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FUNDAÇÃO EDUCACIONAL “PRESIDENTE CASTELO BRANCO”

FACULDADE “CASTELO BRANCO”

A VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA NA FASE


INVESTIGATÓRIA
Larissa Flávia Oliveira 1
Ariadi Sandrini 2

RESUMO:
Neste artigo, após pesquisas realizadas principalmente em doutrinas de autores
competentes no assunto da ausência do Princípio da Ampla Defesa na fase investigatória,
verificou-se que as características do sistema inquisitório puro predominam no sistema
processual penal misto brasileiro, o que fortemente prejudica as garantias do réu e aproxima o
Estado do autoritarismo, que já é fortemente conhecido por aplicar penas deficientes de
garantias constitucionais em resposta a criminalidade.

PALAVRAS-CHAVE: Princípio. Ampla Defesa. Sistema Inquisitório. Investigação.

1 INTRODUÇÃO
Atualmente o conhecimento do abuso de poder na democracia tem se tornado cada vez
maior, e as críticas ao Poder Judiciário e ao processo penal brasileiro o acompanham. Sobre
esse prisma, sabe-se que o maior prejudicado, quando se trata de direito de defesa e liberdade,
é o acusado. Mesmo que os debates correntes do momento afirmem que essa situação está
mudando, na prática observa-se o mesmo atraso estagnado da justiça e a violação aos
princípios existentes. Sábio é Quartim de Moraes ao afirmar (2001, p.16): “Se há tantos
‘democratas’, por que há tão pouca democracia?” Nesse sentido, o presente trabalho visa
expor a violação da ampla defesa, princípio norteador do processo penal brasileiro, que é
causada na fase investigatória do inquérito policial. O mencionado princípio pode ser
entendido como um dos poucos instrumentos efetivos que possibilitam os raros momentos de
defesa do acusado em uma ação penal, contudo, a sua utilização não é frequente, ou se quer é
respeitada na fase da ação penal e, infelizmente, inexistente na fase pré-processual.

1
Graduanda em Direito pela Faculdade “Castelo Branco”. E-mail: larissa_ale@outlook.com
2
Mestre em Processo Civil e professora da Faculdade “Castelo Branco”. E-mail: ariadisandrini@gmail.com
De fato, está claro que vivemos momentos em que a existência de princípios
garantidores dos direitos fundamentais não é provida de forma correta ou em sua totalidade.
Ora, se o objetivo do inquérito policial é apurar a infração, os seus efeitos e apontar uma
possível autoria, cabendo em seguida ao Ministério Público se utilizar de tais dados e oferecer
ou não uma denúncia, cabe pois, também, uma defesa nessa fase, nada mais que justa, do
acusado. Com efeito, infelizmente, as menores falhas e lacunas das leis somadas ao
desrespeito aos direitos fundamentais atingem não só um alvo na mira do judiciário, mas sim,
todos os cidadãos que veem o seu dinheiro desperdiçado diariamente em processos
desnecessários, que poderiam ser evitados ainda na fase pré-processual através da ampla
defesa do indiciado.

2 METODOLOGIA
O trabalho realizado possui como estrutura matriz, pesquisa formada por leituras em
artigos científicos e citações de obras bibliográficas, ambos relacionados ao tema de direitos
fundamentais, bem como assuntos das matérias curriculares de direito processual penal e
constitucional, já estudados em sala de aula pelos integrantes do grupo. Os artigos foram
coletados no período de 26 de agosto a 08 de setembro de 2018. É imprescindível mencionar
também que a coleta das informações contidas em artigos científicos, foram todas
integralmente por vias eletrônicas.
Quanto a organização da estrutura do presente, a mesma ocorreu em três etapas; na 1ª
optou-se por deixar aos integrantes, livre a pesquisa sobre o tema através de três meios:
artigos científicos, monografias e doutrinas conhecidas no curso de Direito; na 2ª etapa
ocorreu o momento da manifestação por escrito de cada integrante, com as suas opiniões e os
pontos de maior relevância; e a 3ª a junção dos escritos, observando as citações necessárias
para a sua conclusão.
Em últimas palavras, por todos esses meios, a pesquisa tem como principal
característica uma imersão mais profunda no significado de direitos fundamentais, buscando
descobrir como e quando são postos em prática a favor do acusado em matéria processual
penal.
3 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS DADOS
Segundo Aury Lopes Jr. e Ricardo Jacobsen Gloeckner, no livro Investigação
Preliminar no Processo Penal:
O CPP de 1941 denomina a investigação preliminar do inquérito policial em clara
alusão ao órgão encarregado da atividade. O inquérito policial é realizado pela
polícia judiciária, que será exercida pelas autoridades policiais no território de suas
respectivas jurisdições, e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua
autoria (art. 4º). (2014, p. 222)

