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Medicina UFPel – Patologia Especial

Aula 10 – Patologia das glândulas salivares


Introdução
As neoplasias de glândulas salivares não são doenças prevalentes. Por mais que sejam de baixa incidência, são
tumores bem particulares. Quando ocorrem em outros tecidos, raramente: tumores TIPO glândulas salivares.
É uma categoria de doenças bem específica. São doenças de natureza inflamatória e neoplásica

Glândulas Salivares
• As glândulas salivares são constituídas por
o Três pares de glândulas maiores
1. Parótida
2. Submandibular
3. Sublingual
o Numerosas glândulas menores localizadas na submucosa da cavidade oral, da faringe e das vias
respiratórias superiores
• A saliva produzida atua na preparação do alimento para a digestão, no controle da microbiota da boca
e no umedecimento das mucosas do trato aerodigestivo superior.
• A unidade secretora é constituída pelos ácinos, que são de três tipos: seroso (secreta amilase), mucoso
(secreta sialomucina) e misto, que contém células mucosas e serosas.
o Parótida: serosa
o Submandibular: mista com predomínio das unidades serosas
o Sublingual: mista com predomínio das unidades mucosas

Mucocele
• Bloqueio ou ruptura de um ducto salivar com consequente extravasamento de saliva para o tecido
conjuntivo estromal.
• Alteração das glândulas salivares bastante comum.
• Macroscopia
o Geralmente se apresenta como uma área abaulada, aumentada de volume, translúcida em
decorrência do acúmulo de saliva (que é translúcida).
o Reação inflamatória que lembra tecido inflamatório de granulação
o Tecido fica com um aspecto edematoso, mas na verdade é a saliva que fica ali acumulada e
uma reação inflamatória.
• Tratamento cirúrgico, sendo necessária a excisão da glândula salivar correspondente que teve seu
ducto lesionado por bloqueio ou ruptura.
• Alguns a classificam como mucocele de extravasamento ou de retenção.
o Extravasamento
▪ Ocorre geralmente em lábio inferior e é secundária a trauma. o trauma rompe o ducto
salivar e extravasa saliva.
▪ Geralmente em pacientes + jovens.
o Retenção
▪ Tende a ocorrer em outra faixa etária (+ em pacientes idosos)
▪ Em outras localizações dentro da cavidade oral, inclusive a nível de gengiva.

Manoella Becker Jaccottet


Sialoadenites
• É o processo inflamatório da glândula salivar.
1. Viral
2. Bacteriana
3. Autoimune

Sialadenite Viral
• Caxumba (parotidite epidêmica)
o Causada por vírus da família Paramyxoviridae, gênero Paramyxovirus, classe rubulavirus
o Principal sialadenite viral.
• É um processo autolimitado, que acomete crianças no período escolar.
• A glândula fica aumentada de volume, dolorosa e com infiltrado linfocitário bastante característico,
típico de processos virais.
• Geralmente o processo regride espontaneamente sem deixar maiores sequelas nas glândulas salivares.

Sialadenite Bacteriana
• Geralmente ocorre em pacientes que apresentam desidratação
o Diminuição do fluxo salivar
o Favorecimento da entrada de bactérias para dentro da glândula através do ducto.
o Processo inflamatório.
• Nessa condição, o processo será exsudativo, exsudação neutrocitária.
• Se não for adequadamente tratado, pode provocar necrose tecidual, abscesso.

Sialolitíase
• Outra condição que favorece a infecção bacteriana é o cálculo, que no caso da glândula salivar é
chamado de sialolitíase.
• Formação
o Presença de restos alimentares dentro do ducto ou células epiteliais descamadas, sobretudo
num paciente que tem um fluxo salivar diminuído.
o Restos alimentares e celulares servem de núcleo para deposição de sais de cálcio e a formação
do cálculo.
o A presença do cálculo ocasiona maior obstrução do fluxo salivar diminuído e isso favorece a
migração de bactérias dentro da glândula
▪ Processo exsudativo inflamatório agudo.
• Tende a ocorrer sobretudo na glândula submandibular porque ela tem um ducto tortuoso e longo
favorecendo a impactação de restos alimentares e celulares (que servem de núcleo para deposição de
sais de cálcio).
• Vai ter uma dilatação do sistema ductal, sendo um ambiente propício para o desenvolvimento de
processo infeccioso bacteriana
• A glândula salivar grosseiramente se assemelha ao pâncreas.
o Configuração lobulada, cinza amarelada.
o Cálculo amarelado
Sialadenite Autoimune
• Síndrome de Sjögren
• É uma doença crônica caracterizada por boca seca (xerostomia) e olhos secos (ceratoconjuntivite
seca) resultando de uma destruição mediada imunologicamente das glândulas salivares e lacrimais
• Ocorre um intumescimento das glândulas salivares de uma configuração bilateral (porque é um
processo de fundo imunológico). As glândulas vão ficar aumentadas por conta de uma celularidade
aumentada dentro das glândulas.
• A proliferação linfoide presente nas glândulas salivares de todos os pacientes com síndrome de
Sjögren é denominada sialadenite linfoepitelial e conhecida pela sigla LESA
o Linfócitos migram e se depositam nas glândulas
▪ Infiltrado linfocitário importante com formações de centros germinativos.
o Glândula vai se tornando lesada e destruída pelos linfócitos
o Atrofia parenquimal
o Paciente apresentar boca seca.
• Microscopia
o Em todo o ácino, há um pontilhado azul: linfócitos.
o Estroma aumentado
▪ Glândula crescida de tamanho às custas desse denso infiltrado linfocitário.

