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As alegaçõ es finais por memoriais é a ú ltima peça processual apresentada pelas partes,

antes do juiz proferir sentença.


Da mesma forma, como ocorre na resposta a acusaçã o, as alegaçõ es finais podem
apresentar todas as preliminares cabíveis, como:
1) Nulidades (art. 564 a 573 do CPP): É preciso atençã o ao identificar qualquer nulidade
ocorrida durante o processo, como ex. incompetência, nulidade de citaçã o, inépcia da
denú ncia e etc..
2) Causas de extinção da punibilidade (art. 107, CP): Como prescriçã o, decadência,
perempçã o, ó bito, fato que deixou de ser crime e etc.
Quanto ao mérito, estas sã o as teses que podem ser combatidas nas alegaçõ es finais, com
base nos incisos do artigo 386 do CPP:
1) Estar provada a inexistência do crime ou não haver prova suficiente que este
aconteceu: Caso nã o haja provas suficientes de que o crime de fato ocorreu, vigorará o
princípio do in dubio pro réu. Assim, caso a acusaçã o nã o tenha comprovado a existência do
crime, o defensor deverá pedir ao juiz que seja deferida a absolviçã o por falta de
materialidade.
2) Não consistir o fato infração penal: Durante a instruçã o do processo, pode ocorrer que
os fatos apurados nã o sã o exatamente como os descritos na denú ncia. Se a conduta
imputada ao réu nã o configurar crime, a defesa deverá pedir a absolviçã o por atipicidade
da conduta.
3) Não existir prova de que o acusado concorreu para a ação penal, ou estar provado
que o mesmo não concorreu com o crime: Nesse caso a tese será de negativa de autoria,
pois caso a defesa prove que ele nã o está ligado ao crime, ou que a acusaçã o nã o tenha
provado seu envolvimento, caberá a absolviçã o, aplicando o princípio do in dubio pro réu.
4) Circunstâncias que excluam a ilicitude do crime, que o isentem de pena ou mesmo
se houver fundada dúvida sobre sua existência: Nesta hipó tese, poderá ser alegada a
presença dos institutos da legítima defesa, do estrito cumprimento do dever legal, do
estado de necessidade, do exercício regular de direito, comprovada a inimputabilidade do
acusado, a ocorrência de crime impossível, erro de tipo, excludentes de culpabilidade e etc.
5) Não existirem provas suficientes para a condenação: Esta hipó tese pode ser utilizada
quando nã o houver outra mais adequada, ou seja, qualquer outra dú vida que possa levar à
absolviçã o do réu deverá ser alegada, pois para uma condenaçã o, é necessá rio estarem
presentes todos os elementos que obriguem o réu a responder pelo crime. Cabível a
aplicaçã o do princípio do in dubio pro réu.
Além das teses acima ventiladas, deve a defesa estar atenta e alegar tudo o que possa
favorecer o acusado, o que podemos chamar de teses subsidiá rias, mesmo que estas sejam
incompatíveis com as teses principais, em respeito ao princípio da eventualidade ou
concentraçã o.
Temos, por exemplo, as seguintes teses subsidiá rias:
Desclassificação da conduta: Deve a defesa demonstrar a partir das provas colhidas nos
autos que o acusado praticou outro crime, geralmente, com pena menor (Ex: de lesã o
corporal leve para a contravençã o penal de vias de fato).
Afastamento de qualificadoras, majorantes, ou de causas de aumento de pena: A
depender do crime, alguns fatos podem aumentam a pena, como exemplo o roubo, que se
praticado com emprego de arma de fogo, aumenta-se até a metade (art. 157, § 2º, inciso I,
CP). Assim, a defesa deve trabalhar para afastar tais circunstâ ncias.
Aplicação de minorantes de pena: temos como exemplo o crime tentado (art. 14, CP), o
arrependimento posterior (art. 16, CP), participaçã o de menor importâ ncia (art. 29, § 1º,
CP), e etc.
Aplicação da pena no mínimo legal: Previstas no artigo 59 do CP, a defesa deve apontar
circunstâ ncias que influam na dosimetria da pena, como a primariedade, bons
antecedentes, comportamento social, motivos que levaram a prá tica do crime,
culpabilidade e etc.
