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LISBOA
2023
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Lucca Moro Costa
Lisboa
2023
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO…………………………………………………………………… 5
ANÁLISE COMPARATIVA……………………………………………………… 5
CONCLUSÃO……………………………………………………………………..18
REFERÊNCIAS……………………………………………………………………19
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1. INTRODUÇÃO
2. ANÁLISE COMPARATIVA
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ratio para pessoas com sofrimento interminável. Ainda durante o Império Romano, com a Lei
das Doze Tábuas, em que há a especificação de uma ideia de suicídio piedoso com a
eutanásia de crianças que nasceram mal-formadas (Tábua IV, 1).
1 Utiliza-se a expressão “eutanásia” entre aspas, na medida em que o significado da palavra origina do grego
para “boa morte”, “morte serena, sem sofrimento”. A utilização da palavra sem o uso das aspas contribuiria para
uma deturpação do real significado da expressão, já que o Estado alemão fez uso da ferramenta para a
perpetuação de um genocídio em pessoas com o intuito de “purificação” da raça ariana.
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Ao fim da Segunda Guerra Mundial, na medida em que os horrores do período nazista
na Alemanha e nos territórios ocupados passaram a ser amplamente conhecidos, ocorreu uma
revolução no campo da bioética que permitiu, anos depois, a introdução de mecanismos
legais para regulamentação da morte clinicamente assistida. O advento de uma teoria bioética
principialista, baseada nos princípios da autonomia do paciente, da beneficência, da não-
maleficência e da justiça, colocam a vontade do paciente em um primeiro plano, permitindo o
surgimento de legislações nacionais sobre o tema.
Passemos, neste momento, a uma análise dos conceitos bioéticos de suicídio assistido,
e eutanásia, os quais compõem, de modo basilar, a ideia de morte clinicamente assistida.
De acordo com o National Health Service 2 (NHS), sistema público de saúde do Reino
Unido, o suicídio assistido pode ser definido como “o ato de deliberadamente auxiliar outra
pessoa a tirar sua própria vida”. Já José Roberto Goldim3, um dos maiores especialistas
brasileiros em bioética e catedrático da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, dispõe
que o “o suicídio assistido ocorre quando uma pessoa, que não consegue concretizar
sozinha a sua intenção de morrer, solicita o auxílio de um outro indivíduo. A assistência ao
suicídio de outra pessoa pode ser feita por atos (prescrição de doses altas de medicação e
indicação de uso) ou, de forma mais passiva, através de persuasão e encorajamento. Em
ambas as formas, a pessoa que contribui para a ocorrência da morte da outra, compactua
com a intenção de morrer através da utilização de um agente causal.”.
Cumpre esclarecer que o conceito de suicídio assistido a ser aqui trabalhado envolve o
que é realizado no âmbito da morte clinicamente assistida, acompanhado por profissional da
saúde e realizado apenas mediante consentimento livre e informado de paciente acometido de
doença grave, incurável e que traz profundo sofrimento.
Definição mais adequada talvez possa ser encontrada no âmbito do Código de Ética
da Associação Médica Americana4, que define o suicídio medicamente assistido como:
“aquele que ocorre quando o médico facilita a morte do paciente ao providenciar os meios
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necessários e/ou informações que permitam ao paciente realizar o ato de terminação da vida
(p. ex., o médico providencia pílulas soníferas e informações sobre a dose letal, ciente de
que o paciente poderá cometer suicídio).
Por outro lado, a eutanásia retira das mãos do paciente o ato de terminação da própria
vida e coloca a injeção do fármaco letal nas mãos do profissional de saúde. Luciano Maia
Alves Ferreira5, em sua obra “Eutanásia e Suicídio Assistido”, define a eutanásia como
aquele que “provoca também a morte antes da hora, porém de maneira suave e indolor, a
pedido de um paciente terminal e em sofrimento, sem perspectivas de melhora e justamente
por isso torna-se tão atrante para tantas pessoas.”
5 LUCIANO MAIA ALVES FERREIRA, Eutanásia e suicídio assistido: uma análise normativa comparada/
1º ed. 2018.
6 Swiss Criminal Code, (1937). https://www.fedlex.admin.ch/eli/cc/54/757_781_799/en
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2.2. LEGISLAÇÕES SOBRE O TEMA NA EUROPA
2.2.1. Suíça.
Ao contrário do que alguns podem pensar, a Suíça não possui uma legislação
expressamente autorizadora do suicídio assistido, de modo que a permissão da prática decorre
de uma omissão legal quando da criação do Código Penal de 1947.
