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Processo: 00314/04
Secção: Contencioso Administrativo- 2.º Juízo
Data do Acordão: 28-10-2004
Relator: Cristina dos Santos
Descritores: INTIMAÇÃO CAMARÁRIA AO SENHORIO PARA EXECUÇÃO DE OBRAS DE
CONSERVAÇÃO
Sumário: 1. O artigo 12.° nº 1 do RJAU (DL 321-B/90, de 15.10) determina que (n.° 1) "as obras de conservação
ordinária estão a cargo do senhorio, sem prejuízo do disposto no artigo 1043.° do Código Civil e nos
artigos 4.° e 120.° do presente diploma".
2. Recai sobre a sociedade comercial proprietária de prédio arrendado em mais de 50%, o dever de
realizar as obras de conservação, assegurando as condições de habitabilidade, segurança e salubridade
que não ponham em risco os direitos contratuais dos inquilinos, os direitos pessoais dos transeuntes e
os interesses comunitários do correcto ordenamento urbanístico.
3. Constitui competência - mas também dever - do Município, fiscalizar e adoptar as medidas que
previnam a eclosão de situações de risco para os interesses mencionados, desde que adequadas.
1. Não pode ser aceite como contra interessada a Sra. D. M..., por a mesma não ter
feito prova de todos os factos necessários para que se opere a transmissão do
arrendamento, nos termos do RA.U.;
2. Não pode a Sra. D. C..., ser admitida como contra interessada por a mesma não
ser porteira do prédio há muitos anos;
3. Deve o Despacho de fls. 169 a 171 ser revogado;
4. Não pode ser dado como provado que a Sra. D. J... é transmissária de Mário ...,
inquilino do 3.° andar Esquerdo, como consta da alínea ee) dos factos provados;
5. A Sra. D. J.. não é transmissária do falecido inquilino Mário ..., nem tampouco a
mesma se arroga de tal direito;
6. A Requerente apresentou uma estimativa, em termos de valor, para a execução
das obras, embora sem ser um valor exacto;
7. É facto notório que uma obra da dimensão da que consta da intimação camarária,
custa largos milhares de euros;
8. Fundamental não é a requerente provar que apresenta uma situação económico-
financeira que a impeça de fazer face a tais custos mas, antes, como o fez, que no
quadro factual em apreço é absolutamente injusto e violador do princípio da
proporcionalidade obrigar a Requerente a despender verbas daquela ordem quando
aguarda que a Câmara Municipal e Lisboa se digne pronunciar-se sobre o processo
de eventual classificação;
9. O processo de classificação não impedindo em termos absolutos, que a
Requerente apresente um projecto para apreciação da Câmara, torna-o, na prática,
absolutamente inviável;
10. Se Câmara Municipal de Lisboa vier a classificar o prédio, as condicionantes
que daí advêm tornarão qualquer projecto que agora se apresentar absolutamente
inútil;
11. Nestas circunstâncias, não faz também sentido, uma vez mais com o devido
respeito, estar a Requerente a candidatar-se ao programa RECRIA, já que as obras
de conservação do prédio, que a Câmara Municipal de Lisboa impôs à Requerente,
ficarão totalmente desaproveitadas;
12. Logo, os custos que a Requerente vier a ter com estas obras repercutir-se-ão,
necessariamente, de forma negativa na sua esfera jurídica;
13. Nas circunstâncias apresentadas o exercício do direito da C.M.L. impor a
realização de obras no prédio em causa constituiu um verdadeiro abuso.
14. O prédio não apresenta risco de ruína e encontra-se afastado do passeio, pelo
que não constitui qualquer risco para os transeuntes.
15. Encontra-se já desocupado em mais de 50%.
16. Sem saber que intervenção poderá ser feita no prédio, a Requerente não pode
celebrar arrendamentos dos andares vagos, já que a ocupação constituiria também
um entrave a essa futura intervenção.
17. Termos em que, e nos mais de Direito aplicáveis, sempre contando com o mui
douto suprimento de V.Exas. deve ser concedido total provimento ao presente
Recurso,revogando-se "in tottum" a douta sentença em crise, bem como o douto
Despacho de fls. 169 a 171, com todas as legais e demais consequências.