Afastamento de agravantes ou aplicação de atenuantes: Previstas no art. 61 a art. 65 do
CP, com o fito de reduzir a pena-base, como exemplo, a confissã o perante autoridade
judiciá ria, se o acusado era menor de 21 (vinte e um) anos a época dos fatos e etc.
Afastamento ou redução do valor mínimo fixado para reparação de danos à vítima: a
depender do crime praticado, o juiz poderá fixar tal valor, desde que com pedido expresso
da denú ncia. A defesa deve juntar elementos no sentido de afastar ou reduzir ao má ximo tal
valor (art. 387, IV, CPP).
Concessão de benefícios previstos em lei: a defesa deve alegar qualquer hipó tese de
benefício para o acusado, como a substituiçã o da pena privativa de liberdade por restritiva
de direitos, sursis, aplicaçã o de regime inicial de cumprimento de pena mais brando e etc.
Aplicação da detração penal: nos casos em que o acusado permaneceu preso
preventivamente no processo, poderá ser descontado na sentença condenató ria tal período
da pena definitiva ora fixada para a fixaçã o regime inicial mais brando (art. 387, § 2º, CPP).
Direito de recorrer em liberdade: trabalhar pela desnecessidade de imposiçã o ou
manutençã o da prisã o preventiva, para que o acusado fique em liberdade enquanto recorre
da decisã o.
Como regra geral, as alegaçõ es finais devem ser realizadas oralmente (art. 403, caput, CPP),
contudo, há a possibilidade de certas situaçõ es a sua apresentaçã o se dá por escrito (art.
403, § 3º, e 404, pará grafo ú nico, CPP), mas na prá tica forense, é quase sempre realizada
por escrito, no prazo de 05 (cinco) dias.
Espero ter ajudado.
Segue modelo abaixo.
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA CRIMINAL DA
COMARCA DE _____________ – ESTADO DO ___________

Autos sob o nº: XXXXXXXXXXXXXXXXXX

FULANO DE TAL, já qualificado nos presentes autos, por intermédio de seu defensor
constituído, vêm, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com fulcro no artigo
403, § 3º, do Có digo de Processo Penal, oferecer suas
ALEGAÇÕES FINAIS POR MEMORIAIS
em razã o da presente açã o penal movida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO
_____________, instaurada com o objetivo de apurar a suposta prá tica da infraçã o penal
contida no artigo 157, “caput”, c/c o seu § 2º, incisos I, II, e V, do Código Penal, fazendo-
as nas seguintes razõ es.
1. DA SÍNTESE PROCESSUAL:
O Ministério Pú blico da Comarca de ______________, no dia 28 (vinte e oito) de janeiro de
2015, ofereceu denú ncia contra o Acusado, por, em tese, ter cometido o crime descrito no
artigo 157, “caput”, c/c o seu § 2º, incisos I, II, e V, do Código Penal.
Consta dos presentes autos que, no dia 02 (dois) de janeiro de 2015, por volta das
22h00min, o acusado, de comum acordo com BELTRANO DE TAL e CICLANO DE TAL e
outro comparsa nã o identificado, munidos de uma arma de fogo (nã o apreendida nos
autos), teriam invadido a residência da vítima VULCANA DE TAL, proferido ameaças de
morte contra ela, e constrangido sua liberdade, prendendo suas mã os com braçadeiras de
nylon, e subtraindo para eles, diversos objetos de valor da residência, como dinheiro,
aparelhos eletrô nicos, joias e bebidas.
Por conta da gravidade dos fatos, o Ministério Pú blico requereu a prisã o preventiva dos
Acusados.
Desta feita, o MM. Juiz desta Comarca recebeu a exordial acusató ria no dia 30 (trinta) de
janeiro de 2015, determinando a citaçã o dos Acusados para apresentar defesa da acusaçã o
que lhe foram imputadas, bem como acolheu o pedido do parquet e decretou a prisã o
preventiva deles.
O Acusado foi regularmente citado, apresentou Resposta a Acusaçã o, e foi custodiado
cautelarmente no dia 24 (vinte e quatro) de maio de 2015.
