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Tema: Análise fonológica

1. Aspectos segmentais e supra-segmentais


2. Unidade de estudo: Fonema ou segmento fonológico
3. Alofones
3.1. Distribuição complementar e variação livre
1. Aspectos segmentais e supra-segmentais

A fonologia é a área de linguística que se ocupa da descrição e análise


dos significantes de cada língua, ou seja, da porção que cada língua
formatou a partir da massa amorfa fônica.
Os significantes de que aqui se refere são os sons pertencentes ao
sistema de uma língua.
Esses sons são designados de segmentos fonológicos. Mas a Fonologia
não estuda só os aspectos segmentais de uma língua, como também os
aspectos supra-segmentais.
Os aspectos supra-segmentais são o acento, a entoação, o tom e a
duração.
Os tons e a duração não fazem parte do sistema fonológico da língua
portuguesa, porque não distinguem significado. Já o acento e a
entoação são elementos supra-segmentais do português. Antes de
prosseguirmos com descrição funcional desses elementos numa língua,
importa, primeiro, explicar o significado.
Tom – é um elemento que está relacionado com a altura do som. Pode-
se distinguir um som pelo tom alto em oposição a um tom baixo. Por
exemplo, na língua japonesa, os tons produzem diferenças de
significado num único significante: nas palavras háshì e hàshí,
Tom – é um elemento que está relacionado com a altura do som. Pode-
se distinguir um som pelo tom alto em oposição a um tom baixo. Por
exemplo, na língua japonesa, os tons produzem diferenças de
significado num único significante: nas palavras háshì e hàshí, a
primeira significa ‘palitinhos usados para comer´ e a segunda significa
´ponte`. O tom alto é representado pelo sinal parecido com o acento
agudo e o tom baixo é representado pelo sinal parecido com acento
grave.
Duração – refere-se ao som longo ou curto e isso repercute-se numa vogal
longa, que se opõe a uma vogal curta. No português, isso não se faz sentir,
porque não tem qualquer efeito significativo, já na língua inglesa, a duração tem
muita importância, pois distingue significados. Exemplos:

sick [sik], significa “alguém doente ou com má disposição” seek [si:k], significa
“tentar encontrar alguma coisa”. A diferença entre essas palavras está na
duração da vogal /i/, a primeira, pronuncia-se com maior duração, neste caso, é
uma vogal longa, a segunda, pronuncia-se com menos duração, neste caso é
uma vogal curta. O símbolo fonético para a vogal longa é um sinal diacrítico
idêntico aos dois pontos [i:].
2. Unidade de estudo: o fonema ou segmento fonológico

No capítulo da análise fonética, estudamos os sons de uma perspectiva fonética, ou seja,


privilegiando as características físicas e fisiológicas envolvidas em suas produções.

Na análise fonológica, tal como já nos referimos, a abordagens do estudo dos sons é diferente.

Como a língua é um sistema de signos, embora possamos em princípio estudar os significantes


por si só (enfocando apenas suas propriedades físicas, por exemplo), o estudo das relações
existentes entre o significante e significado, ou entre o plano das expressão e o plano do
conteúdo, apresenta um carácter mais marcadamente linguístico, pois toca na relação
fundamental dos sistemas linguísticos, a função semiótica.
Assim, os sons não são vistos apenas como sons em si mesmos, mas em termos das
relações que estabelecem entre si e das relações que os unem no plano do conteúdo.

