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Direitos reais- caso prático propriedade horizontal

Ana era proprietária da fração autónoma designada pela letra “B” do prédio urbano constituído e
propriedade horizontal, sito na Rua da Paz, n.º 25, na cidade de Barcelos, desde 2 de janeiro de 2013.
A Assembleia de Condóminos do prédio reunia anualmente para a aprovação do orçamento respeitante às
despesas de conservação e fruição das partes comuns. A parte daquelas despesas correspondente à fracção
“B” foi fixada, de acordo com o critério previsto no artigo 1424.º do Código Civil, em € 120 (cento e vinte
euros) por ano, mantendo-se inalterada entre 2013 e 2020. A Assembleia de Condóminos deliberou ainda
que o referido valor seria pago em quatro prestações trimestrais, vencendo-se cada uma delas no primeiro
dia dos meses de janeiro, abril, julho e outubro de cada ano. Ana participou em todas as reuniões da
Assembleia de Condóminos e sempre votou favoravelmente os orçamentos apresentados anualmente pelo
Administrador.
A 20 de Janeiro de 2021, Ana vendeu, por escritura pública, a referida fração a Barnabé, que registou de
imediato a sua aquisição e enviou ao Administrador do Condomínio cópia da escritura.
Barnabé recebeu no dia 20 de abril de 2021 uma carta registada do Administrador do Condomínio com o
seguinte teor:
“Ex.mo Sr. Barnabé,
Uma vez que adquiriu a fração “B” do prédio urbano constituído e propriedade horizontal, sito na Rua da
Paz, n.º 25, na cidade de Barcelos, de cujo condomínio sou Administrador, notifico V. Ex.a do seguinte:
1. A parte das despesas de conservação e fruição das partes comuns do referido prédio imputada à
fração “B”, de que V. Ex.a é proprietário, ascenderam, nos anos de 2013 a 2020 a € 120,00 (cento e
vinte euros) por ano;
2. A anterior proprietária, porém, nunca procedeu ao pagamento da parte das referidas despesas
correspondentes à fração “B”;
3. Como tal, encontra-se em dívida o montante de € 960,00 (novecentos e sessenta euros), a que se
somam juros de mora desde a data de vencimento de cada uma das prestações trimestrais.
Como V. Ex.a é o atual proprietário da fração “B”, é da sua responsabilidade o pagamento do referido
valor. Venho, por isso, convidá-lo a proceder ao pagamento do valor em dívida no prazo de 10 dias. Findo
aquele prazo sem que o pagamento seja efetuado, procederei à cobrança judicial da dívida.
Com os melhores cumprimentos,
O Administrador do Condomínio,”

1. Deverá Barnabé proceder ao pagamento daquele montante? Justifique devidamente a sua


resposta.
 Não! Apesar de ser uma obrigação real, a jurisprudência tem entendido que não transmite as dividas já
vencidas. A obrigação de contribuir para as despesas do condomínio é uma obrigação real, resultante do
estatuto de proprietário da fração autónoma, mas a posição na maioria da jurisprudência é que à medida
que se vão vencendo essas prestações elas autonomizam-se do direito real e ficam sujeiras ao regime
geral das obrigações e deixam de ser transmissíveis as prestações já vencidas desta obrigação real.
 Significa que, no caso pratico tendo B adquirido o direito de propriedade sobre a fração apenas em 2021
não é responsável pelo pagamento das despesas do condomínio respondentes aquela fração, mas que
respeitem a anos anteriores.