No decorrer do feito, em Audiência de Instruçã o e Julgamento, foram ouvidas as 05 (cinco)
testemunhas de acusaçã o; e as 05 (cinco) testemunhas arroladas pela defesa.
Durante a tramitaçã o do feito, este Juízo acatou o pedido de revogaçã o de prisã o
preventiva, e atualmente, o acusado se encontra em liberdade, desde 22/05/2019.
Na fase do artigo 402 do Có digo de Processo Penal, o Ministério Pú blico requereu a
atualizaçã o dos antecedentes criminais do Acusados, não havendo diligências a serem
requeridas por esta defesa.
O Ministério Pú blico, em suas alegaçõ es finais, pede a condenaçã o dos Acusados, sob o
argumento de que, existente provas suficientes de materialidade e autoria do crime.
Posteriormente, a defesa foi intimada para apresentar suas alegaçõ es finais, o que se faz
por meio da presente.
É , em síntese, o relatório.
2. DAS PRELIMINARES DE MÉRITO:
a. Da nulidade absoluta do Auto de Reconhecimento de Pessoa por Fotografia.
Inobservância dos requisitos do art. 226 do CPP. Prejuízo a defesa.
Desentranhamento da prova:
Em aná lise detida dos autos, constata-se que o Auto de Reconhecimento de Pessoa por
Fotografia produzidos em sede policial, nã o atendeu aos ditames do artigo 226 do Có digo
de Processo Penal, devendo, portanto, serem considerados nulos e desentranhados do
processo, conforme determina o artigo 157, caput, do Codex supracitado.
Dentro do ordenamento jurídico penal, para que uma prova seja considerada legal, a
mesma deve ser produzida em observâ ncia da lei, para que o Magistrado possa proceder
sua valoraçã o dentro do conjunto probató rio baseado no seu livre convencimento
motivado, com fincas no artigo 155, caput, do Có digo de Processo Penal.
O reconhecimento pessoal por fotografia, embora nã o previsto pela lei processual penal
(mas é reconhecido como meio de prova autô noma), para que possa surtir seus efeitos,
deve estrita obediência à legalidade, ou seja, deve ser realizado na forma descrita no artigo
226 do CPP, senã o vejamos:
Art. 226. Quando houver necessidade de fazer-se o reconhecimento de pessoa, proceder-se-á
pela seguinte forma:
I - a pessoa que tiver de fazer o reconhecimento será convidada a descrever a pessoa que deva
ser reconhecida;
Il - a pessoa, cujo reconhecimento se pretender, será colocada, se possível, ao lado de
outras que com ela tiverem qualquer semelhança, convidando-se quem tiver de fazer o
reconhecimento a apontá-la;
III - se houver razão para recear que a pessoa chamada para o reconhecimento, por efeito de
intimidação ou outra influência, não diga a verdade em face da pessoa que deve ser
reconhecida, a autoridade providenciará para que esta não veja aquela;
IV - do ato de reconhecimento lavrar-se-á auto pormenorizado, subscrito pela
autoridade, pela pessoa chamada para proceder ao reconhecimento e por duas
testemunhas presenciais.
Parágrafo único. O disposto no no III deste artigo não terá aplicação na fase da instrução
criminal ou em plenário de julgamento.
Diante dos termos apresentados, verifica-se vícios quanto ao reconhecimento fotográ fico
realizado pela vítima VULCANA DE TAL, o qual deve ser considerado nulo.
Nã o consta nos autos o conjunto das fotos que foram exibidas à vítima no dia do
reconhecimento, somente a foto isolada dos acusados. Feito desta forma, o reconhecimento
demonstra cará ter indutivo à vítima, e inibe justamente a segurança necessá ria ao ato de
reconhecimento pessoal.
O disposto no inciso II do art. 226 possui a finalidade de atribuir maior carga probató ria ao
reconhecimento, fazendo com que a vítima exerça maior concentraçã o e utilize de
características específicas para individualizar as pessoas que pretende reconhecer.