Segundo Martinet, a língua é caracterizada como sendo dotada da chamada dupla


articulação da linguagem, isto é, da possibilidade de a sua cadeia sonora ser
decomposta de duas maneiras distintas. A primeira trata-se da decomposição de
pequenas unidades dotadas de significado, os morfemas. Este é objeto da análise do
estudo da Morfologia. A segunda articulação são os fonemas, muito mais pequenos
que os morfemas, desprovidos de significados, mas a relação entre um fonema e outro
distingue significado ou itens lexicais (ver no primeiro volume do manual de estudos linguísticos, págs.
54,55).
Suponhamos que seja feito o levantamento dos sons oclusivos
produzidos numa língua e se observa que essa língua apresente os
sons [p, b; t, d; k, g]. Podemos afirmar por enquanto que essa língua
apresenta seis fones oclusivos, três surdos e três sonoros. O
simples facto de apresentar esses sons nas diversas manifestações
da cadeia sonora, no entanto, não nos indica como funcionam esses
sons no interior da língua em questão. Qual será, então, a rede de
relações existente entre sons dentro dessa língua específica?
Uma possibilidade bastante comum, que é que se verifica no
português, é a de que cada um dos fones desses pares
separados por ponto e vírgula possa ser utilizado para distinguir
significado entre si. Comparando pares de palavras como par e
bar, tom e dom, e cola e gola, verificamos que cada um deles, o
facto de trocarmos a consoante oclusiva surda inicial pela sonora
com o mesmo ponto de articulação produz uma alteração de
significado.
Podemos dizer que, numa língua desse tipo, além de conterem fones diferentes, cada
um dos pares [p, b], [t, d] e [k, g] contém realizações de dois fonemas diferentes.

A outra possibilidade é a de esses três pares de sons não poderem distinguir


significado na língua em questão. Em campa, uma língua falada no Peru,
encontramos exemplos como os seguintes: a palavra ´ar` apresenta as formas
[´tampia] e [´tambia], e a palavra ´feijão´ apresenta as formas [´matʃaki] e [´matʃagi].
Em ambas as palavras a troca de uma oclusiva surda por uma sonora e vice-versa
não provoca alteração de significado, ou seja, a variação não é distintiva. Se não
houver nessa língua nenhum caso em que ela distinga significado, diremos que os
pares como [p] e [b], por exemplo, não são constituídos de dois fonemas distintos.
Vejamos um outro exemplo que compara a situação do português do Brasil com
outra língua próxima, o italiano. Se observamos as palavras que são grafadas
com ti, percebemos que há diferença de pronúncia de certas regiões para
outras do Brasil. Na cidade de São Paulo e no Rio de Janeiro, por exemplo,
predomina a pronúncia que normalmente grafaríamos tchi, mas que em
transcrição fonética seria [tʃi]. O som produzido antes de [i] não é o mesmo
produzido antes de [a, e, ɛ, ɔ, o, u]. Mas regiões como o estado de
Pernambuco, por exemplo, têm como pronúncia mais comum aquela em que o
som [t] ocorre antes de qualquer vogal, inclusive antes de [i]. Ou seja esse é o
som que nós transcreveríamos como [t] em todas as situações.
Se compararmos a situação encontrada no português com a encontrada com o
italiano, veremos que elas são diferentes. Circunscrevendo a nossa
observação aos sons [t, tʃ, d, dƷ], a princípio pode parecer que o funcionamento
desse conjunto de sons é igual nas duas línguas. Todos os quatro ocorrem em
português e em italiano, como vemos nos exemplos a seguir:

Português:

directo [dƷiʹrɛtu] dois [ʹdojs] tigre [tʃiʹgri] ator [aʹtor]

Italiano:

cinema [ʹtʃinema] testa [ʹtɛsta] titolo [ʹtitolo] cielo [ʹtʃɛlo]


Apesar dessas semelhanças em termo superficiais, a de os sons simplesmente
ocorrerem ou não na língua em análise, há uma diferença importante:

Em italiano, encontramos pares como tintura [tinʹtura] ´tinta` e cintura [tʃinʹtura]


´cinto`, por um lado, e adire [aʹdƷire] ´agir`, por outro. Isso nos indica que nos
pares [t, tʃ, d, dƷ], temos distinções de significado, portanto, esse sons são
fonemas diferentes em italiano. Podemos assinalar referindo-nos aos fonemas
/t/, /tʃ/, /d/, /dƷ/. Observem que distinguimos os fones, que são transcritos entre
colchetes [...], dos fonemas diferentes, que são transcritos entre barras oblíquas
/.../.
Assim, em português, [t, tʃ] não são fonemas diferentes, são
realizações distintas do mesmo fonema. A mesma coisa ocorre
com [d, dƷ].