O artigo 115 do referido Código prevê 7: “Qualquer pessoa que por motivos
egoísticos incite ou auxilie outrem a cometer ou tentar cometer suicídio é, se este outrem
cometer ou tentar cometer suicídio, passível de uma sentença de custódia penal não superior
a cinco anos ou a uma multa monetária (grifei)”.
Além disso, de acordo com a legislação, não há necessidade que o suicídio seja
clinicamente assistido por profissional da saúde como médico ou enfermeiro, bastando
apenas o consentimento do que deseja pôr termo à vida. Outra característica do sistema suíço
passa pela desnecessidade de a pessoa estar passando por doença terminal e incurável, como
em outros países que serão analisados ao longo do estudo.
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Todavia, a atuação médica nos casos em que há o suicídio assistido é extremamente
regulamentada pela Associação Médica Suíça, de modo que a atuação do profissional em
casos em que o paciente solicitar auxílio deve ocorrer quando presentes quatro pilares: a)
capacidade do paciente; b) decisão autônoma; c) sofrimento severo e d) consideração das
alternativas por parte do paciente.
A Suíça jamais autorizou a prática da eutanásia em seu território, sendo ainda que o
artigo 114 do Código Penal suíço prevê a punição ao homicídio a pedido da vítima, o qual
seria perpetrado por motivos louváveis e por compaixão da vítima. Apesar disso, o início do
século XXI trouxe discussões sobre a possibilidade de descriminalização da eutanásia, as
quais foram rejeitadas pelo Parlamento suíço em 2001.
Por fim, ressalta-se que a Suíça permite que estrangeiros realizem o suicídio assistido
na nação, mesmo com assistência de médicos suíços. Referida permissão gera o debate acerca
do suicide tourism e suas implicações no país têm gerado polêmica.
2.2.2. Holanda.
A referida lei alterou o artigo 293 do Código Penal holandês a fim de despenalizar a
prática da eutanásia e do suicídio assistido apenas quando praticada por um médico, o
qual deve agir de acordo com critérios pré-estabelecidos. Em síntese, os critérios a serem
observados pelos médicos quando da realização de uma eutanásia ou de um suicídio assistido
são: a) pedido voluntário de um paciente; b) estar o paciente passando por sofrimento, físico
ou psíquico, insuportável e incurável, sem perspectivas de melhoras; c) informar ao paciente
sua situação e seu prognóstico clínico; d) discussão da situação com o paciente e a chegada a
um consenso; e) consulta a, pelo menos, outro médico que não possui relação com o caso.
Este outro clínico deverá consultar o paciente e atestar de modo escrito que o primeiro
médico cumpriu os requisitos para realização do procedimento de terminação antecipada da
vida e f) realizar o procedimento da eutanásia ou do suicídio assistido com cuidado médico e
respeito à dignidade do paciente.
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O sistema holandês, portanto, prevê a possibilidade de realização da eutanásia e do
suicídio assistido apenas se performados por médico habilitado para tanto e depois do
atendimento de critérios que envolvem, ainda, a opinião de um segundo profissional. Além
disso, é facultado ao clínico recusar a realização do procedimento alegando objeção de
consciência. Outrossim, outra característica do sistema neerlandês é a necessidade de que
todas as mortes não-naturais decorrentes de eutanásia ou suicídio assistido sejam reportadas a
um comitê independente de médicos que verificará o atendimento dos critérios para
realização do procedimento e, caso encontrada alguma falha, poderá recomendar a instituição
de sanções administrativas ou penais ao profissional de saúde.
2.2.3. Bélgica.
A Bélgica se tornou o segundo país europeu a permitir a eutanásia, tendo sido a lei
promulgada em 28 de maio de 2002 e entrado em vigor em 23 de setembro de 2002, no
mesmo ano em que a Holanda adotou a medida. Remanesce vedada a prática do suicídio
assistido no país.