Nesse sentido, podemos caracterizar o inquérito policial como uma fase pré
processual, que tem por objetivo verificar a existência de indícios de autoria e materialidade
referentes a uma suposta infração penal, que após, servirão de base para o oferecimento de
denúncia, em casos de ação penal pública condicionada ou incondicionada, ou oferecimento
de queixa nos casos de ação penal privada.
Aury Lopes Jr., quanto a sua natureza dispõe: “[...] a natureza jurídica do inquérito
policial vem determinada pelo sujeito e a natureza dos dados realizados, de modo que deve
ser considerado um procedimento administrativo pré-processual.” (2014, p. 222)
Em linhas gerais, a partir da conclusão do inquérito e o seu envio para o magistrado
competente e o Ministério Público, haverá o oferecimento da denúncia, via de regra, no qual o
este último, titular da ação penal, deveria prezar e observar pela (des)necessidade do processo,
porém, as denúncias em sua grande maioria são oferecidas.
Superada a conceituação, o que nos interessa de fato é o funcionamento do inquérito e
a participação do Ministério Público e dos advogados de defesa no mesmo. “Atualmente,
existe uma tendência de outorgar ao Ministério Público a direção da investigação preliminar,
de modo que o promotor investigador poderá obrar pessoalmente e/ou por meio da Polícia
Judiciária (necessariamente subordinada a ele).’’ (LOPES JR. e GLOECKNER, 2014, p. 151)
Diante disso podemos chegar à conclusão de que existe uma cumulação de poderes e
participação do Ministério Público que em tese, deveria ser parte do processo, e não uma
figura que pode ir além disso, a ponto de presidir a investigação desde o início para que
depois ela mesmo ofereça a denúncia, com uma defesa já “pré montada” e organizada de
acordo com a sua própria conveniência, o que revela uma completa parcialidade e um vício no
início de todo um possível processo criminal.
Nesse mesmo sentido, versa Aury Lopes Jr.:

“A prática demonstra que o promotor não é mais que um órgão acusador e, como tal,
uma parte parcial que não vê mais que uma direção. Por sua própria índole, está
inclinado a acumular exclusivamente provas contrarias ao imputado. Não contribui
em nada a construção de uma parte polivalente no processo penal, pois, sob o manto
protetor da imparcialidade, o que se faz é atribuir a cada dia mais poderes para uma
das partes (MP), ao mesmo tempo que se dá maior credibilidade à sua atuação.”
(2014, p. 162)

Para agravar a problemática, ainda existe um limitado acesso ao inquérito policial por
parte do advogado de defesa. A lei nº 13.245, de 12 de janeiro de 2016 que
altera o art. 7o da Lei no 8.906, de 4 de julho de 1994 (Estatuto da Ordem dos Advogados do
Brasil) dispõe:

Art. 1o O art. 7o da Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994 (Estatuto da Ordem dos


Advogados do Brasil), passa a vigorar com as seguintes alterações:

“Art. 7o, XIV - examinar, em qualquer instituição responsável por conduzir


investigação, mesmo sem procuração, autos de flagrante e de investigações de
qualquer natureza, findos ou em andamento, ainda que conclusos à autoridade,
podendo copiar peças e tomar apontamentos, em meio físico ou digital; [...]”

É importante reparar no verbo “examinar” utilizado no inciso supracitado, que


possibilita ao advogado da parte investigada apenas o acesso ao inquérito depois de ocorrida
toda a investigação, o que soa bastante irrazoável. Nessa linha, como é possível o MP, órgão
hierarquicamente superior ao departamento de polícia, participar da busca por provas e fatos
que indicam os indícios de autoria e materialidade, sendo estes, elementos essenciais da
acusação? Diante dessa situação, quais as chances reais de um abuso de poder? E não mais
nas entrelinhas, onde está a imparcialidade que permite um processamento justo do possível
acusado? Na verdade o que vemos aqui é apenas a vontade de punir desenfreada.