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Direitos reais- caso prático propriedade horizontal
 Uma vez que o B não é o responsável, aquele que vai ser é o anterior proprietário A.
 É possível que o B seja também responsável por este pagamento?  sim! Mas para o poder ser tinham
de estar presentes os pressupostos da transmissão da divida, ou seja, tem de haver um acordo entre A e
B no sentido de ele assumir essa responsabilidade e além disso era necessário a autorização do
condomínio para haver essa transmissão.
 Não sendo esse o caso, o B não responde pelas obrigações correspondentes ao período anterior à
aquisição da qualidade de condomínio, sendo que quem responde é o anterior condómino A.
 Apesar de se tratar de uma obrigação real, as prestações já vencidas não se transmitem e, portanto, cada
condómino responde apenas pelas obrigações de conservação e fruição das partes comuns,
correspondentes ao período em que tenha sido proprietária da fração.
2. Independentemente da sua resposta à questão anterior, poderá o condomínio exigir hoje a Ana a
totalidade dos valores referidos no texto? (junho 2021)
 Só parte da dívida, uma vez que as contribuições do condomínio são prestações periodicamente
renováveis e por isso, estão sujeitos aos prazos de prescrição mais curtos (310 cc), o prazo é de 5 anos.
 Como se trata de prestações já vencidas, elas autonomizaram-se já da obrigação geral de contribuir para
as despesas da conservação e fruição dos bens comuns, ficando dessa forma ligadas aos prazos de
prescrição do art.º 310 que são 5 anos a contar do vencimento de cada uma delas.
 Se o condomínio viesse exigir agora a A o pagamento destes valores, ela só iria pagar as que se venceram
nestes últimos 5 ano à data da citação para o pagamento. Como estamos em 2021, só poderiam ser
exigidas as prestações que se venceram depois de junho de 2016, admitindo que a citação era feita agora.
3. Está prevista para a próxima semana a realização de uma Assembleia de Condóminos do prédio
para aprovar a realização de obra que consiste na instalação de painéis solares na cobertura do
prédio, para produção de energia elétrica destinada a alimentar dois postos de carregamento de
veículos elétricos na garagem do prédio, obra cujo custo está orçamentado em € 15.000,00 (quinze
mil euros). Barnabé não tem carro e quer saber o seguinte:
a) Qual a maioria necessária para deliberar a realização de tal obra;
b) Se terá de pagar alguma coisa (sabendo que a fração de que é proprietário corresponde a 5%
do valor total do prédio) ou se ficará ou poderá ficar dispensado do pagamento
 Esta obra, pertence às partes comuns, sendo uma obra de inovação (acrescentar ao prédio algo que ele
não tinha antes). Como se trata de uma inovação, é aplicável o art.º 1425 e 1426.
 A- A maioria de 2/3 do valor total do prédio, art.º 1425 nº1 tem de ser aprovado pela maioria, ou seja,
para este efeito existe uma espécie de dupla maioria onde cada condómino conta como uma pessoa e é
preciso a maioria de mais de metade dos condomínios que tem de aprovar a inovação e os condóminos
que aprovarem, têm de ser mais de metade das pessoas que represente pelo menos 2/3 do valor total
do prédio.
O B poderia sozinho impedir aprovação a esta liberação?  ele só poderia não caso de apenas existirem
2 condóminos, sendo um com 95 e ele 5 assim já era possível haver essa impossibilidade, embora o outro
tivesse mais de 2/3 do valor do prédio, mas o outro sozinho seria 1 contra 1 e não teria a maioria dos
condóminos (aqui não acontece isso, uma vez que existe mais condóminos, no entanto, bastava que 2
aprovassem esta inovação que o voto contra de B não produzia efeitos sendo insuficiente)
A maioria seria, a maioria dos condóminos do prédio, desde que essa maioria se representa 2/3 do valor
total do prédio.
Aplicamos o nº1 e não aplicamos mais nenhum dos números porque a inovação que está em causa não
se enquadra em nenhum dos outros números.

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 B- B vota a favor  tem de pagar? E quanto? se vota a favor tem de pagar, em princípio paga em função
da permilagem que tem em resultado da sua fração no prédio (art.º 1426). Sendo que o valor é 5% tem
de pagar 5% de 15000 euros, ou seja, 750 $ a não ser que ele votasse a favor e alguém que votasse contra
e conseguisse ficar dispensado do pagamento. Nesse caso, se algum dos condóminos ficar dispensado
do pagamento por ter visto recursado fundamentalmente a sua recusa por decisão judicial, a parte que
caberia a esse condómino que foi dispensado vai acrescentar-se à parte dos outros.
 B vota contra tinha de pagar na mesma? Em princípio sim.
 Quando é que um condomínio pode ficar dispensado de pagar os encargos com as inovações?  o
primeiro requisito é que não tenha votado a favor, ou seja, não tenha aprovado, mas isso não chega é
necessário que a recusa tenha sido judicialmente havida como fundada (art.º 1426 nº2), o nº3 diz que é
sempre fundada a recusa se ela for ou tiver natureza voluptuaria (quando não é útil nem necessária), ou
não for proporcionada a importância do edifício, mas pode ser considerada em outras situações que não
estas.
 Neste caso, esta inovação tem natureza voluptuaria uma vez que a obra não é útil para não haver uma
perda ou deterioração do prédio, sendo que é útil no caso de aumentar o seu valor e o facto de colocarem
isto aumenta o valor do prédio.  esta benfeitoria muito dificilmente era considerada voluptuaria, no
sentido em que acrescentaria valor ao prédio e até mesmo às próprias frações. Pela parte do voluptuário
muito dificilmente B iria ver a sua recusa fundada.
 Aqui não temos acesso ao valor das frações, mas por ex. um prédio constituído por 10 frações, com uma
despesa destas é considerada desproporcional à importância do edifício?  será difícil que ele consiga
justificar invocando esse motivo.
 Mas o facto de ele não ter nenhum automóvel, nem elétrico nem normal  não tem nenhum interesse
nem vai ser um dos benificiários diretos desta inovação, será que isso seria suficiente para que o tribunal
lhe tivesse dispensado do pagamento da parte que lhe cabe nesta inovação? Provavelmente não seria
suficiente.
(no caso de aparecer uma pergunta como esta no teste, seria apenas necessário falar da maioria necessária)
4. O tribunal considerou que a recusa do B era fundada e que ele não teve de pagar nada, mas passado
1 ano o B comprou um carro elétrico e quer saber se o podia carregar nos postos de carregamento
existentes na garagem do prédio.
 Podia, desde que pagasse a sua quota correspondente (art.º 1426 nº4), tinha de pagar os 5%. Se a recuso
dele fosse fundada o pagamento seria feita pelos restantes, mas se depois quisesse participar nos
benefícios dessa inovação teria previamente de realizar o pagamento que lhe era exigido no inicio, sendo
restituída aos restantes condóminos.

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