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Recursos Salmo 120

SALMO 120
Cântico de ascensão.
Este salmo começa um grupo (Sl 120–134) que partilha de um título inusitado.
Pressupõe peregrinos subindo para Jerusalém, provavelmente para a Páscoa. As tribos
subiam para Jerusalém (ver Sl 122.4), e este grupo de salmos provavelmente tivesse uso
especial nessas ocasiões. O Salmo 120 é oriundo da idéia da ovelha desgarrada, já
mencionada no versículo final do Salmo 119. Aqui o salmista se assemelha a uma
ovelha entre lobos em seu próprio país, e isto abre a cena para a peregrinação de um
ambiente doméstico hostil para as alegrias e bênçãos do culto em Jerusalém.

1. Recordando as Experiências Passadas (v. 1)

O salmo se abre, não com a situação imediata confrontando o salmista, mas com a
recordação do auxílio anterior do Senhor. Reiteradamente fora a ele no passado, e seu
clamor sempre lhe trouxe resposta imediata. A lembrança do auxílio de outrora é o
estímulo para dirigir novamente sua oração a Deus.

Seu amor no passado


Proíbe-me de pensar
Que um dia ele me deixará
Mergulhado em tribulação.
(John Newton)

2. Clamor da Angústia (vs. 2–4)

As palavras iniciais desta seção especificam a necessidade atual (v. 2). As circunstâncias
atuais não estão registradas. Se o salmo pertence ao período pós-exílio, é bem provável
que a situação fosse aquela enfrentada pelos exilados em seu regresso, os quais
contenderam contra a difamação dos samaritanos (Ed 4.12ss.; Ne 4.1ss.; 6.5–14). Os
cristãos devem seguir o exemplo de nosso Senhor. Ele foi chamado glutão e beberrão
(Mt 11.19), e contudo não respondeu nos mesmos termos (1Pe 2.23).
O versículo 3 constitui um apelo direto a que Deus envie juízo sobre os difamadores.
Ele é fraseado em termos semelhantes aos juramentos hebraicos tais como “Deus o
castigue, e o faça com a mesma severidade” (1Sm 3.17; 20.13). O apelo nesses
juramentos é para que Deus lide com a situação, ainda que, naturalmente, a pena real
não seja prescrita. É provável que houvesse alguma ação acompanhante que sugerisse a
natureza da pena. Aqui o castigo é especificado (v. 4). A resposta parece ter em mente as
descrições dadas em outras partes da língua subjacente. No Antigo Testamento ela é
chamada espada afiada (Sl 57.4), e uma flecha mortífera (Jr 9.8), enquanto mais tarde o
Novo Testamento a denomina um membro posto em chama pelo inferno (Tg 3.6). O
esperado castigo será uma resposta adequada, pois se equiparará à ofensa. A árvore da
vassoura tinha uma madeira muito dura, e por isso produzia carvões de longa duração.
O ato de julgamento será mais mortífero do que as próprias palavras dos caluniadores.

3. Estrangeiro em Sua Própria Terra (vs. 5–7)

Meseque e Quedar (v. 5) não eram próximos um do outro. Meseque foi chamado em
conformidade com um filho de Jafé (Gn 10.2), e se refere à Anatólia Oriental (moderna
Turquia). Quedar foi um dos filhos de Ismael e pai da tribo que traz seu nome (Gn
25.13). Refere-se aos árabes beduínos que viviam a sudeste de Damasco. Tão aguda era
a angústia do salmista, que sentia como se estivesse vivendo entre bárbaros! Ele era um
estrangeiro em sua própria terra!
O contraste entre os dois grupos em sua sociedade é ilustrado pelos versículos 6 e 7.
Luz e trevas são incompatíveis. As palavras de paz do salmista são desafiadas por suas
palavras de guerra. O hebraico diz concisamente: “Eu [pela] paz; eles pela guerra.”
Embora o clamor por auxílio, no versículo 2, não seja repetido novamente, ele constitui
um eco até o fim do salmo. Há claramente um intenso anseio por livramento que deve
vir do Senhor.

Comentário: Allan Harman, Salmos, trans. Valter Graciano Martins, 1a edição.,


Comentários do Antigo Testamento (São Paulo, SP: Editora Cultura Cristã, 2011), 422–
424.