Nessa mesma perspectiva afirma Geraldo Prado, Ana Cláudia Ferigato Choukr e
Carlos Eduardo Adriano Japiassú:

Um rápido sobrevoo pelo passado pode ajudar a compreender o que está em jogo no
confronto entre a transparência e o segredo no inquérito policial. A situação se
assemelha muito ao que Cordero chama de oculto judicial e remete ao ápice do
esplendor inquisitorial: o estilo inquisitório implica partidas desiguais, nas quais o
acusado joga na escuridão sabendo apenas o que lhe é dito e nada garante palavras
verdadeiras, do início ao fim; pelo contrário, é bom pressupor que são falsas ou
equivocadas, pois não há jogo limpo ou fair play inquisitorial. (PRADO, CHOUKR,
JAPIASSÚ, 2016, p. 58)

Claramente estamos diante de uma violação do direito humano a liberdade e dignidade


disposto no art. 5º da Constituição Federal como cláusula pétrea. Com o mesmo raciocínio, o
doutrinador Fernando Capez (2016, on-line) se posicionou, “No processo penal acusatório, a
garantia do contraditório assegura a ampla defesa do réu e, logo, é um dos requisitos do
devido processo legal. A ausência do contraditório na persecução criminal transfigura uma
insegurança, pois o réu torna-se indefeso, infligindo afinal um grave dano a sua dignidade.”

É assustador pensar que esses direitos humanos, que são revestidos de poder para
limitar a atuação inapropriada do Estado e evitar um atentado à democracia, são os mesmos
que não estão sendo respeitados em uma das fases criminais mais importantes. Atualmente a
população assiste inerte a toda essa transgressão que vende uma falsa promessa de justiça, e
como se não bastasse a “falsa imparcialidade” também apontada, percebe-se que o ponto de
partida pra essa injustiça está na não observância da aplicação do sistema processual penal
misto.

Sabemos que na fase processual um sistema predomina em detrimento do outro,


oportunamente assim, o sistema acusatório se destaca mais que o inquisitivo em alguns
momentos, mas ambos não poderiam jamais excluir totalmente a aplicação do outro em
qualquer etapa. Contudo, no cenário da fase investigativa as únicas características percebidas
são as do sistema inquisitivo, visto que nessa etapa todo o poder está nas mãos da autoridade
policial em parceria com o Ministério Público, o que torna ainda mais clara a ausência do
princípio da ampla defesa e um forte crescimento do autoritarismo.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao colocar em prática a elaboração do trabalho arcamos com o compromisso de
procurar fontes doutrinarias acerca do sistema adotado no inquérito policial e a ausência de
ampla defesa no mesmo, e a partir disso obtivemos um resultado já esperado com relação a
ineficiência do sistema penal no sentido de designar ao Ministério Público um papel que torna
todo sistema pré-processual inquisitório, o que por óbvio deixa prejudicado todo o possível
processo penal, além disso, a conclusão maior, é o imenso atentado à democracia que essa
pratica gera.
A partir das pesquisas realizadas foram também reveladas confirmações em relação
aquilo que já imaginávamos no que diz respeito a ausência de ampla defesa no inquérito
policial, e o quanto essa carência produz impactos negativos para o exercício efetivo desse
princípio a partir do oferecimento da denúncia em face de um suposto culpado, o fato do
indiciado poder ser inocente não é nem de longe considerado, sendo ele obrigado a pagar por
toda essa perseguição infundada e o desejo desenfreado de punir por parte do poder estatal.
REFERÊNCIAS

CAPEZ. F. 2016. Curso de Processo Penal. São Paulo, 23 ed. Saraiva, n.p. Disponível
em: <http://www.academia.edu/30101059/Curso_de_Processo_Penal_-_Fernando_Capez_-
_2016.pdf> Acesso em: 29.ago.2018.

CHOUKR, A. N. F. & PRADO, G. & JAPIASSÚ, C. E. A. 2016. Processo Penal e


Garantias. Estudos em homenagem ao professor Fauzi Hassan Choukr. Florianópolis, 2 ed.
ampl. e rev., p. 58.

GLOECKNER, R. J. & JR., A. L. 2014. Investigação Preliminar no Processo Penal.


São Paulo, 6 ed. Ver., atual. e ampl., Saraiva, p. 150-222.
QUARTIM DE MORAES, J. 2001. Contra a canonização da democracia. Critica
Marxista. Campinas, p. 16. Disponível em:
<https://www.ifch.unicamp.br/criticamarxista/arquivos_biblioteca/artigo7101quarti.pdf>
Acesso em: 06.set.2018.

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