A LESA frequentemente é uma manifestação de síndrome de Sjögren, cujos outros componentes são
ceratoconjuntivite, xerostomia, artrite reumatoide e hipergamaglobulinemia. Nessa condição, infiltrados
linfoides semelhantes aos presentes nas glândulas salivares maiores também são observados nas glândulas
lacrimais e glândulas salivares menores da cavidade oral.

Neoplasias das Glândulas Salivares


• Apesar da morfologia relativamente simples, originam-se nas glândulas salivares nada menos do que
30 tipos distintos de tumores
• Epidemiologia
o Relativamente incomuns e representam menos de 2% de todos os tumores humanos.
o Cerca de 65% a 80% são originados nas parótidas, 10% nas glândulas submandibulares e o
restante nas glândulas salivares menores, incluindo as glândulas sublinguais
o Geralmente ocorrem em adultos, com discreta predominância pelo sexo feminino, mas em
torno de 5% ocorrem em crianças com menos de 16 anos
• Obs: Os tumores que tendem a acometer mais as mulheres são: glândula salivar, tireoide e vesícula
biliar
• De forma geral, são poucos prevalentes e de pouca agressividade, percentual significativo é tratado e
os pacientes têm sobrevida longa.
• Por outro lado, chama atenção que são doenças bastante específicas das glândulas salivares.
• Os tumores das glândulas salivares são tumores muito típicos dessas glândulas.
o Quando ocorrem em outros lugares como árvore respiratória ou mama, são doenças muito
raras. “Neoplasias tipo Glândulas Salivares”.
• As neoplasias, das glândulas salivares menores têm maior chance de serem malignas.
o O tamanho da glândula é inversamente proporcional à chance de malignidade.
• A parótida é o lugar mais frequente (tanto de malignos como de benignos).

Neoplasias benignas
Adenoma Pleomórfico
• É um tumor misto, termo que não faz parte da nomenclatura recomendada, mas ainda é muito
empregado.
• Epidemiologia
o Neoplasia benigna mais frequente das glândulas salivares
o 60% dos tumores da parótida
o Mais em mulheres de meia idade (quarta década de vida)
• O termo pleomórfico é decorrente de uma diferenciação estromal e epitelial.
o Surge de células epiteliais e tem uma proliferação que se assemelha a glândula salivar normal,
portanto constituída de estruturas ductais, acinais proliferadas mas ele tem um estroma
bastante proeminente e rico em matriz extracelular, que confere ao tecido um aspecto
condróide/mixóide.
o O termo mixóide - algo mucóide, se refere a um excesso de matriz extracelular. Ao cortar o
nódulo, fica uma superfície pegajosa, translúcida, brilhante, que adere a faca. Esse aspecto
reflete essa matriz extracelular abundante.

o A apresentação predominante pode ser muito variada. A configuração macroscópica e