Salmo 120

Cântico dos Degraus

Se admitimos que Davi foi o autor deste Salmo, como é bem provável, ele declara quão
diligentemente se engajava na prática da oração, quando, para escapar da crueldade de
Saul, peregrinava como exilado de um lugar para outro. Ele se queixa especialmente dos
perversos informantes, que injusta e caluniosamente o acusavam de crimes dos quais era
totalmente inocente. Se alguém prefere uma suposição diferente, a linguagem será de
uma queixa simples e geral contra os falsos relatos. Este salmo e os quatorze
subseqüentes são chamados de Salmos dos Degraus. Todavia, não existe nem mesmo
entre os eruditos hebreus concordância quanto à razões por que são assim chamados.
Alguns acham que havia quinze degraus que davam acesso à parte do templo designada
aos homens, enquanto as mulheres permaneciam embaixo. Esta, porém, é uma
conjectura absurda, para a qual não há fundamento. E conhecemos a liberdade que os
judeus, em questões obscuras e incertas como esta, usavam para apresentar como
explicação tudo que lhes vinha à mente.
Alguns traduzem o título por Salmos de Ascensão. E, por ascensão, entendem o
regresso dos judeus do cativeiro babilônico – esta interpretação é totalmente forçada,
pois é manifesto que a maior parte desses salmos foi composta por Davi ou por
Salomão. É fácil deduzir de seu conteúdo que aqueles que foram escritos por Davi eram
entoados no templo, enquanto ele ainda vivia e reinava. Outros pensam que a palavra
ascensão se refere às notas musicais. Alguns também afirmam que o termo se refere ao
início de um cântico. Sendo esta questão de pouca importância, não me disponho a fazer
dela um tema de laboriosa investigação. Todavia, a conjetura provável é que esse título
foi dado a esses salmos em razão de serem eles entoados numa clave mais alta que a dos
demais. A palavra hebraica que foi traduzida por degraus é derivada do verbo ‫צלה‬
(tsalah), ascender ou subir; por isso, concordo com aqueles que têm a opinião de que ela
denota as diferentes notas musicais crescendo em sucessão.

[vv. 1–4]
Em minha angústia, clamei a Jehovah, e ele me respondeu. Ó Jehovah, livra minha
alma do lábio6 de falsidade e da língua de engano. O que a língua de engano8 te dará, e
em que ela te será proveitosa? As flechas afiadas de um homem forte, com brasas de
zimbro.

