, mas em movimento, ou de um dinamismo total: os sete dias da semana.
(sete)  Na Mensagem, está representado em «Os Castelos», a fundação e a defesa da
nacionalidade.

 Número de Eleição, o número do povo de Deus, do povo eleito: os 12 filhos ou as 12 tribos


de Israel, os 12 frutos da árvore da vida, os 12 discípulos de Cristo, as 12 portas da
Jerusalém Celeste no Apocalipse de S. João; o número da Unidade, do Ciclo Completo: os
12 12 meses do ano; do Cumprimento e da Ação: os 12 Cavaleiros da Távola Redonda do Rei
(doze)
Artur; o símbolo do devir humano, da perpétua evolução do Universo.
 A segunda parte «Mar Português» é composta por 12 poemas: as referências míticas ao
período áureo da História nacional (que fecha um ciclo).

Fontes:
 Artur Veríssimo, Dicionário da Mensagem, Lisboa, Areal
Editores, 2000.
 Conceição Jacinto & Gabriela Lança, A Análise do Texto –
Mensagem, Fernando Pessoa, Porto, Porto Editora, 1998.
 Jean Chevalier & Alain Gheerbrant, Dicionário dos
Símbolos, 2.ª ed., Lisboa, Editorial Teorema, 2010.

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