histológica desse tumor também muito variada.
o O tumor surge de células epiteliais e tem um diferencial estromal e parenquimal.
o Apresentam elementos epiteliais dispersos por toda a matriz, com graus vaiados de tecido
condroide (cartilaginoso), hialino, mixoide e até mesmo ósseo.
• Capsula
o Neoplasias benignas geralmente possuem cápsula e mesmo as desprovidas de cápsula
apresentam uma boa delimitação
o O adenoma pleomórfico por vezes possui cápsula incompleta.
o Podem haver infiltrações na cápsula e presença de ninhos tumorais por fora da cápsula.
o Essas características (infiltração de cápsula e ninhos de tumor extracapsulares) não são típicos
de tumores benignos. Mas no caso do adenoma pleomórfico não interferem no
comportamento benigno da lesão.
• Clínica
o O paciente apresenta inicialmente uma assimetria (geralmente na parótida - região pré
auricular).
o Esses tumores apresentam-se como massas bem delimitadas, móveis, indolores, de
crescimento lento dentro da parótida, ou áreas submandibulares ou na cavidade oral.
o Facilmente reconhecido pela clínica e facilmente tratado cirurgicamente. É fácil de evitar a
evolução catastrófica para malignidade
o Recidiva
▪ Recidiva de adenoma pleomórfico é bastante variada. Vai de menos de 5% até mais de
25%. Está diretamente relacionada ao tipo de tratamento.
▪ Se for retirado o tecido salivar normal da volta do tumor, ou seja, margem de
segurança, a recidiva é muito improvável.
▪ Se o paciente for submetido apenas a tumorectomia, pode-se abandonar ninhos de
tumor extracapsulares, teremos uma taxa de recidiva bem mais alta.
o Transformação maligna
▪ Tem chance de sofrer transformação maligna. É proporcional ao tempo.
▪ Quando ocorre a transformação maligna, ele passa a ser a neoplasia maligna MAIS
agressiva da glândula salivar.
▪ Sempre que possível, retirar esse tumor por conta dessa transformação maligna
(principalmente depois de 10, 15 anos), com chance de recidivas locais e metástases à
distância.
• Macroscopia
o Brilhante, com algumas áreas translúcidas.
▪ Área condróide com excesso de MEC.
o Pegajosa e escorregadia ao corte
o lesão é aparentemente bem delimitada e encapsulada (nada impede de ter ninhos tumorais
fora). Por isso que geralmente tem que tirar o lobo superficial da glândula.
o A glândula parótida tem um lobo superficial profundo e tem um nervo passando ali no meio.
Mas geralmente o adenoma pleomórfico acomete o lobo superficial, retira tranquilamente e
fica tudo resolvido na grande maioria das vezes.