1. Em minha angústia clamei, a Jehovah. O nome do autor do Salmo não é expresso,


mas o seu estilo coloca Davi diante de nossos olhos. Portanto, ainda que eu não possa
afirmar positivamente, sinto-me mais inclinado a pensar que Davi foi o seu autor. Nem
será impróprio, em meu juízo, explicá-lo como se o nome e Davi estivesse mencionado
na inscrição. Admitindo isso, eu observaria que, embora Davi, ao afirmar, neste
versículo, que o Senhor o ouvira, lhe renda graças, seu propósito primordial era
apresentar, na forma de lamento, quão perversa e cruelmente os bajuladores de Saul
empregaram todo seu engenho e poder para realizar a destruição de Davi. No entanto,
ele começa com uma expressão de gratidão a Deus, informando-nos que não O invocara
em vão; e diz isso para que seu próprio exemplo encorajasse outros, especialmente os
oprimidos pela adversidade, a nutrirem confiança em oração. É verdade que os homens
sentem necessidade do socorro de Deus a todo instante; todavia, não há razão mais
oportuna para O buscarmos do que o sermos ameaçados por um grande perigo.
Portanto, é digno de nota que Davi foi ouvido quando, constrangido e cercado por
tribulação, recorreu à proteção de Deus.
2. Ó Jehovah, livra a minha alma do lábio de falsidade. Davi agora realça o tipo de
aflição, declarando que se achava sobrecarregado com falsas acusações. Ao acusar seus
inimigos de mentira e falsidade, ele declara sua própria inocência dos crimes que lhe
imputavam caluniosamente. Sua queixa equivale a isto: como ele estava cônscio de não
haver cometido nenhuma falta, era assaltado pelos perversos que eram contrários a toda
a lei, quer humana ou divina, e nutriam ódio por ele, sem lhes haver dado ocasião para
um tratamento tão injurioso. As línguas fraudulentas atacam as pessoas simples e boas
de duas maneiras: ou cercam-nas com vilezas e armadilhas, ou ferem a reputação delas
com calúnias. É desta segunda maneira que o profeta se queixa.
Ora, se Davi, possuidor de tão eminente virtude, isento de toda e qualquer marca de
desgraça e tão distante de toda ação perversa, era assaltado com afrontas, não é surpresa
que os filhos de Deus nestes dias, ao labutarem sob falsas acusações, quando se
esforçam para viver de modo correto, sofram calúnias ainda mais graves. Como têm o
diabo como inimigo deles, é impossível que escapem de serem sobrecarregados com as
mentiras dele. Sim, vemos que as línguas caluniosas não pouparam nem mesmo o Filho
de Deus. Esta consideração deve induzir-nos a suportar com mais paciência a nossa
condição, quando os perversos nos difamarem injustamente, se é certo que a
circunstância aqui descrita é a sorte comum de toda a Igreja.
3. O que a língua de engano te dará? O profeta agrava a malícia de seus inimigos
asseverando que eram tão perversamente inclinados, que se deixavam levar pela
maledicência, quando não viam nenhum perspectiva de derivar alguma vantagem de
outro procedimento. No entanto, ele parece expressar mais que isto – parece sugerir que,
depois de haverem os inimigos derramado todo o veneno de suas calúnias, as suas
tentativas foram vãs e ineficazes. Visto que Deus é o mantenedor da inocência de seus
servos, Davi, inspirado com esperança proveniente desta verdade, se ergue novamente
com coragem heróica, como que para triunfar sobre toda a multidão de seus
caluniadores, reprovando-os por fazerem nada mais do que trair uma impotente paixão
pela maledicência, que Deus fará recair extensivamente sobre a cabeça deles. Uma
consideração bem apropriada para amenizar a tristeza de todos os piedosos, quando o
bom nome deles é maculado injustamente pelos caluniadores, é a de que esses
caluniadores nada lucrarão no final de tudo, porque Deus frustrará a expectativa deles.
4. As flechas afiadas de um homem forte, com brasas de zimbro. Aqui, o salmista
amplia de outra maneira a malícia dos que angustiam os simples e inocentes com suas
calúnias. Ele afirma que tais angustiadores lançam suas notícias injuriosas como o faz
aquele que arremete uma flecha e com ela traspassa o corpo de seu próximo. Diz
também que as calúnias desses ímpios se assemelhavam a brasas de zimbro, que
penetram com mais eficácia e queimam com mais intensidade as substâncias com as
quais entram em contato, mais do que as brasas de qualquer outro tipo de madeira. Isso
significa que as línguas desses caluniadores eram inflamadas com o calor do fogo e, por
assim dizer, imersas em veneno letal. Significa também que tais pessoas eram as menos
escusáveis, devido ao fato de que, sem obterem qualquer vantagem, eram impelidas por
uma paixão desenfreada a infligir males letais sobre os outros. Visto que o profeta não
registra aqui nada que não experimentava em sua própria pessoa, podemos inferir que,
se era conveniente que ele e homens de caráter semelhante fossem assaltados por seus
inimigos com mentiras, que lhes eram como flechas a traspassá-los ou brasas a queimá-
los, não devemos ficar surpresos quando vemos os mais eminentes servos de Deus
sendo exercitados por ataques semelhantes.