Portanto, é extremamente necessá rio que exista nos autos as fotos que foram mostradas à
vítima, com o fito de verificar se, de fato, foram apresentadas fotografias de pessoas
semelhantes as características físicas dos Acusados, como altura, cor de cabelo, tom de pele
e etc., para, entã o, que Vossa Excelência analise se houve ou nã o induçã o, ainda que
involuntá ria, durante o procedimento de reconhecimento.
Diante do exposto, conclui-se que o Auto de Reconhecimento de Pessoa por Fotografia
realizados pela Vítima sã o manifestamente nulos, nã o podendo servir de prova nos autos,
ante o seu cará ter indutivo e em total desacordo com as regras esculpidas no Có digo de
Processo Penal, devendo ser considerada prova ilegal e desentranhada do processo.
Neste sentido, a Constituiçã o Federal veda a admissibilidade da prova ilícita, no art. 5º,
inciso LVI:
LVI - são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos;
Outrossim, o artigo 157, caput, do Có digo de Processo Penal:
Art. 157. São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas,
assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais. (grifo
nosso)
Constatada a ausência de formalidade essencial, qual seja, a observâ ncia dos requisitos do
artigo 226 do Có digo de Processo Penal, resta configurada a nulidade, nos termos do artigo
564, inciso IV, do Codex supracitado:
Art. 564. A nulidade ocorrerá nos seguintes casos:
(...)
IV - por omissão de formalidade que constitua elemento essencial do ato.
Ao se tratar de nulidades, mister analisar o Princípio da Instrumentalidade das Formas
(pas de nullité sans grief). Referido princípio versa que, para se fazer o reconhecimento e a
declaraçã o de nulidade de um ato processual, deve ser averiguado se o ato causa efetivo
prejuízo aos interesses da parte, no regular exercício da jurisdiçã o.
No presente caso, a ausência do conjunto de fotos que foram exibidas à vítima no dia do
reconhecimento, impediu o pleno exercício da defesa, violando os princípios
constitucionais do contraditó rio e ampla defesa, já que não forneceu elementos
suficientes para que os defensores confrontassem à Vítima no decorrer da instrução
processual.
Sem as características das supostas pessoas nestas fotografias que foram apresentadas a
Vítima, ficou impossível de confrontá -la em seu depoimento perante este Juízo. Claramente
a Vítima reconheceu como os autores do roubo os Acusados, posto que, desta forma, ela é
induzida a reconhecer, seja porque está traumatizada pelo crime que sofrera e
querendo justiça, ou até mesmo por falsas memórias.
Falsas memó rias consistem em recordaçõ es de situaçõ es nunca ocorreram ou aconteceram
de forma diversa de como lembrado pela vítima ou testemunha. Embora nã o apresentem
uma experiência direta, as falsas memó rias representam a verdade como os indivíduos as
lembram.[1]
Neste sentido, forçoso ressaltar as liçõ es de Tourinho Filho, quanto a falibilidade do
reconhecimento de pessoa:
No reconhecimento há a fusão de uma percepção presente com outra pretérita. A pessoa que
procede ao reconhecimento faz uma evocação à reminiscência e procura ver a
semelhança entre aquela figura guardada na memória e aquela que lhe é
apresentada. Às vezes a memória não é tão boa. Além disso, quanto mais passa o tempo,
mais se distancia a lembrança, o que dificulta seriamente o reconhecimento.[2] (grifo nosso)
Por fim, e diante das razõ es impostas, ante a inobservâ ncia do procedimento previsto no
artigo 226 do Có digo de Processo Penal, e o prejuízo causado à defesa, requer-se seja
declarada a nulidade absoluta do reconhecimento de pessoa por fotografia realizado
pela vítima VULCANA DE TAL, e consequentemente, o seu desentranhamento dos
autos, forte nos artigos 564, inciso IV, c/c o artigo 157, todos do Código de Processo
Penal.
3. DO MÉRITO:
a. Da ausência de provas suficientes para condenação. Aplicação da regra do in dubio
pro reo. Absolvição do Acusado (art. 386, incisos V e VII, do CPP)
Diante do quadro probató rio colhido nos autos, verifica-se que nã o há provas suficientes
aptas a demonstrar que o acusado teria participado do crime de roubo em questã o,
merecendo ele ser absolvido, com base nas disposiçõ es previstas no artigo 386, incisos V e
VII, do Có digo de Processo Penal.