Em suma: dois sons diferentes mas materialmente semelhantes


podem funcionar como se fossem o mesmo elemento ou como se
fossem elementos diferentes. É o que Saussure tinha em mente
quando elaborou o conceito de valor, que é algo relativo a cada
sistema linguístico (ver no manual de IEL, vol. 1, págs 34-38).
3. Alofones

Como já observámos no capítulo dos fonemas, dois sons, apesar de terem


duas realizações fonéticas diferentes, o facto de exprimirem uma mesma
realidade implica que são realizações de um mesmo fonema. Por exemplo,
o fonema /g/, em português, pode ter, pelo menos, duas realizações
fonéticas diferentes na região do Sul de Angola. Realiza-se como [g], por
falantes do português, como língua materna ou também por aqueles,
embora o português não seja língua materna, são escolarizados ou
coabitam permanentemente com falantes do português – língua materna.
Porém, o mesmo fonema /g/ pode realizar-se como [ᶯg] por falantes do português,
como língua segunda, sobretudo, por aqueles que têm como língua materna o
umbundu. Podemos enquadrar esses exemplos no seguinte contexto de realização:

galinha [gaʹliɲɐ], português – língua materna, mas [ᶯgaʹliɲɐ], português – língua


segunda.

Segundo os exemplos, podemos depreender que o facto de haver mudança de


realização fonética no primeiro som, de [g] para [ᶯg] , não implicou mudança de
significado. O que implica dizer que a realização fonética de [ᶯg] é apenas uma
variante do fonema /g/. A isso chamamos de Alofone. Ou seja, o fone [ᶯg] é um
alofone do fonema /g/, em português.
3.1. Distribuição complementar e variação livre

Dando sequência ao que já foi explicado, dois sons diferentes


podem ter o mesmo valor fonológico. Isto é, existe uma outra forma
de pronunciar um único fonema, a que chamamos de alofone ou
variante.

Entretanto, mesmo que eles sejam realizações de um único fonema,


a relação entre essas variantes pode ser de dois tipos diferentes.
Vejamos o primeiro tipo:

O fone [dƷ], no português falado no Brasil só se realiza quando


estiver diante da vogal [i], nos demais contexto, o mesmo som
pronuncia-se como [d].

Exemplo: dia [ʹdƷia], mas data [ʹ datɐ].

Isso quer dizer que o fone [dƷ] é um alofone do fonema /d/ em


distribuição complementar.
Agora, analisemos o segundo tipo.

O fone [ᶯg], exemplo já dado, é, geralmente, pronunciado por falantes do


português da região sul de Angola, sobretudo, aqueles que têm o umbundu como
língua materna. Esse modo de pronunciar esse som ocorre em todos os contexto
de realização linguística. Ou seja, no lugar de [g], o falante pronuncia sempre [ᶯg].

Exemplo: galinha [ᶯgaʹliɲɐ], o mesmo acontece nas palavras guerra [ᶯgɛra], gostar
[ᶯgoʃʹtar], e assim por diante.

Assim, podemos concluir que o alofone [ᶯg] é uma variante livre.


Portanto, os alofones podem ocorrem em distribuição complementar e
chamam-se variantes combinatórias ou podem ocorrer como variantes
livres.

Os alofones em distribuição complementar (variantes combinatórias)


acontecem por factores de natureza linguística.

As variantes livres acontecem por factores de natureza extralinguística.


Esses factores podem ser, de acordo com Coseriu, diatópicas, diastráticas,
difásicas e diacrónicas (ver no manual de IEL, vol. 1, pags 39, 40).
FIM

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