[vv. 5–7]
Ai de mim! Tenho sido um peregrino em Meseque e habitado entre as tendas de
Quedar. Por muito tempo, a minha alma tem habitado com aquele que odeia a paz. Eu
sou pela paz, e, quando falo, eles são a favor da guerra.13
5. Ai de mim! Tenho sido um peregrino em Meseque. Davi se queixa de que estava
condenado a viver por longo tempo entre um povo perverso. Sua condição se
assemelhava a de um indivíduo infeliz que se vê obrigado a viver, até que envelheça, em
exílio doloroso. Os habitantes de Meseque e de Quedar, como bem sabemos, eram
tribos orientais; aqueles tinham sua origem em Jafé, como Moisés nos diz em Gênesis
10.2; e estes, em um filho de Ismael [Gn 25.13]. Entender estes como um povo da Itália,
que antigamente eram chamados etruscos, é totalmente absurdo e sem a menor
probabilidade. Alguns entendem a palavra Meseque como um substantivo apelativo. E,
visto que ‫( משך‬mashak) significa estender, prolongar, pensam que o profeta lamenta seu
banimento prolongado, de cujo término não via qualquer perspectiva. Mas, como em
seguida ele acrescenta Quedar, termo esse que se refere inquestionavelmente aos
ismaelitas, não tenho dúvida de que Meseque deve ser entendido como que se referindo
aos árabes, que eram vizinhos dos ismaelitas. Se alguém for de opinião que os
habitantes de Meseque obtiveram este nome de sua destreza em atirar com o arco, não
farei objeções, contanto que admitam que o profeta – como se estivesse confinado em
um país de ladrões – expressa o descontentamento de um local de residência
desconfortável e enfadonho. Embora ele mencione os árabes, com os termos
empregados ele fala metaforicamente de seus próprios concidadãos, assim como em
outra passagem ele aplica a designação gentios aos judeus corruptos e degenerados.
Aqui, visando impor ainda mais desonra a seus inimigos, ele escolhe intencionalmente o
nome pelo qual os designa com base em algumas das nações cruéis e bárbaras, cuja
horrível crueldade era notória entre os judeus. Destas palavras, somos informados que
dificilmente pode recair sobre o povo de Deus um mal tão estressante como o serem
eles postos em circunstâncias em que, apesar de viverem uma vida santa e inofensiva,
não podem escapar às calúnias de línguas peçonhentas. Devemos observar que, embora
Davi estivesse vivendo em seu próprio país, não passava de um estranho nele, nada lhe
sendo mais grave do que estar na companhia de homens perversos. Disso aprendermos
que nenhum pecado é mais detestável aos olhos de Deus, por cujo Espírito falava Davi,
do que as falsas acusações que desfiguram vergonhosamente a beleza da Igreja de Deus
e lançam-na no descrédito, fazendo-a diferir pouco dos covis de ladrões ou outros
lugares que se tornam infames devido à bárbara crueldade que neles se pratica.
Ora, se o lugar em que a retidão dos homens bons é dominado pelas injúrias de lábios
mentirosos e se converte, para os filhos de Deus, em um local de exílio miserável, como
poderiam ter prazer, ou melhor, como poderiam deixar de sentir a mais amarga tristeza
em habitar numa parte do mundo onde o sagrado nome de Deus era profanado por
horríveis blasfêmias e sua verdade, obscurecida por detestáveis mentiras? Davi
exclama: Ai de mim! Porque, habitando entre falsos irmãos e uma raça bastarda de
Abraão, ele era molestado injustamente e atormentado por eles, ainda que vivesse entre
eles com sã consciência. Visto que nos dias atuais, na igreja de Roma, o cristianismo é
desonrado por todas as formas de imputações indignas, a fé, despedaçada, a luz,
convertida em trevas, e a majestade de Deus, exposta às mais grosseiras zombarias, será
impossível àqueles que têm algum senso da verdadeira piedade em seu íntimo
permanecerem no meio de tais corrupções e não sentirem grande angústia de espírito.
6. Por muito tempo, a minha alma tem habitado com aquele que odeia a paz. Agora, o
salmista mostra, sem figuras, e, por assim dizer, aponta o dedo àqueles que pouco antes
ele havia caracterizado indiretamente com os termos Meseque e Quedar, ou seja, os
israelitas pérfidos que tinham se degenerado dos santos pais e usavam a disfarce de
israelitas, mas não eram a verdadeira semente de Israel. Ele os qualifica de os que
odeiam a paz, pois, de modo espontâneo e com malícia deliberada, faziam guerra contra
os bons e inofensivos. Com o mesmo propósito, o salmista acrescenta, em seguida, que
seu coração era fortemente inclinado a buscar a paz, ou melhor, que ele era totalmente
devotado à paz e tudo fizera para conquistar o favor deles; todavia, a implacável
crueldade da disposição deles os impelia invariavelmente a fazer-lhe mal.
Quando ele diz: Eu sou pela paz, essa é uma expressão abrupta, mas não obscura,
implicando que ele não lhes fizera qualquer injúria ou injustiça que pudesse ocasionar o
ódio deles. De sua parte, sempre houve paz. E vai mais além e assevera que, ao vê-los
inflamados de ressentimento contra ele, fazia tudo para pacificá-los e trazê-los de volta
à boa compreensão. Pois, nesta passagem, falar é equivalente a propiciar condições de
paz num espírito amigável ou tentar a reconciliação. Deste fato, torna-se mais evidente
quão selvagem e brutal era a soberba dos inimigos de Davi, visto que desdenhavam até
de falar com ele – falar com um homem que merecera o bem de suas mãos e nunca, em
qualquer aspecto, os prejudicara. Somos instruídos, por esse exemplo, que não basta os
fiéis absterem-se de prejudicar os outros; devem, além disso, fazer tudo para atraí-los
com mansidão e incliná-los à boa vontade. Uma vez rejeitadas a moderação e a
bondade, eles devem esperar pacientemente, até que Deus se manifeste desde o céu
como Protetor deles. No entanto, lembremos que, se Deus não estender imediatamente
sua mão em nosso favor, nosso dever é suportar a fadiga ocasionada pela demora, como
Davi, que encontramos neste Salmo dando graças a Deus por seu livramento, enquanto,
ao mesmo tempo, como que extenuado de cansaço em aguardá-lo, lamenta a longa
opressão à qual seus inimigos lhe sujeitaram.

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