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INFLUÊNCIA DO PORTUGUÊS NA FLEXÃO EM NÚMERO EM LÍNGUAS BANTU

DE ANGOLA

Gabriel Mateus Curissuta


Estudante finalista do curso de ensino da língua portuguesa, da Escola Pedagógica do Dundo -
ESPLN, afecta à Universidade Lueji A'nkonde - ULAN
gcurisuta@gmail.com
Resumo:
A metodologia usada no presente trabalho é consubstanciada numa abordagem
linguística baseada em estudo de análise de corpus, foi-nos possível fazer uso aos
diversos estudos ou evidências empíricas, como falas espontâneas de diversos falntes,
na escola, na rádio, na televisão e na vida social. Fizemos uma leituras de certos
manuais didático-pedagógicos e até mesmo literários, onde vimos com frequência este
uso desviante. Assim, o trabalho está estruturado em seis partes, temos uma parte
introdutória, tendo assim as informações ligadas ao aparecimento do português em
território nacional, segue-se a primeira parte que tem assuntos sobre as línguas bantu,
seguir-se-á a parte dois, onde consta reflexões sobre o sistema de variação em
número, primeiro na língua portuguesa (LP), depois em línguas bantu (LB), onde
discute-se como cada uma das línguas com uma forma do seu plural, a terceira parte é
apresentação e análise dos corpus, vem em seguida à parte conclusiva do trabalho,
onde apresentamos algumas visões, por último segue-se a lista de referências
bibliográfica, que usamos para a elaboração deste trabalho.

Palavras-chaves: Implicaturas; Flexão; Língua bantu; Língua Portuguesa

Mugimbu:

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Especificidades de línguas bantu versus língua portuguesa

Actualmente, na linguística especializada o termo língua bantu é referenciado para


designar à guisa de línguas aparentadas compostas por cerca de 600 línguas faladas
por 220 milhões de pessoas no continente africano, localizados na África Central e
Austral, no sul, adjacente aos Montes de Camarões, no sul da Nigéria, na costa
Atlântica do Rio Tana e na República do Quênia (Ngunga 2004).
As línguas nacionais maioritariamente faladas em Angola pertencem no seu todo ao
grupo bantu, línguas da subfamília Níger-Congo da família maior Congo-Cordofaniana,
que com base aos postulados de Gathrie foram classificadas em zonas de 15 a 16,
representadas de letras alfabéticas maiusculizada de "A à S", com excepção de "J, O e
Q".
Por isso, do ponto de vista linguístico (Lexical, Morfossintático, Fonético-fonologico,
etc.), as línguas indo-europeias (língua portuguesa) apresenta-m apanágios diferentes
em relação às línguas da família Congo-Cordofaniana (línguas bantu). Abaixo vamos
apresentar algumas especificidades das línguas bantu versus língua portuguesa:

Línguas bantu tabela: 1 Língua Portuguesa

Alfabeto1 20 a 25 Alfabeto 24

Vogais 5 Vogais 5

Semivigal 2 Semivogal 2

Consoante 13 a 18 Consoante 21

Classe gramatical2 10 a 20 Classe gramatical3 10


Fonte: elaboração própria.

SISTEMA DE VARIAÇÃO EM NÚMERO


1 A maioria das línguas Bantu tem entre quinze (15) a vinte (20) classes incluindo várias classes
de singular-plural veiculando diversos sentidos semânticos dos substantivos (humano, animal,
objecto, concreto, abstracto, animado, não-animado, contável, não-contável) como nos confirma
Austin (2010, citado em Sassuco, 2021, p. 83).
2 Temos 6 classes variáveis e 4 invariáveis.
3 Secretaria de Estado da Cultura: instituto de Línguas Nacionais, boletim n. ⁰1, Luanda 1987.

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As línguas bantu possuem caracteristicas e particularidades diferentes que as distingue
das línguas indo-europeia (língua portuguesa), no tange a formação de singular e
plural, nas línguas nacionais de matriz bantu é formado através do acréscimo de um
morfema prefixal, cada sistema de classes apresenta um prefixo nominal responsável
para a marcação de singular e plural de várias entidades. Como se pode ler em
Andrade (2017), citado em Ualhanga (2017) que,
[…] nas línguas bantu, a estrutura morfológica dos nomes consiste no radical precedido do
prefixo de classe a que nome pertence. Quando o nome não é primitivo, isto é, derivado de um
outro nome ou de um verbo, para além do prefixo, há muitas vezes, modificações da vogal final
(p. 45).
Ademais, os prefixos nominais determinam os demais prefixos das palavras no âmbito
da relação ou concordância dos constituintes frásicos.
No entanto, a luz da gramática normativa, as palavras na língua portuguesa flexionam-
se tendo em conta duas bases teóricamente conhecidas: singular e plural, (cf. Estrela,
Soares & Leitão 2015) e (Amorim & Sousa 2009). Na língua portuguesa, para se
marcar o plural é preciso acrescentar ao morfema uma desinência “S”, ora, tal flexão
pode acontecer em: singular- quando se refere a uma individualidade e em plural-
quando se refere a mais de duas individualidade, no caso um conjunto. Cunha (1999)
lido em Svodabová (2012, p. 29) aflora que,
o plural forma-se acrescentando-se –s ao singular, quer isto dizer, à raiz do núcleo do sintagma.
A concordância do número, através da adição do sufixo –s, está-se realizando também no nível
dos determinantes (isto é: artigos, demostrativos e possessivos), quantificadores (isto é:
indefinidos e numerais) e modificadores (isto é: adjectivos, sintagmas preposicionais e relativos)
no sintagma nominal.
Uma vez que, as mesmas línguas, são de origem comum e semelhante, devido aos
apanágios linguísticos que apresentam, os substantivos ou demais palavras nas
línguas africanas de Angola (Línguas bantu), são caracterizados pelos prefixos que
indicam os números singular e plural, nessas línguas a flexão faz-se com prefixos,
muito contrariamente da LP, que usa o morfema desinencial /s/, no caso o sufixo para
a sua identificação.
Vimos que, em português, a flexão das palavras é tida, pelo acréscimo de um morfema
preso, para que se torne prático a nossa abordagem, apresenta-se abaixo um quadro