Muito embora exista o reconhecimento fotográ fico realizado em sede policial pela vítima,
tal prova nã o pode fornece segurança suficiente em apontar a autoria, tendo em vista que
nã o goza de força probató ria autô noma, devendo ser corroborado por outros meios de
prova nos autos, e, inclusive, o referido reconhecimento tem sido objeto de tese
declarató ria de nulidade e desentranhamento (vide tó pico anterior).
Neste sentido, o reconhecimento fotográ fico é considerado prova precá ria por apresentar
notó rias dificuldades de correspondência entre uma fotografia e uma pessoa, sendo
considerado prova excepcional somente para confirmaçã o de demais provas existentes nos
autos. Em caso semelhante, assim entendeu o Tribunal Regional Federal da 1ª Região
(TRF-1):
PENAL. PROCESSUAL PENAL. ROUBO MAJORADO. ART. 157, § 2º, I, II e V, DO CÓDIGO
PENAL. AUTORIA NÃO COMPROVADA. INEXISTÊNCIA DE PROVAS. RECONHECIMENTO
FOTOGRÁFICO. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. 1. Diante da inexistência de provas a comprovar a
autoria delitiva, é de ser decretada a absolvição, com esteio no art. 386, V, do Código de
Processo Penal. 2. O reconhecimento fotográfico constitui prova precária, "tendo em
vista as dificuldades notórias de correspondência entre uma (fotografia) e outra
(pessoa), devendo ser utilizado este procedimento somente em casos excepcionais,
quando puder servir como elemento de confirmação das demais provas." (Eugênio
Pacelli, Curso de Processo Penal, 16ª. Edição, Atlas, fl. 427, 2012) 3. Esse entendimento
também está assentado no parecer do Ministério Público Federal, o que reforça as razões de
decidir. 4. Sentença absolutória mantida por seus próprios fundamentos. 5. Apelação não
provida. (TRF-1 – APR: 0008063-33.2007.4.01.4000, Relator: Desembargadora Federal
Monica Sifuentes, Data de Julgamento: 17/05/2017, Terceira Turma, Data de Publicação:
31/05/2017 e-DJF1) (grifo nosso)
Como se vê na presente decisã o, é imperioso que o reconhecimento por meio de fotografia
nã o pode ser considerado meio de prova autô nomo apto a embasar uma sentença
condenató ria. De fato, seria necessá rio o reconhecimento pessoal do Acusado pela Vítima, o
que poderia ser feito em Juízo, durante Audiência de Instruçã o e Julgamento, ressaltando
que as dependências do Fó rum desta Comarca detêm de estrutura que preserva a
identidade da vítima durante o reconhecimento, contando com uma sala de vidro
espelhado, ou seja, a Vítima entraria nesta sala e poderia ver o Acusado sem que ele
conseguisse ver a mesma.
No entanto, nã o houve requerimento pelo parquet e pelo assistente de acusaçã o neste
sentido, e a Vítima preferiu ser ouvida na ausência dos Acusados (o que é natural dado a
gravidade do crime que sofrera), e novamente fez o reconhecimento por fotografia, com a
foto acostada no Auto de Reconhecimento de Pessoa, em contínuo desacordo com os
requisitos do artigo 226 do Có digo de Processo Penal.