*
6. Para além dos trabalhos acima descritos deverão ser igualmente efectuados
todos os que no decorrer da obra se venham a verificar necessários.
7. Deverão ser respeitados, durante a execução das obras, os artigos 15.° e 16.°
do RGEU.
DO DIREITO
1. Enquadramento
***
Dir-se-á, desde já, que o julgado em 1ª Instância é para confirmar, para cujos
fundamentos se remete sem qualquer declaração de voto, ao amparo do disposto
no artº 713º nº 5 CPC, ex vi artº 140º CPTA.
C. Quanto ao facto elevado à alínea ee) dos factos assentes, quer no tocante ao
ocupante do ....° andar, Esq., do prédio dos autos com o n.° ..., quer no que
respeita ao ....° andar, Esq. do mesmo prédio, é de notar que:
Sem embargo do contraditório impor a notificação (e pronúncia) da requerente do
requerimento de fls. 175 a 178, cabe referir que, na economia do juízo de não
decretamento da providência que subjaz à sentença impugnada, o que é relevante
não é a qualidade ou o nome do ocupante da fracção em referência, mas, ao invés,
se a mesma se encontra (ou não) ocupada, facto dado como assente pela requerente
(cfr. artigo 8.° do requerimento inicial e documentos juntos pela própria a fls. 11 e
10, respectivamente).
Nestes termos não se vislumbram quaisquer nulidades na sentença impugnada. (..)”.
***
Relativamente a esta matéria é de reter, como se refere a págs. 53 da supra citada
Obra de Mário Aroso de Almeida, que o objecto dos processos administrativos
não se define “(..) por referência às situações subjectivas dos contra-interessados,
titulares de interesses contrapostos aos do autor, mas à posição em que a
Administração se encontra colocada, no quadro do exercício dos seus poderes de
autoridade (..)
Esta circunstância não retira, no entanto, aos contra-interessados a sua qualidade de
verdadeiras partes na relação jurídica multipolar e, por isso, no litígio, para o
efeito e deverem ser demandados em juízo.
É o que resulta do inciso final do artº 10º nº 1, que, portanto, reconhece aos contra-
interessados o estatuto de verdadeiras partes demandadas, em situação de
litisconsórcio necessário passivo – e, importa sublinhá-lo, unitário – com a
entidade pública, com todas as consequências que daí advêm (..)” à “(..) designação
[de contra-interessados] que cabe aos que tenham interesse directo e pessoal em que
não se dê provimento à acção (não é necessária a titularidade de uma posição
jurídica substantiva própria) (..)” (6).
*
Do excerto doutrinário supra decorre, para além da irrelevância da questão
substantiva levantada no ítem 5 das conclusões de recurso, que apenas há-de ser
patente um interesse pessoal, no sentido de a anulação do acto se repercutir
imediatamente na sua esfera jurídica e não na de outrém, bem como directo, isto é,
a prejudicialidade que a anulação do acto assume na sua esfera jurídica configurar-
se de forma imediata, actual, que evidencie no contra-interessado uma situação de
efectiva necessidade de tutela judiciária.
*
Deste modo, também aqui o julgado em 1ª Instância é para confirmar pelos
fundamentos aduzidos no Tribunal a quo, para os quais se remete sem
qualquer declaração de voto, ao amparo do disposto no artº 713º nº 5 CPC, ex vi
artº 140º CPTA e, consequentemente, as questões suscitadas nas conclusões de
recurso sob os ítens 1 a 5 improcedem por falta de fundamentação legal, pelas
razões de direito constantes da sentença recorrida.
***
Lisboa, 28.10.2004,
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(1) Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, III Volume, Coimbra, 2004, p. 107
(2) Na sequência, de resto, do preceito com idêntico conteúdo constante do artº 9º do RGEU,
entretanto revogado pelo artº 129º al. e) do DL nº 555/99, de 16 de Dezembro.
(3) Neste sentido, Aragão Seia, Arrendamento Urbano, Anotado e Comentado, Coimbra, 1998, pp.
165 e 166.
(4) Redacção conferida pelo Decreto-Lei nº 257/95, de 30 de Setembro.
(5) Redacção conferida pelo Decreto-Lei n.° 329-B/2000, de 22 de Dezembro.
(6) Vieira de Andrade, A justiça administrativa, Almedina, 5ª edição, pág. 253.