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ilustrativo, onde figuram algumas palavras com a ocorrênciade flexão em género
(Singular e plural). O plural nas línguas bantu é feito no início da palavra, já na língua
portuguesa ele ocorre no final.
Tabela: 2 flexão de palavras nas línguas bantu é apresentado pelo prefixo nominal que
seleciona a classe, o género e o número de cada palavra.

Classes Singular Ocorrência Plural Ocorrência

1 Mu- Mu-thu/pessoa A- A-thu/pessoaS

2 Mu- Mu-twe/cabeça Mi- Mi-twe/cabeçaS

3 Ki- Ki-ma/coisa I- I-ma/coisaS

4 Di- Di-tadi/pedra Mu- Ma-tadi/pedraS

5 U- W-anda/rede Mau- Ma-wanda/redeS

6 Lu- Lu-mbo/muro Malu- Ma-lumbo/muroS

7 Tu- Tu-ya/fogo Matu- Ma-tuya/FogoS

8 Ku- Ku-nwa/beber Maku- Ma-kudya/comidaS

9 Mb-udi/ovelha Ji- Ji-mbidi/ovelhaS

10 Ka Ka-funga/pastor Tu- Tu-funga/pastoreS


Fonte:elaboração própria.
Nas línguas bantu os nomes comuns são caracterizados por prefixos que indicam o
singular e o plural. Porém, uma das marcas distintivas do ponto de vista linguísticos
que opõem o Português às línguas bantu reside na forma como se processa a
pluralização dos nomes. Na língua Portuguesa a flexão ocorre no final da palavra,
como na maioria das línguas indo-europeias, mas nas LB verifica-se a ocorrência no
início. Se em Português ocorre o morfema –s como estrutura fundamental de
pluralização do nome, em línguas de matriz bantu denota-se a ocorrência de diversos
morfemas, conforme a tabela acima espelha.
(i) Dika sobre o
● grau

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Para Heli Chatelain (1888) citado por Ndombele (2022), afirmam no que concerne a
marcação de grau, no caso diminutivo e aumetativo em línguas bantu é feito através de
prefixos. (Ka —- para a foma diminutiva, Ki —- para aumentativo), já para palavras que
se encontram pluralizada juta-se a ela o prefixo Tu, (Ci (Txi), Mi e Li ou Lu).

Tabela:3 Grau diminutivo

Singular Plural

Ka-kanyingo/ penerinha Tunyingo/penerinhas

Kangombe/ boizinho Tungombe/ boizinhos

Kalumba/rapariguinha Tulumba/rapariguinhas

Kaliwe/pedrinha Tumawe/pedrinhas

Kasuwo/casinha Tusuwo/casinhas

Kamutwe/cabecinha Mitwe/cabeçaS

Grau aumetativo

Lukanyingo/penerão Tunyingo/ penerões

Kingombe/boizão Tungombe/boizões

Kilumba/raparigona Tulumba/raparigonas

Cisuwo/casarão Masuwo/ casarãos

Kamuhela/camazinha Cimuhela/camarão
Fonte: elaboração própria.

● Português nas línguas bantu de Angola

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Classes singular Ocorrência Classes plural Ocorrência