• Microscopia
o Estruturas acinares, epitélio proliferado recapitulando estruturas ductais e tem tecido frouxo,
claro, translúcido
▪ Grande quantidade de matriz entre as células.
o Esses componentes podem variar em quantidade.
Tumor de Warthin / Cistadenoma Papilar Linfomatoso
• Benigno
• Epidemiologia
o A 2ª neoplasia mais comum das glândulas salivares
o O tumor Warthin (cistadenoma linfomatoso papilífero) é encontrado exclusivamente na
glândula parótida e nos gânglios linfáticos periparótidos
o Muito raro nas outras glândulas salivares.
o É mais comum em homens, e uma relação quase universal com o tabagismo foi encontrada
▪ 8x mais frequente em fumantes
o 5ª a 7ª década de vida
• Etiologia ainda não esclarecida
• Clínica
o Crescimento lento, indolor, abaulamento em região pré auricular.
• Morfologia
o Neoplasia epitelial benigna glandular que forma cavidade cística cujo estroma possui denso
infiltrado linfocitário.
o A glândula salivar que tem tecido linfóide associado é a parótida, inclusive tem linfonodos
intraparotídeos.
o Macroscopia
▪ Encapsulado
▪ Coloração pardo-amarelada
▪ Papilas que macroscopicamente se apresentam com aspecto de couve flor.
▪ Múltiplos espaços císticos preenchidos por líquido claro, mucoide ou marrom e, às
vezes, por substância pastosa de aspecto caseoso
o Histologia
▪ Muito característica.
▪ Cavidade cística
▪ Formação de papila
▪ Cavidades e papilas recobertos por epitélio de dupla camada da glândula salivar.
▪ Estroma carregado de linfócitos com centros germinativos (redemoinhos)
▪ Citoplasma granular e acidofílico
• Epitélio com as alterações oxifílicas/oncocítico
o Presente em outros órgãos como rins e tireoide
o Se refere a tumores com alteração citoplasmática com excesso de
mitocôndria, um citoplasma tipicamente granular e acidofílico
Carcinoma Mucoepidermóide
• Neoplasia maligna mais comum
• Mais comumente na glândula parótida
• Componente mucoprodutor e um escamoso.
• Existem 2 tipos de carcinoma epidermóide (alto e baixo grau)
• Baixo grau
o Sobrevida em 5 anos de mais 90%
o Boa delimitação
o Tem predomínio do componente mucoso, formando cavidades com muco. Componente
mucoso é facilmente reconhecido.
o A maioria é de baixo grau.
• Alto grau:
o Sobrevida em 5 anos de 50%
o Bordos infiltrativos, mal delimitado, estrelado
o O componente mucóide é escasso, o muco não é observado com facilidade, tendo até que
fazer colorações especiais para vê-lo.
o Predomínio do componente sólido escamoso. Mais mitose, mais pleomorfismo celular.
• Macroscopia
o Aspecto bem característico de carcinoma: fosco, brancacento, firme. Componente mucosa é
microscópico.
• Microscopia
o Microscopicamente, três tipos principais de células podem ser identificados:
▪ Produtoras de mucina,
▪ Escamosas (epidermóides)
▪ Intermediárias
Carcinoma Adenoide-Cístico
• 2ª neoplasia maligna mais comum
• Típico da glândula salivar, mas mais eventualmente pode estar presente em mamas, pulmões.
• Morfologia
o Macroscopia
▪ Nódulo fosco, brancacento, firme como carcinomas de uma forma geral costumam
apresentar.
▪ Grosseiramente, geralmente tem uma aparência sólida e um padrão infiltrativo de
crescimento, embora alguns exemplos possam ser bem circunscritos.
▪ Eventualmente variante sólida ou com formação de trabéculas.
▪ Mas o aspecto tradicional é de carne de peixe.
o Microscopia
▪ Padrão bastante característico
▪ Descrito como cribriforme: ninhos e colunas de células de aparência bastante branda
são dispostos concentricamente em torno de espaços semelhantes a glândulas
("pseudocistos") preenchidos com material homogêneo eosinofílico PAS-positivo ou
material mixóide granular
▪ Forma espaços de aspecto em queijo suíço (por causa dos furos).
▪ Tipo celular
• células pequenas, sem pleomorfismos proeminentes e essas células vão
proliferando.
• O material rosado dentro dos furos do queijo suíço é excesso de membrana
basal (afinidade tintorial pela eosina, com esse aspecto hialino).
• Característica importante
o Tumores graves e imprevisíveis
o Tendência notável para a invasão de espaços perineurais
▪ O diagnóstico de carcinoma adenoide cístico deve ser questionado se uma amostra
adequada retirada da periferia do tumor não apresentar essa característica
o Invariavelmente recidivantes
Carcinoma de Células Acínicas
• O carcinoma de células acínicas compreende 1% a 3% de todos os tumores das glândulas salivares. Há
uma predominância masculina e um pico de incidência na quinta década de vida, mas há uma ampla
distribuição etária
• Eles são relativamente incomuns, representando somente 2% a 3% dos tumores de glândulas salivares
• É a malignidade bilateral mais comum das glândulas salivares
• É uma variante de um tumor não muito agressivo, com padrão de glândulas serosas
• Macroscopia
o Em geral, são lesões pequenas, bem delimitadas, que podem parecer encapsuladas
o Massa fosca, firme, redonda com uma superfície de corte sólida, friável, branco-acinzentada,
geralmente medindo menos de 3 cm de diâmetro.
o Ocasionalmente, sofre acentuada degeneração cística
• Microscopia
o variação considerável de caso a caso.
o O padrão de crescimento pode ser predominantemente sólido, microcístico, papilar-cístico ou
folicular
o Há também uma variabilidade acentuada na aparência das células tumorais.
o A célula mais característica, conhecida como acínica, tem uma aparência citoplasmática
(granular e basofílica) e morfologia ultraestrutural análoga à das células acínicas das glândulas
salivares normais
o células que constituem as serosas com algum grau de pleomorfismo.
• Clínica
o Recorrência após a dissecção é incomum, mas cerca de 10% a 15% desses neoplasmas
metastatizam para linfonodos.
o A taxa de sobrevida de 5 anos está em torno de 90% e a de 20 anos é de 60%
Existem mais de 30 variantes de tumores de glândula salivar. Mas o 5 aqui descritos representam 95%

Prognostico
• O prognóstico dos tumores das glândulas salivares é determinado pelo estadiamento clínico,
localização e características microscópicas.
• Os tumores malignos da glândula submandibular têm maior incidência de recorrência e metástases do
que os tumores parótidas do mesmo tipo.
• Para o carcinoma adenoide cístico, o prognóstico é melhor quando localizado no palato, intermediário
quando na glândula parótida e pior na glândula submaxilar.
• Para tumores malignos da parótida, a presença de paralisia do nervo facial é um sinal prognóstico
sinistro.
• Em relação aos tipos microscópicos, o prognóstico é melhor para as variantes de baixo grau do
carcinoma mucoepidermóide e de células acínicas e pior para as variantes de alto grau desses tumores
e para o carcinoma adenoide cístico, tumor misto maligno, carcinoma do ducto salivar e carcinoma
espinocelular.
• Parâmetros prognósticos adicionais são discutidos em conexão com os respectivos tipos de tumor

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