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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA SEGUNDA VARA CRIMINAL

DA COMARCA DE DOURADOS-MS

Processo nº: 000000-00.2021.8.07.0007


Classe: ação penal
Acusado: José Expósito Alexandre.

José Expósito Alexandre, já qualificado nos autos da ação penal em epígrafe que lhe move o
Ministério Público do Estado do Acre, por meio de seu advogado que a esta subscreve, vem,
tempestivamente, à presença de vossa excelência, não se conformando com a sentença
condenatória encartada nos autos digitais de fls. 442/455, com espeque no artigo 593, inciso I,
do Código de Processo Penal, interpor recurso de

Apelação Criminal para a Colenda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do


Acre

Requerendo, desde já, seja recebido, autuado o presente recurso com as inclusas razões de
apelação, pugnando pela válida intimação da parte recorrida para apresentação de
contrarrazões, bem como que seja encaminhado, posteriormente à câmara criminal do tribunal
de justiça, para apreciação.Termos em que pede deferimento.

Dourados - MS , 06 de junho de 2021.

Julio Aristimunha Escalabrio


Advogado
OAB/MS nº 25.784
RAZÕES DE APELAÇÃO
Egrégio Tribunal de Justiça
Colenda Câmara Criminal
Douta Procuradoria de Justiça
Senhores Desembargadores

Em que pese o notório saber jurídico do magistrado sentenciante, merece reforma a sentença
condenatória encartada nos autos digitais às fls. 422/455, conclusão a que chegará esta
colenda câmara criminal após análise das razões fáticas e jurídicas enumeradas a seguir:

I-DOS FATOS

Conforme consta dos autos, o apelante foi processado e condenado pela prática do delito de
roubo duplamente circunstanciado, previsto no artigo 157, § 2º, incisos I e II, do Código Penal
(CP), à pena concreta e definitiva de 06 (seis) anos e 02 (dois) meses e 20 (vinte) dias de
reclusão, a ser cumprida em regime inicialmente semiaberto, vide denúncia de fls. 145/153 e
sentença de fls. 422/455.
A defesa, entretanto, após minuciosa análise do contexto probatório, entendeu que houve
error in judicando por parte do juízo a quo, tendo em vista que a essência do processo, na
verdade, indica a necessidade de se absolver o apelante das imputações na quais restou
condenado, devendo esta corte, balizando-se no artigo 386, inciso v e/ou vii, do código de
processo penal (cpp) e sob pena de violação ao artigo 155, do cpp, assim proceder. vejamos.

II – DO MÉRITO

a) da absolvição por ausência de provas para a condenação – aplicação do princípio do favor


rei.
b) da violação ao artigo 155, caput, do cpp.
Após minuciosa e perfeccionista análise do cotejo probatório, a defesa conclui que, embora
demonstrada a materialidade delitiva, não há prova nos autos que seja satisfatória a propiciar a
prolação de édito condenatório contra o apelante, tendo em vista que não há provas suficientes
produzidas em juízo para desmistificar o quesito autoria do delito. Vejamos as razões
encartadas na sentença para reconhecimento da autoria do apelante, segundo o juiz: no que
diz respeito ao acusado apelante, também é o caso de condenação, pois sua versão defensiva
não foi corroborada pelas provas existentes nos autos. verifico que ele não produziu nenhuma
prova do álibi que disse possuir, qual seja, o de que, na noite do crime, estava na casa da sua
ex-mulher. por outro lado, a vítima c. l. a. vem o apontando como um dos autores desse crime
desde a fase policial, tendo ela afirmado que, durante o delito, enquanto um dos assaltantes
(no caso, Anderson) subtrai os bens das outras vítimas, o acusado Schellber lhe abordou,
subtraindo seu aparelho celular. por tudo isso, não resta a menor dúvida da autoria imputada
aos acusados apelante... (fls. 448)
Veja-se da letra do édito condenatório a existência de dois fundamentos para condenar o
acusado: a) o réu não provou sua inocência; b) a vítima c. l. a vem o apontado desde a fase
policial. ocorre que assim agindo este r. juízo termina por violar as premissas básicas
informadoras do processo penal democrático moderno. Senão vejamos, quanto ao argumento
de que o réu não provou sua inocência, nos resta tecer breves considerações acerca do
sistema de distribuição do ônus probatório na seara processual penal. define-se o ônus da
prova como “a responsabilidade da parte, que possui o interesse em vencer a demanda, na
demonstração da verdade dos fatos alegados, de forma que, não o fazendo, sofrer a ‘sanção
processual’, consistente em não atingir a sentença favorável ao seu desiderato” (Nucci. ano
2011, p. 26).