O sistema belga previa, em um primeiro momento, critérios bem mais restritos para a
morte clinicamente assistida. Segundo a versão inicial da legislação, seria necessário a
presença de doença terminal e o sofrimento insuportável do paciente para receber a eutanásia,
bem como ser o requerente pessoa maior de 18 anos de idade. Além disso, distinguia-se do
sistema holandês pela distinção atribuída aos pacientes que possuíam doença terminal e que
chegariam a uma morte natural em breve, daqueles que também possuíam moléstia grave e
terminal, mas que ainda teriam alguns anos de vida. No caso da legislação belga, esses
últimos casos deveriam ser revistos por um terceiro médico para que, caso constatada
efetivamente a terminalidade da doença, se proceda à eutanásia.
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Outra distinção extremamente relevante da lei belga para a lei neerlandesa se dá por
conta da ausência de idade mínima para requerimento de submissão à eutanásia, a partir de
uma emenda legal aprovada em 2014. Em que pese haja um procedimento ainda mais
complexo para os menores de idade receberem a eutanásia, com acompanhamento
psiquiátrico mais amplo e após um processo de revisão por um comitê especial de médicos,
tal prática tem gerado grande polêmica no país.
O avanço do debate sobre o tema no país fez com que o critério do sofrimento
insuportável passasse a abarcar também o sofrimento psíquico, de modo que portadores de
graves distúrbios psicológicos possam requerer a eutanásia.
2.2.4. Luxemburgo.
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L’euthanasie et L’assistance au Suicide em 2009, após uma queda de braço entre a maioria
parlamentar progressista e o Chefe de Estado da época.
2.2.5. Alemanha.
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A Alemanha, assim como a Suíça, proíbe a eutanásia e permite apenas a realização do
suicídio assistido, o qual é conhecido, em alemão, como “steberhlife”. Na Alemanha,
inclusive, há a vedação ao uso do termo “eutanásia”, pela associação aos crimes nazistas
cometidos durante o período do Terceiro Reich. A eutanásia, na Alemanha, é considera
homicídio e passível de aprisionamento por até cinco anos, de acordo com o artigo 216 do
Código Penal alemão.
2.2.6. Espanha.
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formulando, o qual deve ser submetido de forma escrita, em duas oportunidades distintas,
com quinze dias de diferença.
A lei foi aprovada a partir da maioria formada pelos partidos de esquerda e centro que
comandam o Legislativo do país. Apesar disso, o partido de extrema-direita Vox contestou a
constitucionalidade da lei perante o Tribunal Constitucional do país, o qual, em abril de 2023,
decidiu que não havia inconstitucionalidade.
2.2.7. Áustria.
Desde janeiro de 2022, a Áustria se tornou o mais novo país europeu a permitir a
morte clinicamente assistida.
O Código Penal austríaco8 previa, em seu artigo 78: “Qualquer pessoa que incite ou
auxilie outrem a cometer suicídio é punível com pena de prisão de seis meses ou cinco
anos”. A reforma legislativa veio a retirar a expressão “auxilie”, de modo que apenas a
incitação passou a ser crime.
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A lei é decorrente de um veredito da Corte Constitucional austríaca que decidiu pela
inconstitucionalidade da proibição do suicídio assistido, que consistiriam em uma violação ao
princípio da autodeterminação.
Aqueles que são portadores de doença grave e incurável mas que ainda possuem mais
tempo de vida, devem aguardar um período de doze semanas para registrar o pedido em um
serviço notarial, de modo a terem acesso à medicação disponível para o suicídio assistido.
Aqueles que possuem doença terminal, devem aguardar um espaço de tempo de apenas duas
semanas para formalização do pedido. O referido pedido pode ser formalizado por um
representante, caso o paciente não possua mais condições físicas para tanto.
O suicídio assistido está disponível para pessoas que sofrem de graves distúrbios
mentais, desde que a pessoa possua capacidade de discernimento para formalização do
pedido. Menores de idade e pessoas com doenças menos graves não podem realizar o
procedimento, mantendo-se a punição aos assistentes destes casos.
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mediante a formação de um comitê especial composto por 184 cidadãos escolhidos
aleatoriamente, tendo a proposta de elaboração de uma lei sobre a morte clinicamente
assistida sido aprovada por 76% dos membros. A proposta legislativa ainda não foi elaborada
e enviada à Assembleia Nacional todavia, pelo relatório aprovado pelo comitê formado,
crianças com doenças terminais não poderão passar pelo procedimento.
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3. CONCLUSÃO
País Eutanásia Suicídio Ambos Origem Possibilidade de realização em Necessidade de parecer médico para o procedimento
assistido menores de idade
4. REFERÊNCIAS
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