Para corroborar a tese, segue semelhante decisã o do Egrégio Tribunal de Justiça do
Estado do Paraná (TJ-PR):
APELAÇÃO CRIME - TENTATIVA DE ROUBO MAJORADO (ART. 157, § 2º, I E II C.C ART. 14,
II, AMBOS DO CP) - SENTENÇA ABSOLUTÓRIA - RECURSO DA ACUSAÇÃO - ALEGADA
SUFICIÊNCIA PROBATÓRIA ACERCA DA MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS – NÃO
ACOLHIMENTO - RECONHECIMENTO DO ACUSADO POR UM DOS OFENDIDOS -
FRAGILIDADE - INDICAÇÃO DE FERIMENTOS QUE SEQUER FORAM COMPROVADOS POR
OUTRO MEIO DE PROVA - OUTRA VÍTIMA QUE NEGA TER INDENTIFICADO O INCULPADO NA
DELEGACIA – AUTO DE RECONHECIMENTO DE PESSOA POR FOTOGRAFIA -
PRECARIEDADE - DÚVIDA RAZOÁVEL QUE CHANCELA A MANUTENÇÃO DA ABSOLVIÇÃO
SEGUNDO O PRINCÍPIO .IN DUBIO PRO REO. - A condenação exige prova cabal de
autoria e materialidade, não podendo ser alicerçada em elementos de prova inaptos a
gerar de forma segura o juízo de culpabilidade do inculpado. RECURSO DE APELAÇÃO
NÃO PROVIDO.(TJPR - 3ª C.Criminal - 0002440-43.2013.8.16.0114 - Marilândia do Sul - Rel.:
Gamaliel Seme Scaff - J. 07.05.2019) (grifo nosso)
Forçoso ressaltar, Excelência, que a Vítima, perante os policiais militares que atenderam o
local do crime, informou a eles que teria visto uma pessoa de pele morena, alta, e de topete,
conforme descriçã o realizada no Boletim de Ocorrência, e confirmado em Juízo pelo
depoimento das testemunhas.
Tais características sã o totalmente diferentes das descritas pela Vítima no Auto de
Reconhecimento de Pessoa por Fotografia, que descreveu o indivíduo que visualizou de
“pele morena, estatura alta, calça jeans e camiseta de cor que não se recorda”, reconhecendo
o acusado como um dos autores do crime.
Ora Excelência, se a Vítima ficou traumatizada a ponto de nã o esquecer os rostos dos
indivíduos que praticaram o crime, conforme alegado pelo parquet, entã o porque
descreveu características totalmente diferentes do indivíduo, em períodos distintos da
investigaçã o?
Nã o se pode olvidar, Excelência, que a situaçã o traumá tica vivenciada pela Vítima a infligirá
pelo resto da vida, no entanto, isto nã o significa que ela consiga lembrar exatamente das
características dos indivíduos, e tal fato resta demonstrado nos autos. A memó ria humana é
falha, ainda mais se exposta nestas condiçõ es.
Embora a testemunha tenha declarado que participou do reconhecimento fotográ fico,
verifica-se que ele não assinou o termo, sendo assinado por outra testemunha não
foi ouvido em Juízo para corroborar o reconhecimento.
Nã o obstante, a Vítima também afirmou aos policiais militares que os indivíduos estavam
portando um revó lver no momento do roubo, contudo, ao ser questionada em seu
depoimento em Juízo, ela afirmou que os mesmos estavam portando uma pistola, dando a
entender em seu depoimento que tem conhecimento em armas, pois até fez mençã o de
como a arma dos indivíduos era engatilhada.
Além deste frágil reconhecimento por fotografia, não existe nos autos outras provas
que demandem certeza cabal sobre a autoria do Acusado no crime em questão.
Verifica-se que nos autos de quebra de sigilo telefô nico, que a Autoridade Policial
representou pela Interceptaçã o e quebra de sigilo de dados telefô nicos do telefone celular
roubado da Vítima, bem como de outros nú meros suspeitos que pudessem identificar a
autoria do crime, sendo deferida por este Juízo.
Contudo, as informaçõ es colhidas nos referidos autos nã o permitiram revelar a autoria do
crime em tela, ou de qualquer envolvimento do Acusado no crime, sendo, portanto,
arquivado o feito a requerimento do parquet.
Em outro momento das investigaçõ es, foi expedido mandado de busca e apreensã o na
residência do acusado e segundo o policial civil, em depoimento prestado Juízo, foram
encontradas armas de fogo na residência, contudo, afirmou que nada do que foi roubado da
residência da Vítima foi encontrado na residência dele.
Aqui outro ponto importante a ser ressaltado: estas armas apreendidas com o Acusado nã o
foram apresentadas à Vítima, conforme o depoimento do policial.