O Código de Processo Penal, em seu artigo 156, ensina que:

Art. 156. a prova da alegação incumbirá a quem a fizer, sendo,


porém, facultado ao juiz de ofício:
i - ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção
antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes,
observando a necessidade, adequação e proporcionalidade da
medida;
ii - determinar, no curso da instrução, ou antes de proferir
sentença, a realização de diligências para dirimir dúvida sobre
ponto relevante. nova redação pela lei n. 11.690/2008. (grifo
nosso)

Eugênio Pacelli assevera:


Afirmar que ninguém poderá ser considerado culpado senão após
o trânsito em julgado da sentença penal condenatória implica e
deve implicar a transferência de todo o ônus probatório ao órgão
da acusação. a este caberá provar a existência de um crime, bem
como a sua autoria.(...) cabe, assim, à acusação, diante do
princípio da inocência, a prova quanto à materialidade do fato
(sua existência) e de sua autoria, não se impondo o ônus de
demonstrar a inexistência de qualquer situação excludente da
ilicitude ou mesmo da culpabilidade. por isso, é perfeitamente
aceitável a disposição do art. 156 do CPP, segundo a qual ‘a
prova da alegação incumbirá a quem a fizer’. (Oliveira, Eugênio
Pacelli de. curso de processo penal, 17ª edição, São Paulo:
Editora Atlas s. a., 2013, p.333/334).