7
Fonte: elaboração própria.

8
Singular Plural
Pessoa PessoaS
Casa CasaS
Carro CarroS
Fonte: elaboração própria
).

Como se vê acima, nota-se que, a flexão em português é feita com acréscimo de um


elemento mórfico, a desinência final. Quer dizer que a variação marcada por intermedio
de um sufixo e não com anteposição de um prefixo.
2.2. Flexão em LB
.
E, a flexão de plural dos Nomes, Advérbios, Verbos ou palavras substantivas etc.; em
línguas africanas de origem bantu, dá-se através da prefixação ou interfixos, não com a
anteposição do sufixo, ou desinência.
Esta prática é recorrente, quase em todos os níveis, tanto no plano oral, como no
escrito; em pessoas escolarizadas (até com formação na área da linguística) e com as
não-escolarizadas, a pesar de, a língua estar em constante mutação a variação e
mudança serem processo natural de cada língua natural, Labov, (s.d). em Timbane &
Berlinck, (2019). Não nos esqueçamos que ela é acima de tudo representação social,
cultural e identitária de um povo.
Não se deve admitir a esse nível esta vandalização social, mesmo que o factor
principal da língua seja a comunicação. É sabido que, a língua cokwe e kimbundu
são de origem bantu, e a LP, é de linhagem indo-europeia, sendo assim, ambas
apresentam distinções do ponto de vista Fonético-Fonológica, Morfossintáticos e
Semântico, mesmo no plano escrito, elas não apresentam semelhanças, porque
cada uma, vem de famílias/troncos extremamente diferentes.
É inadequado a construção da marca de Pluralidade de certos morfemas baseando-se
no sistema do português. As línguas bantu, no caso as que se esbate aqui, apresentam
apanágios distintos, em detrimento do português (Chicuma, 2014).

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Singular Plural
Mutu Atu
Suwo Masuwo
Diyala Mayala

Apatir do quadro acima ilustrado, se pode observar que as línguas bantu sempre a
formação do plural de certos nomes, advérbios, adjetivos formam-se através de um
prefixo, enquanto em português forma-se com sufixo. De modo, a sermos pragmáticos
achamos melhor trazemos à liça duas marcas de Pluralidade em algumas LB, de modo
a facilitar a compreensão da nossa abordagem, por isso, vamos antes trazer aqui,
abordagens sobre duas línguas de mesma família, no caso bantuísta para vermos a
frequência da variação em certos léxicos. Logo, mais à seguir vamos tratar de línguas
Cokwe e Kimbundu, por serem as que mais, vemos com frequência as palavras com
essas ocorrências pluralizante. Fonte: elaboração própria. Classes dos prefixos, para formação de
singular e plural, em Cokwe e Kimbundu.

3. Apresentação e análise de corpus

Escrita própria Plural descontextualizado


(aportuguesado)

Bantu BantuS

Kakhongo KakhongoS

Kacokwe CokweS

Lunda LundaS

Kamanga KamangaS

Baluba BalubaS

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Maka MakaS

Imbamba ImbambaS

Kamba CambaS

Kota CotaS

Ndengue NdenueS

Kakusu CacusoS

kandongueiro CandongueiroS

Zongola ZongolaS

Jinguba GingumbaS

Kubata CubataS

kiabu QuiaboS

Ibondóò IbindoS

Fonte: elaboração própria. Palavras bantu que sofrem aportuguesamento

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Dizer que as palavras, das quais fizemos alusão já pertence à Português, falado em
Angola, nós em particular não concordamos porque ainda não é reconhecido e
também, não foram ainda dicionarizadas, enquanto não estarem listadas num
dicionário, enciclopédia, glossário etc, é prematuro as considerarmos como sendo
palavras de Português de Angola. Sendo assim, elas continuam a ser ainda palavras
de línguas bantu, por isso devem respeitar a sua grafia original. Se não nos referimos
de empréstimo ou até mesmo neologismos.

Conclusão

Várias palavras existem cujo a flexão em número obedecem os critérios da gramática


normativa portuguesa, mesmo sendo morfemas de origem bantu. Esta readaptação
que a a LP exercem às línguas bantu, tem vindo a ser uma problemática que os
falantes dessas línguas enfrentam.
Para esta implicatura, o nosso pensamento, primeiro temos a dizer que a Língua
Portuguesa, apresenta um sistema de construção de flexão em número diferente, e
também vem de origem igualmente distinto, com a de línguas bantu, sobretudo a
Cokwe e Kimbundu. Por isso não será possível construir a sua variação em singular e
plural, através de acréscimo de sufixo ou morfema desinencial 《 S 》 . Se não, da
antiposição de classes de prefixos.
A LP, apresenta implicaturas no sistema gráfico de sertas palavras em Cokwe e
Kimbundu, isso faz com que as língua africanas percam seu valor e aos pouco vão
desaparecendo, assim o impacto dela sobre as línguas bantu nos reluz à uma situação
de analogias, em que os falantes do português têm quanto ao uso das línguas bantu,
isto é, confundido de certa maneira à morfologia, Fonética-fonologia e à sintaxe das
línguas indo-europeias, propriamente dito o português com a de línguas africanas no
caso pratico as línguas Cokwe e Kimbundu.
O que está na base deste fenómeno é a não utilização das línguas africanas angolana
no sistema de Ensino, porque elas não fazem parte do contexto escolar dos seus
falantes, a falta de investimento neste ramo de saber, e também essas línguas são

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estáticas, no sentido de não se adequarem às novas realidades que o mundo nos
impõe. Pouco conhecimento do sistema gráfico e morfológico, faz com que os falantes
façam uma adaptação afim de que se estabelecer a comunicação. Não devemos falar
de empréstimo, neologismo e variação ou mudança, mas a falta de conhecimento
ligado à linguística Africana (Bantu), a oficialização delas como línguas de escola, da
função pública, e a existência de poucos trabalhos no ramo da léxicologia e
lexicografia, que abordam cuidadosamente sobre essas línguas.

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