A legislaçã o penal prevê a possibilidade de reconhecimento de objetos, em seu artigo 227
do Có digo de Processo Penal, o que poderia ter sido feito e verificado pela Vítima se alguma
dessas armas teriam sido utilizadas no crime, mas nada foi feito para sanar tal dú vida.
Nã o houve testemunhas oculares do fato, que pudessem afirmar com certeza que viram o
acusado praticando o roubo. Na realidade, nada no inquérito aponta à autoria do crime
ao Acusado. As testemunhas arroladas pela acusaçã o afirmaram desconhecer o Acusado,
assim com os demais acusados pelo crime.
O pró prio Acusado, tanto na fase policial quanto na judicial, negou a prá tica do crime, e
afirmou que nã o é uma pessoa alta, pois mede 1,55m (um metro e cinquenta e cinco
centímetros).
Note, Excelência, que nã o é possível extrair evidências concretas e seguras da participaçã o
do acusado no crime em voga. No processo penal, tudo deve ser claro e preciso, como peças
de uma engrenagem, sendo certo que, existindo dú vida razoá vel, é temerá ria uma
condenaçã o. É preferível um culpado solto do que um inocente condenado.
Diante de todo o exposto, a absolviçã o é medida que se impõ e, nos termos do artigo 386,
incisos V e VII, do Có digo de Processo Penal, por ser medida mais adequada ao caso
concreto.
4. DA OBSERVÂNCIA AO PRINCÍPIO DA EVENTUALIDADE EM CASO DE
ENTENDIMENTO PELA CONDENAÇÃO.
a. Do afastamento da majorante de emprego de arma de fogo (art. 157, § 2º, inciso I,
CP). Revogação pela Lei nº 13.654/2018. Princípio da Retroatividade da Lei Penal
mais Benéfica
Atento ao Princípio da Eventualidade, caso Vossa Excelência entenda pela condenaçã o do
Acusado, a defesa pleiteia pelo afastamento da majorante de emprego de arma de fogo,
prevista no inciso I, do § 2º, do artigo 157 do Código Penal.
Isto porque a referida majorante foi revogada pela Lei nº 13.654/2018, que alterou o
Có digo Penal, inserindo a mesma majorante no § 2-A, inciso I, do artigo supracitado, mas
agora aumentando a pena em dois terços.
Considerando que o crime ocorreu na data de 02/01/2015, e a nova lei ter sido
promulgada na data de 23/04/2018, nã o se pode aplicar a nova majorante do § 2-A, inciso
I, face ao Princípio da Retroatividade da Lei Penal mais Benéfica, insculpido no artigo 5º,
inciso XL, da Constituição Federal de 1988.[1]
Deste modo, resta afastada a referida majorante.
b. Dos critérios de fixação de pena. Circunstâncias judiciais e atenuantes:
Nos moldes do art. 68 do Có digo Penal, a dosimetria da pena deve respeitar o
procedimento trifá sico.
Na primeira fase de dosimetria, requer-se seja observado as seguintes circunstâ ncias
judiciais, descritas no artigo 59 do Có digo Penal:
Culpabilidade: pode ser entendida como sendo o grau de menosprezo do agente perante o
bem jurídico lesado ou a reprovaçã o social que o crime e o autor do fato merecem, de
acordo com o caso concreto. Embora o Acusado possuísse plena consciência da ilicitude do
fato, tal fator nã o pode ser considerado a ponto de macular tal circunstâ ncia, devendo ser
reconhecida a culpabilidade como circunstâ ncia judicial favorá vel.
Antecedentes: o Acusado deve ser considerado primá rio, pois a sentença condenató ria
constante na certidã o de antecedentes criminais transitou em julgado apó s os fatos
discutidos nestes autos, devendo ser reconhecida tal circunstâ ncia como favorá vel.
Personalidade do agente: Em tal circunstâ ncia, deve ser elaborado laudo criminoló gico,
por profissional com habilitaçã o suficiente para diagnosticar a efetiva tendência do
Acusado à prá tica de crimes. Inexistindo referido exame nos autos, este critério nã o pode
ser considerado para fins de mensuraçã o da pena-base, devendo atuar como circunstâ ncia
judicial favorá vel.