Assim, em suma, podemos resumir as considerações acima em uma única assertiva: o


acusado não pode ser condenado por não provar sua inocência, porquanto o ônus da prova
pertence à acusação. pode-se afirmar que transferir o ônus da prova para o réu é, no mínimo,
incoerente, visto que sua inocência é presumida nos termos da constituição federal.Aqui, de
bom alvitre uma correção ao que fora afirmado pelo juiz e o que realmente ocorreu no
processo: afirma o magistrado que a vítima o vem reconhecendo desde a fase policial, o que
traduz a ideia de que também o fez em juízo.
A defesa reescreve a assertiva feita pelo juízo de primeiro grau para melhor esclarecer as
provas (ou sua falta) no processo, fazendo-o da seguinte forma: “a vítima c. l. a reconheceu o
acusado tão somente na fase policial.” A ideia trazida pela defesa é simples, após análise dos
autos, verificou-se que a supracitada vítima realmente realizou reconhecimento em sede
policial (fls. 15). entretanto, o juízo sentenciante, considerando relevante a negativa do réu,
sente dúvidas sobre a autoria (art. 156,II, CPP) determinou a realização de reconhecimento
pessoal em juízo.
Ocorre que a prova que o juízo sentenciante necessitava para vislumbrar certeza sobre a
autoria do delito não foi produzida, tendo em vista que foram realizadas 03 (três) audiências
com tal desiderato, entretanto, a vítima não compareceu em nenhuma delas.
O acusado, em sede administrativa (fls. 22), foi interrogado e negou com veemência o delito a
si imputado, conforme se depreende de breve transcrição abaixo: [...] que sobre a acusação de
roubo o interrogado não sabe disto, pois estava com sua mulher Tailine. que o interrogado nega
que tenha tentado esconder uma arma de fogo; que se recusou a sair do quarto, pois não sabia
o que estava acontecendo.” – fls. 22, dos autos.
Em juízo, o interrogado reafirmou sua não participação no delito em comento, conforme se vê
dos trechos abaixo: que nunca teve condenação criminal...; que está preso já faz um ano e não
sabe qual vai ser a decisão daqui hoje, que podem o condenar mas tem a plena certeza de que
não cometeu o ato; que podem te dar trinta anos e passar quinze, lhe chamar de novo e
perguntar se estava presente, e vai dizer “não estava”; que esse cara aí só falou que o
depoente estava envolvido porque estava sob pressão; que a pessoa sob pressão era Gabriel;
que quem pressionava era a polícia; que do mesmo jeito fizeram com o depoente, querendo
que este confessasse o crime que ele cometeu, mas só que o depoente não foi burro, pois não
assumiu nada não; que nega que tenha qualquer participação no delito; que estava em sua
casa dormindo, cedo, quando a polícia chegou lá falando que tinha um cidadão, não falou o
nome dele, que estava lhe acusando de assalto; que não sabe se isso é versão da polícia ou
versão do Gabriel...
Desta feita, narradas as circunstâncias em que se deram a prisão do acusado, bem como
considerando que a polícia lhe guardava rancor, desde 2008 (tendo em vista que o irmão do
acusado teria assassinado um policial militar, gerando uma intriga), fica clarividente que tudo o
que fora produzido em sede policial, às escuras, merece ainda mais cautela quando da
avaliação desta câmara, o que, certamente foi feito, quando determinada a audiência de
reconhecimento pessoal. o juiz, não se satisfazendo tão somente com o reconhecimento em
sede administrativa, determinou¸ para dissipar todas as dúvidas, a realização de
reconhecimento pessoal judicial, o que, não tendo sido realizado, mantém a suspeita sobre
procedimento indutivo realizado pela polícia, bem como mantém a dúvida sobre a autoria do
crime por parte de José Expósito Alexandre.
Não merece muitas considerações o interrogatório do Delator Gabriel, eis que este, tão
somente visando benefícios judiciais, querendo elidir-se do fato ao qual praticou ou visando
uma redução de pena, “colaborou” produzindo provas contra inimigo da polícia militar, o que
por óbvio, não merece credibilidade. ainda, seu depoimento é recheado de inconsistências e
contradições, tudo isto resultado óbvio do afoito interesse em reduções de pena ou benefícios
congêneres. Assim, recaindo contra o acusado tão somente prova inquisitiva, aliada às
suspeitas de terem sido produzidas com o afã de incluí-lo na cena do crime, eis que era visado
pela polícia militar em função de desavenças anteriores, e considerando que nada disso foi
repetido em juízo, as considerações estampadas na sentença não são aptas para condená-lo.
na verdade, a fundamentação da referida sentença viola o artigo 155, do CPP.
Impositiva a absolvição, tendo em vista que, no presente processo, a regra da necessidade de
reproduzir as provas em juízo se torna mais necessária do que o normal para depreender édito
condenatório, o que, claramente, não existe no presente processo, razão por que, deve-se
utilizar este r. juízo, da máxima favor rei, determinando a absolvição do acusado José Expósito
Alexandre, de todos os delitos a ele imputados.
Vê-se que o juízo sentenciante não se atentou para as disposições de nosso código de
processo penal, especialmente aos comandos constantes do artigo 386, inciso iv, que
determina seja decretada a absolvição do réu, desde que o juiz reconheça (v) não existir prova
de ter o réu concorrido para a infração penal.
Neste sentido também caminha a jurisprudência, conforme se verifica do julgado abaixo, com
grifo da defesa:

TJ-AC-Apelação: Apl nº 0001088- 2.2009.8.01.0006 Penal.


Processo Penal. Apelação Criminal. crime contra a dignidade
sexual. estupro de vulnerável. retratação da vítima em juízo.
demais elementos de prova que não dão certeza da materialidade
delitiva. dúvida instaurada. aplicação do in dubio pro reo.
absolvição que se impõe. recurso provido.1. no processo penal, a
dúvida não pode militar em desfavor do réu, haja vista que a
condenação, como medida rigorosa e privativa de uma liberdade
pública constitucionalmente assegurada (art. 5º, xv, liv, lv, lvii e lxi,
da cf), requer a demonstração cabal da autoria e materialidade,
pressupostos autorizadores da condenação. 2. na hipótese de
constarem nos autos elementos de prova que conduzam à dúvida
acerca da ocorrência do crime, a absolvição é medida que se
impõe, em observância ao princípio do in dubio pro reo. 3. recurso
provido.
III– DOS PEDIDOS

Ante o exposto, requer, respeitosamente à esta colenda câmara criminal, seja recebida,
autuada e processada o presente recurso de apelação, bem como apreciar as razões anexas,
para que, seja conhecido e ao final, provido o presente apelo, reformando a sentença prolatada
pelo juízo a quo, em favor do apelante José Expósito Alexandre, para absolvê-lo das
imputações nas quais fora condenado, sob pena de violação aos artigos 386, incisos V e VII,
do CPP, sob pena de violação ao artigo 155, do CPP. Termos em que pede deferimento.

Dourados - MS, 06 de junho de 2021.

Julio Aristimunha Escalabrio


Advogado
oab/ms nº 25.784

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