Motivos: o motivo da infraçã o é inerente ao tipo penal, nã o atuando desfavoravelmente ao
Acusado.
Circunstâncias: nã o influenciaram na conduta do Acusado, sendo normais à espécie.
Comportamento da Vítima: nã o justifica ou autoriza o crime, podendo, no entanto,
diminuir a censura sobre o ato praticado pelo Acusado, atuando, desta maneira, como
circunstâ ncia judicial favorá vel.
Quanto as circunstâncias atenuantes, presente se faz a menoridade de 21 (vinte e um)
anos, nos termos do artigo 65, inciso I, do Código Penal, tendo em vista que o Acusado
contava apenas com 20 (vinte) anos de idade na data do fato.
c. Da detração penal:
A detraçã o penal, nos termos do § 2º do artigo 387 do Có digo de Processo Penal (incluído
pela Lei nº 12.736/2012), pode ser realizada pelo Juiz no momento em que é prolatada a
sentença condenató ria, permitindo a progressã o de regime com a detraçã o do tempo de
prisã o provisó ria na sentença, senã o vejamos:
Art. 387. O juiz, ao proferir sentença condenatória:
(...)
§ 2o O tempo de prisão provisória, de prisão administrativa ou de internação, no Brasil ou no
estrangeiro, será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de
liberdade.
Dando ao juiz de conhecimento competência para realizar a detraçã o, antes conferida
apenas ao juiz da execuçã o, a fim de que sejam evitadas situaçõ es em que o Acusado tenha
que aguardar a decisã o do Juiz da Execuçã o Penal, permanecendo nessa espera em regime
mais gravoso.
Dessa forma, o Acusado foi preso preventivamente no dia 24/05/2017, e ficou custodiado
até o dia 22/05/2019, perfazendo 01 (um) ano, 11 (onze) meses e 29 (vinte e nove
dias), quantia que deverá ser detraída da pena que eventualmente vir a ser condenado,
com a finalidade de especificar o regime inicial de pena.
5. DA CONCLUSÃO:
Diante de todo o exposto, pede-se, encarecidamente, a Vossa Excelência:
a) A declaraçã o de nulidade absoluta do reconhecimento de pessoa por fotografia realizado
pela vítima, e consequentemente, o seu desentranhamento dos autos, embasado nos artigos
564, inciso IV, c/c o artigo 157, todos do Có digo de Processo Penal;
b) A absolviçã o do acusado, ante a ausência de provas suficientes para ensejar a
condenaçã o, nos termos do artigo 386, incisos V e VII, do Có digo de Processo Penal;
c) Em caso de condenaçã o, que seja afastada a majorante de emprego de arma de fogo,
prevista no inciso I, do § 2º, do artigo 157 do Código Penal, ante a sua revogaçã o pela Lei
nº 13.654/2018, e consequentemente, pelo Princípio da Retroatividade da Lei Penal mais
Benéfica, insculpido no artigo 5º, inciso XL, da Constituição Federal de 1988;
d) Que sejam consideradas favorá veis as circunstâ ncias judiciais, na primeira fase da
dosimetria (art. 59 do Có digo Penal);
e) Que seja reconhecida circunstâ ncia atenuante de menoridade de 21 (vinte e um) anos,
nos termos do artigo 65, inciso I, do Có digo Penal;
f) Por fim, que seja realizada a detraçã o penal da pena cumprida provisoriamente pelo
Acusado, de 01 (um) ano, 11 (onze) meses e 29 (vinte e nove dias), nos termos do § 2º
do artigo 387 do Có digo de Processo Penal;
Nestes termos,
Pede e espera deferimento.
______________________, ____ de ___________ de 2020.
_________________________
ADVOGADO
OAB/____ nº _____________.

[1] Art. 5º, inciso XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu.

[1] http://www.justificando.com/2015/09/10/psicologia-do-testemunho-as-falsas-
memorias-no-processo-penal/

[2] TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de Processo Penal. – 13. ed. – São
Paulo: Saraiva, 2010. p. 614.

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